Monografia Sirlene Schettert Hochmuller Leonardi

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1
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI
CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS
CURSO DE DIREITO
ADOÇÃO NO BRASIL: ANÁLISE DA (IM) POSSIBILIDADE DE
REVERSÃO DA “ADOÇÃO À BRASILEIRA” PARA ADOÇÃO
LEGAL NO BRASIL
SIRLENE SCHETTERT HOCHMULLER LEONARDI
Itajaí (SC), maio de 2006.
ii
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI
CENTRO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS, POLÍTICAS E SOCIAIS - CEJURPS
CURSO DE DIREITO
ADOÇÃO NO BRASIL: ANÁLISE DA (IM) POSSIBILIDADE DE
REVERSÃO DA “ADOÇÃO À BRASILEIRA” PARA ADOÇÃO
LEGAL NO BRASIL
SIRLENE SCHETTERT HOCHMULLER LEONARDI
Monografia submetida à Universidade
do Vale do Itajaí – UNIVALI, como
requisito parcial à obtenção do grau de
Bacharel em Direito.
Orientadora: Professora MSc. Patrícia Elias Vieira
Itajaí (SC), maio de 2006.
iii
AGRADECIMENTO
A Deus, por me proteger e abençoar, mesmo que
eu, na felicidade, às vezes d’Ele me esqueça.
A Landa, minha mãe. Sem a sua ajuda, esta
conquista não teria sido possível.
Ao Léo, meu filho. Meu amor maior. A quem
espero dar os exemplos corretos.
A quem já se foi. Heitor, meu pai, que ao lado de
Deus, olha por mim.
A minha orientadora, professora MSc. Patrícia
Elias Vieira. Pela dedicação, paciência, empenho
e zelo. Por compartilhar seus conhecimentos
comigo.
iv
DEDICATÓRIA
Ao Fabiano. Meu marido. Que tantas vezes
abdicou de seus sonhos para que eu pudesse
realizar o meu.
v
O laço que une a sua família verdadeira não é o
de sangue, mas de respeito e alegria pela vida
um do outro.
(Richard Bach)
vi
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo
aporte ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do
Vale do Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o
Orientador de toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Itajaí (SC), maio de 2006.
Sirlene Schettert Hochmuller Leonardi
Graduanda
vii
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale
do Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Sirlene Schettert Hochmuller
Leonardi, sob o título Adoção no Brasil: Análise da (Im) possibilidade de reversão
da “adoção à brasileira” para adoção legal no Brasil, foi submetida em 07 de junho
de 2006 à banca examinadora composta pelos seguintes professores: MSc
Patrícia Elias Vieira, presidente de banca; MSc Marta E. Deligdisch e Dr. Zenildo
Bodnar, integrantes da banca examinadora, e aprovada com a nota 10 (Dez).
Itajaí (SC), junho de 2006.
Professora MSc. Patricia Elias Vieira
Orientador e Presidente da Banca
Professor MSc. Antônio Augusto Lapa
Coordenação da Monografia
viii
ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS
a. C.
Antes de Cristo
Ampl.
Ampliada
Art.
Artigo
Atual.
Atualizada
CC/1916
Código Civil Brasileiro de 1916
CC/2002
Código Civil Brasileiro de 2002
CEJURPS
Centro de Ciências Jurídicas, Políticas e Sociais
CP/1940
Código Penal de 1940
CRFB
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988
d. C.
Depois de Cristo
Des.
Desembargador
ECA
Estatuto da Criança e do Adolescente
Ed.
Edição
Etc.
E Te Cetera
LICC
Lei de introdução ao Código Civil
LTDA
Limitada
MSc.
Mestre
n.
Número
p.
Página
Rev.
Revisada
SC
Santa Catarina
TJ
Tribunal de Justiça
UNIVALI
Universidade do Vale do Itajaí
ix
ROL DE CATEGORIAS
Rol de categorias que a autora considera estratégicas à
compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.
Adoção
A adoção é o “ato jurídico solene pelo qual, observados os requisitos legais,
alguém estabelece, independentemente de qualquer relação de parentesco
consangüíneo ou afim, um vínculo fictício de filiação, trazendo para a sua família,
na condição de filho, pessoa que, geralmente, lhe é estranha1”.
Adoção à brasileira
Segundo Gonçalves2, “A simulada ou à brasileira é uma criação da jurisprudência.
A expressão (...) foi empregada pelo Supremo Tribunal Federal ao se referir a
casais que registram filho alheio, recém nascido, como próprio, com a intenção
de dar-lhe um lar, de comum acordo com a mãe e não com a intenção de tomarlhe o filho.
Adoção por companheiros
A adoção por companheiros visa possibilitá-la a pessoas que vivem em união
estável, conforme menciona o caput do artigo 1.622 do Código Civil: “Ninguém
poderá ser adotado por duas pessoas, salvo se forem marido e mulher ou viverem
em união estável”.
Adoção por parentes
A adoção por parentes encontra proibição estabelecida no parágrafo 1º do artigo
42 do Estatuto da Criança e do Adolescente: “Não podem adotar os ascendentes
e os irmãos do adotando”.
1
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. 18. ed. São Paulo:
Saraiva, 2002. p. 360.
2
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de Família. 8 ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 102.
x
Adoção por divorciados e judicialmente separados
A adoção por divorciados e judicialmente separados é valida, sendo que encontra
respaldo jurídico no parágrafo 4º3 do artigo 42 do Estatuto da Criança e do
Adolescente, bem como no parágrafo único4 do artigo 1.622 do Código Civil.
Adoção post mortem
A adoção post mortem, é aquela onde: “a adoção poderá ser deferida ao adotante
que, após inequívoca manifestação de vontade, vier a falecer no curso do
procedimento, antes de prolatada a sentença5”.
Adoção unilateral
A adoção unilateral é aquela requerida por apenas uma pessoa, formando assim,
uma família substituta monoparental.
Adolescente
Adolescente é o “menor entre 12 e 18 anos de idade6”.
Adotado
Adotado é “aquele que adquire, em relação a quem o adota, a filiação civil7”.
Adotante
3
Art. 42. Podem adotar os maiores de vinte e um anos, independentemente de estado civil. (...) §
4º Os divorciados e os judicialmente separados poderão adotar, conjuntamente, contanto que
acordem sobre a guarda e o regime de visitas, e desde que o estágio de convivência tenha sido
iniciado na constância da sociedade conjugal.
4
Art. 1622. Ninguém pode ser adotado por duas pessoas, salvo se forem marido e mulher, ou se
viverem em união estável.
Parágrafo único. Os divorciados e os judicialmente separados poderão adotar conjuntamente,
contanto que acordem sobre a guarda e o regime de visitas, e desde que o estágio de
convivência tenha sido iniciado na constância da sociedade conjugal.
5
SILVA, José Luiz Mônaco da. A família substituta no Estatuto da Criança e do Adolescente.
São Paulo: Saraiva, 1995. p 110.
6
Art. 2º do Estatuto da Criança e do Adolescente –“ Considera-se criança, para os efeitos desta
Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito
anos de idade”.
7
NUNES, Pedro . Dicionário de Tecnologia Jurídica. 12 ed. rev. ampl. e atual. Rio de Janeiro:
Freitas Bastos, 1993. p. 734.
xi
“O adotante é o agente provocador do ato. É ele que, através da manifestação da
vontade, dá início ao procedimento de adoção8”.
Afeto
Entende-se por afeto “Sentimento de carinho, apego sincero a alguém ou algo,
pode ser entendido como amizade, amor etc.”9
Criança
“Considera-se criança, a pessoa até doze anos incompletos10”.
Família
Atualmente entende-se que a família “é o espaço indispensável para a garantia da
sobrevivência de desenvolvimento e da proteção integral dos filhos e demais
membros, independentemente do arranjo familiar ou da forma como vêm se
estruturando11”.
Família natural
“Família natural, como o próprio nome sugere, é a que encontra o seu ponto de
partida na família biológica, ou seja, na família constituída de ascendentes e
descendentes, unidos por laços de consangüinidade12”.
Família monoparental
Entende-se por família monoparental aquela em que “os filhos se encontram,
necessariamente, vinculados só ao pai ou só a mãe13”.
8
GATELLI, João Delciomar. Adoção internacional: procedimentos legais utilizados pelos países
do Mercosul. Curitiba: Juruá, 2005. p. 27.
9
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Dicionário da lingua portuguesa: Rio de Janeiro:
Nova Fronteira, 2000. p. 20.
10
Art. 2º do Estatuto da Criança e do Adolescente – “Considera-se criança, para os efeitos desta
Lei, a pessoa até doze anos de idade incompletos, e adolescente aquela entre doze e dezoito
anos de idade”.
11
KALOUSTIAN, Silvio Manoug (organizador). Família brasileira, a base de tudo. 2 ed. São
Paulo: Cortez; Brasília, DF: UNICEF, 1994. p. 11 e 12.
12
SILVA, José Luiz Mônaco da. A família substituta no Estatuto da Criança e do Adolescente.
p 6.
xii
Família substituta
A Família substituta é a que “substitui a família natural; é a que vem em segundo
plano, logo depois desta última; isso não significa dizer que a família substituta
seja inferior, sob a ótica moral, religiosa, econômica etc., à família natural14”.
Filiação
Pode-se considerar a filiação como o “vínculo de parentesco que une a prole ao
seu procriador. Liame jurídico que se estabelece entre um indivíduo e outro de
que imediatamente descende em linha reta. Pode ser paterna ou materna,
legítima ou ilegítima15”
Melhor Interesse do Menor
Significa que toda a medida empregada deve levar em conta a criança, ou seja, o
seu bem estar social, a sociabilidade da mesma em relação a família, o convívio,
a sua saúde, as suas possibilidades, enfim tudo o que envolva o menor.
União estável
Entende-se por união estável a “vida prolongada de um homem e uma mulher sob
o mesmo teto, com a aparência de sociedade conjugal16”.
13
LEITE, Eduardo de Oliveira. Famílias Monoparentais: A situação jurídica de pais e mães
separados e dos filhos na ruptura da vida conjugal. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
1997. p. 08.
14
SILVA, José Luiz Mônaco da. A família substituta no Estatuto da Criança e do Adolescente.
p 8.
15
NUNES, Pedro . Dicionário de Tecnologia Jurídica. p. 734.
16
SIDOU, J. M. Othon. Dicionário Jurídico: Academia Brasileira de Letras Jurídicas. Rio de
Janeiro: Forense Universitária, 1997. p. 809.
xiii
SUMÁRIO
xiv
RESUMO............................................................................................XVI
INTRODUÇÃO .......................................................................................1
CAPÍTULO 1 ..........................................................................................4
O DIREITO DE FAMÍLIA NO BRASIL ..................................................4
1.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO DE FAMÍLIA.....................................4
1.1.1 A FAMÍLIA E O CULTO AOS ANTEPASSADOS .........................................4
1.1.2 A FAMÍLIA COM O ADVENTO DO CRISTIANISMO ....................................8
1.2 CONCEITO DE FAMÍLIA NO BRASIL ...........................................................10
1.3 A PERSONALIDADE JURÍDICA DA FAMÍLIA NO BRASIL .........................14
1.4 A FAMÍLIA NO BRASIL SEGUNDO O CODIGO CIVIL DE 1916. .................15
1.5 A FAMÍLIA NO BRASIL APÓS A CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988......18
1.6 A FAMÍLIA NO BRASIL SEGUNDO O CÓDIGO CIVIL DE 2002 ..................22
CAPÍTULO 2 ........................................................................................26
A ADOÇÃO NO BRASIL.....................................................................26
2.1 CONCEITO DE ADOÇÃO NO BRASIL..........................................................26
2.2 HISTÓRICO DA ADOÇÃO .............................................................................30
2.3 NATUREZA JURÍDICA DA ADOÇÃO NO BRASIL .......................................35
2.4 A ADOÇÃO E A LEGISLAÇÃO VIGENTE NO BRASIL: ESTATUTO DA
CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E CÓDIGO CIVIL ...........................................36
2.4.1 A ADOÇÃO SEGUNDO O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO
ADOLESCENTE NO BRASIL ..............................................................................37
2.4.2 A ADOÇÃO SEGUNDO O CÓDIGO CIVIL NO BRASIL.............................39
2.5 DOS REQUISITOS PARA A ADOÇÃO NO BRASIL .....................................40
2.5.1 DOS REQUISITOS DE ORDEM PESSOAL ................................................41
2.5.1.1 Dos Requisitos Pessoais Relativos aos Adotantes .............................41
2.5.1.2 Dos Requisitos Pessoais Relativos aos Adotados ..............................43
xv
2.5.2 DOS REQUISITOS DE ORDEM FORMAL..................................................45
2.6 OS EFEITOS PESSOAIS E PATRIMONIAIS DA ADOÇÃO NO BRASIL .....46
2.7 INEXISTÊNCIA, NULIDADE E ANULABILIDADE DA ADOÇÃO NO BRASIL
..............................................................................................................................49
2.8 REVOGAÇÃO DA ADOÇÃO NO BRASIL .....................................................52
CAPÍTULO 3 ........................................................................................54
A ADOÇÃO LEGAL NO BRASIL E A “ADOÇÃO À BRASILEIRA”.54
3.1 A ADOÇÃO LEGAL NO BRASIL E SUAS ESPÉCIES..................................54
3.1.1 ADOÇÃO UNILATERAL .............................................................................55
3.1.2 ADOÇÃO POR PARENTES ........................................................................56
3.1.3 ADOÇÃO POR COMPANHEIROS ..............................................................57
3.1.4 ADOÇÃO POST MORTEM..........................................................................59
3.1.5 ADOÇÃO POR DIVORCIADOS E JUDICIALMENTE SEPARADOS .........60
3.2 ADOÇÃO NO BRASIL: O PRINCÍPIO DA AFETIVIDADE E DO MELHOR
INTERESSE DO ADOTANDO..............................................................................61
3.3 OS PROCEDIMENTOS NECESSÁRIOS PARA A REALIZAÇÃO DE UMA
ADOÇÃO ..............................................................................................................66
3.3.1 O ESTÁGIO DE CONVIVÊNCIA E A ADOÇÃO LEGAL NO BRASIL ........70
3.3.2 A ADOÇÃO LEGAL E O REGISTRO DE NASCIMENTO DO ADOTADO 72
3.4 “ADOÇÃO À BRASILEIRA” ..........................................................................76
3.5 REVERSÃO DA “ADOÇÃO A BRASILEIRA” PARA ADOÇÃO LEGAL NO
BRASIL.................................................................................................................81
CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................84
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ............................................88
1
RESUMO
A presente monografia tem como objeto analisar adoção no
Brasil: análise da (im) possibilidade de reversão da “adoção à brasileira” para
adoção legal no Brasil. A pesquisa tratará do estudo da adoção legal, que é uma
modalidade de filiação artificial onde, cumpridos os requisitos necessários, torna
o adotado um filho legítimo, independentemente da relação consangüínea. O
desenvolvimento da investigação no primeiro capítulo trata do direito de família
no Brasil, dando enfoque especial à filiação. O segundo capítulo trata da adoção
no Brasil, embasado na legislação vigente, tanto o Estatuto da Criança e do
Adolescente como o Código Civil. O terceiro capítulo trata das hipóteses de
adoção legal e da “adoção à brasileira”. Assim, a
presente pesquisa visa
demonstrar que o melhor interesse da criança e a afetividade devem ser levados
em consideração quando praticada a adoção, ainda que ilegal. Investigar-se-á se
existe a possibilidade de reversão da “adoção à brasileira” para uma adoção legal
no Brasil, tendo como base uma análise legal e doutrinária.
1
INTRODUÇÃO
A presente Monografia tem como objeto tratar da adocao no
Brasil: análise da (im) possibilidade de reversão da “adoção à brasileira” para
adoção legal no Brasil.
Possui como objetivo institucional: produzir monografia para
obtenção do grau de bacharel em Direito, pela Universidade do Vale do Itajaí –
UNIVALI.
Possui como objetivo geral:
investigar a “adoção à
brasileira”, sua ocorrência, motivos e enquadramento legal no Brasil.
Possui como objetivo específico: 1)verificar se a “adoção à
brasileira” é admitida no Brasil, segundo a lei e a doutrina pátrias; 2)compilar as
hipóteses legais de adoção no Brasil; 3)estudar se a “adoção à brasileira” pode
ser revertida para adoção legal no Brasil.
Para tanto, no Capítulo 1, abordar-se-á o Direito de Família
no Brasil, tratar-se-á da família, sua evolução histórica, conceito, personalidade
jurídica e legislação, tanto passada como a atual, conforme obsta na Constituição
Federal e no Código Civil vigente. Este capítulo primeiro aborda e ressalta a
importância da filiação.
No Capítulo 2, discorrer-se-á sobre a Adoção no Brasil, seu
conceito, sua história, natureza jurídica, a legislação vigente, tanto o Estatuto da
Criança e do Adolescente, que trata da adoção para até os 18 anos, quanto o
Código Civil, que trata da adoção para os maiores de idade. Será demonstrado
neste capítulo os requisitos e efeitos da adoção.
Também serão demonstrados os casos de inexistência,
anulabilidade e nulidade da adoção. Além das hipóteses de revogação da adoção
no Brasil.
2
E, no Capítulo 3, tratar-se-á da Adoção Legal no Brasil e a
“Adoção à brasileira”, serão apresentadas as possibilidades legais de adoção no
Brasil, e também da referida adoção ilegal. Será demonstrada sua incidência e
enquadramento no âmbito penal , visto que a “adoção à brasileira” consiste no
registro de filho alheio como próprio, prática esta prevista no artigo 242 do Código
Penal.
Serão apresentadas
as
conseqüências
desta adoção
efetuada sem o devido amparo legal, serão demonstrados os princípios da
afetividade e do melhor interesse da criança como justificativas para a adoção
ilegal. Também será demonstrada a possibilidade de reversão da adoção à
brasileira para uma adoção legal.
Além de serem demonstrados os procedimentos relativos a
adoção, bem como relatar a importância do estágio de convivência e a forma
como deverá ser efetuado o registro de nascimento do adotado.
O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as
Considerações
Finais,
nas
quais
são
apresentados
pontos
conclusivos
destacados, seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões
sobre as questões que envolvem a “adoção à brasileira” e sua (im) possibilidade
de reversão para adoção legal no Brasil.
Para a presente monografia foram levantados os seguintes
problemas:
A “adoção à brasileira” é permitida no Brasil, segundo a lei e a
doutrina?
Quais as hipóteses legais de adoção no Brasil, segundo a doutrina
e a legislação vigente?
A adoção à brasileira pode se reverter em adoção legal no Brasil,
segundo a lei e a doutrina?
E foram levantadas as seguintes hipóteses:
3
A “adoção à brasileira”, não é permitida no Brasil, embora o uso
desta prática é comumente utilizada nas famílias brasileiras,
ainda que sem o devido amparo legal, nos termos do artigo 242
do Código Penal.
As hipóteses legais de adoção no Brasil, são aquelas que se
enquadram no Estatuto da Criança e do Adolescente, que trata
da adoção de crianças e adolescentes; e no Código Civil, que
trata da adoção dos maiores de dezoito anos.
A “adoção à brasileira” não pode se reverter em adoção legal no
Brasil, visto que não tem o devido amparo legal.
Alerta-se que a pesquisa não tem por objeto a análise do
tema na jurisprudência, entretanto, em caráter ilustrativo, algumas foram
transcritas do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, datadas de 2003 a 2005, a
fim de melhor exemplificar a questão.
Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase
de Investigação foi utilizado o Método Indutivo e o Relatório dos Resultados
expresso na presente Monografia é composto na base lógica Indutiva.
Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as
Técnicas, do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da Pesquisa
Bibliográfica.
1
CAPÍTULO 1
O DIREITO DE FAMÍLIA NO BRASIL
1.1 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DO DIREITO DE FA MÍLIA
1.1.1 A FAMÍLIA E O CULTO AOS ANTEPASSADO S
A seguir, far-se-á um relato acerca do histórico da família na
antigüidade. A idade antiga compreende o período histórico que data de 4.000
anos a.C. se estende até meados de 476 d.C.
Segundo Pontes de Miranda17, no direito romano, a palavra
família poderia resultar em significados diversos, como passa a expor:
A palavra Família, aplicada aos indivíduos empregava-se no
Direito Romano em acepções diversas. A palavra Família também
se usava em relação as coisas, para designar o conjunto de
patrimônio, ou a totalidade dos escravos pertencentes a um
senhor [...] em sentido especial, compreende o pai, a mãe e os
filhos; e tomada em um sentido geral compreende todos os
parentes. As vezes exprimia a reunião das pessoas colocadas sob
o poder pátrio ou a manus18 de um chefe único. A Família
compreendia, portanto, o pater famílias19, que era o chefe, os
filhos ou não, submetidos ao pátrio poder, e a mulher in manu,
que se considerava em condição análoga a de uma filha.
17
PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Tratado de Direito de Família. Atualizado por
Vilson Rodrigues Alves. Campinas: Bookseller, 2001. p. 57 e 58 .
18
Manus: é o “poder do paterfamilias sobre as pessoas e coisas dele dependentes, ou seja, o
conjunto familiar”. Conforme SIDOU, J. M. Othon. Dicionário Jurídico: Academia Brasileira de
Letras Jurídicas. p. 503.
19
Pater Familias: é o “homem não subordinado a sujeição familiar, independentemente de idade
ou estado civil. Na formação da família, o ascendente vivo mais remoto, que a dirigia como
sujeito único de direitos e obrigações. Conforme SIDOU, J. M. Othon. Dicionário Jurídico,
1997. p. 576.
5
A família romana se caracterizava por ser uma entidade
organizada hierarquicamente. A família estava sempre sob o comando de um
chefe. O integrante mais velho de determinado grupo era o líder, e somente era
substituído quando viesse a falecer,
estabelecendo, portanto, uma relação de
parentesco, sem haver, necessariamente, relação consangüínea.
No direito romano, em cada família havia uma espécie de
culto doméstico, onde o chefe da família era também o sacerdote. Cada casa
tinha seu próprio altar, em torno do qual a família se reunia a fim de entoar
cânticos religiosos e fazer orações, conforme nos esclarece Coulanges20:
Se nos transportarmos em imaginação até o dia-a-dia dessas
antigas gerações, encontraremos um altar em cada casa e, em
volta desse altar, a família reunida. A cada manhã, a Família ali se
reúne para dirigir ao fogo sagrado as suas primeiras preces, e
toda noite ali o invoca mais uma vez.
Desta forma, pode-se verificar que a religião era o elemento
fundamental para a constituição de determinada família, algo mais importante que
a relação consangüínea ou mesmo afetiva.
Para os romanos, o culto aos mortos era constante, visto
que fora da casa da família, mas em lugar próximo, existiam os túmulos dos
antepassados, aos quais, em determinados dias, os vivos se juntavam aos
mortos, a fim de cultuá-los e oferecerem-lhes oferendas, como alimentos e
bebidas. Em troca de tais ritos, a família invocava proteção21.
A família romana era, portanto, cercada de religiosidade,
sempre sob a autoridade do pater. Este poder era exercido sobre a mulher, sobre
os filhos, e também sobre os escravos.
20
COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. Trad. por Jean Melville. São Paulo: Martin Claret,
2004. p. 44.
21
COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. Trad. por Jean Melville. São Paulo: Martin Claret,
2004. p. 44.
6
As relações de afeto, todavia, não eram consideradas
relevantes, visto que a instituição familiar se fundamentava no poder paterno ou
no poder marital, como nos esclarece Venosa22:
Os membros da família antiga eram reunidos por vínculo mais
poderoso que o nascimento: a religião doméstica e o culto dos
antepassados. Esse culto era dirigido pelo pater. A mulher, ao se
casar, abandonava o culto do lar de seu pai e passava a cultuar
os deuses e antepassados do marido.
Pode-se, num sentido amplo, classificar a família romana
como um grupo de pessoas que habitavam na mesma casa e que cultuavam e
invocavam os mesmos antepassados.
Como tal culto deveria, obrigatoriamente, ser presidido por
um homem, justificando-se a adoção à época do Direito Romano, pois se a família
não tinha descendente homem, ou se este se emancipava ou renunciava aos
cultos, o filho adotado presidiria futuramente o culto, quando da falta de um filho
de sangue.
Pode-se afirmar que para os romanos, a religião foi o
fundamento da entidade familiar, independente do vínculo sangüíneo, como nos
esclarece Carletti23 :
A Família Romana compreende, portanto, todas as pessoas que
estão sujeitas ao mesmo chefe, independente do vínculo de
sangue. Segue dizendo que como a mulher não pode ser nunca
chefe de Família, os filhos procriados por uma filiafamilia24 casada
com um de outra família, pertence a esta e são juridicamente
estranhos a família de origem da mãe, quando o filho, que por sua
vez tenha filhos, é emancipado, os filhos permanecem sob o
22
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Direito de família. São Paulo: Atlas S.A. 2004. p. 18.
23
CARLETTI, Amilcare. Curso de Direito Romano. São Paulo: Universitária de Direito, 1999. p.
173.
24
Filia Família: é o “descendente feminino, em primeiro grau, do chefe da família, sob cujo poder
se encontra”. Conforme NUNES, Pedro . Dicionário de Tecnologia Jurídica p. 437.
7
poder do paterfamilias, salvo se forem expressamente
emancipados, ficando assim estranhos a seu genitor.
O regime matrimonial da família romana era a monogamia25,
sendo que esta união deveria ocorrer através do casamento, como menciona
Cretella Jr26:
Os romanos conheceram duas espécies de casamento; o
casamento cum manu27 e o sine manu28 (...), o primeiro é aquele
em que a mulher cai sob o poder do marido ou do paterfamilias do
marido. O segundo é aquele em que a mulher não cai sob o poder
do marido, continuando sob a manus do pater da família de que
provém.
É certo de que também existia o regime de concubinato,
porém, este não era reconhecido no início da era romana.
O casamento, todavia, deveria ser precedido de uma
cerimônia, e não apenas pelo ato de a mulher deixar a casa do pai e passar a
viver na casa do marido. Era necessário uma espécie de ritual para que o vinculo
conjugal pudesse ser caracterizado.
Ocorre que, após vários séculos vivendo sob a mesma
estrutura familiar, a família romana se depara com uma nova influência ideológica.
25
Monogamia: é a “união matrimonial legítima entre um só homem e uma só mulher. Estado de
pessoa que, em obediência ao regime legal, contrai um casamento válido, não podendo fazê-lo
novamente enquanto este subsistir. Forma de casamento adotada no Brasil”. Conforme
BENASSE, Paulo Roberto. Dicionário Jurídico. Campinas – SP: Bookseller, 2000. p. 230.
26
CRETELLA JÚNIOR, J. Curso de Direito Romano: o direito romano e o direito civil brasileiro.
revisada e aumentada. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p.118 e 119.
27
Casamento “Cum Manu”: é “a mais antiga das modalidades do matrimônio romano, em virtude
do qual a mulher transitava do vínculo familiar de nascimento para a família do marido, no todo
dependente do novo paterfamilias”. conforme SIDOU, J. M. Othon. Dicionário Jurídico. p.120.
28
Casamento “Sine Manu”: é a “modalidade do antigo matrimônio romano, pela qual a mulher
continuava vinculada à família de origem e ao seu paterfamilias. Coexistente com a modalidade
‘cum manu’, ainda na República suplantou-a, passando a prevalecer”. Conforme SIDOU, J. M.
Othon. Dicionário Jurídico. p. 121.
8
Nesta fase surge o cristianismo29, que é o conjunto das religiões cristãs, baseados
nos fundamentos, na pessoa e na vida de Jesus Cristo.
1.1.2 A FAMÍLIA COM O ADVENTO DO CRISTIAN ISMO
Com a chegada do Cristianismo, a família romana deixa de
lado a adoração pelos deuses familiares, visto que o cristianismo pregava a fé em
um único Deus, um ser superior, que deveria ser adorado e respeitado como
único.
O Cristianismo pregava também o respeito e o amor ao
próximo, como consta na Bíblia Sagrada, no livro de Mateus30:
Mestre, qual é o grande mandamento na Lei? Respondeu-lhe
Jesus: Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda
a tua alma e de todo o teu entendimento. Este é o grande e
primeiro mandamento. O segundo, semelhante a este é: amarás o
teu próximo como a ti mesmo. Destes dois mandamentos,
dependem toda a Lei e os Profetas.
Com o advento do Cristianismo,
mudou também a
constituição da família romana. Esta, que anteriormente era comandada pelo
pater, e tinha este como autoridade suprema, passou a adorar um único Deus,
poderoso e supremo, como menciona Coulanges31:
O divino foi situado fora e acima da natureza visível. Enquanto
anteriormente cada homem fizera o seu Deus, havendo tantos
deuses quantas as famílias e as cidades, Deus apresenta-se
agora como um ser único, infinito, universal, único gerador e
29
Cristianismo: é o “Conjunto de confissões religiosas baseadas nos ensinamentos de Cristo”.
Conforme DINIZ, Maria Helena. Dicionário jurídico. São Paulo: Saraiva, 1998. p. 956.
30
BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada. 2 ed. traduzido por João Ferreira de Almeida. Barueri, São
Paulo: Sociedade Bíblica do Brasil, 2001. Mateus, Capítulo 22, versículos 36 a 40. p. 22.
31
COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. p. 413.
9
esteio vital para os mundos, preenchendo sozinho a necessidade
de adoração inata do homem.
Pode-se observar, portanto que houve uma grande mudança
na instituição familiar romana. O pater, que anteriormente possuía autoridade
absoluta, perde sua total superioridade.
O Cristianismo, fundador da denominada Igreja Católica,
trouxe consigo diversas mudanças. Alterou a forma de culto da família romana,
pois não pertencia somente a uma determinada família, mas chamou toda a
humanidade.
Os cultos não eram mais secretos. Os cultos, orações e
ensinamentos religiosos eram ofertados a todos os povos, e não somente a um
grupo fechado, não existindo desta forma a exclusão, visto que anteriormente os
cultos eram realizados dentro das casas, somente com os membros daquela
determinada família32.
Desta feita, a antiga constituição familiar foi totalmente
extinta, conforme demonstra Coulanges33:
O pai perdeu a autoridade absoluta que outrora seu sacerdócio
lhe conferira, conservando apenas a autoridade outorgada pela
própria natureza ao pai para a criação do filho. A mulher, que o
antigo culto colocara em posição inferior ao marido, tornou-se
moralmente sua igual.
O advento do Cristianismo trouxe, todavia, alterações em
relação às uniões realizadas sem nenhuma formalidade, conforme menciona
Venosa34:
O Cristianismo condenou as uniões livres e instituiu o casamento
como sacramento, pondo em relevo a comunhão espiritual entre
32
COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. p. 415.
33
COULANGES, Fustel de. A Cidade Antiga. p. 418.
34
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Direito de família. p. 19.
10
os nubentes, cercando-a de solenidades perante a autoridade
religiosa.
Pode-se verificar, portanto, que o Cristianismo teve grande
influência na nova constituição da família romana. Esta passou a não ter mais a
religião doméstica, cultuando agora um só Deus, supremo e superior. Da mesma
forma instituiu o casamento religioso como fundamental para uma união familiar.
A crença familiar desapareceu, estabelecendo-se uma nova crença, a crença em
um único Deus.
Ainda hoje o Cristianismo é seguido, embora possua várias
crenças e denominações, o Cristianismo é presente no sentido de que adoramos
a um único Deus.
1.2 CONCEITO DE FAMÍLIA NO BRASIL
O vocábulo família, célula mater social, não tem acepção
única, sofreu mutações no curso da história em razão da evolução da sociedade
no curso do tempo.
Gomes35, acerca do sentido em que se emprega o vocábulo
família diz:
Em acepção lata, compreende todas as pessoas descendentes de
ancestral comum, unidas pêlos laços do parentesco, as quais se
ajuntam os afins. Neste sentido, abrange, além dos cônjuges e da
prole, os parentes colaterais até certo grau, como tio, sobrinho,
primo, e os parentes por afinidade, sogro, genro, nora cunhado.
Stricto sensu36, limita-se aos cônjuges e seus descendentes,
englobando, também, os cônjuges dos filhos. Designa a palavra
Família mais estritamente ainda o grupo composto pelos cônjuges
e filhos menores.
35
GOMES, Orlando. Direito de Família. 14. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002. p. 33.
36
Sticto Sensu: é o “BENASSE, sentido estrito”. Conforme Paulo Roberto. Dicionário Jurídico. p.
441.
11
Seguindo a mesma corrente, extrai-se o pensamento de
Rodrigues37:
O vocábulo Família é usado em vários sentidos. Num conceito
mais amplo, poder-se-ia definir a Família como formada por todas
aquelas pessoas ligadas por vínculo de sangue, ou seja, todas
aquelas pessoas provindas de um tronco ancestral comum, o que
corresponde a incluir dentro da órbita da Família todos os
parentes consangüíneos. Numa acepção um pouco mais limitada,
poder-se-ia compreender a Família como abrangendo os
consangüíneos em linha reta e os colaterais sucessíveis, isto é, os
colaterais até quarto grau. Num sentido ainda mais restrito,
constitui a Família o conjunto de pessoas compreendido pêlos
pais e sua prole.
Murdock38 conceitua a família como sendo: “um grupo social
caracterizado pela residência comum, com cooperação econômica e reprodução”
O Código Civil39 de 2002 não define claramente a palavra
família, visto que tal vocábulo pode aceitar acepções diversas, porém, de forma
geral, Guareschi40 a analisa da seguinte maneira: “A família é a primeira
instituição com que uma pessoa entra em contato em sua vida. E ela a
acompanha, duma maneira ou outra, até sua morte. Direta ou indiretamente, ela
está sempre presente”.
Por conseguinte, Kaloustian41 a define da seguinte maneira:
“A família é o espaço indispensável para a garantia da sobrevivência de
desenvolvimento e da proteção integral dos filhos e demais membros,
independentemente do arranjo familiar ou da forma como vêm se estruturando”.
37
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito de Família. 27. ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p.4.
38
MURDOCK, apud LAKATOS, Eva Maria. Sociologia Geral. 5 ed. São Paulo: Atlas, 1985.
p.185.
39
BRASIL. Lei nº10.406, de 10.01.2002, Código Civil, atual. pela Lei nº10.825, de 22.12.2003. 10
ed. São Paulo: Saraiva, 2004.
40
GUARESCHI, Pedrinho Alcides. Sociologia Crítica: Alternativas de mudança. 8 ed. Porto
Alegre: Mundo Jovem, 1986. p.79.
41
KALOUSTIAN, Silvio Manoug (organizador). Família brasileira, a base de tudo. 2 ed. São
Paulo: Cortez; Brasília, DF: UNICEF, 1994. p. 11 e 12.
12
No que tange a diversidade de significados do vocábulo
família, Zamberlam42 menciona o seguinte:
Família não abarca um único significado. Evidencia-se, inclusive,
que a família não é uma expressão passível de conceituação, mas
tão somente de descrições; ou seja, é possível descrever as
várias estruturas ou modalidades assumidas pela família através
dos tempos, mas não defini-la ou encontrar algum elemento
comum a todas as formas com que se apresenta este
agrupamento humano.
Desta forma, deve-se considerar a família dentro de um
conceito amplo, ou seja, família é o conjunto de pessoas unidas por um vinculo
jurídico de natureza familiar.
Venosa43, menciona que “como regra geral, porém, o Direito
Civil moderno apresenta uma definição mais restrita, considerando membros da
família as pessoas unidas por relação conjugal ou de parentesco”.
Neste sentido, pode-se afirmar que as diversas espécies de
família se apresentam diferentemente devido sua estrutura, conforme menciona
Lakatos44:
Se, originariamente, a família foi um fenômeno biológico de
conservação e produção, transformou-se depois em fenômeno
social. Sofreu considerável evolução até regulamentar suas bases
conjugais conforme as leis contratuais, normas religiosas e
morais. Toda sociedade humana tem regras que abrangem as
relações sexuais e a procriação de filhos, situando a criança em
determinado grupo de descendência. Todavia, essas regras não
são as mesmas em toda parte.
Desse modo, deve-se considerar o vocábulo família em um
conceito amplo, levando-se em consideração as diversas espécies de família.
42
ZAMBERLAM, Cristina de Oliveira. Os novos paradigmas da família contemporânea: uma
perspectiva interdisciplinar. Rio de Janeiro: Renovar, 2001. p.107.
43
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Direito de família. p. 17.
13
Monteiro45 relata esta diversidade da seguinte forma:
O direito positivo conhece quatro espécies de grupos familiares: a)
a família legitima, criada pelo casamento, e inteiramente
disciplinada pelo legislador; b) a entidade familiar, decorrente da
união estável entre homem e mulher, em que nenhuma das partes
tenha vínculo matrimonial; c) a família natural, ou comunidade
familiar, formada por ambos os genitores, ou apenas um deles, e
seus descendentes; d) a família substitutiva, na qual a criança é
colocada, na falta ou em lugar daquela em que nasceu, para
receber melhores condições de vida, e na qual passa a
desempenhar integralmente o papel de filho.
Pode-se afirmar que atualmente, na legislação brasileira,
não há mais a restrição que anteriormente considerava apenas o instituto do
casamento como família, tampouco existe qualquer espécie de ato discriminatório
em relação à filiação. Neste sentido, menciona Zamberlam46:
A nova definição constitucional de família, tornando-a mais
inclusiva e com menor número de preconceitos; a igualdade de
direitos e deveres entre homens e mulheres na sociedade
conjugal; (...) assim como a afirmação do direito das crianças e
adolescentes à convivência familiar e comunitária, o
reconhecimento da igualdade de direitos aos filhos havidos ou não
da relação do casamento ou por adoção, ficando proibidas as
designações discriminatórias relativas à filiação, são as conquistas
que mudaram a face da questão familiar na Constituição.
Atualmente, resta configurado que é considerada como
família tanto aquela oriunda do casamento, como também a família que se origina
a partir da união estável e aquela que se estabelece pela adoção.
44
LAKATOS, Eva Maria. Sociologia Geral. 5 ed. São Paulo: Atlas, 1985. p.185.
45
MONTEIRO, Washington de Barros. Direito
Saraiva. 2001, p. 9.
46
ZAMBERLAM, Cristina de Oliveira. Os novos paradigmas da família contemporânea: uma
perspectiva interdisciplinar. p.122.
Civil: Direito de Família. 36 ed. São Paulo:
14
1.3 A PERSONALIDADE JURÍDICA DA FAMÍLIA NO BRASIL
Anteriormente defendia-se fortemente a idéia de que a
família se enquadrava no conceito de pessoa jurídica. Tal entendimento partia do
pressuposto de que a família não seria apenas um grupo social, mas
personificado47.
Essa personalidade jurídica48 era conferida a família, em
razão de a mesma ser detentora de direitos, tanto patrimoniais, como a
propriedade de bem de família, e também de direitos extra-patrimoniais, como o
nome.
Porém, Venosa49 explica que: “Essa posição foi prontamente
superada pela imprecisão do conceito”.
Sobre a matéria traz-se a lume a lição do referido autor:
Em nosso direito e na tradição ocidental, a Família não é
considerada uma pessoa jurídica, pois lhe falta evidentemente
aptidão e capacidade para usufruir direitos e contrair obrigações.
Os pretensos direitos imateriais a ela ligados, o nome, o poder
familiar, a defesa da memória dos mortos, nada mais são do que
direitos subjetivos de cada membro da Família. Com maior razão,
da mesma forma se posicionam os direitos de natureza
patrimonial. A Família nunca é titular de direitos. Os titulares serão
sempre seus membros individualmente considerados.
Todavia, a doutrina, de forma distinta, encontra adeptos nas
duas fontes. Tanto naquelas que acreditam ser a família dotada de personalidade
jurídica, como aquelas que crêem no contrário.
47
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. p. 21 e 22.
48
Personalidade Jurídica: é a “condição do ente em face do ordenamento jurídico, como titular de
direitos e sujeito a deveres por ele impostos”. conforme SIDOU, J. M. Othon. Dicionário
Jurídico. p. 592.
49
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. p. 21 e 22.
15
Nas palavras de Venosa50: “A doutrina majoritária, longe de
ser homogênea, conceitua família como instituição. Embora essa conclusão seja
repetida por muitos juristas, trata-se de conceito por demais vago e impreciso”.
Neste sentido, Gomes51 diz o seguinte: ”Para que um grupo
tenha personalidade, é preciso que possua existência distinta, não só daquela de
cada um dos indivíduos que o compõem, mas, também, da sua totalidade ou de
sua soma”.
Desta forma, a união de indivíduos não basta para que este
grupo tenha condições de ser classificada como pessoa jurídica.
Ainda em consonância com Gomes52:
Para que se personalize, é preciso que o vínculo constitutivo do
grupo seja não um laço qualquer acarretando solidariedade ou
comunidade, mas um vínculo de associação no sentido próprio do
termo, vale dizer, é preciso que os indivíduos estejam agrupados,
por sua vontade, ou pela vontade da lei, em vista de persecução,
em comum, de certo fim, que há de ser a realização de uma obra
a qual consagrem parte de suas forças.
Por último, cumpre ressaltar que a família não se enquadra
no conceito de pessoa jurídica, pois as atividades que realiza, sendo essas de
natureza patrimonial ou não, podem e são realizadas sem esta prerrogativa.
1.4 A FAMÍLIA NO BRASIL SEGUNDO O CODIG O CIVIL DE 1916.
O Código Civil53 de 1916, ficou vigente por mais de 80 anos.
No momento em que entrou em vigor, já foi considerado inadequado à realidade
50
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. p. 22.
51
GOMES, Orlando. Direito de Família. p. 37.
52
GOMES, Orlando. Direito de Família. p. 37.
53
BRASIL. Lei nº3.071, de 01.01.1916, Código Civil, publicada no Diário Oficial da União – DOU,
de 01.01.1916, revogado pela Lei n.º 10.406, de 10.01.2002.
16
social, visto que o referido código não manifestou posição quanto as inovações
sociais da época.
Venosa54 esclarece tal situação da seguinte maneira:
Como observamos, o Código Civil de 1916 de há muito já não
retratava o panorama atual da família, derrogado em grande parte
por inúmeras leis complementares, que dificultavam sobremaneira
o estudo sistemático da matéria.
O referido autor ainda menciona que o Código Civil de 1916
ignorava o direito dos filhos havidos fora do casamento:
O Código Civil de 1916 centrava suas normas e dava
proeminência à família legítima, isto é, aquela derivada do
casamento, de justas núpcias. Elaborado em época histórica de
valores essencialmente patriarcais e individualistas, o legislador
do início do século passado marginalizou a família não provinda
do casamento e simplesmente ignorou direitos dos filhos que
proviessem de relações não matrimoniais, fechando os olhos a
uma situação social que sempre existiu.
Pode-se afirmar que, especificamente sobre a família, tal
obra ignorou suas transformações e não amparou normativamente este segmento
Ainda em vigor o Código Civil datado de 1916, Viana55 diz o
seguinte “Se tomarmos os conceitos adotados pala Lei Maior e fizermos uma
comparação com o pensamento presente no diploma civil será fácil perceber que
há um descompasso entre ele e a realidade social”.
O Livro I da parte especial do referido código, faz alusão ao
Direito de Família e se subdivide em três títulos. O primeiro trata do casamento, o
segundo dos efeitos jurídicos do casamento, e o terceiro do regime de bens entre
os cônjuges.
54
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. p. 31 .
55
VIANA, Marco Aurélio S. Direito de Família. 2 ed. Belo Horizonte: Del Rey, 1998, p. 37.
17
Destarte pode-se afirmar que o Código Civil de 1916 só
classificava a família como aquela que fosse oriunda do casamento. Nesse
sentido, Diniz56 diz o seguinte:
Há relações familiares fora do matrimonio que podem ser
pessoais, patrimoniais e assistenciais, que foram ignoradas pelo
nosso Código Civil de 1916, que apenas indiretamente as
regulava (art. 248, IV, 1.177 e 1.719, III) com o escopo de
fortalecer a família legítima.
Pode-se
verificar,
portanto,
que
o
referido
Código
encontrava-se desatualizado, pois trazia estabelecido nele regras restritas, que
não permitiam ao intérprete fazer uso destas na atualidade.
Nesse sentido, Monteiro57 diz o seguinte:
O Código Civil não retrata mais o panorama atual da Família, por
ele disciplinada à luz de princípios que não mais vigoram; as
alterações introduzidas por leis especiais,
revogando
explicitamente o texto anterior, ou com ele incompatíveis, fazem
com que o jurista se depare com um emaranhado de leis nem
sempre precisas, desprovidas de um princípio inspirador único, de
modo a tornar praticamente impossível um tratamento sistemático
da matéria.
É certo que o legislador dava maior importância a família
oriunda do casamento, a chamada família legítima, e pouco mencionava a família
denominada ilegítima, aquela que derivava do concubinato, como explica
Rodrigues58 “Com efeito, poucas eram as disposições que se referiam a família
surgida a margem do casamento, sendo que os mais importantes concerniam a
possibilidade de reconhecimento do filho natural”.
O Código Civil de 1916 também se manifestava contrário a
dissolução do casamento. Foram necessários décadas de debates e discussões
56
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. p. 5.
57
MONTEIRO, Washington de Barros. Direito Civil: Direito de Família. p.10.
58
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito de Família. p.8.
18
sobre o tema para que, finalmente, em 1977, fosse instituída no Brasil a Lei n.º
6.515, denominada Lei do Divórcio59.
Com o advento da Constituição da República Federativa do
60
Brasil , de 1988, a família ganhou nova forma, e as espécies de família que não
derivam do casamento foram melhor amparadas.
A Sociedade atual sofreu inúmeras transformações em seu
meio, fazia-se, portanto, necessário que o legislador atribuísse nova posição em
relação aos novos acontecimentos sociais. Tem-se aí a promulgação da
Constituição da República Federativa do Brasil61, em 1988.
1.5 A FAMÍLIA NO BRASIL APÓS A CONSTITUI ÇÃO FEDERAL DE 1988.
A Constituição Federal, promulgada em 5 de outubro de
1988, inseriu um capítulo voltado para a família. Trata-se do Capítulo VII , sob a
título: Da Família, da Criança, do Adolescente e do Idoso, sendo que os artigos
que tratam da família são o 226 até o 230.
Definiu a mesma como sendo o fundamento da sociedade.
Garantiu-lhe proteção do Estado, independente da forma que se originou a
entidade familiar.
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 22662,
preceitua a referida proteção, visto que o caput menciona que a família, base da
sociedade, e em todas as suas formas, tem especial proteção do Estado.
59
BRASIL. Lei n. 6.515, de 26 de dezembro de 1977 – Regula os casos de dissolução da
sociedade conjugal e do casamento, seus efeitos e respectivos processos, e dá outras
providências.
60
BRASIL, Constituição da República Federativa. Promulgada em 5 de outubro de 1988. São
Paulo: Saraiva, 2003.
61
A partir deste momento tratar-se-á da Constituição da República Federativa do Brasil, como
Constituição Federal .
62
Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. § 1º. O casamento é
civil e gratuita sua celebração; § 2º. O casamento religioso tem efeito civil, nos termos da lei; §
3º; Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher
19
Acerca da referida proteção, Venosa63 menciona:
O direito de família disciplina a relação básica entre os cônjuges,
se casados, ou entre companheiros, na ausência de núpcias. A
sociedade conjugal tem proteção do estado com ou sem
casamento, nos termos da nossa Constituição de 1988.
Da mesma forma, e no sentido de proteger a instituição
familiar, dispõe o art. 227, caput da Constituição Federal:
Art. 227. É dever da Família, da sociedade, e do Estado
assegurar a criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o
direito a vida, a saúde, a alimentação, a educação, ao lazer, a
profissionalização, a cultura, a dignidade, ao respeito, a liberdade,
e a convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo
de toda forma de negligencia, discriminação, exploração,
violência, crueldade e opressão.
Desta forma, é possível verificar que uma das intenções do
legislador, quando da promulgação da Constituição Federal, foi a de elevar a
união estável à condição de entidade familiar.
A concepção de que a família era tão somente aquela que
advinha do casamento mudou com o advento da Constituição Federal . A união
estável, que até então não era reconhecida como família, ganhou reconhecimento
jurídico e amparo constitucional, gerando assim uma nova espécie de família.
Rodrigues64 aborda esta questão da seguinte forma:
como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento; § 4º. Entende-se,
também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus
descendentes; § 5º. Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos
igualmente pelo homem e pela mulher; § 6º. O casamento civil poderá ser dissolvido pelo
divórcio, após prévia separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei, ou
comprovada separação de fato por mais de dois anos; § 7º. Fundado nos princípios da
dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre
decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o
exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou
privadas; § 8º. O Estado assegurará a assistência à família na pessoa de cada um dos que a
integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas relações.
63
VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. p. 28 .
20
O fim da discriminação contra a família assim formada ocorreu,
em princípio, com a Constituição de 1988, cujo artigo 226, § 3º,
proclama que a união estável, entre o homem e a mulher,
representa uma entidade familiar, que está sob a proteção do
Estado, independentemente de matrimônio. Adiante, no § 4º do
mesmo dispositivo constitucional, atribui-se igualmente a
qualidade de entidade familiar à comunidade constituída por um
dos pais e seus descendentes.
Ocorre que, apesar da Constituição Federal mencionar tais
direitos, ocorreram dúvidas quanto a caracterização da união estável. Por este
motivo, buscou o legislador uma maneira de preencher tais lacunas.
Desta forma, foi criada a Lei 8.97165 de 29 de dezembro de
1994, a fim de regular o direito dos companheiros a alimentos e a sucessão.
Porém tal lei não conceituou claramente o instituto, para o
qual o legislador criou nova lei. A lei 9.27866, de 10 de maio de 1996 regulou o
parágrafo 3º da Constituição Federal, conceituando especificamente a união
estável como entidade familiar, e delegou-lhe direitos e deveres.
Também excluiu o disposto no artigo 1º da Lei 8.971, que
exigia o tempo mínimo de cinco anos de relacionamento, ou constituição de prole,
para que a companheira pudesse pleitear seus direitos.
Em relação à filiação, a Constituição Federal trouxe algumas
mudanças, conforme menciona Zamberlam67:
A nova definição constitucional de família, tornando-a mais
inclusiva e com menor número de preconceitos; a igualdade de
direitos e deveres entre homens e mulheres na sociedade
conjugal; a consagração do divórcio; a afirmação do planejamento
64
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito de Família. p.11.
65
BRASIL. Lei nº. 8.971, de 29 de dezembro de 1994 – Regula o direito dos companheiros a
alimentos e à sucessão.
66
BRASIL. Lei nº. 9.278, de 10 de maio de 1996 – Regula o § 3º do art. 226 da Constituição
Federal.
67
ZAMBERLAM, Cristina de Oliveira. Os novos paradigmas da família contemporânea: uma
perspectiva interdisciplinar. p.122.
21
familiar como livre decisão do casal e a previsão da criação de
mecanismos para coibir a violência no interior da família, assim
como a afirmação do direito das crianças e adolescentes à
convivência familiar e comunitária, o reconhecimento da igualdade
de direitos do filhos havidos ou não da relação do casamento ou
por adoção, ficando proibidas as designações discriminatórias
relativas à filiação, são as conquistas que mudaram a face da
questão familiar na constituição.
Grande foi a alteração trazida pelo advento da Constituição
Federal, conforme menciona Leite68: “a proposta constitucional, rechaçando o
tratamento discricionário entre filhos legítimos e ilegítimos, valoriza corajosamente
o elemento afetivo e sociológico da filiação”.
Outro ponto importante a ser destacado trata da família
monoparental69, onde o(s) filho(s) vivem sob o pátrio poder apenas do pai ou da
mãe.
Neste sentido, Leite70 comenta:
Qualquer que seja a postura adotada pela doutrina, relativamente
à previsão constitucional, ficou suficientemente claro que o
surgimento da noção de entidade familiar ao lado da família
tradicional, ou da família monoparental, abandona o vocabulário
moralizador que qualificava situações relativamente atípicas para
reconhecer, sem vacilações, a existência de um fenômeno social,
uma nova forma familiar com a qual será necessário, bom ou mal
grado, conviver e legislar daqui para o futuro.
Como podemos verificar, o advento da Constituição Federal
estabeleceu um marco importante na caracterização da família, visto que incluiu
proteção em vários aspectos que o Código Civil de 1916 ignorava.
68
LEITE, Eduardo de Oliveira. Famílias Monoparentais: A situação jurídica de pais e mães
separados e dos filhos na ruptura da vida conjugal. 2 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
1997. p. 07.
69
Família Monoparental: é aquela onde “os filhos se encontram, necessariamente, vinculados só
ao pai ou só a mãe”. Conforme LEITE, Eduardo de Oliveira. Famílias Monoparentais: A
situação jurídica de pais e mães separados e dos filhos na ruptura da vida conjugal. p. 08.
22
1.6 A FAMÍLIA NO BRASIL SEGUNDO O CÓDIG O CIVIL DE 2002
A família brasileira, nas últimas décadas, sofreu grandes
transformações, tanto na sua função, como composição e concepção. No passar
do tempo, perdeu as características da família tradicional, patriarcal, conforme
menciona Pereira71:
Na sociedade moderna, contudo, repousa a família não mais no
princípio natural da consangüinidade, onde ressalta o interesse
individual dos membros da família, e onde já se observa a correta
simetrização entre os direitos do homem e da mulher. Assim,
enquanto na família primitiva importante era o interesse coletivo
do grupo familiar, na moderna sobreleva o interesse individual de
cada um de seus membros.
O legislador, em consonância a estas mudanças, visou
ampliar o âmbito dos interesses das famílias, que deveriam ser protegidos pelo
estado.
Tem-se aí o advento do Código Civil de 2002, que destinou
seu Livro IV da parte especial para o Direito de Família, a fim de melhor
estabelecer e conceituar as relações familiares.
O referido Livro, de acordo com Gonçalves72, “divide-se em
quatro partes: direito pessoal, direito patrimonial, união estável tutela e curatela”.
A primeira parte, o Título I, trata do Direito Pessoal, que de
acordo com Sidou73, entende-se ser uma “denominação aplicada ao ramo do
Direito das Obrigações (...), em opositivo aos Direitos Reais”.
70
LEITE, Eduardo de Oliveira. Famílias Monoparentais: A situação jurídica de pais e mães
separados e dos filhos na ruptura da vida conjugal. p. 19.
71
PEREIRA, Áurea Pimentel. A nova Constituição e o Direito de Família. Rio de Janeiro:
Renovar, 1999. p. 25.
72
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de Família. 8 ed. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 01.
73
SIDOU, J. M. Othon. Dicionário Jurídico: Academia Brasileira de Letras Jurídicas. p. 278.
23
Em consonância com o Código Civil, o Direito Pessoal
engloba o casamento e as relações de parentesco.
Quanto a Segunda parte, o Título II, o mesmo trata do
Direito Patrimonial, conceituados por Diniz74 da seguinte maneira: “Aquele que
tem por objeto bens suscetíveis de avaliação econômica, sendo, em regra,
transmissível ou transferível”.
De acordo com o Código Civil, o Direito Patrimonial engloba
o regime de bens entre os cônjuges, o usufruto e administração dos bens de filhos
menores, os alimentos e trata também do bem de família.
No que tange a terceira parte, o Título III do mencionado
livro trata da união estável, conceituada por Sidou75 da seguinte forma: “vida
prolongada de um homem e uma mulher sob o mesmo teto, com a aparência de
sociedade conjugal”.
A união estável encontra respaldo jurídico tanto na
Constituição Federal, em seu artigo 226, §3º, como no Código Civil, em seu artigo
1.723.
Por último o Título IV do referido Livro, que trata da Tutela e
da Curatela.
A Tutela, de acordo com Gonçalves76, pode ser entendida da
seguinte maneira: “Tutela é o encargo conferido por lei a uma pessoa capaz, para
cuidar da pessoa do menor e administrar seus bens. Destina-se a suprir a falta do
poder familiar e tem nítido caráter assistencial”.
O artigo 1.728 do Código Civil menciona os casos em que os
filhos menores serão postos em Tutela. diz o referido artigo: “Os filhos menores
são postos em Tutela: I – com o falecimento dos pais, ou sendo estes julgados
ausentes; II – em caso de os pais decaírem do poder familiar”.
74
DINIZ, Maria Helena. Dicionário jurídico. São Paulo. p. 171.
75
SIDOU, J. M. Othon. Dicionário Jurídico: Academia Brasileira de Letras Jurídicas. p. 809.
24
Já a Curatela, segundo Gonçalves77, “é encargo deferido por
lei a alguém capaz para reger a pessoa e administrar os bens de quem não pode
fazê-la por si mesmo”.
O artigo 1.767 relata os interditos, ou seja, aqueles sujeitos à
curatela.
Diz o mencionado artigo:
Art. 1.767. Estão sujeitos à Curatela: I – aqueles que, por
enfermidade ou deficiência mental, não tiveram o necessário
discernimento para os atos da vida civil; II – aqueles que, por
outra causa duradoura, não puderam exprimir a sua vontade; III –
os deficientes mentais, os ébrios habituais e os viciados em
tóxicos; IV – os excepcionais sem completo desenvolvimento
mental; V – os pródigos.
O Código Civil de 2002 buscou atualizar, muitas vezes em
concordância com a Constituição Federal de 1988, o que o Código Civil de 1916
havia ignorado, ou aquilo que já estava ultrapassado.
Segundo Diniz78, na atualidade, o Direito de Família deve
basear-se sobretudo no afeto, como passa a expor:
O fundamento básico do casamento, da vida conjugal e do
companheirismo é a afeição entre os cônjuges ou conviventes e a
necessidade de que perdure completa comunhão de vida, sendo a
ruptura da união estável, separação judicial e o divórcio, uma
decorrência da extinção da afectio, uma vez que a comunhão
espiritual e material de vida entre marido e mulher ou entre
conviventes não pode ser mantida ou reconstituída.
76
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de Família. p. 160.
77
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de Família. p. 167.
78
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. p. 17 e 18.
25
É certo que o Código Civil de 2002 reafirmou o que já fora
previsto anteriormente na Constituição Federal de 1988, reconhecendo como
entidade familiar não somente aquela oriunda do casamento, mas também a que
provém da união estável.
Diz o artigo 1511 do Código Civil: ”O casamento estabelece
comunhão plena de vida, com base na igualdade de direitos e deveres dos
cônjuges.
Diz o artigo 1723 do Código Civil: ”É reconhecida como
entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na
convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de
constituição de família”.
É possível verificar que o Código Civil de 2002 pôs fim a
discriminação acerca da união estável contida no Código Civil de 1916
e, a
princípio, buscou uma forma de melhor regulamentar a família brasileira, com o
intuito de melhor protegê-la.
Desta feita, relatada a importância da filiação no âmbito
familiar, passar-se-á a estudar agora a adoção, que é espécie de filiação afetiva e
não consanguínea.
26
CAPÍTULO 2
A ADOÇÃO NO BRASIL
2.1 CONCEITO DE ADOÇÃO NO BRASIL
A criança depende do acompanhamento de pessoas em
quem confie, a fim de que possa ter seu desenvolvimento social e psicológico
saudáveis.
Sznick79 relata tal situação: “Já está mais do que
comprovado que a criança não só tem o direito mas é exatamente dentro do
ambiente familiar onde ela melhor encontra condições de crescimento e
desenvolvimento”.
Entretanto, muitas crianças perderam seus pais naturais, ou
os têm, mas foram abandonadas ou são agredidas pelos mesmos, devendo ser
afastadas destes para seu próprio bem.
Para suprir a necessidade da criança que não dispõe dos
seus genitores, estas serão incluídas em outro âmbito familiar. Desta forma, será
lhes dado novo(s) pai(s). Têm-se aí a adoção.
O
modernamente
82
instituto80
da
Adoção,
segundo
Boscaro81,
“é
concebida como um instituto voltado a dar um lar a alguém que
79
SZNICK, Valdir. Adoção: Direito de família, guarda de menores, tutela, pátrio poder, adoção
internacional. São Paulo: LEUD. p. 273.
80
Instituto: é o “fenômeno jurídico disciplinado por princípios e normas, cujo conceito guarda
univocidade na linguagem jurídica”. Conforme MELO, Osvaldo Ferreira de. Dicionário de
política jurídica. Florianópolis: OAB – SC Ed., 2000. p. 50.
81
BOSCARO, Márcio Antônio. Direito de Filiação. 3 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais
LTDA, 2002. p. 86 .
82
A palavra Modernamente, no caso em tela, não trata da Idade Moderna, mas sim da Idade
Contemporânea.
27
não o possui, porque abandonado pelos pais naturais, ou em virtude do óbito dos
mesmos”.
Diniz 83 menciona o seguinte:
A adoção vem a ser o ato jurídico solene pelo qual, observados os
requisitos legais, alguém estabelece, independentemente de
qualquer relação de parentesco consangüíneo ou afim, um vínculo
fictício de filiação, trazendo para sua família, na condição de filho,
pessoa que, geralmente lhe é estranha. Dá origem, portanto, a
uma relação jurídica de parentesco civil entre adotando e adotado.
É uma ficção legal que possibilita que se constitua entre adotante
e adotado um laço de parentesco de 1º grau na linha reta.
Venosa84 acrescenta que:
A adoção é modalidade artificial de filiação que busca imitar a
filiação natural. Daí ser também conhecida como filiação civil, pois
não resulta de uma relação biológica, mas de manifestação de
vontade, conforme o sistema do código civil de 1916, ou de
sentença judicial, no atual sistema do Estatuto da Criança e do
Adolescente (Lei 8.069/90), bem como no corrente código. A
filiação natural repousa sobre o vínculo de sangue, genético ou
biológico; a adoção é uma filiação exclusivamente jurídica, que se
sustenta sobre a pressuposição de uma relação não biológica,
mas afetiva.
Pode-se verificar, portanto, que no instituto da adoção, o que
realmente importa não são os laços sangüíneos, mas os laços criados no dia a
dia, que contribuem para a formação física e psicológica saudável do menor.
Verifica-se, juridicamente, que não há diferença entre os
filhos biológicos e os filhos adotivos. Ambos são portadores de direitos e deveres,
83
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. p. 360.
84
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de família. p.327.
28
visto que a adoção, segundo Wald85 “dá ao filho adotivo status86 idêntico ao do
filho legítimo”.
Ressalta-se que, a partir do ano de 1988, deixou-se de
identificar o filho biológico como filho legítimo e o filho adotivo como ilegítimo. A
Constituição Federal preceitua a referida proteção:
Art. 227. È dever da família, da sociedade, e do Estado assegurar
à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à
vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à
profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade
e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo
de toda a forma de negligência, discriminação, exploração,
violência, crueldade e opressão. (...)
§ 6º Os filhos, havidos ou não da relação do casamento, ou por
adoção, terão os mesmos direitos e qualificações, proibidas
quaisquer designações discriminatórias relativas à filiação.
Da mesma forma, o artigo 1.626 do Código Civil acentua o
direito a igualdade entre os filhos biológicos e os filhos havidos por adoção, se
não vejamos: “A adoção atribui a situação de filho ao adotado, desligando-o de
qualquer vínculo com os pais e parentes consangüíneos, salvo quanto aos
impedimentos para o casamento”.
Verifica-se, portanto, que após a efetivação do instituto da
adoção, são criados laços de parentesco entre adotado e adotante, conforme
menciona Trindade87:
85
WALD, Arnoldo. O Novo Direito de Família. 13 ed. rev. Atual. e ampl. São Paulo: Saraiva,
2000. p.197.
86
Status: palavra definida como “situação, estado ou condição de alguém ou algo, perante a
opinião das pessoas ou em função do grupo ou categoria em que é classificado, e que pode lhe
conferir direitos, privilégios, obrigações, limitações, etc.”.
87
TRINDADE, Jorge. Direito da Criança e do Adolescente: Uma abordagem multidisciplinar.
Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2005. p. 222.
29
A adoção é uma forma pela qual alguém estabelece com outrem
laços recíprocos de parentesco civil por força de uma ficção legal.
Sendo um instituto jurídico que imita a chamada filiação natural.
Enquanto a filiação natural decorre do vínculo sangüíneo, a
adotiva advém de sentença88 judicial.
Neste sentido, Pereira89 diz o seguinte: “A adoção é, pois, o
ato jurídico90 pelo qual uma pessoa recebe outra como filho, independentemente
de existirem entre elas qualquer relação de parentesco consangüíneo91 ou afim92”.
A efetivação da adoção traz ao adotado o laço de
parentesco em primeiro grau e linha reta93, conforme menciona Gomes94:
Adoção é o ato jurídico pelo qual se estabelece,
independentemente do fato natural da procriação, o vínculo de
filiação. Trata-se de ficção legal, que permite a constituição, entre
duas pessoas, do laço de parentesco do primeiro grau em linha
reta.
Verifica-se que adoção é o ato jurídico que cria o vínculo de
filiação entre adotante e adotado, inexistindo, juridicamente, qualquer diferença
entre filho adotivo e filho biológico, visto que a adoção, segundo Zamberlam95:
88
Sentença: é o veredicto ou decisão que o magistrado (ou o tribunal) profere sobre a espécie
submetida a seu julgamento. Juízo pronunciado em qualquer matéria. Conforme BENASSE,
Paulo Roberto. Dicionário Jurídico. p.283.
89
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições do Direito Civil. 14 ed. Rio de Janeiro: Forense,
2004. p. 392 .
90
Ato jurídico: é o “ato realizado com as formalidades legais, que tem por fim criar, conservar,
modificar ou extinguir um direito”. conforme BENASSE, Paulo Roberto. Dicionário Jurídico.
2000. p. 50.
91
Consangüinidade: é o “parentesco entre duas ou mais pessoas que, por sangue, tem em
comum o mesmo tronco familiar consangüíneo”. Conforme SIDOU, J. M. Othon. Dicionário
Jurídico. 1997. p.178.
92
Afim: é aquele que “apresenta afinidade. Relativo ao parentesco de afinidade. Parente por
casamento, por vínculo de afinidade”. Conforme FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Mini
Aurélio. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2001. p. 21.
93
Linha Reta: é o “parentesco das pessoas que estão umas para com as outras na relação de
ascendentes e descendentes”. Conforme SIDOU, J. M. Othon. Dicionário Jurídico. 1997.
p.483.
94
GOMES, Orlando. Direito de Família. p.369.
95
ZAMBERLAM, Cristina de Oliveira. Os novos paradigmas da família contemporânea. p.108.
30
Marca a passagem de uma paternidade estritamente biológica a
uma paternidade afetiva e social, e traz novos desafios para estes
sujeitos, em especial este homem, que necessitará acolher os
filhos de um outro homem e preservar uma boa relação com os
seus.
A adoção no Brasil é ato jurídico solene, que gera vínculo de
filiação entre o(s) adotante(s) e o adotado. Este instituto jurídico, na atualidade, dá
ao filho natural e adotivo os mesmos direitos e obrigações.
2.2 HISTÓRICO DA ADOÇÃO
A adoção é instituto que sofreu algumas modificações no
curso do tempo. Na Idade Antiga96 a mesma era admitida, e se justificava pela
religiosidade que consistia no culto aos antepassados.
Venosa97 menciona que “o instituto era utilizado na
Antigüidade como forma de perpetuar o culto doméstico”.
Neste sentido, Rodrigues98 diz o seguinte:
Aquele cuja família se extingue não terá quem lhe cultue a
memória de seus maiores. Assim, a mesma religião que obrigava
o homem a casar-se para ter filhos que cultuassem a memória dos
antepassados comuns; a mesma religião que impunha o divórcio
em caso de esterilidade e que substituía o marido impotente, no
leito conjugal, por seu parente capaz de ter filhos, vinha oferecer,
por meio da adoção, um último recurso para evitar a desgraça
representada pela morte sem descendentes.
Da mesma forma, Sznick99 aborda o tema:
96
Idade Antiga. Período que compreende a data de 4.000 a.C. e se estende até meados de 476
d.C.
97
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de família. p.329.
98
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito de família. p. 335.
99
SZNICK, Valdir. Adoção: Direito de família, guarda de menores, tutela, pátrio poder, adoção
internacional. São Paulo: LEUD, 1999. p. 25.
31
Desde os antigos, o instituto da adoção foi conhecido e usado;
verdade é que o instituto não possuía a configuração como a
conhecemos hoje. A adoção, contrato pelo qual o adotante se
constitui, por meio legal, pai do adotado, com maior ou menor
amplitude, era conhecida dos antigos e tinha uma função
específica como a da perpetuação dos deuses e do culto familiar,
com os ritos e oferendas. Vê-se, in casu100, especialmente, o culto
dos deuses familiares e domésticos como um fim que devia ser
perpetuado.
Tem-se aí um relato fiel da importância da adoção na Idade
Antiga, que tinha apenas o intuito de dar continuidade a família, e não o de
proporcionar ao adotado um lar.
Conforme Gilissen101, na Idade Média102 e na Idade
Moderna103 a adoção era instituto praticamente inexistente:
(...) a adoção é em geral desconhecida durante a Idade Média e a
época moderna. A estrutura da família medieval, fundada nos
laços de sangue no seio da linhagem, opunha-se à introdução de
um estranho. (...) A adoção era admitida numa parte dos países
do Sul da Europa (Itália, Espanha, pays de droit écrit em França),
sob a influência do renascimento do direito romano; mas, mesmo
aí, não era muito freqüente e não tinha muitas vezes efeitos em
matéria de sucessão. Era feita perante o notário ou o juiz, ou,
então, por escrito do príncipe.
Neste mesmo sentido, em relação à Idade Média, Venosa104
menciona o seguinte:
100
In Casu: significa “no caso vertente, na hipótese debatida, na espécie”. Conforme BENASSE,
Paulo Roberto. Dicionário Jurídico. 2000. p.395.
101
GILISSEN, Jhon. Introdução Histórica ao Direito. Tradução de A. M. Hespanha e L. M.
Macaísta Malheiros. 3ª ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2001. p. 614.
102
Idade Média: consiste no “período histórico compreendido entre o começo do séc. V e meados
do séc. XV”. Conforme FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Mini Aurélio. p. 371.
103
Idade Moderna: consiste no “período histórico compreendido entre a Renascença e as
Revoluções Francesa e Industrial”. Conforme LUFT, Celso Pedro. Mini dicionário Luft. São
Paulo: Ática, 2000. p. 373.
104
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. p. 331.
32
Na Idade Média, sob novas influências religiosas e com a
preponderância do Direito Canônico105, a adoção cai em desuso.
Na idade moderna, com a legislação da Revolução Francesa, o
instituto da adoção volta à baila, tendo sido posteriormente
incluído no Código de Napoleão de 1804. Esse diploma admitiu a
adoção de forma tímida, a princípio, nos moldes da adoção
romana minus plena.
A adoção obstante no Código Civil de 1916 visava, em
primeiro lugar, o interesse dos adotantes, deixando o adotado em segundo plano.
Em relação a adoção segundo o Código Civil de 1916,
Venosa106 diz o seguinte:
A adoção, no Código Civil de 1916, de lei eminentemente
patrimonial visava proeminentemente a pessoa dos adotantes,
ficando o adotado em segundo plano, aspecto que já não é
admitido na moderna107 adoção. Originalmente, o Código
disciplinou a adoção conforme tendência internacional na época,
isto é, como instituição destinada a dar prole aqueles que não
tinham e não podiam ter filhos. A adoção somente era possível,
por exemplo, na provecta idade de 50 anos.
Ainda em relação ao Código Civil de 1916, Dias108 diz o
seguinte:
Coube ao Código Civil de 1916, nos artigos 368 a 378, introduzir
sistematicamente o instituto no sistema jurídico brasileiro. Pela
redação original, os maiores de 50 anos que não tivessem filhos
“dados pela natureza” podiam adotar, devendo ser de 18 anos a
diferença entre adotante e adotando. Era exigido o consentimento
105
Direito Canônico: pode ser designado como “o corpo ou coleção de leis que regem a Igreja
Católica. Conforme SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. Rio de Janeiro: Forense. 4 v.
1975. p. 531.
106
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de Família. p.334.
107
A palavra moderna, no caso em tela, não trata da Idade Moderna, mas sim da Idade
Contemporânea.
108
DIAS, Maria Berenice. Direito de Família e o Novo Código Civil. 3 ed. Belo Horizonte: Del
Rey, 2004. 157 e 158 .
33
dos pais ou tutor ou ainda do próprio adotando, no caso de ser
maior ou emancipado.
O instituto da adoção sofreu alterações com o advento da
Lei 3.133, de 8 de maio de 1957109, que atualizou a adoção prescrita no Código
Civil vigente, conforme menciona Rodrigues110:
A Lei n.º 3.133/57 alterou aquela concepção de 1916, pois
permitiu a adoção por pessoas de 30 anos, tivessem ou não prole
natural. Portanto, o legislador não teve em mente remediar a
esterilidade, mas sim facilitar as adoções, possibilitando que um
maior numero de pessoas, sendo adotado, experimentasse
melhoria em sua condição moral e material.
A lei supra mencionada trouxe outras alterações para o
instituto da adoção, e não somente a redução da idade de 50 para 30 anos.
Dentre outras alterações, Dias111 menciona que a adoção foi
autorizada a “casais que tivessem cinco anos de casados, bem como ao tutor ou
curador do pupilo ou curatelado após dar contas da administração. Foi dado ao
adotado o direito de desligar-se da adoção ao cessar a menoridade ou a
interdição”.
Também em relação ao diploma legal acima mencionado,
Venosa
112
diz que: “a Lei n.º 3.133/57 representa um divisor de águas na
legislação e na filosofia da adoção no Direito pátrio”.
O advento da Lei n.º 4.655/65113 trouxe a denominada
Legislação Adotiva, conforme cita Venosa “Pela legitimação adotiva estabeleciase um vínculo profundo entre adotante e adotado, muito próximo da família
biológica”.
109
BRASIL. Lei nº3.133. Atualiza o instituto da adoção prescrita no Código Civil. Promulgada em
08 de maio de 1957.
110
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito de Família. p.337.
111
DIAS, Maria Berenice. Direito de Família e o Novo Código Civil. p. 141 e 142.
112
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de família. p. 339.
34
Já com o advento do Código de Menores, Lei n.º
6.697/79114, o instituto da adoção foi dividido em dois tipos. A adoção simples115 e
a adoção plena116, conforme menciona Dias117:
O “Código de Menores”, Lei n.º 6.697/79, revogou a Lei n.º
4.655/65 sem revogar a adoção simples do Código civil, passando
a vigorar duas formas de adoção: a adoção plena nos moldes da
legitimação adotiva e a adoção simples pelo Código Civil e pelos
artigos 27 e 28 do Código de menores.
Na Idade Contemporânea118, no Brasil, com a criação da Lei
8.069, de 13 de julho de 1990 - Estatuto da Criança e do adolescente – ECA - , a
adoção sofreu profundas transformações, visto que tal estatuto veio evidenciar e
até mesmo ampliar o direito das crianças e dos adolescentes que a Constituição
Federal de 1988 e o Código Civil de 1916 já elencavam.
Atualmente, pode-se afirmar que a adoção apresenta-se
somente na forma plena, igualando os filhos adotivos aos naturais. Tal instituto é
regulado pela Lei 8.069/90 - Estatuto da Criança e do adolescente e pela Lei
10.406/02 - Código Civil.
Assim, verifica-se que, primeiramente, a adoção foi admitida
para atender ao culto dos antepassados; após, para suprir a necessidade de
constituir prole por quem não teve filiação biológica; seguindo-se do interesse do
adotado em ter genitores, mesmo que não genéticos.
113
BRASIL. Lei n.º. 4.655. Legitimação adotiva, promulgada em 06 de junho de 1965.
114
BRASIL. Lei n.º. 6.697, Código de menores, promulgada em 10 de outubro de 1979.
115
Adoção Simples: é aquela “concernente ao vínculo de filiação que se estabelece entre o
adotante e o adotado, que pode ser pessoa maior ou menor entre 18 e 21 anos, mas tal posição
de filho não será definitiva ou irrevogável”. Conforme Diniz, Maria Helena. Curso de Direito
Civil Brasileiro: Direito de família. p. 361.
116
Adoção Plena: é aquela onde “o menor adotado passa a ser, irrevogavelmente, para todos os
efeitos legais, filho legítimo dos adotantes, desligando-se de qualquer vínculo com os pais de
sangue e parentes, salvo os impedimentos matrimoniais”. Conforme Diniz, Maria Helena. Curso
de Direito Civil Brasileiro: Direito de família. p. 383.
117
DIAS, Maria Berenice. Direito de Família e o Novo Código Civil. p. 142.
118
Idade Contemporânea: é o “período histórico compreendido entre as Revoluções Francesa e
Industrial e os dias atuais”. Conforme LUFT, Celso Pedro. Mini dicionário Luft. p. 373.
35
2.3 NATUREZA JURÍDICA DA ADOÇÃO NO BRA SIL
No que tange à natureza jurídica da adoção, esta não
encontra uniformidade na doutrina brasileira.
Ela é caracterizada como instituto por alguns, como Antônio
Chaves e Arnoldo Wald, mas também pode ser classificada como contrato, como
no entender de Eduardo Espínola e de Gomes de Castro119.
Para Venosa120, a natureza jurídica da adoção sempre foi
controvertida, sendo que “a dificuldade decorre da natureza e origem do ato”.
Atualmente, pode-se aceitar a adoção como sendo um
negócio unilateral121 e solene122, conforme nos relata Rodrigues123:
Trata-se de negócio unilateral e solene. É verdade que a
unilateralidade da adoção é imperfeita e mesmo discutível, pois a
lei reclama o consentimento dos pais ou do representante legal do
adotado (e, se maior de 12 anos, do próprio adotando: CC. Art.
1.621; ECA, art. 45). Esse requisito levou mesmo alguns
escritores clássicos a definirem a adoção como contrato. Mas,
como há hipóteses em que tal concordância não é exigida e como
a principal manifestação de vontade é a do adotante, não choca
admiti-la como ato unilateral124.
119
GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção: doutrina e prática. p. 26 e 27.
120
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de família. p.332.
121
Negócio Jurídico Unilateral: é aquele em que “há uma declaração única de vontade, de uma só
pessoa ou de várias pessoas, agindo por força de um único interesse. No primeiro caso, o
protótipo é o testamento; no segundo, o contrato consigo próprio. Conforme SIDOU, J. M. Othon.
Dicionário Jurídico. p. 534.
122
Negócio Jurídico Solene: é o que “depende de forma especial prevista em lei”. Conforme
SIDOU, J. M. Othon. Dicionário Jurídico. p.534.
123
124
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito de Família. p.341.
Ato Unilateral: é o “ato resultante de uma só declaração de vontade, de uma ou de diversas
pessoas, se essas agindo quanto a um só interesse”. Conforme SIDOU, J. M. Othon. Dicionário
Jurídico. p.77.
36
A adoção vista como um contrato deve ser descartada, visto
que as relações contratuais, mormente, tem relação com o direito das
obrigações125 e não com o direito de família126, conforme menciona Pereira127:
A bilateralidade na adoção foi considerada por muitos como um
“contrato”. Não obstante a presença do consensus128, não se pode
dizê-la um contrato, se tiver em consideração a figura contratual
típica do direito das obrigações. Alguns a qualificam simplesmente
ato solene. Outros, como instituto de ordem pública, produzindo
efeitos em cada caso particular na dependência de um ato jurídico
individual.
Assim, a adoção é classificada, quanto à natureza jurídica,
como ato jurídico unilateral e solene,
constitutiva que determinará
que
consiste numa sentença judicial
a modificação da paternidade e maternidade do
adotado e a nova filiação ao(s) adotante(s).
2.4 A ADOÇÃO E A LEGISLAÇÃO VIGENTE NO BRASIL: ESTATUTO DA
CRIANÇA E DO ADOLESCENTE E CÓDIGO CIVIL
A legislação brasileira vigente que regulamenta a adoção,
compõe-se de uma lei geral e uma lei especial que regem a adoção.
A lei geral é o Código Civil, que entrou em vigor em 11 de
janeiro de 2003, e regulamenta a adoção nos artigos 1618 a 1629.
125
Direito Das Obrigações: é a “parte do Direito Civil que rege as relações dos indivíduos entre si,
das quais resultem encargos ou compromissos, espontaneamente assumidos ou decorrentes de
preceito legal, e os efeitos daí decorrentes”. Conforme SIDOU, J. M. Othon. Dicionário
Jurídico. p.260.
126
Direito De Família – “é o complexo das normas que regulam a celebração do casamento, sua
validade e os efeitos que dele resultam, as relações pessoais e econômicas da sociedade
conjugal, a dissolução desta, as relações entre pais e filhos, o vínculo de parentesco e os
institutos complementares da tutela, da curatela e da ausência”. (C. Bevilacqua). Conforme
BENASSE, Paulo Roberto. Dicionário Jurídico. p.150.
127
128
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições do Direito Civil. p. 393.
Consenso: é a “conformidade de sentimentos; acordo, anuência. Envolve consenso ou
concordância”. Conforme SIDOU, J. M. Othon . Dicionário Jurídico. p.180.
37
A lei especial é o ECA – Estatuto da Criança e do
Adolescente129, de 13 de julho de 1990, nos artigos 39 a 52.
O Estatuto da Criança e do Adolescente regula a adoção
para os menores de dezoito anos e o Código Civil regula a adoção para os
maiores de dezoito anos.
2.4.1 A ADOÇÃO SEGUNDO O ESTATUTO DA CR IANÇA E DO
ADOLESCENTE NO BRASIL
O processo de adoção no Brasil passou por diversas
alterações. No ano de 1990, com o advento da Lei 8.609, denominada Estatuto da
Criança e do Adolescente, ficou regulada a adoção para os menores de dezoito
anos e manteve-se as regras já estabelecidas no Código Civil para os maiores de
dezoito anos.
Nas palavras de Boscaro130:
Atualmente, entre nós, encontra-se a adoção disciplinada pelos
artigos 39 a 52 da Lei 8.069/90, conhecida como Estatuto da
Criança e do Adolescente, embora a adoção de maiores e de
nascituros ainda continue a ser disciplinada pelas normas
respectivas do Código Civil.
Tal estatuto consta de 267 artigos, sendo que a parte que
trata da adoção está relatada no Livro I, Título II, seção III, subseção IV, artigos
39 a 52.
O advento do Estatuto da Criança e do Adolescente trouxe
modificações no sistema jurídico brasileiro, conforme menciona Rizzini131:
129
BRASIL. Lei n.º 8.069, de 13.07.1990, dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente,
publicada no DOU, em 16.07.1990.
130
131
BOSCARO, Márcio Antônio. Direito de Filiação. p. 85.
RIZZINI, apud WEBER, Lídia. Pais e Filhos por Adoção no Brasil. Juruá Editora. Curitiba:
2001. p. 114.
38
A aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente,
diferentemente da trajetória seguida no passado, simbolizou o
clímax de um movimento social, que contou com a participação de
uma diversidade de atores pela primeira vez presente na história
da legislação aqui retratada. O processo inusitado de elaboração
e aprovação da lei, foi possível, devido a conjuntura política vivida
pelo país, acompanhando a orientação mundial de defesa dos
direitos humanos da cada cidadão.
Pode-se afirmar que o Estatuto da Criança e do Adolescente
possui o intuito de, em consonância com o Código Civil e com a Constituição
Federal de 1988, proteger os direitos fundamentais das crianças e adolescentes,
conforme menciona Nery Júnior e Machado132:
Por sua vez, o ECA, em absoluta sintonia com a Constituição de
1988, rompeu vigorosamente com a concepção anteriormente
vigente, eliminando completamente a divisão de crianças e
adolescentes em duas classes de pessoas, em obediência estrita
ao princípio constitucional da igualdade [...] Na sistemática da
Constituição Federal, obviamente seguida na elaboração do ECA,
todas as crianças e adolescentes, independentemente da situação
fática em que estejam e de sua posição no seio do tecido social,
gozam de um mesmo ‘status’ jurídico; gozam da mesma gama de
direitos fundamentais positivados na Constituição Federal, cujos
contornos mais pormenorizados vem ditados no próprio ECA.
Cahali133, comentando acerca do advento do Estatuto da
Criança e do Adolescente, se pronunciou da seguinte forma:
Dilui-se, na noite dos tempos, a vinculação do instituto à sua
origem mais remota, representada pelo dever de perpetuação do
culto doméstico; e, superadas antigas digressões, a adoção foi
deixando de ser uma forma de filiação substituta para amainar a
angústia dos casais estéreis.
132
NERY JUNIOR, Nelson. MACHADO, Martha de Toledo. O Estatuto da Criança e do
Adolescente e o Novo Código Civil à luz da Constituição Federal: princípio da especialidade
e o direito intemporal. Disponível em http://jij.tj.rs.gov.br/jij_site/jij_site. home. Acesso em 30 de
março de 2006.
133
CAHALI, Yussef Said. A adoção em Face do Estatuto da Criança e do Adolescente. Revista
Juriplenum. 1998, CD, 1-36.
39
Pode-se afirmar que o advento do Estatuto da Criança e do
Adolescente não beneficiou apenas aqueles casais que não podem ter filhos,
visto que o instituto da adoção se estende também aos casais que já tem filiação
biológica, como também a pessoas em união estável ou solteiras, mas busca,
principalmente, incluir a criança e o adolescente em uma estrutura familiar onde
haja a afetividade, buscando o melhor interesse do adotado.
2.4.2 A ADOÇÃO SEGUNDO O CÓDIGO CIVIL NO BRASIL
O Código Civil trouxe algumas alterações no âmbito da
adoção, porém, veio ressaltar a importância desta, conforme já mencionava o
Estatuto da Criança e do Adolescente.
Neste sentido, Tavares134 diz o seguinte:
O novo Código Civil trata da adoção reiterando as disposições do
ECA, embora atropelando a terminologia, dando a impressão de
lamentável descaso pelo progresso desse ramo especial do
Direito, de crucial importância para todos os povos da atualidade
alinhados com o Direito Internacional135. Quando a lei geral (CC)
posterior, sem abranger todo o assunto regula determinado ponto
no mesmo sentido da lei anterior especial (ECA), não há
revogação tácita; elas coexistem, com eficácia combinada.
Rodrigues136relata: “O Código Civil disciplinou a adoção na
forma por que era tradicionalmente regulada alhures, isto é, como instituição
destinada a dar filhos, ficticiamente, àqueles a quem a natureza os havia negado”.
O mencionado dispositivo legal trata da adoção dos maiores
de dezoito anos, e encontra-se regulamentado no Livro IV, subtítulo II, capítulo IV,
134
TAVARES, José de Farias. Comentário ao Estatuto da Criança e do adolescente. Rio de
Janeiro: Forense, 2002. p. 45.
135
Direito Internacional: é o “conjunto de normas alusivas aos interesses superiores da sociedade,
na interdependência dos Estados soberanos, e disciplinadoras das relações transnacionais e
das existentes entre órgãos internacionais e entre pessoas físicas ou jurídicas dos diferentes
países”. Conforme DINIZ, Maria Helena. Dicionário jurídico. p.167.
40
dos artigos 1.618 a 1.629, e, portanto, elenca alguns requisitos relativos à adoção,
como passa-se a expor a seguir.
2.5 DOS REQUISITOS PARA A ADOÇÃO NO BR ASIL
Os requisitos para a caracterização deste determinado
instituto jurídico são os elementos necessários para a efetivação da adoção.
Todavia, já que é um ato jurídico unilateral solene, para que
se possa efetuar uma adoção, são necessários que sejam cumpridos
determinados requisitos, tanto de ordem pessoal, como de ordem formal. Estes
requisitos segundo Gonçalves137 são:
Os principais requisitos constantes no novo Código Civil são:
a)idade mínima de dezoito anos para o adotante (art. 1.618)138;
b)diferença de dezesseis anos entre adotante e adotado (art.
1.619)139; c)consentimento dos pais ou dos representantes legais
de quem se deseja adotar; d) concordância deste, se contar mais
de doze anos (art. 1.621)140; e)processo judicial (art. 1.623)141; f)
efetivo benefício para o adotando (art. 1.625)142.
136
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito de Família. p.329.
137
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de Família. p. 103 e 104 .
138
Art. 1618. Só a pessoa maior de 18 (dezoito) anos pode adotar.
Parágrafo Único. A adoção por ambos os cônjuges ou companheiros poderá ser formalizada,
desde que um deles tenha completado 18 (dezoito) anos de idade, comprovada a estabilidade
da família.
139
Art. 1619. O adotante há de ser pelo menos 16 (dezesseis) anos mais velho que o adotado.
140
Art. 1621. A adoção depende do consentimento dos pais ou dos representantes legais, de
quem se deseja adotar, e da concordância deste, se contar mais de 12 (doze) anos. § 1º O
consentimento será dispensado em relação à criança ou adolescente cujos pais sejam
desconhecidos ou tenham sido destituídos do poder familiar; § 2º O consentimento previsto no
caput é revogável até a publicação da sentença constitutiva da adoção.
141
Art. 1.623. A adoção obedecerá a processo judicial, observados os requisitos estabelecidos
neste código.
Parágrafo Único. A adoção de maiores de 18 (dezoito) anos dependerá, igualmente, da
assistência efetiva do Poder Público e de sentença constitutiva.
142
Art. 1625. Somente será admitida a adoção que constituir efetivo benefício para o adotando.
41
Os requisitos de ordem pessoal dizem respeito aos
adotantes e aos adotados. Os requisitos de ordem formal dizem respeito a
solenidade, ao consentimento dos envolvidos no processo de adoção, e também
da convivência entre os mesmos.
2.5.1 DOS REQUISITOS DE ORDEM PESSOAL
Os requisitos de ordem pessoal são os que dizem respeito
tanto aos adotantes como aos adotados, e dizem respeito a algumas exigências
que devem ser observadas em relação aos mesmos.
2.5.1.1 Dos Requisitos Pessoais Relativos aos Ado tantes
Primeiramente, tratar-se-á do requisito acerca da idade
mínima do adotante.
Assim como o Código Civil, em seu artigo 1.618, o Estatuto
da Criança e do Adolescente, em seu artigo 42,143 condiciona a capacidade para
adotar à maioridade civil. Neste sentido, como o Código Civil de 2002 reduziu de
21 para 18 anos a maioridade, a pessoa maior de 18 anos já pode adotar.
Neste sentido, nos esclarece Dias144:
Portanto, temos uma nova idade-referência para questões básicas
relativas à adoção: o adotante poderá ter 18 anos e o adotando
deverá ser menor desta idade. Embora o legislador civil tenha
imposto a obrigatoriedade de sentença constitutiva para a adoção
em qualquer idade (1.623), mantém-se a competência exclusiva
das Varas da Infância e juventude quando o adotando for menor
de 18 anos, na forma do artigo 148, inciso III, do Estatuto da
Criança e do Adolescente.
143
Art. 42. Podem adotar os maiores de vinte e um anos, independentemente de estado civil. (...).
144
DIAS, Maria Berenice. Direito de Família e o Novo Código Civil. p.159.
42
Importante ressaltar que no caso de adoção por cônjuges ou
por companheiros, é necessário que ao menos um deles tenha dezoito anos.
Outro requisito diz respeito a diferença de idade entre
adotantes e adotandos.
Tal requisito, conforme menciona o Código Civil, artigo
1.619, bem como o artigo 42, §3º145 do Estatuto da Criança e do Adolescente, de
dezesseis anos, entre o adotante e o adotado, justifica-se, segundo Gomes146,
pelo seguinte:
Decorre a exigência da orientação legislativa de imitar a natureza,
espaçando a diferença de idade pelo intervalo de uma geração.
Nem se poderia admitir, por ser chocante, fosse o filho, ainda
adotivo, mais velho do que o pai ou tivesse idade que não desse a
aparência perfeita de sua condição.
Outro requisito diz respeito ao estado civil dos adotantes.
Neves147 explica tal situação: “Estará apto a adotar a pessoa
que tiver capacidade civil (...)não importa o estado civil da pessoa. Poderá ser
solteiro, casado, viúvo, separado, divorciado ou concubinado”.
Porém, o artigo 1.622148 do Código Civil, bem como o artigo
42, §4º149 do Estatuto da Criança e do Adolescente, relatam que ninguém pode
145
Art. 42 (...) § 3º. O adotante há de ser, pelo menos, dezesseis anos mais velho do que o
adotando.
146
GOMES, Orlando. Direito de Família. p. 372.
147
NEVES, Márcia Cristina Ananias. Vade-mecum do direito de família à luz do novo Código
Civil. São Paulo: Jurídica Brasileira, 2002, p. 656.
148
Art. 1622. Ninguém pode ser adotado por duas pessoas, salvo se forem marido e mulher, ou se
viverem em união estável.
Parágrafo único. Os divorciados e os judicialmente separados poderão adotar conjuntamente,
contanto que acordem sobre a guarda e o regime de visitas, e desde que o estágio de
convivência tenha sido iniciado na constância da sociedade conjugal.
149
Art. 42 (...) § 4º. Os divorciados e os judicialmente separados poderão adotar conjuntamente,
contanto que acordem sobre a guarda e o regime de visitas, e desde que o estágio de
convivência tenha sido iniciado na constância da sociedade conjugal.
43
ser adotado por duas pessoas, salvo se forem marido e mulher, ou se viverem em
união estável.
Há ainda o requisito constante no artigo 1.620150 do Código
Civil, bem como no artigo 44151 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que
mencionam que o tutor ou o curador terá de prestar contas de sua administração,
e pagamento de eventuais débitos, ou não poderá adotar.
Fiuza152 relata: “podem o tutor ou o curador adotar o tutelado
ou o curatelado somente após a devida prestação de contas e o pagamento de
eventuais débitos”.
Por conseguinte, Fachin153 justifica que a prévia prestação
de contas: “terá o escopo de permitir a aferição da adequação ou não da
administração do tutor ou do curador aos deveres legais, evitando prejuízos ao
tutelado ou ao curatelado”.
O artigo mencionado visa preservar o interesse do tutelado
ou curatelado, evitando assim qualquer tipo de dilapidação de seu patrimônio.
Tratados os requisitos pessoais relativos, aos adotantes,
passar-se-á a tratar dos requisitos pessoais relativos aos adotados.
2.5.1.2 Dos Requisitos Pessoais Relativos aos Ado tados
No que tange aos requisitos pessoais relativos aos
adotandos, conforme menciona Neves154, “estão elencados nos arts. 40 e 45 do
Estatuto da Criança e do Adolescente”.
150
Art. 1.620. Enquanto não der contas de sua administração e não saldar o débito, não poderá o
tutor ou o curador adotar o pupilo ou o curatelado.
151
Art. 44. Enquanto não der contas de sua administração e não saldar o débito, não poderá o
tutor ou o curador adotar o pupilo ou o curatelado.
152
FIUZA, Ricardo. Novo Código Civil Comentado. São Paulo: Saraiva, 2002. p.432.
153
TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo (coordenador). Comentários ao novo Código Civil. 18 v. Rio
de Janeiro: Forense, 2004, p 168.
154
NEVES, Márcia Cristina Ananias. Vade-mecum do direito de família à luz do novo Código
Civil. p. 755.
44
O primeiro requisito diz respeito à idade do adotando,
conforme menciona o artigo 40 do referido Estatuto: “O adotando deve contar
com, no máximo, dezoito anos à data do pedido, salvo se já estiver sob a guarda
ou tutela dos adotantes”.
O segundo requisito relativo ao adotando, obsta no § 2º do
art. 45 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que diz o seguinte: “Em se
tratando de adotando maior de doze anos de idade, será também necessário o
seu consentimento”.
Verifica-se também, através do artigo 1.625 do Código Civil,
e do artigo 43 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que só será aceita a
adoção quando esta trouxer efetivo benefício para o adotando, conforme
menciona Gonçalves155; “Tal exigência apoia-se no princípio do ‘melhor interesse
da criança’, referido na cláusula 3.1 da Convenção Internacional dos Direitos da
Criança, ratificada pelo Brasil por intermédio do Decreto n. 99.710/90”.
Da mesma forma, Diniz156 diz o seguinte:
Apenas será admitida a adoção que constituir efetivo benefício
para o adotando (CC, art. 1.625), visto que não há adoção intuitu
personae157, pois o juiz é quem terá o poder-dever de optar pela
família substitutiva adequada, e não os pais da criança a ser
adotada, e muito menos os adotantes. O poder judiciário é que
analisará a conveniência ou não, para o adotando, e os motivos
em que se funda a pretensão dos adotantes, ouvindo, sempre que
possível, o adotando, levando em conta o parecer do Ministério
Público.
Resta evidenciado que o melhor interesse do adotando deve
prevalecer, devendo este ser inserido na família que melhor puder lhe
proporcionar um ambiente saudável e equilibrado.
155
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de Família. p.105.
156
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. p. 420.
157
Intuitu Personae: “tendo em conta a pessoa, ou em consideração a ela”. Conforme SIDOU, J.
M. Othon. Dicionário Jurídico. p.430.
45
Tratados os requisitos de ordem pessoal relativos aos
adotantes e aos adotados, passar-se-á a estudar os requisitos de ordem formal.
2.5.2 DOS REQUISITOS DE ORDEM FORMAL
No que tange aos requisitos de ordem formal, estes dizem
respeito ao consentimento, a solenidade e ao estágio de convivência158, conforme
nos esclarece Sznick159:
Estabelece ainda a lei os requisitos formais que examinaremos a
seguir: um, é claro, a exigência de escritura pública tornando-a
pois um ato solene; outro o consentimento, que é exigido não
expressamente, mas por outras normas.
Referente ao consentimento, este está elencado no artigo
1.621 do Código Civil, que menciona “A adoção depende do consentimento dos
pais ou dos representantes legais, de quem se deseja adotar, e da concordância
deste, se contar com mais de doze anos. (...)”.
Da mesma forma o artigo 45, do Estatuto da Criança e do
Adolescente referencia o requisito mencionado “A adoção depende do
consentimento dos pais ou de representante legal do adotando”.
Para a efetivação da adoção, faz-se necessário a
concordância entre aqueles que entregam uma pessoa à adoção, daqueles que o
adotam e do próprio adotante, quando este for maior de doze anos de idade.
Neste sentido, Gomes160 diz o seguinte:
O consentimento do adotado ou do seu representante legal, se for
incapaz ou nascituro, é indispensável. Exige-se no momento de
158
Acerca do estágio de convivência, este será tratado no título 3.3.1.
159
SZNICK, Valdir. Adoção: Direito de família, guarda de menores, tutela, pátrio poder, adoção
internacional. p. 110.
160
GOMES, Orlando. Direito Civil: Direito de Família. p.372.
46
realização do ato, mas se tem entendido, entre nós, que pode ser
ulterior, sendo maior o adotado.
Na hipótese de a criança não estar mais sob o pátrio poder
dos pais, ou de seu representante legal, não há o que se falar em consentimento
por parte destes.
No que diz respeito ao requisito da solenidade, o artigo
1.623 do Código Civil menciona “A adoção obedecerá a processo judicial,
observados os requisitos estabelecidos neste código”.
Já o parágrafo único do mencionado artigo revela “A adoção
de maiores de dezoito anos dependerá, igualmente, da assistência efetiva do
Poder Público e de sentença constitutiva”.
Referente a necessidade de processo judicial, Fachin161
afirma: “a nova direção jurídica conferida aos procedimentos adotivos unifica, na
concessão final, a adoção de menores e de maiores (de dezoito anos), fazendo-a
depender de sentença”.
Pode-se, portanto, verificar que o Código Civil traz diversos
requisitos de ordem pessoal e formal, que devem ser devidamente preenchidos, a
fim de que se possa efetuar uma adoção.
2.6 OS EFEITOS PESSOAIS E PATRIMONIAIS D A ADOÇÃO NO BRASIL
Da adoção decorrem diversos efeitos, sendo que estes são
divididos em efeitos de ordem pessoal e efeitos de ordem patrimonial.
Gonçalves162 os define da seguinte forma: “Os de ordem
pessoal dizem respeito ao parentesco, ao poder familiar e ao nome; os de ordem
patrimonial concernem aos alimentos e ao direito sucessório”.
161
TEIXEIRA, Sálvio de Figueiredo (coordenador). Comentários ao novo Código Civil. p. 183.
162
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de Família. p.105.
47
No que tange ao parentesco, fica evidenciado que após a
adoção, cria-se com a família adotante um vínculo de parentesco equiparado ao
vínculo consangüíneo, cessando, portanto, os vínculos de parentesco com a
família biológica do adotado, restando apenas os vínculos de sangue, a fim de
evitar casamento entre o adotado e sua família biológica, conforme menciona o
artigo 1.521,nos incisos I, II, III, IV e V do Código Civil163.
Ainda em relação ao parentesco, Gomes 164 diz o seguinte:
O parentesco resultante da adoção constitui-se apenas entre o pai
e o filho adotivo, conservando-se estranhos os parentes de cada
qual, mas para os efeitos de casamento prevalecem os
impedimentos estatuídos em razão do parentesco natural. Não
podem casar o adotante com a viúva do adotado e o adotado com
a viúva do adotante, nem o adotado com o filho superveniente ao
pai ou a mãe adotiva.
No que diz respeito ao poder familiar, Gonçalves165 diz o
seguinte: “com a adoção, o filho adotivo é equiparado ao consangüíneo sob todos
os aspectos, ficando sujeito ao poder familiar transferido do pai natural para o
adotante”.
No tocante ao nome, é facultado aos adotantes a decisão de
trocar ou não o nome do adotado. Diz o artigo 1.627 do Código Civil: “A decisão
confere ao adotado o sobrenome do adotante, podendo determinar a modificação
de seu prenome, se menor, a pedido do adotante ou do adotado”.
Ainda em relação ao nome, Rodrigues166 diz o seguinte:
163
Art. 1.521. Não podem casar: I – os ascendentes com os descendentes, seja o parentesco
natural ou civil; II – os afins em linha reta; III – o adotante com quem foi cônjuge do adotado e o
adotado com quem o foi do adotante; IV – os irmãos, unilaterais ou bilaterais, e demais
colaterais, até o terceiro grau inclusive; V – o adotado com o filho do adotante.
164
GOMES, Orlando. Direito de Família. p.375.
165
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de Família. p.106.
166
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito de Família. p.348.
48
A adoção por sentença judicial será inscrita no registro civil. Do
mandado que a ordenar não se dará certidão, porque o intuito é o
de que todos esqueçam. Cancelar-se-á o registro original e
nenhuma observação sobre a origem do ato poderá constar na
certidão de registro. Nesta figuração os nomes dos pais do
adotante como avós do adotado. Há, como se vê, uma integração
total deste na família daquele.
Nos efeitos de ordem patrimonial que dizem respeito aos
alimentos, Gomes167 diz o seguinte:
O adotante está obrigado a sustentar o adotado, enquanto dure o
pátrio poder, e a lhe prestar alimentos nos casos em que são
devidos pelo pai ao filho maior. O adotado tem, igualmente, a
obrigação de prestar alimentos ao adotante, posto não o
mencione a lei entre os devedores de tal prestação. A menção
considera-se, entretanto, desnecessária, por ter o adotado a
condição de filho legítimo.
Resta evidenciada a obrigação do adotante em prestar
alimentos ao adotado, quando haja necessidade, visto que a adoção os torna
parentes de primeiro grau em linha reta.
No que tange aos efeitos de ordem patrimonial que dizem
respeito ao direito sucessório, Gonçalves168 diz o seguinte:
Com relação ao direito sucessório, o filho adotivo concorre, hoje,
em igualdade de condições com os filhos de sangue, em face da
paridade estabelecida pelo artigo 227, § 6º, da Constituição e do
disposto no artigo 1.628169 do Código Civil.
167
GOMES, Orlando. Direito de Família. p.375.
168
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de Família. p.106 e 107.
169
Art. 1628. Os efeitos da adoção começam a partir do trânsito em julgado da sentença, exceto
se o adotante vier a falecer no curso do procedimento, caso em que terá força retroativa à data
do óbito. As relações de parentesco se estabelecem não só entre o adotante e o adotado, como
também entre aquele e os descendentes deste e entre o adotado e todos os parentes do
adotante.
49
Ocorre que, como o filho adotivo é em tudo equiparado ao
biológico, pode o mesmo ter o direito à sucessão extinto, o que ocorre no caso da
deserdação.
Neste caso, menciona Diniz170 “a norma jurídica confere ao
adotante e ao que foi adotado a possibilidade de romper o efeito sucessório da
adoção, desde que surjam os casos dos arts. 1.814171, 1.962172 e 1.963173 do
Código Civil”.
Através destes apontamentos, verifica-se que o filho adotivo
passa a ter os mesmos direitos que o filho biológico, tanto no que diz respeito aos
efeitos de ordem pessoal, como nos efeitos de ordem patrimonial.
2.7 INEXISTÊNCIA, NULIDADE E ANULABILIDA DE DA ADOÇÃO NO BRASIL
No que se refere aos casos de inexistência, nulidade e
anulabilidade da adoção, estes dizem respeito à configuração da falta de alguma
condição indispensável à adoção.
Os casos de inexistência da adoção dividem-se em três
hipóteses, conforme menciona Diniz174:
170
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. p. 501.
171
Art. 1.814. São excluídos da sucessão os herdeiros ou legatários: I – que houverem sido
autores, co-autores ou partícipes de homicídio doloso, ou tentativa deste, contra a pessoa de
cuja sucessão se tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente; II – que
houverem acusado caluniosamente em juízo autor da herança ou incorrerem em crime contra a
sua honra, ou de seu cônjuge ou companheiro; III – que, por violência ou meios fraudulentos,
inibirem ou obstarem o autor da herança de dispor livremente de seus bens por ato de última
vontade.
172
Art. 1.962. Além das causas mencionadas no art. 1.814, autorizam a deserdação dos
descendentes por seus ascendentes: I – ofensa física; II – injúria grave; III – relações ilícitas com
a madrasta ou com o padrasto; IV – desamparo do ascendente em alienação mental ou grave
enfermidade.
173
Art. 1.963. Além das causas enumeradas no art. 1.814, autorizam a deserdação dos
ascendentes pelos descendentes: I – ofensa física; II – injúria grave; III – relações ilícitas com a
mulher ou companheira do filho ou a do neto, ou com o marido ou companheiro da filha ou o da
neta; IV – desamparo do filho ou neto com deficiência mental ou grave enfermidade.
174
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. p. 499.
50
a)Falta de consentimento do adotado e do adotante; b) falta do
objeto, p. ex., se o adotante estiver privado do exercício do poder
familiar por incapacidade, ausência ou interdição civil; e c) falta de
processo judicial com a intervenção do Ministério Público.
No que tange a nulidade da adoção, esta ocorrerá se for
violado algum dos requisitos inerentes a adoção, conforme menciona Diniz175:
1)O adotante não tiver mais de 18 anos (CC, art. 1.618, caput),
por não haver diferença de pelo menos 16 anos de idade entre
adotado e adotante (CC, art. 1.619); 2) Duas pessoas, sem serem
marido e mulher ou conviventes, adotaram a mesma pessoa (CC,
art. 1.622 e parágrafo único); 3) O tutor ou o curador não prestou
contas (CC, art. 1.620); 4) Vício resultante de simulação (CC,
art.167) ou de fraude à lei (CC, art. 166, VI).
Por conseguinte, têm-se os casos de anulabilidade da
adoção, conforme menciona Diniz176:
1)Falta de assistência do pai, tutor ou curador, ao consentimento
do adotado relativamente incapaz (CC, art. 171, I); 2) Ausência de
anuência da pessoa sob cuja guarda se encontra o menor ou
interdito; 3)Consentimento manifestado somente pelo adotado
relativamente incapaz (CC, art. 171, I); 4) Vício resultante, p. ex.
de erro, dolo, coação (RT, 586: 40: CC, art. 171, II); 5) Falta de
consentimento do cônjuge ou convivente do adotante e do
consorte do adotado, mas há julgados, no que concordamos, visto
que a lei não exige tal anuência, dispensando-a (...), se a adoção
for feita pelo casal, caso em que se pressupõe, expressa ou
tacitamente, o consenso de ambos.
Conforme fora mencionado acima, pode-se verificar que a
inexistência, a nulidade e a anulabilidade da adoção serão argüidas na falta de
algum pressuposto que deveria ter sido cumprido.
175
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. p. 500.
176
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. p. 500.
51
Decorrente da falta de algum pressuposto, que resulte em
caso de nulidade ou anulabilidade da adoção, poderá ser interposta Ação de
Impugnação, que, segundo Diniz177, acaba “desdobrando-se em (a) ação de
nulidade da adoção (...), ou (b) ação de anulação da adoção (...)”.
A ação de nulidade da adoção é declaratória, não
produzindo efeito constitutivo, visto que o vínculo de filiação que fora estabelecido
entre adotante e adotado já nasceu ineficaz. Tal ação tem o intuito de declarar a
nulidade do ato efetuado.
Já a ação de anulação da adoção tem como escopo romper
o laço de filiação já estabelecido. Tal ação pode ser movida tanto pelo adotante
quanto pelo adotado, porém, Diniz178 menciona que “terceiros interessados, como
parentes das partes, sucessores ou legatários também poderão movê-la”.
Verifica-se também que nestas ações a presença do
Ministério Público se faz indispensável.
Porém, onstata-se que o exame de tais atos não deve ser
avaliado de forma rigorosa, conforme menciona Monteiro179: “torna-se preciso não
perder de vista que a natureza benéfica do instituto não exige rigor extremado no
exame das formalidades legais”.
Resta configurado que deve ser avaliado o melhor interesse
do adotando, a fim de evitar que o rigor em relação as formalidades necessárias à
adoção acabe prejudicando o adotado ao invés de beneficiá-lo.
177
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. p. 500.
178
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. p. 501.
179
MONTEIRO, Washington de Barros. Direito Civil: Direito de Família. p. 272.
52
2.8 REVOGAÇÃO DA ADOÇÃO NO BRASIL
Quando ainda em vigor, o Código Civil de 1916 estabelecia
em seu artigo 373180 a possibilidade da revogação. Entretanto, atualmente, a
adoção é irrevogável.
Neste sentido, Monteiro181 ressalta:
Os incapazes não tem suficiente discernimento para aquilatar a
gravidade do ato praticado. Faltam-lhes inteligência e vontade.
Natural, portanto, se lhes ressalve a faculdade de resolverem
sobre a conveniência ou inconveniência de manterem a adoção,
logo que se vejam em condições de fazê-lo, pela cessação da
incapacidade”.
Ainda em relação ao Código Civil de 1916, este apresentava
em seu artigo 374 outras hipóteses de dissolução da adoção, como mencionado a
seguir: “Art. 374. Também se dissolve o vínculo da adoção: I – quando as duas
partes convierem; II – nos casos em que é admitida a deserdação”.
Em relação ao inciso I, Rizzardo182 diz o seguinte “exigia-se
a existência de acordo entre o adotado e os adotante, se maior aquele; ou entre
os que haviam dado o filho em adoção e o adotante”.
No tocante ao inciso II, Rizzardo183 diz que “a dissolução por
ato que admitia a deserdação reclamava a utilização da via judicial”.
Com o advento do Estatuto da Criança e do Adolescente,
não se poderia mais extinguir a adoção, visto que o artigo 48 relata o que segue:
“A adoção é irrevogável”.
180
Artigo 373. O adotado, quando menor, ou interdito, poderá desligar-se da adoção no ano
imediato ao em que cessar a interdição, ou a menoridade.
181
MONTEIRO, Washington de Barros. Direito de Família. 2001. p.267.
182
RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família: Lei n.º 10.406, de 10.01.2002. 3 ed. Rio de Janeiro:
Forense, 2005. p. 544.
183
RIZZARDO, Arnaldo. Direito de família. 2005. p. 544.
53
Acerca do artigo supra citado, Ishida184 relata:
A adoção, assim como a tutela, é revestida de definitividade.
Assim, o genitor que consuma a adoção, com sentença trânsito
em
julgado,
não
pode
alegar
posteriormente
seu
“arrependimento”. Ao contrário da tutela que se finda com a
maioridade civil, a adoção mantém o vínculo entre adotante e
adotado, sendo irrevogável.
Já o Código Civil em vigor não faz menção ao assunto, visto
que, segundo o artigo 1626185, o filho adotivo em tudo se equipara ao filho natural,
não se pode, portanto, após o trânsito em julgado da sentença que concedeu a
adoção, revogar a situação de filho em que o adotado se encontra.
Assim, investigada a adoção no Brasil, passar-se-á a
estudar as espécies da adoção legal no Brasil e os procedimentos para requerêla, os princípios da afetividade e do melhor interesse do menor, a “adoção à
brasileira” e a possibilidade de reversão desta para a adoção legal no Brasil.
184
ISHIDA, Válter Kenji. Estatuto da Criança e do Adolescente: Doutrina e Jurisprudência. 5 ed.
São Paulo: Atlas, 2004. p. 111.
185
Art. 1.626. A adoção atribui a situação de filho ao adotado, desligando-o de qualquer vínculo
com os pais e parentes consangüíneos, salvo quanto aos impedimentos para o casamento.
Parágrafo Único. Se um dos cônjuges ou companheiros adota o filho do outro, mantêm-se os
vínculos de filiação entre o adotado e o cônjuge ou companheiro do adotante e os respectivos
parentes.
54
CAPÍTULO 3
A ADOÇÃO LEGAL NO BRASIL E A “ADOÇÃO À BRASILEIRA”
3.1 A ADOÇÃO LEGAL NO BRASIL E SUAS ES PÉCIES
A adoção é um ato pelo qual se atribui ao adotado a
condição de filho. Neste sentido, pode-se afirmar que a adoção legal é aquela que
encontra respaldo jurídico na legislação brasileira vigente, ou seja no Estatuto da
Criança e do Adolescente e no Código Civil.
Constata-se que o artigo 42 do Estatuto da Criança e do
Adolescente, menciona os casos em que a adoção é possível, sem fazer
referência ao estado civil do adotante. Diz o caput do referido artigo: “Podem
adotar os maiores de vinte e um anos, independentemente de estado civil”.
Importante salientar que o Código Civil de 2002 reduziu de
21 para 18 anos a capacidade civil. Diz o caput do artigo 1618: “só a pessoa
maior de dezoito anos pode adotar”.
Verifica-se que a adoção poderá ser pleiteada por pessoa
solteira, por cônjuges, por companheiros186, por divorciados e judicialmente
separados, por parentes, salvo ascendentes e irmãos, e até mesmo a adoção
póstuma187.
186
Informa-se que para a presente monografia o termo companheiros designa aqueles que
convivem em união estável, porém, não compreende as pessoas que vivem em união
homoafetiva.
187
TAVARES, José de Farias. Comentário ao Estatuto da Criança e do adolescente. p. 48 e
49.
55
3.1.1 ADOÇÃO UNILATERAL
Atualmente, é muito comum deparar-se com famílias
monoparentais,
onde,
segundo
Leite188:
“os
filhos
se
encontram,
necessariamente, vinculados só ao pai ou só a mãe”.
Neste sentido, o mencionado autor comenta:
A coabitação é um modelo familiar que tende a substituir o
casamento (...) embora não casados, e não desejando sê-los,
muitos dos coabitantes decidem ter filhos. Alguns educam juntos
os filhos comuns; outros, não assumem a paternidade e nem
educam os filhos e, finalmente, uma terceira categoria nem sabe
que é pai (tendo sido meramente usados como genitores).
Pode-se
constatar que
muitas
vezes
o
registro
de
nascimento da criança é efetuado apenas no nome da mãe, ou o pai efetua o
registro de nascimento, porém, não convive com o filho, tampouco fornece a
assistência necessária ao mesmo.
Em observância as novas estruturas familiares, cuidou o
legislador pátrio de protegê-las e concedê-las o direito à adoção, autorizando-a a
adotantes unilaterais, e não apenas aos adotantes casados ou companheiros.
Tavares189 explica tal situação:
(...) uma mulher sozinha poderá adotar uma criança ou
adolescente de origem desconhecida, e que continuará sem
paternidade, porém, com uma família substituta monoparental
materna. Assim como o homem sozinho poderá adotar como filho
uma criança ou adolescente de origem ignorada que continuará
sem maternidade conhecida, porém, com uma família substituta
monoparental paterna, nas mesmas condições. (grifo no
original).
188
LEITE, Eduardo de Oliveira. Famílias Monoparentais: A situação jurídica de pais e mães
separados e dos filhos na ruptura da vida conjugal. p. 08 e 57.
189
TAVARES, José de Farias. Comentários ao Estatuto da Criança e do adolescente. p. 53.
56
Fator importante a ser destacado, que o Estatuto da Criança
e do Adolescente omitiu, trata da adoção unilateral efetuada por cônjuge ou
companheiro.
Menciona o parágrafo único do artigo 1.626 do Código Civil:
“se um dos cônjuges ou companheiros adota o filho do outro, mantêm-se os
vínculos de filiação entre o adotado e o cônjuge ou companheiro do adotante e os
respectivos parentes”.
Tavares190 explica tal situação:
Quando alguém quiser adotar filho do seu cônjuge (enteado) ou
de seu concubino e que não seja filho também seu, fará sozinho a
adoção, como adotante único, com o assentimento exigido no art.
45, do pai ou mãe do adotando. Este (ou esta) permanecerá com
seu vínculo parental consangüíneo inalterado e comparece à
adoção apenas como anuente, sem poder adotar, claro, filho que
já é seu e fica sendo. O que muda é a relação de parentesco do
outro lado, ou seja, da linha do adotante.
Desta forma, resta evidenciado que se justifica assim a
possibilidade de adoção unilateral, visto que, atualmente, muitas famílias são
formadas por apenas um dos genitores e seus filhos.
3.1.2 ADOÇÃO POR PARENTES
O Estatuto da Criança e do Adolescente, em seu artigo 42, §
191
1º
, proíbe a adoção por avós e por irmãos.
Existem doutrinadores que discordam desta proibição
estabelecida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. Neste sentido, Neves192
diz o seguinte:
190
TAVARES, José de Farias. Comentários ao Estatuto da Criança e do adolescente. p. 50.
191
Art. 42, § 1º ECA “Não podem adotar os ascendentes e os irmãos do adotando”.
57
Eis aqui a nosso ver, uma falha do Estatuto. É comum entre nós
que crianças sejam educadas e/ou sustentadas pêlos avós, ou
porque os pais assim o querem ou por não terem condições de
propiciar o bem estar de seus filhos. Esse procedimento era
amplamente aceito pela jurisprudência, que via nos avós pessoas
perfeitamente capazes de criar seus netos como verdadeiros
filhos, mesmo porque estariam unidos por laços de extremo amor.
No entanto, o legislador achou por bem proibir adoção nestes
casos.
Esta é uma questão que traz divergências, visto que uma
adoção por parentes, dependendo do caso específico, poderia ser benéfica para a
criança. Existem doutrinadores que julgam válida esta proibição devido sua
influencia no direito sucessório, conforme relata Rodrigues193:
A proibição de adotar um neto talvez se justifique na idéia de que
o ato poderá afetar a legítima de herdeiro necessário mais
próximo, tal como o filho. Como o neto adotado assumirá a
posição de filho, para todos os efeitos, ele concorrerá com seu
próprio pai, na sucessão do avô. Imagine-se por hipótese um caso
de desavença entre pai e filho. Aquele, para prejudicar o último,
adotaria o neto e em seu testamento o gratificaria também com a
quota disponível. Por morte do testador o neto herdaria a quota
disponível por força do testamento e a metade da legítima por
força de sua condição de filho adotivo.
A proibição da adoção por avós e por irmãos está elencada
no Estatuto da Criança e do Adolescente, portanto, não há o que se discutir em
relação a este assunto.
3.1.3 ADOÇÃO POR COMPANHEIROS
A entidade familiar tem sofrido diversas modificações nos
últimos tempos. Com o advento da Constituição Federal de 1988, a união estável
192
NEVES, Márcia Cristina Ananias. Vade-mecum do direito de família à luz do novo Código
Civil. 2002, p. 754.
193
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito de Família.. p. 343.
58
foi reconhecida como entidade familiar. Tal conceito está exposto no artigo 226, §
3º, e diz o seguinte:
A família, base da sociedade, tem especial proteção do estado.
(...). § 3º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a
união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar,
devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.
Mais tarde, o Código Civil de 2002 também conceituou a
união estável. Diz o artigo 1.723 do Código Civil “É reconhecida como entidade
familiar a União Estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência
pública, contínua e duradoura, e estabelecida com o objetivo de constituição de
família”.
Importante
ressaltar que
a união estável,
para
ser
caracterizada como entidade familiar, deve respeitar alguns fundamentos,
conforme menciona Rodrigues194.
Pode-se caracterizar a união estável como a união do homem e
da mulher, fora do matrimônio, de caráter estável, mais ou menos
prolongada, para o fim de satisfação sexual, assistência mútua e
dos filhos comuns e que implica uma presumida fidelidade
recíproca entre a mulher e o homem.
O artigo 42, § 2º195 do Estatuto da Criança e do Adolescente
menciona claramente a adoção por companheiros, buscando nesse sentido
sincronia com a Constituição Federal, que reconhece a união estável como
entidade familiar.
194
195
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito de Família. p.259.
Art. 42. Podem adotar os maiores de vinte e um anos, independentemente de estado civil. (...)
§ 2º A adoção por ambos os cônjuges ou concubinos poderá ser formalizada, desde que um
deles tenha completado vinte e um anos de idade, comprovada a estabilidade da família.
59
Da mesma forma, o Código Civil, em seu artigo 1.618,
parágrafo único196, admite a adoção por companheiros.
No que tange a adoção por companheiros, Fiuza197 assim
expõe seu pensamento:
O acréscimo da adoção por companheiros, ou seja, por aqueles
que vivem em união estável, também foi realizado de modo a
adequar o novo Código à legislação superveniente ao início de
sua tramitação, no caso ao Estatuto da criança e do Adolescente
(art. 42, § 4º), bem como à Constituição Federal, que atribui à
união estável o caráter de entidade familiar (art. 226, § 3º).
Desta
forma,
pode-se
verificar
que
a
adoção
por
companheiros é viável, visto que encontra o devido respaldo legal tanto no
Estatuto da Criança e do Adolescente quanto no Código Civil de 2002.
3.1.4 ADOÇÃO POST MORTEM198
O artigo 42, § 5º199 do Estatuto da Criança e do Adolescente
trouxe como inovação a adoção póstuma, a qual pode ser efetivada, contanto que
o adotante já tenha iniciado o processo de adoção.
Neste mesmo sentido, o artigo 1.628200 do Código Civil
menciona que se o adotante vier a falecer no curso do procedimento de adoção,
os efeitos da adoção iniciam quando da data do óbito.
196
Art. 1.618. só a pessoa maior de dezoito anos pode adotar.
Parágrafo único. A adoção por ambos os cônjuges ou companheiros poderá ser formalizada,
desde que um deles tenha completado dezoito anos de idade, comprovada a estabilidade da
família.
197
FIUZA, Ricardo. Novo Código Civil Comentado. São Paulo: Saraiva. p. 430.
198
Post Mortem: é aquela que ocorre “depois da morte”. Conforme BENASSE, Paulo Roberto.
Dicionário Jurídico. p. 424.
199
Art. 42. Podem adotar os maiores de vinte e um anos, independentemente de estado civil. (...)
§ 5º A adoção poderá ser deferida ao adotante que, após inequívoca manifestação de vontade,
vier a falecer no curso do procedimento, antes de prolatada a sentença.
200
Art. 1628. Os efeitos da adoção começam a partir do transito em julgado da sentença, exceto
se o adotante vier a falecer no curso do procedimento, caso em que terá força retroativa à data
do óbito. As relações de parentesco se estabelecem não só entre o adotante e o adotado, como
60
Neste sentido, Venosa201 afirma:
O § 5º do art. 42 permite que a adoção seja deferida quando o
adotante vier a falecer no curso do procedimento, antes de
prolatada a sentença. O procedimento já deve Ter sido iniciado
em vida, cabendo ao juiz analisar sobre a conveniência de adoção
post mortem (atual Código, art. 1.628). não é admitida a adoção
sem que o interessado tenha iniciado o processo.
Acerca da adoção póstuma, Mônaco da Silva202 menciona:
Trata-se de inovação do legislador menorista, regulada no § 5º do
art. 42 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Diz o dispositivo
que a adoção poderá ser deferida ao adotante que, após
inequívoca manifestação de vontade, vier a falecer no curso do
procedimento, antes de prolatada a sentença. É chamada pela
doutrina de adoção póstuma, porque a sentença é sempre
proferida supervenientemente à morte do adotante.
Pode-se verificar, portanto, que se forem preenchidos todos
os requisitos legais para a adoção, a morte do adotante não implica no
indeferimento da adoção. Pelo contrário, faz com que esta retroaja à data da
morte do postulante.
3.1.5 ADOÇÃO POR DIVORCIADOS E JUDICIALM ENTE SEPARADOS
A adoção por divorciados e por separados é válida, sendo
que esta encontra respaldo jurídico no artigo 42, § 4º203 do Estatuto da Criança e
do Adolescente, bem como no artigo 1.622 parágrafo único204 do Código Civil.
também entre aquele e os descendentes deste, e entre o adotado e todos os parentes do
adotante.
201
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de família. p.349.
202
SILVA, José Luiz Mônaco da. A família substituta no Estatuto da Criança e do Adolescente.
p 110.
203
Art. 42. Podem adotar os maiores de vinte e um anos, independentemente de estado civil. (...)
§ 4º Os divorciados e os judicialmente separados poderão adotar, conjuntamente, contanto que
61
Porém, tal espécie de adoção estabelece condições para
sua efetivação. Tavares205, embasado no Estatuto da Criança e do Adolescente,
assim expõe seu comentário acerca das condições para a adoção por divorciados
e separados:
Ampara o § 4º as crianças ou adolescentes que se achavam em
estágio de convivência com os adotantes sobrevindo a separação
ou o divórcio do casal. Poderá, ainda assim, haver a adoção
conjunta que estava sendo preparada se concordarem entre si os
interessados sobre dois pontos. O primeiro: com qual dos
adotantes – pai ou mãe – ficará o encargo da guarda do menor. O
segundo: regulação do direito – dever de visita ao filho adotado,
da mesma maneira como se dá com referencia a quaisquer outros
filhos.
Cabe salientar que tal situação é juridicamente legal, mas há
que se manter uma relação equilibrada entre os ex companheiros, a fim de
possibilitar ao adotado um ambiente familiar adequado.
3.2 ADOÇÃO NO BRASIL: O PRINCÍPIO DA AFE TIVIDADE E DO MELHOR
INTERESSE DO ADOTANDO
A adoção visa oferecer ao adotado uma melhor perspectiva
de vida, sendo que a afetividade no âmbito familiar é questão indiscutível.
Atualmente, se leva em consideração o ambiente familiar
adequado, equilibrado e amoroso, a fim de que o adotando possa ter da família
acordem sobre a guarda e o regime de visitas, e desde que o estágio de convivência tenha sido
iniciado na constância da sociedade conjugal.
204
Art. 1622. Ninguém pode ser adotado por duas pessoas, salvo se forem marido e mulher, ou se
viverem em união estável.
Parágrafo único. Os divorciados e os judicialmente separados poderão adotar conjuntamente,
contanto que acordem sobre a guarda e o regime de visitas, e desde que o estágio de
convivência tenha sido iniciado na constância da sociedade conjugal.
205
TAVARES, José de Farias. Comentário ao Estatuto da Criança e do adolescente. p. 55.
62
que o acolheu com afeto, todo carinho e cuidados que sua família biológica não
lhe pode oferecer.
Neste sentido, Lôbo206 destaca que a afetividade deve ser
tratada como um princípio:
Projetou-se, no campo jurídico-constitucional, a afirmação da
natureza da família como grupo social fundado essencialmente
nos laços de afetividade. Encontra-se na Constituição Federal
brasileira três fundamentos essenciais do princípio da afetividade,
constitutivos dessa aguda evolução social da família, máxime
durante as últimas décadas do Século XX: a)todos os filhos são
iguais, independentemente de sua origem (art. 227, § 6º); b)a
adoção, como escolha afetiva, alçou-se integralmente ao plano da
igualdade de direitos (art. 227, § 5º e 6º); c)a comunidade formada
por qualquer dos pais e seus descendentes, incluindo-se os
adotivos, tem a mesma dignidade de família constitucionalmente
protegida (art. 226, § 4º).
Segundo Lôbo207, entende-se por princípio como sendo uma
“espécie do gênero norma jurídica constitucional, que não fica à mercê da norma
jurídica infra constitucional regulamentadora”.
Menciona ainda que de um princípio surgem efeitos
imediatos e determinantes, como passa a expor:
1. Imposição permanente ao legislador, para que o densifique
com os conteúdos prevalecentes em cada época, mediante
normas infraconstitucionais (eficácia positiva);
2. Conformação fundamental das normas infraconstitucionais,
que devem ser aplicadas e interpretadas a partir e segundo o
princípio constitucional (eficácia positiva);
206
LÔBO, Paulo Luiz Netto. Princípio jurídico da afetividade na filiação. Jus Navigandi,
Teresina,
a.
4,
n.
41,
maio.
2000.
Disponível
em:
http://jus
jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=527. Acesso em 30 de mar. de 2006.
207
LÔBO, Paulo Luiz Netto. Princípio jurídico da afetividade na filiação. Jus Navigandi,
Teresina,
a.
4,
n.
41,
maio.
2000.
Disponível
em:
http://jus
jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=527. Acesso em 30 de mar. de 2006.
63
3. Compatibilização limitante das normas infraconstitucionais,
que não podem com o princípio colidirem, sob pena de
inconstitucionalidade ou de revogação (eficácia negativa).
Ante o exposto, resta configurado que o princípio da
afetividade encontra respaldo na Constituição Federal, visto que trata da
dignidade humana.
Levando em consideração a afetividade no ambiente
familiar, o carinho dispensado pelos adotantes à criança, em caráter
exemplificativo, verifica-se jurisprudência do Tribunal de Justiça de Santa
Catarina208, se não vejamos:
EMENTA:
DIREITO
DE
FAMÍLIA
GUARDA
E
RESPONSABILIDADE - CRIANÇA COM DOIS DIAS DE VIDA
ENTREGUE PELA MÃE BIOLÓGICA A PRETENDENTES A
GUARDA E ADOÇÃO - CASAL À ÉPOCA NÃO CADASTRADO
NA LISTA DE FUTUROS ADOTANTES - PROCEDIMENTO DE
INCLUSÃO EM TRÂMITE - GUARDA INDEFERIDA RIGORISMO DA MEDIDA QUE SE VERIFICA NA HIPÓTESE
COMO INJUSTIFICÁVEL E DESACONSELHÁVEL - ESTUDO
SOCIAL FAVORÁVEL AO CASAL QUE JÁ DETINHA A GUARDA
POR MAIS DE SETE MESES - INTERESSE DA MENOR QUE SE
SOBRELEVA À INOBSERVÂNCIA DAS FORMALIDADES DO
PROCESSAMENTO DA PERFILHAÇÃO - INEXISTÊNCIA DE
ELEMENTOS QUE JUSTIFIQUEM A RETIRADA DA INFANTE
DA FAMÍLIA QUE A ACOLHERA - RECURSO PROVIDO
"pela interpretação teleológica da constituição federal e do
estatuto da criança e do adolescente, evidencia-se como
desaconselhável sob todos os aspectos a retirada de uma menor
do ambiente familiar onde se encontra há meses para colocá-la
em abrigo ou em outra família. A excepcionalidade de tal
providência está reservada tão-somente às medidas de proteção,
cujas hipóteses estão expressamente delineadas no art. 98 do
estatuto da criança e do adolescente.
Como corolário, deve a
208
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina. Agravo de instrumento n.º.
2005.004104-9, da 3ª Câmara de Direito Civil. Comarca de Blumenau. Relator: Des. Marcus
Túlio Sartorato. Data da Decisão: 12/08/2005. Disponível em: http//www.tj.sc.gov.br. Acesso em
10 de março de 2006.
64
menor permanecer em companhia daqueles que a acolheram
desde os primeiros dias de vida, com a anuência da mãe
biológica, e passaram desde então a provê-la de todos os
cuidados necessários à sobrevivência, incluídos educação,
alimentação, lazer e, sobretudo, carinho familiar. Eventual
repreensão a meios escusos utilizados, como, por exemplo, a
denominada 'adoção à brasileira', por si só, não pode sobrepujar
os interesses maiores e o bem-estar da criança".
Os laços afetivos, o carinho familiar, não são oriundos
apenas de uma filiação consangüínea, mas também de uma filiação adotiva, visto
que o convívio familiar cria laços de afeto duradouros.
Freire, apud Granato209, acerca dos sentimentos que
envolvem uma adoção, relata o seguinte:
Aproximar-se da adoção é aproximar-se dos sentimentos mais
profundos, é conhecer êxitos e fracassos, é perceber o lado
positivo e o lado negativo de milhares de pessoas, é ver as mais
belas manifestações de solidariedade e também, as mais duras
expressões de egoísmo e insensibilidade. Aproximar-se da
adoção é deixar-se levar por caminhos desconhecidos, muitas
vezes obscuros; é descobrir novos horizontes, guiados pelas luzes
da coragem e da esperança.
A adoção é um ato que envolve amor, respeito, e sobretudo
afeto, equipara-se a uma filiação biológica, e, portanto, o convívio origina os laços
afetivos necessários a uma estrutura familiar adequada.
Para Schreiber210, a adoção atualmente deve atender o
melhor interesse do adotando. Neste sentido, diz o seguinte:
Importante ressaltar que antigamente, a finalidade da adoção era
dar filhos a quem não os tivesse. Atualmente, esse quadro
209
210
GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção: doutrina e prática. p. 13.
SCHREIBER, Elisabeth. In TRINDADE, Jorge. Direito da Criança e do Adolescente: Uma
abordagem multidisciplinar. Revista do Ministério Público do Rio Grande do Sul. Porto Alegre:
Livraria do Advogado Ed. , 2005. p. 208.
65
inverteu-se: a adoção serve para dar uma família ao adotando,
prevalecendo, portanto, o interesse da criança. É uma medida de
proteção aos direitos da criança e do adolescente, e não um
mecanismo de satisfação de interesses de adultos. Trata-se,
sempre de encontrar uma família adequada a uma determinada
criança, e não de buscar uma criança para aqueles que querem
adotar.
A legislação vigente trata do melhor interesse da criança
tanto no Código Civil quanto no Estatuto da Criança e do Adolescente.
Em relação ao Código Civil, tal situação encontra o
dispositivo legal no artigo 1.625, ou seja: “Somente será admitida a adoção que
constituir efetivo benefício para o adotando”.
Seguindo a mesma linha, o artigo 43 do Estatuto da Criança
e do Adolescente menciona: “A adoção será deferida quando apresentar reais
vantagens para o adotando e fundar-se em motivos legítimos”.
A Convenção Internacional do Direitos da Criança também
evidencia a necessidade de se levar em consideração o melhor interesse da
criança. Em relação ao exposto, Pereira211 menciona:
Destacamos, especialmente, o princípio do “melhor interesse da
criança”, indicado no artigo 3º da Convenção Internacional sobre
os direitos da Criança (ONU, 89) ao declarar que “todas as ações
relativas às crianças, levadas a efeito por instituições públicas ou
privadas de bem estar social, tribunais, autoridades
administrativas ou órgãos legislativos, devem considerar,
primordialmente, o interesse maior da criança”.
O princípio do melhor interesse da criança deverá ser
observado e aplicado ao caso concreto. Em caráter ilustrativo, segue
entendimento jurisprudencial do Tribunal de Justiça de Santa Catarina212:
211
PEREIRA, Tânea da Silva. In DIAS, Maria Berenice . Direito de Família e o Novo Código
Civil. 2 ed. Belo Horizonte: Del Rey, p. 140.
212
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina. Apelação Cível 1999.019583-0, da
1ª Câmara de Direito Civil. Comarca de Florianópolis. Relator Desª. Salete Silva Sommariva.
66
EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE GUARDA E BUSCA E
APREENSÃO DE MENOR CUMULADA COM ANULAÇÃO DE
REGISTRO FALSO - PRETENDIDA COMPETÊNCIA DO JUÍZO
DA INFÂNCIA E JUVENTUDE - PRELIMINAR AFASTADA. Não
se encontrando a infante em situação de abandono, é indiscutível
a competência da vara da família para processar e julgar a
presente demanda. APELAÇÃO CÍVEL - VALIDAÇÃO DO
REGISTRO DE NASCIMENTO - CONSOLIDAÇÃO DOS LAÇOS
FAMILIARES E AFETIVOS PELO TEMPO - RECURSO
PROVIDO. Tendo a mãe biológica postulado a guarda da menor
há muito consolidada pelo convívio da infante com outra família,
inviável resta seu deferimento, tendo-se sempre em vista os
interesses da menor que possui prioridade absoluta garantida
constitucionalmente.
O princípio do melhor interesse da criança e do adolescente
é assim empregado por estar previsto na Convenção Internacional sobre os
direitos da criança (ONU, 1989). Contudo, tal regra é aplicada também nos casos
do adotando ter mais de dezoito anos completos.
Verifica-se, portanto, que os princípios da afetividade e do
melhor interesse do adotando devem ser observados pelo
legislador e pelo
intérprete da norma jurídica, a fim de buscar a solução do caso concreto, para a
constituição ou não da adoção.
3.3 OS PROCEDIMENTOS NECESSÁRIOS PAR A A REALIZAÇÃO DE UMA
ADOÇÃO
Existem algumas etapas necessárias a serem cumpridas
pelos adotantes para se proceder a adoção legal no Brasil.
Data da Decisão: 03/06/2003. Disponível em: http//www.tj.sc.gov.br. Acesso em 10 de março de
2006.
67
Souza213 nos esclarece tal procedimento da seguinte
maneira
“as
pessoas
interessadas
terão
que
percorrer
as
instituições
encarregadas, procurar a Vara da Infância e Juventude (Juizado de Menores),
providenciar documentos e entrar na fila de espera”.
Ressalta-se que nas comarcas onde houver ambas, os
interessados em adotar crianças e adolescentes deverão se encaminhar até a
Vara da Infância e Juventude, e os interessados em adotar alguém com dezoito
anos completos, ou mais, deverá se encaminhar até a Vara da Família.
A Vara de Família do Fórum agendará uma entrevista com
os interessados, sendo que nesta entrevista os candidatos à adoção receberão
uma lista de documentos necessários para o início do processo.
Esta entrevista será realizada por assistentes sociais. Tal
procedimento é melhor explicado por Souza214:
Hoje, as assistentes sociais fazem uma série de entrevistas com
os casais. Uma sondagem sutil, onde são avaliados os aspectos
morais, sociais, espirituais e afetivos do futuro lar da criança para
perceber se o casal está realmente decidido a assumir a
paternidade e se está em condições de adotar.
São necessários alguns documentos que seguem as regras
próprias de cada comarca, mas em geral são os requisitados pela Comissão
Estadual Judiciária de Adoção215.
No estado de Santa Catarina os documentos são os
seguintes:
1. Requerimento dirigido ao Juiz da Infância e da juventude; 2.
Atestado de antecedentes criminais; 3. Atestado de sanidade
213
SOUZA, Hália Pauliv. Adoção é doação. Curitiba: Juruá, 2003. p. 23.
214
SOUZA, Hália Pauliv. Adoção é doação. p. 23.
215
CEJA – Comissão Estadual Judiciária de Adoção. Adoção em Santa Catarina. Cleverson
Oliveira. Secretário Jurídico – organizador. Florianópolis, SC. 2001, p. 12.
68
física e mental; 4.Comprovante de rendimentos; 5. Comprovante
de residência; 6. Certidão de casamento; 7. Carteira de
identidade; 8. Estudo social elaborado por assistente social do
Fórum da cidade onde residem os requerentes.
Após esta entrevista os prováveis adotantes preencherão a
denominada ficha de triagem, onde poderão selecionar o tipo físico, idade e sexo
da criança que pretendem adotar. A partir desse momento, integrarão uma lista
de espera.
Assim que aprovada a ficha, os prováveis adotantes já estão
aptos a adotar, devendo assim aguardar a chegada do filho desejado.
Assim que uma criança portadora do perfil desejado pêlos
adotantes seja encontrada, o candidato à adoção é contatado.
O início do processo de adoção, conforme esclarece
Granato216, será feito da seguinte maneira:
(...)através de petição inicial, formulada por advogado, ou nos
termos do art. 166217 do Estatuto, por exceção, poderá ser
formulado diretamente em cartório, em petição assinada pêlos
próprios requerentes, se os pais forem falecidos ou se tiverem
sido destituídos ou suspensos do pátrio poder, ou houverem
aderido expressamente ao pedido de colocação em família
substituta. No parágrafo único do mesmo artigo, há a exigência de
oitiva dos pais pela autoridade judiciária e pelo representante do
Ministério Público e de se tomar a termo as declarações, na
hipótese de concordância com o pedido.
216
GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção: doutrina e prática. p. 97.
217
Art. 166. Se os pais forem falecidos, tiverem sido destituídos do pátrio poder, ou houverem
aderido expressamente ao pedido de colocação em família substituta, este poderá ser formulado
diretamente em cartório, em petição assinada pelos próprios requerentes.
Parágrafo único. Na hipótese de concordância dos pais, eles serão ouvidos pela autoridade
judiciária e pelo representante do Ministério Público, tomando-se por termo as declarações.
69
Os pedidos de colocação em família que substitua a família
de origem, no caso a adoção, seguem os requisitos enunciados no artigo 165 do
Estatuto da Criança e do Adolescente, que são:
Art. 165. São requisitos para a concessão de pedidos de
colocação em família substituta:
I – qualificação completa do requerente e de seu eventual
cônjuge, ou companheiro, com expressa anuência deste;
II – indicação de eventual parentesco do requerente e de seu
cônjuge, ou companheiro,
com a criança ou adolescente,
especificando se tem ou não parente vivo;
III – qualificação completa da criança ou adolescente e de seus
pais, se conhecidos;
IV – indicação do cartório onde foi inscrito nascimento, anexando,
se possível, uma cópia da respectiva certidão;
V – declaração sobre a existência de bens, direitos ou
rendimentos relativos à criança ou ao adolescente.
Parágrafo único. Em se tratando de adoção, observar-se-ão
também os requisitos específicos.
A respeito da colocação do adotando em nova família,
Granato218 menciona o seguinte:
O Juiz poderá, liminarmente, ouvido o órgão do Ministério Público,
determinar a entrega da criança ou do adolescente aos adotantes,
mediante termo de guarda e de responsabilidade, enquanto se
processa a adoção. Esse documento, o termo de guarda, é
indispensável, porque legitima a posse do adotando com seus
futuros pais adotivos.
218
GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção: doutrina e prática. p. 98.
70
Porém, antes de conceder a guarda do menor ao provável
adotante, far-se-á uma investigação prévia. Szinick219 relata: “Ao conceder a
guarda o juiz determina uma investigação preliminar não só para fixar o período
de estágio, mas para verificar as condições familiares e sócio econômicas do
adotante”.
Passarão então,
adotante e
adotando, pelo
período
denominado estágio de convivência, sendo que durante este período o candidato
faz visitas e realiza um acompanhamento à criança no abrigo ou instituição que a
mesma se encontra, e a leva para sua casa.
A partir do trânsito em julgado da decisão judicial, se opera
plenamente a adoção.
3.3.1 O ESTÁGIO DE CONVIVÊNCIA E A ADOÇÃO LEGAL NO BRASIL
O Estatuto da criança e do adolescente, em seu artigo 46
trata do estágio de convivência, que é o período de adaptação entre adotante e
adotando, antes de ser constituída tal filiação civil.
O artigo 46 do Estatuto da Criança e do Adolescente dispõe:
Art. 46. A adoção será precedida de estágio de convivência com a
criança ou adolescente, pelo prazo que a autoridade judiciária
fixar, observadas as peculiaridades do caso.
§ 1º. O estágio de convivência poderá ser dispensado se o
adotando não tiver mais de um ano de idade ou se, qualquer que
seja a sua idade, já estiver na companhia do adotante durante
tempo suficiente para se poder avaliar a convivência da
constituição do vínculo.
219
SZNICK, Valdir. Adoção: Direito de família, guarda de menores, tutela, pátrio poder, adoção
internacional. São Paulo: LEUD. p. 85.
71
§ 2º. Em caso de adoção por estrangeiro residente ou domiciliado
fora do País, o estágio de convivência, cumprido no território
nacional, será de no mínimo quinze dias para crianças de até dois
anos de idade, e de no mínimo trinta dias quando se tratar de
adotando acima de dois anos de idade.
O parágrafo primeiro do artigo 46 do mencionado estatuto
relata que o estágio de convivência pode ser dispensado se o adotando não tiver
mais de um ano de idade.
Venosa220 justifica tal dispensa da seguinte forma: “a criança
em tenra idade adapta-se com facilidade à nova família, daí por que pode ser
dispensado o estágio”.
No que tange ao parágrafo segundo do referido artigo, no
caso de adoção por estrangeiros221, o estágio de convivência deve ser cumprido
no Brasil.
Nesse sentido, mencionam Cury, Garrido & Marçura222:
O estágio de convivência não pode ser cumprido no exterior (...) O
estágio na adoção internacional não pode ser dispensado. A lei
estabeleceu prazos mínimos, podendo a autoridade judiciária
ampliá-los, segundo seu prudente arbítrio.
Para Tavares223, o estágio de convivência se justifica pelo
seguinte:
O estágio de convivência propicia condições de conhecimento
mútuo entre aqueles que se preparam para a séria e grave
vinculação familiar, completa e definitiva. Destina-se ao aferimento
dos atributos pessoais, compatibilidades ou incompatibilidades. O
220
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de família. p.340.
221
A adoção por estrangeiros não será tratada nesta monografia.
222
CURY, Munir. Estatuto da Criança e do Adolescente anotado / Cury, Garrido & Marçura. 3
ed. ver. e atual. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 2002. p. 61.
223
TAVARES, José de Farias. Comentário ao Estatuto da Criança e do adolescente. p. 56 e
57.
72
período dessa observação deve durar enquanto conveniente à
sua finalidade, questão de fato a ser decidida pelo juiz em cada
caso concreto.
Seguindo o mesmo direcionamento, Venosa224 esclarece a
finalidade do estágio de convivência, ou seja:
Esse estágio tem por finalidade adaptar a convivência do
adotando ao novo lar. O estágio é um período em que se
consolida a vontade de adotar e de ser adotado. Nesse estágio,
terão o juiz e seus auxiliares condições de avaliar a conveniência
da adoção.
Conforme
Granato225:
“Esse
estágio
é
um
período
experimental em que o adotando convive com os adotantes, com a finalidade
precípua de se avaliar a adaptação daquele à família substituta, bem como a
compatibilidade desta com a adoção”.
Pode-se afirmar que o estágio de convivência é importante,
e que o prazo estabelecido pela autoridade judiciária deve ser respeitado, visto
que visa criar laços de afetividade entre adotante e adotando.
3.3.2 A ADOÇÃO LEGAL E O REGISTRO DE NAS CIMENTO DO ADOTADO
A inscrição no registro civil, decorrente da adoção, se dá por
sentença, conforme menciona Venosa226: “Após o trânsito em julgado será inscrita
no Cartório do Registro Civil, mediante mandado do qual não será fornecida
certidão. É cancelado o registro original do adotado, não mais se fazendo menção
quanto à modificação”.
224
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de família. p. 340.
225
GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção: doutrina e prática. p. 80.
226
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de família. p. 342.
73
O artigo 47 do Estatuto da Criança e do Adolescente relata a
possibilidade de alteração do registro de nascimento. Desta forma, menciona o
referido artigo:
Art. 47. O vínculo da adoção constitui-se por sentença judicial,
que será inscrita no registro civil mediante mandado do qual não
se fornecerá certidão.
§ 1º A inscrição consignará o nome dos adotantes como pais, bem
como o nome de seus ascendentes.
§ 2º O mandado judicial, que será arquivado, cancelará o registro
original do adotado.
§ 3º nenhuma observação sobre a origem do ato poderá constar
nas certidões do registro.
§4º A critério da autoridade judiciária, poderá ser fornecida
certidão para a salvaguarda de direitos.
§ 5º A sentença conferirá ao adotado o nome do adotante e, a
pedido deste, poderá determinar a modificação do prenome.
§ 6º a adoção produz seus efeitos a partir do transito em julgado
da sentença, exceto na hipótese prevista no artigo 42, § 5º, caso
em que terá força retroativa à data do óbito.
Acerca do referido assunto, Rodrigues227 assim expõe seu
pensamento:
Elemento complementar da forma de adoção é a inscrição no
Registro Civil. Trata-se, em rigor, da abertura de novo assento de
nascimento, pois o original será cancelado. O novo assento,
obedecendo a sentença, atribuirá ao adotado, como visto, o nome
de família do adotante. E, numa exceção à regra da Lei de
Registros Públicos que o proíbe, a lei superveniente permite a
227
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Direito de Família. p.350.
74
alteração até do prenome do adotado, se assim o pleitear o
adotante ou o adotando menor.
Da mesma forma que o Estatuto da Criança e do
Adolescente, o Código Civil, em seu artigo 1.627, também menciona a alteração
do prenome e sobrenome do adotado: “A decisão confere ao adotado o
sobrenome do adotante, podendo determinar a modificação de seu prenome, se
menor, a pedido do adotante ou do adotado”.
Segundo Venosa228, “a sentença que concede a adoção tem
cunho constitutivo. Quando prolatada a sentença de adoção, opera-se
simultaneamente a extinção do poder familiar229”.
Da mesma forma que a adoção de crianças e adolescente,
regulada pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, a adoção de maiores de 18
anos, regulada pelo Código Civil, dependerá da assistência efetiva do poder
público, e de sentença constitutiva, conforme menciona o parágrafo único do
artigo 1.623230.
Neste sentido, Gonçalves231 menciona que:
Competirá aos juizes de varas de família a concessão da medida
aos adotandos que já atingiram a maioridade, ressalvada a
competência exclusiva do juízo da infância e da juventude para
concedê-la às crianças e adolescentes, bem como aos que
completaram dezoito anos de idade e já estavam sob a guarda ou
228
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: Direito de família. p. 343.
229
Poder Familiar. “é um complexo de direitos e deveres quanto à pessoa e bens do filho,
exercidos pelos pais na mais estreita colaboração, e em igualdade de condições”. Conforme
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil. 14 ed. Rio de Janeiro: Forense,
2004. p. 421.
230
Art. 1623. A adoção obedecerá a processo judicial, observados os requisitos estabelecidos
neste código.
Parágrafo Único. A adoção de maiores de dezoito anos dependerá, igualmente, da assistência
efetiva do Poder Público e de sentença constitutiva.
231
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de Família. p. 105.
75
tutela dos adotantes, como prevê o art. 40232 do mencionado
Estatuto.
Ainda em consonância com o autor supra citado, o mesmo
menciona que: “A sentença de adoção será averbada no cartório do Registro
Civil”, conforme menciona o Código Civil, em seu artigo 10, inciso III233.
A Lei 6.015234, de 31 de dezembro de 1973 trata dos
Registros Públicos, sendo que o artigo que regulamenta o registro de nascimento
é o artigo 50, que informa o seguinte:
Art. 50. Todo nascimento que ocorrer no território nacional deverá
ser dado a registro, no lugar em que tiver ocorrido o parto ou no
lugar da residência dos pais, dentro do prazo de 15 (quinze) dias,
que será ampliado em até 3 (três) meses para os lugares
distantes mais de 30 (trinta) quilômetros da sede do cartório (...).
O registro de nascimento falso, que configura a “adoção a
brasileira”, se dá por maneira simples, conforme menciona Granato235:
Esse registro, feito no Cartório de Registro Civil das Pessoas
Naturais, é extremamente fácil, já que basta o suposto pai ou mãe
ali comparecer e declarar o nascimento, obedecendo ao disposto
no artigo 54 da Lei de Registros Públicos (Lei 6.015, de
31.12.1973).
Seguindo o mesmo pensamento, Tânea Pereira236 relata que
o registro de nascimento de uma adoção à brasileira ocorre quando:
232
Art. 40. O adotando deve contar com, no máximo, dezoito anos à data do pedido, salvo se já
estiver sob a guarda ou tutela dos adotantes.
233
Art. 10. Far-se-á a averbação em registro público: (...) III – dos atos judiciais ou extrajudiciais de
adoção.
234
Lei nº.6.015, de 31 de dezembro de 1973. Dispõe sobre os Registros Públicos e dá outras
providências.
235
236
GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção: doutrina e prática. p. 130 e 131.
PEREIRA, Tânea da Silva. Direito da criança e do adolescente: uma proposta disciplinar. Rio
de Janeiro: Renovar, 1996. p. 271.
76
(...) o casal registra criança tida por terceiro como sendo seu filho,
usando declarações falsas das maternidades ou hospitais ou
mesmo usando o artifício de a mulher comparecer a cartório
acompanhada de duas testemunhas e declarar que teve o filho em
casa. Nesta situação é dispensada a apresentação de qualquer
documento oficial, mesmo de um médico.
Desta forma, fica evidenciado que a facilidade em efetuar o
registro de nascimento de uma criança contribui para uma adoção irregular.
Ocorre que, quando descoberta a adoção irregular, o
registro será anulado, conforme menciona Szinick237:
Na “adoção à brasileira”, registra-se o filho como se fosse próprio,
ou seja, nascido daqueles pais. Não se trata de, como pensam
alguns, de uma ficção mas sim de pura e simples simulação.
Descoberta essa “adoção” a conseqüência é, desde logo, a
anulação do registro civil. Não se trata de cancelamento mas sim
de anulação pois o ato sequer existiu. Com essa anulação
extingue-se todo o ato simulado.
Desta forma, verifica-se que o registro de nascimento de
uma criança, quando irregular, efetuada mediante a “adoção à brasileira”, se
descoberto, é passível de anulação.
3.4 “ADOÇÃO À BRASILEIRA”
A denominada “adoção à brasileira” é aquela onde alguém
registra filho alheio como próprio. Esta conduta está demonstrada no artigo 242
do Código Penal238. Diz o referido artigo:
Art. 242. Dar parto alheio como próprio; registrar como seu o filho
de outrem; ocultar recém nascido ou substituí-lo, suprimindo ou
237
SZNICK, Valdir. Adoção: Direito de família, guarda de menores, tutela, pátrio poder, adoção
internacional. p.435.
238
BRASIL. Decreto Lei n.º. 2.848, de 07.12. 1940, Código Penal. São Paulo: Saraiva, 2006.
77
alterando direito inerente ao estado civil: Pena – reclusão, de 2
(dois) a 6 (seis) anos. Parágrafo Único. Se o crime é praticado por
motivo de reconhecida nobreza:
Pena – detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos, podendo o juiz deixar
de aplicar a pena.
Liberati239
nos
esclarece
tal
conduta:
“Existe
um
nascimento, existe a criança, mas sua filiação não é aquela que está sendo
declarada”.
Existem vários motivos que levam alguém a optar pela
adoção à brasileira. Neste sentido, Marmitt240 diz o seguinte:
Muitos casais que não podem ter filhos e tem condições para criálos não desejam submeter-se aos tramites legais, como
constituição de advogado, audiências no fórum, entrevistas com
técnicos do juizado, etc. Também não querem tornar público
terem adotado uma criança. Procuram, então, simplificar as
coisas. Apoderam-se de algum recém-nascido, abandonado pela
mãe, geralmente solteira, e se dirigem ao cartório, fazendo o
registro em seu nome, como filho biológico fosse. Semelhante
procedimento tem sido incentivado por médicos, enfermeiras,
assistentes sociais, religiosas e até por autoridades judiciárias,
que tem fechado os olhos, em vista dos fins nobres e sociais, de
elevado teor humanistico e assistencial, que o ato colima.
Dentre
os motivos que levam alguém a efetuar o falso
registro de nascimento, possivelmente o maior deles seja o medo de que lhe seja
tirado do convívio familiar uma criança que, afetivamente, já lhe é filho, para que a
mesma seja entregue a outro pretendente, já cadastrado, e apto para receber
uma criança.
Ainda referente aos motivos que levam uma pessoa a
praticar a adoção à brasileira, Granato241 menciona o seguinte:
239
LIBERATTI, Wilson Donizeti. Comentários ao Estatuto da Criança e do adolescente. 6 ed.
São Paulo: Malheiros, 1995, p. 202.
78
(...) fácil é intuir que, dentre eles, estão a esquiva de um processo
judicial de adoção demorado e dispendioso, mormente quando se
tem que contratar advogado; o medo de não lhe ser concedida a
adoção pêlos meios regulares e, pior ainda, de lhe ser tomada a
criança, sob o pretexto de se atender a outros pretendentes há
mais tempo “na fila” ou melhor qualificados; ou, ainda, pela
intenção de se ocultar à criança a sua verdadeira origem.
A adoção à brasileira não encontra terminologia na
legislação. Esta denominação é uma criação da jurisprudência242, conforme
menciona Gonçalves243:
A simulada ou à brasileira é uma criação da jurisprudência. A
expressão “adoção simulada” foi empregada pelo Supremo
Tribunal Federal ao se referir a casais que registram filho alheio,
recém nascido, como próprio, com a intenção de dar-lhe um lar,
de comum acordo com a mãe e não com a intenção de tomar-lhe
o filho.
A questão que envolve a adoção à brasileira não deve ser
vista apenas como um ilícito penal, uma vez que, regra geral, o que se busca
nesta adoção ilegal é o amparo material e afetivo à criança, uma vez que os
genitores biológicos da mesma não puderam oferecer, ora porque não quiseram,
ora porque não puderam.
Mirabete244 relata que “não raro, porém, há conivência da
verdadeira mãe, o que não exclui a configuração do delito”.
Seguindo o mesmo direcionamento, Granato245 relata:
240
MARMITT, Arnaldo. Adoção. Rio de Janeiro: Aide, 1993. p. 159.
241
GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção: doutrina e prática. p. 131.
242
Jurisprudência: Pode-se defini-la como a “Ciência do Direito baseada em decisões dos
tribunais”. Conforme BENASSE, Paulo Roberto. Dicionário Jurídico. p. 210.
243
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito de Família. p. 102.
244
MIRABETE, Júlio Fabbrini. Manual de direito penal. 5 ed. rev. e atual. São Paulo: Atlas, 1990.
p. 42.
245
GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção: doutrina e prática. p. 131.
79
A mãe de sangue, geralmente impossibilitada de criar o recém
nascido, não se importa em entregar a criança a quem aparecer e
disser que tem melhor condições de fazê-lo e raramente tem
contato com a família adotante, contribuindo, assim, para o
sucesso desse tipo de “adoção”.
A mãe biológica que entrega seu filho à adoção, ainda que
esta seja feita de forma irregular, muitas vezes o faz com a consciência de que
não poderia criá-la, tanto pela falta de recursos financeiros como emocionais.
Neste sentido Souza246 menciona:
A mãe doadora é uma pessoa que permitiu que o filho nascesse.
Não abortou. Deseja encontrar uma família para seu bebê e não
deverá ser julgada. Não é uma pessoa má, bem como os pais
adotivos não são símbolos de bondade. Julgamentos cruéis
existem por desconhecimento de causa.
A mãe que doa o filho não deve, portanto, ser alvo de
críticas, visto que, sabendo não ter condições de criá-lo, busca uma família com o
intuito de que a criança tenha um lar adequado.
Destarte, no parágrafo único do referido artigo 242 do
Código Penal, quando comprovado que o crime foi cometido por motivo de
reconhecida nobreza, a pena é reduzida, podendo deixar de ser aplicada.
Granato247 dispõe:
A severidade da norma penal choca-se tão frontalmente com os
relevantes motivos sociais que acompanham imemorialmente atos
dessa natureza, que os sentimentos do homem médio comum –
dos quais não se pode excepcionar o juiz – que, com raras
exceções, são unânimes a doutrina e a jurisprudência em
diligenciar meios e pretextos para contornar o texto álgido da lei a
fim de não cominar pena alguma, quando alguns, entre esses
milhares de casos que anualmente ocorrem, chegam, por
qualquer circunstância às barras dos tribunais. Ninguém resiste à
246
SOUZA, Hália Pauliv. Adoção é doação. 2003. p. 62.
247
GRANATO, Eunice Ferreira Rodrigues. Adoção: doutrina e prática. p. 132.
80
verdadeira coação de ordem moral decorrente do alto valor
espiritual e humano que inspiram tais gestos.
Para Delmanto248, o perdão judicial249 se justifica porque:
“não havia o crime o crime quando a falsidade do registro era praticada por motivo
nobre, ou seja, quando o falso beneficiava o menor em vez de prejudicar seus
direitos”.
Em caráter exemplificativo, segue jurisprudência do Tribunal
de Justiça de Santa Catarina250 :
EMENTA: CRIME CONTRA O ESTADO DE FILIAÇÃO APLICAÇÃO DO ARTIGO 242, PARÁGRAFO ÚNICO, DO
CÓDIGO PENAL - PERDÃO JUDICIAL CONCEDIDO -PLEITO
MINISTERIAL
ALMEJANDO
A
CONDENAÇÃO
IMPOSSIBILIDADE - MOTIVO DE NOBREZA CARACTERIZADO.
RECURSO IMPROVIDO.
Desta forma, resta evidenciado pela jurisprudência que o
perdão judicial poderá ser aplicado ao caso.
O perdão judicial, quando comprovado o motivo de
reconhecida nobreza, é explicado por Szinick251:
O motivo “de reconhecida nobreza” engloba a chamada “adoção à
brasileira” (...). Esse motivo de “reconhecida nobreza”
compreende os atos de generosidade, de alta compreensão
humana, o altruísmo do ser humano, o ato movido pela compaixão
humana e tendo em vista o interesse do menor.
248
DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado. 6 ed. atual. e ampl. Rio de Janeiro: Renovar,
2002. p. 509.
249
Perdão Judicial: este ocorre “nos casos autorizados por lei, quando o juiz deixa de aplicar a
pena”. Conforme BENASSE, Paulo Roberto. Dicionário Jurídico. p. 252.
250
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina. Apelação Criminal 2004.004073-3,
da 1ª Câmara Criminal. Comarca de Anchieta. Relator Des. Juiz José Carlos Carstens Köhler.
Data da Decisão: 06/04/2004. Disponível em: http//www.tj.sc.gov.br. Acesso em 10 de março de
2006.
251
SZNICK, Valdir. Adoção: Direito de família, guarda de menores, tutela, pátrio poder, adoção
internacional. p.437.
81
A referida questão deve ser tratada de forma cuidadosa, e
observado o caso concreto, visto que na maioria das vezes a família que adota
busca o melhor interesse da criança, busca inserí-la num ambiente familiar,
cercado dos cuidados necessários, tanto materiais como afetivos.
3.5 REVERSÃO DA “ADOÇÃO A BRASILEIRA” PARA ADOÇÃO LEGAL NO
BRASIL
A adoção à brasileira, embora caracterize ilícito penal, é uma
prática comumente utilizada pela sociedade brasileira.
Em consonância com o
mencionado, uma
pesquisa
elaborada por Weber252 mostra o seguinte:
As adoções legais foram realizadas por 52,1% das famílias
participantes desta pesquisa, e a maioria das adoções informais
ocorreram através do registro em cartório da criança como filho
legítimo do casal que a adotou, através de uma declaração falsa
de nascimento (41,5%); o restante das adoções informais (6,4%)
seguiu o procedimento conhecido como filhos de criação, isto é, a
criança passa a morar definitivamente com outra família, mas sua
certidão de nascimento não é alterada, permanecendo com a
filiação de seus pais biológicos.
Verifica-se, portanto, que no referente as adoções ilegais, o
ilícito penal contido no artigo 242 do Código penal, o registro de filho alheio como
próprio, ou mais especificamente, a vulgarmente denominada adoção à brasileira
se faz presente na maioria dos casos de adoção ilegal.
Ocorre que a maioria dos casos em que acontece esta
adoção, os adotantes levam em consideração a afetividade, o carinho que desde
já nutrem pela criança, e o medo de que lhes seja tirado o filho amado, os leva ao
registro ilegal da criança.
252
WEBER, Lídia. Pais e Filhos por Adoção no Brasil. Juruá Editora. p. 114.
82
Porém, quando evidenciada a boa fé dos adotantes, em
razão do princípio da afetividade e do melhor interesse do menor, deve ser
convertida esta adoção irregular em adoção legal.
Em caráter ilustrativo, registra-se jurisprudência do Tribunal
de Justiça de Santa Catarina253, que assim decidiu:
EMENTA: DIREITO DE FAMÍLIA - ECA - ADOÇÃO - MÃE
BIOLÓGICA QUE ENTREGA MENOR AINDA NA MATERNIDADE
MEDIANTE INSTRUMENTO PARTICULAR DE DECLARAÇÃO A
FAMÍLIA SUBSTITUTA DEVIDAMENTE CADASTRADA NA
COMARCA
AÇÃO
ANULATÓRIA
MOVIDA
PELO
REPRESENTANTE DO MINISTÉRIO PÚBLICO - PEDIDO DE
BUSCA E APREENSÃO DA INFANTE DEFERIDO SOB O
ARGUMENTO DE TER HAVIDO ADOÇÃO À BRASILEIRA RIGORISMO DA MEDIDA QUE SE VERIFICA NA HIPÓTESE
COMO INJUSTIFICÁVEL E DESACONSELHÁVEL - INTERESSE
DA MENOR QUE SE SOBRELEVA À INOBSERVÂNCIA DAS
FORMALIDADES DO PROCESSAMENTO DA PERFILHAÇÃO INTERPRETAÇÃO TELEOLÓGICA DOS ARTIGOS 227 DA
CONSTITUIÇÃO, 6º DO ECA E 5º DA LICC - RECURSO
PROVIDO. Pela interpretação teleológica da constituição federal e
do estatuto da criança e do adolescente, evidencia-se como
desaconselhável sob todos os aspectos a retirada de uma menor
do ambiente familiar onde se encontra há meses para colocá-la
em abrigo ou em outra família. A excepcionalidade de tal
providência está reservada tão-somente às medidas de proteção,
cujas hipóteses estão expressamente delineadas no art. 98 do
estatuto da criança e do adolescente.
Como corolário, deve a
menor permanecer em companhia daqueles que a acolheram
desde os primeiros dias de vida, com a anuência da mãe
biológica, e passaram desde então a provê-la de todos os
cuidados necessários à sobrevivência, incluídos educação,
alimentação, lazer e, sobretudo, carinho familiar. Eventual
repreensão a meios escusos utilizados, como, por exemplo, a
253
BRASIL. Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina. Agravo de Instrumento
2004.007632-0, da 3ª Câmara de Direito Civil. Comarca de Navegantes. Relator Des. Marcos
Túlio Sartorato. Data da Decisão: 29/10/2004. Disponível em: http//www.tj.sc.gov.br. Acesso em 10
de março de 2006.
83
denominada "adoção à brasileira", por si só, não pode sobrepujar
os interesses maiores e o bem-estar da criança.
Assim, para reverter a “adoção à brasileira” em adoção legal,
deverá ser observado se os adotantes são pessoas que preenchem os requisitos
necessários contidos no Código Civil e no Estatuto da Criança e do Adolescente,
e avaliados pelo intérprete da norma jurídica, a fim de se averiguar o caso
concreto e verificar a possibilidade da criança permanecer na família que já a
havia acolhido, caracterizados os laços de afetividade e o melhor interesse do
adotando, tanto da adoção de menores como da adoção de maiores de dezoito
anos.
84
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente monografia teve como objeto tratar da (im)
possibilidade de reversão da “adoção à brasileira” para uma adoção legal no
Brasil. O principal objetivo do presente trabalho foi o de demonstrar e ressaltar a
importância da afetividade e do melhor interesse da criança nos casos de adoção,
ainda quando esta tenha sido feita de modo irregular.
Para tanto, o primeiro capítulo tratou do direito de família no
Brasil. Abordou a família de uma forma geral, porém, deu um enfoque especial à
filiação. Neste, pode-se constatar que o instituto da adoção surgiu na Idade Antiga
com intuito religioso, que era o de perpetuar o culto aos antepassados.
Verificou-se que a adoção atendia unicamente a vontade do
adotante, pois o casal que não tinha filhos biológicos não teria quem os cultuasse
após sua morte, ficando assim fadados ao esquecimento. Não se levava em
consideração, portanto, o interesse do adotado.
O advento do Cristianismo foi um marco na história da
adoção, visto que o enfoque desta mudou, pois a partir da era cristã, não mais se
cultuava os antepassados, mas a um Deus único. Passou-se então a dar um
enfoque diferente a adoção, admitindo-se a importância da filiação no grupo
familiar.
Tratou-se ainda o primeiro capítulo de conceituar a família,
onde foi possível verificar que o vocábulo família não possui uma acepção única,
pois pode englobar as diferentes espécies de grupo familiar existentes.
Para tanto foi utilizada a legislação, tanto aquela revogada
como a vigente, com o intuito de demonstrar a evolução histórica da família.
85
O capítulo segundo tratou da adoção no Brasil, elencou seu
conceito, seu histórico e
natureza jurídica. Tal natureza jurídica que gera
divergências, visto que parte acredita tratar-se de uma instituição, unilateral e
solene, e parte trata a adoção como uma espécie de contrato.
Tratou ainda o segundo capítulo de demonstrar o instituto da
adoção embasado na legislação vigente, tanto o Estatuto da Criança e do
Adolescente, de 1990, que trata da adoção de crianças e adolescentes de até
dezoito anos, quanto o Código Civil de 2002, que cuida da adoção para os
maiores desta idade.
Abordou-se que atualmente a adoção se apresenta apenas
na forma plena, não fazendo distinção alguma entre o filho biológico e o filho
adotivo, com a única ressalva dos impedimentos matrimoniais para este último.
Foram mencionados também os requisitos relativos à
adoção, tanto aqueles de ordem pessoal, que dizem respeito ao adotante e ao
adotando, bem como os requisitos de ordem formal, sendo que estes estão
elencados no Código Civil, e encontram correspondente no Estatuto da Criança e
do Adolescente.
Tratou-se ainda dos efeitos da adoção, tanto os de ordem
pessoal, que dizem respeito ao parentesco, ao poder familiar e ao nome, como
também aqueles de ordem patrimonial que dizem respeito aos alimentos e ao
direito sucessório.
Derradeiramente, foi relatada a investigação sobre a
inexistência, anulabilidade e nulidade da adoção. Também se verificou que a
adoção no Brasil é irrevogável.
No capítulo terceiro tratou-se da adoção legal no Brasil e da
“adoção à brasileira”. Neste foram demonstradas as hipóteses de adoção legal no
Brasil, as quais são: adoção unilateral; adoção por casados; adoção por
companheiros; adoção por separados ou divorciados, e a adoção póstuma.
86
Tratou-se
ainda
de
demonstrar
os
procedimentos
necessários à realização de uma adoção, bem como de ressaltar a importância do
estágio de convivência entre adotantes e adotandos, e também a forma como é
efetuado o registro de nascimento do adotado.
Por fim tratou-se da “adoção à brasileira”. Esta foi
conceituada e foi demonstrado seu enquadramento no âmbito penal , visto que
este tipo de adoção consiste em ilícito penal, como pôde ser constatado.
Foram demonstradas as conseqüências desta adoção
irregular, efetuada sem o devido
amparo legal, e também a possibilidade de
reversão desta adoção irregular para uma adoção legal.
Por fim, retoma-se as três hipóteses básicas desta pesquisa.
No que tange a primeira hipótese, restou confirmado que a
“adoção à brasileira” não é permitida no Brasil, ainda que seu uso seja
comumente utilizado no âmbito da família brasileira.
No que se refere a segunda hipótese, foi esclarecido que as
hipóteses legais de adoção no Brasil são as seguintes: adoção unilateral; adoção
por casados; adoção por companheiros; adoção por separados ou divorciados, e
a adoção póstuma.
No que se refere a terceira e última hipótese, pode-se
constatar que a “adoção à brasileira” pode se reverter para uma adoção legal no
Brasil, com base no principio da afetividade e o melhor interesse da criança.
Destarte, pode-se verificar que o que deve prevalecer é o
interesse do adotando. A entidade familiar disposta a adotar deve ter em mente
que a adoção é uma maneira de proporcionar ao adotado uma família, baseado
no afeto e no respeito mútuo.
Deve-se ter o intuito de proporcionar ao adotado uma melhor
perspectiva de vida e, principalmente, um ambiente familiar equilibrado e
saudável.
87
Assim, alerta-se que a pesquisa não teve o cunho de
esgotar o tema ao pacificar a discussão sobre o mesmo, mas contribuir para a
racionalização das teses jurídicas que discorrem sobre a (im) possibilidade de
reversão da “adoção à brasileira” para adoção legal.
88
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