relato de caso - Associação Catarinense de Medicina

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Arquivos Catarinenses de Medicina
ISSN (impresso) 0004- 2773
ISSN (online) 1806-4280
RELATO DE CASO
Seroma gigante pós hernioplastia incisional com tela
não absorvível (polipropileno)
Giant seroma after incisional hernioplasty with polypropylene mesh
Sérgio Lopes1, Anderson Mayer2, Vinícius Spiandorllo2, Alysson Matioski2, Flávia Bonato2, Ricardo Treml3
Resumo
Introdução
O seroma é uma complicação frequente na cirurgia
plástica, com incidência variável na literatura. Representa um grande transtorno para o cirurgião e um fator
importante de insegurança e insatisfação para o paciente. Relatamos um caso de seroma pós hernioplastia
incisional com tela não absorvível (polipropileno) com
dimensões de 13 x 21 x 25cm e peso aproximado de
8 (oito) kg. Após a ressecção da lesão a paciente foi
submetida a uma abdominoplastia em âncora devido a
lipodistrofia remanescente.
O tratamento da hérnia incisional com tela inabsorvível, principalmente a de polipropileno, está cada
vez mais difundido na prática cirúrgica em função da
redução da recidiva. O plano de inclusão desta prótese na parede abdominal está diretamente relacionado
com as taxas de complicações, sendo o seroma a mais
frequente. 1 A sua incidência é variável na literatura, e
representa um grande transtorno para o cirurgião e para
o paciente. Sua etiologia está relacionada à alteração
da velocidade de fechamento dos capilares linfáticos
e apresenta-se relativamente tardio. 2,3 Apesar da evolução benigna, pode apresentar alterações como encapsulamento, infecção, drenagens espontâneas entre
outras, vindo a comprometer o resultado cirúrgico.3
Descritores: Seroma gigante. Abdominoplastia em ân­
cora. Hernioplastia.
Abstract
O grande fator predisponente ao aparecimento do
seroma é o amplo descolamento do retalho abdominal
e a utilização de órteses, que além de gerar uma maior
área descolada para localização de coleções líquidas,
produzem desvascularização do retalho abdominal,
com maior lesão de vasos linfáticos.3
Seroma is a frequent complication in plastic surgery,
with variable incidence in the literature. It is cause of
inconvenience to the surgeon and an dissatisfaction for
the patient. We report a case of a seroma after incisional hernioplasty with nonabsorbable mesh (polypropylene) with dimensions of 13 x 21 x 25cm and weighing
approximately eight (8) kg. After resection of the lesion,
the patient had undergone a an inverted “T” abdominoplasty to correct the lipodystrophy.
O objetivo desse relato de caso é descrever uma complicação cirúrgica composta por seroma importante que
comprometia o aspecto e funcional da paciente. Além de
constituir-se num desafio ao tratamento cirúrgico.
Keywords: Giant seroma. Tummy tuck. Abdominoplasty.
Hernioplasty.
Relato de caso
Paciente do sexo feminino, 71 anos, sem comorbidades prévias, foi submetida a laparotomia para tratar abdome agudo inflamatório em 2006. No transoperatório
foi diagnosticado apendicite complicada com perfuração cecal, sendo realizado apendicectomia, colectomia
direita e anastomose primária. Evoluiu no pós-operatório com fístula entérica e necessidade de ileostomia
para o tratamento. Após um ano de estoma realizou
1. Preceptor do Serviço de Cirurgia Plástica do Hospital Evangélico de Curitiba.
Departamento de Cirurgia Plástica e Queimados do Hospital Universitário
Evangélico, Curitiba, PR, Brasil.
2. Residentes do Serviço Cirurgia Plástica do Hospital Evangélico de Curitiba.
Departamento de Cirurgia Plástica e Queimados do Hospital Universitário
Evangélico, Curitiba, PR, Brasil.
3. Acadêmico de medicina da Faculdade Evangélica do Paraná Estagiário Serviço Cirurgia Plástica do Hospital Evangélico de Curitiba. Curitiba, PR, Brasil.
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Seroma gigante pós hernioplastia incisional com tela não absorvível (polipropileno)
Discussão
reconstrução do trânsito intestinal sem intercorrências.
Em 2010 evoluiu com presença de hérnia incisional incapacitante com necessidade de intervenção cirúrgica.
Neste período realizou hernioplastia incisional com uso
de tela de polipropileno abaixo do plano subcutâneo.
As hérnias da parede abdominal são defeitos que
podem ser congênitas ou adquiridas. A hérnia incisional
(HI) é uma complicação frequente da laparotomia, com
incidência de 3% a 13%. 3
No pós-operatório precoce da correção da hérnia
apresentou um abaulamento na região abdominal. A ultrassonagrafia (US) evidenciou seroma de pequeno volume, sendo manejado clinicamente pelo cirurgião geral
que havia realizado o procedimento cirúrgico. O volume
desta lesão cística foi aumentando gradativamente e
18 meses após comprometeu significativamente a qualidade de vida da paciente. (figura 1). Na investigação
complementar a ultrassonografia demonstrou extensa
lesão sólida cística, heterogênica com septos parietais
livres, paredes espessas e dimensões aproximadas 13 x
21 x 25cm (figura 1). A tomografia abdominal e pélvica
evidenciou a lesão cística sobre a região da musculatura abdominal e transversa com medidas semelhantes a
do US com os demais órgãos íntegros (figura 1).
As hérnias incisionais decorrem da separação precoce da fáscia muscular no pós-operatório, em geral subclínica. 3 Durante os primeiros dias de pós-operatório
(0-30 dias), a resistência da ferida à tração é menor, resultando em forte dependência da integridade da sutura .4 Vários estudos têm comparado diferentes técnicas
de fechamento fascial e demonstraram não haver diferença entre sutura contínua versus separada. 4 Quanto
ao material de sutura, recomenda-se fio absorvível, uma
vez que diminui as complicações infecciosas, além de
evitar o “efeito de secção” na fáscia, o que poderia predispor a deiscência muscular. 3,4 Cerca de 50% de todas
as HI desenvolvem-se nos primeiros dois anos e três
quartos ocorrem dentro de três anos de pós-operatório.
3,4
A utilização das órteses (telas) para assegurar a força
da parede abdominal sem tensão diminuiu significativamente a taxa de recorrência das hérnias incisionais.
A cirurgia tradicional (“aberta”) com tela é considerada
a abordagem mais indicada no tratamento das HI. 4 Entretanto, uma grande desvantagem do reparo aberto da
hérnia é a necessidade de extensa dissecção dos tecidos moles realizada para colocação adequada da órtese. Isto resulta em desvascularização, espaço morto e
maior predisposição a formação de hematoma, seroma
e infecção. 3,4
Baseado na história clínica e exames complementares, a paciente foi submetida a procedimento cirúrgico
pela equipe de cirurgia plástica para ressecção da lesão
e correção da lipodistrofia abdominal. No transoperatório observou-se plano de clivagem entre a lesão cística
e a aponeurose, conforme constatado no exame tomográfico (figura 1). A lesão pesava em torno de 8 (oito) Kg
e na análise verificou-se presença de grumos, parede
espessa e presença da tela de polipropileno aderida a
parede inferior (figura 2).
Após a ressecção do cisto (Figura 2), realizou-se a
marcação, no intraoperatório, da abdominoplastia em
âncora devido a lipodistrofia remanescente. Realizou-se plicatura da aponeurose para correção da flacidez
na área da retirada da órtese. Os retalhos foram fixados
com múltiplos pontos de adesão utilizando fio de sutura monofilamentar inabsorvível.
O tempo de permanência hospitalar após a correção
laparoscópica é menor do que após a cirurgia aberta.
Dentre as desvantagens da técnica aberta destacam-se que a necessidade de dissecção dos tecidos moles,
drenos, o que aumenta a taxa morbidade e prolonga a
convalescença. 2-4
Coelho et al4 constatou que a formação de seromas foi a complicação mais frequente em seu estudo
(24,4%), comparável com vários outros estudos que reportam esta complicação em até um terço dos pacientes
. No entanto, como muitas vezes são assintomáticos, em
geral não são classificados como complicação verdadeira. A maioria dos seromas resolve espontaneamente
após 8 a 12 semanas conforme visto por Coelho et al4
em seu estudo em que 73% dos seromas reabsorveram
em até 12 semanas .
A síntese foi realizada em planos com sutura absorvível e utilização de dois drenos Suctor 4.8mm com orifício de entrada na região púbica.
A paciente evoluiu favoravelmente no pós-operatório, permanecendo com os drenos abdominais por
12 dias devido ao débito elevado. O laudo do exame
anátomo-patológico evidenciou cisto compatível com
seroma. No momento a paciente está realizando suas
atividades diárias sem limitações e satisfeita com resultado cirúrgico.
A opção pela conduta cirúrgica aberta, no caso apresentado, foi devido às dimensões alcançadas pela lesão
solida cística e pela possibilidade de correção da lipodistrofia abdominal no mesmo procedimento cirúrgico.
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Seroma gigante pós hernioplastia incisional com tela não absorvível (polipropileno)
O seroma é uma coleção fluida que apresenta
caracte­rísticas de exsudato com predomínio de neutrófilos e altas taxas de proteínas. Os mecanismos postulados para sua formação são: secção de numerosos
canais linfáticos, espaço morto decorrente do extenso
descolamento do retalho dermogorduroso, forças de cisalhamento entre o retalho e a aponeurose e liberação
de mediadores inflamatórios 5,6.
drenagem profilática reduzem significativamente esta
complicação.
Referências
1. Hoer J, Lawong G, Klinge U. Factors influencing the
development of incisional hernia: a retrospective
study of 2983 laparotomy patients over a period of
10 years. Chrirug. 2002; 73:474-80.
Os principais fatores predisponentes à formação do
seroma são a obesidade ou grandes perdas ponderais,
que resultam em um sistema linfático hipertrófico; a extensão da área de desco­lamento do retalho dermogorduroso, devido ao aumento do espaço morto; cicatriz
supraumbilical prévia, que funciona como uma barreira
à drenagem linfática; e a associação de lipoaspiração 6,7.
2. Mudge M, Hughes LE. Incisional hernia: a 10-year
prospective study of incidence and attitudes. Br J
Surg. 1985;72: 70-1.
3. Pollock AV, Evans M. Early prediction of late incisional hernias. Br J Surg. 1989; 76:953-4.
4. Coelho JCU, Claus CMP, Lourei MP, Dimbarre D, Cury
AM, Campos ACL. Hernioplastia incisional Laparoscópica.Experiência de 45 casos. ABCD Arq Bras Cir
Dig,2011;24(2):121 125.
Tais coleções líquidas são diagnosticadas pelo exame físico ou por ultrassonografia 8. A maioria dos cirurgiões, segundo a literatura, preconiza o uso de drenos
no pós operatório (P.O.) imediato, pois a presença de
líquidos poderia comprometer a cicatrização, uma vez
que a retardam e propiciam o surgimento de infecções.9
5. Kulber DA, Bacilious N, Peters ED, Gayle LB, Hoffman
L. The use of fibrin sealant in the prevention of seromas. Plast Reconstr Surg. 1997;99 (3):842-9.
Baroudi & Ferreira 9 descreveram os pontos de fixação do retalho ,“quilting sutures”, com a finalidade de
minimizar o espaço morto e, consequentemente, diminuir o acúmulo de líquido.
6. Kim J, Stevenson TR. Abdominoplasty, liposuction
of the flanks, and obesity: analyzing risk factors for
seroma formation. Plast Reconstr Surg. 2006;117
(3):773-9.
O acúmulo de seroma sob o retalho abdominal pode
levar a aumento da pressão nessa região, causando
deiscências, necroses, drenagens espontâneas pela ferida operatória e infecção. 10 A necessidade de múltiplas aspirações causa repetidas visitas ao consultório,
aumento dos custos pós-operatórios e, principalmente,
desconforto ao paciente 6,10. Seromas crônicos não tratados podem levar à formação de uma cápsula fibrosa
ao seu redor, denominada pseudo­bursa. Essa cápsula
pode sofrer um processo de contração, evoluindo em
alguns casos com deformidade da parede abdominal,
sendo indicado tratamento cirúrgico como o ocorrido
com a paciente do caso descrito 10.
7. Stocchero IN. Ultrasound and seromas [letter]. Plast
Reconstr Surg. 1993;91(1):198.
8. Mohammad JA, et al. Ultrasound in me diagnosis
and management of fluid collection complications following abdominoplasry. Ann Plast Surg.
1998;41(5)498- 502.
9. Baroudi R, Ferreira CA. Seroma: how to avoid it and
how to treat it. Aesthet Surg J. 1998;18(6):439-41.
10.Roje Z, Roje Z, Karanovic N, Utrobicic I. Abdominoplasty complica­tions: a comprehensive approach
for the treatment of chronic seroma with pseudobursa. Aesthetic Plast Surg. 2006;30(5):611-5.
Conclusão
O seroma é uma complicação cirúrgica com incidência relativamente frequente em nosso meio. Entretanto, a lesão cística apresentada no caso medindo
13x21x25 cm e pesando 8kg , é incomum, com escassa
descrição pela literatura. Não há, ainda, um consenso
pré-estabelecido para a prevenção da formação do exsudato seromatoso. Porém medidas intra operatórias
como refinamento da técnica cirúrgica, diérese menos
traumática, hemostasia mais criteriosa, síntese reforçada das estruturas anatômicas visando diminuir o espaço morto, e, também, medidas pós-operatórias como a
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Seroma gigante pós hernioplastia incisional com tela não absorvível (polipropileno)
Anexos
Figura 1 – Evidência do seroma a ectoscopia,
tomografia e ultrasonografia.
Figura 2 – Peça cirúrgica, intra, pós-operatória e
resultado estético após 2 meses.
Endereço para correspondência:
Dr. Sérgio Lopes
E-mail : [email protected]
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