Imagem da Semana: Radiografia e Cintilografia Imagem 01. Radiografia simples de tórax na incidência anteroposterior (AP) na primeira avaliação Imagem 02: Radiografia simples do tórax em AP após diálise peritoneal. Imagem 03: Radiografia simples do tórax em perfil após diálise peritoneal. Imagem 04: Cintilografia com 99mTc-MAA infundido no líquido de diálise peritoneal. Paciente do sexo masculino, 1 ano e 3 meses de idade, portador da síndrome de Prune Belly, em diálise peritoneal ambulatorial contínua (CAPD) devido a doença renal crônica. Foi admitido para esclarecimento etiológico de derrames peritoneais recidivantes. Ao exame: taquipneia, diminuição discreta do murmúrio vesicular à direita, roncos respiratórios difusos, sem sinais de esforço respiratório. Foram solicitados os exames em anexo. Analisando os exames por imagem e o quadro clínico, pode-se concluir que a provável causa dos derrames pleurais recorrentes é: a) Insuficiencia Cardíaca Congestiva b) Pneumonia lobar c) Fístula peritôniopleural d) Encarceramento pulmonar Análise da imagem Imagem 1: Radiografia de tórax, incidência AP, mostrando pulmões hiperexpandidos. Imagem 2 e 3: Radiografias de tórax em AP e perfil, após diálise peritoneal: deslocamento medial da pleura visceral direita e compressão do pulmão ipsilateral condicionados por derrame pleural (setas vermelhas). Imagem 4: Fístula peritôniopleural na cintilografia com 99mTc - MAA (macroagregrado de albumina marcado com tecnécio 99 metaestável), infundido no líquido peritoneal de diálise demonstrada através da presença do material no hemitórax direito. Diagnóstico A fístula peritôniopleural secundária a diálise peritoneal é uma complicação rara. Os pacientes desenvolvem derrame pleural pela passagem do líquido da cavidade peritoneal para o espaço pleural através de um defeito no diafragma. Na maioria das vezes, o derrame pleural é unilateral, à direita, caracterizado como transudato. A cintilografia com infusão de 99TcMAA no líquido peritoneal confirma o diagnóstico. O derrame pleural é uma condição frequente na insuficiência cardíaca (IC). Na maioria das vezes, é bilateral com volume maior à direita, que é também a localização mais comum quando unilateral. O indivíduo apresenta quadro clínico característico da IC, com dispnéia progressiva, edema de membros inferiores, turgência de jugular, terceira bulha e estertores crepitantes à ausculta pulmonar. Nas radiografias simples de tórax, além do derrame pleural, evidencia-se aumento da área cardíaca e sinais de congestão pulmonar. A incidência de derrame pleural nas pneumonias varia de 36% a 57%, sendo considerado fator de pior prognóstico. O paciente apresenta sinais e sintomas típicos do processo infeccioso pulmonar, como febre, prostração, taquipnéia, tosse produtiva, crepitações e broncofonia à ausculta respiratória. As radiografias do tórax demonstram área(s) de consolidação pulmonar, sobretudo nas pneumonias típicas. O encarceramento pulmonar representa o estágio final de cura anormal de uma pleurite inflamatória ou infecciosa, cujas causas mais comuns são traumas intratorácicos, empiema e efusão parapneumônica complicada, condições ausentes no paciente em questão. A fibrose entre as pleuras parietal e visceral impede a expansão pulmonar completa e permite o acúmulo de transudato. As radiografias do tórax mostram acúmulo de líquido pleural unilateral, de tamanho pequeno a moderado. Discussão do caso A diálise peritoneal ambulatorial contínua (CAPD) é comumente usada em pacientes com doença renal em estágio terminal. A infusão do fluido dialítico na cavidade peritoneal aumenta a pressão abdominal que, associada a uma pressão intrapleural negativa, pode causar extravasamento do fluido peritoneal para o espaço pleural através de comunicações pleuroperitoniais. Apesar de rara, trata-se de uma complicação bem reconhecida da diálise peritoneal, com incidência variando de 1,6 % a 10% na população adulta e, nos pacientes pediátricos, até 3%. O mecanismo de sua patogênese é uma comunicação peritôniopleural através de um defeito anatômico congênito ou adquirido do diafragma, podendo, assim, ocorrer desde a primeira diálise. O paciente pode apresentar sintomas decorrentes do derrame pleural, como desconforto respiratório, particularmente dispnéia e taquipneia, e tosse seca. Os sinais mais comuns do quadro são redução ou ausência do frêmito toracovocal, percussão maciça ou submaciça e redução ou abolição do murmúrio vesicular sobre a região com líquido. Aproximadamente 25% dos pacientes são assintomáticos. O diagnóstico do derrame pleural pode ser é feito à partir de radiografias simples do tórax, podendo ser confirmado por ultrassonografia ou tomografia computadorizada. Entretanto, esses métodos de investigação não indicam a origem do fluido. Marcadores bioquímicos do fluido pleural, como níveis elevados de glicose, podem ser indicativos de fluido peritoneal no espaço pleural. Porém, além da necessidade de realizar procedimento invasivo para obtenção do fluido, os valores de corte ainda não são bem definidos e dependem da concentração de glicose do dialisado. A infusão de azul de metileno na cavidade peritoneal é um método com baixa sensibilidade e riscos potenciais de peritonite química. A cintilografia com infusão de 99mTc-MAA no líquido peritoneal é considerada o exame de melhor sensibilidade e especificidade para o diagnóstico de hidrotórax associado à diálise peritoneal. É um método rápido e adequado para diagnosticar fístulas peritoneais. Diferentes abordagens terapêuticas são descritas na literatura. A suspensão temporária da diálise peritoneal é a primeira medida a ser tomada. Introdução de tetraciclina no espaço pleural e correção cirúrgica da comunicação diafragmática já foram descritos. A pleurodese, usando o talco como agente esclerosante, tem sido a opção mais utilizada quando há expansão pulmonar completa e o paciente se apresenta em bom estado geral. Aspectos relevantes - O derrame pleural consequente à fístula peritôniopleural é uma complicação rara da diálise peritoneal ambulatorial contínua (CAPD). - Cerca de 25% dos pacientes são assintomáticos. Quando sintomáticos, podem apresentar apenas tosse seca e dispnéia. - Não há um consenso sobre qual método diagnóstico tem melhor acurácia, porém a cintilografia com infusão de 99mTc-MAA no líquido de diálise peritoneal tem se mostrado um exame rápido e adequado para diagnosticar a origem peritoneal do fluido pleural. - As abordagens terapêuticas incluem a suspensão da diálise peritoneal, pelo menos temporariamente, e tratamento cirúrgico, em caso de recidivas. - Atualmente, a pleurodese com talco é a abordagem cirúrgica de primeira escolha. Referências - Rajnish, Anshu, Muffazal Ahmad, and Pradeep Kumar. "Peritoneal scintigraphy in the diagnosis of complications associated with continuous dialysis." Clinical nuclear medicine 28.1 (2003): 70-71. ambulatory peritoneal - Szeto, Cheuk Chun, and Kai Ming Chow. "Pathogenesis and management of hydrothorax complicating peritoneal dialysis." Current opinion in pulmonary medicine 10.4 (2004): 315319. - Maude, Rapeephan R., and Michael Barretti. "Severe “sweet” pleural effusion in a continuous ambulatory peritoneal dialysis patient." Respiratory Medicine Case Reports 13 (2014): 1-3. - Herbrig, Kay, et al. "Dry cough in a CAPD patient." Nephrology Dialysis Transplantation 18.5 (2003): 1027-1029. - Chavannes, M., et al. "Diagnosis by Peritoneal Scintigraphy of Peritoneal DialysisAssociated Hydrothorax in an Infant." Peritoneal Dialysis International 34.1 (2014): 140143. - Daugirdas, John T., Peter G. Blake, and Todd S. Ing. Manual de diálise. Medsi, 2003. Responsáveis Caroline dos Reis, acadêmica do 11º período de Medicina da UFMG E-mail: creis.caroline[arroba]gmail.com Bárbara Queiroz Bragaglia, acadêmica do 11º período de Medicina da UFMG E-mail: barbara.bragaglia[arroba]hotmail.com Gustavo Campos, acadêmico do 11º período de Medicina da UFMG E-mail: fcamposgustavo[arroba]gmail.com Orientadora Gláucia Santos, médica nefrologista pediátrica do serviço de diálise do HC-UFMG E-mail: glauciaplacidonio[arroba]gmail.com Revisores Júlia Petrocchi, Fernando Bottega, Ana Luiza Mattos Tavares, Luísa Bernardino, Profa. Viviane Parisotto e Prof. José Nelson Mendes Vieira.