INVESTIGANDO A ATENÇÃO SELETIVA NA SALA DE AULA DE INGLÊS COMO LÍNGUA ESTRANGEIRA Ms. Juliane Regina Trevisol (UNICENTRO/I) Resumo: O presente trabalho teve por objetivo investigar a percepção (noticing, SCHMIDT, 1990, 1995), com atenção seletiva, de uma certa estrutura linguística em Inglês. Os participantes da pesquisa foram 45 alunos da sexta série de uma escola pública no sul do Brasil. Considerando o contexto de aprendizagem de inglês como língua estrangeira (ILE) no Brasil, no qual a sala de aula é uma das principais formas ou contextos de contato do aprendiz com a língua inglesa, a instrução formal parece ser fundamental para que a aquisição da língua aconteça (ELLIS, 1994). Mantendo isso em mente, procurou-se também observar qual tipo de instrução poderia melhor favorecer a percepção do item-alvo, se Foco na Forma (FonF) ou Foco nas FormaS. Para o experimento, os participantes foram divididos em dois grupos, tendo cada grupo recebido um tipo de instrução. Os instrumentos para coleta de dados foram: um préteste, seguido do período de tratamento, um protocolo escrito e um pós-teste. Apesar das limitações do estudo, os resultados sugerem que ambos os grupos tiveram um desempenho semelhante em termos de precisão da produção do item tratado. Assim, considera-se que, como advoga Doughty (2001), forma e significado não podem ser completamente separados. Palavras-chave: percepção, aprendizagem de Inglês como língua estrangeira, instrução formal. Abstract: The present paper aimed at investigating whether or not the noticing (SCHMIDT, 1990, 1995) of a certain linguistic structure in English might be observed within a group of sixth grade learners in a public school in the south of Brazil. Considering the context of English as a foreign language (EFL) learning in Brazil, in which the English classroom may still be one of the main settings for language contact, formal instruction seems to be essential for allowing language acquisition to take place (ELLIS, 1994). Keeping that in mind, the experiment also observed which instructional setting might have enhanced noticing, focus on form or focus on formS. For the experiment, participants were divided in two groups, one for each instruction type. Instruments for data gathering were a pre-test, followed by the treatment period, a written protocol and a post-test. Despite the limitations of the study, results suggest a similar performance in terms of accuracy for both groups, what might lead us to consider that, as Doughty (2001) claims, form and meaning cannot be entirely separated. Keywords: noticing, English as a Foreign Language learning, formal instruction. INTERLINGUAGENS V.1 2010 1. Introdução A aprendizagem de uma língua estrangeira (LE) é uma tarefa um tanto quanto complexa (ELLIS, 1997). Desde que comecei a ter contato com a língua inglesa, a língua que eu escolhi para aprender quando eu ainda era uma adolescente, este fato chamou minha atenção. Além de aulas semanais de língua, uma boa quantidade de trabalho extra-classe se fazia necessário para que eu pudesse sentir que havia alcançado a um nível de confiança para usar a língua em diferentes contextos. Sem as horas de instrução formal em sala de aula, somadas às horas extras do contato fora da escola, eu acho que dificilmente teria chegado ao nível de proficiência que tenho hoje. O papel da instrução formal – em sala de aula - na literatura de aquisição de segunda língua (second language aquisition, SLA) tem sido bastante contestado por pesquisadores. Alguns advogam por uma aprendizagem de LE naturalística, acreditando que a instrução formal em sala de aula não traz muito benefício em termos de aprendizagem e, portanto, deva ser evitada (KRASHEN, 1982; PRABHU, 1987). Outros pesquisadores acreditam que a instrução é necessária e pode sim facilitar a aprendizagem (ELLIS, 1994, 1997; DEKEYSER, 2003; DOUGHTY, 2003), porém muitos fatores devem ser considerados a fim de realizar a árdua tarefa de se adquirir uma nova língua diferente da língua materna. Segundo Rod Ellis (1997, p. 87), a instrução pode ajudar aprendizes de uma segunda língua (L2) de diversas maneiras. Ela pode levar a maior precisão de produção e percepção da língua, pode auxiliar os alunos a progredir mais rapidamente através de estágios de desenvolvimento e também pode desestabilizar as gramáticas de interlíngua (IL) já fossilizadas. Embora a instrução possa apresentar todas essas vantagens, é preciso considerar o fato de que a mesma nem sempre é bem sucedida e os seus efeitos podem ser de curta duração, uma vez que o estágio de desenvolvimento do aluno e a natureza da estrutura-alvo a ser ensinada também influenciam a aprendizagem. Desta forma, se a instrução formal nem sempre é eficaz e se nem todo o input, ou seja, o insumo, recebido em sala de aula pode ser assimilado pelo aluno, faz-se necessário um mecanismo para ajudar a “selecionar” ou “peneirar” as informações recebidas. Uma dessas ferramentas é conhecida como atenção, que permite aos alunos INTERLINGUAGENS V.1 2010 que consigam „sintonizar‟ ou „peneirar‟ seletivamente uma parte do insumo recebido (GASS; MACKEY, 2007). O construto atenção foi trazido para o foco de recentes pesquisas e debate em SLA por Schmidt (1990, 2001), que introduziu este termo na literatura. Ele afirma que a atenção é necessária para todos os aspectos da aprendizagem de L2. Schmidt apresenta o construto de atenção não como um fenômeno único, mas sim como estando este interligado a vários mecanismos os quais ele denomina vigilância (allertness), orientação (orientation), pré-registo (preconscious registration) (detecção inconsciente), seleção (selection) (detecção consciente com atenção seletiva), facilitação (facilitation) e inibição (inhibition) (SCHMIDT, 2001). O foco da presente investigação está no construto da seleção, ou detecção consciente com atenção seletiva, que é denominado noticing. Para Schmidt (2001, p. 10), a instrução explícita assume papel importante por auxiliar o foco nas formas (estrutura da língua a ser aprendida) e significados presente no input, no insumo recebido, o que é pré-requisito para posterior processamento (DE GRAAFF, 1997; N. ELLIS, 1993; R. ELLIS, 1994a; HULSTJIN & DE GRAAFF, 1994b; LONG, 1988; SCHMIDT, 1990; SCHMIDT & FROTA, 1986; SHARWOOD SMITH, 1993, 1994; TERREL, 1991; TOMLIN & VILLA, 1994; VAN PATTEN, 1994; apud SCHMIDT, 2001). Sendo assim, ao atender ou perceber conscientemente um aspecto específico do input, os aprendizes podem adquirir com maior sucesso a estrutura apresentada. E é esse o ponto principal que o presente trabalho visa investigar. Depois desta breve contextualização de alguns aspectos relevantes para a aprendizagem de LE/L2, o presente trabalho tem como objetivos principais investigar: (a) se a percepção consciente ou atenção seletiva – noticing - pode acontecer em uma sala de aula de Inglês como língua estrangeira (ILE) com alunos adolescentes, estudantes de uma escola pública no Brasil; e (b) assumindo-se que (a) seja possível, verificar qual situação de ensino proporcionará mais atenção seletiva/noticing nos estudantes. A pesquisa aqui relatada está dividida em cinco partes: a primeira parte traz a revisão da literatura com o referencial teórico que serviu de base para o estudo; em seguida são apresentadas as perguntas e hipóteses investigadas na pesquisa, seguidas da INTERLINGUAGENS V.1 2010 descrição da metodologia empregada e, por fim, das considerações finais e sugestões para pesquisas futuras. 2. Revisão de literatura Conforme mencionado anteriormente, o objetivo desta pesquisa é verificar se um grupo de alunos adolescentes pode „notar‟/‟perceber‟ uma estrutura-alvo (através da atenção seletiva) e, conseqüentemente, aprendê-la. No Brasil, poucos estudos têm investigado a questão da atenção seletiva em um ambiente formal de ensino. Algumas pesquisas neste tema foram desenvolvidas por Schmidt e Frota (1986), Bergsleithner (2004), Welp (2001), Raymundo (2001) e Neri (2006), conforme mencionado por Marques (2007), sendo que a maioria destes estudos teve como participantes aprendizes adultos de LE e verificou sua forma de usar a atenção seletiva para melhorar a aquisição da língua-alvo. Aprender outro idioma é uma tarefa complexa (ELLIS, 1997), especialmente se essa tentativa é de aprender uma língua estrangeira (LE) que não é oficialmente falada no país, como é o caso de alunos brasileiros aprendendo inglês como LE no Brasil. Neste contexto, a instrução formal dada em sala de aula pode ser uma solução com bons resultados, pelo menos em alguns dos casos. A fim de melhor apresentar e discutir este e outros aspectos relacionados à área de SLA no contexto da presente pesquisa, os sub-temas desenvolvidos na seqüência são: instrução formal, Foco na Forma (Focus on Form - FonF) versus Foco nas FormaS (Focus on FormS), e Atenção seletiva (noticing). 2.1 Instrução formal O papel da instrução formal em SLA, como explicado por Ellis (1994), assume diferentes posições teóricas. Por um lado, alguns pesquisadores (DULAY; BURT, 1973; KRASHEN 1982; PRABHU, 1987) acreditam que a prática da instrução formal deva ser abandonada, pois o aprendizado acontece "naturalmente". Para estes autores, devese rejeitar qualquer intervenção planejada por meio de apresentação e prática de itens INTERLINGUAGENS V.1 2010 diferentes e regras gramaticais, assim como qualquer intervenção não planejada como a correção de erro (ELLIS, 1994). Contrariamente a esta perspectiva, um outro grupo de pesquisadores (HARLEY, 1989; WHITE et al, 1991; PIENEMANN, 1984; apud ELLIS, 1994) dão suporte à ideia de que a instrução formal pode não só promover a "aquisição" por fornecer input compreensível, mas também pelo fato de os alunos, pelo menos em algumas ocasiões, conseguirem aprender verdadeiramente o que foram ensinados. Aqueles que pertencem a esta última posição acreditam que o ensino formal funciona como um facilitador para a aprendizagem. Por fornecer regras de forma mais consciente juntamente com a prática, a instrução formal permite aos alunos que transformem o conhecimento „controlado‟ adquirido de forma a torná-lo mais automático, de desempenho mais espontâneo (SHARWOOD SMITH, 1981; apud ELLIS, 1994). Mais importante ainda é o fato de o ensino formal poder permitir aos alunos que dêem maior atenção seletiva para as formas (estrutura) da língua e às conexões de forma e sentido observadas no insumo; isso é o que vai preparar seu caminho para a posterior aquisição da língua (LIGHTBOWN, 1985; SHARWOOD SMITH, 1980; GASS, 1991; apud ELLIS, 1994). Segundo Rod Ellis (1994, p. 659), “a instrução formal resulta em maior precisão e acelera o progresso através de seqüências de desenvolvimento. Além disso, seus efeitos são, pelo menos em alguns casos, duradouros”1. Da mesma forma, Doughty (2003) afirma que a instrução é eficaz, uma vez que é relevante para as necessidades dos alunos, como por exemplo a necessidade de aprendizes de inglês que moram em países onde a língua inglesa não é falada oficialmente. Com o propósito de verificar se a instrução faz a diferença na aprendizagem de uma L2, Long (1988, apud DOUGHTY, 2003, p. 261-262) investigou quatro domínios de SLA: processos (entre os quais está noticing), via (route), taxa (rate) e nível final de aquisição de L2 (level of ultimate L2 attainment). O que é relevante, dentro da pesquisa de Long sobre os domínios de SLA, é a constatação de que a instrução pode promover uma aprendizagem mais rápida da língua-alvo - apesar de não ser possível „pular‟ nenhum estágio de desenvolvimento, conforme lembra Pienemann (1989) -, partindo-se do pressuposto de que o aluno está 1 [Minha tradução] Originalmente: “formal instruction results in increased accuracy and accelerates progress through developmental sequences. Also, its effects are, at least in some cases, durable” (Ellis, 1994, p. 659). INTERLINGUAGENS V.1 2010 “psicolinguisticamente pronto” para a tarefa de aprendizagem. Além disso, a instrução permite que os aprendizes de L2 cheguem o mais próximo possível de desenvolver uma competência nativa da língua, por exemplo, através do fornecimento de insumo mais rico e modificado e/ou de feedback (DOUGHTY, 2003, p. 262). Após terem sido apresentadas algumas pontos relevantes sobre o ensino de L2, assume-se neste estudo que a instrução formal é eficaz e que, sem ela, a maioria dos alunos - especialmente os adultos - enfrentaria uma dificuldade ainda maior para aprender uma LE/L22, e que talvez, tal aprendizagem nem fosse possível sem a instrução formal. 2.2 Foco na Forma versus Foco nas FormaS Ao considerarmos as situações de instrução formal verificamos que não existe conclusão clara a respeito de qual seria a abordagem ou “método” mais adequado a ser seguido. Para a presente pesquisa, cada um dos grupos de tratamento recebeu um tipo específico de instrução: o grupo A (GA) foi instruído com Foco na Forma (FonF), e o grupo B (GB) com Foco nas FormaS. A abordagem FonF, proposta por Long (1991), foi motivada pela hipótese da Interação (Interaction Hypothesis - LONG, 1981, 1983, 1996, apud LONG; ROBINSON, 1998). Esta hipótese postula que a interação entre o aprendiz e outros falantes é um sítio importante para o desenvolvimento de uma L2. Além disso, o que realmente importa em certos tipos de interação é a negociação de significados na qual os aprendizes se envolvem durante o momento de interação; é esta negociação que vai fornecer informações importantes sobre as relações de forma-função dentro da L2 (LONG; ROBINSON, 1998, p. 22-23). Ao interagir e negociar significados, o aprendiz pode, possivelmente, receber feedback negativo sobre sua fala, isto é, a confirmação pelo interlocutor de que algo em seu discurso está incorreto e portanto deve ser reorganizado. Segundo Long e Robinson (1998, p.23): O feedback [negativo] chama a atenção dos alunos para os desequilíbrios entre o insumo e a produção, ou seja, faz com que eles se concentrem na forma, e pode induzi-los a perceber os tipos de formas que não são 2 Apesar de a pesquisadora compreender as diferenças entre os conceitos de língua estrangeira (LE) e segunda língua (L2), neste artigo os termos serão usados alternadamente, sem diferenciação. INTERLINGUAGENS V.1 2010 suficientemente observáveis em um contexto de insumo puramente compreensível (por exemplo, os itens que não são aprendidos através de evidência positiva ou são raros, e/ou semanticamente simples, e/ou perceptualmente não salientes, e/ou causam pouco ou nenhuma dificuldade de comunicação3. A instrução dentro da perspectiva de FonF é fundamentalmente voltada ao significado e à comunicação (LONG; ROBINSON, 1998). Dessa forma, o FonF acontece de forma esporádica, não-planejada e surge naturalmente quando os alunos encontram um problema de compreensão ou de produção, quando envolvidos em atividades comunicativas significativas (STORCH, 2001). Nesta perspectiva, o professor só interfere desviando a atenção dos alunos para a forma, estrutura da língua, quando há esta necessidade vinda do próprio aprendiz. É por isso que, de acordo com Long (1991), não haveria necessidade de o professor ter uma meta linguística préplanejada para cada aula. Como, dentro da perspectiva de FonF, o objetivo da aula é de se concentrar em atividades comunicativas significativas, o professor deve estar preparado para ensinar qualquer estrutura que venha a ser necessária no momento em os estudantes encontram algum problema de comunicação. A perspectiva de FonF adotada nesta pesquisa foi baseada em Ellis (2001) e é intitulada foco na forma planejado. Como para esta pesquisa havia a necessidade de se ter um item lingüístico pré-selecionado para o tratamento em sala de aula, a definição de Ellis (2001) foi escolhida simplesmente porque trabalha com uma estrutura linguística pré-selecionada a ser ensinada. Desta forma, neste experimento, cada grupo recebeu um tratamento especial e diferenciado quanto ao item gramatical do inglês investigado: „verbos na terceira pessoa do singular, com –s‟. Sem a pré-seleção do item, a presente investigação não teria sido possível. Os tratamentos e procedimentos adotados para a pesquisa serão mais claramente explicados no decorrer do artigo. A abordagem tradicional tem há tempos funcionado de forma que a primeira tarefa do professor era focar nas formas da língua, ou seja, o foco seria a análise da línguaalvo, geralmente através do uso de uma gramática ou um livro didático-pedagógico 3 [Minha tradução]. Originalmente: “[negative] feedback draws learners‟ attention to mismatches between input and output, that is, causes them to focus on form, and can induce noticing of the kinds of forms for which a pure diet of comprehensible input will not suffice (e.g., items that are unlearnable from positive evidence or are rare, and/or semantically lightweight, and/or perceptually nonsalient, and/or cause little or no communicative distress)” (LONG; ROBINSON, 1998, p. 23). INTERLINGUAGENS V.1 2010 usado com este fim. Este trabalho gramatical ou „abordagem sintética‟, de acordo com Wilkins (1976, apud LONG; ROBINSON, 1998), é ainda largamente utilizado em salas de aula de língua estrangeira no mundo todo, incluindo o Brasil. Alguns exemplos, de acordo com o autor são os métodos de ensino Gramática-Tradução e Áudio-lingual, entre outros. De modo geral, nesta perspectiva o aluno trabalha com amostras limitadas da língua-alvo, as quais são expostas como partes separadas de um todo, de modo a se aprender passo a passo as estruturas da língua. A aquisição é vista quase que como um quebra-cabeça: um processo de acumulação de „peças‟ até que toda a estrutura da L2 seja construída (WILKINS, 1976, p. 2). No entanto, é preciso lembrar que a aquisição de uma L2 se dá de forma muito mais complexa e não pode ser vista como mero processo de acumulação de partes. Portanto, o Foco nas FormaS descreve as abordagens tradicionais com foco no ensino da gramática, onde um item lingüístico é selecionado pelo professor, o qual o apresenta explicitamente à turma e depois solicita aos alunos que façam atividades práticas de modo a memorizar a estrutura dada (STORCH, 2001). O Foco nas FormaS se distingue do FonF especialmente porque no primeiro se trabalha um item gramatical de forma planejada, e no segundo a atenção é chamada para a estrutura de forma „acidental‟, mais natural, estando esta dentro de uma situação comunicativa. Além disso, a abordagem do Foco nas FormaS não proporciona aos alunos a participação em interações que envolvam construção de significado, pois não tem base em atividades comunicativas; ela é intensamente centrada na estrutura da língua-alvo (por exemplo, o uso de „verbos na terceira pessoa do singular, com –s‟ do Inglês) a ser ensinada. 2.3 Schmidt e a questão da atenção seletiva O conceito de atenção é extremamente importante para que possamos compreender muitos aspectos da SLA, tais como o modo de se desenvolver a interlíngua ao longo do tempo, as causas para a variação da mesma, a forma como a fluência é desenvolvida na L2, o papel das diferenças individuais na aprendizagem de L2, bem como a forma através da qual diferentes tipos de instrução (como por exemplo, FonF e Foco nas FormaS) podem contribuir para a aprendizagem de línguas. INTERLINGUAGENS V.1 2010 O construto atenção, como já mencionado, não é um fenômeno unitário. Entre os vários mecanismos que tal construto comporta, um deles, foco desta pesquisa, é a percepção consciente – noticing -, chamada aqui de atenção seletiva. A atenção seletiva é aqui vista como a ocorrência de algum evento por meio de registro consciente (SCHMIDT, 1995, apud BERGSLEITHNER, 2007, p. 30). O termo noticing, em inglês, é equivalente a terminologias apresentadas por outros pesquisadores na literatura de SLA. Schmidt (2001, p. 5) cita "apercepção" (GASS, 1988), "detecção com atenção seletiva” (TOMLIN; VILLA, 1994), e “detecção com ensaio na memória de curto prazo" (ROBINSON, 1995) como termos equivalentes. O termo noticing foi introduzido na literatura por Schmidt através de sua teoria da „Hipótese da percepção‟ (Noticing Hypothesis Theory). A principal suposição da „Hipótese da percepção‟ (SCHMIDT, 1990) é que os alunos de L2 devem prestar atenção consciente aos aspectos lingüísticos presentes no insumo que estão recebendo a fim de adquiri-los. Por meio desta atenção consciente, alguns aspectos do insumo podem ser processados pelo aluno e vir a tornar-se intake, levando os alunos a terem um desempenho mais correto na língua-alvo. Intake é compreendido como a parte do insumo que foi processada pelo aprendiz e se transformou em conhecimento adquirido (SHARWOOD-SMITH, 1994, apud BERGSLEITHNER, 2007, p. 29). A idéia de noticing - percepção consciente ou atenção seletiva - assumida no presente artigo é baseada em Bergsleithner (2007). Segundo a autora, a atenção seletiva na forma como a vislumbramos aqui se dá de forma forçada ou provocada pelo professor por meio de tratamento ou de instrução formal (BERGSLEITHNER, 2007, p. 33). Este ponto é colocado porque se diferencia da proposta original de Schmidt, na qual a percepção consciente está relacionada com um ensino indutivo, naturalístico, e não com explicações nas aulas de língua ou ensino formal e explícito (BERGSLEITHNER, 2007, p.32), como é geralmente o caso de ensino de LE no Brasil. Para a presente investigação, um questionário de perguntas do tipo „sim/não‟ (baseado em ROBINSON, 1995) foi proposto para medir a atenção seletiva dos alunos. A percepção ou atenção seletiva investigada aqui está dentro do contexto de instrução formal, ou seja, ensino de língua inglesa em sala de aula com a presença do professor- INTERLINGUAGENS V.1 2010 instrutor. Outro questionário, denominado Protocolo Escrito, também foi adotado como instrumento de coleta de dados para a pesquisa. 3. Metodologia: perguntas e hipóteses investigadas Depois de descrever o objetivo geral da pesquisa e de apresentar a discussão teórica na qual esta está inserida, duas questões principais (Q1 e Q2) e suas respectivas hipóteses (H1 e H2) foram investigadas neste estudo: Q1. Pode a percepção através de atenção seletiva acontecer em um contexto de sala de aula da sexta série de uma escola pública? H1. A percepção pode também ocorrer quando o grupo-alvo é composto por alunos adolescentes com idades entre 11-12 anos. Esta primeira questão se dá pelo fato de que pesquisas anteriores voltadas à investigação da atenção seletiva trataram especialmente de aprendizes adultos (RAIMUNDO, 2001; WELP, 2001, apud MARQUES, 2007). Nestes estudos, foi-se observado que os aprendizes adultos tendem a ser mais capazes de seletivamente atender ao insumo recebido (por exemplo, de melhor perceber um item lingüístico) devido ao fato de sua capacidade cognitiva ser mais desenvolvida por conta da idade. Mesmo sabendo que os adolescentes ainda têm um longo caminho a percorrer em relação ao desenvolvimento de suas capacidades cognitivas, acredita-se aqui que eles também devam ser capazes de perceber conscientemente itens específicos da línguaalvo presentes no insumo. Além disso, também se assume ser possível que tal grupo possa verbalizar as regras que tiveram contato por meio do ensino formal de inglês, embora suas explicações sobre a língua-alvo podem não ser tão explícitas e claras como as de aprendizes adultos. Q2. Assumindo que H1 seja verdadeira, qual tipo de instrução provoca mais percepção consciente: o Foco na Forma (com mais ênfase em atividades comunicativas) ou o Foco nas FormaS (com foco intenso nas estruturas da língua-alvo, sem interações comunicativas)? INTERLINGUAGENS V.1 2010 H2. O Foco na Forma, de caráter mais comunicativo, pode ter um efeito mais positivo se comparado com a o Foco nas FormaS, abordagem mais tradicional de foco na gramática. A hipótese H2 é de que a primeira abordagem (FonF) irá provocar um maior nível de percepção consciente do que a última, pelo fato de estar engajada com um ensino mais comunicativo, com atividades que promovam um tentativa de interação em sala de aula, na qual a estrutura lingüística é trabalhada de forma mais indutiva do que explícita. Assim, observando a estrutura-alvo de forma indutiva, os alunos poderão, possivelmente, produzir o item em foco com maior precisão e continuar no processo de desenvolvimento lingüístico. 3.1 Participantes da pesquisa O presente estudo foi realizado com um total de 45 participantes. Os participantes foram alunos da turma de inglês de uma sexta série do ensino fundamental, de uma escola pública, com uma média de 12 anos de idade. A escola na qual a coleta de dados foi feita está localizada na cidade de Gaspar, no estado de Santa Catarina, sul do Brasil. O material didático adotado nas aulas regulares de inglês é o livro Take your time (volume 2). Para o tratamento da pesquisa, porém, atividades diferentes das do livro didático foram trabalhadas com os alunos. A pesquisa coletou dados com duas turmas regulares de sexta série. Aqui, as duas turmas serão denominadas Grupo A (GA) e Grupo B (GB). O GA continha 27 alunos (13 meninas e 14 meninos) e o GB 18 alunos (11 meninos e 7 meninas). Considerando o conhecimento prévio dos alunos quanto ao contato com a língua inglesa fora da sala de aula, a professora regente mencionou que nenhum aluno fazia cursinho de idiomas. As aulas de inglês na escola eram a forma principal de familiaridade dos alunos com o idioma, além do seu contato com músicas internacionais, conforme mencionado também pela professora regente. INTERLINGUAGENS V.1 2010 3.2 Instrumentos e procedimentos de coleta de dados Conforme mencionado anteriormente, foi-se escolhido um item gramatical para que a investigação da percepção com os alunos da sexta série fosse possível. O item em foco: verbo no presente simples na terceira pessoa do singular com –s (como em „She works every day‟). Os instrumentos utilizados para verificar se os alunos poderiam perceber (com atenção seletiva, percepção consciente) e produzir tal item com precisão foram: um pré-teste, seguido do tratamento (três dias), o protocolo escrito (aplicado no terceiro dia) e um pós-teste final (aplicado no quarto dia). O pré-teste foi dado a todos os participantes uma aula antes do início do tratamento, a fim de se observar se a estrutura investigada já era conhecida por alguns alunos. O teste consistiu em um conjunto de cinco imagens, referindo-se a pessoas „ele/ela‟ (he/she) fazendo determinada atividade: por exemplo, a imagem de uma garota jogando tênis. Assim, os alunos foram instruídos a olhar para as imagens e escrever frases sobre elas no tempo presente. O pré-teste confirmou que nenhum dos participantes tinha familiaridade com a estrutura-alvo a ser ensinada no período de tratamento. Após o pré-teste, iniciou-se o período de tratamento („instrução‟ da forma gramatical) dado para os dois grupos, com duração de três aulas. O tratamento se refere à forma como a aula seria trabalhada, dentro do tipo de instrução escolhido previamente, sendo um com foco maior em atividades comunicativas (onde a gramática foi trabalhada de forma indutiva, não-explícita), e outro com foco no ensino explícito de gramática, com apresentação de regras e prática de estruturas. As duas formas de tratamento adotadas foram: a instrução com base na abordagem FonF, trabalhada com o GA; e a instrução com Foco nas FormaS, trabalhada com o GB. Devido ao tempo curto da aula (40 minutos) e, uma vez que a estrutura-alvo foi considerada um tanto complexa, fez-se necessário dispor de três aulas para que o tratamento fosse desenvolvido. O tratamento foi realizado de forma que, em cada um dos três dias os alunos tiveram contato com diferentes tipos de frases na estrutura-alvo, frases na forma afirmativa, interrogativa e negativa. Para o GA foram dadas atividades comunicativas, nas quais os alunos tinham que interagir verbalmente com seus colegas e assim estariam usando a estrutura em foco em INTERLINGUAGENS V.1 2010 situações interativas. Nenhuma explicação de qualquer regra gramatical foi dada a menos que os alunos a solicitassem (os alunos não pediram explicações e, portanto, nenhuma regra de terceira pessoa -s foi ensinada). Um exemplo da atividade foi o seguinte: fez-se um círculo com os alunos em sala e o professor pediu para que cada aluno da classe dissesse em inglês o que gostava ou não de fazer - por exemplo, „I like to play soccer‟/„Eu gosto de jogar bola‟. Depois disso, cada aluno teve que relatar o que o colega à sua direita havia dito – „John likes to play soccer‟ / „João gosta de jogar bola‟. O professor fez o primeiro exemplo e os alunos seguiram após ele, tentando produzir frases contendo os verbos na terceira pessoa do singular com –s. Para o GB, o tratamento foi totalmente voltado para a explicação explícita da forma em questão. Primeiramente, a professora passou no quadro-negro a regra dos verbos na terceira pessoa do singular com -s e deu exemplos. Em seguida, os alunos copiaram os exemplos no caderno e fizeram atividades gramaticais para trabalhar a estrutura-alvo. Dentro desta aula com Foco nas FormaS, os participantes não interagiam de forma alguma com os seus colegas; apenas verificam a regra e posteriormente faziam atividades para praticar a estrutura ensinada. No terceiro dia após o tratamento, o protocolo escrito foi aplicado em Português e no quarto dia foi feito o pós-teste. O protocolo escrito tinha a finalidade de verificar se os alunos haviam percebido a estrutura-alvo, ou prestado atenção às regras; também observava se os mesmos poderiam verbalizá-las e dar exemplos, fazendo frases com a estrutura aprendida. O pós-teste foi utilizado para verificar se a forma lingüística aprendida durante o tratamento foi retida pelos aprendizes, mesmo que, no caso do presente estudo, por um curto período de tempo. Semelhante ao pré-teste, o pós-teste consistiu em um conjunto de seis imagens através das quais os participantes deveriam escrever frases usando a estrutura-alvo na sua forma afirmativa, negativa e interrogativa. Para a análise dos dados coletados, foram consideradas corretas as frases que não continham erros na estrutura-alvo. Outros erros que não voltados ao foco da pesquisa foram desconsiderados. Além disso, foi considerado como ocorrência de percepção/atenção seletiva da estrutura-alvo somente as instâncias nas quais os alunos foram capazes de verbalizar a regra e produzir duas frases contendo a estrutura solicitada no protocolo escrito. INTERLINGUAGENS V.1 2010 4. Resultados e discussão Como mencionado nos procedimentos metodológicos, os resultados do pré-teste confirmaram que nenhum participante havia conhecimento prévio da estrutura linguística trabalhada no período de tratamento. Quanto ao protocolo escrito, a maioria dos alunos parece perceber ou procurar compreender as regras quando em contato com uma nova estrutura. Considerando a tentativa de verbalizar a regra, não houve diferença significativa entre o GA e o GB. A Tabela 1 mostra que 13 participantes do GA (48%) e 9 participantes do GB (50%) foram capazes de explicar a regra de forma suficientemente clara, o que gerou um percentual semelhante para ambos os grupos. Tabela 1. GA e GB – Percepção da estrutura-alvo medida pelo protocolo escrito (porcentagem de acurácia na verbalização da regra e nos exemplos escritos dados) Total Verbalização correta da regra Sentenças corretas produzidas GA GB 27 participantes (100%) 13 participantes (48%) 15 participantes (55%) 18 participantes (100%) 9 participantes (50%) 9 participantes (50%) Quando solicitados para escrever exemplos da estrutura-alvo, 15 participantes do GA (55%) e 9 participantes do GB (50%) conseguiram escrever no mínimo duas frases usando a estrutura de forma correta. Mesmo sem receber nenhuma instrução explícita sobre a regra em inglês dos verbos na terceira pessoa no singular com -s, os participantes do GA se mostraram capazes de verbalizar algum tipo de explicação, alguma „regra‟ para a estrutura aprendida. No entanto, as descrições do GB sobre como a estrutura aprendida „funcionava‟ se apresentaram de forma muito mais detalhada que o GA; além disso, as explicações dadas pelos participantes do GB geralmente tratavam das diferenças entre os três tipos de frases: nas formas afirmativa, negativa e interrogativa. Considerando a H1 da pesquisa, que pretendia verificar se os aprendizes de inglês da sexta série do ensino fundamental seriam capazes de perceber a estrutura-alvo, podemos observar que a hipótese fora parcialmente confirmada, segundo os números apresentados na tabela acima. Mesmo que a percepção do item gramatical não tenha se INTERLINGUAGENS V.1 2010 dado com porcentagens muito elevadas – a média foi de 50% em geral -, nota-se que os alunos foram capazes de usar de sua atenção seletiva para perceber a estrutura e dar algum sentido a ela, a fim de entender como usar com este novo item lingüístico. Assim, além dos aprendizes adultos de LE, aprendizes na puberdade, com idade média de 12 anos, são também capazes de perceber, de forma consciente, aspectos voltados à estrutura da língua que estão aprendendo, por mais que sua capacidade cognitiva ainda esteja em fase de desenvolvimento. Com relação ao pós-teste, aplicado no dia 4, observa-se que o GA conseguiu produzir frases usando o item em questão com maior precisão do que o GB, apesar de a diferença entre os grupos ter sido relativamente pequena (51% de acurácia para o GA, e 38% para a GB), como demonstrado na Tabela 2. As porcentagens apresentadas se referem à produção correta da estrutura-alvo em 4, 5 ou 6 sentenças no pós-teste. Tabela 2. GA e GB: Porcentagem de produção correta da estrutura-alvo no pós-teste. Produção correta: 4 ou mais sentenças corretas GA GB 51,83% 38,88% Considerando os tipos de sentença analisados – formas afirmativa, negativa e interrogativa-, percebe-se que o GA obteve o mesmo desempenho em termos de produção correta para as frases nas formas afirmativa e negativa: de um total de 54 sentenças, os aprendizes do GA conseguiram formar 32 sentenças corretas nas formas afirmativas e negativas. Conforme apresentado na Tabela 3, de modo geral o GA produziu as sentenças afirmativas e negativas com média próxima a 60% de acurácia; sua produção acurada das sentenças interrogativas foi menor: 22 frases corretas para um total de 54, obtendo uma porcentagem de 40% de acurácia para esta forma. Tabela 3. GA - Resultados da produção correta por tipo de sentença no pós-teste Grupo A Negativa Afirmativa Interrogativa Total* 54 54 54 Sentenças corretas** 32 32 22 Porcentagem 59,25% 59,25% 40,74% Nota: * Número total de sentenças por tipo. ** Número total de sentenças corretas. INTERLINGUAGENS V.1 Total 162 86 53,08% 2010 A tabela 4 mostra os resultados do GB quanto à sua produção acurada, considerando também cada tipo de frase produzida. Comparando-se os três tipos de frase, nota-se que o GB não apresentou grande diferença na produção correta dos diferentes tipos de frase: afirmativa, negativa e interrogativa. Considerando-se o total de 36 frases analisadas para cada tipo, o GB produziu de modo correto 16 sentenças negativas, 18 afirmativas e 14 interrogativas. O tipo de frase produzido com maior precisão foi a afirmativa, com 50% de acerto. A forma interrogativa pareceu ser a mais complexa de ser produzida corretamente, sendo que sua freqüência de produção correta foi de aproximadamente 40%. Tabela 4. GB - Resultados da produção correta por tipo de sentença no pós-teste Grupo B Negativa Afirmativa Interrogativa Total* 36 36 36 Sentenças corretas** 16 18 14 Porcentagem 44,44% 50% 38,88% Nota: * Número total de sentenças por tipo. ** Número total de sentenças corretas. Total 108 48 44,44% Se compararmos as produções de GA e GB, podemos perceber que os aprendizes sentiram maior dificuldade na produção das sentenças interrogativas, uma vez que estas tiveram os menores índices de acurácia ao serem produzidas. Porém, de modo geral, os resultados de ambos os grupos foram um tanto similares, em termos percentuais. Para o GA, parece ter havido maior percepção da estrutura-alvo, considerando-se que suas porcentagens de produção correta dos três tipos de frases no pós-teste foram mais elevadas do que as porcentagens do GB, conforme visualizado nas tabelas 3 e 4. Quanto ao total de produções corretas, o GA obteve 53% no total de frases corretas, enquanto que o percentual total do GB foi de 44%. Tal resultado mostra que o GA fora capaz de „perceber‟ melhor o item, ou seletivamente atender de forma mais freqüente à estrutura-alvo, se comparado ao GB, apesar de suas explanações da regra (no protocolo escrito) terem sido menos elaboradas do que as do outro grupo. Este grau mais elevado de percepção do item-alvo pode ter ocorrido pelo fato de o tratamento recebido pelo grupo A ter sido mais „natural‟: a estrutura fora trabalhada de forma „indireta‟, através de uma atividade comunicativa envolvendo todos os alunos da sala. Assim, a segunda hipótese, H2, também se confirma: a abordagem comunicativa, de Foco na Forma, parece ter trazido mais INTERLINGUAGENS V.1 2010 benefícios em termos de aprendizagem para os alunos. O GA obteve melhores resultados provavelmente por ter trabalhado dentro de uma abordagem mais interativa FonF – sem foco específico na regra em questão e sem instrução explícita da estruturaalvo por parte do professor; Dessa forma, possivelmente, a aprendizagem tenha sido mais significativa e, assim, os ganhos em termos de percepção foram maiores se comparados à abordagem tradicional, com foco na estrutura-alvo e instrução explícita da regra. 5. Considerações finais O presente estudo visa observar a capacidade de „percepção‟ (SCHMIDT, 1990) ou „atenção seletiva‟ de uma estrutura-alvo por aprendizes brasileiros de inglês como língua estrangeira. Para tanto, foram investigadas duas turmas de inglês em uma escola pública, com um total de 45 aprendizes entre 11-12 anos de idade, residentes no sul do Brasil. Os dados foram coletados através de um pré-teste, seguido de um período de tratamento em sala de aula, e um pós-teste. O objetivo geral da pesquisa era investigar se tais aprendizes conseguiriam „perceber‟ e posteriormente verbalizar e escrever exemplos do item gramatical investigado: verbos na terceira pessoa do singular com –s. Os dois tipos de tratamento aplicados foram: Foco na Forma, para o grupo A; e Foco nas FormaS, para o grupo B. O protocolo escrito do pós-teste procurou observar, através da correta explanação da „regra‟ e da exposição de frases com a estrutura-alvo, se o item gramatical fora percebido pelos aprendizes. Quanto a esta medição indireta de percepção, pode-se observar que os alunos que receberam o tratamento com Foco nas FormaS foi capaz de melhor verbalizar ou explanar detalhadamente a regra que rege os verbos na terceira pessoa do singular com –s. Convém lembrar que tal tratamento segue uma abordagem tradicional de instrução explícita da estrutura-alvo e posterior prática da mesma através de atividades gramaticais. No entanto, o grupo que recebeu a abordagem comunicativa – sem instrução explícita da estrutura-alvo - com Foco na Forma parece ter obtido resultados melhores (mais frases corretas) na produção das sentenças com a estruturaalvo. INTERLINGUAGENS V.1 2010 Considerando o fato de as porcentagens de produção correta entre GA e GB terem sido um tanto similares, sugere-se que, provavelmente, não tenha havido uma grande diferença no tratamento da estrutura pelos dois tipos de abordagens de ensino adotadas no presente estudo. Conforme explica Doughty (2001), "forma" e "significado" não podem ser inteiramente separados. Sabe-se que o Foco na Forma (FonF) pode vir a permitir momentos de foco em elementos linguísticos, enquanto que o Foco nas FormaS se limita a tal foco, e um foco no significado excluiria completamente qualquer atenção à estrutura da língua. Dessa forma, as abordagens de Foco nas FormaS e FonF não podem ser considerados pólos opostos, conforme indiretamente assumido nesta investigação. Talvez, como Dekeyser (1998) propõe, uma abordagem de ensino de língua exclusiva deva ser evitada. Possivelmente, o mais acertado seria que o trabalho em sala de aula contemplasse variados métodos de ensino e o uso de atividades diversas que, quando em conjunto, pudessem permitir que alunos com diferentes características e necessidades tivessem atendidos seus estilos preferidos de aprendizado. Certamente assim melhores ganhos poderiam ser observados no âmbito do ensino e aprendizagem de línguas. Quer-se lembrar que a pesquisa empírica aqui relatada foi de pequena escala e, portanto, apresenta limitações. Dessa forma, os resultados apresentados são apenas sugestivos. Sugere-se que pesquisas posteriores investiguem salas de aula com um maior número de participantes, tendo um período de tratamento maior, e aplicação do pós-teste depois de um período mais longo de tempo, a fim e observar se os aprendizes conseguiriam reter a estrutura-alvo por mais tempo, por exemplo. Pesquisas futuras podem, assim, vir a confirmar ou descartar as conclusões aqui apresentadas. E considerando-se que a sala de aula real é um cenário difícil de ser controlado, talvez alguns outros métodos devam ser desenvolvidos para medir a percepção e a aquisição de algum aspecto da LE, a fim de evitar variáveis intrusivas que possam influenciar os resultados de modo a reduzir seu grau de confiabilidade. Por fim, espera-se que mais estudos sejam realizados com o objetivo de verificar se os resultados aqui apresentados são relevantes e confiáveis. Além disso, a sala de aula é um ambiente experimentalmente enriquecedor que deve continuar sendo investigado, embora com cautela, a fim de que a literatura de aquisição de segunda língua possa também se enriquecer a partir do conhecimento aprofundado deste contexto. INTERLINGUAGENS V.1 2010 6. Referências bibliográficas BERGSLEITHNER, J. M. Working memory capacity, noticing, and L2 speech production. Tese de Doutorado em Letras - Programa de Pós-Graduação em Inglês e Literatura Correspondente, Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC, Florianópolis, 2007. DEKEYSER, R. Beyond focus on form: cognitive perspectives on learning and practicing second language grammar. In: DOUGHTY C. J.; WILLIAMS, J. (Eds.). Focus on form in classroom second language acquisition. Cambridge University Press, 1998. p. 42-285. DEKEYSER, R. Implicit and explicit learning. In: DOUGHT, C. J.; LONG, M. H. (Eds.), The handbook of second language acquisition. Malden, MA: Blackwell Publishing, 2003. p. 313-348. 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