Estratégia e Corrupção ENPAD

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Estratégia e Corrupção
Autoria: Felipe Mendes Borini, Fernando Correa Grisi
Resumo
O presente artigo objetiva discutir os impactos da corrupção nas estratégias de negócios,
entender a corrupção na perspectiva do micro e pequeno empresário paulista, desenvolver uma
métrica para avaliar a mesma, e, finalmente, apontar as implicações de tais resultados para os
estudos em estratégia organizacional. Para tanto, foi conduzido. Estratégia e corrupção são
discutidas por meio de um dialogo entre teorias econômicas, a visão baseada em recursos e a
teoria institucional. Um survey com as micro e pequenas empresas serve de base para testar a
métrica elaborada e medir a percepção dos empresários. Os resultados apontam para as práticas
corruptas de roubo, suborno, propina, concorrência desleal, sonegação, pirataria, fraude, tráfico
de informação. Três clusters de empresas se diferenciam quanto à percepção das práticas
corruptas em seu ramo, exigindo à reflexão de pontos centrais que deveriam ser levados em
consideração nas estratégias de combate a corrupção: a eficiência produtiva dos recursos e
capacidades organizacionais; a formação das pessoas, no sentido de competência individual; a
ética empresarial; e uma cultura organizacional não permissiva aos atos corruptos.
Introdução
O que é corrupção? A resposta corriqueira seria a definição próxima àquela do código penal,
tal como a definição clássica de Nye (1967) em que corrupção está associada a qualquer ato
ilegal para beneficiar uma instância privada ou pública. Entretanto, os avanços nos estudos
das ciências sociais mostram que a resposta não é tão simples.
Para melhor compreender a indagação do início do parágrafo precisamos compreender que a
corrupção não é um fenômeno exclusivo de uma sociedade ou de um momento de seu
desenvolvimento, pois está presente em formações sociais distintas (Bezerra, 1995). e sofrem
uma variação significativa, pois possui uma dimensão social, legal, histórica e cultural. Isto
quer dizer que dependendo do grupo social em análise, um fato pode ter uma cotação mais ou
menos corrupta, ou nem mesmo corrupta. Os trabalhos de Peters e Welch (1978), Gibbons
(1990) e Johnston (1989) mostram que a percepção social da corrupção varia conforme
escolaridade, classe social, local de residência e formação política.
Foi a tese de Heidenheimer (1970) que trouxe a tona a importância das relações sociais no
ordenamento do que é uma pratica corrupta ou não. Heidenheimer sugeriu três tipos de
corrupção. A “corrupção preta” quando lei e norma social coincidem, ou seja, a lei pune e a
sociedade acredita que aquele ato deve e vai ser punido, portanto em sua maioria classifica
tais atos como corruptos. A “corrupção branca” que é o extremo oposto da “corrupção preta”,
pois a lei reprova, mas a população é tolerante quanto a pratica, ou, mesmo, nem ao menos
reconhece o comportamento como moralmente questionável. E a “corrupção cinza” quando os
atores sociais avaliam determinado comportamento de forma controversa. Hoje se fala muito
na mídia em “mercado cinza” como o mercado dos produtos piratas, contrabandeados, ou
subfaturados, entre outras suposições. Trata-se de produtos que praticam algum ato ilícito em
alguma transação da cadeia produtiva, mas são de modo geral consumidos pela população,
que em boa parte dos casos sabe que esta cometendo um ato ilícito ao adquiri-lo, mas
considera tal pratica institucionalizada e “permitida”.
O estudo de Heidenheimer (1970) ampliou a perspectiva da corrupção para além da definição
normativa, proveniente das ciências jurídicas (Scoot, 1972; Johnston, 1996). Além disso,
embora a tese tenha sido um ensaio, os estudos de Gibbons (1990) e Johnston (1989) puderam
comprovar empiricamente a tese de Heidenheimer. Peters e Welch (1978) reforçam os
diferentes modos de encarar a corrupção, mostrando em seu estudo que a inserção social das
normas escritas varia conforme o caso estudado. Enquanto para alguns casos, noventa por
cento enquadrava o ato como corrupto, em outros casos, um ato legalmente corrupto, era
proclamado como tal apenas para vinte por cento dos entrevistados. Tais resultados foram
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posteriormente aplicados no Canadá (Atkinson e Mancuso, 1985) e Austrália (Jackson et
al.,1994) confirmando a tese da variabilidade das relações sociais conforme cultura, historia,
normas e instituições legais. Portanto, embora exista em cada unidade federativa um aparato
de leis e normas a respeito da corrupção, é importante ressaltar que não existe um
universalismo sobre corrupção e o entendimento desta por parte da população pode variar
dentro de um continum de atos ilegais julgados como corruptos, até atos ilegais da mesma
forma, mas não julgados como corruptos pela população. Isto mostra que a corrupção é um
fenômeno social e complexo inerente as relações pessoais individuais, institucionais e
corporativas, que neste texto nos interessa em particular.
Dado que corrupção varia conforme o grupo social em análise e não se restringe as normas
legais ou questões de mérito moral e ético interpretadas por hermeneutas da sociedade, o
presente artigo objetiva discutir os impactos da corrupção nas estratégias de negócios,
entender a corrupção na perspectiva do empresário – no caso, o micro e pequeno empresário
paulista -, desenvolver uma métrica para avaliar a mesma, e, finalmente, apontar as
implicações de tais resultados para os estudos em estratégia organizacional.
Corrupção e Estratégia
É difícil encontrar estas duas palavras nos grandes manuais da estratégia popularizados no
Brasil, ou de autores brasileirosi ou mesmo nos artigos acadêmicos de periódicos nacionais e
até internacional. De outro, lado a palavra corrupção é comum para os empresários e mesmo
para os acadêmicos da área de estratégia. Os empresários lidam todo dia com a atitude ilícita
de concorrentes, parceiros comerciais, clientes e funcionários; e consequentemente levam
constantemente tais problemas para os professores de graduação e principalmente MBA’s de
estratégia organizacional. Para responder aos estudantes os acadêmicos, por sua vez, como
proliferadores de obras publicadas tem o modelo SWOT ou as cinco forças de Porter, dentre
as mais famosas, que por natureza não englobam a corrupção de maneira diretaii. Por que este
descaso? A corrupção não importa, pois não influência no desempenho da empresa? Ou, a
corrupção importa, mas esta institucionalizada (Scoot, 1995) de tal maneira na sociedade, que
o que é ruim para uma empresa é ruim para outra empresa, logo o empresário deve se
acostumar a trabalhar num ramo que sofre o encargo de tais mazelas ilícitas? Ou seria que a
percepção de corrupção dos empresários sobre corrupção, não tem tão grande importância?
É inegável que existe uma institucionalização da corrupção em vários ramos da vida social e
vida corporativa. O esquema interpretativo (Hinings e Greenwood, 1998) orientador das
decisões organizacionais e dos julgamentos de valor em relação a corrupção não são estáticos
e uniformes, pelo contrario, apresentam grande variabilidade, mas mesmo assim, variando
quanto ao grau de aceitação da corrupção, para os empresários, embora a corrupção seja uma
mazela, a legitimação da mesma e a adaptação das suas decisões estratégicas em concordância
as práticas corruptas, trata-se de uma estratégia de sobrevivência da empresa em tal ambiente
institucional, pois a organização precisa se adaptar às normas e padrões de conduta
socialmente valorizados, que correspondem às expectativas dos atores no contexto no qual
atuam (Scott, 1995). Nada garante a sobrevivência e a própria legitimação da empresa caso o
empresário adote uma estratégia contrária, uma estratégia ofensiva, de combate à corrupção.
Entretanto, nada impede que as empresas de acordo com a interpretação do ambiente podem
adotar estratégias diferenciadas, que garantam uma competitividade superior. Adotar
estratégias de combate à corrupção se caracterizaria como um diferencial competitivo.
Assim, a tentativa que se propõe é trazer as teorias econômicas acerca da corrupção (para uma
análise mais profunda ver Silva, 2000) para o âmbito corporativo em pró de uma reflexão das
implicações da corrupção na estratégia da organização.
A análise que segue se baseia em duas teorias econômicas da corrupção: teoria dos “caçadores
de renda”; teoria econômica da propina.
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A teoria dos “caçadores de renda” (Krueger, 1974; Bhangwati, 1982; Tullock, 1990). A
motivação básica dos agentes econômicos é a maximização do seu bem-estar econômico. A
maximização é dependente do conjunto de regras, preferências individuais e da renda. A
corrupção entra no momento em que os agentes tentam obter o máximo de rendimentos
extrapolando os limites impostos, ou seja, por meio de diversas formas de privilégio. Num
mercado competitivo, como somente alguns grupos de agentes conquistaram privilégios, o
resultado final é o desperdício econômico, pois os custos da atividade caçadora de renda são
maiores que os benefícios obtidos por alguns grupos. Quais custos são estes? Eis que entra a
dimensão qualitativa, um recurso humano qualificado ao reconhecer que a atividade corrupta
garante uma renda superior que a atividade legal, ele vai despender horas de seu trabalho e
seu máximo esforço na atividade geradora de renda: a corrupta. A sociedade perde como um
todo, pois este agente esta usando sua qualificação - construída em grande parte dos casos, ao
custo dos impostos da sociedade – para uma atividade ilícita, “caçadora de renda” para uns
privilegiados e que onera a todos, pois sua devida função não será realizada com cem por
cento das forçasiii. Particularmente, a empresa perde, pois esta empregando um recurso
valioso, para uma atividade ilícita. Tudo bem, por vezes a empresa pode sair ganhando com
os resultados da atividade da mão de obra ilícita. Ambos agentes empresa e empregado
estariam agindo coadunados para a pratica ilícita, sendo que os ganhos seriam distribuídos por
ambas as partes. Mas será que era necessário empregar para aquela atividade uma mão de
obra tão valiosaiv? Se for este o caso ambos se merecem empresa e empregado. Entretanto, o
caso pode ser de corrupção por parte do empregado. Será que este empregado, exercendo sua
atividade com cem por cento de esforços não poderia garantir um retorno superior para a
empresa? Se a resposta for não, antes de permitir que o empregado pense em buscar uma
atividade “caçadora de renda”, a empresa precisa articular seus recursos e capacidades de
modo a garantir que o empregado tenha condições de realizar uma atividade mais rentável.
Por outro, lado se a resposta for sim, a empresa precisa urgentemente rever os valores, crenças
e normas que constituem sua cultura organizacional, pois o problema evidentemente se
encontra no cerne da maneira de fazer negócios naquela empresa. A cultura empresarial por si
só pode corromper o empregado, uma vez que ele, por si próprio não gostaria de exercer tal
atitude, mas precisa se envolver em atividades ilícitas, como uma estratégia de sobrevivência
na empresa. A empresa é corrupta em função das normas de condutas e valores socialmente
valorizados no ambiente que atua, de tal modo, que se assim não for, não teria acesso aos
recursos materiais e econômicos (Scott, 1995).
Portanto, o problema é da corrupção, de um lado é ordem de articulação de recursos ou
capacidades, um problema técnico e que supostamente poderia ser refletido a luz da teoria da
visão baseada em recursos (Penrose, 1959; Wernefelt, 1984; Barney, 1991, 2001) e
capacidades dinâmicas (Teece, Pisano, Shuen, 1997); por outro lado, o problema da corrupção
é institucional, inerente a adequação às normas de conduta instituída para os diversos atores
do segmento competitivo (Machado-da-Silva e Fonseca, 1996; Machado-da-Silva e Barbosa,
2002).
A teoria econômica da propina (Rose-Arckermann, 1978) leva em conta o suborno e a propina
em razão do conflito entre o bem público e privado. No Estado perfeito, legado da burocracia
weberiana, cujo comportamento do burocrata é estritamente público, as decisões não são
pessoais, logo desempenhariam sua função com a máxima eficiência. No momento em que
algum incentivo financeiro (propina, suborno) tenta quebrar a relação impessoal, tornando-a
pessoal o mundo perfeito desaba e a corrupção prevalece. O mesmo ocorre na organização
privada, a máxima eficiência do empregado é quebrada quando alguém de dentro da empresa
ou de fora transforma a relação profissional em pessoal em troca de algum favorecimento
ilícito. O problema da propina depende, portanto, da restrição moral do empregado aceitar ou
não aceitar tal favorecimento. A restrição moral por sua vez depende de sua formação como
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do ambiente em que se encontra. Embora um fenômeno que pode ser incitado por agentes
externos da empresa envolvendo agentes internos, em qualquer caso, continua a tratar
novamente de um problema inerente a organização, pois a organização é um grupo social
imerso nos padrões e normas de um grupo social maior da qual ela faz parte (Granovetter,
1985). Assim, a empresa em suas estratégias de recrutamento, seleção e desenvolvimento
profissional não pode abdicar da questão moral em pró de uma questão técnica ou intelectual,
pois a mesma, como já vista, pode rapidamente ser usada para outros fins que não os
organizacionais. A empresa precisa rever o modelo de formação de pessoas passando dos
conceitos passados de qualificação técnica, para um conceito mais abrangente de formação
integral das pessoas que servem a organização, alinhado com o conceito de competência
individual (Dutra, 2004). Da mesma forma, cabe a gestão empresarial ser rigorosa na conduta
normativa das questões éticas e morais socializadas por meios dos valores e crenças
organizacionais. Neste início de década é comum o titulo de “organização socialmente
responsável” ou “organização ética”, assim como, os códigos de conduta e códigos de ética,
mas cabe ressaltar que de nada adianta os códigos se não existir uma estratégia de
socialização das normas elaboradas nos mesmos (a não ser que o caso seja apenas uma
questão de publicidade).
Portanto, a questão da propina depende de uma estratégia de recursos humanos, aliada a uma
estratégia de socialização das questões éticas e morais inerentes às práticas administrativas,
que esta fortemente correlacionada com o ambiente institucional e com seu impacto na
formação da cultura empresarial, a mesma, que muitas vezes é a responsável pela propina
devido exigir resultados “a qualquer custo” ou ser negligente com questões ilícitas. Trata
novamente de uma questão técnica e institucional, já que os recursos da firma são
condicionados pelo ambiente e características sócio-culturais em que elas atuam (Pettigrew e
Whipp, 1993).
Medindo a Corrupção
A maioria das pesquisas acerca da corrupção pode ser classificada em três vertentes (Bezerra,
1995; Speck, 2000): os estudos baseados em dados forenses de condenações penais; os
estudos de casos relacionados com os grandes escândalos na mídia (ex. CPI dos correios; caso
PC-Farias; mensalão, entre vários outros); e finalmente as pesquisas de percepção qualitativas
e quantitativas. Neste estudo, o foco é o ultimo modo de pesquisa.
Dentro das pesquisas quantitativas e qualitativas os estudos da primeira geração tentavam
identificar a percepção da sociedade quanto aos atos ilícitos. Os estudos de Peters e Welch
(1978), Gibbons (1990) e Johnston (1989) se enquadram neste tipo. O foco era saber se o que
esta na lei reflete no conceito do grupo social. A segunda geração (ver Kaufmann, Kraay e
Zóido-Lobatón, 1999) é marcada pelos grandes painéis desenvolvidos por instituições
nacionais ou supranacionais tais como o Banco Mundial, World Economic Fórum, World
Competitiveness, assim como, por institutos de pesquisa de mercado e agências de risco.
Usando da opinião de especialistas, empresários e acadêmicos as pesquisas mediam a
percepção dos entrevistados quanto a corrupção no país. As situações eram expostas de modo
geral sem se referir a um determinado ramo ou empresa, mas na percepção de como a
sociedade agia e com que freqüência as práticas de corrupção ocorriam.
Como resultado dessa segunda geração surgiu o Índice de Percepções da Corrupção (IPCorr),
um projeto da Universidade de Gottingen e incorporado pela organização não governamental
Transparência Internacional (TI). O índice mostra as notas dos paises variando de
absolutamente corrupto (0) até absolutamente integro (10). Com isto é criado um ranking,
que, principalmente, pode orientar as atividades de empresas estrangeiras quanto aos seus
investimentos externos, assim como pode orientar políticas públicas de combate à corrupção,
ou orientar agências financeiras quanto ao risco de empréstimos, dentre outras utilidades.
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Entretanto, a corrupção é um fenômeno das ralações sociais e a nota pode variar conforme a
percepção de cada sociedade, sendo esta uma severa limitação do IPCorr.
A terceira geração de pesquisas, na qual a presente pesquisa se enquadra, além de medir a
corrupção procura refletir sobre as implicações da mesma e estratégias de combate. Grande
parte das pesquisas, como as do Banco Mundial (World Bank, 2004) e do Programa das
Nações Unidas para o Desenvolvimento da América Latina e Caribe (El Corruptometro,
1998) apresentam implicações e estratégias no âmbito das políticas públicas.
Não existe pesquisas que pensem nas implicações da corrupção e nas estratégias de combate
no âmbito das empresas privadas. O tema é polêmico e talvez esse tenha sido este um dos
principais impedimentos para pesquisas do tipo. Entretanto, levantamentos recentes
(Tranparecy International Bangladesh, 1997; Ciet, 1998; Coalition, 2000) têm demonstrado
que os empresários estão dispostos a informar sobre suas experiências com o assunto, dessa
forma fornecendo além da percepção geral, uma noção da freqüência da corrupção no âmbito
dos negócios.
Baseado no possível interesse dos empresários em discutir sobre o tema e na lacuna que as
pesquisas da corrupção apresentam, ou seja, a lacuna da corrupção no dia-dia dos negócios, a
presente pesquisa de caráter exploratório esboça uma tentativa de construção de métrica para
a corrupção e discussão das implicações para os estudos acadêmicos em estratégia.
Metodologia
Coleta de dados
A população escolhida para a pesquisa foram micros e pequenas empresas (MPE) da cidade
de São Paulo que atuam no comércio de produtos e serviços. A amostragem retirada da
população seguiu critérios não probabilísticos de conveniência. O raio de pesquisa foi
delimitado pela região do centro expandido da região de São Paulo. Trata-se do centro da
capital paulista adentrando em partes da zona sul, leste, oeste e norte da capital paulista.
Nessa região, além de uma grande concentração de MPE de comércio e serviços, existem
grandes concentrações de comércio popular e ruas ou regiões comerciais famosas pela venda
de tecidos, eletrônicos, etc.
A escolha das MPE tem duas razões: relevância e conveniência. As MPE representam 98% do
número de empresas da economia nacional, detém 53% dos trabalhadores com carteira
assinada (Sebrae, 2006), são responsáveis por 28% do faturamento nacional (Sebrae, 2000).
Em São Paulo perfazem 98% dos estabelecimentos (Sebrae-SP, 2007) e são responsáveis por
67% das pessoas ocupadas (Sebrae, 2000). Enquanto no período de 2004 as MPE cresceram
23% em números de estabelecimentos, as médias e grandes empresas cresceram 18% (SebraeSP, 2007). Em 2004, cerca de 53% das MPEs estavam no comércio, 34% em serviços e 13%
na indústria, sendo que as que mais crescem são as de serviço (Sebrae-SP, 2007).
Além disso, é mais fácil o acesso às pessoas responsáveis pela operação da MPE. O foco nas
grandes empresas, além da dificuldade de acesso, necessitaria do contato de diferentes
pessoas, nem sempre em departamentos similares nas empresas. O proprietário da MPE, ou
responsável direto da MPE, além de ter conhecimento de todas as áreas da empresa, tinha
mais fácil acesso a pessoas chave caso necessitasse de alguma opinião para a resposta das
questões – fato ocorrido em algumas MPE.
Embora, trata-se de uma amostra não probabilística por conveniência o número de empresas
pesquisadas seguiu a regra do tamanho da amostra (Rea; Parker, 2000). Considerado um nível
de confiança de 95%; margem de erro de 7% para mais ou menos e trabalhando a proporção
de 0,5, uma vez que a verdadeira proporção (p) é desconhecida: o número final de empresas
pesquisadas seria de 196. Para garantir uma seguridade em casos de questionários perdidos ou
não compreendidos ao número de empresas pesquisadas foi adicionado mais vinte empresas,
totalizando 216 amostras. Dez foram descartadas por problemas de preenchimento restando
para análise 206 empresas.
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A coleta de dados foi realizada por meio de entrevistas pessoais para garantir a confiabilidade
da aplicação do questionário, já que se tratava de questionários que envolviam perguntas
complexas, de caráter polêmico e que necessitava de uma forte garantia que se tratava de um
questionário isento, para fins acadêmicos e cujo tratamento de dados seria agregado de
maneira nenhuma ressaltando o nome da empresa, ou qualquer particularidade que
identificasse a empresa.
Procedimentos para a Construção do Questionário
A estratégia adotada foi a construção de um questionário que refletisse a corrupção nos
negócios no ambiente brasileiro, mais precisamente a capital paulista. A razão de tal escolha
partiu do pressuposto que as pesquisas em relação ao aspecto corrupção não relatam
diretamente o que ocorre nas empresas, mas em sua maioria são painéis sobre o nível de
corrupção da sociedade em que a empresa se encontra (Kaufmann, Kraay e Zóido-Lobatón,
1999 e Speck, 2000) ou, ainda, quando relatam a corrupção nos negócios trata-se de
explanações teóricas e reflexivas (Argandona, 2005 e Kayes, 2005).
Assim, o primeiro passo para a construção do questionário foi a elaboração de grupos
focalizados em entrevistas em profundidade, os grupos de foco, contendo dez pessoas cada,
num total de seis grupos.
O grupo escolhido para as sessões foi o de micro e pequenos empresários do centro expandido
de São Paulo e que aceitaram participar de discussões acerca da corrupção. Duas foram as
restrições para os participantes: experiência no ramo - teriam que ter no mínimo cinco anos de
empresa constituída – e ser proprietário de um estabelecimento formal. A situação financeira
do negócio e o profissionalismo da gestão foram outras duas variáveis diferenciadoras. Na
montagem dos grupos de foco foram ponderados os grupos com metade dos empresários em
boa situação financeira e outra metade com situação financeira delicada; metade com gestão
profissional e outra metade não.
O foco da discussão eram os atos ilegais praticados por empresas e a efetividade da punição
do sistema legal e social sobre tais fatos. Em entrevistas de aproximadamente três horas o
moderador do grupo buscava ao máximo extrair as principais ocorrências de corrupção
conhecidas e vivenciadas pelos participantes.
A condução dos grupos de foco garantiu a obtenção de um painel sobre a corrupção nas MPE.
Foram obtidas quarenta e nove variáveis (fatos) acerca da corrupção nos negócios.
Para um delineamento da importância atual e futura dessas variáveis foram conduzidas
técnicas de prospecção, tais como o método delphi e a construção de cenários.
A escolha do método delphi se deu primeiramente em razão do fato da disposição apenas de
dados não mensuráveis a respeito da corrupção no dia-dia dos negócios, um tema, que apesar
de não ser recente é muito pouco pesquisado no ambiente de negócios. Assim, usou-se o
método, pois não existe no grau de profundidade proposto pela pesquisa dados históricos e
quantitativos a respeito da corrupção nos negócios. Além disso, é recomendável, pois o
assunto inerente a pesquisa, trata-se de um julgamento subjetivo de um grupo (Wright;
Giovinazzo, 2001).
Uma segunda razão para seu uso está em sintonia com a explicação de (Turoff; Linstone,
1975), ou seja, um método para um problema complexo. O objetivo, além de selecionar as
variáveis que melhor explicassem a corrupção para o grupo envolvido (no caso todos
participantes dos grupos foram convocados novamente para participar da aplicação do
método), era, também, delinear as variáveis de corrupção mais plausíveis de ser encontradas
no futuro.
Para incrementar a discussão, além dos empresários participantes foi inserido na discussão
também especialistas da área de gestão, contabilidade e direito para opinar a respeito dos
aspectos de corrupção nas empresas.
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O procedimento de aplicação seguiu as diretrizes e modelo exposto por Wright; Giovinazzo
(2001). Foram formuladas as questões com base nas entrevistas com os grupos de focos. Os
painelistas foram convocados para a sessão do método. Iniciou-se com um questionário com
quarenta e nove questões abordando as variáveis pré-expostas pelos entrevistados dos grupos
de foco. Os painelistas dentro de uma tábua de zero a dez deveriam expressar a concordância
com a importância e freqüência daquelas atividades hoje e num futuro dimensionado de não
mais que dez anos. As respostas das questões quantitativas foram tabuladas, definindo-se a
mediana e os quartis. Nessa primeira rodada ainda era possível o respondente expressar
justificativas e opiniões qualitativas associadas a previsões quantitativas. Tabulada as
respostas e consideradas as justificativas os resultados foram devolvidos aos participantes
para a segunda rodada. Nesta rodada os participantes deveriam reavaliar suas respostas à luz
das respostas numéricas e das justificativas dadas pelos demais respondentes na rodada
anterior. Da mesma forma prosseguiu mais uma rodada chegando a uma convergência
satisfatória das respostas. Dessas questões referentes às variáveis sobre corrupção, trinta e
uma questões receberam notas concordantes quanto à importância e freqüência de sua
ocorrência nos negócios, hoje e no futuro.
A última etapa foi caracterizada pela construção de cenários por parte de especialistas em
estratégias organizacionais. Com base nos resultados das entrevistas do grupos de foco e no
método delphi, os especialistas (total de sete) construíram cenários prospectivos pelo método
de narrativas do futuro (Glenn; Gordon, 2006).
O método propõe que seja construído cenários por meio de narrativas elaboradas pelos
especialistas acerca das diferentes configurações de mundo sobre influência de fatores chave
que se pretende elucidar e avaliar o impacto. Os fatores graduam entre dois extremos: positivo
e negativo. Os fatores usados foram a maior ou menor corrupção no futuro e a punição maior
ou menor da sociedade e das instituições legais. O cruzamento dos vértices e a construção de
narrativas desvendaram quatro cenários com alto nível de corrupção e alto nível de punição
legal e social; baixo nível de corrupção e alto nível de punição legal e social; alto nível de
corrupção e baixo nível de punição legal e social; e baixo nível de corrupção e baixo nível de
punição legal e social. Esses cenários abriram perspectiva para mais cinco variáveis que
foram incluídas para a pesquisa com empresários.
Variáveis centrais de pesquisa
O resultado das etapas anteriores apresentou no fim trinta e cinco variáveis que melhor
representam as práticas de corrupção evidenciadas no dia-dia das empresas. As variáveis são
apresentadas a seguir.
1) pagamento antecipado ao fornecedor e não recebimento a mercadoria exata; 2) compra de
produtos sem nota fiscal pelos seus concorrentes; 3) fraude interna praticada por funcionários;
4) práticas de concorrência desleal; 5) casos de empresas que foram fechadas devido a agir de
forma desleal; 6) pagamento de propina para fechar negócios; 7) pagamento de propina para
fiscais do governo; 8) manutenção do caixa-dois; 9) descontos por meio do faturamento sem
impostos; 10) fornecedores que vendem mercadorias sem nota fiscal; 11) empresas do ramo
que vendem mercadorias sem nota fiscal; 12) ofertas (comércio) de informações sigilosas de
concorrentes; 13) compra informações sigilosas de outras empresas; 14) concorrentes que
ficam sabendo do lançamento de produtos ou serviços antes da divulgação oficial; 15) venda
de produtos cujas especificações são diferentes das características anunciadas; 16) compra e
venda de mercadorias desviadas; 17) casos de apreensão de mercadorias por suspeita de
desvio; 18) venda de produtos com valor muito abaixo do mercado; 19)compra e venda de
produtos piratas; 20) venda de produtos com qualidade inferior ao padrão exigido por lei; 21)
“lavagem de dinheiro"; 22) casos de fiscalização que fechou algum negócio por lavagem de
dinheiro; 23) fornecedores que já tiveram seus nomes envolvidos em casos de corrupção; 24)
receptação de carga roubada; 25) possibilidade de uma empresa adquirir cargas roubadas sem
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saber que é roubada; 26) casos de simulação de roubo para obtenção do seguro; 27) sonegação
de impostos; 28) subfaturamento; 29) prática de omissão de informações ao cliente para
conclusão de uma venda; 30) perda de vendas devido a concorrentes que vendem produtos
com informações omitidas; 31) prática de oferecer dinheiro para o fornecedor ou comprador;
32) prática de oferecer dinheiro ao fiscal para garantir uma licença; 33) prática de oferecer
dinheiro para a fiscalização para obter um serviço especial; 34) oferecer dinheiro para escapar
de multa; 35) prática de oferecer dinheiro para obter vantagem na competição; 36) venda de
produtos a preço muito abaixo do custo médio.
As variáveis acima estavam dispostas dentro de uma escala de freqüência de cinco pontos.
Quanto à forma a abordagem de pesquisa e forma de questionamento os tópicos abaixo
relatam as precauções tomadas.
Considerações importantes sobre a forma de questionamento
Abordagem de pesquisa
A questão de como abordar o empresário, foi outro ponto que levantou grande polêmica na
formulação da pesquisa e na própria conversa introdutória com os empresários e estudiosos de
métodos de científicos de pesquisas e pesquisa de mercado.
Ora fica evidente que o pesquisador seria visto com “maus olhos” ao relatar para o empresário
que iria fazer uma pesquisa sobre corrupção nas empresas. E assim foi em muitas vezes,
sendo necessária a escolha de outra empresa. Como relatado, a percepção do empresário é que
se tratava de algum agente fiscal “espião”; ou mesmo, alguma pesquisa mal intencionada
levantada por algum concorrente.
A questão foi suavizada preponderantemente por dois fatores. Primeiro, a capacidade de
convencimento que era uma pesquisa acadêmica não encomendada com nenhuma empresa de
mercado e que os dados jamais seriam tratados de forma separada. O nome da empresa e do
empresário não eram questões inerentes aos questionários, apenas pedíamos um e-mail em
razão do segundo argumento de convencimento. O pesquisador se comprometeu em enviar
via e-mail um relatório da pesquisa para cada participante, em que constariam os resultados
gerais da pesquisa e o mais importante, propostas normativas de soluções estratégicas para os
principais problemas apresentados.
Forma de Questionamento
Outra questão delicada era a resposta. Não teria sentido o pesquisador perguntar para o
empresário se ele vende sem nota, ou sonega imposto, ou vende produto pirata, etc. Claro que
a resposta seria duvidosa, cheia de ponderações e longe da verdade. Até mesmo o pesquisador
poderia interferir e deixar de ser um elemento neutro na pesquisa por fazer seu julgamento de
valor no momento de questionar o empresário de acordo com a percepção que o
estabelecimento e a pessoa transmitissem ao pesquisador. Assim, seguindo a tendência de
outras pesquisas quantitativas comentadas na revisão teórica foram tomadas duas precauções.
O uso de questões similares para o mesmo fato e a abordagem indireta.
Embora, muitas vezes, as variáveis discorram sobre mesmo assunto, como por exemplo,
roubo de carga ou suborno, dentre outras, estas trinta e cinco variáveis foram dispostas no
questionário tratando de um quesito de questões similares, ou seja, mesmo que o empresário
respondesse de forma duvidosa numa questão em virtude do fato de ele se apresentar receoso
quanto à questão, ou mesmo, em dúvida, isto não seria um entrave, pois outras variáveis sob o
mesmo assunto balanceariam a resposta teoricamente imperfeita do empresário.
Quanto à abordagem indireta em vez de perguntar: “o senhor comete sonegação de impostos
na sua empresa”; a pergunta era direcionada ao ramo como um todo, em outras palavras, para
a concorrência: “com que freqüência o senhor acha que os seus concorrentes - ou em certas
questões: “as empresas do seu ramo de negócios - cometem sonegação de impostos”.
Claro que se trata de uma questão de percepção e isto desde o começo o texto não esquiva de
salientar tal limitação. Como dito a natureza do tema pesquisado impede uma análise que não
8
seja a percepção quando o intuito é investigar o que ocorre nos meandros das empresas e não
se encontra formalmente declarado. Entretanto, ao indicar para o empresário apontar um
panorama do que ocorre com os concorrentes este tem uma liberdade maior de emitir uma
opinião mais próxima da realidade, pois a pergunta incide sobre as demais empresas e não a
empresa dele. Ele pode se sentir o justo, o “paladino da justiça”, perante um mar de empresas
corruptas que atuam no setor. Pode e se sente assim se o caso for verídico. Como também,
pode ser que ele não seja tão justo, mas ao relatar que os demais concorrentes são corruptos,
ele se praticasse tal ação corrupta não teria por que esconder, pois estaria apenas jogando as
regras do jogo para sobreviver. Mas existe um terceiro comportamento de resposta que
poderia enviesar a pesquisa: o empresário que atribui a situação decadente da empresa dele, as
mazelas do ambiente externo, entre elas a corrupção. Assim, ao ser questionado este
empresário tende a alocar as dificuldades de sua empresa na corrupção praticada pelos
concorrentes e empresas do ramo. Ele estaria atribuindo uma carga enviesada nas respostas de
percepção dele em razão do desempenho não adequado do seu negócio. Trata-se de um
comportamento muito recorrente dos pequenos empresários nacionais de atribuir os
insucessos aos fatores externos da empresa, pois não sabem dimensionar os erros de sua
própria gestão (Sebrae, 2006).
Variáveis de Legitimação
Para verificar a influência do comportamento de apontar a corrupção como razões únicas do
insucesso nos negócios, foram elaboradas questões inerentes ao desempenho presente e futuro
da empresa, a saber: a) o crescimento do faturamento no último ano; b) o crescimento do
número de clientes no ultimo ano; c) participação de mercado aproximada da empresa; d)
expectativa futura de crescimento do negócio.
Ainda inerente à questão, acrescentamos mais quatro variáveis relacionadas ao
profissionalismo do negócio. O mérito para a corrupção como agente nefasto ao negócio do
empresário poderia ser uma simples resposta ao fato de ele não ter uma gestão
profissionalizada do negócio e não ser capaz de identificar corretamente os pontos fracos de
sua gestão. Assim dentro de uma escala de concordância de cinco pontos foi questionado ao
empresário sobre: a) uso de planos de negócios; b) prática do planejamento estratégico; c) uso
de medidas de controle; d) uso de práticas de gestão da qualidade.
Resultados
Amparado nas variáveis centrais acerca da corrupção foi realizado uma análise fatorial, por
meio da análise dos componentes principais e método Varimax buscando a redução do espaço
amostral. Os fatores retidos do resultado significativo (p<0,000) com Kaiser-Meyer-Okin de
0,956 podem ser apreciados na tabela 1. Nessa tabela é possível analisar as variáveis retidas
em cada um dos nove fatores. Fatores estes com Eigenvalues maior que 1,000 e que explicam
71,021% da variância da amostra
Para garantir a confiabilidade e não viés da percepção dos respondentes em razão da sua
performance financeira e profissionalismo, as variáveis de controle, também, foram
submetidas a uma análise fatorial por meio da análise dos componentes principais e método
Varimax buscando a redução do espaço amostral. Os fatores retidos do resultado significativo
(p<0,000) com Kaiser-Meyer-Okin de 0,819, com Eignvalues superiores a 1,000 e que
explicam 64% da variância da amostra podem ser apreciados na tabela 2. Dois fatores foram
obtidos de acordo com o planejado: o fator de performance para medir o desempenho e sua
expectativa; e o fator profissionalismo medindo o quanto a empresa tem uma gestão
profissional.
A tabela 3 mostra a correlação dos fatores de corrupção e fatores de legitimação (correlação
de pearson). Como pode ser observado as correlações, quando significantes são fracas. Isto
mostra que na respostas dos inquiridos, não existiu a interferência do fator da performance
atual e futura da empresa, assim como, não existiu a influência da presença ou não de uma
9
administração profissional. Em outras palavras, foi negado o temor de os respondentes
atribuírem um grau maior para a corrupção devido a problemas financeiros e de mercado do
negócio, assim como, devido ao não conhecimento das técnicas de gestão adequadas para a
condução do negócio. Este resultado associado aos demais valida a métrica construída para
esta amostra e nos permite o prosseguimento das análises.
Tabela 1. Corrupção: Fatores Obtidos
Fatores
prática de oferecer dinheiro para a fiscalizacao para obter um serviço especial
prática de oferecer dinheiro para não ser multado em uma transgressão.
prática de oferecer dinheiro para obter vantagem
prática de oferecer dinheiro ao fiscal para garantir uma licença
prática de oferecer dinheiro para o fornecedor
recepção de mercadoria de carga roubada
simulação de roubo para obtenção do seguro
fechamento de negócio por lavagem de dinheiro
adquirir cargas roubadas sem saber que é roubada
apreensão mercadorias por suspeita de desvio
compra mercadorias desviadas
fornecedores com nomes envolvidos em casos de corrupção.
lavagem de dinheiro
descontos por meio do faturamento sem impostos.
venda mercadorias sem nota fiscal por fornecedores
venda mercadorias sem nota fiscal por concorrentes
manutenção do caixa-dois
sonegação de impostos
compra de produtos sem nota fiscal pelos seus concorrentes
pratica de subfaturamento.
ofertas de informações sigilosas de concorrentes.
compra de informações sigilosas de outras empresas.
conhecimento do lançamento de produtos antes da divulgação oficial.
venda de produtos cujas especificações são diferentes das anunciadas.
compra e venda de produtos piratas.
venda de produtos com qualidade inferior
venda de produtos com valor muito abaixo do mercado.
venda de produtos com informações omitidas.
omissão de informações
Existe concorrência desleal.
venda de produtos a preço muito abaixo do custo médio
fechamento de empresas devido a agir de forma desleal.
propina para fechar negócios.
pagamento de propina para fiscais do governo
%explicação
0,8145654
0,8105738
suborno
0,7904501
0,7827079
0,6765953
0,7714231
0,6952602
0,6842252
0,6746437
roubo
0,6697814
0,6566209
0,558368
0,5534768
0,7488907
0,7177313
0,7088851
0,6769251 sonegação
0,6163151
0,5835608
0,5519117
0,8263265
0,8071329 tráfico de
0,7517134 informação
0,4773957
0,7543133
0,7509175
0,6345505 piratária
0,4876805
0,4256988
0,7734705 concorrência
0,7434523
desleal
0,693961
0,5078191
propina
0,495428
40,16
6,62
5,57
4,49
4,16
3,95
3,28
pagamento antecipado ao fornecedor e não recebimento a mercadoria exata.
0,7819032
fraude
0,6434629
fraude interna praticada por funcionários.
Ext. Method: Principal Component Analysis.Rotation Method: Varimax with Kaiser Normalization.
Rotation converged in 8 iterations.
2,80
Tabela 2: Fator Variáveis de Legitimação
10
faturamento
clientes crescimento
marketshare
expectativa futura
certificado qualidade
controle
planejamento
plano negocios
Componente
fator
% explicação
0,8835519
0,8806195 performance
46%
0,8072764
0,597682
0,763615
0,751939 profissionalismo
18%
0,7203094
0,6826163
Tabela 3: Correlação corrupção vs. variáveis de legitimação
Correlação
roubo
Sig.
suborno
Sig.
Sonegação
Sig.
trafico de informação
Sig.
pirataria
Sig.
concorrencia desleal
Sig.
propina
Sig.
fraude
Sig.
performance
0,036
0,602
-0,075
0,280
-0,052
0,459
0,020
0,769
-0,017
0,811
0,032
0,648
0,116
0,094
0,018
0,793
profissionalismo
-0,021
0,765
0,056
0,418
-0,215
0,002
0,220
0,001
0,020
0,770
0,061
0,379
0,000
0,999
0,042
0,550
Fatores Retidos
O fator retido com maior poder de explicação da variância da amostra foi aquele denominado
de suborno. Trata-se do ato de oferecer dinheiro ou alguma outra forma de incentivo para um
agente público, empresa fornecedora ou qualquer outra instituição em pró de receber
benefícios adicionais ou ficar isento de alguma penalidade por não cumprir a lei.
O segundo fator retido foi denominado de roubo, pois, de modo geral, está relacionado com o
roubo de cargas, obtenção de mercadorias provenientes de roubo e a lavagem de dinheiro.
O terceiro fator denominado de sonegação reúne as variáveis inerentes à lesão do fisco por
práticas diretas e indiretas de sonegação de impostos.
O quarto fator, tráfico de informações, diz a respeito da cessão de informações sigilosas sobre
as estratégias das empresas. Um fator inerente à empresa e praticado por funcionários da
própria empresa, ou ao menos, com a colaboração destes.
O quinto fator, pirataria é muito relatado e ressaltado na mídia. Referente à venda de produtos
que são cópias ilegais das principais marcas de mercado, ou das marcas da moda.
Concorrência desleal (presente para 70% das empresas), o sexto fator, engloba a prática de
atividades ilícitas para obter vantagens concorrências em relação às demais empresas
concorrentes.
O pagamento de alguma quantia adicional para o fisco e para fechar negócios com
fornecedores foi denominado de propina.
Finalmente, o fator denominado fraude que aqui tem o sentido de mentira e não o sentido
legal que é corrupção privada. Assim o fator condiz com a venda de mercadorias e não
entrega da mesma, ou entrega em quantidades inferiores e alteradas em relação ao contrato
11
comercial; ou ainda, um ato de mentira interna praticada por funcionários como desvio de
mercadorias e dinheiro para si próprio, ou em favor de outros.
Análise de clusters
Os fatores retidos serviram de base para a separação dos grupos semelhantes quanto a
percepção da influência da corrupção em seu ambiente de negócios. Partindo dos scores da
regressão proveniente da análise fatorial conduzimos uma análise de cluster para diferenciar
os grupos de empresas. Primeiramente rodamos análises de clusters hierárquicos, pelo método
entre grupos e do vizinho mais afastado tendo como objetivo encontrar um número
aproximado de clusters que nossa amostra poderia ser dividida. Esse número ficou entre três e
quatro clusters conforme o padrão dos coeficientes de homogeneidade (entre grupos) e a
correlação Pearson (vizinho mais afastado). Partindo da premissa de uma solução com três ou
quatro clusters, foi realizado uma análise de clusters K-means chegando a combinação de três
clusters como a mais adequada para explicar a nossa amostra. A tabela 4 mostra os centros
dos fatores dentro de cada cluster.
Tabela 4: Corrupção Cluster.
suborno
roubo
sonegação
trafico de informação
piratária
concorrência desleal
propina
fraude
n. empresas
1
0,6904289
-0,29175
0,308433
0,5788637
0,1346411
0,1988318
-0,0354687
0,3793232
68
2
-0,4259387
0,5146838
0,3994093
-0,1331558
-0,3192565
-0,0138732
0,1991554
-0,1270603
86
3
-0,178567
-0,4812048
-1,0586521
-0,5743948
0,326728
-0,3232261
-0,0864384
-0,2360555
52
O cluster um com sessenta e oito empresas (33%) agrega empresas que apontam como
principais mazelas da corrupção em seus negócios, os seguintes fatores: suborno, tráfico de
informação, concorrência desleal e fraude. O cluster dois, o mais numeroso com 86 empresas
(42%) agrega os fatores de roubo, sonegação e propina. O cluster três com cinqüenta e duas
empresas (25%) é afetado principalmente pela pirataria.
A disposição dos clusters mostra o cluster um afetado fortemente pela prática de concorrência
desleal, fraude interna e tráfico de informações que se trata de condutas adquiridas ao longo
do tempo e praticadas pelas empresas. No cerne do negócio dessas empresas, a prática de
atitudes corruptas por parte dos integrantes das mesmas é, talvez, uma prática vista como
necessária para sobrevivência, ou imposta pelo grupo social para a perpetuação do negócio e
sobrevivência no cargo. Neste caso, para os integrantes desse grupo é maior a coragem de
oferecer suborno para o fisco, fornecedores e demais instituições e até visto como uma prática
comum dentre aqueles com os quais essas empresas se comparam. É uma pratica ilegal, existe
a conivência dos fiscais e fornecedores, mas é vista pelos integrantes deste grupo como
aceitável dentro do que não é legal.
O cluster três tem como principal característica a pirataria. Como a análise se deteve
predominantemente ao comércio de bens e serviços, uma grande probabilidade de os
respondentes neste caso se referirem a informalidade alta existente na cidade de São Paulo.
Vários pontos comerciais em que foi realizada a pesquisa são caracterizados pela alta
concentração de camelos na rua, do lado de fora da loja, em frente aos estabelecimentos.
Portanto, para estas empresas o grande vilão é a informalidade que longe dos “olhos dos
fiscais” pode vender produtos ilegais e manobras competitivas ilegais para auferir ganhos
superiores.
12
Finalmente, o cluster dois caracterizado por fatores associados a “corrupção preta”, ou seja,
ilegalidade que é punida severamente pela lei e sociedade e se encontra no núcleo das ações
públicas contra a corrupção. Roubo, sonegação e propina têm sido combatidos fortemente
pelo poder público, porém na cultura empresarial e pessoal dos integrantes dessas empresas,
embora reconheçam o risco de exercer tal atividade, ele exercem a mesma. Seria a prática
mais deplorável e mais arriscada incorrida pelas empresas.
A figura 1 apresenta um esquema visual dos resultados. As empresas podem ser divididas em
três grupos gerais. Um grupo de empresas atacado pela corrupção na forma de deslealdade,
seja o tráfico de informação – percebido por 66% das empresas -, ou o suborno – percebido
por 51% das empresas -, ou a concorrência desleal – percebido por 70% das empresas -, ou
ainda a fraude – percebido por 30% das empresas. Um segundo grupo de agentes é atacado
fortemente pela pirataria, que é percebida por 65% das empresas. Uma conseqüência da
atuação de empresas longe dos olhos da fiscalização, ou seja, na informalidade. E um terceiro
grupo de agentes que envolvem as empresas pressionadas por um ambiente institucional
corrupto, pois as pessoas e empresas não têm medo da lei, o que chamamos do cluster das
empresas com “falta de medo da lei”. Neste cluster predomina o roubo que está presente para
26% das empresas, a sonegação que se faz presente no setor, na percepção de 66% das
empresas e a propina que é percebida por 26% das empresas.
Figura 1: Corrupção
Informalidade
Deslealdade
Falta de
medo da
lei
Implicações
A apresentação das teorias da corrupção e as reflexões acerca das estratégias organizacionais
de combate a corrupção apontou para a necessidade de integrar tanto a teoria institucional
como a visão baseada em recursos para entender a competitividade. Essa abordagem
integrativa do ambiente técnico e institucional, já defendida por Machado-da-Silva e Barbosa
(2002) é necessária pela seguinte razão: as abordagens isoladas não se complementam,
consequentemente não existiria razão para estratégias organizacionaisv de combate a
corrupção. Caso a linha de pensamento adote apenas a abordagem do ambiente técnico
voltado para o desempenho econômico financeiro as estratégias de corrupção são negadas. A
própria pesquisa mostra que não existe correlação entre corrupção e desempenho. Empresas
afetadas por um ambiente fortemente corrupto tinham performance satisfatória, assim como o
inverso era verdadeiro. De outro lado, uma abordagem baseada apenas no ambiente
institucional não incentiva a mobilização de estratégias organizacionais, pois parte do
princípio que, toda empresa esta sujeita às mesmas condições do ambiente institucional e a
solução estratégica deveria ser uma ação governamental ou de outras instituições nãogovernamentais, ou no máximo, estratégias cooperativas de empresas de um determinado
ramo.
Entretanto, quando é articulado o ambiente técnico e institucional as estratégias de combate à
corrupção passam a fazer sentido, pois o foco não é simplesmente o desempenho, nem a
adaptação às relações sociais e institucionais estabelecidas. Nas reflexões da discussão teórica
surgiram quatro pontos centrais que explicam as relações corruptas no ambiente empresarial:
a ineficiência produtiva dos recursos e capacidades organizacionais; a formação das pessoas,
no sentido de competência individual; a falta de ética empresarial; e uma cultura
13
organizacional permissiva aos atos corruptos, uma vez, reflete a cultura do grupo social da
qual faz parte. Os dois primeiros aspectos são resultados de uma ótica de análise sobre o
prisma da visão baseada em recursos, enquanto os dois últimos só são enxergados em
magnitude pela teoria institucional.
Dessa forma, se o objetivo é pensar e discutir estratégias de combate à corrupção temos que
trabalhar com uma visão integrada do ambiente técnico e institucional da competitividade e
que discuta estratégias de maximização dos recursos e capacidade, como novas tecnologias;
estratégias de formação de competências individuais integradas a uma postura moral e ética; e
estratégias que perpassam primeiramente por uma transformação dos esquemas interpretativos
no intuito de provocar estratégias de transformação da ética empresarial e cultura
organizacional, como meio de agir no próprio ambiente institucional.
Limitações
Duas limitações importantes referente ao estudo. Trata-se de um estudo exploratório, portanto
a métrica elaborada, assim como, os resultados obtidos são influenciados fortemente pelo
ambiente institucional e as características sócio-culturais especificas da região estudada. As
variáveis elaboradas para pesquisa, os fatores retidos, como o grau de importância de cada
fator e a percepção do empresário muda conforme muda o grupo social e as relações sociais
da que ele faz parte. Isto limita a generalização do estudo, mas ao mesmo tempo incita outros
estudos em outras localidades para que se tenha um corpo mais consolidado dos fatores de
corrupção nos negócios e para que a discussão das estratégias organizacionais de combate a
corrupção tenha uma base mais sólida para reflexão e discussão.
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i
A referência aqui é para os livros em geral vendidos com o titulo de “Gestão Estratégica”, ou
“Planejamento Estratégico”, ou ainda, “Administração Estratégica”. Não foram citados, os
mesmos, por dois motivos: primeiro, o conhecimento geral dessas obras por parte dos
estudiosos de estratégia organizacional, muitos dos quais autores de tais obras; segundo em
razão do grande numero de obras e o reduzido espaço que teríamos para citar, além da não
pertinência direta com as obras relacionadas ao tema do artigo.
ii
Dois pontos merecem ser comentados quanto a afirmativa acima. Primeiro, a referência é ao
do conteúdo das obras mais vendidas (claro, lembrando Naím (2006), são os números oficiais,
sem que se saiba o quanto foi lido por meio de reproduções gráficas, o famoso “xérox”, ou
por meio de “copias não autorizadas”, ou mais recentemente baixadas pelos programas de
compartilhamento de arquivos, tais como o “Emule”) e reproduzidos nos MBA’s. Segundo,
acredita-se que vários professores de MBA’s possam apresentar ótimas soluções pessoais
vivenciadas na prática profissional e consultorias prestadas, assim como, possam incrementar
a corrupção nas famosas ferramentas estratégicas como a SWOT e cinco forças de Porter,
porém, tal fato não se mostra institucionalizado e legitimado em obras publicadas, ou mesmo,
nos programas de cursos de MBA’s
iii
Não é de se espantar a presença de profissionais de alto gabarito no comando de muitas
atividades ilícitas e suas mirabolantes estratégias. Naím (2006) no capitulo “Nada se compara
ao negócio das drogas” de seu livro Ilícito, mostra a capacidade estratégica dos chefões do
trafico de invejar muitos estrategistas e lideres de empresas aclamados pela mídia e empresas
de “headhunters”.
iv
A pergunta deste contexto tem um caráter anti-ético, como se fosse uma recomendação: seja
corrupto, mas empregue uma mão de obra mais barata, ou não perca tanto tempo para achar
alguém muito qualificado. Claro, que a posição tomada é apenas para chamar a atenção do
desperdício de recurso e não uma solução normativa para a empresa ganhar mais dinheiro
com a corrupção.
v
A referência é para estratégias organizacionais, uma vez que, a tese defendida é que o
combate à corrupção deve partir das empresas e não depender da ação de instituições públicas
ou não governamentais. Portanto, a diretriz para as soluções neste artigo se limita as soluções
cabíveis de serem adotadas pelas empresas.
16
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