Entraves para a competitividade da agropecuária - Cepea

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ENTRAVES PARA A COMPETITIVIDADE DA AGROPECUÁRIA
Ricardo Mendonça da Fonseca
Daniela B. Bartholomeu Bonato
Luciane Conte
Humberto F. S. Spolador
Pesquisadores do Cepea
Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada/Esalq-USP
[email protected]
Artigo Publicado no Jornal de Piracicaba
Edição de 12/7/2006 – Pág. B-4
A competitividade do agronegócio brasileiro está baseada na elevada
produtividade de algumas culturas e no baixo custo de produção verificados “dentro da
porteira”.
Nos casos da soja e da cana-de-açúcar, por exemplo, a competitividade brasileira
assenta-se principalmente em vantagens relacionadas às características favoráveis de
solo, clima e tecnologia, assim como no aumento da produção resultante da expansão das
fronteiras agrícolas, basicamente no Centro-Oeste e Norte. Outro bom exemplo de
eficiência produtiva é a bovinocultura de corte. O Brasil possui um dos menores custos
mundiais de produção e a liderança tanto no volume produzido quanto nas exportações
em nível mundial.
Entretanto, deficiências na infra-estrutura logística e de armazenagem, bem como
a elevada carga tributária, diminuem de forma parcial as vantagens da agropecuária. A
competitividade do setor passa a ser prejudicada assim que os produtos saem da
propriedade, em direção aos centros de consumo.
No Brasil, os custos de transporte são um componente relevante dos preços finais
dos produtos, tendo em vista a dispersão espacial do mercado interno brasileiro e das
longas distâncias envolvidas na comercialização. No caso de produtos agropecuários,
devido aos preços relativamente baixos quando comparados aos bens industrializados, os
transportes acabam tendo maior impacto na composição dos custos.
A elevada dependência em relação ao modal rodoviário é apontada como um dos
principais gargalos da infra-estrutura de transporte no País. Mais de 60% de toda a carga
é movimentada por rodovias, as quais se apresentam em estado de conservação precário.
Para se ter uma idéia, de toda a extensão da malha rodoviária, apenas 12%, o equivalente
a 196 mil quilômetros, são pavimentados. Desta parcela, 72% são classificados como
“deficiente”, “ruim” ou “péssimo” quanto ao estado de conservação do pavimento.
Além desses problemas no modal rodoviário, há sérias deficiências também na
oferta da infra-estrutura ferroviária, portuária e de armazenagem, dificultando a opção
por modais alternativos que proporcionassem o escoamento eficiente da produção.
Num passo seguinte ao deslocamento da produção, a competitividade da
agropecuária esbarra na carga tributária, que é muito elevada, em torno de 34% do
Produto Interno Bruto (PIB). Fica nesta etapa mais uma boa parte da lucratividade dos
negócios e dos incentivos a novos investimentos.
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Uma diminuição dos impostos sobre a produção agropecuária traria benefícios ao
consumidor e ao produtor. Para o consumidor, poderia ocorrer uma redução dos preços
dos alimentos, enquanto que o produtor poderia aumentar sua rentabilidade. Favoreceria
também as exportações, com o produto brasileiro se tornando mais competitivo.
Em termos fiscais, uma das medidas compensatórias para o setor agropecuário foi
a Lei Kandir, aprovada em setembro de 1996. Essa lei isenta produtos primários e semielaborados do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS),
fomentando as exportações desses bens. A importância dessa lei para o setor vem à tona
especialmente em uma época como a atual, de valorização da taxa de câmbio, que reduz a
competitividade dos produtos brasileiros no mercado internacional.
Analisando as medidas do governo em prol da agropecuária, constata-se que
pontos críticos como seguro rural e gerenciamento de risco de preços praticamente não
foram tocados nos últimos anos. A perda da colheita por conta de condições climáticas e
receitas insuficientes em conseqüência das oscilações da taxa de câmbio ou dos preços
são alguns desses riscos em que a proteção inexiste ou, quando existe, é inviável e
inacessível para a grande maioria dos produtores da agropecuária.
O Plano Agrícola e Pecuário 2006-2007, também conhecido como Plano Safra,
divulgado recentemente ainda é vago nas medidas de gerenciamento de alguns dos riscos
de mercado e, com isso, persistem dúvidas quanto à viabilidade e sustentabilidade do
setor agropecuário no longo prazo sem assistência governamental.
Em relação ao seguro rural, o aumento do percentual de subvenção e a inclusão de
novas culturas ao programa são medidas paliativas frente à incipiente atuação do seguro
rural no País.
Uma questão fundamental ainda não solucionada é a abertura do mercado de
resseguros e a nova regulamentação do fundo de estabilidade do seguro rural, a fim de
proporcionar maior proteção às seguradoras que atuam no ramo rural.
De mais concreto, os Planos Safras têm sido basicamente medidas de apoio ao
refinanciamento de dívidas já vencidas dos produtores rurais; não mais do que isto.
Apesar de todas essas dificuldades, relatório conjunto da Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e da Organização para Alimentos e
Agricultura (FAO, sigla do equivalente em inglês) da ONU divulgado neste mês indica
grande potencial no setor agropecuário para China, Índia e Brasil num futuro próximo.
Isso quer dizer que persistem boas perspectivas para o setor agropecuário
brasileiro. O desejo maior é que esta potencial oportunidade futura seja aproveitada da
melhor forma possível. Para tanto, algumas medidas de reestruturação com efeitos de
longo prazo implicando em viabilidade econômica e gerencial devem ser tomadas.
China e Índia têm se mostrado mais efetivos na busca da competitividade, cujo
resultado direto é um crescimento econômico mais consistente no longo prazo.
Interessante é o Brasil não deixar escapar boas oportunidades de ganhos futuros como
conseqüência de falhas próprias, explorando as potencialidades locais e corrigindo suas
fraquezas.
Nota: na próxima semana, será publicado artigo dos mesmos autores sobre medidas que
poderiam diminuir os entraves da competitividade do setor agropecuário.
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