a transformação de gauss - DM

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS
CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DE TECNOLOGIA
DEPARTAMENTO DE MATEMÁTICA
A TRANSFORMAÇÃO DE GAUSS
Tales Villas Boas dos Santos
São Carlos - SP
Dezembro - 2010
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS
CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DE TECNOLOGIA
DEPARTAMENTO DE MATEMÁTICA
A Transformação de Gauss
Tales Villas Boas dos Santos
RA: 282456
Dissertação apresentada ao Departamento de Matemática da
UFSCar como parte dos requisitos para a obtenção do título
de Licenciado em Matemática.
Orientador: Prof. Dr. Luís Antônio Carvalho dos Santos
São Carlos - SP
Dezembro - 2010
3
São Carlos, 15 de Dezembro de 2010.
Tales Villas Boas dos Santos.
Orientador: Luís Antônio Carvalho dos Santos.
4
Sumário
1 Introdução
7
2 Transformação de Gauss
9
3 Frações Contínuas
13
4 Boas Aproximações por Racionais
19
5 Números Algébricos e Transcendentes
25
5.1 Teorema de Liouville . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
25
5.2 Teorema de Lagrange . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
28
5.3 Exemplos de transcendentes: e e π . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
31
Referências Bibliográcas
37
5
Capítulo 1
Introdução
Ao nal de nossa graduação em Matemática deveremos desenvolver uma monograa, cuja
a escolha do tema ca por nossa conta, do aluno e de seu orientador. Como aluno escolhi
meu orientador já voltado para a área de análise, parte da Matemática que despertou meu
interesse durante minha vida acadêmica. Ao escolher o tema visamos produzir um trabalho
de conclusão de curso sobre um assunto pouco tratado durante a graduação.
Uma motivação para o começo do trabalho foi o estudo da transformação de Gauss, que dá
título ao trabalho, esta se destaca por ser uma função com propriedades dinâmicas notáveis,
além de gerar, por meio de frações contínuas, uma boa aproximação de números reais usando números racionais. Por boa aproximação estou falando da velocidade de convergência.
Apresentei então, inicialmente, como que aplicando repetidamente a transformação aparece
uma fração contínua, em seguida esbocei o gráco da transformação no intervalo [0,1] e
termino mostrando que a transformação de Gauss preserva uma medida.
Dessa forma podemos estudar os números irracionais a partir de convergentes racionais.
Um convergente é um truncamento de uma fração contínua, e esses convergentes são bem
comportados e possuem diversas relações que estão em algumas proposições, corolários e
teoremas. Esses convergentes ainda podem ser usados para se aproximar um número real
o quanto se queira, e o estudo dessas aproximações nos leva até a constante
√
5, o maior
número que majora uma quantidade innita de aproximações.
Ao nal do trabalho são estudados os números irracionais que podem ser divididos em
algébricos e transcendentes, ou seja, números que são raízes de polinômios com coecientes
inteiros e os que não são raízes de polinômios com coecientes inteiros. Estudei nesse
trabalho o Teorema de Liouville, que relaciona a transcendência com as frações contínuas,
e o Teorema de Lagrange, que mostra que toda fração contínua periódica é um irracional
7
8
CAPÍTULO 1.
INTRODUÇÃO
algébrico de grau 2.
Para a maior parte desses resultados foi estudado o livro "Continued Fractions", do russo
A.Ya.Khinchin, com o auxílio do texto do professor Carlos Gustavo Moreira. E ao nal do
trabalho estudei os dois números transcendentes mais conhecidos, e e π usando o livro do
Baker.
Capítulo 2
Transformação de Gauss
Denição 2.0.1. Dado x ∈ R denimos [x] como o único inteiro tal que [x] ≤ x < [x] + 1.
O número inteiro [x] denomina-se o maior inteiro menor do que o número real x. Segue da
denição que 0 ≤ x − [x] < 1.
Denição 
2.0.2. Denimos a Transformação de Gauss pela ϕ : [0, 1] → [0, 1]
ϕ(x) =

1 − 1
, se x 6= 0
x
x
, se x = 0.

0
Vejamos que a transformação ϕ está bem denida. Seja x ∈ [0, 1] então x1 ≥ 1 e ϕ = x1 −
1
x
∈
[0, 1]. Logo ϕ(x) ∈ [0, 1] para todo x ∈ [0, 1]. Veremos a seguir como a Transformação de
Gauss pode ser utilizada para a expansão de um número real em frações contínuas.
Seja x ∈ [0, 1] e denotando por a1 o número inteiro
1
x
de ϕ(x) =
1
x
−
1
x
obtemos a
igualdade
x=
1
.
a1 + ϕ(x)
Aplicando novamente este raciocínio, ou seja, denotando por a2 o número inteiro
ϕ2 (x) =
1
ϕ(x)
−
h
1
ϕ(x)
i
(2.0.1)
h
1
ϕ(x)
i
de
obtemos a seguinte igualdade
ϕ(x) =
1
.
a2 + ϕ2 (x)
Substituindo (2.0.2) em (2.0.1) obtemos
x=
1
a1 +
9
.
1
a2 +ϕ2 (x)
(2.0.2)
10
CAPÍTULO 2.
Recursivamente, e denotando cada inteiro
x=
h
i
1
ϕj−1 (x)
de aj , obtemos a seguinte expansão
1
a1 +
.
1
a2 +
...
TRANSFORMAÇÃO DE GAUSS
1
+
1
ak +ϕk (x)
Na construção da Transformação de Gauss temos que se
1
1
1
1
<x≤1⇒1≤ <2⇒
= 1 ⇒ ϕ(x) = − 1
2
x
x
x
se
1
1
1
1
1
<x≤ ⇒2≤ <3⇒
= 2 ⇒ ϕ(x) = − 2.
3
2
x
x
x
Continuando com este raciocínio vemos que a transformação de Gauss é dada por
ϕ(x) =
para todo
1
k+1
1
−k
x
< x ≤ k1 .
Consideremos então a transformação de Gauss ϕ : [0, 1] → [0, 1] denida por ϕ(x) = x1 −
(Figura 2.1).
Figura 2.1: Transformação de Gauss
1
x
.
11
Lema 2.0.1. Para todo intervalo [a, b] ⊂ [0, 1] a transformação de Gauss ϕ : [0, 1] → [0, 1]
satisfaz a seguinte propriedade:
Z
ϕ−1 ([a,b])
1
dx =
1+x
Z
b
a
1
dx.
1+x
(2.0.3)
Demonstração: Considere a seguinte estimativa
Z
ϕ−1 ([a,b])
1
dx =
1+x
Z
1
1
∪∞
n=1 [ b+n , a+n ]
∞ Z
X
1
dx
1+x
1
a+n
1
dx
1
1+x
n=1 b+n
∞
X
1
1
=
ln
+ 1 − ln
+1
a+n
b+n
n=1
∞
X
a+n+1
b+n+1
=
ln
− ln
a
+
n
b+n
n=1
M X
b+n+1
b+n
= lim
− ln
ln
M →∞
a
+
n
a+n+1
n=1 b+1
b+M +1
= lim ln
− ln
.
M →∞
a+1
a+M +1
=
Como a soma na penúltima igualdade é telescópica e
lim ln
M →∞
b+M +1
a+M +1
=0
temos que
Z
ϕ−1 ([a,b])
1
b+1
dx = ln
=
1+x
a+1
Z
a
b
1
dx.
1+x
12
CAPÍTULO 2.
TRANSFORMAÇÃO DE GAUSS
Capítulo 3
Frações Contínuas
Dado um número x ∈ R consideremos a seguinte sequência de números naturais (an )
denidos recursivamente através da seguinte relação an = [αn ] sendo α0 = x e, se αn ∈
/ Z
então αn+1 =
1
αn −an
, para todo n ∈ N.
Se, para algum n, αn = an temos
x = α0 = a0 +
1
a1 +
a2 +
Caso contrário,
x = a0 +
.
= [a0 ; a1 , a2 , · · · , an ] .
1
...
1
+ a1
n
1
a1 +
.
= [a0 ; a1 , a2 , · · · ] .
1
a2 +
1
...
Denição 3.0.3. Seja x = [a0 ; a1 , a2 , · · · ] sua expansão em frações contínuas. Então o
n-ésimo convergente do número real x é denido pelo número racional
pn
= [a0 ; a1 , a2 , · · · , an ].
qn
pn
qn
tal que
(3.0.1)
Proposição 3.0.1. A sequência dos convergentes de uma expansão em frações contínuas
satisfaz as seguintes propriedades:
(i) p0 = a0 , p1 = a0 a1 + 1, q0 = 1 e q1 = a1 ;
(ii) pn = an pn−1 + pn−2 e qn = an qn−1 + qn−2 para todo n ≥ 2;
(iii) pn+1 qn − pn qn+1 = (−1)n para todo n ≥ 0.
Demonstração: O item (i) segue por denição. Para a prova de (ii) usaremos indução
nita sobre n. Seja [a0 ; a1 , a2 , . . . , an ] =
pn
qn
o n-ésimo convergente de uma expansão em
13
14
CAPÍTULO 3.
FRAÇÕES CONTÍNUAS
frações contínuas, mostraremos que as sequências (pn ) e (qn ) estão denidas por p0 = a0 ,
p1 = a0 a1 + 1, q0 = 1 e q1 = a1 e ainda pn = an pn−1 + pn−2 e qn = an qn−1 + qn−2 para
todo n ≥ 2. De fato para n = 0, n = 1 e n = 2 devemos mostrar que p2 = a2 p1 + p0 e
q2 = a2 q1 + q0 . De fato,
1
p2 .
= [a0 ; a1 , a2 ] = a0 +
q2
a1 +
=
1
a2
a2 (a0 a1 + 1) + a0
a2 p 1 + p 0
=
.
a1 a2 + 1
a2 q 1 + q 0
Suponha que a armação seja válida para k = n. Para k = n + 1 temos
pn+1 .
1
]
= [a0 ; a1 , a2 , . . . , an , an+1 ] = [a0 ; a1 , a2 , . . . , an−1 , an +
qn+1
an+1
1
)pn−1 + pn−2
(an + an+1
an+1 (an pn−1 + pn−2 ) + pn−1
=
=
1
an+1 (an qn−1 + qn−2 ) + qn−1
(an + an+1 )qn−1 + qn−2
an+1 pn + pn−1
=
.
an+1 qn + qn−1
Prova de (iii). Seja
Ψn+1 = pn+1 qn − pn qn+1 ,
para todo n ≥ 0.
Aplicando (ii) na igualdade anterior obtemos
Ψn+1 = pn+1 qn − pn qn+1 = (an+1 pn + pn−1 )qn − (an+1 qn + qn−1 )pn
= −(pn qn−1 − pn−1 qn )
= −Ψn .
Logo, a sequência Ψn satisfaz a seguinte propriedade Ψn+1 = −Ψn para todo n ≥ 0. Assim,
Ψn+1 = (−1)2 Ψn−1 = (−1)3 Ψn−2 = . . . = (−1)n Ψ1 . Mas Ψ1 = p1 q0 − p0 q1 = (a0 a1 + 1) −
a0 a1 = 1, ou seja Ψn+1 = (−1)n .
Denição 3.0.4. Se x = [a0 ; a1 , a2 , . . .] podemos escrever x = [a0 , a1 , . . . , an−1 , αn ], onde
αn = [0; an , an+1 , . . .].
Corolário 3.0.1. Para todo x ∈ R
x=
αn pn−1 + pn−2
,
αn qn−1 + qn−2
(3.0.2)
pn−2 − qn−2 x
.
qn−1 x − pn−1
(3.0.3)
onde
αn =
15
Demonstração: Note que a prova da Proposição (3.0.1) independe se αn é um número
inteiro ou não e a segunda é a primeira se isolarmos o αn .
Corolário 3.0.2. Para todo n ≥ 1,
pn−1 pn
(−1)n
−
=
.
qn−1
qn
qn qn−1
(3.0.4)
Demonstração: Seja n ≥ 1 xo e notemos que
pn−1 pn
−
=−
qn−1
qn
pn qn−1 − pn−1 qn
qn−1 qn
.
Graças ao item (iii) da Proposição (3.0.1) temos que
(−1)n
pn−1 pn
−
=
.
qn−1
qn
qn qn−1
Teorema 3.0.1. Para todo n ≥ 2,
qn pn−2 − pn qn−2 = (−1)n−1 an .
(3.0.5)
Demonstração: Multiplicando as equações pn = an pn−1 + pn−2 e qn = an qn−1 + qn−2 por
qn−2 e pn−2 respectivamente e subtraindo a primeira da segunda obtemos.
qn pn−2 − pn qn−2 = an (qn−1 pn−2 − pn−1 qn−2 ) = (−1)n−1 an .
Corolário 3.0.3. Para todo n ≥ 2
pn−2 pn
(−1)n−1 an
−
=
.
qn−2
qn
qn qn−2
Demonstração: Dividindo os termos da equação (3.0.5) por qn qn−2 , obtemos o resultado.
Teorema 3.0.2. Os convergentes de ordem par formam uma sequência crescente de números
racionais e os convergentes de ordem ímpar formam uma sequência decrescente de números
racionais.
16
CAPÍTULO 3.
FRAÇÕES CONTÍNUAS
Demonstração: A prova segue do corolário anterior.
Exemplo 3.0.1: Seja a sequencia de Fibonacci,{1, 1, 2, 3, 5, . . .} dada recursivamente por:
ϕ1 = 1 e ϕn = ϕn−1 + ϕn−2 se n ≥ 2.
ϕ0 = 1 ,
Então limn→∞ ϕn = ∞, mas criando uma nova sequencia, Φn =
ϕn+1
ϕn
, veremos que esta
converge. Vamos provar isso via fraçõescontínuas. Temos:
Φ0 =
1
= 1,
1
Φ1 =
2
1
=1+ ,
1
1
Φ2 =
3
1
=1+
2
1+1
···
Podemos assim escrever Φn+1 = [1; 1, 1, . . . , 1], assim
|
Φn =
{z
n vezes
}
pn−1 + pn−2
pn−1 + pn−2
pn
=
=
.
qn
qn−1 + qn−2
pn−2 + pn−3
Seja α = limn→∞ Φn , então
α=1+
Portanto
1
.
α
√
1+ 5
α=
.
2
A próxima proposição fornece explicitamente o erro da aproximação de x pelo convergente
pn
qn
.
Proposição 3.0.2. Para cada n ∈ N xo
x−
sendo
βn+1 =
(−1)n
pn
=
qn
(αn+1 + βn+1 )qn2
qn−1
= [0; an , an−1 , an−2 , . . . , a1 ].
qn
Demonstração:
pn−1 − qn−1 x qn−1
+
qn x − p n
qn
pn−1 qn − pn qn−1
=
qn (qn x − pn )
(−1)n
=
.
qn (qn x − pn )
αn+1 + βn+1 =
Portanto
x−
pn
qn (qn x − pn )
(−1)n
=
=
.
qn
qn2
(αn+1 + βn+1 )qn2
17
Teorema 3.0.3. Para todo n ∈ N.
p
n
x − ≤ 1 < 1 .
qn qn qn+1
qn2
Demonstração:
É fácil, pela proposição anterior, ver que x pertence a um dos seguintes
intervalos
pn pn+1
,
qn qn+1
,
pn+1 pn
,
qn+1 qn
e portanto vale a desigualdade:
pn+1 pn (−1)n p
n
x − ≤ = 1 .
− = qn
qn+1
qn
qn qn+1 qn qn+1
Como qn+1 > qn para todo n ∈ N segue que
1
1
p
1
n
< 2 , então x − < 2 .
qn qn+1
qn
qn
qn
18
CAPÍTULO 3.
FRAÇÕES CONTÍNUAS
Capítulo 4
Boas Aproximações por Racionais
Denição 4.0.5. Chamaremos de Melhor Aproximação uma fração ab , (b > 0), com a e
b ∈ Z, para um número real x se
c x − > x −
d
para todas as frações dc satisfazendo: 0 < d ≤ b e
a
b
a b
6= dc .
Essa denição será chamada de uma aproximação de primeiro tipo. A denição
que segue
será chamada de uma aproximação de segundo tipo. A razão entre x − pq e 1q , é |qx − p|,
ou seja
p
x
−
q
1
q
Denição 4.0.6. A fração
a
b
= |qx − p|
será uma aproximação do segundo tipo se
|dx − c| > |bx − a|.
para 0 < d ≤ b e
a
b
6= dc .
Proposição 4.0.3. Toda aproximação de segundo tipo também é uma aproximação de
primeiro tipo.
Demonstração: Se
d ≤ b. Assim,
a
b
é uma aproximação do segundo tipo então |dx − c| > |bx − a| com
x − c d
1
d
>
19
x − a b
1
b
.
20
CAPÍTULO 4.
E então
BOAS APROXIMAÇÕES POR RACIONAIS
c x − > x −
d
a .
b
O próximo resultado nos diz que todo convergente
pn
qn
é uma boa aproximação de segundo
tipo.
Teorema 4.0.4. Seja
o n-ésimo convergente da expansão em frações contínuas de um
pn
qn
dado número real. Então,
(4.0.1)
|qn x − pn | < |qx − p|
para todo p, q ∈ Z, tais que 0 < q ≤ qn ,
Demonstração: Como pq =
6
pn
qn
p
q
6=
pn
qn
.
temos que |pqn − qpn | ≥ 1 logo
p pn − ≥ 1 .
q qn qqn
Como qn+1 > qn ≥ q segue que
e portanto
p
q
p pn − > 1
q qn qn qn+1
n+1
está fora do intervalo pqnn , pqn+1
. Portanto,
x −
p pn p pn+1 p ≥ 1 .
≥ min − , −
q
q qn
q qn+1 qqn+1
E assim,
|qx − p| ≥
1
qn+1
≥ |qn x − pn | .
E toda boa aproximação será um convergente como veremos no teorema a seguir.
Teorema 4.0.5. Seja |qx − p| uma boa aproximação de segundo tipo de x = [a0 ; a1 , a2 , . . .],
então
p
q
é um convergente de x.
Demonstração: Denotemos por pqkk o k-ésimo convergente da expansão em frações contínuas
de x. Suponha que
p
q
6=
pi
, ∀i
qi
∈ N então mostraremos que
p
q
não é uma boa aproximação de
segundo tipo. De fato, temos então alguns casos a serem considerados pois
p0
p0 p1
p1
∪
,
∪
,∞ ,
R = −∞,
q0
q0 q 1
q1
21
Caso 1.
p
q
Neste caso
∈ −∞, pq00 .
p
q
≤
p0
q0
= a0 , então
|x − a0 | < x −
logo encontramos um racional
a0
1
6=
p
q
com 1 ≤ q tal que a desigualdade contida na Denição
(4.0.6) aparece invertida mostrando que
Caso 2.
p
q
∈
Neste caso,
p0 p1
,
q0 q1
p |qx − p|
≤ |qx − p|,
≤
q
q
p
q
não é uma boa aproximação de segundo tipo.
.
pertence a um intervalo cujos pontos extremos são da forma
p
q
perda de generalidades podemos assumir que
pk−1
qk−1
<
p
q
<
pk+1
qk+1
pk−1
qk−1
e
pk+1
qk+1
. Sem
. De fato, este caso ocorre
quando k é ímpar. Temos então as seguintes desigualdades
e
p pk−1 1
−
q qk−1 ≥ qqk−1
(4.0.2)
p pk−1 pk pk−1 −
< −
= 1 .
q qk−1 qk
qk−1 qk qk−1
(4.0.3)
Logo, graças as desigualdades acima temos que q > qk .
Além disso,
x −
portanto,
1
p pk+1 p ≥
− ≥
,
q
qk+1
q
qqk+1
|qx − p| = q x −
1
p ≥
.
q
qk+1
Assim,
pk |qk x − pk | = qk x − qk
pk+1 pk 1
≤ qk − ≤
≤ |qx − p|,
qk+1
qk
qk+1
mostrando que
Caso 3.
Ainda, se
não é uma boa aproximação de segundo tipo.
p
q
p1
,
∞
q1
p1
q1
p
∈
q
p
>
q
.
, temos
x −
p p1 p 1
> − ≥
,
q
q1
q
qq1
então
|qx − p| >
Por outo lado temos
1
.
q1
p1 p0 p
1
0
|x − a0 | = x − < − = ,
q0
q1
q0
q1
22
CAPÍTULO 4.
BOAS APROXIMAÇÕES POR RACIONAIS
então
|qx − p| > |x − a0 | = |1 · x − a0 | = |q0 x − p0 |,
o que novamente contradiz a denição de boa aproximação de segundo tipo, e portanto
um convergente.
p
q
é
Teorema 4.0.6. Toda fração irredutível
p
q
x.
que satisfaz x − pq <
1
2q 2
é um convergente de
Demonstração: Suponha
pn
p
qn > 0,
6
=
.
qn
q
1
|qn x − pn | ≤ |qx − p| <
2q
Então,
Portanto,
x −
p 1
.
<
q
2qqn
pn p p
n
− ≤ x − + x −
qn
q qn Por outro lado, como
pn
qn
p 1
1
qn + q
<
+ 2 =
.
q
2qqn 2q
2qn q 2
6= pq , temos
pn p − ≥ 1 ⇒ 1 < qn + q .
qn
q qqn
qqn
2qn q 2
Como qn > q então
p
q
é uma boa aproximação do segundo tipo e assim um convergente de
x.
√
√
Lema 4.0.2. Se k ≥ 2, αn+1 + βn+1 ≤ 5 e αn + βn ≤ 5, então βn+1 >
Demonstração: Como
1
βn+1
=
qn
qn−1
α n = an +
1
αn+1
+
1
βn+1
5−1
2
.
= an + βn
e
segue que
√
1
αn+1
,
= αn + βn .
Para n = k e n = k + 1, temos nas hipóteses do lema,
√
√
1
1
+
≤ 5, αn + βn ≤ 5.
αn βn
(4.0.4)
23
Isolando os αn e multiplicando as desigualdades temos
√
√
1
1
1 = αn
≤
,
5 − βn
5−
αn
βn
fazendo a distributiva
0<5−
√
completando o quadrado
1
5 βn +
βn
,
!2
√
5
− βn ,
2
1
<
4
nalmente obtemos
√
βn >
5−1
.
2
Que prova o lema.
Teorema 4.0.7. Para todo x irracional, n ≥ 1 temos x −
n
o
n−1 pn pn+1
, qn , qn+1 .
racional pqkk ∈ pqn−1
pk qk <
√1 2
5qk
para pelo menos um
Demonstração: Pela proposição (3.0.2),
(−1)n
x − pn = .
2
qn
(αn+1 + βn+1 )qn Suponha que o teorema seja falso. Então existe x irracional , n > 1 com
αn
+ βn
≤
αn+1 + βn+1 ≤
αn+2 + βn+2 ≤
√
√
√
5
5
5.
Pela Equação (3.0.2), temos
αn+1 pn + pn+1 pn p
n
x − = − qn αn+1 qn + qn+1
qn
1
=
qn (qn αn+1 ) + qn−1
1
= 2
.
qn (αn+1 + βn+1 )
Do lema temos que
√
5−1
βn >
,
2
βn+1
√
5−1
>
2
E portanto, pela equação (4.0.4),
ak =
1
βk+1
2
− βk < √
−
5−1
√
5−1
= 1,
2
24
CAPÍTULO 4.
BOAS APROXIMAÇÕES POR RACIONAIS
absurdo pois ak é um inteiro positivo, essa contradição termina a prova do teorema.
A próxima proposição mostra que
√1
5
é a menor constante c tal que a inequação
x −
c
p < 2
q
q
é satisfeita pra uma sequência innita de racionais.
Proposição 4.0.4.
racionais pq .
√
p
5 é o maior número tal que α − q <
Demonstração: Tome > 0 e α =
de racional
pn
qn
tal que
√
1+ 5
2
√1
5q 2
tem innitas soluções
e suponha por absurdo que exista uma sequência
1 + √5 p 1
n
− < √
.
2
qn ( 5 + )qn2
Podemos tomar a sequência de tal maneira que qn → ∞ quando n → ∞. Assim,
√ !
1+ 5
1
.
− pn < √
( 5 + )qn
2
qn
Multiplicando ambos lados por qn
√ 1− 5
2
− pn obtemos
√
1+ 5 pn √ 2
2 − qn − 5
pn − pn qn − qn2 <
√
.
5+
Como os
pn
qn
s formam uma sequência que se aproxima do irracional então
lim
n→∞
Então, no limite
Porém
√
√ 5
5+
!
√
1 + 5 pn
−
= 0.
2
qn
√
1+ 5 p √ √
2 − q − 5
5
√
=√
.
5+
5+
< 1 mas |p2n − pn qn − qn2 | ≥ 1. Absurdo.
Capítulo 5
Números Algébricos e Transcendentes
5.1
Teorema de Liouville
Denição 5.1.1. x é irracional algébrico de grau n se é raiz de uma equação de coecientes
inteiros de grau n e nenhuma menor que n.
Exemplo 5.1.2:
disso
√
√
2 é um irracional de grau 2 pois é raiz da equação x2 − 2 = 0. Além
2 não é raiz de nenhuma equação de grau 1 com coecientes inteiros. Ora, suponha
√
√
por absurdo que 2 fosse de grau 1, então existiriam a, b ∈ Z tais que a 2 + b = 0, mas
√
então 2 = −b
, absurdo.
a
Denição 5.1.2. Se um irracional não é algébrico dizemos que ele é transcendente.
√
Exemplo 5.1.3: π, e, 2 2 , eπ são exemplos de irracionais transcendentes.
Teorema 5.1.1. Para cada irracional algébrico α de grau n, existe um número positivo C
tal que, para quaisquer p e q(q > 0) arbitrários,
α −
p C
> n.
q
q
Demonstração: Suponha que α seja raiz de uma equação polinomial de grau n, f (α) = 0.
Aplicando o algorítmo de Euclides obtemos
f (x) = (x − α)f1 (x),
(5.1.1)
onde f1 (x) é um polinômio de grau n − 1. Podemos armar que f1 (α) 6= 0, pois senão α
seria raiz de um polinômio de grau n − 1, contradizendo assim o fato de α ser um número
25
26
CAPÍTULO 5.
NÚMEROS ALGÉBRICOS E TRANSCENDENTES
algébrico de grau n. Podemos supor sem perda de generalidade que f1 (α) > 0. Pelo Teorema
da Conservação do Sinal ∃δ > 0 tal que
f1 (x) > 0 (α − δ ≤ x ≤ α + δ).
Suponha que p e q(q > 0) são um par de inteiros arbitrários. Dividiremos a demonstração
em dois casos.
> 0, pois
Caso 1. Suponha α − pq ≤ δ.
Neste caso f1
p
q
p
q
∈ (α − δ, α + δ) e, substituindo x =
p
q
na equação (5.1.1),
obtemos
p
q
f
a0 + a1
p
−α= =
q
f1 pq
=
p
q
+ . . . + an
f1
n
p
q
p
q
a0 q n + a1 pq n−1 + . . . + an pn
.
q n f1 pq
(5.1.2)
Assim, calculando o valor absoluto temos
n
a0 q + a1 pq n−1 + . . . + an pn 1
1
≥
=
q n f1 pq q n f1 pq
q n f1 pq
(5.1.3)
pois o numerador dessa fração é um número inteiro diferente de zero. De fato, se f
então
p
q
p
q
=0
seria um zero do polinômio f (x) contido no intervalo (α − δ, α + δ) onde α é um
zero isolado. Logo, por unicidade teríamos que α =
p
q
contradizendo assim o fato de α ser
um irracional. Este numerador é então pelo menos igual à unidade em valor absoluto. Seja
M = max{f1 (x); |x − α| ≤ δ} então f1
seguinte estimativa
p
q
α −
≤ M . Graças à (5.1.2) e (5.1.3) obtemos a
p 1
≥
.
q
M qn
Concluímos assim, a demonstração
do Teorema no Caso 1, tomando C =
Caso 2.
1
M
.
Suponha que α − pq > δ .
Neste caso, observemos que
α −
p δq n
δ
> n ≥ n.
q
q
q
Concluímos assim, a demonstração do Teorema no Caso 2, tomando C = δ .
Escolhendo C = min{δ, M1 }, obtemos assim, para p e q(q > 0) inteiros arbitrários a
seguinte desigualdade
α −
p C
> n.
q
q
5.1.
27
TEOREMA DE LIOUVILLE
Observação 5.1.1. Pela contra-positiva do Teorema (5.1.1), se α é um irracional tal que
para cada C > 0 e n ∈ Z+ existem inteiros p e q(q > 0), tais que
α −
C
p ≤
,
q qn
(5.1.4)
então α é um número não algébrico, isto é, é transcendente.
Denição 5.1.3. Um número real x é dito de Liouville se para todo n ∈ N existirem p e q
inteiros tais que
0 < x −
1
p < n , q > 1.
q
q
Veremos nos resultados a seguir que os números de Liouville não só são irracionais como são
transcendentes.
Proposição 5.1.1. Todo número de Liouville é irracional.
Demonstração: Essa prova será feita por contradição. Então suponha que x = dc e tome
n tal que 2n−1 > d. Se x fosse de Liouville existiriam p e q tais que
p 1
0 < x − < n ,
q
q
a primeira desigualdade mostra que
p
q
6= dc . Disso e do fato de p, q, c e d serem inteiros temos
que |cq − pd| ≥ 1. Assim
x −
1
1
1
p c p cq − pd = − =
≥
> n−1 ≥ n
q
d q
dq
dq
2 q
q
chegamos na contradição. Portanto se x de Liouville, x é irracional.
Proposição 5.1.2. Todo número de Liouville é transcendente.
Demonstração: O fato dos números de Liouville serem transcendentes decorre da Observação (5.1.1) no caso particular quando C = 1. Para C > 1 é simples ver que a desigualdade
continua sendo verdadeira. Segue da denição de número de Liouville que existe uma sequência de racionais
n o
pk
qk
tal que 2 ≤ q1 < q2 < q3 < . . . e
p
k
x − < 1 ,
qk qkk
k = 1, 2, 3, . . . .
(5.1.5)
28
CAPÍTULO 5.
NÚMEROS ALGÉBRICOS E TRANSCENDENTES
Dados 0 < C < 1 e n ∈ N seja k0 ∈ N sucientemente grande tal que
1
qkk−n
(5.1.6)
∀k ≥ k0 .
< C,
Então, xado um k ≥ k0 temos que
p
k
x − < 1 = 1 1 ≤ C
qk qkk
qkn
qkk−n qkn
mostrando que a condição (5.1.4) é satisfeita com
p
q
=
pk
qk
.
Exemplo 5.1.4: A constante de Liouville é denida por
L=
∞
X
10−j! .
j=1
Proposição 5.1.3. A constante de Liouville é um número de Liouville.
Demonstração: Para algum n xo dena p e q da forma
p=
n
X
10n!−j! ,
q = 10n! .
j=1
Temos assim
L −
∞
∞
∞
∞
X
X
X
X
1
p −j!
−(n+j+1)!
−(n+1)!−j
−(n+1)!
=
10 =
10
≤
10
= 10
10−j < 10−n!n = n .
q
q
j=n+1
j=0
j=0
j=0
Portanto L é um número de Liouville.
5.2
Teorema de Lagrange
Denição 5.2.1. Uma fração contínua [a0 ; a1 , a2 , . . .] é periódica de período k(k ≥ 1) (diferença da repetição) e de ordem i(i ≥ 0) (começo da repetição), se e só se,
an+k = an ,
∀n ≥ i
Assim, em analogia com uma dízima periódica, representaremos uma fração contínua periódica por
Exemplo 5.2.5:
x = [a0 ; a1 , a2 , . . . , ai−1 , ai , ai+1 , . . . , ai+k−1 ].
√
7 é uma fração contínua periódica de ordem 2 e período 4, pois
√
7 = [2; 1, 1, 1, 4].
5.2.
29
TEOREMA DE LAGRANGE
Teorema 5.2.1. x é uma irracionalidade quadrática (ou de grau 2), se e somente se, sua
representação em frações contínuas é periódica.
Demonstração:
Suciência: Se a representação em frações contínuas de um número é periódica, então
existem i ≥ 0 e k ≥ 1 tais que satisfazem a relação
an+k = an
para todo n ≥ i. Denotando por αn = [0; an , an+1 , . . .] o resto da expansão em frações
contínuas, é fácil ver que αn+k = αn , ∀n ≥ i. De fato,
αn+k = [0; an+k , an+k+1 , . . .]
= [0; an , an+1 , . . .]
= αn
Assim
αn+k = αn
para todo n ≥ i. Portanto, pelo Corolário (3.0.1),
x=
pn+k−1 αn+k + pn+k−2
pn−1 αn + pn−2
=
.
qn−1 αn + qn−2
qn+k−1 αn+k + qn+k−2
(5.2.1)
Usando a periodicidade temos que, se n ≥ i, então
pn+k−1 αn + pn+k−2
pn+k−1 αn+k + pn+k−2
=
,
qn+k−1 αn+k + pn+k−2
qn+k−1 αn + pn+k−2
(5.2.2)
então, usando (5.2.1) e (5.2.2) temos que
pn−1 αn + pn−2
pn+k−1 αn + pn+k−2
=
.
qn−1 αn + qn−2
qn+k−1 αn + pn+k−2
Que multiplicando em cruz resulta em An αn2 + Bn αn + Cn = 0 onde
An = pn−1 qn+k−1 − pn+k−1 qn−1
Bn = pn−1 qn+k−2 + pn−2 qn+k−1 − (pn+k−1 qn−2 + pn+k−2 qn−1 )
Cn = pn−2 qn+k−2 − pn+k−2 qn−2 .
E portanto αn satisfaz uma equação do segundo grau com coecientes inteiros. Como x
pode ser escrito como em (5.2.4) a partir do αn provamos que se x é uma fração contínua
periódica então ela é raiz de uma equação do segundo grau.
30
CAPÍTULO 5.
NÚMEROS ALGÉBRICOS E TRANSCENDENTES
Necessidade: Vamos provar agora que se x é uma irracionalidade quadrática (e portanto
raiz de uma equação do segundo grau) então a fração contínua de x é periódica, i.e., existem
n e k tais que αn+k = αn , ∀n ≥ i. Neste caso, existem a, b, c inteiros tais que
(5.2.3)
ax2 + bx + c = 0.
Temos, ainda, pelo Corolário (3.0.1) que
x=
e portanto
a
pn−1 αn + pn−2
qn−1 αn + qn−2
pn−1 αn + pn−2
,
qn−1 αn + qn−2
2
+b
pn−1 αn + pn−2
qn−1 αn + qn−2
(5.2.4)
+ c = 0.
Agora escrevendo a equação para αn obtemos
An αn2 + Bn αn + Cn = 0.
(5.2.5)
Com
2
,
An = ap2n−1 + bpn−1 qn−1 + cqn−1
Bn = 2apn−1 pn−2 + b(pn−1 qn−2 + pn−2 qn−1 ) + 2cqn−1 qn−2 ,
2
.
Cn = ap2n−2 + bpn−2 qn−2 + cqn−2
Disso, em particular, obtemos que Cn = An−1 . Com esses An , Bn e Cn , é simples ver que
Bn2 − 4An Cn = (b2 − 4ac)(pn−1 qn−2 − qn−1 pn−2 )2
= (b2 − 4ac)(−1)2n
.
= b2 − 4ac = ∆,
isso é, o discriminante de (5.2.5) é o mesmo de (5.2.3) para todo n. Além disso, como
então denimos δn−1 = qn2 ·
pn−1
qn−1
|δn−1 | =
x − pn−1 < 1 ,
2
qn−1 qn−1
− x e assim |δn−1 | < 1, pois
2
qn−1
p
1
n−1
2
< qn−1
· x −
· 2 = 1.
qn−1
qn−1
Portanto,
pn−1 = xqn−1 +
δn−1
.
qn−1
5.3.
EXEMPLOS DE TRANSCENDENTES:
E
E
31
π
Substituindo em An , obtemos,
2
δn−1
δn−1
2
+ cqn−1
An = a xqn−1 +
+ b xqn−1 +
qn−1
qn−1
δ2
2
= (ax2 + bx + c)qn−1
+ 2axδn−1 + a n−1
+ bδn−1 .
2
qn−1
Aplicando o módulo em ambos os lados e utilizando a desigualdade trigular obtemos,
2
δ
n−1
|An | = 2axδn−1 + a 2 + bδn−1 < 2 |ax| + |a| + |b| ,
q
n−1
do mesmo modo,
|Cn | = |An−1 | < 2 |ax| + |a| + |b| .
Assim, An e Cn são limitados e podem assumir apenas um número nito de valores, como
Bn =
√
∆ − 4An Cn , então Bn assume um número limitado de valores e portanto armo que
se a sequência {αn }∞
n=1 assume um número nito de valores, então existem n e k ∈ Z+ tais
que, para todo n ≥ i, implica que
αn = αn+k .
De fato, suponha pela contra-positiva, que para todo i e k ∈ Z+ , existe n ≥ i tal que
αn 6= αn+k , disto implica que para cada kj = j ∈ Z+ xo existe um nj ≥ j tal que
αnj 6= αnj +k . Como sabemos que isso vale para todo k então existem innitos valores de αj .
Isso mostra que a representação da fração contínua de x é periódica.
5.3
Exemplos de transcendentes:
e
e
π
Teorema 5.3.1. O número real e é transcendente.
Demonstração: Antes da prova em si veremos que se um polinômio f (x) é de grau m, e
se
Z
I(t) =
t
eu−t f (u)du,
0
onde t é um número real qualquer. Resolvendo essa integral por partes,
t
Z
u−t
e
t
Z
t
f (u)du = −f (t) + e f (0) +
0
eu−t f 0 (u)du.
(5.3.1)
eu−t f (2) (u)du.
(5.3.2)
0
Resolvendo essa nova integral que apareceu, obtemos
Z
t
e
0
u−t 0
0
t 0
Z
f (u)du = −f (t) + e f (0) +
0
t
32
CAPÍTULO 5.
NÚMEROS ALGÉBRICOS E TRANSCENDENTES
Substituindo (5.3.2) em (5.3.1), chegamos em
I(t) = e
t
1
X
f
(j)
(0) −
1
X
j=0
f
(j)
t
Z
eu−t f (2) (u)du.
(t) +
0
j=0
Recursivamente obtemos
t
I(t) = e
m
X
f
(j)
m
X
(0) −
j=0
Mas como f é de grau m então
f
(j)
0
eu−t f (m+1) (u)du.
(t) +
0
j=0
Rt
t
Z
eu−t f (m+1) (u)du = 0, então temos que
t
I(t) = e
m
X
f
(j)
(0) −
j=0
m
X
f (j) (t).
(5.3.3)
j=0
Uma função f (x) pode ser escrita como a diferença de sua parte positiva para sua parte
negativa, ou seja
f (x) = f + (x) − f − (x),




f (x), , se f (x) ≥ 0
−f (x), , se f (x) ≤ 0
−
+
e f (x) =
denidas por f (x) =



0
0
, se f (x) < 0
, se f (x) > 0
e como ambas funçõessão positivas podemos calcular o módulo da f (x) usando suas partes
positivas e negativas:
|f (x)| = f + (x) + f − (x).
Veremos agora um uso para essa outra forma de escrever a função:
Z
b
Z
b
Z
+
f (x)dx −
f (x)dx =
a
a
b
f − (x)dx.
a
Temos então
Z b
Z b
Z b
−
+
f (x)dx −
f (x)dx
f (x)dx = a
Za b
a Z b
−
+
f (x)dx
≤ f (x)dx + −
a
a
Z b
Z b
=
f + (x)dx +
f − (x)dx
a
a
Z b
=
f + (x) + f − (x)dx
a
Z b
=
|f (x)|dx
a
Portanto
Z b
Z b
f (x)dx ≤
|f (x)|dx.
a
a
5.3.
EXEMPLOS DE TRANSCENDENTES:
E
E
π
33
Sendo f (j) a j−ésima derivada de f . Além disso, se f (x) denotar o polinômio obtido a
partir de f trocando os coeciêntes por seu valor absoluto, então
Z
t
eu−t f (u)du|
|I(t)| = |
Z 0t
|et−u f (u)|du
≤
Z0 t
eu−t |a0 + a1 u + . . . + an un |du
=
0
Z t
≤
eu−t (|a0 | + |a1 |u + . . . + |an |un )du
Z0 t
=
eu−t f (u)du
Z0 t
≤
e|t| f (t)du
0
Z t
|t|
du
= e f (t)
0
≤ |t|e|t| f (|t|).
Obtemos assim a desigualdade
|I(t)| ≤ |t|e|t| f (|t|).
(5.3.4)
Suponha então que e seja algébrico, assim
q0 + q1 e + . . . + qn en = 0
(5.3.5)
Assim q0 6= 0 e qn 6= 0 senão e não seria de grau n e para alguns inteiros n > 0, q1 , . . . , qn−1 6=
0 . Vamos agora comparar estimativas para
J = q0 I(0) + q1 I(1) + . . . + qn I(n),
onde I(t) é denido como descrito acima com
f (x) = xp−1 (x − 1)p . . . (x − n)p ,
(5.3.6)
34
CAPÍTULO 5.
NÚMEROS ALGÉBRICOS E TRANSCENDENTES
assim m = (n + 1)p − 1. E p denota um primo grande. Calculando os I(k)s, temos
I(0) = 0
I(1) = e
I(2) = e
m
X
f
j=0
m
X
2
(j)
(0) −
m
X
j=0
m
X
f (j) (0) −
j=0
..
.
I(n) = en
f (j) (1)
f (j) (2)
j=0
m
X
f (j) (0) −
j=0
m
X
f (j) (n).
j=0
Substituindo em (5.3.6), temos
m
X
J = q1 e
f (j) (0) −
j=0
+ qn
en
Pondo
j=0
!
f (j) (1)
+ q2
m
X
f (j) (0) −
e2
m
X
f (j) (0) −
j=0
j=0
j=0
Pm
m
X
m
X
m
X
!
f (j) (2)
+ ...+
j=0
!
f (j) (n) .
j=0
f (j) (0) em evidência, obtemos
J=
m
X
f (j) (0)(q1 e + q2 e2 + . . . + qn en ) −
j=0
m X
n
X
qk f (j) (k)
j=0 k=1
De (5.3.5) temos
J =−
m X
n
X
qk f (j) (k),
j=0 k=0
Essa f em particular tem raízes {0, 1, . . . , n} e portanto f (j) (k) = 0 se j < p com k > 0 ou
se j < p − 1 com k = 0, e então para todo j, k que não j = p − 1 e k = 0, f (j) (k) é um inteiro
divisível por p!, ainda temos que
f (p−1) (0) = (p − 1)!(−1)np (n!)p ,
de onde, se p > n, f (p−1) é um inteiro divisível por (p − 1)! mas não por p!. Segue que, se
também p > |q0 |, então J é um inteiro não nulo divisível por (p − 1)! e então |J| ≥ (p − 1)!.
Mas a estimativa f (k) ≤ (2n)m junto com (5.3.4) nos dá
|J| ≤ |q1 |ef (1) + . . . + |qn |nen f (n) ≤ cp
para algum c que independe de p. A estimativa se torna inconsistente se p é sucientemente grande pois o fatorial cresce mais rápido que uma potência de uma base xa, e essa
contradição prova o teorema.
5.3.
EXEMPLOS DE TRANSCENDENTES:
E
E
35
π
Teorema 5.3.2. O número real π é transcendente.
Demonstração: Suponha o contrário, que π é algébrico, então θ = iπ também é algébrico.
Seja θ de grau d, sejam θ1 (= θ), θ2 , . . . , θd todas as raízes do polinômio e seja l o coeciente
do monômio de maior grau do polinômio que dene θ. Da equação de Euler eiπ =-1, obtemos
(1 + eθ1 )(1 + eθ2 ) . . . (1 + eθd ) = 0.
O produto a esquerda pode ser escrito como a soma de 2d termos eΘ , onde
Θ = 1 θ1 + . . . + d θd ,
e j = 0 ou 1, suponhamos que n dos números
1 θ1 + . . . + d θd ,
são não-nulos, e denotamos esses por α1 , . . . , αn . Temos então
q + eα1 + . . . + eαn = 0,
(5.3.7)
onde q é o inteiro positivo 2d − n.
Devemos comparar a estimativa para
J = I(α1 ) + . . . + I(αn ),
onde I(t) é denida como na prova do teorema (5.3.1) com
f (x) = lnp xp−1 (x − α1 )p . . . (x − αn )p ,
e p novamente é um primo grande. De (5.3.3) e (5.3.7) temos
J = −q
m
X
j=0
f
(j)
(0) −
m X
n
X
f (j) (αk ),
j=0 k=1
onde m = (n + 1)p − 1. Agora a soma em k é um polinômio simétrico ao polinômio cuja os
coecientes são lα1 , . . . , lαn , e segue de duas aplicações do teorema fundamental das funções
simétricas junto com a observação que cada função elementar simétrica à lα1 , . . . , lαn é
também uma função elementar simétrica em 2d números lΘ, isso representa um racional
inteiro. Mais ainda, como f (j) (αk ) = 0 quando j < p, esse último é divisível por p! quando
j 6= p − 1, e
f (p−1) (0) = (p − 1)!(−l)np (α1 . . . αn )p
36
CAPÍTULO 5.
NÚMEROS ALGÉBRICOS E TRANSCENDENTES
é um racional inteiro divisível por (p − 1)! mas não por p! se p é sucientemente grande.
Portanto, se p > q , temos |J| ≥ (p − 1)!. Mas de (5.3.4) obtemos
|J| ≤ |α1 |e|α1 | f (|α1 |) + . . . + |αn |e|αn | f (|αn |) ≤ cp
para algum c independente de p. A estimativa é inconsistente para um p sucientemente
grande, e a contradição prova o teorema.
Referências Bibliográcas
[K]
A. Ya. Khinchin, Continued Fractions, Dover, (1964).
[C]
Moreira, Carlos Gustavo, Frações Contínuas, Representações de Números e Aproxi-
mações.
[B]
Baker, Alan, Transcendental Number Theory, Cambridge University Press, (1975).
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