COOPERATIVA DE MULHERES: DESAFIANDO AS DESIGUALDADES NO AGRESTE PERNAMBUCANO. Maria do Socorro Freire* Niedja Lima Silva** Manuelle Araújo Holanda*** Thallyta Mota Gois**** Victor Montenegro***** Resumo Os desafios colocados para as mulheres nas relações de trabalho expressam a necessidade de políticas públicas para essa categoria social. A exploração da mulher, sua invisibilidade e opressão são colocadas em evidência nas relações de gênero que permeiam a posição das mulheres seja no lar ou no trabalho. Neste contexto, o presente trabalho visa descrever de maneira reflexiva o processo de consolidação de uma cooperativa de mulheres artesãs situada no município de São Joaquim do Monte, agreste pernambucano. Este apoio ao empreendimento é executado à luz da compreensão do importante papel que a economia solidária assume na promoção da saúde e no desenvolvimento sustentável de comunidades. Tendo um potencial real de emancipação social, a cooperativa de mulheres consegue, através de processos organizativos, desenvolver as potencialidades já existentes na própria comunidade, enquanto estratégia de enfrentamento das desigualdades sociais e de gênero. Palavras-chave: Gênero. Relações de Trabalho. Cooperativismo. Desenvolvimento Sustentável. 1 INTRODUÇÃO A partir de uma perspectiva ampliada, as iniciativas de promoção da saúde se direcionam a reduzir as desigualdades e iniquidades na saúde da população e garantir oportunidades e recursos de forma igualitária para que as pessoas realizem seu potencial de saúde. Dessa forma, segundo a Carta de Ottawa de 1986 a promoção da saúde é o processo de capacitação da comunidade para atuar na melhoria de sua qualidade de vida e saúde, incluindo uma maior participação no processo. * Universidade Federal de Pernambuco. Possui graduação em Serviço Social pela Universidade Federal de Pernambuco (1978). Especialista em Saúde Pública pela ENSP/FIOCRZ (1987) e em Associativismo e Cooperativismo pela Universidade Federal Rural de Pernambuco (2004) Mestre em Serviço Social pela Universidade Federal de Pernambuco (1996). Desde 1997 é pesquisadora e desenvolve atividades de ensino e extensão no Núcleo de Saúde Pública e Desenvolvimento Social da Universidade Federal de Pernambuco. Email: [email protected] ** Universidade Federal de Pernambuco. Graduanda do curso de Serviço Social da Universidade Federal de Pernambuco. Estagiária do Núcleo de Saúde Pública e Desenvolvimento Social (NUSP/UFPE), também é Integrante do Núcleo Comunicação e Direitos humanos da UFPE onde é bolsista de iniciação científica. E-mail: [email protected] *** Universidade Federal de Pernambuco. Estudante de graduação em Enfermagem. Estagiária do Núcleo de Saúde Pública e Desenvolvimento Social. E-mail: [email protected] **** Universidade Federal de Pernambuco. Estudante de graduação em Terapia Ocupacional. Estagiária do Núcleo de Saúde Pública e Desenvolvimento Social. E-mail: [email protected] ***** Universidade Federal de Pernambuco. Estudante de graduação em Ciências Sociais. Estagiário do Núcleo de Saúde Pública e Desenvolvimento Social. E-mail: [email protected] Esta conceituação sugere que a criação de estratégias que consideram a saúde como um recurso para a vida, contribuindo para o desenvolvimento social, econômico e pessoal, fazendo com que fatores econômicos, políticos, culturais, sociais e ambientais sejam favoráveis à saúde. É nesta perspectiva que as ações são realizadas nos municípios de Barra de Guabiraba e São Joaquim do Monte, no âmbito do projeto “Incubação de Cooperativas de Mulheres Artesãs da Rede Pernambucana de Municípios Saudáveis”, cujos objetivos principais foram: a) promover a sustentabilidade de duas cooperativas de artesãs nos municípios de Barra de Guabiraba e São Joaquim do Monte por meio de incubação tecnológica visando a sua consolidação no mercado e no desenvolvimento local; b) incentivar a equidade de gênero e o empoderamento das mulheres artesãs da Rede Pernambucana de Municípios Saudáveis através de trocas de experiências nos Encontros da Rede e participação na FENEARTE;c) articular equidade de gênero as questões de trabalho e renda, qualidade de vida e políticas públicas saudáveis, nas ações e interações dos participantes e parcerias; c) fortalecer as capacidades produtivas e gerenciais das duas organizações cooperativas através de capacitações em planejamento, gestão e comercialização Dessa forma o referido projeto intervém nas condições fundamentais para obtenção de uma vida saudável como educação, renda, ecossistema estável, recursos sustentáveis, justiça social e equidade. Assim, a partir das experiências de cada comunidade e de suas potencialidades, foi formada em cada município, uma cooperativa de mulheres artesãs, objetivando gerar confiança, solidariedade, geração de renda e empoderamento, contribuindo para o desenvolvimento local. Neste contexto, este trabalho tem por objetivo apresentar as discussões e resultados desse projeto de extensão nas cooperativas, promovendo a sustentabilidade das ações das cooperadas e fortalecendo as potencialidades locais. 2 METODOLOGIA São utilizadas estratégias metodológicas participativas de incubação tecnológica (FRANÇA FILHO,2009) nos processos de planejamento e gestão democrática de organizações cooperativas. O trabalho conta com o apoio do planejamento operacional e ação reflexiva do Método Bambu (MENEZES FILHO, 2006) utilizado como um instrumento de mobilização dos grupos, monitoramento e avaliação das capacidades desenvolvidas e lições aprendidas 3 REFERENCIAL TEÓRICO 3.1 GERAÇÃO DE RENDA COM GRUPO DE MULHERES: A MULHER FRENTE EMPREENDIMENTOS COLETIVOS. Com os estudos realizados sobre o tema e a partir do conhecimento dos municípios incluídos neste projeto, foram contempladas as questões que embasam as intervenções necessárias para uma vida saudável. Estas, dizem respeito ao desenvolvimento social, econômico e pessoal e incluem de forma mais precisa a pobreza, a desigualdade social e de gênero que fazem parte da problemática que abrange a comunidades envolvida na ação. Em primeiro lugar, faz-se necessário refletir que tais problemas são construções sóciohistóricas abordadas como expressões da questão social, e esta é apreendida enquanto o conjunto das expressões das desigualdades da sociedade capitalista, resultante da disputa da riqueza socialmente produzida, mas desigualmente apropriada (Iamamoto, 2009). Sendo a pobreza uma das manifestações da questão social, que Yazbek (2012), a situa como expressão direta das relações sociais, não se reduzindo a privações materiais, mas como categoria política que expressa a carência de direitos, de oportunidades e possibilidades. A autora ainda relata que a pobreza, em sua qualidade relativa, gira em torno da desigualdade social e de suas outras condições, seja de gênero, etnia ou outros aspectos. No que diz respeito à pobreza, ela se torna ainda mais presente no cotidiano do público alvo deste projeto: as mulheres. As dificuldades no mercado de trabalho desafiam esta categoria, já que ainda representam mais da metade da população desempregada e ainda recebem de forma inferior aos homens, mesmo quando realizam as mesmas atividades. (AGÊNCIA CONDEPE/FIDEM; DIEESE 2012) Os novos desafios que estão sendo colocados para as mulheres nas relações de trabalho são construídos historicamente. A submissão da mulher, sua exploração, invisibilidade e opressão são colocadas em evidência nas relações de gênero que permeiam a posição das mulheres seja no lar ou no trabalho. Portanto as desigualdades de gênero cercam o contexto feminino, isso justifica a necessidade de políticas públicas para essa categoria social e a importância das cooperativas de mulheres artesãs como um instrumento de empoderamento e enfrentamento da pobreza. Diante disso, a estratégia de “Municípios Saudáveis” que o NUSP vem atuando, propõe a participação popular no desenvolvimento local, neste projeto especificamente, com atividades de geração de renda com mulheres do interior pernambucano. A iniciativa de ação nas cooperativas, partiu da necessidade de enfrentamento das expressões da questão social que se manifestam como a pobreza, exclusão social, desigualdade social e de gênero. Parafraseando a Política Nacional de Promoção da Saúde o projeto tem por finalidade promover a qualidade de vida, reduzindo riscos à saúde que estão relacionados ao modo de viver, condições de trabalho, habitação, ambiente, educação, lazer, cultura, acesso a bens e serviços essenciais (BRASIL, 2006). A partir desta perspectiva, trabalhar com geração de renda para melhoria da qualidade de vida é uma estratégia, observando-se atualmente diversas mudanças no mundo do trabalho, avanços e retrocessos que nos colocam diante da necessidade de observar tais contradições. De acordo com Antunes (2011), presencia-se uma nova fase de desconstrução do trabalho, com o aumento da informalidade e em uma nova era de precarização estrutural do trabalho em escala global. Ou seja, a precarização do trabalho ocorre tanto em países capitalistas desenvolvidos, como em países em desenvolvimento, atingindo todas as formas de trabalho, sejam elas na área urbana ou na rural. Por ser o trabalho uma prática social, ele se inclui de forma diferenciada nas relações sociais entre os sexos. Diante dessa afirmação, a divisão sexual do trabalho, tem em si, a existência das relações de poder que são construídas históricas e socialmente, persistindo a valorização do trabalho do homem, enquanto há uma desvalorização e invisibilidade do trabalho feminino. Mesmo que essa produção se dê na mesma medida, a mulher ainda contém em si a centralidade da vida doméstica das tarefas de cuidados e pela procriação, ou seja, atividades vinculadas às qualidades que as mulheres devem ter, como um ser que se dedica harmoniosamente com o seu sentimento maternal a vida reprodutiva e a esfera da reprodução do trabalho. (CARLOTO; GOMES, 2011) Para tanto, a alternativa para superação das desigualdades e invisibilidade do trabalho feminino em São Joaquim do Monte, resulta do acúmulo de capital social, surgindo a iniciativa dessas mulheres para formalização das duas organizações cooperativas. Essa opção pelo cooperativismo nos remete a Paul Singer (2002), afirmando que para ter uma sociedade em que predomine a igualdade é preciso uma economia solidária ao invés de competitiva. Para ele a economia solidária tem como princípios básicos a propriedade coletiva do capital e o direito à liberdade individual. Mas o tema no Nordeste é considerado frágil diante do investimento de capital e da mão de obra não qualificada, assim como há um declínio da participação das mulheres em organizações cooperativas. (FRANCO DE SÁ, 2008) A proposta deste trabalho de incubação, ou seja, de assessoria à organização popular, visa fortalecer a cooperativa incentivando processos de autogestão. As cooperativas resultam primeiramente das potencialidades locais e também das intervenções realizadas pela equipe do NUSP. 4 CONCLUSÃO Algumas capacitações foram promovidas através da intervenção da equipe do NUSP e do Núcleo de Design do Centro Acadêmico do Agreste CAA/UFPE, como as oficinas de Design que promoveram a qualidade dos produtos para a FENEARTE, articulando o conhecimento já adquirido das cooperadas com o dos estudantes, oficinas sobre cooperativismo e apoio técnico na elaboração dos estatutos e na realização das assembleias de fundação das cooperativas bem como o acompanhamento dos procedimentos legais de registro das cooperativas e exposição na FENEARTE. Neste segundo semestre serão realizadas oficinas bambu para reforçar o sentimento de pertencimento, compromisso e atualizar o processo de autogestão com os novos membros das cooperativas com oficinas de planejamento. Dessa forma, as capacitações terão como foco a autonomia das cooperativas e seu reconhecimento, assim como o sentimento de pertencimento das cooperadas de modo que sejam fortalecidas as potencialidades, promovendo equidade de gênero e o enfrentando da exclusão social. Esperam-se como principais resultados a sustentabilidade das cooperativas de artesãs, o que promoverá geração de renda, equidade de gênero e inclusão social. No que diz respeito às particularidades das cooperativas, acredita-se nas seguintes mudanças: Conclusão do processo de legalização e visibilidade das cooperativas concernentes à melhora na produtividade e facilitação na comercialização dos produtos.Na autonomia das cooperativas através da capacidade de autogestão. Espera-se impulsionar o sentimento de pertencimento e apropriação do trabalho realizado, para que elas se reconheçam naquilo que fazem e produzem. REFERÊNCIAS ANTUNES, Ricardo. 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