ELETROMAGNETISMO II 20 187 COMPORTAMENTO EM C. A. DOS MATERIAIS FERROMAGNÉTICOS Este capítulo é dedicado a fenômenos que ocorrem em materiais ferromagnéticos, quando estes são submetidos a campos magnéticos variáveis no tempo. Estes fenômenos ocorrem porque os materiais ferromagnéticos além de serem bons condutores para o fluxo magnético, também se enquadram na categoria dos materiais condutores de corrente elétrica (não tão bons condutores como o cobre, o alumínio e o ouro, por exemplo) 20.1 - Permeabilidade Diferencial e Permeabilidade Incremental Como vimos no capítulo passado, o cálculo de indutâncias requer o conhecimento de permeabilidades magnéticas que não são constantes, variando na medida em que a intensidade de campo magnético ao qual o material ferromagnético está submetido também varia. Esta permeabilidade, por sua vez, varia com as correntes nos enrolamentos, responsáveis pela excitação dos campos magnéticos. Entretanto, para certas aplicações, devemos definir um número que expresse esta permeabilidade magnética. Portanto, algumas considerações devem ser feitas aqui. A indutância definida como a relação entre o fluxo concatenado e a corrente, só é válida quando é constante. No caso dos materiais ferromagnéticos, não é constante e escrevemos para a indutância: L d d N m di di (20.1) Para o circuito magnético da figura 20.1 de comprimento médio , podemos escrever que: m S B dm S dB (20.2) Da mesma forma N i H di dH N I N Figura 20.1 - Estrutura ferromagnética com um enrolamento Portanto, de (20.1) temos: UNESP/Bauru – Naasson Pereira de Alcantara Jr. – Claudio Vara de Aquino (20.3) 188 ELETROMAGNETISMO II L N2S dB dH (20.4) O fator dB/dH com dimensão de permeabilidade magnética corresponde à declividade (variável) na curva de histerese. Conforme podemos observar na figura 20.2, a relação dB/dH, por sua razão de ser, é conhecida por permeabilidade diferencial, maior do que a relação Bi/Hi no mesmo ponto i. B (T) Bi dB/dH Hi H (A/m) Figura 20.2 - Ciclo de Histerese com representação de B, H e dB/dH. Se uma corrente alternada é aplicada ao circuito, tal que dB/dH varie de instante a instante, fica impraticável utilizarmos o conceito de indutância. Neste caso, é conveniente utilizar uma indutância média Lav, definida como: L av onde N2S dB N2S dH av (20.5) B max H max Bmax Figura 20.3 – representação da permeabilidade magnética média como sendo a relação Bmax/Hmax Hmax Suponhamos agora que em adição a uma pequena corrente alternada, tenhamos uma componente DC (corrente contínua) relativamente grande. Neste caso, pequenos laços de histerese existirão em cada ponto do ciclo de histerese principal, como pode ser visto na figura 20.4. Neste caso, o valor médio dB / dH é dado por B / H onde B e H são as diferenças entre os extremos do laço de histerese menor onde B / H recebe o nome de permeabilidade incremental. UNESP/Bauru – Naasson Pereira de Alcantara Jr. – Claudio Vara de Aquino 189 ELETROMAGNETISMO II B H Figura 20.4 - Laço de histerese com laços de histereses secundários 20.2 - Correntes Parasitas Quando uma massa metálica ferromagnética é submetida a uma densidade de fluxo com indução variável no tempo, forças eletromotrizes serão induzidas no seu interior, produzindo laços ou espiras de correntes parasitas que circularão pelo metal. Tais correntes parasitas são também conhecidas por correntes de Foucault, que encontrando resistência, aquecem o material dissipando energia. Considere a figura 20.5, onde uma chapa ou lâmina de material ferromagnético, de espessura , comprimento um pouco maior do que e profundidade a, é submetida a um campo magnético variável, no tempo, na direção do eixo x, ou seja, perpendicular a área (plano do papel) dele saindo. z i B y i Figura 20.5 - Chapa de material magnético submetida a campo variável A análise que faremos se restringe a chapas ou lâminas de material ferromagnético, onde >>, na presença de campos magnéticos de indução senoidal, uniformemente distribuído ao longo da seção transversal de modo que: B B0 cos t â x (20.6) A presença deste campo magnético de indução senoidal no tempo induz laços de corrente alternada no meio ferromagnético, ocorrendo por conseqüência a dissipação de energia. Considerando o material como uma chapa ou lâmina de espessura << , podemos admitir que os laços de corrente UNESP/Bauru – Naasson Pereira de Alcantara Jr. – Claudio Vara de Aquino ELETROMAGNETISMO II 190 parasita praticamente acompanham o perfil da lâmina e assim considerar apenas as diferenças de potencial na direção y em decorrência da fem e induzida segundo a lei de Faraday, conforme e d dt s B dS (20.7) Para um laço genérico de corrente induzida na chapa, podemos escrever que e 2 z B0 sen t . (20.8) Como já vimos em capítulos anteriores a fem induzida encontra-se na espira e estabelece a circulação da corrente induzida em cada laço. Assim, cada laço de corrente induzida percorrendo a chapa, pela lei de Joule, dissipará uma potência dada por: dP E 2ef dR (20.9) onde R é a resistência do percurso significativo 2 com resistividade específica percorrido por cada laço de corrente induzida. Assim, dR 2 a dz (20.10) Portanto, a potência média dissipada na lâmina em cada laço de corrente será: 2 z B0 2 dP 2 2 adz 2 B02 a z 2 dz (20.11) A potência total dissipada na lâmina será dada pela integração da potência em cada laço de corrente, para z variando de 0 a /2. Desta forma, a potência dissipada em toda a espessura da chapa pela circulação das correntes parasitas envolventes ou de Foucault será então: / 2 Pf 0 B02 2 a z 2 dz (20.12) O caminho oferecido pelos laços de correntes parasitas encontra uma resistência elétrica no percurso fechado 2 . Daí considerarmos apenas a metade da espessura da chapa no cálculo da potência dissipada na lâmina para que não a tomemos duas vezes, valor este já considerado na equação (20.10) na determinação da resistência elementar dR em cada laço de corrente. Assim, Pf B20 2 a 3 24 (20.13) Sendo o volume da lâmina a , as perdas por unidade de volume no Sistema Internacional de Unidades será: p fv B 20 2 a 3 B02 2 2 W 24 a 24 m3 ou:ainda UNESP/Bauru – Naasson Pereira de Alcantara Jr. – Claudio Vara de Aquino (20.14) 191 ELETROMAGNETISMO II p fv B 02 2 2 24 W m3 (20.15) Vemos então que as perdas por correntes parasitas são: 1. 2. 3. 4. proporcionais ao quadrado da indução magnética B;. proporcionais ao quadrado da freqüência f ou , onde = 2f; proporcionais ao quadrado da espessura da chapa do material magnético; proporcionais à condutividade (ou inversamente proporcionais à resistividade). 20.3 - Perdas por Histerese O material ferromagnético quando submetido a um campo magnético variável no tempo se aquece por duas razões; uma delas, já vista, pela indução de correntes parasitas ou de Foucault e outra por dissipação de energia na inversão dos dipolos ou domínios magnéticos existentes no meio, que são as perdas por histerese. A teoria dos circuitos elétricos mostra que a energia W entregue por uma fonte a um circuito é: t W t v( t ) i(t ) dt 0 d N dt i dt N i d 0 (20.16) Admitindo o circuito magnético com comprimento médio e seção reta S uniforme temos: W N H dBS H S dB S H dB N B (20.17) B Suponhamos que um material ferromagnético seja submetido à ação de um campo magnético H variável no tempo, com uma frequência f ou período T = 1/f. Em cada ciclo ou período, uma parcela da energia injetada no material será dissipada ou utilizada apenas para percorrer o ciclo de histerese e se constituirá em perdas por histerese. Para melhor compreendermos as perdas por histerese, vamos fazer uma análise passo a passo. Denominando Ph a potência associada ao ciclo de histerese, e W h a energia dissipada em um ciclo, ou período T teremos: W h P h T Ph f (20.18) Em termos de potência dissipada por histerese podemos então escrever que: Ph Wh f (20.19) 2 Se o campo magnético é expresso em A/m e a indução magnética em tesla (T) ou Wb/m , a densidade volumétrica de energia magnética wm, dada na equação (20.17), necessária para criar uma indução magnética B é dada no Sistema Internacional por: B W w m H dB 3 m 0 (20.20) Neste caso, a energia magnética total armazenada no material de volume V é: Wm w m V UNESP/Bauru – Naasson Pereira de Alcantara Jr. – Claudio Vara de Aquino (20.21) 192 ELETROMAGNETISMO II Vamos examinar agora graficamente a expressão para a densidade de energia ao longo de um ciclo de histerese: Se a curva é percorrida no sentido positivo (acréscimo na magnetização) como na figura 20.6, esta área é algebricamente positiva e representa a energia entregue pela fonte ao material. B (T) H (A/m) Figura 20.6: energia armazenada no material à medida que se aumenta a intensidade de campo magnético Pela figura 20.7, quando a curva é percorrida no sentido negativo (redução na magnetização) a área é algebricamente negativa e representa a parcela de energia devolvida pelo material à fonte externa. B (T) H (A/m) Figura 20.7: energia liberada pelo material magnético, à medida que a intensidade de campo magnético é reduzida A diferença entre as áreas é a energia que foi dissipada na inversão dos domínios magnéticos no material, em forma de calor. B (T) H (A/m) Figura 20.8 – energia magnética perdida no aumento e redução de H UNESP/Bauru – Naasson Pereira de Alcantara Jr. – Claudio Vara de Aquino 193 ELETROMAGNETISMO II Fazendo essa análise ao longo de todo o ciclo de histerese, obteremos a perda por histerese em um ciclo, que é a área do laço de histerese. B (T) H (A/m) Figura 20.9 –energia dissipada em um ciclo de histerese A energia dissipada W h em todo o material, ou seja, no volume V por ciclo é: (20.22) W h A V onde A é a área do ciclo de histerese, e V o volume do material. Pela equação (20.19) a potência devido ao fenômeno da histerese é então: (20.21) P h A V f (W ) Exemplo 20.1 Seja um núcleo laminado de transformador, com chapas de espessura = 1 mm, cuja liga de ferro possui a curva mostrada na figura 20.10. Se o volume de material empregado no circuito magnético 7 é V = 100 cm 3, a condutividade do material é = 10 S/m para uma freqüência elétrica f = 60 Hz, calcule as perdas totais no ferro. 2 B (Wb/m ) 1,5 0,98 H )A/m) - 35 35 100 - 0,98 Figura 20.10 - Ciclo de histerese do exemplo 18.1 Solução: a) cálculo das perdas por correntes parasitas ou de Foucault: A densidade volumétrica de potência dissipada pelas correntes parasitas é dada por UNESP/Bauru – Naasson Pereira de Alcantara Jr. – Claudio Vara de Aquino 194 ELETROMAGNETISMO II pf Da mesma forma, temos que a potência dissipada por unidade de volume por histerese é dada pela área do ciclo, no caso calculada de forma aproximada pelo paralelogramo: 2 Bmax 2 2 24 2 10 7.1,5 2.2 .60 . 10 3 pf 24 2 A 2 Bmax 2 Hc (W/m3) p f 1,33 105 W / m3 Logo, a potência dissipada pelas perdas em histerese é dada por E a potência dissipada por efeito Joule neste caso resulta Ph 2 Bmax 2 Hc V f Pf p f V 1,33 105.100 10 6 13,3 W Ph 2 .1,5 . 2 . 35 .100 .10 6 . 60 1,3 W Temos para o total das perdas no ferro b) - cálculo das perdas por histerese PFe Pf Ph 13,3 1,3 14,6 W 20.4 - Magnetoestrição A Magnetostrição (ou magnetoestrição) é um fenômeno que certos materiais magnéticos apresentam quando submetidos a tensões mecânicas (tração e compressão) modificando a arrumação de seus dipolos magnéticos, produzindo deformações em suas dimensões. É um fenômeno de efeito análogo ao piezelétrico no qual a pressão exercida provoca arrumação de dipolos elétricos, criando diferenças de potencial. A variação do comprimento do material, por unidade de comprimento, ao longo da direção do campo é representada no gráfico da figura 20.11 à esquerda, para o ferro, níquel e cobalto. Valores altos de H são necessários para produzir o mais alto efeito da magnetostrição. Alguns materiais, como o níquel e o cobalto, se contraem na direção do campo magnético aplicado, (magnetoestrição negativa) enquanto outros, como ligas permalloy, se alongam (magnetoestrição positiva) O níquel, por exemplo, possui magnetoestrição negativa pois quando na presença de um campo H da ordem de 50 A/m sofre uma redução da ordem de 0,002 % em seu comprimento. Dl x10 -6 l 2 0 N/mm 20000 40000 60000 H (A/m) 0.50 2 10 N/mm Fe -10 Co 2 20 N/mm 0.25 -20 -30 500 1000 1500 -40 Ni Figura 20.11 - Curva de magnetostrição para vários materiais ferromagnéticos O efeito magnetostritivo é também reversível. Uma excitação mecânica modifica as propriedades magnéticas do material enquanto que uma excitação magnética faz o material variar em suas dimensões. Conforme pode ser visto no gráfico da figura 20.11 à direita. Inversamente, quando submetido à compressão, o níquel melhora as suas propriedades ferromagnéticas. Em máquinas elétricas, o fenômeno da magnetostrição é percebido através de ruídos durante a operação das mesmas. Materiais magnetostritivos são utilizados na produção de ondas ultrassonicas (sonar), filtros elétricos e medidores de deformação (transdutores em instrumentação). UNESP/Bauru – Naasson Pereira de Alcantara Jr. – Claudio Vara de Aquino