Universidade Estadual de Maringá - Departamento de Matemática Cálculo Diferencial e Integral: um KIT de Sobrevivência c Publicação Eletrônica do KIT http://www.dma.uem.br/kit Ponto Fixo e forças da natureza na superfı́cie da Terra Emerson Barilli & Emerson Dionisio Belançon Sumário 1 Introdução 1 2 TVI - um teorema importante 2 3 Mesma velocidade, temperatura e pressão 3 1 Introdução Os fenômenos da natureza causam danos e parecem não ter explicação. Por isso muitos paı́ses investem quantias vultosas em previsão numérica do tempo. Utilizam-se satélites para coletar dados e informações que serão importantes nos modelos numéricos de previsão do tempo. Em muitos casos não podemos prever exatamente a magnitude do fenômeno, mas à medida em que ele se define vamos melhorando as previsões. Nessas notas vamos apresentar uma aplicação da teoria dos pontos fixos para obter alguma informação sobre a Terra. Vamos mostrar que existem pontos diametralmente opostos da Terra que possuem a mesma temperatura. Antes disso, vamos rever alguns resultados da Matemática. c KIT 2 Cálculo Diferencial e Integral: um KIT de Sobrevivência 2 TVI - um teorema importante Definição 1 (Continuidade em um ponto) Seja função f : (a, b) → R. Dizemos que f é contı́nua em um ponto x0 ∈ (a, b), se uma das condições abaixo forem satisfeitas: i)limx→x0 f (x) = f (x0 ); ii) ∀ > 0, ∃ δ > 0 tal que x ∈ (a, b) | x − x0 |< δ tem-se | f (x) − f (x0 ) | < ; iii) Se para toda sequência xn ∈ (a, b), com xn → x0 temos f (xn ) → f (x0 ); Seja f : I ⊂ R → R, dizemos que f é contı́nua no intervalo I ⊂ R, se for contı́nua em todos os pontos deste intervalo. Um dos resultados mais importantes sobre as funções contı́nuas é o seguinte teorema. Teorema 1 (Teorema do valor intermediário) Seja f : [a, b] → R contı́nua. Se f (a)f (b) < 0, então, existe c ∈ (a, b) tal que f (c) = 0. A demonstração desse resultado pode ser encontrada por exemplo em [1] ou [2]. 2 Seja f : X → X uma aplicação e x0 ∈ X. Dizemos que x0 é ponto fixo de f se f (x0 ) = x0 . Geometricamente, o gráfico da aplicação f sempre interceptará a reta y = x. Teorema 2 Toda aplicação contı́nua f : [a, b] → [a, b] tem pelo menos um ponto fixo. Demonstração: Defina a seguinte aplicação g : [a, b] → R dada por g(x) = f (x) − x. Assim g mede a distância orientada entre x e sua imagem f (x). Da definição de ponto fixo, x será um ponto fixo de f se g(x) = 0. Se um dos extremos do intervalo é ponto fixo nada temos a provar. Então suponhamos que nenhum dos extremos seja ponto fixo. Como f (a) e f (b) estão no intervalo [a, b] segue que a < f (a) e f (b) < b, pois supomos que nem a e nem b são pontos fixos de f . Portanto g(a) > 0 e g(b) < 0. Como g é contı́nua, segue do teorema do valor intermediário que, existe x0 ∈ [a, b] tal que g(x0 ) = 0, assim g(x0 ) = f (x0 ) − x0 = 0, o que implica que f (x0 ) = x0 . Portanto x0 é um ponto fixo de f . 2 Teorema 3 Seja f : C → R aplicação contı́nua de um cı́rculo na reta. Então, f tem um par de pontos diametralmente opostos com mesma imagem. c KIT Cálculo Diferencial e Integral: um KIT de Sobrevivência 3 Demonstração: Seja f : C → R uma aplicação contı́nua do cı́rculo C na reta R. Considere x e x0 pontos diametralmente opostos sobre C e defina g : C → R por g(x) = f (x) − f (x0 ). Como f é contı́nua, então g também é contı́nua, assim, tomando x = x0 temos g(x0 ) = f (x0 ) − f (x) = −(f (x) − f (x0 )) = −g(x). Segue que g têm sinais opostos em x e x0 ou g(x0 ) = −g(x) = 0. Se g(x) = 0 então f (x) = f (x0 ) e o teorema está demonstrado. Se g(x) 6= 0, como g é contı́nua segue do teorema do valor intermediário que, existe um ponto x0 ∈ C tal que g(x0 ) = 0, isto é, g(x0 ) = f (x0 ) − f (x00 ) = 0 então f (x0 ) = f (x00 ). Portanto em pontos diametralmente opostos em um cı́rculo as imagem são iguais. 2 De modo inteiramente análogo, podemos demonstrar o resultado ainda é válido quando a função está definida sobre uma esfera. 3 Mesma velocidade, temperatura e pressão Teorema 4 Toda aplicação contı́nua de uma esfera (do R3 ) na reta tem um par de pontos diametralmente opostos com mesma imagem. Demonstração: Seja f : E → R uma aplicação contı́nua definida sobre a esfera E. Considere (x, y, z) e (x, , y , , z , ) as coordenadas dos pontos diametralmente opostos em E, com isso, defina g : E → R dada por g(x, y, z) = f (x, y, z) − f (x0 , y 0 , z 0 ). Como f é contı́nua, então g também é contı́nua, além disso, tomando (x, y, z) = (x0 , y 0 , z 0 ) temos g(x0 , y 0 , z 0 ) = f (x0 , y 0 , z 0 )−f (x, y, z) = −(f (x, y, z)−f (x0 , y 0 , z 0 )) = −g(x, y, z). Assim, segue que g têm sinais opostos em (x, y, z) e (x0 , y 0 , z 0 ), ou ainda, g(x0 , y 0 , z 0 ) = −g(x, y, z) = 0. Se g(x, y, z) = 0 então g(x, y, z) = f (x, y, z) − f (x0 , y 0 , z 0 ) = 0 o que implica f (x, y, z) = f (x0 , y 0 , z 0 ) e o teorema está demonstrado. Se g(x, y, z) 6= 0, como g é contı́nua segue do teorema do valor intermediário que, existe um ponto de coordenadas (x0 , y0 , z0 ) ∈ E tal que g(x0 , y0 , z0 ) = 0, isto é, g(x0 , y0 , z0 ) = f (x0 , y0 , z0 ) − f (x00 , y00 , z00 ) = 0 então f (x0 , y0 , z0 ) = f (x00 , y00 , z00 ). Portanto, em pontos diametralmente opostos em uma esfera as imagens serão iguais. 2 c KIT Cálculo Diferencial e Integral: um KIT de Sobrevivência 4 Uma conclusão curiosa é que se considerarmos a superfı́cie da Terra como sendo uma esfera e a função contı́nua g como sendo a velocidade do vento nos pontos (x, y, z) de sua superfı́cie, podemos concluir que existe, em cada instante, um par de pontos diametralmente opostos com mesma velocidade. O mesmo vale para temperatura e pressão, consideradas como funções contı́nuas. Agradecimentos: Agradecemos ao prof. Doherty Andrade pelas sugestões e correções ao texto. Referências [1] Figueiredo, Djairo G., Análise I, editora L.T.C., Rio de Janeiro, 1974. [2] D. Andrade. Notas de Aula de Análise Real, UEM, 2002.