NOTA TÉCNICA IMPACTO DA POLÍTICA MONETÁRIA SOBRE A TRAJETÓRIA DA DÍVIDA BRUTA DO GOVERNO GERAL VILMA PINTO AGOSTO DE 2015 0 Economia Aplicada Ano 2015 | Introdução A política monetária ganhou maior flexibilidade após a adoção do regime de metas de inflação. A fixação da meta da taxa básica de juro (SELIC) é utilizada como instrumento básico, ou até único, para combate inflacionário. O cenário macroeconômico brasileiro levou o banco central a elevar seguidamente a taxa SELIC com finalidade de conter a inflação e atrair capitais externos, mas com efeitos colaterais inevitáveis sobre as contas públicas. O objetivo desta nota técnica é comentar brevemente efeitos principais sobre a política fiscal, sob a perspectiva de avaliação dos impactos sobre a trajetória crescente do gasto com juros nominais e, por conseguinte, da dívida bruta do governo geral. Modelo analítico simplificado para estimação da Dívida bruta do Governo Geral A relação existente entre a dívida e o PIB é um dos parâmetros para avaliar a solvência do governo. Tradicionalmente no Brasil a medida antes utilizada para tal avaliação era a da dívida líquida do setor público (DLSP), porém a mesma tem sofrido efeitos da desvalorização cambial (fora o enorme peso dos empréstimos aos bancos oficiais), levando a uma aparente redução deste indicador mais por conta do elevado estoque de ativos em dólar que propriamente por outros fatores (sem contar que é rara a redução do volume de reservas do Brasil). A contabilidade criativa dos últimos anos disparou uma mudança de hábito dos analistas que passaram cada vez mais a atentar para a dívida bruta do governo geral (DBGG), ao invés da DLSP, o que, por sua vez, também permite um melhor dimensionamento do volume de endividamento do setor. Para avaliar o impacto das mudanças recentes na SELIC e na conjuntura macro e fiscal, é usado um modelo analítico simplificado para estimação da dívida bruta análogo ao modelo de sustentabilidade da dívida já proposto pelo Tesouro Nacional1. Em resumo, a especificação analítica é explicitada pela equação 1 da seguinte forma: ( ( 1 Ver (Costa; 2009) em: http://goo.gl/wnFPH9. ) ) Onde: é a dívida bruta no instante de tempo t; tempo t-1; é a taxa real de juro; é a dívida bruta no instante de é a taxa real de crescimento da economia; e éo resultado primário. Com base neste modelo analítico simplificado é possível traçar cenários de trajetória de dívida bruta, dado algumas premissas de juro, PIB e Primário. Trajetória da Dívida Bruta Conforme definição do banco central, a SELIC é a taxa de juros Over-Selic é “fixada pelas autoridades monetárias e tem o papel de sinalizar para os agentes econômicos o nível básico de remuneração dos títulos federais. Seu nível efetivo é definido pela média ponderada do volume diário das operações lastreadas em títulos públicos federais de curto, médio e longo prazo no tempo presente. Tais títulos são emitidos pelo Tesouro ou pelo Banco Central, negociados e registrados pelo Serviço Especial de liquidação e Custódia, Selic, na forma de operações compromissadas. Notadamente a taxa de juros Over-Selic tem a função de orientar as demais taxas de juros de curto prazo da economia, agindo como um limite mínimo.”2 A taxa Selic e o IPCA possuem elevada participação na DBGG, respondendo por cerca de 60% do total da Dívida. Conforme evidenciado pelo Gráfico 1, no póscrise houve uma elevação da participação do indexador IPCA e uma redução da participação da SELIC sendo compensada por uma maior participação do indexador pré-fixado. 2 Ver: https://goo.gl/1iZfRc. Gráfico 1 – DBGG, Participação % por indexador. Demais Indexadores Índices de preços IPCA Selic Pré-fixado 60 50 40 30 20 10 abr/15 dez/14 ago/14 abr/14 dez/13 ago/13 abr/13 dez/12 abr/12 ago/12 dez/11 ago/11 abr/11 dez/10 ago/10 abr/10 dez/09 abr/09 ago/09 dez/08 ago/08 abr/08 dez/07 ago/07 abr/07 dez/06 0 Fonte: BCB. Elaboração Própria. Aqui se optou por traçar dois cenários de trajetória de dívida bruta: um supondo que as autoridades monetárias irão perseguir um cenário de convergência da inflação para a meta já em 2016, conforme já objetivado pelo Banco Central; e outro cenário em que o banco central mudaria seu plano de voo para mirar a inflação no centro da meta somente em 2017. Ocorre que ao seguir uma política de ajuste da taxa básica de juro, objetivando uma inflação na meta somente em 2017, o banco central pode fazer isso em dois cenários distintos: um em que a autoridade monetária possui credibilidade, ou seja, onde os agentes econômicos confiam que o objetivo não será alterado novamente (credibilidade perfeita); e outro cenário em que o banco central não possui credibilidade, ou seja, existe certa desconfiança por parte dos agentes se a meta será mantida ou não (desancoragem). Estes processos distintos nos levam aqui a adotar três cenários possíveis para trajetória da SELIC, e consequente, também três cenários para Inflação – vide Tabela 1. Tabela 1 – Cenários para Trajetória da SELIC e Inflação. SELIC IPCA na meta em 2016 Credibilidade Perfeita Desancoragem 2015 2016 2017 2018 15,3 13,5 15,3 13,3 11,8 13,8 11,0 11,0 11,9 11,0 11,0 11,9 IPCA IPCA na meta em 2016 Credibilidade Perfeita Desancoragem Fonte: IBRE. Elaboração própria. 9,2 9,2 9,2 4,5 5,3 5,6 4,5 4,5 4,5 4,5 4,5 4,5 Assumindo tudo mais constante e variando apenas os efeitos da SELIC e da Inflação no tempo, o cenário considera uma contração da economia de -2,2% em 2015, -0,1% em 2016, e um crescimento de 1,0% em 2017 e 1,5% em 2018. Já o esperado para o resultado primário corresponde a nova meta proposta pelo governo3, sendo elas: 0,15% do PIB em 2015, 0,7% em 2016, 1,3% em 2017 e 2,0% em 2018. Aplicando as premissas macroeconômicas na equação [1], é possível chegar a 3 cenários distintos; conforme evidenciado pelo gráfico 2. A trajetória da dívida é crescente no longo prazo, muito pelo aumento da taxa de juros na largada e a combinação de baixo crescimento econômico e primário abaixo do necessário para manter a dívida estável. Porém é possível verificar que em um cenário de credibilidade perfeita, a trajetória da DBGG é expressivamente menor que nos demais cenários. Gráfico 2 – Possíveis trajetórias para a DBGG. 75,0% 72,3% 71,6% 70,0% 68,9% 65,0% 60,0% 55,0% 50,0% 2012 2013 2014 4,50% de IPCA em 2016 4,50% de IPCA em 2017 com credibilidade 3 Ver: http://goo.gl/8bqVWN. 2015E 2016E 2017E 2018E 4,50% de IPCA em 2017 sem credibilidade Fonte: BCB, STN e IBRE. Elaboração Própria. Esse deslocamento dado apenas por mudanças de premissas de SELIC e Inflação evidencia o peso que a alta da Selic traz para o comportamento da DBGG no longo prazo, pois embora se mantenha a trajetória de crescimento, o nível da dívida é sensivelmente menor que nos outros cenários em que o a alta do juro é expressivamente maior. Conclusões Os resultados apresentados evidenciam que, como eram esperados, os impactos da alta da SELIC vem contribuindo para manter a dívida bruta em trajetória crescente. A grande questão é qual dos três cenários gera um efeito menos custoso para o banco central face à possibilidade de atuação da política monetária. Observase que o cenário em que o banco central muda seu plano de voo e eleva a SELIC até o ponto de seu modelo de inflação convergir para a meta de 4,5% em 2017, isso sendo feito com credibilidade perfeita, gera um impacto menor na DBGG. Ocorre que este cenário não é crível diante da atual conjuntura, logo o modelo em que o banco central mantém a credibilidade e ancora suas expectativas, buscando uma inflação no centro da meta no final de 2016 passa a ser a menos custosa para a política fiscal. Referências bibliográficas Banco Central do Brasil (BCB). Diretoria de Política Econômica (DEPEC). Manual de Estatísticas Fiscais. Abril de 2012. Disponível em: https://goo.gl/KDFbdI. Ministério da Fazenda (MF). Nota técnica do tesouro: Estimativa da Trajetória da Dívida Bruta do Governo Geral do Brasil. 29 de julho de 2015. Disponível em: http://goo.gl/SFZSwz. Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão (MP). Apresentação sobre o Relatório Bimestral de Despesas e Receitas Primárias do 3° Bimestre de 2015. Nelson Barbosa, julho de 2015. Disponível em: http://goo.gl/m9Sltz. Dívida Pública: a experiência brasileira / Anderson Caputo Silva, Lena Oliveira de Carvalho, Otavio Ladeira de Medeiros (organizadores). – Brasília: Secretaria do Tesouro Nacional: Banco Mundial, 2009. 502 p. Disponível em: http://goo.gl/wnFPH9. COSTA, Carlos E. E.L. Sustentabilidade da dívida pública. Parte 1, capítulo 3. – Brasília: Secretaria do Tesouro Nacional: Banco Mundial, 2009. Disponível em: http://goo.gl/m9Sltz. Rio de Janeiro www.fgv.br/ibre Rua Barão de Itambi, 60 22231-000 - Rio de Janeiro – RJ São Paulo 2 Economia Aplicada Ano 2015 | Av. Paulista, 548 - 6º andar 01310-000 - São Paulo – SP