As elites econômicas ainda são a mesmas? Sobre como a história pode nos ajudar a entender a postura do empresariado diante do impeachment de 2016 Quem são elites econômicas e como elas atuam no campo político u As elites econômicas são heterogêneas (empresariado industrial; financeiro; agrícola; médio e pequeno empresário...) u Aqui vamos tratar, sobretudo, do grande empresariado industrial, que faz parte de uma elite muito poderosa em termos econômicos e, consequentemente, político. Como podemos ver na tabela elaborada pela economista Célia Lessa Kerstenetzky u (http://www.proac.uff.br/cede/sites/default/files/TD106.pdf): Taxa de crescimento 2012/2002 (%) Participação na renda em 2012 (%) Participação da renda em 2002 (%) 1% mais ricos -6,0 12,6 13,4 10% mais ricos -4,9 44,7 47 Objetivos u Analisar a postura política deste ator ao longo do governo de Dilma Roussef e, principalmente durante o embate em torno do impeachment. u Demonstrar que a postura do empresariado neste momento está marcada pelo mesmo pragmatismo conservador que caracterizou a sua atuação política durante toda a República. O apoio do empresariado aos governos petistas u A partir da eleição de 2002, o PT monta uma coalizão de centro-esquerda capaz de aglutinar setores do empresariado: u A presença de José Alencar, grande industrial do setor têxtil, na posição de vice-presidente na chapa petista e a Carta aos Brasileiros foram os primeiros passos para conformar esta coalizão. u Após a vitória, as nomeações de Roberto Rodrigues para o Ministério da Agricultura, de Henrique Meirelles para o BC e de Antônio Palocci para a Fazenda confirmaram a estratégia de conquista do apoio empresarial ao projeto petista. u A aliança com o agronegócio e com as empreiteiras. O apoio inicial do empresariado à virada desenvolvimentista de Dilma u Com o forte crescimento econômico alcançado pelo país em 2010 (7,5%), a coalizão de interesses liderada pelo PT parecia assumir de vez um caráter desenvolvimentista. u Fiesp, CUT e Força Sindical unem-se pela queda da taxa de juros e atacam a política monetária do BC de Meirelles. A entrega do documento Brasil do diálogo, da produção e do emprego à presidente Dilma Rousseff, no início de 2011. Abaixo algumas reportagens sobre o assunto: u http://economia.estadao.com.br/noticias/negocios,fiesp-cut-e-forca-contra-osjuros,88748e u http://www1.folha.uol.com.br/fsp/poder/po1910201119.htm u http://www.jb.com.br/marcus-ianoni/noticias/2016/01/19/coalizoes-e-politicamacroeconomica/ Dilma e o ensaio desenvolvimentista u O Plano Brasil Maior apresentado pelo governo de Dilma em agosto de 2011 funcionou como uma resposta ao documento entregue pelo empresariado paulista e pelas centrais sindicais. u Dilma atendeu muitas das propostas feitas pela coalizão produtivista que se formava: a) redução da taxa de juros para nível internacional, b) diminuição dos spreads bancários, c) facilitação do crédito para o investimento, d) aumento do IOF sobre a entrada de capital estrangeiro, e) desonerações tributárias, f) adoção do conteúdo nacional como diretriz da política industrial, g) preferência para produtos nacionais nas compras governamentais. O afastamento do empresariado do governo Dilma u u u u u Afastamento progressivo em relação ao governo. Conformou-se um consenso de que o governo era excessivamente intervencionista e que isto estava afetando os investimentos. Lançamento pelos industriais do documento: 101 propostas para modernização trabalhista, no final de 2012. Isso levou a uma ruptura do pacto que começara a ser costurado entre os industriais e as centrais sindicais em 2011. Nos protestos de 2013, os industriais passam a assumir, de forma mais clara, uma postura de oposição ao governo federal. Os industriais, os empresários do agronegócio, dos serviços e do comércio se juntaram aos rentistas na exigência de cortes nos gastos públicos e na flexibilização da CLT. Nas eleições de 2014 e durante o ano de 2015, esse afastamento se concretiza. O empresariado no “jogo” do impeachment Não obstante o seu afastamento do governo, grande parte do empresariado mantém uma postura cautelosa em relação ao impeachment. Passando a apoiá-lo abertamente apenas no final de 2015. Agosto de 2015 u http://oglobo.globo.com/opiniao/manipulacao-do-congresso-ultrapassa-limites-17109534 u http://www1.folha.uol.com.br/mercado/2015/08/1672332-nao-ha-motivos-para-tirar-dilmado-cargo-diz-presidente-do-itau-unibanco.shtml Dezembro de 2015 u http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,fiesp-declara-apoio-formal-ao-impeachmentde-dilma,10000004821 u http://politica.estadao.com.br/noticias/geral,governo-e-oposicao-procuram-setorprodutivo--que-pede-decisao-rapida-,10000004038 u http://brasil.elpais.com/brasil/2016/03/30/politica/1459289168_509972.html O pragmatismo conservador na trajetória do empresariado brasileiro u A Formação do empresariado industrial brasileiro (1870-1930) u As primeiras iniciativas de ação coletiva e o enfrentamento pragmático do agrarismo. Os industriais não enfrentaram abertamente os interesses agrários. u A formação de uma coalizão prioritária junto à elite burocrática do Estado u Embora relutantes no apoio ao Golpe de 1930, os industriais passaram a ocupar cargos em Ministérios e conselhos de política criados por Vargas. u O corporativismo de Estado. Os industriais resistiram ao corporativismo no começo, mas aderiram a ele como forma de controle dos movimentos de massa. Por isso apoiaram a instauração do Estado Novo. u No Estado Novo, embora apoiassem as medidas industrializantes, se opuseram à estatização da economia e ao crescente intervencionismo. Empresários na República Populista u Engajamento e ruptura com a coalizão nacional desenvolvimentista u Ao longo dos anos de 1950, o empresariado nacional integra a coalizão de interesses que impulsiona o crescimento econômico e a industrialização do país. Esta coalizão reunia as forças políticas de centro-esquerda, os sindicalistas, os militares nacionalistas, um expressivo segmento do empresariado industrial e setores da intelectualidade brasileira. u Nesse período, a burguesia nacional passou a compor, junto com a alta burocracia estatal e o capital estrangeiro, o tripé que financiaria e implementaria a industrialização. A economia então crescia a uma média de 7% ao ano. u Na virada da década de 1950 para a de 1960, o recrudescimento da Guerra Fria, com a revolução em Cuba, a expansão dos movimentos sindicais e pela reforma agrária e a grande crise econômica vivida pelo país esgarçaram a coalizão política nacional desenvolvimentista. u Neste contexto, a burguesia nacional, inclusive os industriais, uniu-se aos interesses do capital estrangeiro e de setores das Forças Armadas para dar um golpe de Estado. O Empresariado e a Ditadura Civil-Militar u O empresariado nacional integrou a coalizão política dominante ao longo da ditadura civil-militar e, em termos econômicos, se diversificou de modo significativo entre 1964 e 1985. u Participando de forma ativa de instâncias decisórias nos primeiros anos do regime, o empresariado nacional, em grande medida, apoiou a repressão a setores democráticos e de esquerda que se colocaram contra o Golpe. u Na virada da década de 1960 para a de 1970 e, principalmente, durante o governo Geisel (1974-1979), o empresariado passa a questionar a estatização da economia e sua exclusão das instâncias decisórias. u Rompe de forma paulatina e pragmática com a ditadura, integrando a coalizão política que conduziu o processo de redemocratização. O empresariado na Nova República: a adesão ao ideário neoliberal, “pero no mucho” u Em um primeiro momento, não há um consenso no seio do empresariado nacional, sobretudo entre os industriais, em relação ao esgotamento da estratégia desenvolvimentista que possibilitou a industrialização do país. Grande parte dele apoia o Plano Cruzado. u O fracasso do plano fortalece entre os empresários a visão de que é necessário a adesão do país a uma estratégia liberal conservadora de desenvolvimento, o chamado neoliberalismo. u Esta postura ganhará contornos mais claros no posicionamento das associações empresariais durante a Assembleia Constituinte e, em seguida, no período de reforma constitucional. Nestes momentos, os empresários combateram o avanço dos direitos sociais e expansão do “intervencionismo” estatal na economia. O empresariado na Nova República: a adesão ao ideário neoliberal, “pero no mucho” u Nos anos de 1990, os industriais são deslocados pelo setor financeiro da posição de ator privilegiado no diálogo com o alto escalão da burocracia. u Neste período, os industrias assumem uma postura ambígua em relação a liberalização da economia. u Embora tenham apoiado claramente o processo de privatização de empresas e de serviços públicos, foram críticos da acelerada abertura da economia e da política monetária do governo. u Demonstraram também enorme preocupação com a ausência de uma política industrial e foi por conta desses fatores que se afastaram, paulatinamente, do governo de FHC. u É no bojo deste afastamento que Lula e o PT atraem setores do empresariado, sobretudo os industriais, para o seu projeto político. Conclusão u O grande empresariado brasileiro, historicamente, não assumiu posturas ideológicas duradouras, o que dificultou a sua adesão a projetos de desenvolvimento de longo prazo. u Ao contrário do empresariado estadunidense, por exemplo, o brasileiro nem mesmo endossou posturas liberais stricto sensu. Sendo assim, sempre esteve disposto a apoiar medidas e regimes antidemocráticos com vistas a garantir seus privilégios. Conclusão u Mais precisamente, não obstante as inúmeras clivagens existentes entre as distintas frações do empresariado brasileiro, estas nunca hesitaram em se unir contra o fortalecimento do poder regulatório do Estado e a ascensão política de setores da classe operária ou mesmo de qualquer outro movimento popular que pudesse atenuar sua hegemonia. u Portanto, o empresariado brasileiro agiu e continua agindo de forma pragmática e conservadora, fato este que tem dificultado entre nós até mesmo a conformação de um pacto interclasses mais duradouro que permita, minimamente, a erradicação da miséria e da pobreza e a promoção de condições de vida mais dignas às classes trabalhadoras. Referências u ARAUJO, Maria P. N. A ditadura militar em tempo de transição (1974-1985). In: Francisco Carlos Palomanes Martinho. (Org.). Democracia e Ditadura no Brasil. Rio de Janeiro: Editora da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (eduerj), 2006, p. 153-164. u BIANCHI, Álvaro. 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