A IDENTIDADE DA ESCRITA NO PROCESSO DE INTERAÇÃO A

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A IDENTIDADE DA ESCRITA NO PROCESSO DE INTERAÇÃO A DISTÃNCIA
UMA PRÁTICA SOCIAL DA CULTURA DIGITAL
Cristina Normandia (Mestranda)
Estrella Bohadana (Orientadora)
Tecnologia da Informação e Comunicação nos Processos Educacionais
Introdução
A expressão lingüística sempre foi de interesse dos homens, que já em séculos anteriores
discutiam a importância da persuasão e do teor artístico que as Retóricas1 deveriam possuir. A
Retórica como técnica de argumentação tinha por objetivo convencer, expor uma sabedoria e
encantar com o discurso, sendo considerada uma das primeiras manifestações culturais que se
realizava plenamente na oralidade e era considerada a arte de falar bem, ou “Arte da
Oratória”. Desde as origens, a composição oral e escrita, de acordo com o modelo retórico,
era um processo que deveria conter invenção, elocução e memória, tornando-se na Idade
Média e na Renascença referência da programação educacional, era requisito indispensável.
Essa referência a Retórica possibilita a percepção de que a escrita sempre foi definida como
paradigma de um bom domínio técnico dos elementos formais da linguagem, por isso as
gramáticas normativas e históricas propõem que o bom domínio da escrita tem como
referência o “bem falar e o bem escrever” dos oradores e escritores literários.
Observa-se que a organização da escrita nunca excluiu de seu uso o padrão da técnica
utilizada por pessoas que possuíam cultura e eram consideradas padrões culturais, até hoje o
domínio da escrita está associado à evolução da linguagem e do pensamento humano.
Esta sucinta reflexão da evolução da escrita que acompanhou a evolução da linguagem e do
pensamento humano, de acordo com a Filosofia e a História faz-nos entender a dimensão da
escrita no universo da cultura do papel, que está associada ao domínio de técnica de expressão
e que possibilitou com os livros e até mesmo a invenção da Imprensa a construção da
memória da sociedade.
Mas a língua é produto social e cultural, usada dialogicamente; que passa pelas
transformações que venha ocorrer na sociedade, nos sujeitos que dela fazem uso e que são
1
Enciclopédia Barsa. Volume 12, p. 42.
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considerados os mentores das mudanças. Isso amplia o conceito de cultura, de língua, homem
e sociedade. Foram tantas as evoluções culturais decorridas durante os últimos séculos que
ocasionaram alterações na condição humana. Neste sentido, podemos referir-nos a revolução
da técnica e da tecnologia. Segundo Pierre Levy (2007,p.22) “As tecnologias são produtoras
de uma sociedade e uma cultura”. Por exemplo, a Revolução Industrial que nos trouxe as
máquinas a vapor e de tear, foi uma grande transformação nas técnicas de mão-de-obra no
séc. XIX.
Em pleno séc. XXI, vivenciamos uma evolução das técnicas da comunicação, influenciadas
pela circulação de capital e pela necessidade de rapidez na informação, estamos na era da
Globalização. Nessa nova cultura, a interação de países e pessoas é fundamental para a
integração econômica, social, política e cultural, gerando a Cultura da Internet. A Internet
(Canclini, 2008) é um sistema socialmente produzido, que conquistou indivíduos do mundo
inteiro, possibilitando a troca de interesses diversos, entre eles a criação de laços sociais, em
sites de relacionamento, como é o caso do Orkut.
A comunicação nas redes sociais ocorre por meio de mensagens, os “scraps”, que em
português significa “recado”. Em virtude disso, a escrita é o meio pelo qual se estabelece a
interação a distancia. Caracteriza-se pela liberdade de expressão, pela fragmentação dos
signos lingüísticos, pela associação com a linguagem não verbal e principalmente por destoar
do padrão culto da língua. Atende ao objetivo da Internet: comunicação rápida, livre e
expressiva. Esta escrita interativa reflete uma subjetividade e descompromisso com padrões
elitizados de comportamento. Totalmente distanciada dos anseios da Retórica, da literatura e
do processo educacional, em que se prioriza a escrita culta.
A Internet reflete um espaço real, mas virtual, que possibilita a diversidade de comunicação
de acordo com os interesses vigentes e desejados, destaca-se entre estes o padrão de consumo,
o perfil da cultura digital.
O que temos, nas redes sociais, é uma linguagem que contraria a dualidade lingüística
(escrita e fala) proposta pelos os estruturalistas e aproxima-se de uma atividade social da
língua que Bakhtin (2000) definiu de “Fenômeno Social de Interação verbal.”
Essa intensa liberdade expressiva corresponde ao que Marcuschi diz (2003) sobre as
escolhas que os sujeitos fazem de acordo com suas atividades sócio-culturais, no caso dos
“scraps” houve uma transmutação dos antigos recados dos suportes de papel.
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A escrita interativa das redes sociais corresponde a uma informalidade e por isso é associada
à Oralidade, uma prática social da linguagem falada. Porém, apesar da semelhança de
informalidade, a escrita interativa das redes sociais não possui os mesmos recursos da
oralidade, como a observação as reações do interlocutor, a ênfase de termos, duração dos sons
etc. Este fenômeno de interação verbal (Bakhtin) pode ser definido com uma prática social de
leitura e escrita, o Letramento. Marcuschi adverte (2003): “Letrado é o indivíduo que
participa de forma significativa de eventos de letramentos e não apenas aquele que fez um uso
formal da escrita.”
A escrita presente nas redes sociais, como Orkut, são inaceitáveis ao uso padronizado e ao
processo educacional. A escola propõe o estudo da língua com rigor metodológico fazendo
oposição às variações lingüísticas. Marcuschi Observa (2003): “Minha posição é a de que fala
e escrita, se torna bimodal. Fluente em dois modos de uso e não simplesmente em dois
dialetos.”
A língua faz parte das transformações culturais, no caso da cultura da Internet estas
mudanças são apelos de consumo que influenciam os padrões de sociabilidade e comunicação
do indivíduo.
Então, questionamos, a escrita das redes sócias estaria “transgredindo a
linguagem”, comprometendo a cultura e o processo educacional, ou é uma linguagem que
possibilita a interação a distancia, sendo uma prática social.
Objetivo
A pesquisa tem como objetivo estudar a Identidade da Escrita no Processo de Interação a
distancia, sendo considerada uma prática social da Cultura Digital. Propõem-se estas
questões:
1) O que diferencia a língua escrita dos scraps para a modalidade escrita da cultura do papel?
2) Qual a relação da cultura da internet com a estrutura textual dos scraps do Orkut?
3) A escrita digital nos scraps são uma subversão da variante padrão, ou um novo letramento
que está sendo internalizado?
Fundamentação Teórica
Para atingirmos as perspectivas teóricas desta pesquisa, tomaremos por base as postulações
da teoria de Bakhtin que propõe uma construção dialógica da linguagem e as concepções de
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Letramento. Bakhtin vai apresentar uma crítica radical ao objetivismo abstrato de Saussure,
indagando o verdadeiro núcleo da realidade lingüística:
“A verdadeira substância da língua não é constituída por um sistema abstrato de formas
lingüísticas nem pela enunciação monológica isolada, nem pelo ato psicofisiológico da sua
produção, mas pelo fenômeno social da interação verbal, realizada através da enunciação ou
das enunciações. A interação verbal constitui assim a realidade fundamental da língua.
(Bakhtin, 1981, p.123)”
Aproveitamos e fazermos também uma referência ao Letramento, citando Kleiman (1995,
p.22):
“As práticas de letramento, no plural, são social e culturalmente determinadas e, como tal, os
significados específicos que a escrita assume para um grupo social dependem de contextos e
instituições em que ela foi adquirida. Não pressupõe, esse modelo, uma relação causal entre
letramento e progresso ou civilização, ou modernidade, pois, ao invés de conceber um grande
divisor entre grupos orais e letrados, ele pressupõe a existência e investiga as características,
de grandes áreas de interface entre práticas orais e letradas”.
Metodologia
Como o foco é a Identidade da Escrita no Processo de Interação a distancia, haverá todo
cuidado na seleção dos scraps do Orkut. Inicialmente será estabelecido um grupo de vinte
alunos do7º ano do ensino fundamental, voluntários com idades entre 11 e 13 anos de uma
escola pública federal do Estado do Rio de Janeiro no ano 2011. Levantando dados a partir da
análise de recados (scraps), em textos escritos, no ambiente indicado para postagem de
mensagens da qual esses adolescentes participam. Estas práticas escritas se realizam em um
contexto informal de interação da Internet que disponibiliza vários recursos que se aproximam
de uma nova prática.
Referência Bibliográfica
BAHKTIN, Mikhail. Os gêneros do discurso. In BAHKTIN, M., Estética da criação verbal.
São Paulo: Martins Fontes.
GARCIA Canclini, Néstor. Consumidores e cidadãos. 7º edição, 2008.
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KLEIMAN, A. Modelos de Letramento e as Práticas de Alfabetização na escola. Campinas:
Mercado de Letras, 1995.
LÉVY, Pierre. Cibercultura. Coleção TRANS. Editora 34.
MARCUSCHI, L . Da fala para a escrita: atividades de retextualização. Editora Cortez, 2003.
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