7.2) Tratamento farmacológico 7.2.1)Visão Geral. O tratamento medicamentoso da hipertensão arterial sistêmica (HAS) objetiva reduzir os níveis pressóricos para valores inferiores a 140/90 (A). Para os pacientes com alto risco cardiovascular (ex: diabéticos, renais cônicos, portadores de doença aterosclerótica e AVC pregresso) sugere-se uma redução inferior a 130/80 (A)26. O benefício cardiovascular deve-se mais à diminuição dos níveis da pressão arterial do que ao uso específico de qualquer classe de anti-hipertensivo (B)28. 7.2.2) O uso de agentes anti-hipertensivos De maneira genérica, a escolha do agente anti-hipertensivo deve, sempre que possível, respeitar as seguintes características26: • Ser eficaz por via oral e bem tolerado • Permitir a administração em menor número possível de tomadas, com preferência para dose única diária. • Ser iniciado com as menores doses efetivas preconizadas para cada situação clínica, podendo ser aumentadas gradativamente, pois quanto maior a dose, maiores serão as probabilidades de efeitos adversos. • Ser considerado em associação para os pacientes com hipertensão em estágio 2 , que na maioria das vezes, não respondem à monoterapia. • Ser utilizado por um período mínimo de 4 semanas, salvo em situações especiais, para aumento de dose, substituição da monoterapia ou mudança das associações em uso. As classes de agentes anti-hipertensivos, associações e interações medicamentosas encontram-se no anexo 3 dessa linha-guia. Em relação às classes específicas de fármacos pode-se afirmar que: 1) Baixas doses de diurético tiazídico é a terapia mais custo-efetiva (A)24. 2) Inibidores da enzima de conversão da angiotensina II (IECA), antagonistas dos receptores da angiotensina II (ARA II), bloqueadores dos canais de cálcio (BCC) e betabloqueadores (BB) parecem reduzir a mortalidade e a morbidade em pacientes hipertensos com diabetes (2)13. 3) Os seguintes anti-hipertensivos: IECA, ARA II, BCC, BB parecem ter similar efeitos a curto e médio prazo em relação aos eventos cardiovasculares maiores (2)8. As tabelas a seguir objetivam sintetizar a escolha da intervenção a ser seguida, por grau de hipertensão e por condição de comorbidade. Tabela 15 – Intervenção segundo os níveis pressóricos e a presença ou ausência de complicações. Adaptado do VII Joint30 Modificações no estilo de vida Classificação da PA PA HAS Sistólica diastólica Abordagem inicial terapêutica sem complicações com complicações Normal <120 <80 orientações gerais não usar não usar Pré-hipertensão 120 – 139 80 – 89 Sim não usar não usar Hipertensão Grau Tiazídico para a 140 – 159 1 90 – 99 Sim Hipertensão Grau 2 maioria* droga específica*** Tiazídico mais outra** > ou =160 > ou =100 Sim classe droga específica*** ( para a maioria dos casos) Pacientes sem complicações: associada a outras * Hipertensão estágio 1 (140-159/90-99 mmHg) necessitará de uma droga na maior parte das vezes. Deve-se usar tiazídicos (hidroclorotiazida, por exemplo), podendo-se considerar o uso de IECA, ARA II, BB, CCB. **Hipertensão estágio 2 (160/100 mmHg ou mais) deve-se combinar, frequentemente, pelo menos duas drogas: um tiazídico associado a alguma das seguintes classes: IECA, ARA II, BB, CCB. ***Pacientes com complicações ou condições especiais: Insuficiência cardíaca – diurético tiazídico ou de alça, BB,IECA, ARA II, antagonista da aldosterona. Pós infarto do miocárdio - BB, IECA, Antagonista da Aldosterona. Alto risco cardiovascular - tiazídico, BB, IECA, BCC. Diabetes - diurético tiazídico, BB, IECA, ARA II, BCC. Doença Renal Crônica- IECA, ARA II, diurético de alça. Prevenção de acidente vascular encefálico recorrente – diurético tiazídico e IECA. Tabela 16 – Escolha do agente anti-hipertensivo conforme situação especial Drogas Recomendadas* Situações Especiais Diuréticos BB IECA ARA II Insuficiência Cardíaca X x x X x x Pós Infarto do Miocárdio X x x Diabetes X x x X x X Prevenção de AVC recorrente X Fonte: JNC 7 Report – 2003 31 x AA X X Alto Risco Coronariano Doença Renal Crônica BCC x x * Abreviações: BB (betabloqueadores), IECA (inibidor da enzima de conversão da angiotensina II), ARA II (antagonista do receptor da angiotensina II), BCC(bloqueador do canal de cálcio), AA (antagonista da aldosterona). 7.2.3) Características específicas dos agentes anti-hipertensivos Diuréticos. Existem forte evidências que os diuréticos aliviam os sintomas, reduzem os episódios de descompensação e melhoram a capacidade de exercitar-se em pacientes com insuficiência cardíaca (IC) 9. Diuréticos e restrição salina são indicados em pacientes que têm sinais de retenção líquida (C)9. Diuréticos tiazídicos parecem reduzir as taxas de formação recorrente de cálculos urinários à base de cálcio quando há hipercalciúria (2)36. Adição de antagonista da aldosterona é recomendada em pacientes com sintomas moderados a graves de insuficiência cardíaca (B) 9. Beta bloqueadores Beta bloqueadores (BB) não são, em geral, indicados como primeira linha na terapia para hipertensão (B)20. No entanto podem ser drogas de primeira linha no caso de pacientes jovens. BB são menos efetivos em reduzir a incidência de AVC do que outros anti-hipertensivos (2)9. Os beta bloqueadores se usados em idosos após infarto do miocárdio associam-se à redução da mortalidade e, em todas as idades, reduzem a mortalidade em pelo menos 6 meses pós episódio de IAM (2)9. Grande redução na freqüência cardíaca com o uso de beta-bloqueador pode estar associado a um aumento de eventos cardiovasculares e morte (2) 9.Beta bloqueadores cardiosseletivos parecem ser seguros para uso em doenças pulmonares leve e moderada9. Inibidores da Enzima Conversora de Angiotensina Vantagens Os IECAs reduzem a mortalidade cardiovascular por todas as causas e é tão efetivo quanto os outros anti-hipertensivos no controle da PA (1)8. São indicados para todos os pacientes com redução fração de ejeção, independentemente de serem sintomáticos ou não, a menos que haja alguma contra-indicação ou intolerância (A)9. Atuam como protetores renais (vide parte referente a doença renal crônica e diabetes). Um estudo demostrou que o Ramipril na dose de 10 mg uma vez ao dia reduz a taxa de morte cardiovascular por: infarto do miocárdio , AVC e insuficiência cardíaca em pacientes com mais de 55 anos com doença vascular ou diabetes (1)34. Os IECAs reduzem a progressão da macroalbuminúria e microalbuminúria em pacientes com diabetes mellitus4. Os ARA II e IECAs parecem ter similar eficácia para retardar a progressão de uma nefropatia diabética recente (3)9. Desvantagens A exposição fetal aos IECAs no primeiro trimestre de gravidez está associada a um aumento da incidência de má formações congênitas (2)18. Os IECAs podem exacerbar a resposta a picadas (veneno) de insetos (3)16. IECAs podem ser a principal causa de acometimento das vias aéreas por angioedema (3), embora não seja um efeito freqüente. Este efeito é revertido, na maioria dos casos, com a interrupção do uso 7,27 . Um estudo realizado com o enalapril apresentou uma incidência de 0,68% de angioedema com essa medicação. Os grupos de maior risco foram: os negros (OR 2,88), história de rash cutâneo por droga (OR 3,78), idade maior que 65 anos (OR 1,6), alergias sazonais (OR 1,79). O angioedema é mais comum ao iniciar a medicação7. O uso de IECA concomitantemente com a espirinolactona aumenta o risco de hipercalemia (OR 20,3)15. Indicação de interrupção de uso dos IECAs : hipercalemia (potássio sérico maior que 5,6 mmol/L), aumento da creatinina maior que 30% do valor basal, mesmo para paciente com nível basal acima de 1,4 mg/d 16. ARA II A principal indicação do uso dos ARA II é substituir os IECAs em casos de reações adversas a estes 23 . Os efeitos colaterais são similares aos IECAs exceto por raramente causarem tosse, angioedema, prejuízo no paladar ou hepatotoxidade9. Não parece haver diferença individual na eficácia da redução da pressão arterial entre os ARAs II (3)14. 7.2.4) Escolha da agente anti-hipertensivo em grupos específicos Raça. Diuréticos tiazídicos são as drogas de escolha inicial para os negros (B), seguido dos bloqueadores de canal de cálcio11, 21. Diabetes Recomenda-se que a pressão arterial seja reduzida a valores inferiores a 130/80 mmHg e a 125/75 mmHg, se houver proteinuria > 1 g/24 hs 6. A manutenção da PA diastólica menor que 80 mmHg em pacientes com diabetes diminui as taxas de mortalidade e eventos cardiovasculares (2)9 IECAs: podem reduzir o risco de infarto do miocárdio mais que os bloqueadores de canal de cálcio em diabéticos (2)6 parecem reduzir todas as causas de mortalidade na nefropatia diabética (2) reduzem a velocidade de progressão da nefropatia diabética inicial (3)9 ARAs II limitada evidência nos resultados de mortalidade9. reduzem a velocidade de progressão da nefropatia diabética (1)10. Idosos O tratamento da hipertensão arterial isolada em idosos reduz a morbidade (1) e provavelmente a mortalidade (2)30. Sugere-se que o tratamento da hipertensão no idoso seja iniciado com bloqueador de canal de cálcio diidropiridínico de longa ação (anlodipina, nifedipina retard), uma vez que estes reduzem a incidência de déficit cognitivo e demência12. Crianças e adolescentes Não há estudos que indiquem a melhor opção, devendo-se estar atento à restrição do uso de IECA e ARA II em adolescentes do sexo feminino, pelo seu potencial efeito teratogênico31. Mulheres As seguintes medicações podem ser usadas nas gestantes: metildopa (1ª escolha), BCC, BB (pode estar associada a crescimento intra- uterino restrito) e vasodilatadores (ex: hidralazina)31,26. Os anticoncepcionais orais (ACOs) podem aumentar os níveis pressóricos. Por isso, mulheres que fazem uso desses devem ter a pressão arterial aferida regularmente e, caso tornem-se hipertensas, deverá haver substituição do método contraceptivo. Doença renal crônica. A maior parte deverá ser tratada com a combinação de: IECA ou ARA II e Diuréticos. A diminuição dos níveis pressóricos associa-se com a diminuição do risco cardiovascular e da mortalidade nos pacientes em diálise (2). Deverá ser mantida pressão arterial menor que 130/80 mmHg. Obesos Principais drogas a usar: BCC, IECA, ARAII e diuréticos em baixa dose31. 7.3) O uso de ácido acetilssalicílico (AAS) e estatinas em paciente portadores de HAS 7.3.1) Indicações para o uso do AAS (utilizar tabelas do anexo) Recomenda-se o uso de AAS para homens com idade de 45 a 79 anos quando o potencial benefício de reduzir os episódios de infarto agudo do miocárdio superam o potencial risco de hemorragia intestinal ( A )32. Recomenda-se ainda o uso de AAS para mulheres com idade de 55 a 79 anos quando o potencial benefício de prevenir os episódios de AVC superam os riscos de hemorragia intestinal (A)32. As evidências atuais são insuficientes para suportar recomendação contra ou favor ao uso do AAS em homens e mulheres com mais de 80 anos de idade31. Não é recomendável o uso do AAS para a prevenção de AVC em mulheres com idade inferior a 55 anos, bem como para infarto do miocárdio em homens com menos de 45 anos de idade (A)32. O risco de hemorragia digestiva grave com o uso concomitante de antiinflamatórios não esteróides e AAS quadriplica em relação ao uso isolado do AAS. O risco de hemorragia digestiva no homem é duas vezes maior do que na mulher. O efeito protetor de 75 mg de AAS é o mesmo que em doses maiores, porém os riscos de sangramento aumentam com a dose32. A associação de outro antiagregante plaquetário (ex: dipiridamol) ao AAS pode melhora a eficácia contra novos eventos cardiovasculares na prevenção secundária, mas não traz benefícios na prevenção primária (2)29. As tabelas 2 e 3 no anexo 2 têm o objetivo de individualizar o estudo do risco/benefício por paciente, cruzando o poder de prevenção dos eventos cardiovasculares em comparação com os riscos de sangramento. 7.3.2) Estatinas As estatinas devem ser usadas de forma a atingir as seguintes metas: Fonte: V Diretriz Brasileira de Hipertensão Arterial Doses das estatinas Fonte: IV Diretriz sobre dislipidemias e prevenção da ateriosclerose Estatinas reduzem a incidência de infarto do miocárdio e AVC em pacientes (mais em homens que nas mulheres) sem doença cardiovascular (nível 1 de evidência)9. Esse benefício depende mais do risco cardiovascular geral do que dos níveis de colesterol9. Estatinas reduzem a mortalidade e os infartos do miocárdio em adultos com doença coronariana (1)35.