ATESTADOS MÉDICOS, MÉDICOS ASSISTENTES E - CRM-PR

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ATESTADOS MÉDICOS, MÉDICOS ASSISTENTES E BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS
MEDICAL CERTIFICATES, MEDICAL ASSISTANTS AND SOCIAL SECURITY BENEFITS
Leonardo Biscaia*
*Perito Médico do INSS, doutorando em Sociologia - UFPR e mestre em Saúde Pública/Fiocruz
Palavras-chave ¬ Atestado médico, legislação previdenciária, benefício, codificação de doença,
afastamento laboral, perícia.
Keywords ¬ Medical certificate, social security legislation, benefit, disease coding, work leave,
expertise.
Recentemente, houve no CRM-PR um evento destinado a discutir o atestado médico; entre os temas
abordados, falou-se sobre a responsabilidade do médico assistente na emissão desse tipo de
documento e como deve ser preenchido corretamente. Embora aparentemente banais, esses
aspectos traduzem-se na modificação das relações de trabalho dos pacientes com seus
empregadores e com os órgãos governamentais que regulam as atividades civis. Deixando de lado
as implicações trabalhistas e civis – pois são assuntos bastante extensos –, o que importa tratar aqui
são os resultados produzidos junto à Previdência Social.
Como se sabe, a legislação previdenciária brasileira estabelece que todo trabalhador deve ser
encaminhado para avaliação pericial médica a cargo do Instituto Nacional do Seguro Social – INSS –
para analisar a percepção de benefício por incapacidade se permanecer afastado do trabalho por
mais de 15 dias. Como o afastamento do trabalho é por doença, quem atesta a existência de doença
é o médico assistente, que registra no atestado médico o prazo previsto do tratamento do seu
paciente, além de outras informações que julgue pertinentes, dentre as quais o estado atual da
doença, o prognóstico e a codificação internacional das doenças (CID).
É preciso lembrar que a concessão do benefício previdenciário é feita pelo INSS e não pelo perito
médico, sendo necessário ainda o cumprimento de exigências administrativas – como a filiação ao
regime geral da Previdência Social, a data do início da doença e a data do requerimento do benefício
– sem as quais o paciente/segurado, mesmo estando incapaz para o trabalho, não terá direito ao
auxílio-doença.
Tem-se então duas figuras muito bem determinadas, com suas próprias competências e suas
atividades características. A primeira é a do médico assistente, que responde pelo diagnóstico,
tratamento e acompanhamento do paciente/segurado. A segunda é a do perito médico
previdenciário, que analisa o impacto que a doença alegada para o afastamento do
paciente/segurado tem sobre a sua capacidade de desempenhar suas atividades laborativas. Tudo
isso está definido de modo muito claro em uma resolução do CFM publicada em 2008, a de número
1.851, que sofreu modificação recentemente, por meio da resolução 2.015 de 2013 – além do que
está disposto capítulo XI do Código de Ética Médica, sobre auditoria e perícia médica.
O ponto que desejo destacar é a diferença fundamental que há entre o médico assistente e o perito
médico da Previdência – diferença que foi enfatizada pela resolução CFM 2.015/2013: o médico
assistente não pode ser perito do próprio paciente, isto é, ele não pode, por não estar autorizado, a
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emitir juízos sobre a capacidade ou incapacidade do seu paciente para a consecução das atividades
ocupacionais. A justificativa para essa divisão de tarefas reside nos diferentes comprometimentos
de um e outro médico; o assistente está empenhado em utilizar todos os meios e todo o seu
conhecimento para beneficiar o seu paciente, com quem mantém uma relação de confiança. O
perito previdenciário, por seu turno, não baseia sua prática na relação médico/paciente e, portanto,
não se estabelece uma relação de confiança; na verdade, a relação entre perito e paciente/segurado
é caracterizada pela desconfiança mútua, tendo em vista haver interesses pecuniários envolvidos
nessa relação. Ao perito, como dito acima, como funcionário público designado para responder a
determinadas questões formuladas implícita ou explicitamente pelo Estado, cabe analisar as
conseqüências de um dado diagnóstico sobre a capacidade para o trabalho do paciente/segurado,
não sendo de sua responsabilidade o diagnóstico, o tratamento nem o acompanhamento do
paciente, embora esses conhecimentos sejam indispensáveis para sua avaliação.
O resultado prático da diferença entre médico assistente e perito previdenciário é que, nos
atestados médicos exarados pelos assistentes, não deve haver referências à capacidade laborativa
do seu paciente/segurado. Assim, expressões do tipo “incapaz para as atividades profissionais” ou
“deve afastar-se do trabalho”, ainda que bem intencionadas e mesmo como mera sugestão,
constituem perícia do próprio paciente, portanto contrariam os ditames éticos da profissão médica.
Muitos médicos que são frequentemente procurados por pacientes/segurados para emitir
atestados médicos com vistas precisamente a perícia do INSS já mudaram suas condutas e
deixaram de afirmar em seus atestados seu paciente “deve ser aposentado” ou “deve receber
auxílio-doença”. Esses nobres colegas, muitos dos quais se viram questionados sobre a eticidade de
suas condutas, entenderam que o mais adequado é informar o que lhes cabe informar, reservando
ao perito médico a decisão sobre a concessão do benefício previdenciário. Os médicos assistentes
que ainda fazem esse tipo de sugestão precisam conscientizar-se do equívoco que cometem e evitar
serem peritos de seus pacientes; os peritos médicos previdenciários precisam encaminhar os
atestados que firam as regras dessa forma aos canais competentes. O CRM deve, por sua vez,
orientar os médicos assistentes, fiscalizando e cobrando o cumprimento dessas normas, punindo
quando for o caso.
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