centro de ensino superior do ceará faculdade cearense curso de

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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO CEARÁ
FACULDADE CEARENSE
CURSO DE SERVIÇO SOCIAL
MIRNNA VASCONCELOS DA SILVA
A ATUAÇÃO PROFISSIONAL DO/A ASSISTENTE SOCIAL NO CENTRO DE
REFERÊNCIA ESPECIALIZADO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL – CREAS REGIONAL
– FORTALEZA
FORTALEZA
2013
MIRNNA VASCONCELOS DA SILVA
A ATUAÇÃO PROFISSIONAL DO/A ASSISTENTE SOCIAL NO CENTRO DE
REFERÊNCIA ESPECIALIZADO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL – CREAS REGIONAL
– FORTALEZA
Monografia submetida à aprovação da
Coordenação do Curso de Serviço Social
do Centro de Ensino Superior do Ceará,
como requisito parcial para obtenção do
grau de Graduação.
Orientadora: Profª Ma. Moíza Siberia Silva
de Medeiros
FORTALEZA
2013
S586a Silva, Mirnna Vasconcelos
Atuação profissional do(a) Assistente Social no centro de
referência especializado de assistência social – CREAS regional Fortaleza / Mirnna Vasconcelos Silva. Fortaleza – 2013.
135f.
Orientador: Profª. Ms. Moíza Siberia Silva de Medeiros.
Trabalho de Conclusão de curso (graduação) – Faculdade
Cearense, Curso de Serviço Social, 2013.
1. Serviço Social. 2. Assistente Social – atuação
profissional. 3. Trabalho – CREAS Regional. I. Medeiros, Moíza
Siberia Silva de. II. Título
CDU 364(813.1)
Bibliotecário Marksuel Mariz de Lima CRB-3/1274
Aos meus Pais, pelo amor manifestado de
diversas formas, inclusive pela educação.
AGRADECIMENTOS
Mesmo que se diga que a produção científica é uma tarefa solitária – em
alguns momentos é de fato – a construção desta monografia também é fruto de um
coletivo de pessoas que estiveram ao meu lado nesta etapa acreditando em mim e
no resultado deste estudo. A Vocês quero agradecer:
À Deus, autor da vida, fonte de todas as bênçãos. A Ti Senhor, quero
agradecer pela inspiração e sabedoria que tão gratuitamente me concedeu para a
realização deste trabalho. Por ter cuidado de mim e daqueles que me são caros ao
longo deste caminho. Por ter chegado até aqui. A Ti ó Deus, toda honra e toda glória
eternamente!
Ao meu pai, Antônio Tabosa, pelo amor e apoio incondicional que sempre
dispensou as suas filhas. Pelo esforço ao longo de toda a vida para nos garantir o
estudo e que nada nos faltasse. Homem trabalhador e de um coração enorme. Meu
referencial de honestidade e dedicação à família. Um exemplo de PAI.
À minha mãe, Maria Auxiliadora, por todo carinho e amor que só uma
MÃE sabe dar. Por seu silêncio edificante, sua paciência e cuidado tão zelosos. Por
sempre acreditar em mim. Uma Doce Mulher. Forte e Meiga. Minha pérola preciosa.
Ao meu esposo, Rafael Carneiro, companheiro de toda a vida. Por todo
amor e compreensão que dispensou durante a elaboração desta monografia. Pela
parceria e discussões fecundas sobre como fazer pesquisa. Pela escuta sempre
atenta. Por enxugar as minhas lágrimas nos momentos em que achava que não iria
conseguir. Por me amar e acreditar em mim quando eu mesma não acreditava. A
você, meu amor, minha inspiração.
Às minhas irmãs, cunhado e sobrinha, Marienne Vasconcelos, Maíres
Vasconcelos, Odílio Oliveira e Maíara Olivieira. Minha família. Por entender minhas
ausências. Pela torcida, amizade e companheirismo.
Ao meu primo Jean, que durante a realização deste ensaio monográfico
partiu desta vida e foi para junto de Deus. Agradeço por ter sido testemunha de seu
processo de transformação, por isso não direi adeus, mas até logo com a certeza de
que nos veremos novamente.
À minha amiga Joelma, minha querida irmã de fé, que sempre me apoiou
e esteve ao meu lado incentivando meus projetos, sonhos e lutas.
À minha orientadora, Profª. Ma. Moíza Siberia, pela parceria na realização
desta pesquisa. Pela admirável pessoa e profissional que você é. Agradeço por ter
aceitado me orientar neste estudo e por ter me dado à honra de produzir esta
pesquisa mediante suas orientações.
Às professoras convidadas, Profª. Drª. Mônica Duarte Cavaignac e Profª.
Ma. Paula Raquel da Silva Jales por terem aceitado compor a banca examinadora
desta monografia.
À Coordenação de Serviço Social da Faculdades Cearenses na pessoa
da Profª Ma. Eliane Nunes, onde também referencio a Profª. Ma. Flaubênia Girão
pela dedicação e o empenho para que o Curso de Serviço Social da FAC fosse
valorizado e respeitado entre as instituições de ensino.
À todas as professoras e professores da Faculdades Cearenses que
participaram de minha formação profissional e contribuíram para meu crescimento
acadêmico. Por incentivar um olhar crítico, não passivo às circunstâncias da vida.
À minha supervisora de estágio supervisionado em Serviço Social,
Assistente Social Luciana Mendes, pela generosidade a mim conferida no período
de estágio e, acima de tudo, pela competência e o exemplo de profissional que você
é para mim.
À toda a equipe que compõe o CREAS Regional, de modo especial, as
assistentes sociais do CREAS Regional que participaram deste estudo e as aquelas
que pude conviver durante minha prática de estágio no CREAS Regional.
Às minhas amigas de faculdade Maria Glaucineide, Marlúcia Rosendo,
Jailma Rodrigues, Cristina Maria, Érika Lorena, Cristina Maia, Natathalie Liberato e
Fernanda Braga. Queridas amigas que conquistei nestes quatro anos. Amizades
preciosas que quero ter para toda vida. Juntas, buscamos com muita luta a
concretização deste sonho. Pela vitória alcançada, mais do que merecida.
À todos/as os/as companheiros/as da turma de Serviço Social. Por termos
permanecidos juntos até aqui com a certeza que nos veremos novamente como
assistentes sociais e colegas de trabalho.
À todos que direta ou indiretamente contribuíram para que a produção
desta monografia fosse possível.
À Vocês, meu Muito Obrigada!
“Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades,
Muda-se o ser, muda-se a confiança, Todo
mundo é composto de mudança, Tomando
sempre novas qualidades.”
Luís Vaz de Camões
RESUMO
Este ensaio monográfico teve como objetivo discutir sobre a profissão de Serviço
Social e como esta categoria profissional se insere nos espaços ocupacionais. Para
tanto, esta investigação teve como foco central investigar a Atuação Profissional
do/a Assistente Social no Centro de Referência Especializado de Assistência Social
– CREAS Regional – Fortaleza com a intenção de analisar o fazer profissional do/a
assistente social no cotidiano institucional do CREAS Regional – Fortaleza. Seus
objetivos foram: Conhecer as competências e atribuições do/a assistente social no
CREAS, Analisar o significado da categoria Instrumentalidade para as participantes
da pesquisa, Compreender o papel do/a assistente social dentro da equipe
interdisciplinar no CREAS e Investigar os limites e possibilidades entre as condições
de trabalho e a atuação dos/as assistentes sociais na viabilização dos direitos. As
categorias analíticas centrais que nortearam este estudo foram: Trabalho, Cotidiano,
Instrumentalidade e Assistência Social. Para a consecução dos objetivos
pretendidos empreendemos uma pesquisa eminentemente qualitativa do tipo
bibliográfica, documental e empírica. Elegemos como método para a referida
análise, o método dialético. Utilizamos nesta pesquisa, as técnicas da entrevista e
do questionário. Participaram deste estudo, quatro assistentes sociais que exercem
atividades laborativas distintas na instituição. A partir dos dados coletados e
analisados, percebemos que as situações de violação de direitos sobre as quais
os/as assistentes sociais incidem sua atuação profissional no CREAS requerem dos
profissionais um trabalho social específico no campo da proteção social especial e
exigem dos profissionais um olhar crítico e ampla leitura da realidade para a
apreensão destas violações enquanto expressões da questão social que se
apresentam no cotidiano. A apreensão da categoria instrumentalidade pelas
profissionais entrevistadas não se deu em sua completude, pois o significado desta
capacidade se reduziu a uma de suas dimensões, a saber, a dimensão técnicooperativa. Espaços do cotidiano institucional como o plantão social e o trabalho
interdisciplinar realizado na instituição foram valorizados pelas participantes e
reforçam o seu papel na instituição. No exercício de sua atuação profissional, o/a
assistente social, em sua condição de trabalhador assalariado, condiciona-se a
determinados limites institucionais que incidem na satisfação ou insatisfação na
execução de suas atribuições quando estes limites interferem no posicionamento
ético-político do profissional.
Palavras-chave: Serviço Social. Assistente social. Atuação profissional. Trabalho.
CREAS Regional.
ABSTRACT
This monographic essay aims to discuss the profession of social work and how this
professional category fits in the occupational spaces. Therefore, this research
focuses on investigating the social worker’s professional performance at the Center
for Social Assistance Specialized Reference - Regional CREAS - Fortaleza with the
intent of analyzing the social worker’s professional making in everyday at CREAS
Regional – Fortaleza. Its objectives were: to know the powers and duties of the social
worker at CREAS, to analyze the meaning of the category Instrumentality for
research participants, to understand the role of the social worker within the
interdisciplinary team at CREAS, and to investigate the limits and possibilities
between working conditions and the social workers’ performance in the viability of
rights. The core analytical categories that guided this study were: Labor, Everyday
Life, Instrumentality and Assistance. To achieve the intended goals, we undertook a
survey eminently qualitative, literature, documentary and empirical. We have chosen
as a method for this analysis, the dialectical method. We used in this research, the
techniques of interview and questionnaire. The study included four social workers
engaged in different labor activities in the institution. From the data collected and
analyzed, it was found that cases of violation of rights about which social workers
focus on CREAS require a specific social work in the field of special social protection.
This requires a critical view of professionals and wide reading of the reality to the
apprehension of these violations as expressions of the social question that arise in
everyday life. The seizure of the category instrumentality by professionals
interviewed was not in its fullness, since the significance of this ability has been
reduced to one of its dimensions, namely the technical operational dimension.
Institutional spaces of everyday life, such as social duty and interdisciplinary work
done in the institution were valued by participants and enhance their role in the
institution. In the exercise of their professional, social worker in his capacity as
employee determines himself to certain institutional limits that affect the satisfaction
or dissatisfaction in the performance of their duties when these limits interfere in his
ethical-political position.
Keywords: Social Services. Social Worker. Professional Activities. Work. CREAS
Regional.
LISTA DE TABELAS
1. Tabela 1 – Parâmetros de referência para a definição do número de CREAS,
considerando o porte do município........................................................................... 38
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABEPSS
Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social
CEAS
Centro de Estudos e Ação Social
CF
Constituição Federal
CFESS
Conselho Federal de Serviço Social
CFP
Conselho Federal de Psicologia
CIAPREVI
Centro Integrado de Atenção e Prevenção à Violência contra a
Pessoa Idosa
CNAS
Conselho Nacional de Assistência Social
CRAS
Centro de Referência de Assistência Social
CREAS
Centro de Referência Especializado de Assistência Social
CRESS
Conselho Regional de Serviço Social
DCA
Delegacia da Criança e do Adolescente
DCECA
Delegacia de Combate a Exploração Sexual de Crianças e
Adolescentes
ECA
Estatuto da Criança e do Adolescente
ENESSO
Executiva Nacional de Estudantes de Serviço Social
FAC
Faculdades Cearenses
FUNCI
Fundação da Criança e da Família Cidadã
IPEA
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
LA
Serviço de Proteção Social a Adolescentes em Cumprimento de
Medida Socioeducativa de Liberdade Assistida
LBA
Legião Brasileira de Assistência
LOAS
Lei Orgânica de Assistência Social
NEVCA
Núcleo de Enfrentamento da Violência contra Crianças e
Adolescentes
NOB/SUAS
Norma Operacional Básica do SUAS
NOB-RH/SUAS
Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do SUAS
PAEFI
Serviço de Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e
Indivíduos
PFMC
Piso Fixo de Média Complexidade
PNAS
Política Nacional de Assistência Social
PSB
Proteção Social Básica
PSC
Prestação de Serviços à Comunidade
PSE
Proteção Social Especial
SENAI
Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial
SER
Secretaria Executiva Regional
SESI
Serviço Nacional da Indústria
STDS
Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social
SUAS
Sistema Único de Assistência Social
TCC
Trabalho de Conclusão de Curso
UECE
Universidade Estadual do Ceará
URLBM
Unidade de Recepção Luiz Barros Montenegro
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 14
CAPÍTULO I: PERCURSO METODÓLOGICO E PARTICULARIDADES DA
PESQUISA: OS PRIMEIROS PASSOS NA INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA ........... 17
1.1 Aproximação ao objeto de estudo ................................................................... 18
1.2 Contextualizando o Serviço Social Brasileiro nas políticas sociais ............. 22
1.3 Percurso Metodológico .................................................................................... 27
1.4 Conhecendo o Lócus da Pesquisa: Centro de Referência Especializado de
Assistência Social – CREAS ................................................................................. 33
1.5 Perfil das profissionais entrevistadas ............................................................ 45
CAPÍTULO II: O SERVIÇO SOCIAL COMO OBJETO DE ESTUDO: TRABALHO E
COTIDIANO DA ATUAÇÃO PROFISSIONAL ........................................................ 51
2.1 Concepções Clássicas e Contemporâneas acerca da categoria trabalho .. 52
2.2 A Atuação Profissional do Serviço Social como trabalho ............................ 63
2.3 O Cotidiano do trabalho do/a Assistente Social no CREAS ......................... 70
CAPÍTULO III: A ASSISTÊNCIA SOCIAL COMO POLÍTICA PÚBLICA NO BRASIL
.................................................................................................................................. 82
3.1 A Assistência Social como política pública da Seguridade Social .............. 83
3.1.1 A Proteção Social Especial .............................................................................. 94
3.1.2 A Instrumentalidade no trabalho do/a Assistente Social................................. 101
3.2 O Projeto Ético-Político do Serviço Social e as particularidades do trabalho
do/a Assistente Social na Política de Assistência Social ................................. 108
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 117
REFERÊNCIAS ...................................................................................................... 123
ANEXOS ................................................................................................................ 129
14
INTRODUÇÃO
(Re) aprender a olhar. Não olhar de qualquer modo ou mesmo não olhar.
Mas, olhar de uma forma diferente. Olhar para de fato enxergar e então construir.
Este foi o desafio ao qual que me propus na elaboração deste ensaio monográfico.
Muito mais que descrever buscamos neste trabalho, enxergar, compreender e
compartilhar as experiências proporcionadas nesta investigação científica, possíveis
a partir de uma olhar mais apurado, um olhar científico capaz de produzir resultados
que se plasmem da realidade onde foi gestada ao mundo acadêmico.
Portanto, apresentamos a você leitor/a o fruto desse novo olhar. Neste
ensaio monográfico nos propomos a investigar a atuação Profissional do/a
Assistente Social com a intenção de contribuir acerca do debate sobre o trabalho
do/a assistente social na sociedade, especificamente nos serviços públicos. O/A
Assistente Social tem sido um/a profissional requisitado/a a desenvolver sua atuação
nos mais diversos postos de trabalho, mas sabemos que historicamente o Estado é
o maior empregador deste profissional requerendo sua atuação nas políticas sociais.
Desse modo, nossa proposta de investigação científica escolheu como
lócus de estudo para esta análise o Centro de Referência Especializado de
Assistência Social – CREAS Regional – Fortaleza, equipamento público que viabiliza
os serviços sociais da Política de Assistência Social na Proteção Social Especial.
Realizamos a pesquisa com quatro assistentes sociais, do sexo feminino, que
laboram nos acompanhamentos sociais, setor de denúncia e equipe volante da
referida
Unidade.
Tomamos por
base
neste
estudo
o
método
dialético,
caracterizando-se como eminentemente qualitativo com a utilização das técnicas de
pesquisa: a entrevista e o questionário.
Almejamos com esta discussão destacar a relevância do Serviço Social
em um equipamento da proteção social especial. Desse modo, apresentamos ao/a
leitor/a como principal objetivo deste ensaio monográfico analisar o fazer profissional
do/a assistente social no cotidiano institucional do CREAS Regional – Fortaleza.
Mediante esta indagação, procuramos discutir e contribuir, a partir de situações
15
concretas do cotidiano de trabalho dos/as assistentes sociais como a profissão vem
exercendo sua atuação profissional e as formas que esta atuação vem assumindo
no campo das políticas sociais.
Destacamos como título desta produção o termo “Atuação Profissional”
para designar o trabalho do/a assistente social, por entendermos que esta
nomenclatura contempla todas as outras formas de dizer sobre o que faz o Serviço
Social. Consideramos que a referida nomenclatura em nada agride o saber fazer da
profissão, haja vista que as entidades representativas da profissão utilizam
comumente o termo “atuação” para intitular a elaboração de seus documentos
normativos. Este termo diz respeito, no nosso entendimento, ao campo onde o
Serviço Social pode empreender o seu trabalho, que neste caso, refere-se ao
CREAS Regional.
Para tanto, esta monografia está estruturada em três capítulos, conforme
o/a leitor/a poderá apreciar posteriormente. No Capítulo I: Percurso metodológico
e Particularidades da Pesquisa: os primeiros passos na investigação científica,
apresentamos as motivações que impulsionaram a elaboração desta pesquisa, o
percurso metodológico que tracei nesta investigação, a contextualização do Serviço
Social na realidade brasileira, as particularidades do lócus da pesquisa e o perfil das
profissionais que fizeram parte deste estudo.
No Capítulo II: Serviço Social como objeto de estudo: trabalho e
cotidiano da atuação profissional, o/a leitor/a terá acesso as considerações de
autores clássicos e contemporâneos acerca da categoria trabalho para compreender
o lugar que esta categoria ocupa na sociedade e nesta discussão, a fim de elucidar,
portanto, o Serviço Social como profissão circunscrita na divisão social e técnica do
trabalho e sua atuação como trabalho na sociedade. Posteriormente, tomando como
base de discussão a categoria cotidiano, apresentamos reflexões acerca do espaço
cotidiano do CREAS Regional e as implicações que este equipamento incide positiva
e/ou negativamente na atuação profissional.
No Capítulo III: A Assistência Social como política pública no Brasil,
destacamos o histórico e as particularidades da política de assistência social no país
16
como um dos eixos estruturantes da seguridade social, a partir dos marcos legais
que a constituíram. Trazemos ainda alguns apontamentos sobre como esta política
pública vem se estruturando atualmente na sociedade, bem como a estruturação da
proteção social especial na política de assistência social. Continuando a discussão,
apresentamos
breves
considerações
sobre
a
categoria
instrumentalidade
destacando sua importância na atuação profissional dos/as assistentes sociais como
também buscamos descobrir o entendimento das interlocutoras da pesquisa sobre
esta categoria. Encerrando este capítulo, escrevemos sobre a relação entre o
Projeto Ético-Político do Serviço Social e as particularidades do trabalho do/a
Assistente Social neste campo específico da Política de Assistência Social, de modo
a elucidarmos as exigências que este projeto imprime na atuação dos/as assistentes
sociais.
Ao longo da investigação apresentamos as falas das interlocutoras desta
pesquisa, testemunhas oculares que permitiram através deste estudo uma
compreensão sobre a atuação profissional do/a assistente social, que embora
imersa em contradições, encontra-se comprometida com a direção social abraçada
pela categoria. Os relatos das participantes da pesquisa foram elementos cruciais
para o entendimento do lugar que a profissão vem ocupando no campo das políticas
sociais.
Por fim, nas considerações finais, retomamos os objetivos da pesquisa
para responder a pergunta de partida deste estudo, onde realizamos algumas
sínteses das questões expostas e as principais conclusões elucidadas que
possibilitarão que este estudo contribua no debate da atuação profissional na política
de assistência social e na proteção social especial. Não temos a intenção de esgotar
a discussão do tema com este estudo, por isso, com esta produção traçamos alguns
elementos que podem subsidiar outras produções sobre o tema proposto.
Sinta-se convidado, caro/a leitor/a a conhecer este constructo produzido
com afinco e dedicação, a fim de fazê-lo/a entender um pouco mais sobre a
profissão de Serviço Social, a partir dos achados que podemos desvelar nesta
investigação. Desejamos a você uma prazerosa leitura!
17
CAPÍTULO I
PERCURSO METODÓLOGICO E PARTICULARIDADES DA PESQUISA: OS
PRIMEIROS PASSOS NA INVESTIGAÇÃO CIENTÍFICA
“[...] a postura científica não é algo de apenas alguns eleitos,
podendo ser exercida em qualquer campo de estudo.
Metodologia Científica é muito mais do que algumas regras de
como fazer uma pesquisa. Ela auxilia a refletir e propicia um
‘novo’ olhar sobre o mundo: um olhar científico, curioso,
indagador e criativo”.
Mirian Goldenberg
18
1.1 Aproximação ao objeto de estudo
A motivação para a escolha desta temática para este Trabalho de
Conclusão de Curso (TCC) deu-se a partir de duas experiências que para mim foram
bastante significativas: a primeira, a participação na Conferência Municipal de
Assistência Social do município de Fortaleza em agosto de 2011. A segunda, a
experiência de estágio supervisionado em Serviço Social realizada no Centro de
Referência Especializado de Assistência Social (CREAS) Regional – Fortaleza.
O ano de 2011 destacou-se como um ano de realização de conferências.
Na perspectiva do direito e da participação social, as conferências constituem-se em
um importante dispositivo para que as Políticas Sociais e, no caso, a Assistência
Social seja efetivada, conforme prescrito na Constituição Federal (CF) de 1998 como
um direito social e uma política pública de responsabilidade do Estado.
Estava cursando o 5º período do curso de Serviço Social quando
aconteceu, no mês de agosto, a IX Conferência Municipal de Assistência Social do
município de Fortaleza com o tema: “Consolidar o SUAS e Valorizar seus
Trabalhadores no Âmbito Municipal”. Nesta conferência participamos como
convidada1 das discussões e debates acerca da Política de Assistência Social de
Fortaleza e podemos perceber os diversos pontos de vista dos trabalhadores da
assistência, sejam aqueles que trabalham diretamente com os usuários dos
serviços, sejam aqueles designados à organização da política no município.
Dentre as divisões dos eixos para elaboração das propostas de ação da
conferência, participamos do eixo que propunha as discussões sobre a qualificação
dos serviços socioassistenciais. Neste eixo tomamos parte in loco das propostas,
discussões, sugestões, desafios e críticas que o envolviam e constatamos nas falas
dos profissionais e usuários da política de assistência social, a persistência para que
esta política realmente desempenhasse o seu papel na cidade.
1
De acordo com o Capítulo II, artigo 7º, parágrafo II do Regimento Interno da Conferência Municipal,
a participação como convidada/o nas conferências concede apenas o direito à voz, sendo vetado o
direito a voto. Cf. CONSELHO MUNICIPAL DE ASSISTÊNCIA SOCIAL. Regimento Interno da IX
Conferência Municipal de Assistência Social. Fortaleza, 2011.
19
As discussões e debates ao longo de toda a conferência, fossem na
plenária, fossem no espaço dos eixos, remetiam de uma forma ou de outra à
valorização dos trabalhadores da assistência social, tema da atual conferência.
Como pensar na efetividade de uma política sem pensar em seus articuladores?
Como oferecer um serviço de qualidade sem qualificar os trabalhadores da
assistência social? Esses foram apenas alguns de tantos outros questionamentos
que surgiram na plenária da conferência.
O espaço da conferência proporcionou não somente elaborar propostas
para a melhoria dos serviços oferecidos pela Política de Assistência Social, mas
sobremaneira, discutir os desafios e problemas que necessitavam ser vencidos, bem
como construir estratégias de qualificação e valorização de seus trabalhadores – um
dos braços articuladores da política.
É inegável que os/as assistentes sociais compõem grande parte do
número de trabalhadores da assistência social e, nesta conferência, observamos
como estes/as profissionais buscam promover discussões acerca de sua atuação
profissional, bem como de qualificação para todos os trabalhadores da Política de
Assistência Social.
Como estudante em processo de formação profissional, participar da
conferência possibilitou ampliar a visão da atuação profissional do/a assistente
social, como profissional comprometido/a com o seu “fazer” nas instituições de
acesso aos serviços públicos. Mas, sobretudo, comprometido/a com a qualidade dos
mecanismos que viabilizam sua atuação, de forma a contribuir para que a Política de
Assistência Social de fato se constitua dia-a-dia na perspectiva do direito social. Não
há dúvidas de que esta experiência suscitou a curiosidade em pesquisar o cotidiano
de trabalho da profissão que abraçamos para exercer, fato que foi posteriormente
aprofundado na prática de estágio.
Concomitante ao mês em que ocorreu a conferência municipal, iniciamos
a prática de estágio supervisionado em Serviço Social, mediante convênio firmado
entre a instituição de ensino – Faculdade Cearense (FAC) – e a Secretaria de
20
Trabalho e Desenvolvimento Social (STDS), onde fora encaminhada por esta
secretaria ao Centro de Referência Especializado de Assistência Social – CREAS
Regional – Fortaleza. Permanecemos na referida instituição todo o período que
compreende o estágio supervisionado, de acordo com a matriz curricular
estabelecida no curso, a saber: 2011.2, 2012.1 e 2012.2. Estando na referida
instituição, foi possível acompanhar as atividades desenvolvidas pelo Serviço Social
no atendimento aos usuários dos serviços, bem como no fortalecimento da
autonomia destes cidadãos como sujeitos de direitos.
Ao participar das atividades empreendidas na instituição juntamente com
a supervisora de campo, acompanhamos diversas situações que norteavam a sua
atuação
profissional
e
das
demais
assistentes
sociais
naquele
espaço
socioinstitucional. Situações essas que vão desde limitações institucionais – como a
impossibilidade de realizar um encaminhamento por não haver vagas nos abrigos,
por exemplo –, situações de risco – referentes a relativas “revoltas” de alguns
usuários dos serviços – e até conquistas profissionais – como melhorias nas
condições de trabalho e/ou o encerramento de um acompanhamento social que
repercutiu em bons resultados para as famílias atendidas.
Na condição de estagiária, foi possível conhecer e perceber as nuances
da realidade – muitas vezes difíceis de serem transpostas – contidas naquele
espaço, bem como o comprometimento das assistentes sociais com sua atuação
profissional na viabilização dos direitos. Foi então, a partir do acompanhamento
diário da atuação profissional às demandas institucionais que se apresentavam no
CREAS – que acabou consolidando o interesse manifestado na participação da
conferência – que nos instigou a pesquisar a atuação profissional do/a assistente
social naquele espaço. No intuito de percebermos como se dá a relação do/a
profissional de Serviço Social com os mais diversos determinantes que se
apresentam no processo cotidiano de desvelamento das expressões da questão
social2. Da mesma forma, compreendermos o reconhecimento do/a assistente social
em sua identidade profissional como trabalhador circunscrito na divisão social e
2
No nosso entendimento a questão social constitui-se como o conjunto das desigualdades sociais
produzidas pelo sistema capitalista de produção. Sobre a questão social, Cf. Martinelli (2001); Netto,
(2011); Iamamoto & Carvalho (2011).
21
técnica do trabalho e a efetivação do projeto ético-político em sua atuação
profissional.
No dia a dia com as profissionais, visualizávamos as leituras e
apontamentos teóricos dos autores de referência se plasmarem na realidade através
dos limites, entraves, possibilidades e conquistas do cotidiano de trabalho das
assistentes sociais, fazendo-nos refletir os elementos enigmáticos3 que envolvem
essa profissão. Empreendemos, portanto, uma busca teórica a partir das categorias
que acabaram se tornando base desta pesquisa, a saber: trabalho, cotidiano,
instrumentalidade e assistência social na tentativa de analisarmos o fazer
profissional do/a assistente social no cotidiano institucional do CREAS Regional –
Fortaleza. Sendo esta a principal indagação e pergunta de partida para este trabalho
investigativo.
Estas foram as bases de aproximação deste objeto de estudo e para
tanto, estabelecemos como objetivos específicos que no nosso entendimento
possibilitaram uma melhor compreensão sobre da pergunta de partida: conhecer as
competências e atribuições do/a assistente social no CREAS; analisar o significado
da categoria instrumentalidade para as participantes da pesquisa; compreender o
papel do/a assistente social dentro da equipe interdisciplinar no CREAS; investigar
os limites e possibilidades entre as condições de trabalho e a atuação dos/as
assistentes sociais na viabilização dos direitos.
Neste sentido, a pesquisa desenvolvida torna-se relevante para o Serviço
Social, tendo em vista ser importante para o fortalecimento da profissão: perceber
como a atuação profissional tem sido exercida nos mais diferentes espaços, neste
caso especificamente, em um equipamento da política de proteção social especial,
articulando esta atuação aos limites e possibilidades da realidade institucional. No
entendimento de que discutir sobre a atuação profissional possibilita plasmar a visão
de totalidade da realidade social, compreendida entre profissional-usuário-política,
tão necessária para um exercício profissional comprometido com a direção social
assumida pelo Serviço Social, a partir de seu projeto ético-político.
3
Sobre esses elementos, ou seja, o caráter contraditório em que a profissão é exercida na sociedade
trataremos modestamente de clarificá-los no decorrer deste ensaio monográfico.
22
Da mesma forma, os resultados obtidos nesta pesquisa visam
proporcionar à sociedade uma mudança de olhar sobre a atuação do Serviço Social
nos serviços públicos, como profissão circunscrita na divisão social e técnica do
trabalho.
De modo algum temos a intenção de encerrar a discussão sobre a
atuação das/os assistentes sociais com esta pesquisa. Tão pouco que as
conclusões e posicionamentos desta investigação tornem-se algo acabado dentro do
universo empírico. Assim, a intenção que vislumbra este ensaio monográfico é de
que a pesquisa produzida seja apresentada em seminários, encontros científicos,
conferências, encontros do Serviço Social, de forma a contribuir com as discussões
acerca da temática estudada. Do mesmo modo, que seja disponibilizada no CREAS
Regional, a fim de que o conhecimento produzido possa servir essencialmente
àqueles que possibilitaram sua produção. Estimamos que a temática pesquisada
torne-se linha de pesquisa para futuras pesquisas acadêmicas e a partir destas
iniciativas, colaborar para uma melhor compreensão da realidade no que tange ao
debate sobre a profissão de Serviço Social na sociedade.
1.2 Contextualizando o Serviço Social Brasileiro nas políticas sociais
Discorridas as motivações que
impulsionaram esta
investigação,
procuramos nos parágrafos seguintes situar o/a leitor/a acerca do objeto estudado,
haja vista que para compreender as particularidades do Serviço Social, é
interessante que possamos no desenvolvimento das políticas sociais neste país,
especificamente no Sistema de Proteção Social Brasileiro com foco na Política
Nacional de Assistência Social.
Assim como na Europa e na América Latina, as protoformas do Serviço
Social no Brasil estão intimamente ligadas à Igreja e a visão que esta possuía
acerca dos “problemas sociais”4. Sob as diretrizes das encíclicas Rerum Novarum e
4
Ressaltamos que era dessa forma que a questão social era concebida na visão da Igreja, ou seja,
os “problemas sociais” eram provenientes de um desajuste individual e moral do indivíduo. Cf.
23
Quadragesimo Anno5, começaram a surgir instituições assistenciais como, por
exemplo, o Centro de Estudos e Ação Social (CEAS) que tinha a função de difundir
a doutrina e a ação social da Igreja. Sob o viés da filantropia e da caridade, este
centro atuava na minimização das refrações da questão social 6, devido à
intensificação do processo de industrialização capitalista e aumento da urbanização
na década de 1930 com o governo de Getúlio Vargas.
De acordo com Jaccound (2009), o sistema de proteção social público
surgiu a partir da agudização dos “riscos sociais”7 devido à expansão das relações
de trabalho oriundas do processo de industrialização e urbanização. Neste período,
a proteção social emergia por parte da sociedade através das ações da filantropia e
da caridade. Na medida em que se expandia a industrialização, aumentava o “risco
social” das famílias caírem na miséria devido à dificuldade de se conseguir um
emprego. Salienta-se que o sistema de proteção social, como mecanismo de acesso
aos “direitos sociais”, organizou-se por meio do seguro social. Os benefícios e
serviços eram obrigatoriamente concedidos pelo Estado àqueles que estivessem
impedidos de garantir a sua subsistência pela via do trabalho.
Na década de 1930, as transformações decorrentes da industrialização no
Brasil – que se deu de modo tardio – ocasionaram o avanço das forças produtivas
do capital e da divisão do trabalho, aumentando na mesma medida as diversas
formas de exploração do trabalho. Para conter as manifestações do movimento
operário – que reivindicava melhores condições de trabalho – e os demais
problemas sociais advindos do processo industrial, o Estado propõe políticas de
proteção social para o enfrentamento da questão social na tentativa de controlar os
ânimos da classe operária e, ao mesmo tempo, isentar o ônus da burguesia com
custos na produção. Assim, define-se Proteção Social como “um conjunto de
CASTRO, Manuel Manrique. História do Serviço Social na América Latina. 9. ed. São Paulo: Cortez,
2008.
5
A Encíclica Rerum Novarum trazia em discussão o enfrentamento à questão operária cabendo à
própria Igreja a tarefa de combatê-la. A Encíclica Quadragesimo Anno abordava a urgência de se
criar uma ação voltada para combater o paganismo e a secularização. Cf. (Ibid., 2008).
6
Neste período a questão social era vista sob uma perspectiva individual e como questão de polícia.
7
Jaccound (2009) destaca que as situações de risco social seriam múltiplas, a saber, doença,
velhice, desemprego, morte. Cf. JACCOUND, Luciana. Proteção Social no Brasil: Debates e Desafios.
In: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Concepção e Gestão da proteção
Social Não Contributiva no Brasil. Brasília: Unesco, 2009. p. 57-86.
24
iniciativas públicas ou estatalmente reguladas para a provisão de serviços e
benefícios sociais visando enfrentar situações de risco social ou privações sociais”
(JACCOUND, 2009, p.58).
É neste contexto que o Serviço Social se insere nas instituições sociais e
assistenciais8 do Estado, ampliando seu campo de trabalho e atuando nas formas de
enfrentamento à questão social, a saber, as políticas sociais. Assume então “um
lugar na execução das políticas sociais emanadas do Estado e, a partir desse
momento, tem seu desenvolvimento relacionado com a complexidade dos aparelhos
estatais na operacionalização das políticas sociais” (YAZBEK, 2009, p.132).
Conforme afirma Iamamoto e Carvalho (2011, p. 83-84),
[...] é nesse contexto, em que se afirma a hegemonia do capital industrial e
financeiro, que emerge sob novas formas a chamada “questão social”, a
qual se torna a base de justificação desse tipo de profissional especializado.
A questão social não é senão as expressões do processo de formação e
desenvolvimento da classe operária e de seu ingresso no cenário político da
sociedade, exigindo seu reconhecimento como classe por parte do
empresariado e do Estado.
Posterior à década de 1940, o sistema de proteção social manteve-se
inalterado, ou seja, continuou organizado pelo seguro social deixando diversos
grupos sociais à margem do acesso aos serviços e benefícios por não pertencerem
ao seguro previdenciário, sendo atendidos pela filantropia 9 ou pela lógica da
benemerência10. Era incumbência destas o atendimento aos pobres e necessitados
constituindo-se como um mecanismo assistencialista e de favor do Estado.
Concernente à década de 1960, Bulla (2003) destaca que as implicações
do modelo econômico desenvolvimentista redefiniram a conjuntura do país, haja
vista que os investimentos do capital estrangeiro dinamizaram significativamente a
8
Dentre estas instituições podemos destacar a Legião Brasileira de Assistência (LBA) e o Serviço
Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), ambos criados em 1942, e o Serviço Social Nacional
da Indústria (SESI), em 1946.
9
Segundo Mestriner (2008), a filantropia em seu sentido restrito ocupa-se com a preocupação do
favorecido com o outro que nada tem e, em seu sentido amplo, pressupõe o sentimento mais
humanitário, vinculado à garantida condição digna de vida. Cf. MESTRINER, Maria Luiza. O Estado
entre a filantropia e a assistência social. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2008.
10
Esta lógica pauta-se no pressuposto de que para os pobres qualquer coisa basta. Cf. YAZBEK,
Maria Carmelita. Estado, Políticas Sociais e Implementação do SUAS. In: Ministério do
Desenvolvimento Social e Combate à Fome. SUAS: Configurando os Eixos de Mudanças. Vol. 1.
Brasília: MDS, 2008. p. 79-135.
25
economia brasileira com repercussões na área administrativa, tecnológica e
financeira. A implantação desse modelo permitiu a acumulação e expansão
capitalista e suas formas de controle social e político. Por essa razão repercute na
ditadura militar um período de repressão, censura e autoritarismo, fazendo com que
os direitos políticos fossem visivelmente suprimidos e, em contrapartida, fossem
ampliados os direitos sociais como mecanismo compensatório através das políticas
sociais.
Durante os anos da ditadura militar as políticas sociais possuíram em seu
interior o objetivo de legitimação do sistema autoritário vigente, com caráter
fragmentário, setorial e emergencial, se sustentava na necessidade de dar
legitimidade aos governos que buscavam bases sociais para manter-se no
poder. Neste período, passava-se a ideologia de que o desenvolvimento
social seria decorrente do desenvolvimento econômico (DALLAGO, 2007,
p.3).
Sposati (1991 apud JACCOUND, 2009) aponta que até a década de 1970
o sistema de proteção social passou pelo chamado Estado de Bem Estar
Ocupacional, onde os direitos universais eram substituídos pelo direito contratual.
Vale ressaltar que na década de 1980, o sistema de proteção social – nele inserido a
previdência social, a assistência social e a saúde – era fragmentado. Não se tinha o
caráter de seguridade social e de universalidade proposto pela Constituição Federal
de 1988. “Esta é precisamente a experiência do Brasil que, por quase cinco décadas
no século passado, foi um dos países que mais rápido conseguiram expandir sua
economia no mundo, sem obter, todavia, resultados consideráveis no âmbito social.”
(POCHMANN, 2004, p. 7).
A Constituição Federal de 1988 introduziu o conceito de seguridade social
ao sistema de proteção social, sendo entendido como um conjunto de medidas
públicas contra privações econômicas e sociais (JACCOUND, 2009). Estas medidas
articulavam a garantia do direito à saúde, à previdência e à assistência social,
pilares fundamentais à estabilidade da sociedade democrática.
A constituição Federal de 1988 ao afiançar direitos humanos e sociais como
responsabilidade pública e estatal, operou, ainda que conceitualmente,
fundamentais mudanças, pois acrescentou na agenda dos entes públicos
um conjunto de necessidades até então consideradas de âmbito pessoal ou
individual (SPOSATI, 2009, p. 13).
26
A inclusão da assistência social na seguridade social proporcionou a
ampliação dos direitos sociais, ressaltando o seu papel no cenário brasileiro
enquanto política pública de direito do cidadão e responsabilidade do Estado e não
mais como benemerência ou uma atividade focalizada. Além disso, tornou-se um
novo campo na formulação de estratégias para promoção do acesso aos serviços e
benefícios pelos cidadãos brasileiros.
Nos marcos legais da Política de Assistência Social destacam-se: a Lei
Orgânica de Assistência Social (LOAS)11, que estabelece as diretrizes da
Assistência Social, especificando a regulamentação de uma estratégia política
descentralizada; a Política Nacional de Assistência Social (PNAS)12, que legitima o
Sistema Único de Assistência Social (SUAS); a Norma Operacional Básica do SUAS
(NOB/SUAS)13, aprovada em 2005 pelo Conselho Nacional de Assistência Social
(CNAS) que disciplina a PNAS e normatiza o SUAS; e a Tipificação Nacional de
Serviços Socioassistenciais14, fruto da deliberação da VI Conferência Nacional de
Assistência Social em 2007.
O SUAS tem por funções essenciais: a proteção social, a vigilância e a
defesa dos direitos socioassistenciais. No que tange à proteção social, aborda dois
eixos: a proteção social básica e a proteção social especial. A primeira atua junto às
famílias e seus membros, cujos direitos não foram violados, mas que estão em
situação de vulnerabilidade social. A segunda atua na modalidade de média
complexidade quando os direitos já foram violados, mas os vínculos familiares ainda
não foram rompidos e na modalidade de alta complexidade, quando ocorre a
violação de direitos e o enfraquecimento e/ou quebra de vínculos (SIMÕES, 2010).
Inúmeros avanços foram conquistados na Assistência Social, mas ainda
há muitos desafios a serem enfrentados, pois a eficácia da política depende de um
esforço mútuo e contínuo de todos os agentes envolvidos, tendo em vista que ainda
11
Lei nº 8.742/1993 que fora complementada pela Lei nº 12.435/2011.
Resolução nº 145, de 15 de outubro de 2004 (DOU 28/10/2004).
13
Resolução nº 130, de 15 de Julho de 2005. Em 2013, esta resolução fora revogada pela Resolução
CNAS nº33/2012 que aprova a nova NOB/SUAS.
14
Resolução nº 109, de 11 de novembro de 2009, aprovada pelo Conselho Nacional de Assistência
Social que caracteriza os serviços a serem ofertados na proteção social básica e na proteção social
especial.
12
27
existem resistências na consolidação da Assistência Social como política pública
que viabiliza direitos. Outro entrave a ser enfrentado é a concepção conservadora e
neoliberal que atribui a transversalidade desta política ao acesso material àqueles
supérfluos para o capital, e não como política pública que prioriza a garantia do
direito ao trabalho.
É nesse campo de efetivação dos mecanismos de viabilização da
assistência social e demais políticas sociais – nos dizeres de Iamamoto (2009),
tensionado entre desigualdade, rebeldia e conformismo – que os/as assistentes
incidem sua atuação, o que requer uma leitura crítica e um repensar constante de
sua atuação na efetivação dessa política, como estratégia de enfrentamento das
desigualdades sociais. Da mesma forma, é “impossível uma leitura da assistência de
per si, sem atentar para as determinações sociais e históricas do significado da
assistência como política governamental, de sua imbricação com as relações de
classe e destas com o Estado”. (SPOSATI et al., 2010, p. 25).
1.3 Percurso Metodológico
Delimitado, portanto, o objeto de estudo, suas motivações e os
pressupostos que norteiam esta investigação, empreendemos esforços para
traçarmos a metodologia de pesquisa que melhor se adequaria a elucidação das
indagações do referido objeto. “O que determina como trabalhar é o problema que
se quer trabalhar: só se escolhe o caminho quando se sabe aonde se quer chegar”
(GOLDENBERG, 2004, p.14).
Compreende-se a metodologia como um caminho a se percorrer no
processo de fazer ciência. Trata-se do cuidado com os procedimentos e ferramentas
para a abordagem da realidade. Assim, “a metodologia inclui as concepções teóricas
de abordagem, o conjunto de técnicas que possibilitam a construção da realidade e
o sopro divino do potencial criativo do investigador” (MINAYO, 1994, p.16).
A inserção na realidade é que nos impulsiona à produção do
conhecimento. Neste sentido, o Serviço Social tem alçado voos na pesquisa social,
28
consolidando seu caráter não apenas interventivo, mas também investigativo na
análise dos processos que envolvem a realidade social.
Partindo do entendimento que a realidade não se apresenta de forma
estática, mas ao contrário, é dinâmica e repleta de contradições com nuances que a
todo instante se modificam e trazem um novo significado à realidade elegemos como
método de análise desta pesquisa o método dialético, uma vez que:
Esse método de apreensão da realidade social não se atém a
procedimentos de raciocínio apologéticos ou contemplativos, mas tem como
premissa a construção de um saber que põe em primeiro momento as
condições sociais reais do homem e suas formas de existência (LARA,
2007, p.79).
Citando Lukács, Lara (2007) reafirma a importância do método dialético
no que concerne a sua capacidade reflexiva, que possibilita apreender as dimensões
do ser e da consciência dos sujeitos sociais como um processo histórico movido por
contradições, haja vista que:
A ciência autêntica extrai da própria realidade as condições estruturais e as
suas transformações históricas e, se formula leis, estas abraçam a
universalidade do processo, mas de um modo tal que deste conjunto de leis
pode-se sempre retornar – ainda que frequentemente através de muitas
mediações aos fatos singulares da vida. É precisamente esta a dialética
concretamente realizada de universal, particular e singular (LUKÁCS, 1970,
p. 81 apud LARA, 2007, p.79).
Desse modo, o método dialético possibilitou refletir sobre o universo de
atuação das assistentes sociais no CREAS Regional com os determinantes
estruturais que se relacionam à processualidade histórica que envolve a profissão no
cotidiano da realidade social.
Neste
sentido,
partimos
dos
seguintes
objetivos:
conhecer
as
competências e atribuições do/a assistente social no CREAS; analisar o significado
da categoria instrumentalidade para as participantes da pesquisa; compreender o
papel do/a assistente social dentro da equipe interdisciplinar no CREAS e investigar
os limites e possibilidades entre as condições de trabalho e a atuação dos/as
assistentes sociais na viabilização dos direitos. Optamos, portanto, por uma análise
de pesquisa do tipo qualitativa, a fim de compreendermos como se apresenta no
29
cotidiano a atuação profissional dos/as assistentes sociais e os fenômenos sociais
que circundam esta realidade. “Os dados da pesquisa qualitativa objetivam uma
compreensão profunda de certos fenômenos sociais apoiados no pressuposto da
maior relevância do aspecto subjetivo da ação social” (GOLDENBERG, 2004, p.49).
Tendo em vista a busca pela profundidade na compreensão dos
fenômenos sociais que circundam os atores escolhidos para esta análise, Martinelli
(1999)15 destaca três considerações sobre a pesquisa qualitativa, a saber: o caráter
inovador da pesquisa qualitativa para traduzir os significados atribuídos pelos atores;
a dimensão política e de construção coletiva que este tipo de análise de pesquisa
traz consigo, haja vista que parte da realidade dos atores e a eles retorna
criticamente; e o fato de que este caráter político e coletivo não se apresenta como
algo restrito, mas complementar.
Explicitada a natureza qualitativa deste ensaio monográfico utilizamos
como técnicas de pesquisa a entrevista e o questionário. No que concerne à
entrevista, esta é uma técnica de pesquisa “em que o investigador se apresenta
frente ao investigado e lhe formula perguntas, com o objetivo de obtenção dos dados
que interessam à investigação” (GIL, 2011, p. 109). Já o questionário, é uma técnica
que prioriza demonstrar os objetivos da pesquisa em questões específicas,
emergindo de suas respostas a descrição das características do grupo pesquisado
(GIL, 2011).
Os instrumentos de coleta de dados utilizados na pesquisa foram a
aplicação do questionário e do roteiro semiestruturado de entrevista. Nesta
investigação, o questionário foi utilizado com o intuito de apresentar o perfil do
processo de formação das profissionais e as particularidades de sua atuação
profissional. Utilizamos o roteiro semiestruturado por entendermos que nos ajudaria
a obter informações sobre o que os sujeitos da pesquisa sabem, sentem e suas
explicações sobre a realidade na qual estão inseridos. Da mesma forma, a utilização
15
Cf. MARTINELLI, Maria Lúcia. O uso de abordagens qualitativas na pesquisa em serviço social. In:
MARTINELLI, Maria Lúcia (Org). Pesquisa qualitativa: um instigante desafio. São Paulo: Veras
Editora, 1999. p. 19-27.
30
do roteiro possibilitou que possíveis lacunas percebidas nas respostas das
entrevistadas fossem mais bem exploradas durante as entrevistas.
Considerando que na pesquisa qualitativa a preocupação do pesquisador
deve estar voltada para “o aprofundamento da compreensão do grupo social”
(GOLDENBERG,
2004,
p.14),
tivemos
máxima
atenção
aos
relatos
das
interlocutoras desta pesquisa, como também perceber os elementos velados nestes
relatos, seus comportamentos, gestos, silêncio e as nuances do universo empírico.
Assim, fizemos uso do diário de campo como uma das ferramentas elucidativas das
nuances por observadas.
Concernente o ingresso na pesquisa de campo, apresentamos-nos a
supervisora do CREAS em 05/04/2013 levando o ofício da Instituição de Ensino e o
Termo de Autorização da pesquisa expedido pelo Laboratório de Inclusão da
Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social, órgão público ao qual o CREAS é
subordinado. Expusemos à referida supervisora as intenções que suscitaram esta
pesquisa, os objetivos do estudo, bem como a intenção em entrevistar as
profissionais de cada âmbito de atuação na unidade. Conversamos sobre a
intencionalidade da pesquisa e fomos autorizadas a aplicá-la na instituição. A
pesquisa de campo compreendeu os meses de abril e maio do corrente ano.
Não tivemos dificuldades para adentrar ao campo de pesquisa, haja vista
que o espaço institucional escolhido era conhecido por haver sido nosso campo de
estágio. É fato que as situações que observamos durante este período motivaram a
iniciar esta pesquisa; contudo, retornar à instituição como pesquisadora incutiu a
responsabilidade de um olhar científico às mesmas questões que outrora observara.
Quanto ao contato propriamente dito com as interlocutoras da pesquisa, estas se
fizeram em três visitas a unidade – e não encontrei resistências por parte das
profissionais em participar da investigação.
Antes da concessão das entrevistas, foi firmado entre mim e as
profissionais entrevistadas um Termo de Consentimento de participação da pesquisa
científica, que garantia o anonimato de suas identidades, bem como a aceitação das
31
interlocutoras para a gravação das entrevistas – o que nos auxiliaria a observar
outros elementos na coleta de dados.
Inicialmente encontramos dificuldade para agendar as entrevistas devido
à peculiaridade pela qual a instituição estava passando, o que ocasionou mudança
na escala de trabalho dos profissionais da unidade16. Constatamos que houve
dificuldade de algumas interlocutoras em responder certas perguntas do roteiro 17,
mesmo sendo melhor explicitadas, mas esse fato em nada foi estranho, ao contrário,
constituiu-se como mais um importante elemento para análise, pois acreditamos que
as circunstâncias do processo formativo e do próprio cotidiano de trabalho acabam
ocasionando
estranhamentos
e/ou
entendimentos
restritos
a
determinados
conceitos. A utilização de instrumentos, como por exemplo, o gravador de voz,
também foi uma relativa dificuldade apresentada na coleta de dados pelo
constrangimento inicial que a sua presença causava. Contudo, depois de
esclarecida a utilidade científica do equipamento para o desenvolvimento da
entrevista, tornava-se algo secundário às entrevistadas.
Ressaltamos que apenas uma das profissionais comunicou que
concederia a entrevista, mas não desejava que esta fosse gravada. O que fazer
então? Como a pesquisa científica também exige criatividade do pesquisador e,
mediante o inesperado, acabamos por redigir suas respostas, fato que nos limitou no
que concerne a perceber com maior profundidade particularidades do momento da
entrevista, levando-nos a refletir e a constatar que no universo empírico devemos
estar sempre preparados ao que a realidade nos apresenta. Salientamos que a
transcrição da entrevista não prejudicou a elucidação do objetivo central do estudo.
Considerando que esta pesquisa constitui-se como eminentemente
qualitativa, ou seja, procura uma maior aproximação com o objeto estudado para
16
Chegando ao CREAS Regional percebemos que a unidade estava muito vazia, tanto de
profissionais quanto de usuários dos serviços. A supervisora da Unidade nos informou que a
instituição estava passando por uma particularidade que era a falta de pagamento dos salários dos
trabalhadores do CREAS há dois meses, fato que fez com que a supervisão reorganizasse a escala
de trabalho dos profissionais para dirimir o ônus da falta de pagamento. Coincidentemente a
demanda de usuários também havia diminuído. (Diário de Campo 05/04/213).
17
Neste caso, as perguntas sobre a categoria Instrumentalidade.
32
torná-lo mais explícito (Gil, 2002), os tipos de pesquisa que nortearam este estudo
foram pesquisa bibliográfica, pesquisa documental e pesquisa de campo.
Conforme Gil (2002) a pesquisa bibliográfica permite ao pesquisador
cobertura acerca dos fenômenos, pois se baseia nas contribuições de diversos
autores sobre determinado assunto. Dito isto, estabelecemos como categorias
analíticas: trabalho, cotidiano, instrumentalidade e assistência social, sendo estas
categorias que subsidiaram as apreciações desta pesquisa, a partir do diálogo com
os autores.
A pesquisa documental “vale-se de materiais que não recebem ainda um
tratamento analítico” (GIL, 2002, p.45), mas que possibilitam dados que evitam a
perda de tempo. Nesta técnica de pesquisa realizamos leituras acerca das leis e
instrumentos normativos que envolvem os espaços de trabalho e a própria atividade
laborativa dos/as assistentes sociais.
A pesquisa de campo consiste no recorte do pesquisador em termos de
espaço com a realidade empírica a ser pesquisada, pois “Ela realiza um momento
relacional e prático de fundamental importância exploratória, de confirmação ou
refutação de hipóteses e construção de teorias” (MINAYO, 1994, p.26). O Campo
em que se aplicou a referida pesquisa foi o Centro de Referência Especializado de
Assistência Social – CREAS Regional, localizado no bairro Presidente Kennedy, no
município de Fortaleza. Os sujeitos da pesquisa foram os/as profissionais que
trabalham no CREAS.
No que tange as participantes da pesquisa, estabelecemos os critérios de
escolha com base nas atividades laborativas desenvolvidas pelas assistentes sociais
na instituição. Assim, a pesquisa contou com a contribuição de quatro participantes:
uma assistente social plantonista, que trabalha em um dos municípios que o CREAS
dá suporte; duas assistentes sociais diaristas responsáveis pelos atendimentos
sociais às demandas que chegam à instituição; e uma assistente social diarista que
atua no setor de denúncia da unidade e exerce uma atividade de cunho mais
administrativo.
33
Inicialmente minha intenção era entrevistar seis profissionais, sendo duas
de cada campo de atuação, a fim de perceber congruências e divergências
no relato das profissionais de cada campo de trabalho na instituição. Porém,
devido à incompatibilidade no agendamento das entrevistas, contei com a
participação de quatro profissionais (Diário de Campo 15/05/2013).
Ressaltamos que os dados obtidos na pesquisa de campo encontram-se
diluídos ao longo de todo o ensaio monográfico, onde foram analisados à luz das
categorias analíticas propostas neste estudo, servindo, assim, de base para clarificar
e/ou
refutar
os
objetivos
específicos
delineados
nesta
pesquisa
e,
consequentemente, elucidar a pergunta de partida que norteia esta investigação.
1.4 Conhecendo o Lócus da Pesquisa: Centro de Referência Especializado de
Assistência Social – CREAS
O locus escolhido para análise da atuação do/a assistente social nesta
pesquisa foi o CREAS Regional – Fortaleza, equipamento vinculado à Proteção
Social Especial (PSE)18 que atua na média complexidade.
O Censo SUAS 201119 informou que existem no Brasil 52 CREAS
Regionais e 2.057 CREAS municipais, registrando um aumento de 519 unidades em
relação ao censo realizado no ano anterior. A região Nordeste é a região que possui
o maior número de CREAS, a saber, 792 unidades municipais e 42 unidades
regionais20 (BRASIL, 2011a). Na cidade de Fortaleza existem atualmente 04
unidades municipais, sob a responsabilidade da prefeitura municipal e 01 unidade
regional, sob a responsabilidade do Estado.
O Centro de Referência Especializado de Assistência Social é uma
unidade pública de abrangência municipal ou regional que presta atendimento a
indivíduos e/ou famílias em situação de risco pessoal ou social por violação de
direitos. Suas ações se desenvolvem pela oferta de serviços que necessitam de
18
Sobre a Proteção Social Especial, abordaremos mais adiante no capítulo III.
Os dados apresentados foram retirados do Censo SUAS CREAS do ano de 2011 no site do MDS.
(Disponível em: <http://aplicacoes.mds.gov.br/sagirmps/ferramentas/nucleo/Desen/>. Acesso em: 28.
Mar. 2013).
20
Convém ressaltar que no período da pesquisa do Censo SUAS CREAS de 2011 estavam
cadastrados 2.109 unidades CREAS.
19
34
intervenções especializadas e que requerem uma maior estruturação técnica na
área da proteção social especial (BRASIL, 2011b).
A regulamentação dos serviços ofertados pelo CREAS está prescrita na
Lei do SUAS21 que, consolidada a LOAS, referencia o CREAS como a unidade
responsável pelas ações da proteção social especial de média complexidade. Além
da legislação mencionada, existem outras normatizações22 que clarificam o papel e
as competências do CREAS na Política Nacional de Assistência Social e no Sistema
Único de Assistência Social.
Segundo o documento de Orientações Técnicas do CREAS (BRASIL,
2011b, p.23), o papel do CREAS no âmbito do SUAS destina-se a
Ofertar e referenciar serviços especializados de caráter continuado para
famílias e indivíduos em situação de risco pessoal e social, por violação de
direitos, conforme dispõe a Tipificação Nacional de Serviços
Socioassistenciais; A gestão dos processos de trabalho na Unidade,
incluindo a coordenação técnica e administrativa da equipe, o planejamento,
monitoramento e avaliação das ações, a organização e execução direta do
trabalho social no âmbito dos serviços ofertados, o relacionamento cotidiano
com a rede e o registro de informações, sem prejuízo das competências do
órgão gestor de assistência social em relação à Unidade.
É o equipamento que, no âmbito do SUAS, destina-se à implementação
de serviços de caráter continuado que trabalhem o fortalecimento dos vínculos de
indivíduos e/ou grupos, amenizando os impactos das situações de risco social que
culminam em atos de violação de direitos23. Neste sentido, os serviços
especializados ofertados pelo CREAS são norteados sob a garantia das seguranças
socioassistenciais previstas na PNAS e na Tipificação Nacional de Serviços
Socioassistenciais, a saber: segurança de acolhida, segurança de convívio ou
vivência familiar e segurança de sobrevivência ou de rendimento e de autonomia.
21
Lei nº 12.435/2011 conhecida como “Lei do SUAS” que institucionaliza as ações do Sistema Único
de Assistência Social - SUAS na LOAS.
22
Dentre as quais podemos citar: A Constituição Federal, NOB/SUAS, NOBRH/SUAS, Tipificação
Nacional de Serviços Socioassistenciais, Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Estatuto do
Idoso, Lei Maria da Penha, dentre outras.
23
Por violação de direitos destacamos os seguintes eventos: violência física, psicológica, negligência,
abandono, violência sexual (abuso e exploração), situação de rua, trabalho infantil, práticas de ato
infracional, fragilização ou rompimento de vínculos, afastamento do convívio familiar, dentre outros
(BRASIL, 2011b).
35
No que concerne ao CREAS, a segurança de acolhida deve ser garantida
dando aos usuários dos serviços todas as condições de escuta e de qualificação
técnica da equipe para recepcioná-lo e ouvi-lo em suas demandas e necessidades,
de modo a conhecer as suas particularidades e, a partir delas, proceder as
informações e o trabalho social necessário para acessar seus direitos (BRASIL,
2011b).
O CREAS deve proporcionar ao usuário na segurança de convívio ou
vivência familiar, a oferta de serviços de forma contínua sempre direcionando o
trabalho social ao fortalecimento dos vínculos familiares, comunitários e sociais
(BRASIL, 2011b).
Na segurança de sobrevivência ou de rendimento e de autonomia, as
ações do CREAS devem pautar-se pela primazia da autonomia dos indivíduos e/ou
famílias, de forma que o atendimento especializado deste órgão contribua na
elevação do grau de independência e qualidade dos laços sociais, bem como na
ampliação das potencialidades dos usuários no enfrentamento das problemáticas,
articulando-as à oferta dos serviços, benefícios e programas de transferência de
renda (BRASIL, 2011b).
A Política de Assistência Social tem como um de seus objetivos afiançar a
proteção social na perspectiva destas seguranças e, em se tratando de um
equipamento como o CREAS que diariamente lida com situações de fragilização e
violação de direitos, estas seguranças não podem ser perdidas de vista pela equipe
técnica e nem pelos gestores públicos. Sabemos, no entanto, que existem outros
processos24 para além da dimensão legal e normativa que estão imbricados para o
bom funcionamento do equipamento, mas estes não devem sobrepor os elementos
que garantem o acesso integral aos serviços, programas e projetos disponíveis.
O documento de Orientações Técnicas do CREAS (2011b, p.25) aponta,
ainda, que os objetivos do CREAS prescritos sob a garantia das seguranças
24
Processos que envolvem dimensões econômicas – no que tange ao orçamento público –,
dimensões políticas – no que diz respeito ao interesse dos representantes políticos de implementação
das políticas públicas – e dimensões sociais – no enfrentamento prático das condições objetivas e
subjetivas da política de assistência social.
36
supracitadas são imprescindíveis no desenvolvimento de seu papel no SUAS,
possibilitando ainda
clarificar o papel do CREAS e fortalecer sua identidade na rede; evitar
sobreposição de ações entre serviços de naturezas e até mesmo áreas
distintas da rede que, evidentemente, devem se complementar no intuito de
proporcionar atenção integral às famílias e aos indivíduos; evitar a
incorporação de demandas que competem a outros serviços ou unidades da
rede socioassistencial, de outras políticas ou até mesmo de órgãos de
defesa de direito; qualificar o trabalho social desenvolvido.
Dessa forma, é importante não apenas conhecer as atribuições e papéis
delegados ao CREAS do ponto de vista normativo, mas, sobretudo, perceber a
aplicabilidade destas atribuições na realidade social para que seja fortalecida a
identidade do equipamento nas políticas públicas.
Aos profissionais que, devido ao cotidiano profissional, conhecem as
fragilidades e potencialidades do trabalho social, recai a incumbência de através da
execução de suas atividades contribuírem para que a visão normativa e a visão
social25 do equipamento não sejam incongruentes, mas, ao contrário, estabeleçam
real significado entre serviços, projetos e programas ofertados com a viabilização de
direitos dos usuários dos serviços.
Na tentativa de compreender o entendimento que as interlocutoras da
pesquisa26 possuem sobre o CREAS, ao serem indagadas sobre o seu significado
verbalizaram a seguinte definição:
O CREAS é o Centro de Referência Especializado de Assistência Social. Ele
é um órgão do Governo de Estado do Ceará e o seu objetivo é atender
pessoas que estejam com os direitos violados e com os vínculos
fragilizados. O objetivo também é que esse vínculo possa ser resgatado,
reestruturado para que a violação de direitos não venha mais a ocorrer.
(Ágata). (grifo nosso).
É um órgão que trabalha com direitos violados. Dentro desse público,
costumamos trabalhar no interior com adolescentes em LA e PSC. (Lápis
Lazuli). (grifo nosso).
25
No que diz respeito ao caráter útil do equipamento.
Os nomes fictícios das participantes da pesquisa estão vinculados aos nomes de pedras preciosas
que serão esclarecidos na seção seguinte intitulada como: Perfil das profissionais entrevistadas.
26
37
O CREAS é Centro de Referência Especializado de Assistência Social que
tem como objetivo tratar as questões sociais de uma maneira mais
especializada quando não é mais possível resolvê-las na atenção básica.
(Pedra do Sol). (grifo nosso).
O CREAS é o Centro de Referência Especializado de Assistência Social,
onde a gente atende aquele público com os direitos violados. Quando a
proteção é rompida esse público chega ao CREAS para aquele atendimento
mais especializado, ou seja, as vítimas de abuso, ou idoso quando é
negligenciado, ou uma mulher violentada, entre outros. (Ônix). (grifo nosso).
Três interlocutoras ressaltam que o CREAS trabalha sobre os direitos
violados e uma interlocutora, Pedra do Sol, fez uma leitura macroestrutural dessas
violações destacando-as como questão social, o que remete a pensar que as
situações de violação de direitos sobre as quais o CREAS atua constituem-se, de
modo particular, como expressões da questão social e esta constatação não pode
ser perdida de vista pelas/os profissionais do CREAS.
É esta visão que possibilita uma leitura crítica das violações que chegam
à instituição ao passo que são fruto de um processo de desigualdade social e
econômica vivenciado na sociedade, as quais repercutem nas dimensões
microestruturais dos sujeitos, ou seja, em seu ambiente de convívio familiar e/ou
comunitário, desencadeando, no nosso entendimento, situações degradantes de
violação de direitos geradoras de violência.
No que concerne à caracterização do trabalho do CREAS feito pelas
interlocutoras, Ágata, Lápis Lazuli e Ônix ficou evidenciado em suas falas, a
reprodução do discurso institucional que retrata o CREAS como um equipamento
destinado a atuar sobre os direitos violados sem, contudo, abrir espaço para se
discutir o que vem a ser esse direito violado e suas repercussões em nossa
sociedade. Haja vista que paralelo às situações geradoras de violência – que
retratam o direito violado em sua forma mais gritante – emergem outras situações de
violação de direitos que precisam ser tratadas com a mesma relevância, a fim de
construir estratégias para o seu enfrentamento nos espaços institucionais.
Faz-se necessário, portanto, compreendermos que o que está oculto às
violações de direitos são processos antagônicos de luta de classes que incidem na
vida dos sujeitos das mais variadas formas, requerendo do/a assistente social
38
capacidade crítica, investigativa e interventiva em sua atuação. E mediante esse
processo o/a assistente social é convocado a incidir seu trabalho sobre as
expressões da questão social como matéria-prima do Serviço Social.
O fortalecimento da identidade do CREAS requer ainda um trabalho
intersetorial com os demais órgãos da rede de proteção social, clarificando as
competências de cada um deles, estabelecendo protocolos, fluxos e linhas de ação
para as situações mais adversas que se apresentem. Ou seja, a compreensão do
território de atuação e das particularidades sociais de cada área é fundamental para
que os devidos encaminhamentos sejam dados garantindo não apenas a efetividade
das ações do CREAS e sua legitimidade, como também a efetividade de toda a rede
socioassistencial (BRASIL, 2011b).
Conforme o documento de Orientações Técnicas do CREAS (2011b),
considerando a diversidade do território brasileiro, a PNAS aliada à portaria nº 843
de 28 de dezembro de 201027, prevê a distribuição das unidades do CREAS a partir
do porte populacional das localidades, como aponta a tabela abaixo:
Tabela 1 – Parâmetros de referência para a definição número de CREAS,
considerando o porte do município.
Porte do Município
Número de Habitantes
Parâmetros de Referência
Cobertura de atendimento em CREAS
Pequeno Porte I.
20.000
Regional; Ou implantação de CREAS
Municipal quando a demanda justificar.
Pequeno Porte II.
20.001 a 50.000
Implantação de Pelo Menos 01 CREAS.
Médio Porte.
50.001 a 100.000
Implantação de Pelo Menos 01 CREAS.
Grande Porte, Metrópoles e
Implantação de 01 CREAS a cada
A partir de 100.001
DF.
200.000 habitantes.
Fonte: Orientações Técnicas: Centro de Referência Especializado de Assistência Social – CREAS,
2011. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.
As situações que propiciam a criação de um CREAS com abrangência
regional ocorrem quando a demanda dos municípios não justifica serviços
especializados de forma contínua, ou quando o município não apresenta condições
27
Dispõe sobre o cofinanciamento federal, por meio do Piso Fixo de Média Complexidade (PFMC),
dos serviços socioassistenciais ofertados pelos Centros de Referência Especializados de Assistência
Social, a partir dos níveis de gestão e porte dos municípios.
39
de ofertar um serviço especializado individualmente, devido ao porte ou nível de
gestão28 (BRASIL, [2010]).
A implantação do CREAS Regional se dá por iniciativa do Estado ou por
um conjunto de municípios, ficando sob a responsabilidade do Estado a regulação
do equipamento no âmbito regional com a participação dos municípios envolvidos.
Sua implantação pode também ocorrer através de uma cooperação intermunicipal
para fixar os serviços, desde que a ocorrência de situações de violação de direitos
justifique a articulação com outros municípios. Neste caso, os municípios se
comprometem a executar conjuntamente os serviços, bem como as condições
operacionais para fazê-lo. Atenta-se ao fato de que, para ambos os casos, deve ser
observado o critério geográfico, tanto para viabilizar o deslocamento da equipe
técnica quanto para auxiliar o acesso dos usuários aos serviços disponíveis
(BRASIL, [2010]).
Nesta pesquisa trata-se do Centro de Referência Especializado de
Assistência Social – CREAS Regional – Fortaleza29, localiza-se na Rua Tabelião
Fabião, nº 114, bairro Presidente Kennedy. O referido bairro faz parte da Secretaria
Executiva Regional (SER) III30, regional composta por dezesseis bairros, a saber:
Amadeu Furtado, Antônio Bezerra, Autran Nunes, Bonsucesso, Bela Vista, Dom
Lustosa, Henrique Jorge, João XXIII, Jóquei Clube, Padre Andrade, Parque Araxá,
Pici, Parquelândia, Quintino Cunha, Rodolfo Teófilo e Presidente Kennedy.
Concentra uma população de 398.382 habitantes que corresponde a 16,5% da
população do município31.
28
Os municípios possuem três níveis de gestão que propiciam o repasse de recursos da União, a
saber: gestão inicial, gestão básica e gestão plena. Cf. BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social
e Combate à Fome. Norma Operacional Básica – NOB/SUAS. Brasília: [s.n], 2005. p. 69-175.
Disponível em: <http://www.mds.gov.br/assistenciasocial/secretaria-nacional-de-assistencia-socialsnas/cadernos/politica-nacional-de-assistencia-social-2013-pnas-2004-e-norma-operacional-basicade-servico-social-2013-nobsuas>. Acesso em: 20. jan. 2013.
29
Ressaltamos que as informações sobre as atividades específicas do CREAS Regional Fortaleza e
a organização de trabalho da unidade foram coletadas a partir da experiência de estágio
supervisionado em Serviço Social na instituição, no período de 2011.1 a 2012.2.
30
Divisão territorial estabelecida na cidade de Fortaleza para sua organização geográfica e
administrativa. Atualmente em Fortaleza existem 07 SER’S (I, II, III, IV, V, VI e Centro).
31
Dados obtidos no Mapa da Criminalidade e da Violência em Fortaleza – Perfil da SER III, elaborado
em 2011 pelo Laboratório de Direitos Humanos, Cidadania e Ética da Universidade Estadual do
Ceará-LabVida-UECE; Laboratório de Estudos da Conflitualidade da Universidade Estadual do
Ceará-COVIO-UECE e Laboratório de Estudos da Violência da Universidade Federal do Ceará-LEV-
40
O CREAS Regional - Fortaleza foi instituído inicialmente em 1992 com a
nomenclatura de SOS Criança. Vinculado à Secretaria do Trabalho e Ação Social,
atual Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social, o SOS Criança tinha como
objetivo viabilizar alternativas de atuação no enfrentamento as violações de direitos
contra crianças e adolescentes e seus familiares. Era composto pelo setor de
denúncias, setor de recepção e setor de desaparecidos32 (BRASIL & SOUSA, 2010).
Acerca do trabalho desenvolvido pelo SOS Criança que fora herdado pelo CREAS
Regional, uma das participantes da pesquisa ressaltou:
Pelo CREAS já ter um histórico de atuação neste complexo quando
funcionava o SOS Criança, as pessoas já chegam aqui sabendo que vão ter
alguma resposta ou alguma orientação e com isso muitas demandas
acabam chegando e nós procuramos dar os devidos encaminhamentos
(Lápis Lazuli).
Em 2001 foi criado em âmbito nacional o Programa Sentinela, que tinha
por objetivo cumprir metas do Plano Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual
contra Crianças e Adolescentes, ou seja, sua tarefa consistia na prestação de um
atendimento integral às crianças e adolescentes vítimas de violência sexual, a partir
da articulação de uma rede de serviços que viabilizassem este atendimento (BRASIL
& SOUSA, 2010).
Em Fortaleza existiam dois Programas Sentinela33, um vinculado à antiga
Secretaria do Trabalho e Ação Social e outro vinculado a Prefeitura Municipal de
Fortaleza. Este sob a responsabilidade da prefeitura municipal era desenvolvido pela
Fundação da Criança e da Família Cidadã (FUNCI). Aquele sob a responsabilidade
da secretaria estadual era desenvolvido pelo SOS Criança. Atualmente este serviço
é desenvolvido apenas no âmbito municipal.
No ano de 2005, o SOS Criança transformou-se em Núcleo de
Enfrentamento da Violência contra Crianças e Adolescentes (NEVCA), que,
UFC. (Disponível em: <http://www.uece.br/covio/dmdocuments/regional_III.pdf>. Acesso em: 30. Mar.
2013).
32
Atualmente esses setores ainda permanecem no CREAS Regional.
33
Desde 2008, na primeira gestão da Ex-Prefeita de Fortaleza, Luizianne Lins, o Programa Sentinela
passou a denominar-se Rede Aquarela.
41
subordinado à Coordenação de Proteção Social Especial da STDS, passou a
incorporar as atribuições do antigo SOS Criança e do Programa Sentinela. Sua
institucionalização para CREAS Regional ocorreu em 2007, posterior à aprovação
da PNAS, em 2004, e da NOB SUAS, em 2005, sendo suas atividades direcionadas
pela Política Nacional de Assistência Social.
O CREAS Regional – Fortaleza integra o complexo de Articulação e
Enfrentamento da Violência contra Crianças e Adolescentes, juntamente com a
Delegacia de Combate à Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes (DCECA),
a Delegacia da Criança e do Adolescente (DCA) e a Unidade de Recepção Luiz
Barros Montenegro (URLBM). A DCECA promove suas ações junto a crianças e
adolescentes que tiveram seus direitos violados e a DCA volta-se para o
atendimento de crianças e adolescentes que cometeram ato infracional. Já a
ULRBM destina-se a acolher provisoriamente os adolescentes acusados de prática
de ato infracional enquanto a medida socioeducativa é estabelecida judicialmente.
Todas as demandas do CREAS Regional dentro da atuação da equipe
técnica são direcionadas ao Serviço Social. É partir da análise dos assistentes
sociais que as demandas são atendidas e/ou redirecionadas para outros
profissionais num trabalho interdisciplinar, ou até mesmo encaminhadas a outras
unidades da rede de proteção social.
A Unidade Regional do CREAS divide sua atuação na PSE em Fortaleza
com outros quatro CREAS Municipais, localizados nas SER’S II, III, V, VI. Dessa
forma, a organização do atendimento às violações de direitos ocorre a partir de uma
divisão de atendimento entre os bairros, ou seja, para cada regional existem bairros
que o CREAS Regional atende preferencialmente. Sobre a diversidade do público
atendido e as violações de direitos mais frequentes, uma das interlocutoras
destacou:
A quebra do vínculo que mais reincide no CREAS é a violência intrafamiliar.
Nosso maior público para os atendimentos especializados foram vítimas de
violência de alguém próximo de seu convívio [...]. O CREAS atende o
público de violência sexual, psicológica, física, PCD, idosos, mulheres, mas
o nosso maior público é violência sexual contra criança (Ônix).
42
No que concerne exclusivamente aos casos de violência sexual, os
serviços oferecidos para atendimento desta demanda dividem-se entre o CREAS
Regional e a Rede Aquarela34. A Rede Aquarela possui uma equipe de referência na
DCECA, havendo da mesma forma, uma divisão de atendimento por bairros para
cada SER. Ressalta-se ainda que a unidade regional não executa, em Fortaleza, os
serviços de LA e PSC, sendo estes desenvolvidos pelas unidades municipais,
conforme afirmou uma das participantes da pesquisa:
Com relação à tipificação dos serviços aqui no CREAS nós não fazemos a
execução das mediadas socioeducativas de PSC e LA aqui. Se foi feito
algum acordo eu não sei. O que eu sei é que essas medidas já antes eram
executadas pela Prefeitura e pela Pastoral do Menor [...]. Deve ter sido por
conta da municipalização dos serviços e aí esse serviço ficou mais para o
município (Ágata).
As ações do CREAS Regional na PSE de média complexidade não se
limitam apenas ao município de Fortaleza. Existe o trabalho realizado por equipes
volantes para atender alguns municípios que não possuem um CREAS
implementado, devido às condições de implantação do equipamento que já citamos
anteriormente. Neste sentido, o CREAS Regional disponibiliza equipes de referência
para os municípios de Chorozinho, Pindoretama, Acarape e Barreira, sendo estas
equipes compostas por Assistentes Sociais e Psicólogas. Nesses municípios, as
equipes de referências acompanham os serviços de Liberdade Assistida (LA) e de
Prestação de Serviço a Comunidade (PSC), segundo relatou uma das profissionais:
Atuamos também com algumas equipes no interior, nos municípios de
Pindoretama, Chorozinho, Acarape e Barreira. Lá, as equipes do CREAS
Regional executam as medidas socioeducativas. Essas equipes se
deslocam para o interior porque nesses municípios não há um quantidade
populacional necessária para a implantação de um CREAS. Daí o CREAS
Regional de responsabilidade do Estado desloca uma equipe a essas
localidades para realizar os atendimentos da proteção social especial
(Ágata).
Ao todo são três equipes, entre as quais uma atende o município de
Chorozinho, outra referencia o município de Pindoretama e a terceira atua nos
municípios de Acarape e Barreira. As profissionais – uma assistente social e uma
psicóloga para cada equipe – trabalham durante a semana nessas localidades e
34
A Rede Aquarela é um programa vinculado a Secretaria de Direitos Humanos da Prefeitura
Municipal de Fortaleza que executa e coordena ações de enfrentamento à violência sexual contra
crianças e adolescentes.
43
uma vez por semana se deslocam ao CREAS Regional para elaboração de seus
relatórios e demais procedimentos. Sobre a dinâmica de trabalho das equipes
volantes do CREAS Regional, uma de nossas interlocutoras disse:
Eu trabalho no município de Chorozinho fico lá dois dias da semana e um
dia aqui na Sede Regional. Existem outros municípios que são atendidos
pelo CREAS que são os municípios de Pindoretama, onde a equipe também
fica dois dias no município e um dia na sede e os municípios de Acarape e
Barreira, onde uma equipe acompanha esses dois locais e fica um dia em
cada um deles (Lápis Lazuli).
O CREAS Regional também atende o “Projeto Cavaleiros do Futuro”,
elaborado pelo Esquadrão de Polícia Montada Coronel Moura Brasil da Polícia
Militar do Ceará em parceria com a STDS. Este projeto possui uma escola de
equitação para atender crianças e adolescentes das comunidades do entorno do
esquadrão da polícia montada, que estejam fora da escola e distante do convívio
familiar. Sua finalidade é transmitir conhecimentos técnicos sobre equitação e fazer
com que as crianças permaneçam na escola disciplinarmente. O CREAS auxilia este
projeto disponibilizando um sociólogo e uma pedagoga, que realizam o
acompanhamento das crianças e adolescentes. A idade para inserção no projeto é
de oito anos de idade, com permanência até quatorze anos.
As denúncias que chegam ao CREAS Regional provêm de demandas
espontâneas – sendo estas atendidas no Plantão Social –, do Disque Denúncia
Estadual – que possui um setor que integra o CREAS Regional – e de
encaminhamentos dos órgãos que compõem a rede de proteção. O CREAS oferta
ainda, o serviço de atendimento a pessoas desaparecidas realizando o registro do
desaparecimento nos atendimentos do plantão social e faz a veiculação da imagem
do desaparecido nos meios de comunicação.
Compõem a equipe de referência da unidade: 1 supervisora, 9 assistentes
sociais, 2 advogados, 1 pedagoga, 6 psicólogas e 79 educadores sociais. Trabalham
na instituição 1 agente administrativo, 3 assistentes administrativos, 1 instrutor
educacional, 3 técnicos educacionais, 1 auxiliar administrativo, 2 instrutores de
ofício, 1 atendente infantil, 12 motoristas, 1 motociclista, 3 auxiliares de serviços
gerais e 6 assistentes técnicos totalizando 132 trabalhadores. Se contabilizarmos os
44
profissionais35 que estão à disposição em outros órgãos (9 profissionais), o CREAS
totaliza 141 trabalhadores36.
Em se tratando do espaço físico, a unidade regional conta com 3 salas
para atendimento social, 1 sala lúdica para atendimento psicológico, 1 auditório, 1
sala para os atendimentos do plantão social, 1 sala dos educadores sociais, 1 sala
do Serviço Social, 1 sala da Psicologia, 1 sala do Direito, recepção, brinquedoteca,
banheiros, cozinha, refeitório, setor de denúncia, setor administrativo e uma sala
para a supervisão da Unidade.
Quando a instituição era chamada de SOS CRIANÇA os atendimentos
relativos a denúncias de violação de direitos a crianças e adolescentes já
aconteciam, sendo, portanto necessária à presença de profissionais de Serviço
Social. Atualmente, a presença de assistentes sociais, bem como o trabalho do
Serviço Social, apresenta particularidades interessantes de serem analisadas, haja
vista que as assistentes sociais exercem ocupações profissionais bem distintas.
Assim, mediante as características que compõem a execução dos
serviços do CREAS Regional na proteção social de média complexidade, torna-se
este universo um terreno fértil e um espaço ocupacional extremamente propício para
a análise da atuação profissional das/os assistentes sociais no empreendimento de
um trabalho social congruente com a direção social profissional. Sob este prisma é
que sinalizamos esta instituição como um espaço escolhido para a análise das
indagações elencadas neste estudo.
Desse modo, depois de delineados os traços que compõem o CREAS
Regional na execução de suas atividades, bem como os traços específicos que
constituem o CREAS Regional – Fortaleza, convidamos o/a leitor/a a conhecer o
perfil das interlocutoras desta pesquisa que tornaram possível validar que o
conhecimento teórico em nada se torna estranho ao conhecimento empírico.
35
Esses profissionais são: 01 advogado, 04 assistentes sociais, 01 educador social, 01 instrutor
educacional, 01 psicóloga e 01 técnico educacional. As razões que demandaram seus
remanejamentos a outros órgãos, não puderam ser coletadas na pesquisa de campo.
36
Fonte: Centro de Referência Especializado de Assistência Social – CREAS Regional – Fortaleza.
45
1.5 Perfil das profissionais entrevistadas
O caráter da pesquisa qualitativa se dá justamente pelo conteúdo das
informações obtidas pelos interlocutores da pesquisa, pois são carregadas de
subjetividade que traduzem o seu ser, modo de viver e o seu olhar diante das
circunstâncias que os cercam.
Partindo do princípio de que o ato de compreender está ligado ao universo
existencial humano, as abordagens qualitativas não se preocupam em fixar
leis para se produzir generalizações. Os dados da pesquisa qualitativa
objetivam uma compreensão profunda de certos fenômenos sociais
apoiados no pressuposto da maior relevância do aspecto subjetivo da ação
social. (GOLDENBERG, 2004, p.28)
Assim, procuramos delinear as interlocutoras desta investigação científica
com base em critérios que auxiliassem a clarificar as indagações suscitadas na
pergunta de partida. Desse modo, os contatos com as assistentes sociais e a
aplicação das entrevistas e questionários tiveram base nas três dimensões de
atuação desenvolvidas pelas assistentes sociais na instituição.
Investiguei a atuação profissional de quatro assistentes sociais que
trabalham no CREAS Regional, sendo uma assistente social que trabalha em um
município do interior, duas assistentes sociais que trabalham nos acompanhamentos
sociais realizados na instituição e uma assistente social que trabalha no setor de
denúncia da instituição. A descrição do perfil das interlocutoras da pesquisa tem por
objetivo apresentar as particularidades do processo de formação acadêmica e de
atuação das profissionais colhidas na aplicação dos questionários.
De um modo geral, após a análise dos dados apresentados nos
questionários e relatos das entrevistas podemos destacar já inicialmente o
predomínio do gênero feminino na instituição. Das quatro entrevistadas, duas são
casadas e duas são solteiras. Três professam a religião católica e uma não destacou
religião. A faixa etária das assistentes sociais situa-se entre 29 e 39 anos. Todas
trabalham na instituição sob o vínculo empregatício de terceirização. Trabalham sob
46
o regime das 30horas semanais, de acordo com lei nº 12.317/201037. Três
graduaram-se na Universidade Estadual do Ceará (UECE) e uma no Instituto
Camillo Filho no estado do Piauí. Todas concluíram sua graduação entre os anos de
2007 e 2008. Duas não tiveram outra experiência profissional e duas já trabalharam
em outras instituições. Por fim, todas mencionaram como referência teórica para sua
atuação profissional a autora Marilda Villela Iamamoto e uma mencionou a
referência teórica de Karl Marx.
Assim, traçamos algumas informações gerais sobre cada profissional
participante da pesquisa. Ressaltamos que para garantir o anonimato das
entrevistadas substituirei seus nomes por nomes fictícios vinculados a pedras
preciosas. A escolha das pedras preciosas, portanto, busca traduzir a subjetividade
dessas mulheres captadas no momento das entrevistas, pois adentrar no universo
das interlocutoras da pesquisa fez-nos sentir em uma expedição a procura de
tesouros e com a imensa satisfação de tê-las encontrado. Desse modo, Lápis
Lazuli38, Ágata39, Ônix40 e Pedra do Sol41 serão seus nomes.
 Lápis Lazuli: 30 anos, solteira. Professa a religião católica. É assistente social
terceirizada da instituição e trabalha sob o regime das 30horas semanais.
Compõe a equipe técnica de referência e trabalha há 5 anos no CREAS
Regional. Foi estagiária da instituição e não teve outra experiência profissional
além desta que exerce no CREAS. Concluiu sua graduação em 2007.2 na
Universidade Estadual do Ceará. Dentre as atividades propostas em sua
37
Lei que acrescenta dispositivo à Lei no 8.662, de 7 de junho de 1993, para dispor sobre a duração
do trabalho do Assistente Social.
38
Lápis Lazuli simboliza confiança e segurança na tomada de decisões importantes. Conhecida como
a pedra dos Faraós, abre o campo mental estimulando a inteligência e autocontrole na tomada de
decisões.
(Disponível
em:
<http://www.pedramistica.com.br/significado-pedraspreciosas/default.asp?let=L>. Acesso em: 05. Mai. 2013).
39
Ágata remete a proteção, amizade, justiça e vitalidade. Desenvolve a coragem e a autoconfiança.
Os antigos romanos acreditavam que as Ágatas em forma de anéis poderiam oferecer-lhes poder e
riqueza.
(Disponível
em:
<http://www.pedramistica.com.br/significado-pedraspreciosas/default.asp?let=A>. Acesso em: 05. Mai. 2013).
40
Ônix simboliza a concentração e proteção. Traz sabedoria em decisões que precisam ser tomadas.
(Disponível em: <http://www.pedramistica.com.br/significado-pedras-preciosas/default.asp?let=O>.
Acesso em: 05. Mai. 2013).
41
Pedra do Sol faz alusão ao sucesso nas realizações, reconhecimento e autoestima. Traz fama e
sucesso para aqueles que desejam reconhecimento pessoal em qualquer atividade. Inspira
autoestima,
confiança
e
certeza
nas
realizações.
(Disponível
em:
<http://www.pedramistica.com.br/significado-pedras-preciosas/default.asp?let=P>. Acesso em: 05.
Mai. 2013).
47
graduação realizou estágio supervisionado em Serviço Social. Em sua atuação
profissional já participou de encontros do conjunto Conselho Federal de Serviço
Social (CFESS) e Conselho Regional de Serviço Social (CRESS), Conselhos
de Direitos e Conferências Municipais. Destacou como autores de referência de
sua atuação profissional Vicente de Paula Faleiros, José Paulo Netto, Marilda
Villela Iamamoto e Cynthia Andersen Sarti. Não exerce supervisão de estágio
na instituição. Utiliza como instrumentos/procedimentos técnicos para sua
atuação profissional os relatórios sociais, visitas domiciliares e pareceres
sociais. Participa semestralmente das capacitações oferecidas pela instituição.
Informou que mensalmente são realizadas reuniões da equipe técnica, das
quais participa. As atribuições específicas da profissão que exerce na
instituição são acompanhamento de pessoas vítimas de violação de direitos e
acompanhamentos
de
adolescentes
em
cumprimento
de
medidas
socioeducativas em meio aberto. As questões éticas que norteiam seu trabalho
cotidiano são o respeito à autonomia e escolhas dos usuários, compromisso
com os serviços prestados e com a autonomia do assistente social, atenção
para executar apenas aquilo que é de competência da profissão. Destacou que
escolheria outra profissão com relação a sua identificação com outras áreas,
mas se identifica com a profissão que exerce e que gosta do que faz.
 Ágata: 29 anos, casada. Professa a religião católica. É assistente social
terceirizada da instituição e trabalha sob o regime das 30horas semanais.
Compõe a equipe técnica de referência e trabalha há 4 anos no CREAS
Regional. Foi estagiária da instituição e não teve outra experiência profissional
além desta que exerce no CREAS. Concluiu sua graduação em 2007.2 na
Universidade Estadual do Ceará. Dentre as atividades propostas em sua
graduação realizou estágio supervisionado em Serviço Social, estágio
extracurricular e participou de eventos científicos sem publicação de trabalho.
Em sua atuação profissional já participou de encontros do conjunto CFESSCRESS e Conferências Estaduais. Destacou como autores de referência de
sua atuação profissional Raquel Raichelis, Maria Carmelita Yazbek, Marilda
Villela Iamamoto e Ivanete Boschetti. Exerce supervisão de estágio na
instituição.
Utiliza como instrumentos/procedimentos técnicos para sua
atuação profissional os relatórios sociais, reuniões de equipe e outros
48
instrumentos concernentes ao setor de denúncia. Participa semestralmente das
capacitações oferecidas pela instituição. Informou que participa mensalmente
das reuniões da equipe técnica. As atribuições específicas da profissão que
exerce na instituição são atendimentos sociais do plantão social e relatório
social. As questões éticas que norteiam seu trabalho cotidiano são o sigilo
profissional, defesa intransigente dos direitos humanos, utilização do número
de registro, respeito as normas e princípios dos outros profissionais, ausência
de preconceitos, entre outros. Destacou que não sabe se escolheria outra
profissão.
 Ônix: 33 anos, solteira. Não citou religião. É assistente social terceirizada da
instituição e trabalha sob o regime das 30horas semanais. Compõe a equipe
técnica de referência e trabalha há 2 anos no CREAS Regional. Já trabalhou
no Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), no Projeto Projovem
Urbano em um município do estado do Piauí. Concluiu sua graduação em 2008
no Instituto Camillo Filho em Teresina/Piauí. Dentre as atividades propostas em
sua graduação realizou estágio supervisionado em Serviço Social, estágio
extracurricular, eventos científicos sem publicação de trabalho, iniciação
científica, atividades de extensão e movimento estudantil. Em sua atuação
profissional já participou de Conferências Municipais e Conselhos de Direitos.
Destacou como autores de referência de sua atuação profissional Marilda
Villela Iamamoto e José Paulo Netto. Não exerce supervisão de estágio na
instituição. Utiliza como instrumentos/procedimentos técnicos para sua atuação
profissional os relatórios sociais, visitas domiciliares, reuniões de equipe e
entrevista. Participa semestralmente das capacitações oferecidas
pela
instituição. Informou que participa mensalmente das reuniões da equipe
técnica. Destacou como atribuição específica da profissão que exerce na
instituição os benefícios eventuais. As questões éticas que norteiam seu
trabalho cotidiano são o respeito e valorização das famílias atendidas, o
interesse em resolver, encaminhar e orientar as demandas atendidas.
Destacou que escolheria outra profissão pela desvalorização e precarização
existente
na
profissão,
como
também
desenvolvimento e crescimento profissional.
pela
falta
de
incentivo
no
49
 Pedra do Sol: 39 anos, casada. Professa a religião católica. É assistente social
terceirizada da instituição e trabalha sob o regime das 30horas semanais.
Compõe a equipe técnica de referência e trabalha há 4 anos no CREAS
Regional. Teve outra experiência profissional antes da atual, a saber, no
CREAS do município de Quixadá. Concluiu sua graduação em 2008.2 na
Universidade Estadual do Ceará. Dentre as atividades propostas em sua
graduação participou do movimento estudantil, estágio supervisionado em
Serviço Social, estágio extracurricular e participou de eventos científicos sem
publicação de trabalho. Em sua atuação profissional já participou de encontros
do
conjunto
CFESS-CRESS
e
Conferências
Estaduais,
Conferências
Municipais e Conselhos de Direitos. Destacou como autores de referência de
sua atuação profissional Marilda Villela Iamamoto, José Paulo Netto e Karl
Marx.
Exerce
supervisão
de
estágio
na
instituição.
Utiliza
como
instrumentos/procedimentos técnicos para sua atuação profissional os
relatórios sociais, visitas domiciliares, pareceres sociais, reuniões de equipe,
entrevista, palestras e acrescentou a facilitação de capacitações. Participa
semestralmente das capacitações oferecidas na instituição. Informou que
participa mensalmente das reuniões da equipe técnica. Não destacou as
atribuições específicas da profissão e nem as questões éticas que norteiam
seu trabalho cotidiano. Destacou que não escolheria outra profissão porque a
profissão de Serviço Social contempla dentre os conhecimentos a satisfação de
sua escolha, tendo a teoria em muitos momentos distante da prática, mas em
outros a resolutividade na prática de muitas denúncias.
Estas são as participantes deste estudo, testemunhas oculares do
universo que pretendemos desvendar. Desta feita, procuramos neste capítulo
apresentar a você leitor/a, as motivações e inquietações que impulsionaram a
realização deste estudo, bem como o contexto em que se situa o recorte deste
objeto, os passos empreendidos no percurso metodológico, o conhecimento do
lócus da pesquisa e quem são os atores sociais que compõem esta investigação.
Todos estes elementos possibilitaram traçar um desenho inicial sobre esta
inquietação que nos motiva – a atuação da/o assistente social – e serviram de
alicerce para as mediações que buscamos plasmar e as descobertas que surgiram
neste estudo.
50
Convidamos o/a leitor/a a adentrar neste universo instigante da pesquisa,
onde procuraremos nos capítulos seguintes articular o desenho inicial traçado com
as respectivas reflexões teóricas que possibilitaram a melhor compreensão e
dialética sobre a atuação profissional das/os assistentes sociais no referido lócus, a
saber, CREAS Regional, recorte que na verdade, traduz a atuação da categoria
profissional.
51
CAPÍTULO II
O SERVIÇO SOCIAL COMO OBJETO DE ESTUDO: TRABALHO E COTIDIANO
DA ATUAÇÃO PROFISSIONAL
“Todo começo é difícil em qualquer ciência.”
Karl Marx.
52
Na intenção de traçarmos um desenho teórico que auxilie reflexões
acerca deste objeto de estudo, tratamos neste capítulo de compartilhar com o/a
nobre leitor/a posicionamentos de autores clássicos e contemporâneos sobre a
categoria trabalho – desde sua concepção clássica às repercussões do mundo do
trabalho no modelo de produção capitalista contemporâneo –, articulando aos
estudos produzidos e defendidos pelo Serviço Social nesse âmbito. Não obstante,
buscaramos refletir através da categoria cotidiano como as particularidades do
espaço sócio-ocupacional incidem sobre a atuação dos/as assistentes sociais e
como esta atuação profissional se mantém e/ou se transforma nos referidos
espaços.
Consideramos estas concepções teóricas pertinentes para o delinear
científico que pretendemos apresentar. Refletir sobre o lugar que esta profissão
ocupa na realidade social mediante suas configurações – seja no mundo do
trabalho, nas políticas sociais, na conjuntura brasileira e na própria categoria
profissional –, bem como a incidência de sua atuação profissional nessas
configurações
são
aspectos
que
buscaremos
trazer
em
discussão
no
posicionamento defendido de que a atuação do/a assistente social é trabalho que
repercute mediações importantes no cotidiano profissional e institucional.
2.1 Concepções Clássicas e Contemporâneas acerca da categoria trabalho
O homem42 tem necessidades e anseios, contudo, diferente dos outros
animais, sempre buscou satisfazê-los encontrando formas e/ou maneiras de
concretizá-los a partir dos recursos de que dispõe. Para a satisfação destas
necessidades, o homem relaciona-se com a natureza de tal forma que se torna
capaz de transformá-la e objetivá-la materialmente. A esta inter-relação dá-se o
nome de trabalho.
42
Ao destacar ao longo deste ensaio monográfico o termo “homem”, não estamos nos referindo à
variação de gênero que remete ao masculino, mas ao sinônimo deste termo a outros destacados
nesta monografia como, por exemplo, gênero humano, ser humano, ou seja, trata-se da espécie
humana, da humanidade.
53
Para Marx (1987, p. 202), “o trabalho é um processo de que participam o
homem e a natureza, processo em que o ser humano com sua própria ação,
impulsiona, regula e controla seu intercâmbio material com a natureza”.
Qualquer que seja a ação realizada por outros animais, estas são apenas
formas de adaptações destes seres ao próprio ambiente. Ao contrário, a interrelação estabelecida entre o gênero humano e a natureza pelo trabalho pressupõe
uma possibilidade de desenvolvimento ulterior43 conferindo-lhe um nível de
sociabilidade que situa o gênero humano no processo histórico de reprodução da
vida social. É pelo trabalho que o homem defronta-se com a natureza e incide sobre
esta todas as suas potencialidades físicas e mentais, a fim de se apropriar dos
recursos que a natureza disponibiliza para transformá-los em algo útil para sua vida
(MARX, 1987).
Esta atividade desenvolvida pelo ser humano é oriunda de uma dimensão
teleológica, que podemos defini-la como a capacidade de objetivar antecipadamente
na consciência o que anseia transformar para a reprodução de sua vida. Atua,
portanto na causalidade – relações complexas de causa e efeito – dos objetos
naturais. Como destaca Marx (1987), em sua comparação entre abelha e o
arquiteto, o que os distingue é o fato de o arquiteto já idealizar em sua mente a
construção do objeto antes de transformá-lo materialmente. Imprime a este objeto
todas as características anteriormente pensadas constituindo “a lei determinante do
seu modo de operar e ao qual tem de subordinar sua vontade” (MARX, 1987, p.
202).
Por este processo o gênero humano evidencia a sua práxis, como ação
consciente e crítica executada de forma ordenada em todo o processo de trabalho
para concretizar o que outrora foi idealizado, “atuando assim sobre a natureza
externa e modificando-a, ao mesmo tempo modifica sua própria natureza” (MARX,
1987, p.202). Assim, o trabalho constitui-se como atividade comum a todos os seres
43
Este desenvolvimento ulterior pode ser definido como o nível de sociabilidade estabelecido entre os
homens pelo trabalho.
54
humanos, que garante a reprodução da vida material, sendo eminentemente
ontológico44 a estes seres como mediação entre a necessidade e a realização desta.
Corroborando
com
Marx,
Lukács
(2010)45
aponta
importantes
considerações acerca do caráter ontológico do trabalho. O autor destaca como uma
das novidades do pensamento marxiano a inter-relação estabelecida pelo trabalho
entre o ser social e as formas orgânicas e inorgânicas da natureza.
Somente o trabalho tem na sua natureza ontológica um caráter claramente
transitório. Ele é em sua natureza uma inter-relação entre homem e
(sociedade) e natureza, tanto com a natureza inorgânica (...), quanto com a
orgânica, inter-relação (...) que se caracteriza acima de tudo pela passagem
do homem que trabalha, partindo do ser puramente biológico ao ser social
(...). Todas as determinações que, conforme veremos, estão presentes na
essência do que é novo no ser social estão contidas in nuce no trabalho. O
trabalho, portanto, pode ser visto como um fenômeno originário, como
modelo, protoforma do ser social (...). (LUKÁCS, 1980 apud ANTUNES,
1999, p. 136). (grifo nosso).
Para Lukács (2010), o trabalho é a atividade humana que apresenta a
especificidade de transformação de uma atividade puramente natural em uma
atividade objetiva, pensada previamente a um fim estabelecido, ou seja, o pôr
teleológico. “O trabalho é a unidade entre o pôr efetivo de uma dada objetividade e a
atividade ideal prévia diretamente regida e mediada por uma finalidade específica”
(LUKÁCS, 2010, p.20).
No que concerne à causalidade e à teleologia46, Lukács (2010) também
reforça os pressupostos apontados por Marx. Segundo aquele autor, a capacidade
de ideação teleológica do trabalho sobre as condições causais da natureza
44
Netto (1978, p. 70-71) destaca o entendimento de Lukács sobre ontologia como sendo “a
modalidade real e concreta da existência do ser, a sua estrutura e movimento. O marxismo é posto
por Lukács, nesta perspectiva, como a pesquisa materialista e dialéctica da ontologia do ser social —
pressupondo, necessariamente, uma dialéctica da natureza. Para Lukács, aliás, todos os enunciados
concretos [de Marx]... em última análise... são enunciados directos sobre um tipo de ser— isto é, são
puras afirmações ontológicas”. Cf. NETTO, José Paulo. Lukács e a Crítica da Filosofia Burguesa.
Lisboa: Seara Nova, 1978.
45
Em sua obra A Ontologia do Ser Social, Lukács (2010, p.22) procura “reexaminar passo a passo as
categorias fundamentais do pensamento de Marx, iniciando pela retomada das considerações
marxianas acerca do trabalho como complexo central decisivo do ser social, passando pelo problema
da reprodução, da ideologia, e culminando no tratamento da alienação”. Cf. LUKÁCS, György.
Prolegômenos para uma ontologia do ser social: questões de princípios para uma ontologia hoje
tornada possível. Tradução de: Lya Luft e Rodnei Nascimento. Supervisão editorial de: Ester
Vaisman. São Paulo: Boitempo, 2010.
46
Cf. LUKÁCS, 2010, p. 39-40, nota de rodapé.
55
possibilitam o salto transformador da condição humana, e o surgimento de uma nova
objetividade que constitui o trabalho como uma categoria qualitativamente nova na
ontologia do ser social.
[...] o trabalho introduz no ser a unitária inter-relação, dualisticamente
fundada, entre teleologia e causalidade; antes de seu surgimento havia na
natureza apenas processos causais. Em termos realmente ontológicos, tais
complexos duplos só existem no trabalho e em suas conseqüências sociais,
na práxis social. O modelo do pôr teleológico modificador da realidade
torna-se, assim, fundamento ontológico de toda práxis social, isto é,
humana. (LUKÁCS, 2010, p. 40-41).
Sobre a práxis social, Lukács (2010, p. 292-293) acrescenta:
Temos aqui à nossa frente ambos os lados da conditio humana que Marx
concebe. De um lado, o referente ao ser, a atividade, a práxis como aquilo
que torna humanos os seres humanos, aquilo que faz surgir, da dialética
interna de sua práxis associada, o mundo dos seres humanos; do outro
lado, as objetividades dadas, socialmente mediadas, dos objetos de uma tal
práxis nas objetividades dos fatos naturais, já elaboradas pela práxis social
ou ainda intactas. Na interação entre os dois “mundos” realiza-se a práxis, a
atividade humana. Dela emerge a consciência sempre relativa, como
precondição indispensável da nova adaptação ativa ao ambiente. A
consciência é, em sua gênese no plano ontológico, nada mais do que o
momento fundante indispensável desse novo processo de ser. (grifos
originais).
Assim, concordamos com Marx e Lukács ao afirmarem que o trabalho é o
ato produzido pelo homem que lhe confere uma identidade social, pois só será
possível “falar razoavelmente em ser social quando entendermos que sua gênese,
seu elevar-se em relação à sua própria base e a aquisição de autonomia, se baseia
no trabalho, na realização contínua de posições teleológicas”. (LUKÁCS, 1980, p. 9
apud ANTUNES, 1999, p. 137).
Retomando as concepções de Marx, o autor afirma que o processo de
trabalho além da relação homem-natureza também envolve o trabalho, o objeto de
trabalho e os meios de trabalho47. Como já fora abordado, este processo atua para
um determinado fim e se encerra ao materializar o produto. Todo produto oriundo do
processo de trabalho possui um valor-de-uso, ou seja, torna-se um material da
47
Como trabalho, compreendemos a própria atividade já definida neste texto anteriormente; como
objeto de trabalho, a matéria em que o trabalho incide, e como meios de trabalho, os mecanismos
utilizados para dirigir a atividade laboral ao objeto. Aos três elementos que compõem o processo de
trabalho chamamos meios de produção (MARX, 1987).
56
natureza transformado pelo gênero humano e com utilidade adaptada às
necessidades humanas. E não somente isso, os produtos do trabalho assumem a
forma de mercadoria48, adquirindo um duplo caráter de ser não apenas um valor-deuso, mas e, sobretudo, um valor-de-troca49, pois são produzidos para serem
vendidos. Desse modo, o que se objetiva no processo de produção capitalista é o
processo de valorização do capital, ou seja, a produção de mais-valia. Conforme
Marx (1987, p. 210-211):
[...] nosso capitalista não é movido por puro amor aos valores-de-uso.
Produz valores-de-uso apenas por serem e enquanto forem substrato
material, detentores de valor-de-troca. Tem dois objetivos. Primeiro, quer
produzir um valor-de-uso, que tenha um valor-de-troca, uma artigo
destinado a venda, uma mercadoria. E segundo, quer produzir uma
mercadoria de valor mais elevado que o valor conjunto das mercadorias
necessárias para produzi-las, isto é, a soma dos valores dos meios de
produção e força de trabalho, pelos quais antecipou seu bom dinheiro no
mercado. Além de um valor-de-uso quer produzir mercadoria, além de valorde-uso, valor, e não só valor, mas também valor excedente (mais-valia).
Desse modo, o valor-de-uso que produz um trabalho real e concreto não
consegue refletir por ele mesmo a medida de valor nele corporificado. É preciso,
portanto, separar o trabalho de sua forma real e concreta para visualizar o valor
materializado no produto em sua dimensão abstrata. O trabalho então adquire um
caráter dual, pois ao ser gerador de valor-de-uso e de valor, distingue e produz a
inter-relação entre trabalho concreto e trabalho abstrato.
Ao desaparecer o caráter útil dos produtos do trabalho, também desaparece
o caráter útil dos trabalhos nêles corporificados, desvanecem-se, portanto,
as diferentes formas de trabalho concreto, elas não mais se distinguem
umas das outras, mas reduzem-se tôdas a uma única espécie de trabalho, o
trabalho humano abstrato. (MARX, 1987, p. 44-45).
Todo trabalho concreto é, portanto, produtor de valor-de-uso. O ser
humano não pode viver sem suprir suas necessidades e só pode fazê-lo na medida
em que trabalha. “O trabalho, como criador de valores de uso, como trabalho útil, é
indispensável à existência do homem, – quaisquer que sejam as formas de
sociedade [...]” (MARX, 1987, p.50). Na apropriação privada da produção, o trabalho
48
“A mercadoria é, antes de mais nada, um objeto externo, uma coisa que, por suas propriedades,
satisfaz necessidades humanas, seja qual for a natureza, a origem delas, provenham do estômago ou
da fantasia”. (MARX, 1987, p. 41).
49
“O valor-de-troca revela-se na relação quantitativa entre valores-de-uso de espécies diferentes, na
proporção em que se trocam, relação que muda no tempo e no espaço”. (Ibid., p.43).
57
deixa de ser atividade útil, livre e consciente para ser controlado e surgir como
trabalho abstrato – gerador de valor – pela exploração máxima da força de trabalho,
meios de produção e tempo de trabalho socialmente necessário 50 produzindo a
chamada mais-valia, ou seja, o lucro gerado ao capitalista por esta máxima
exploração.
Conforme já pontuamos, o trabalho em seu sentido ontológico consitui-se
como dimensão fundante do ser social, independente da forma de sociedade
vivenciada. Contudo, “o trabalho também é historicizado. Ou seja, necessita ser
situado sob determinada formação social” (ARAÚJO, 2008, p. 11). É importante
ressaltarmos essa especificidade do trabalho, porque na sociedade capitalista o
trabalho assume outro sentido sócio-histórico, diferente de seu sentido ontológico,
qual seja o sentido de trabalho assalariado, não mais importa o seu caráter útil, pois
é transformado em mercadoria e medido pelo seu tempo de duração (ARAÚJO,
2008).
Desse modo, na particularidade da sociedade capitalista, as condições
subjetivas de trabalho estão dissociadas das condições objetivas e essa constatação
torna-se evidente quando o trabalhador assume sua “condição” de indivíduo livre.
(ARAÚJO, 2008). Conforme Marx é liberdade:
[...] em um duplo sentido de que ele dispõe, como pessoa livre de sua força
de trabalho como sua mercadoria, e de que ele, por outro lado, não tem
outras mercadorias para vender, solto e solteiro, livre de todas as coisas
necessárias à realização de sua força de trabalho (MARX, 1985, p. 140
apud ARAÚJO, 2008, p. 11-12).
O trabalho que antes era realizador, um bem para o homem, nas relações
capitalistas de produção converte-se em trabalho assalariado. Sua alienação e
estranhamento destitui o gênero humano de sua força de trabalho, fazendo-o
submeter-se a quaisquer atividades por um preço que não contempla todo o seu
esforço. Ao vender sua força de trabalho, não se reconhece o produto de seu labor,
nem o faz de modo consciente, tão pouco este lhe pertence. Vejamos, portanto, qual
50
Por tempo de trabalho socialmente necessário compreendamos como o tempo de trabalho para a
produção de um valor-de-uso nas condições normais de produção social (MARX, 1987). No modo de
produção capitalista o tempo ideal para produção de um produto é excedido e utilizado para a
produção de mais produtos pela exploração da força de trabalho.
58
a compreensão das interlocutoras da pesquisa acerca do lugar ocupado pelo
trabalho em suas relações sociais.
Deveríamos ser mais bem remunerados, pois nosso trabalho perpassa por
situações muito delicadas que as pessoas vivem. Nosso trabalho não deixa
de ser um trabalho de risco e aqui nós não temos segurança, não
recebemos insalubridade, nada (Lápis lazuli).
[...] se não nos prepararmos para conseguir um lugar no mercado de
trabalho que é muito concorrido você vai ficar sempre “bitolado” no trabalho,
trabalhando, mas de forma insegura onde a gente não sabe se vai ficar no
emprego... Então assim... Vivemos de uma forma insegura (Ônix).
A questão do salário... Nosso salário é muito baixo e assim... Não a nossa
coordenação, mas a secretaria não olha para essa questão. A maioria dos
trabalhadores são terceirizados, há a precarização, o salário é bem inferior.
Os profissionais servidores aqui recebem 40% a mais de periculosidade
enquanto que nós recebemos o salário somente. Com relação à
terceirização esse ano ainda não aconteceu, mas o nosso contrato acaba e
começa outro e aí não tiramos férias e apesar deles pagarem pelas nossas
férias na rescisão, mas o que a gente quer é o descanso da gente (Ágata).
A
partir
destas
considerações,
fica
claro
que
as
profissionais
entrevistadas neste estudo identificam-se enquanto trabalhadoras assalariadas, ou
seja, o reconhecimento do trabalho vincula-se à dimensão do salário que no modelo
capitalista de produção adquire a forma de emprego mediante as relações de
compra e venda da força de trabalho. O trabalho na sociedade capitalista é
convertido em emprego a partir da relação salarial entre aquele que vende sua força
de trabalho e aquele que dita às condições de realização do trabalho. É importante
fazer essa ressalva da diferenciação de trabalho e emprego, a partir do relato das
interlocutoras, pois comumente os sujeitos não percebem esta distinção. Estes
relatos apontam como as transformações provenientes do mundo do trabalho
ocasionadas pelo modelo de produção capitalista repercutem no reconhecimento do
gênero humano nesta atividade51.
Concernente às transformações contemporâneas no mundo do trabalho,
Antunes (1999) destaca que a sociedade contemporânea tem vivido nas últimas
décadas, profundas transformações que atingem tanto as condições objetivas – no
51
A partir do que pontuamos sobre a historicidade do trabalho – em sua caracterização como
trabalho livre e trabalho assalariado – na sociedade capitalista, nossa linha de investigação parte em
defesa do Serviço Social como trabalho, onde o leitor/a poderá conhecer nossas bases de
argumentação na próxima seção.
59
âmbito estrutural do modo de produção vigente – quanto subjetivas – desta
sociedade, em virtude das complexas relações da sociabilidade humana.
A crise dos anos 1970, “teve suas raízes profundas numa crise secular de
produtividade que resultou do excesso constante de capacidade e de produção do
setor manufatureiro internacional” (BRENNER, 1999, p. 12-13 apud ANTUNES,
1999, p. 31). Suas expressões fenomênicas foram a crise do fordismo/taylorismo e
do keynesianismo e tiveram como resposta de ação do capital a chamada
reestruturação produtiva52 e o neoliberalismo 53 que trouxeram significativas
mudanças para o mundo do trabalho como, por exemplo, condições precarizadas de
trabalho,desemprego estrutural, dentre outros. Estas mudanças fragmentam cada
vez mais a sociabilidade humana.
Para
Antunes
(1999),
estas
são
consequências
de
uma
(des)sociabilização que introduzem novas dimensões de organização societal
carregadas de elementos fetichizadores que vão
[...] desde o culto da “sociabilidade democrática”, que teria finalmente
realizado a utopia do preenchimento, até a crença da desmercantilização da
vida societal, no fim das ideologias, no advento de uma sociedade
comunicacional capaz de possibilitar uma interação subjetiva, por meio de
novas formas de intersubjetividade. Ou ainda aquelas que visualizam o fim
do trabalho e a realização concreta do reino do tempo livre dentro da
estrutura global da reprodução societária vigente. (ANTUNES, 1999, p. 1516). (grifos originais).
Esses discursos enfocam a “ideia” de que as consequências da
reestruturação produtiva e do neoliberalismo devem ser internalizadas, pois as
mudanças no mundo do trabalho são necessárias a uma sociabilidade “melhor para
todos”. Contudo, o que está velado é o empenho e a permanência de uma
52
Antunes (1999, p. 36) destaca que a reestruturação produtiva do capital tratava-se de “reestruturar
o padrão produtivo taylorista / fordista, procurando, desse modo, repor os patamares de acumulação
existentes no período anterior, especialmente no pós-45, utilizando-se, como veremos, de novo e
velhos mecanismos de acumulação.” Cf. ANTUNES, Ricardo. Os Sentidos do Trabalho: Ensaio sobre
a afirmação e negação do trabalho. São Paulo: Boi Tempo, 1999.
53
Segundo Sandroni (2004, p. 421), os neoliberais “defendem o disciplinamento da economia, não
para asfixiá-la, mas para garantir-lhe sobrevivência, pois, ao contrário dos antigos liberais, não
acreditam na autodisciplina espontânea do sistema. [...]. O disciplinamento da ordem econômica seria
feito pelo Estado, para combater aos excessos da livre-concorrência, e pela criação dos chamados
mercados concorrenciais”. Cf. SANDRONI, Paulo. Novíssimo Dicionário de Economia. 13. ed. São
Paulo: Best Seller, 2004.
60
sociabilidade
que
particularidades
e
(des)sociabiliza,
os
ou
descaracteriza
seja,
em
extrai
seu
dos
indivíduos
reconhecimento
suas
enquanto
trabalhadores54.
Fundamentando-se em Mészáros, Antunes (1999) destaca que no
processo de reestruturação produtiva, o sistema de metabolismo social55 nasce
desta subordinação do trabalho ao capital que se processou historicamente e que
ocorreu independente de determinação ontológica. Este metabolismo apresenta-se
dividido entre mediações de primeira ordem e mediações de segunda ordem.
As mediações de primeira ordem buscam satisfazer as necessidades
básicas do ser humano, em uma ação consciente e de inter-relação com a natureza.
Nesta mediação não há aprisionamentos, o homem é livre para usufruir dos meios
de produção disponíveis na natureza e estabelecer mediações “cuja finalidade é a
preservação da vida e da organização societal” (ANTUNES, 1999, p. 19). As
mediações de segunda ordem correspondem ao processo de (des)sociabilização
que introduz “elementos fetichizadores e alienantes de controle social metabólico”
(ANTUNES, 1999, p. 20), haja vista que sua constituição ocorre paralelo a
constituição do sistema do capital.
Harvey (1992 apud ANTUNES, 2011) destaca que o processo de
acumulação flexível do capital iniciado no pós década de 1970 caracteriza-se
justamente pela flexibilidade – que não significa ausência de rigidez e sim
intensificação mediante a variação dos mercados – dos processos de trabalho a
partir do surgimento de novos setores de produção, novos fornecimentos
54
Em meio a este processo, Antunes destaca o discurso empreendido acerca da perda da
centralidade da categoria do trabalho nas relações sociais, também conhecida como “fim do
trabalho”. O referido autor não corrobora com esse discurso, ao contrário, argumenta que “[...] o que
se pode presenciar no mundo contemporâneo é uma maior inter-relação, uma maior interpenetração
entre as atividades produtivas e as improdutivas, entre as atividades fabris e de serviços entre as
atividades laborativas e as atividades de concepção, que se expandem no contexto da reestruturação
produtiva do capital. O que remete ao desenvolvimento de uma concepção ampliada para se
entender sua forma de ser do trabalho no capitalismo contemporâneo, e não à sua negação.”
(ANTUNES, 2011, p. 178). (grifos originais). Cf. ANTUNES, Ricardo. Adeus ao Trabalho? Ensaio
sobre as metamorfoses e a centralidade no mundo do trabalho. 15. ed. São Paulo: Cortez, 2011.
55
Partimos do entendimento que o metabolismo social refere-se a uma mudança da natureza social
instaurada, a partir da reestruturação produtiva incutindo à vida social novas formas fetichizadoras de
sociabilidade. Antunes (1999) destaca as considerações de Mészáros sobre este conceito. Cf.
MÉSZÁROS, István. Beyond Capital (Towards a Theory of Transition), Merlin Press, Londres, 1995.
61
financeiros, novos mercados e taxas intensificadas de inovação comercial,
tecnológica e organizacional. O autor desenvolve a tese de que sendo a acumulação
flexível uma forma própria do capitalismo conserva três características desse modo
de produção, quais sejam: 1) É sempre voltado para o crescimento; 2) Este
crescimento se apoia na exploração do trabalho vivo; 3) O fato de o capitalismo
manter uma intrínseca dinâmica tecnológica e organizacional.
Desse modo, as consequências da reestruturação produtiva a partir do
modelo de acumulação flexível foram tão intensas no mundo do trabalho
objetivamente e subjetivamente que julgamos pertinente apresentar algumas
metamorfoses do mundo do trabalho indicadas por Antunes (2011) que exemplificam
a incidência dessas transformações na classe-que-vive-do-trabalho56, classe onde
as/os assistentes sociais se inserem.
Houve uma desproletarização do trabalho industrial fabril, haja vista que,
paralelo à diminuição do trabalhador industrial tradicional, ocorreu um expressivo
aumento do trabalho assalariado pela ampliação do setor de serviços (ANTUNES,
2011).
As implicações também ocorreram na dimensão de gênero com a
heterogeneização do trabalho, ou seja, a inserção da mulher no mercado de trabalho
que exacerbou a exploração de sua força de trabalho. O que leva a refletir que
paralelo às contradições existentes entre indivíduo e sua classe, também persistem
aquelas oriundas entre classe e gênero, diversificando e complexificando as
relações de trabalho, de modo que além da relação capital/trabalho recaem sobre a
mulher as tiranias contidas na relação homem/mulher. (ANTUNES, 2011). No que se
refere à profissão de Serviço Social:
56
Termo utilizado por Antunes (1999) para dar legitimidade contemporânea ao conceito de classe
trabalhado de Karl Marx. O autor pretende com este termo dar magnitude ao ser social que trabalha
apreendendo sua processualidade histórica e enfatizando o sentido atual de classe trabalhadora
mediante as inúmeras tensões que desejam desconstruir a noção de classe e o fim do trabalho. A
classe-que-vive-do-trabalho, portanto, engloba os trabalhadores que vendem sua força de trabalho
compondo os trabalhadores produtivos do capital na geração do trabalho manual direto e os
trabalhadores improdutivos que não geram diretamente mais-valia, mas são utilizados pelo capital
enquanto geradores de valor-de-uso como os trabalhadores dos setores de serviços.
62
[...] embora ainda existam hoje práticas voltadas a caridade, a filantropia
que é aquela história da origem do serviço social, do seu surgimento como
trabalho feminino. Até mesmo as pessoas para quem trabalhamos não tem
a noção do que é o trabalho do assistente social [...]. Nosso trabalho é
importante, mas não é tão valorizado. (Ônix).
A subalternidade57 da profissão antes vista por ser estritamente feminina,
insiste em permanecer na categoria de assistentes sociais com o acréscimo – no
nosso entendimento – de novas justificativas como, por exemplo, que o trabalho
do/a assistente social não é um trabalho especializado, pois “qualquer” pessoa pode
exercê-lo e, desse modo, não se dá credibilidade aos/às assistentes sociais que,
como os/as demais trabalhadores/as que vendem a sua força de trabalho, acabam
tendo que se conformar com encargos que não contemplam o nível de sua
especialização.
Outras tendências também são evidentes, como o desemprego estrutural,
que se estabelece em escala global, e a subproletarização, que expande alternativas
informais de trabalho como, por exemplo, o trabalho parcial, temporário e
terceirizado, imprimindo também formas desregulamentadas e flexíveis de direitos
em uma estratégia de desregulamentação dos direitos na perspectiva da
acumulação capitalista que permite ao capital controlar ainda mais as relações
sociais. “Direitos flexíveis de modo a dispor desta força de trabalho em função das
necessidades do mercado consumidor.” (ANTUNES, 2011, p.34). Uma das
interlocutoras da pesquisa faz a seguinte leitura acerca das repercussões da
terceirização do trabalho no Serviço Social:
[...] a questão da terceirização é um fator negativo, por outro lado, o governo
também não abre concurso e aí a situação vai ficando sempre desse jeito
porque a gente também precisa de emprego. É aquela questão que Marilda
sempre coloca “como profissional inserido no mercado de trabalho o
assistente social acaba tendo que se adequar nessas circunstâncias”.
(Ágata).
Corroborando com as considerações de Ágata, Raichelis (2011, p. 431)
ressalta que “os efeitos da tríade flexibilização/precarização/terceirização do trabalho
57
O caráter subalterno da profissão refere-se ao fato do Serviço Social constituir-se em suas
protoformas como uma profissão exercida somente por mulheres. Netto (2011) destaca que a
institucionalização do Serviço Social que ocasionou a ruptura com o voluntariado não propiciou, na
mesma medida, a ruptura com a subalternidade da profissão como sendo eminentemente feminina.
Cf. NETTO, José Paulo. Capitalismo Monopolista e Serviço Social. 8.ed. São Paulo: Cortez, 2011.
63
do assistente social se fazem sentir em níveis e intensidade antes desconhecidas
pela profissão” e aponta alguns efeitos da terceirização para o trabalho social, a
saber, a desconfiguração do significado do trabalho especializado do/a assistente
social; o deslocamento das relações entre a população e a gestão estatal, tendo
como intermediárias das relações contratuais as empresas particulares; a falta de
fortalecimento de vínculos com os usuários dos serviços e/ou descontinuidades dos
serviços mediante os limites contratuais e a separação entre direito e prestação de
serviço (RAICHELIS, 2011).
Essas são tendências presentes no trabalho do/a assistente social que na
ótica do capital, o Serviço Social, como as demais profissões está inserido, mas não
totalmente sujeito, pois é possível criar espaços de fortalecimento e de luta através
de profissionais qualificados/as e conscientes de sua atuação profissional para
enfrentar as pressões do capital.
2.2 A Atuação Profissional do Serviço Social como trabalho
Por que discutimos as concepções de Marx, Lukács e Antunes até aqui?
Porque estes são os rebatimentos que originalmente incidem sobre as/os
trabalhadores/as e que persistem na contemporaneidade, assumindo novas formas
de subordinação. Por isso, a historicidade do trabalho e sua importância para a
sociedade não pode ser perdida de vista – principalmente ao se discutir sobre
categorias profissionais –, a fim de se evitar a naturalização da história do trabalho.
Como compreender a atuação profissional do/a assistente social a partir
destes apontamentos? O Serviço social como profissão circunscrita na divisão social
e técnica do trabalho também sofre os mesmos rebatimentos em sua atuação
profissional que os demais trabalhadores. Faz-se necessário, portanto, compreender
como a profissão se situa nesta sociedade e suas transformações no contexto
histórico brasileiro. E ainda, a compreensão da historicidade da profissão articulada
à historicidade do trabalho são elementos cruciais para materialização de sua
atuação, ou seja, de seu trabalho na sociedade.
64
Temos a intenção de apresentar ao/a leitor/a nesta seção o caráter do
trabalho contido na profissão de Serviço Social tomando como base para nossa
discussão autores de referência da profissão. Estas argumentações articuladas aos
elementos da pesquisa empírica revelam dados existentes entre as condições de
trabalho e a atuação da profissão no lócus estudado mediante seus limites e
possibilidades presentes nas relações sociais.
O Serviço Social é definido como uma profissão “configurada como um
tipo de especialização do trabalho coletivo dentro da divisão social e técnica do
trabalho” (IAMAMOTO & CARVALHO, 2011, p.77) que participa da reprodução das
relações sociais e do processo contraditório contido historicamente nestas relações.
Situar o Serviço Social neste contexto significa compreender estas relações sociais
em seu próprio movimento e contradições que envolvem tanto os processos de
reprodução da força de trabalho e dos meios de sua produção, quanto a dimensão
de totalidade inerente a estes processos que abrangem as correlações de poder, os
antagonismos de classes e os sujeitos com suas lutas sociais.
O delinear histórico da atuação profissional do Serviço Social está
vinculado pela passagem do viés caritativo e filantrópico ao viés institucional no
momento em que “a questão social, pelo seu caráter de classe, demanda do Estado
mecanismos de intervenção não apenas econômicos, mas também políticos e
sociais” (RAICHELIS, 2011, p.423) com a prestação de serviços sociais. É nesta
passagem que o Serviço Social afirma-se como profissão no Brasil, associando-se
de modo particular ao setor público, mas também a outras instituições e/ou
organizações privadas voltadas à prestação de serviços sociais à população. “A
profissão se consolida, então, como parte integrante do aparato estatal e de
empresas privadas, e o profissional, como um assalariado a serviço das mesmas.”
(IAMAMOTO & CARVALHO, 2011, p. 86).
Apesar da regulamentação do Serviço Social como profissão liberal 58, não
se pode determinar esta regulamentação como característica que contemple
totalmente a profissão. Se, de um lado, o caráter liberal incorpora certos traços à
58
Portaria nº 35 de 19 de abril de 1949 do Ministério de Trabalho, Indústria e Comércio.
65
profissão – como, por exemplo, uma orientação normativa de posicionamento ético –
em contrapartida, o/a assistente social não exerce de forma independente suas
atividades, pois não detém as condições materiais para sua atuação nem, tão
pouco, seu completo controle.
O trabalho do Assistente Social se insere numa relação de compra e venda
de mercadorias em que sua força de trabalho é mercantilizada. Aí se
estabelece uma das linhas divisórias entre a atividade assistencial
voluntária, desencadeada por motivações puramente pessoais e idealistas,
e a atividade profissional que se estabelece mediante uma relação
contratual que regulamenta as condições de obtenção dos meios de vida
necessários à reprodução desse trabalho especializado. Passa esse agente
a receber um salário, preço de sua mercadoria força de trabalho em troca
de serviços prestados, determinado como o preço de qualquer outra
mercadoria, ingressando sua atividade no reino do valor. Uma das précondições para tal ingresso é a transformação de sua força de trabalho em
mercadoria e de seu trabalho em atividade subordinada à classe capitalista,
para efetivar-se à medida que, conforme já acentuamos, não se afirma
historicamente como uma profissão liberal. (IAMAMOTO & CARVALHO,
2011, p. 92).
Por este motivo, não é possível proceder qualquer análise da profissão
sem inseri-la no contexto das instituições onde a atuação profissional é exercida
correndo o risco de não abranger por completo as nuances existentes entre o
Serviço Social, as referidas instituições e as relações sociais estabelecidas nestes
espaços. Reduzir em si mesma a análise da atuação profissional, sem articular estes
processos, é um equívoco.
Assim, concordamos com Iamamoto e Carvalho (2011) na afirmativa de
que o trabalho do/a assistente social se insere nas relações sociais mediante a
relação de compra e venda de sua força de trabalho, que opera como mercadoria e
como valor determinando sua atuação profissional especializada como atividade
submetida ao empresariado e – com maior frequência – ao Estado para execução
de diversas atribuições nas políticas sociais, haja vista que o Estado é o maior
contratante do trabalho do/a assistente social. Reforçando esta afirmativa, uma das
interlocutoras da pesquisa disse:
O Estado deve dar subsídios para uma execução dos serviços satisfatória.
Pena que nossos profissionais não são tão reconhecidos. (Lápis Lazuli).
66
Iamomoto (2011a) aponta que neste contexto das relações sociais, o
trabalho do/a assistente social emerge na sociedade em uma dupla conjunção, a
saber, como trabalho concreto e trabalho abstrato.
Enquanto trabalho concreto a “dimensão teleológica do trabalho do
assistente social” (IAMAMOTO, 2011a, p. 416) acontece mediante a execução plena
de sua atividade naquilo a que a profissão se destina a fazer – atuar na viabilização
dos direitos e na promoção da cidadania e emancipação humana. Sua utilidade
social como trabalho concreto se reflete sobre a vida dos sujeitos através de
serviços, programas e projetos, de forma a responder as necessidades sociais e
materiais da população pela via das políticas públicas.
Na execução destas atividades é que o Serviço Social aponta a qualidade
específica de seu trabalho, imprimindo legitimidade – adquirida em sua formação
universitária – a sua atuação profissional, firmando-se como sujeito profissional, pois
se “trata de uma atividade inscrita predominantemente no terreno político e
ideológico, com refrações nas condições materiais da existência dos sujeitos”
(IAMAMOTO, 2011a, p. 418).
Enquanto trabalho abstrato, o/a assistente social ingressa no mercado de
trabalho como proprietário de sua força de trabalho. Contudo, sua atividade
teleológica somente se efetiva quando articulada a condições e recursos
necessários para sua realização, que se encontram à disposição dos empregadores
institucionais. Desse modo, o/a assistente social se insere no contexto do trabalho
coletivo, ingressando nestas instituições e estando sujeito aos ditames e às
condições estabelecidas por seus empregadores, o que repercute diretamente em
sua relativa autonomia (IAMAMOTO, 2011a). Assim, o Serviço Social, como uma
profissão pertencente às relações sociais de produção, está sujeito às mesmas
implicações do capital como outros trabalhadores e, do mesmo modo, geradora de
mais-valia mediante a influência do trabalho abstrato em sua atuação. A partir desta
particularidade do trabalho profissional do/a assistente social, Ônix destacou:
[...] trabalhamos sob o regime das trinta horas e como estamos sob contrato
terceirizado que tem um período para se encerrar o Estado não cria vínculo
conosco e isso acaba tirando direitos que poderíamos adquirir com a
67
estabilidade no trabalho. Atuamos na violação de direitos e estamos sujeitos
a todos os riscos, mas não temos insalubridade... Não somos valorizados
enquanto profissionais. (Ônix).
Segundo Araújo (2008, p. 15), o caráter de especialização do trabalho do
Serviço Social surge para “suprir as necessidades que surgem do processo de
produção e reprodução da vida social”.
Com esta citação, ressaltamos que a dimensão do trabalho especializado
do/a assistente social decorre de sua atuação tanto na dimensão daquilo que é
material e palpável quanto daquilo que é imaterial, mas que é socialmente
necessário59 como, por exemplo, a dimensão dos direitos e do acesso aos serviços
sociais nas políticas públicas. Além desta particularidade o respaldo para este
caráter especializado advém da conjuntura histórica na qual a profissão foi gestada,
do processo de formação acadêmica que confere ao/a profissional arcabouço teórico
e crítico para plasmar mediações – aliado aos instrumentos que o/a assistente social
utiliza em sua atuação – e do direcionamento ético-político seguido pela profissão.
Portanto, há de se considerar que em uma sociedade complexificada
como a sociedade capitalista a utilidade social da profissão inevitavelmente recai
sobre estas dimensões que são socialmente necessárias, mas que não são
materialmente palpáveis, como “no campo do conhecimento, dos valores, dos
comportamentos, da cultura, que, por sua vez, têm efeitos reais interferindo na vida
dos sujeitos”. (IAMAMOTO, 2011b, p. 68).
Nestes termos, constatamos que a dimensão ontológica do trabalho
também se estende a todas estas complexificações da sociedade. Dessa forma, a
partir das argumentações sobre a caracterização do trabalho do Serviço Social na
concepção de trabalho concreto e abstrato, bem como as argumentações desse
processo de complexificação da sociedade que atribuem condições materiais e
imateriais de intervenção, defendemos que as argumentações apresentadas dão o
59
Cf. Iamamoto (2011b).
68
devido suporte a tese que fundamenta a atuação do Serviço Social como trabalho na
sociedade60.
Um dos objetivos que traçamos nesta pesquisa foi investigar as condições
de trabalho e a atuação dos/as assistentes sociais na viabilização dos direitos,
perspectiva que nos conduz a refletir sobre os limites e possibilidades que os
espaços institucionais apresentam aos/as assistentes sociais no exercício de sua
atuação profissional.
Sob este prisma, Yazbek (2009) argumenta que a atuação profissional
do/a assistente social realiza-se pela mediação entre Estado, instituição e classes
subalternas. É a partir do desvelamento dessas mediações poderão ser apreendidos
os espaços institucionais e suas políticas socioassistenciais. Corroborando com a
autora supracitada, Barbosa et al (1998, p.111) destaca que o
[...] argumento para a requisição do trabalho do assistente social está
circunscrito às políticas sociais e às relações mantidas com as mesmas
pelos sujeitos sociais carentes de recursos privados na reprodução
espiritual e material no contexto das sociedades.
Diante disso, o/a assistente social não pode fugir da relação contraditória
que permeia sua atuação, ou seja, como participante dos interesses do capital e
participante das reivindicações, lutas e respostas da classe trabalhadora.
O espaço estatal, portanto, constitui-se como um espaço específico e
grande estimulador da atuação profissional, “onde o assistente social é convocado a
realizar as mais variadas atividades na administração de recursos e implementação
de serviços” (RAICHELIS, 2009, p. 380). Contudo, como os demais espaços de
trabalho, impõem determinadas condições objetivas à atuação profissional dos/as
assistentes sociais. Estas condições apoiam-se na condição de assalariamento
conferida aos assistentes sociais que podem ou não interferir em sua relativa
autonomia, e consequentemente, na efetivação de seu projeto profissional61.
60
Existe outro discurso defendido por alguns autores de que o Serviço Social não se caracteriza
como trabalho na sociedade, posicionamento que não será seguido nesta investigação. A este
respeito, Cf. Lessa (2000; 2007).
61
Destacaremos algumas reflexões sobre o Projeto Profissional do Serviço Social no capítulo III
deste ensaio.
69
Esta inserção, que inscreve o assistente social em uma relação de
assalariamento e o integra ao mercado de trabalho como um dos agentes
responsáveis pela execução de políticas engendradas no âmbito do Estado
e voltadas ao atendimento de sequelas da “questão social” [...]. (YAZBEK,
2009, p. 11).
Ao indagar as profissionais do CREAS Regional acerca do exercício de
sua relativa autonomia, colhemos estes relatos:
Existe. Conseguimos nos posicionar diante da instituição e em nosso
trabalho social procuramos dar ao usuário condições para que ele também
tome suas próprias decisões sem influenciá-lo. Mas, às vezes, nosso
trabalho se confunde. (Lápis Lazuli).
Aqui no CREAS eu visualizo que seja o profissional que for, consegue ter e
exercitar uma autonomia no seu fazer. Até porque, se nossos superiores
fossem tirar essa autonomia, então não adianta a gente tá aqui fazendo um
trabalho que a gente só pode fazer o que der. Então, eu vejo que nós temos
autonomia para decidir qual o melhor procedimento a ser tomado para os
nossos encaminhamentos, qual a melhor maneira de acompanhar aquela
demanda. (Ágata).
[...] a instituição nos dá bastante espaço para que tenhamos autonomia
para desenvolver nosso trabalho, mas o que atrapalha é essa rede de
serviços que é muito fragilizada (Pedra do Sol).
Em todas as falas as profissionais destacaram que as condições para o
exercício da relativa autonomia não são cerceadas no espaço institucional do
CREAS Regional, bem como as entrevistadas demonstraram segurança em suas
respostas no momento das entrevistas.
Ao mesmo tempo, em um dos relatos das profissionais citado acima é
possível constatar um dos fatores das condições de trabalho que dificultam a
atuação profissional, a saber, o que a Assistente Social Pedra do Sol destacou como
a “fragilização da rede”. Na verdade o que se desvela é a fragmentação das políticas
sociais que acabam dificultando a articulação das ações e o acesso dos usuários
aos serviços sociais. Em outro momento da entrevista, mas ainda em relação a este
assunto a referida profissional destacou: “Se eu tenho um equipamento funcionando
de 7 às 22h eu preciso ter todos os departamentos funcionando” (Pedra do Sol).
70
As condições de trabalho vêm reestruturando as funções destinadas ao
Serviço Social inserindo os/as profissionais nos mais diversos espaços sócioocupacionais e, consequentemente, a diversos empregadores e organizações de
trabalho. Portanto, compreendemos a relativa autonomia dos/as assistentes sociais
como elemento fundamental para a atuação profissional, pois é por meio desta
habilidade que o/a profissional exercita sua capacidade de propor, de intervir, de
mediar e de gerar consensos nos antagonismos de classes. Mas, sobretudo é por
intermédio da relativa autonomia que se torna possível fazer a defesa do projeto
profissional que baliza e dá sentido ao significado social da profissão na sociedade.
A realidade institucional com suas rotinas burocráticas desafiam os/as assistentes a
romper com a dimensão do instituído envolvendo “o assistente social como
intelectual capaz de realizar a apreensão crítica da realidade e do trabalho no
contexto dos interesses sociais e da correlação de forças [...]”. (RAICHELIS, 2011, p.
428).
2.3 O Cotidiano do trabalho do/a Assistente Social no CREAS
Tratamos de apresentar nesta seção os apontamentos de alguns autores
acerca da categoria cotidiano. À luz de suas concepções, buscamos elucidar
algumas questões que perpassam as dimensões do cotidiano institucional das
profissionais entrevistadas, questões essas, necessárias para compreendermos a
relação entre o espaço cotidiano e a atuação profissional das assistentes sociais no
CREAS Regional, a fim de descobrirmos as particularidades desta relação no campo
investigado.
Dizem que o cotidiano é rotina, pois são ações que repetimos todos os
dias e que passam despercebidas e imersas no pragmatismo e na imediaticidade.
Entendemos o cotidiano da vida como um espaço envolto de significados. Nossas
atividades diárias, decisões, ações, pensamentos e sentimentos refletem o que
somos e nos possibilitam entender por que somos desta ou daquela maneira, por
que fazemos o que fazemos, ou ainda, perceber as repercussões de determinadas
ações em nossas vidas. Contudo, esse mesmo cotidiano é mergulhado em forças
71
estranhas62 que nos apartam dessas dimensões sufocando-nos ante a oportunidade
de reconstruí-lo e reinventá-lo pelas nossas próprias experiências. Acreditamos ser
esse o desafio proposto à nossa sociedade: sobrepor a imediaticidade para
reinventar o espaço do cotidiano.
Portanto, pensar o Serviço Social no espaço do cotidiano dá margem ao
processo reflexivo de compreender os significados da profissão e como emergem
sobre os/as assistentes sociais mediante sua atuação profissional nos espaços
ocupacionais das instituições reinventando seus significados nas dimensões que
envolvem o seu trabalho profissional.
[...] as experiências cotidianas parecem minúsculos fragmentos isolados da
vida, tão distantes dos vistosos eventos coletivos e das grandes mutações
que perpassam a nossa cultura. Contudo, é nessa fina malha de tempos,
espaços, gestos e relações que acontece quase tudo o que é importante
para a vida social. É onde assume sentido tudo aquilo que fazemos e onde
brotam as energias para todos os eventos, até os mais grandiosos.
(MELUCCI, 2004, p.13 apud STECANELA, 2009, p. 70).
Ao se discutir sobre as repercussões do cotidiano na vida do ser social,
Heller (2008) apresenta a vida cotidiana como a vida de todo homem no sentido de
que são as ações cotidianas que nos conectam com nossa essência humanogenérica. A vida cotidiana também é definida pela autora como a vida do homem
inteiro. Nesta concepção, o ser humano participa da vida cotidiana na sua
integralidade e com todos os aspectos que dizem respeito a sua individualidade e
personalidade, ou seja, o homem põe em ação na cotidianidade todos os seus
sentidos e capacidades, mas o fato de exercê-los – ao mesmo tempo no cotidiano –
ocasiona que estas capacidades não se realizem em sua plenitude.
Acerca dos aspectos da vida cotidiana, Heller (2008) destaca no que se
refere a sua significação e conteúdo, que o cotidiano é heterogêneo e hierárquico. A
autora afirma que a heterogeneidade envolve em grande medida a realidade
cotidiana, pois o homem possui uma imensidão de atividades, ou seja, partes de sua
vida que se complementam. “São partes orgânicas da vida cotidiana: a organização
do trabalho e da vida privada, os lazeres e o descanso, a atividade social
62
Referimos-nos as forças alienantes e fetichizantes que consomem a essência ontológica do ser
nesta sociedade capitalista.
72
sistematizada, o intercâmbio e a purificação.” (HELLER, 2008, p.32). Do mesmo
modo, diante desta diversidade de atividades, em determinados momentos da vida
privilegiamos algumas atividades em detrimento de outras, haja vista que “a forma
concreta da hierarquia não é eterna e imutável, mas se modifica de modo específico
em função das diferentes estruturas econômico-sociais” (HELLER, 20008, p. 32).
Ambos os aspectos coincidem de modo que a heterogeneidade dê margem para
que a hierarquia espontânea se mantenha em movimento.
Olhando para a sociedade capitalista me remeto a perguntar: qual
estrutura hierárquica vem sendo privilegiada na vida cotidiana? Ousamos responder
que seja a ideologia da alienação que nos sucumbe de nós mesmos fazendo o
capital extrair de nós, sem que percebamos, nossa essência como seres sociais.
A cotidianidade é o espaço de inserção do homem, por essa razão o
gênero humano adquire as habilidades necessárias para viver a cotidianidade em
sociedade. É por meio dessas habilidades que “se evidencia que a assimilação da
manipulação das coisas é sinônimo de assimilação das relações sociais”. (HELLER,
2008, p.33).
Se a assimilação da manipulação das coisas (e, eo ipso, a assimilação do
domínio da natureza e das mediações sociais) é já condição de
“amadurecimento” do homem até tornar-se adulto na cotidianidade [...] Essa
assimilação, esse “amadurecimento” para a cotidianidade, começa sempre
“por grupos” [...]. E esses grupos face-to-face estabelecem uma mediação
entre o indivíduo e os costumes, as normas e a ética de outras integrações
maiores. O homem aprende no grupo os elementos da cotidianidade [...] .
(HELLER, 2008, p. 33-34). (grifos originais).
Com esta citação, podemos atestar no que tange ao Serviço Social, que a
assimilação da manipulação das coisas inerentes à profissão – no que concerne as
ferramentas de execução de sua atividade laborativa, competências teóricas, leitura
da realidade, atitude investigativa – permite ao/a assistente social a apreensão dos
elementos da cotidianidade do espaço institucional assimilando na mesma medida
seu papel nas relações sociais e sua identidade profissional pela execução de suas
atribuições.
O
“amadurecimento”
apontado
por
Heller
(2008)
quando
contextualizamos ao cotidiano das assistentes sociais do CREAS Regional ocorre
quando são capazes de imprimir em sua atuação profissional aquilo que é almejado
73
pela categoria e pelo seu grupo social. Sobre a afirmação do Serviço Social no
espaço institucional do CREAS Regional, nossas interlocutoras verbalizaram:
O assistente social é um dos principais profissionais para o
desenvolvimento do trabalho social aqui no CREAS. Eu costumo dizer que
antes de ser Assistente Social, você deve ser humano para ter sensibilidade
e perceber que nosso trabalho passa pela noção de orientação, jamais pela
noção de imposição de comportamento. (Lápis Lazuli).
Embora as diferenças profissionais, eu percebo, eu visualizo sim o
reconhecimento do nosso trabalho pelos outros profissionais. Tanto do setor
da psicologia quanto do setor de direito e dos outros também. Tanto que
muitas vezes nos procuram para tirar alguma dúvida, saber nossa opinião
eu acho que isso é reconhecimento. Aqui não queremos nos sobrepor a
eles nem eles a nós. (Ágata).
Constatamos através dos relatos das participantes da pesquisa, que a
profissão de Serviço Social, dentro da dinâmica de trabalho do CREAS – que
engloba profissionais de distintas áreas do conhecimento para o trato das
expressões da questão social – tem o devido reconhecimento das outras categorias
profissionais na execução do trabalho social que permeia suas especificidades.
As situações complexas do cotidiano imprimem e exigem dos/as
assistentes sociais uma abordagem social específica para lidar com questões tão
delicadas que permeiam a vida dos indivíduos, requerendo um preparo profissional e
emocional para o acompanhamento destas realidades. Do mesmo modo, as
instituições apresentam um cotidiano de ações e atividades que precisam ser
incorporadas pelos/as assistentes sociais e a partir destas ditas ações, perceber as
universalidades do cotidiano que exigem uma postura investigativa para desvelar
possíveis mediações para um atendimento especializado. O documento de
Orientações Técnicas do CREAS (2011b, p.96) acrescenta que:
É preciso reconhecer as reais dificuldades dos profissionais na realização
do acompanhamento especializado a famílias e indivíduos em situação de
risco pessoal e social, por violação de direitos, nos serviços do CREAS, em
decorrência das situações complexas com as quais se deparam e do
impacto que este trabalho causa na vida dos trabalhadores.
Uma das interlocutoras relatou:
74
Recebi uma denúncia uma vez de um professor que possuía 60 alunos e 30
estavam usando drogas, sendo que um deles o procurou com o desejo de
recuperar-se justamente aquele que era tido como o influenciador dos
outros. O professor tratou logo de nos procurar porque para ele, trabalhar a
dependência deste rapaz poderia ajudar a influenciar também a
recuperação dos outros. Infelizmente ficamos de mãos atadas. Não há
CAPS em Chorozinho muito menos CAPS AD. O CAPS mais próximo é o
de Cascavel. Mas na perspectiva da escuta e do acolhimento não
poderíamos dar as costas a essa demanda e fizemos os encaminhamentos
para o CAPS de Cascavel, pois era o que estava dentro das nossas
possibilidades (Lápis Lazuli).
A fim de conhecermos as atribuições do/a assistente social no CREAS
como um dos objetivos propostos nesta investigação, pontuamos que estas
atribuições contemplam àquelas ações descritas no documento de Orientações
Técnicas do CREAS. Contudo, o Conselho Federal de Serviço Social (CFESS)
elaborou
outros instrumentos
normativos
que
direcionam a
atuação
dos
trabalhadores da Assistência Social. O documento de Orientações Técnicas do
CREAS descreve como principais atribuições dos profissionais na unidade
especializada:
Acolhida, escuta qualificada, acompanhamento especializado e oferta de
informações e orientações; Elaboração, junto com as famílias/indivíduos, do
Plano de Acompanhamento Individual e/ou Familiar, considerando as
especificidades e particularidades de cada um; Realização de
acompanhamento especializado, por meio de atendimentos familiar,
individuais e em grupo; Realização de visitas domiciliares às famílias
acompanhadas pelo CREAS, quando necessário; Realização de
encaminhamentos monitorados para a rede socioassistencial, demais
políticas públicas setoriais e órgãos de defesa de direito; Trabalho em equipe
interdisciplinar; Orientação jurídico-social (advogado); Alimentação de
registros e sistemas de informação sobre das ações desenvolvidas;
Participação nas atividades de planejamento, monitoramento e avaliação dos
processos de trabalho; Participação das atividades de capacitação e
formação continuada da equipe do CREAS, reuniões de equipe, estudos de
casos, e demais atividades correlatas; Participação de reuniões para
avaliação das ações e resultados atingidos e para planejamento das ações a
serem desenvolvidas; para a definição de fluxos; instituição de rotina de
atendimento e acompanhamento dos usuários; organização dos
encaminhamentos, fluxos de informações e procedimentos. (BRASIL, 2011b,
p. 99).
O CREAS Regional possui uma dinâmica específica de trabalho e uma
das assistentes sociais relatou como se organizam as atribuições do Serviço Social:
Existe a demanda espontânea e aí quando chega dependendo da
necessidade fazemos o acompanhamento social, mas a maioria das ações
do serviço social se dá pela denúncia. São feitas ligações pra cá
denunciando, é feita a visita pelo educador social e ocorre o primeiro
75
atendimento passando a fazer parte das demandas do Serviço Social.
Havendo necessidade, encaminhamos para outros profissionais para que
eles também façam suas intervenções. Também chegam denúncias da
DCECA, Disque 100 e de outros órgãos (Ônix).
Ressaltamos que nem todas as assistentes sociais do CREAS executam
as mesmas atividades e, portanto, não possuem as mesmas atribuições. Assim
devemos considerar que paralelo a estas atribuições coexistem as condições
objetivas de trabalho que pressionam o cotidiano institucional e podem refletir no
nível de satisfação das profissionais na execução de suas atividades. Vejamos,
portanto, o que as interlocutoras relataram sobre sua atuação:
Eu gostava muito de fazer as visitas quando eu realizava atendimento
social, hoje eu não faço porque eu trabalho no setor de denúncia e lá o
direcionamento das minhas atribuições são outros (Ágata).
O trabalho com os direitos violados é um trabalho realmente enriquecedor, a
medida que a gente consegue avançar nessa fragilidade e trabalhar o seu
fortalecimento (Pedra do Sol).
Meu fazer profissional se pauta sempre na perspectiva de orientação com
as pessoas (Lápis Lazuli).
O que almejamos evidenciar a partir de suas falas é que as condições
objetivas de trabalho devem necessariamente dar suporte para que a atuação do/a
assistente social ocorra satisfatoriamente – haja vista que este/a profissional não
detém os meios de trabalho. Desse modo, os/as assistentes sociais devem perceber
“sob quais condições o Serviço Social tem possibilidade de contribuir na construção
de formas de acesso aos recursos e informações sociais” (VASCONCELOS, 2002,
p. 518 apud AMADOR, 2009, p. 131-132). Quando estas condições objetivas
inexistem ou existem parcialmente e/ou até mesmo pressionam o cotidiano
institucional ao ponto de chocar-se com a direção social da profissão acaba
refletindo nas condições subjetivas dos/as profissionais gerando determinados níveis
de satisfação ou de insatisfação no trabalho realizado.
Entendemos que todas as atribuições elencadas, se executadas de modo
satisfatório, contribuem para o fortalecimento do equipamento, garantia dos direitos
dos usuários e legitimidade ao trabalho profissional. Por essa razão, é que merece
76
destaque em nossa reflexão a questão do exercício da interdisciplinaridade no
cotidiano institucional.
Consideramos a interdisciplinaridade uma das particularidades que
perpassa tanto o âmbito do cotidiano das instituições quanto envolve a atuação
dos/as assistentes sociais, haja vista que no caso especifico do CREAS Regional a
ocorrência da interdisciplinaridade – mediante o trabalho da chamada equipe de
referência – constitui-se como elemento chave para se discutir o trabalho do/a
assistente social com outros profissionais. Neste sentido, o exercício da
interdisciplinaridade é uma das atribuições do/a assistente social no espaço sócio
institucional do CREAS Regional63 no atendimento as demandas sociais inerentes
deste espaço.
Relevantes são as considerações de Fraga (2010) a respeito desta
dimensão do trabalho cotidiano do/a assistente social. A autora destaca que as
profissões que executam os serviços sociais, de um modo geral, tem se preocupado
com inviabilidade decorrente de um trabalho solitário sem abertura para discussão
com outras áreas do saber. Por isso a “interdisciplinaridade precisa ser pensada
como uma necessidade de interação e busca dos profissionais das diferentes áreas
do conhecimento” (FRAGA, 2010, p.57)64. Todas as profissionais entrevistadas
ressaltaram em seus relatos a importância e os aspectos positivos do trabalho
interdisciplinar no trabalho social com violações de direitos o que se confirma,
descrevemos nestas linhas:
Hoje todas as violações de direitos que chegam no CREAS passam por um
atendimento interdisciplinar: Serviço Social, Psicologia e Jurídico. As
orientações jurídicas ocorrem quando são necessárias. O Serviço Social e
Psicologia trabalham muito conjuntamente em todas as demandas... A
gente trabalha com os atendimentos diretos às vítimas. Depois a gente
tenta sentar e ver como a gente pode trabalhar para desenvolvê-lo melhor e
63
Conforme as orientações da Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do Sistema Único
de Assistência Social (NOB-RH/SUAS), aprovada por meio da Resolução nº269, de 13 de dezembro
de 2006, do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS) e Orientações da Resolução nº 17 de
20 de junho de 2011 que ratifica a equipe de referência definida pela NOB-RH/SUAS e reconhece as
categorias profissionais de nível superior para atender as especificidades dos serviços
socioassistenciais e das funções essenciais de gestão do SUAS.
64
“No vernáculo pátrio, a palavra interdisciplinar (inter + disciplinar) refere-se ao que é comum a duas
ou mais disciplinas ou ramos do conhecimento, enquanto multidisciplinar (de mui + disciplina)
abrange ou refere-se a muitas disciplinas” (FERREIRA, 1999 apud FRAGA, 2010, p 57).
77
ao final o acompanhamento é encerrado com um relatório onde cada
profissional elabora o seu documento (Pedra do Sol).
Mas assim... Essa interdisciplinaridade é muito importante aqui no CREAS,
pois você acaba aprendendo com o outro, pois são outras visões que
traduzem a complementaridade do todo que é aquele indivíduo. O
atendimento em conjunto faz toda a diferença. As perguntas direcionadas a
família são diferentes e se completam e é nisso que consiste a
interdisciplinaridade (Ágata).
Da mesma forma, colhemos nas entrevistas as indagações sobre outros
aspectos do trabalho interdisciplinar que precisam ser revistos:
Nos casos de violência sexual o atendimento especializado deve ser
psicossocial para que a assistente social trabalhe o lado social da família e
a psicóloga trabalhar os traumas e efeitos da violência na vítima. Como na
nossa realidade atualmente estamos com um déficit de profissionais da
psicologia, contamos com apenas duas profissionais, a agenda acaba
ficando muito cheia né. A gente não consegue casar os atendimentos
fazendo com que a gente atenda primeiro as famílias e deixando para
marcar o atendimento psicológico um mês depois ou mais. Os atendimentos
acabam ficando separados, distantes e dificultando o vínculo. O trabalho
interdisciplinar com a psicologia ocorre, mas não como deveria ser (Ônix).
Estes aspectos evidenciam que a complexidade do cotidiano também se
alia inevitavelmente as condições objetivas de trabalho e as macroestruturas da
Política de Proteção Social Especial. Como fazer um trabalho social se não há
proporcionalidade entre a quantidade de profissionais e de demandas? Como
exercer
um
trabalho
interdisciplinar
se
não
há
possibilidades
de
um
acompanhamento sistemático? Esses são questionamentos que devem ser
problematizados no universo das instituições entre as categorias profissionais e seus
empregadores, a fim de reivindicar e de construir estratégias para a superação
destas dificuldades garantindo qualidade aos serviços oferecidos aos usuários.
Um espaço do cotidiano do CREAS Regional que merece destaque em
nossa análise é o espaço do Plantão Social, local onde os/as assistentes sociais
realizam o atendimento as demandas espontâneas. Para discutir o espaço do
cotidiano do plantão, Amador (2009) faz um resgate histórico sobre as concepções
clássicas acerca do plantão. Inicialmente o plantão social emerge sob a perspectiva
do atendimento emergencial, considerando os usuários como “clientes” onde a
atuação profissional se limitaria a analisar a possibilidade de concessão dos pedidos
de auxílio. Para Hollis (1979 apud AMADOR, 2009), o caráter emergencial refletia a
78
dimensão coercitiva das instituições sociais como “meio de se tomar o pulso da
comunidade” (ibidem, p. 129) e a dimensão psicologizante cabendo ao/a assistente
social “habilidade de entrevistar e conhecimento do método da primeira entrevista de
modo que o máximo de compreensão da situação apresentada possa ser obtido
pelo assistente social e, o máximo de ‘ajuda’ possa ser obtido pelo cliente” (ibidem,
p.129-130).
Por essa razão, Amador (2009) destaca que a forma como o equipamento
dá resposta às demandas definirá o tipo de abordagem do plantão. “Os objetivos e a
metodologia do trabalho dos assistentes sociais no plantão são influenciados pela
filosofia de cada agência, seus conceitos, funções e pelo lugar no plano total da
organização da comunidade para o bem-estar social.” (AMADOR, 2009, p. 130).
Sobre o plantão social, as assistentes sociais do CREAS Regional fizeram a
seguinte análise:
No plantão social costumamos atender situações emergentes, mas avalio
como um serviço extremamente válido. É o momento que... Mais até que os
acompanhamentos sociais... Devemos exercitar o acolhimento e a escuta.
Saber ouvir o outro, pois estamos lidando com as dores das pessoas, com
pessoas que chegam desesperadas por uma orientação. Para os casos em
que ocorrem encaminhamentos no plantão social comunicamos ao usuário
todo o procedimento a ser realizado (Lápis Lazuli).
Assim... Os usuários quando chegam ao plantão social boa parte deles não
necessariamente chegam em busca do CREAS pelo que ele é. Muitas
vezes chegam porque ouviram falar e muitos deles chegam apenas para
pedir uma orientação sobre coisas simples como o bolsa família ou alguma
orientação jurídica... Quando é uma demanda, por exemplo, uma família
que vem da delegacia com boletim de ocorrência nós fazemos o
atendimento inicial e fazemos o acompanhamento. Mas eu acho positivo o
plantão social. Quando as pessoas chegam a gente procura dar toda a
orientação para que o usuário não fique de instituição em instituição
(Ágata).
Constatamos nas falas das entrevistadas que, de modo geral, a
concepção histórica do plantão social, anteriormente relatada em sua visão
emergencial,
vem
sendo
superada
no
cotidiano
do
CREAS
Regional.
Compreendemos a importância do espaço do plantão para todos os agentes
envolvidos, principalmente aos usuários que chegam procurando orientação e um
atendimento especializado para sua necessidade. Não podemos desconsiderar que
o caráter emergencial reflete necessidades da população usuária, contudo, o que
79
deve ser diferente é a capacidade do/a assistente social de ir além do emergencial e
enxergar a totalidade do ser social que está diante dele.
Neste sentido, outros elementos puderam ser observados em seus
relatos, como por exemplo, o destaque de Lápis Lazuli quando frisou que é preciso
“saber ouvir o outro, pois estamos lidando com as dores das pessoas” ressaltando a
dimensão da escuta nos atendimentos sociais e o respeito ao usuário em suas dores
em um momento de fragilização. Do mesmo modo, Ágata destacou que nos
atendimentos decorrentes do plantão social “muitos deles chegam apenas para pedir
uma orientação sobre coisas simples como o bolsa família ou alguma orientação
jurídica”, ou seja, existem demandas que necessitam apenas de um único
atendimento, pois perpassam a dimensão da informação e/ou esclarecimento. Assim
como,
surgem
demandas
com
maior
complexidade
que
requerem
um
acompanhamento social que já se inicia no atendimento do plantão social, sendo
dada continuidade posteriomente. “Quando é uma demanda, por exemplo, uma
família que vem da delegacia com boletim de ocorrência nós fazemos o atendimento
inicial e fazemos o acompanhamento”.
Visualizamos no espaço cotidiano do CREAS Regional – entre
atendimentos do plantão social e acompanhamentos sociais – uma relativa
congruência entre os objetivos institucionais e os objetivos da profissão na medida
em que as assistentes sociais conseguiam incutir em sua atuação profissional
perspectivas de ação que plasmavam os princípios contidos no Código de Ética
Profissional como também valores em defesa dos direitos humanos e da cidadania.
Contudo, não podemos perder de vista que, apesar das possíveis congruências os
objetivos institucionais e os objetivos profissionais refletem projetos societários
opostos e que fatalmente em um momento ou outro entrarão em conflito.
Ao serem indagadas acerca da distinção entre os objetivos profissionais e
os objetivos institucionais, as interlocutoras narraram:
Eu acho que não há distinção. Eu acho assim: o Serviço Social trabalha
com garantia de direitos. O que a gente faz aqui no CREAS? A gente tenta
minimizar a violação de direitos. Tentamos fazer com que esses direitos
sejam garantidos. A gente tenta, por exemplo, que os direitos das crianças e
adolescentes – que é nossa maior demanda – sejam garantidos, então, eu
80
acho que nesse sentido, os objetivos da profissão não se distinguem dos
objetivos da instituição (Ágata).
Aqui no CREAS eu vejo essa distinção na fragilidade da rede ou no
fortalecimento da rede. Se a gente tivesse uma rede mais ativa se não
tivesse tantos furos, mas eu não considero que tenha distinção (Pedra do
Sol).
Acho que é a mesma coisa. Antes de atuar na profissão a gente é munida
apenas do conhecimento teórico e como experiência temos somente nosso
estágio. Aprendemos sobre os direitos e a sua defesa. Profissionalmente
quando trabalhamos em um serviço especializado os objetivos devem
coincidir só que acabamos não executando tudo por conta dos limites
(Ônix).
Apesar dos relatos apresentados pelas profissionais de que os objetivos
institucionais e profissionais não se distinguem partimos em defesa do contrário. Os
objetivos da profissão são distintos dos objetivos institucionais, pois aqueles
traduzem um vir-a-ser buscado, almejado e diariamente construído pela categoria
profissional e que estão apoiados em uma visão mais reflexiva que dá amplo
significado às demandas dos usuários sem desvinculá-las das condições estruturais,
materiais e sociais que perpassam suas vidas. Para além de “meras” necessidades
individuais, as demandas dos usuários são expressões da questão social e de tal
modo devem ser consideradas, a fim de que não se percam de vista as relações
contraditórias e o antagonismo de classes das lutas sociais.
A distinção destes objetivos se confirma, inclusive, ao final do relato de
Ônix, que, mesmo tendo afirmado que os objetivos profissionais e institucionais são
semelhantes destacou: “só que acabamos não executando tudo por conta dos
limites”. Ora, se os limites se fazem presentes na efetivação dos objetivos
profissionais, isto se deve ao fato de que em algum momento eles não caminham
em consonância com os objetivos institucionais.
Os objetivos institucionais só poderão, em algum momento, coincidir com
os objetivos da profissão quando aqueles proporcionarem condições para uma
atuação profissional livre da perspectiva de “ajustamento”, livre da perspectiva do
“bom funcionamento” da rotina institucional e livre do “olhar isolado” das
singularidades dos usuários. Quando estes pressupostos são superados nas
instituições, podemos afirmar que no espaço do cotidiano há convergência entre os
81
objetivos da Instituição e do Serviço Social. Não podemos deixar de mencionar o
fato de os objetivos da profissão estarem intrinsecamente vinculados a um projeto
profissional que se contrapõe àquele que é ideologicamente posto em nossa
sociedade que acaba sendo plasmado de modo sutil nas políticas sociais65.
Compreendemos que é a partir da própria complexidade da realidade do
cotidiano que devem surgir forças para transformação das situações pragmáticas da
realidade social das instituições. Diante das limitações institucionais a atuação
profissional deve ser mediada evitando os extremos messiânicos e fatalistas, de
modo a ir além da rotina institucional, viabilizando possibilidades de ação que
traduzem uma atuação profissional comprometida ética e politicamente.
65
Percebemos esta sutileza na dimensão focalizada que caracteriza algumas políticas, nas
condicionalidades que limitam o acesso aos serviços sociais, e entre outras, a dimensão
orçamentária que não contempla todos os serviços sociais e ainda sofre consideráveis retrações.
82
CAPÍTULO III
A ASSISTÊNCIA SOCIAL COMO POLÍTICA PÚBLICA DA SEGURIDADE SOCIAL
“O momento que vivemos é um momento pleno de desafios.
Mais do que nunca é preciso ter coragem, é preciso ter
esperanças para enfrentar o presente. É preciso resistir e
sonhar. É necessário alimentar os sonhos e concretizá-los diaa-dia no horizonte de novos tempos mais humanos, mais
justos, mais solidários.”
Marilda Villela Iamamoto.
83
3.1 A Assistência Social como política pública da Seguridade Social
Compartilhamos com o leitor/a nesta seção os aspectos constitutivos da
Política de Assistência Social na realidade histórica brasileira e na seguridade social,
bem como os marcos legais que legitimam a assistência social como política pública.
Não obstante, à luz de estudiosos da assistência social buscaremos refletir também
os direcionamentos dados a esta política na atualidade e as repercussões deste
incurso na vida dos usuários e no trabalho dos/as assistentes sociais.
Dentre os espaços de atuação possíveis para o exercício profissional
dos/as assistentes sociais, o campo da seguridade social, é sobremaneira, o espaço
que mais agrega estes profissionais. Esta constatação deve-se, sobretudo, a própria
construção histórica das políticas sociais no Brasil e de como o Serviço Social foi se
inserindo neste espaço para o enfrentamento das refrações da questão social,
contribuindo para o desenvolvimento destas políticas em sua construção e
fortalecimento.
Segundo Boschetti (2009) os princípios estruturantes da seguridade social
baseiam-se nos modelos bismarckiano e beveridgiano. O primeiro nasceu na
Alemanha, considerado como um sistema de seguros sociais, destinando-se a
manter a renda dos trabalhadores em momentos de risco social, ou seja, em
momentos de perda da capacidade laborativa momentânea ou permanente. O
segundo surgiu na Inglaterra, os direitos tinham um caráter universal destinando-se
a garantir mínimos sociais a todos os cidadãos em circunstância de necessidade,
tendo por objetivo a luta contra a pobreza.
Os princípios do modelo bismarckiano vigoraram sobre a previdência
social e em menor parcela da saúde66, bem como o modelo beveridgiano vigorou na
assistência social e em grande parcela da saúde. Contudo, estas influências não
incidiram de maneira paritária no Brasil, pois se percebeu uma considerável
relevância do modelo bismarckiano. Ao analisarmos a constituição da proteção
66
Segundo Boschetti (2009) o modelo bismarckiano incidiu na saúde no auxílio doença comumente
chamado de seguro saúde que é regido pelas regras previdenciárias.
84
social no Brasil, constatamos que de 1923 à Constituição de 1988, a lógica do
seguro – pilar bismarckiano – estabeleceu critérios de acesso à previdência e à
saúde (BOSCHETTI, 2009).
O princípio dessa lógica é garantir a proteção, às vezes exclusivamente, e
às vezes prioritariamente, ao trabalhador e à sua família. É um tipo de
proteção limitada, que garante direitos apenas àquele trabalhador que está
inserido no mercado de trabalho ou que contribui mensalmente como
autônomo ou segurado especial à seguridade social (BOSCHETTI, 2009,
p.326).
Sob este prisma, a lógica do seguro apresenta duas características
centrais: o acesso aos direitos se condiciona àqueles que contribuem mensalmente
e o valor dos benefícios é relativo à contribuição efetuada (BOSCHETTI, 2009).
Paralelo a essa lógica caminha outra, a saber, a lógica da universalização dos
direitos que não submete os direitos sociais ao contrato contributivo. Assume uma
lógica social que vem “assegurando direitos com base nas necessidades sociais,
que não sejam condicionados a uma contribuição direta prévia, que não sejam
proporcionais a uma contribuição efetuada anteriormente” (BOSCHETTI, 2009,
p.327).
Com a Constituição de 1988 a seguridade social foi formada a partir do
tripé previdência social, saúde e assistência social. Contudo, as diretrizes
constitucionais não conseguiram plasmar-se totalmente e/ou orientaram de forma
equivocada as políticas sociais que adquiriram um caráter híbrido67, constatação que
se deve ao desmonte da seguridade social na conjuntura social brasileira na década
de 1990 (BOSCHETTI, 2009).
E a assistência social? Como esta dimensão da seguridade social se
articula no sistema brasileiro? A constituição da assistência social ao longo da
história esteve associada a “uma ação pública desprovida de reconhecimento legal
como direito, mas associada institucionalmente e financeiramente à previdência
social.” (BOSCHETTI, 2009, p. 329).
67
Esse caráter agrega direitos oriundos e vinculados ao trabalho (previdência social), bem como
direitos universais (saúde) e seletivos (assistência) (BOSCHETTI, 2009).
85
Apoiada por décadas na matriz do favor, do clientelismo, do
apadrinhamento e do mando, que configurou um padrão arcaico de
relações, enraizado na cultura política brasileira, esta área de intervenção
do Estado caracterizou-se historicamente como não política, renegada
como secundária e marginal no conjunto das políticas públicas. (COUTO et
al, 2012, p. 55).
A este respeito são interessantes as reflexões de Boschetti (2009) acerca
da tensão entre assistência social e trabalho. O primeiro fator a ser destacado é que
a lógica do seguro, como não consegue contemplar a todos trabalhadores – mas
apenas aos que contribuem –, faz com que os trabalhadores informais e/ou os
desempregados demandem os recursos da lógica social do direito não contributivo.
Pensar na assistência social como a “política salvadora”, em detrimento das outras
políticas que compõem o tripé da seguridade social, é um equívoco. Da mesma
forma, admitir a importância do trabalho para a estruturação da vida não significa
defender qualquer tipo de trabalho.
Defender a seguridade social em sentido amplo, onde a lógica social se
sobreponha a lógica securitária, requer reconhecer o espaço da assistência
social em seu âmbito, sem superestimá-la e tampouco sem discriminá-la
como um direito incompatível com o trabalho (BOSCHETTI, 2009, p.328).
O ingresso da política de assistência social como um dos eixos
estruturantes da seguridade social pela CF 1988 foi uma iniciativa inovadora, pois
exigiu que a assistência social, sendo tratada como política pública de
responsabilidade do Estado, seja capaz de enunciar o conteúdo dos direitos do
cidadão. (SPOSATI, 2009).
Os marcos legais que afirmam a assistência social no cenário brasileiro
são: a Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS); a Política Nacional da Assistência
Social (PNAS); o Sistema Único da Assistência Social (SUAS); a Norma Operacional
Básica do SUAS (NOB/SUAS); a Norma Operacional Básica de Recursos Humanos
do SUAS (NOB-RH/SUAS) e a Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais.
A Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS), Lei nº 8.742 de 7/12/1993
ratificou os artigos 203 e 204 da CF, assegurando a instituição constitucional da
assistência social pertencente à estrutura política do Estado. A LOAS possibilitou
uma inovação ao vincular o caráter de direito não contributivo à assistência social,
86
de modo que a população em risco e/ou em situações de vulnerabilidade social se
desvinculasse do caráter de “assistida” ou “favorecida” para se tornar “usuária”
(COUTO et al, 2012).
Sem dúvida um avanço ao permitir que a assistência social, assim posta,
transite do assistencialismo clientelista para o campo da Política Social.
Como política de Estado, passa a ser um campo de defesa e atenção dos
interesses dos segmentos mais empobrecidos da sociedade. (YAZBEK,
1995, p. 10 apud COUTO, 2012, p. 55).
A principal contribuição da LOAS reside no fato de que sua instituição
viabiliza os direitos sociais, distanciando-se das práticas clientelistas e de
benemerência (SIMÕES, 2010). “Um serviço que, portanto, não é uma simples
prática, mas uma ação orientada institucionalmente e fundamentada numa
concepção teórica que a transforma em uma ação política.” (SIMÕES, 2010, p. 297).
Ressaltamos que em 2011 a LOAS sofreu alterações em sua redação pela Lei
12.435 de 6/7/2011 que promoveu a inserção do SUAS na LOAS institucionalizando
este sistema, sendo esta lei conhecida como a “Lei do SUAS”.
A Política Nacional da Assistência Social (PNAS), Resolução CNAS nº
145, de 15/10/2004, propõe-se a esclarecer as diretrizes para a concretização da
Assistência Social. Mediante um modelo de gestão compartilhado entre os entes
federados a PNAS explicita as atribuições das três instâncias governamentais
(COUTO et al, 2012). Procura demarcar as particularidades, campos de ação,
usuários e formas de operacionalização da Assistência Social, como política pública
de proteção social. Seus objetivos compreendem:
Prover serviços, programas, projetos e benefícios de proteção social básica
e, ou, especial para famílias, indivíduos e grupos que deles necessitarem;
Contribuir com a inclusão e a equidade dos usuários e grupos específicos,
ampliando o acesso aos bens e serviços socioassistenciais básicos e
especiais, em áreas urbana e rural; Assegurar que as ações no âmbito da
assistência social tenham centralidade na família, e que garantam a
convivência familiar e comunitária. (BRASIL, 2004 apud COUTO et al, 2012,
p.61).
Com base na PNAS, o marco da implantação do SUAS ocorreu pela
Norma Operacional Básica do Sistema Único de Assistência Social (NOB/SUAS),
Resolução CNAS nº 130, de 15/7/2005, que regula a organização do SUAS no
87
território brasileiro. Em 2013, a referida resolução fora revogada pela Resolução
CNAS nº33, de 12/12/2012, que aprova a Nova NOB/SUAS trazendo inovações
sobre a Política Nacional de Assistência Social, principalmente no que tange às
competências atribuídas à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios,
à gestão dos recursos destinados a ações, programas, projetos e benefícios e como
serão financiados.
O SUAS é o sistema responsável pela articulação dos serviços,
responsabilidades, vínculos, hierarquia, benefícios e ações da assistência social.
Possui um caráter permanente e uma estrutura descentralizada, participativa e
articulada com as políticas públicas setoriais. Este sistema apresenta como funções
assistenciais a proteção social, a vigilância social e a defesa social e institucional. “O
SUAS materializa o conteúdo da LOAS, cumprindo no tempo histórico dessa política
as exigências para a realização dos objetivos e resultados esperados que devem
consagrar direitos de cidadania e inclusão social” (BRASIL, 2005b, p. 39).
Segundo Mota et al (2010) existem ainda dois aspectos de superação que
emergem com a instituição do SUAS, a saber, a superação histórica da cultura
assistencialista e do ranço do favor, da ajuda e do nepotismo, bem como a
superação ideológica da caridade mediante a operacionalização de parâmetros
técnicos e de profissionalização para a efetivação da Assistência Social. Superar
estes aspectos é um desafio que se apresenta cotidianamente a atuação dos/as
assistentes sociais, para imprimir um trabalho social na perspectiva do direito
distante do ranço assistencialista, conforme nos relata uma das interlocutoras da
pesquisa, Pedra do Sol:
Tem que ser trabalhado dia a dia a questão da assistência e do
assistencialismo para que as práticas não se confundam (Pedra do Sol).
Posterior às normatizações para a organização do SUAS buscou-se
referenciar também os trabalhadores da Política de Assistência Social através da
Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do SUAS (NOB-RH/SUAS),
Resolução CNAS nº 269, de 13/12/2006. Esta normatização “representa um avanço
no que diz respeito à profissionalização da política de assistência social, com vistas
88
a garantir aos usuários do Sistema Único de Assistência Social serviços públicos de
qualidade.” (BRASIL, 2011c, p. 15).
Por fim, mas não menos importante, a Tipificação Nacional dos Serviços
Socioassistenciais, Resolução nº 109, de 11/11/2009, é outro instrumento normativo
da Política de Assistência Social que trata exclusivamente da organização dos
serviços de proteção social do SUAS por níveis de complexidade: Proteção Social
Básica e Proteção Social Especial de Média e Alta Complexidade. Estabelece,
ainda, para cada nível de complexidade serviços sociais específicos para os
atendimentos às situações de vulnerabilidade social e risco social e pessoal das
famílias e/ou indivíduos.
Diante dos aparatos normativos elencados que no âmbito legal
institucionalizam a Assistência Social – seus serviços e ações na viabilização dos
direitos dos cidadãos –, é necessário que compreendamos que enquanto política
social sua efetivação durante a constituição desses marcos legais, não fugiu do
movimento histórico da realidade e das forças sociais que a empreendiam para
entender as implicações dessa política na sociedade brasileira.
Do mesmo modo, não podemos esquecer que o foco dessa política são
os cidadãos que na condição de usuários usufruem dos serviços e benefícios que a
assistência social efetiva. Devido às configurações atuais do capitalismo – como
desemprego estrutural e desestruturação das proteções sociais, por exemplo –,
Couto et al (2010) sinaliza uma redefinição no perfil dos usuários da assistência que
reconfigura as relações de trabalho e consequentemente a pressionar o Estado a
ampliar suas políticas para incorporar esses contingentes populacionais.
Esse novo perfil passou a incorporar tanto a população inapta para o
trabalho que demanda dos serviços assistenciais para a manutenção de sua vida
quanto os trabalhadores aptos para o trabalho, mas devido à forte concorrência do
mercado de trabalho, não encontram recolocação profissional (COUTO et al, 2010).
Face à impossibilidade do direito ao trabalho, o Estado, na ampliação de
seu campo de atuação, realiza um duplo movimento: incorpora esse novo perfil de
89
usuários em suas políticas sociais e, ao mesmo tempo, impõe critérios para acesso
aos benefícios da assistência. “A Assistência Social passa a assumir, para uma
parcela significativa da população, a tarefa de ser a política de proteção social, e não
parte da política de proteção social.” (MOTA et al, 2010, p. 189). Com isso a
identidade dos cidadãos, usuários da política, é então desmontada de suas bases de
direito transformando nos termos de Sposati (2009, p. 23) “os cidadãos em
necessitados sociais, ou em não cidadãos”.
Neste sentido, Boschetti (2009, p.329) faz uma crítica ao posicionamento
da política de assistência social no cenário contemporâneo brasileiro:
[...] os benefícios assistenciais, sob a forma de programas de transferência
de renda permanentes, passam a ter um papel de ‘substitutos’ dos
rendimentos dos empregos inexistentes. Essa situação atual não resolve,
ao contrário, agudiza, a histórica tensão entre o trabalho e assistência
social, pois é a ausência de trabalho/emprego que provoca a demanda pela
expansão da assistência, sem que essa seja capaz de resolver a questão
do ‘direito ao trabalho’ e o direito a ter direitos, nos marcos do capitalismo.
Assim, a assistência social não pode e não deve substituir o trabalho, mas
pode ser um elemento intrínseco de um sistema maior de proteção social,
complementar aos direitos do trabalho, podendo contribuir para transferir
renda do capital para o trabalho.
Do mesmo modo, Mota (2010) faz suas considerações acerca do papel
desempenhado pela assistência social nas políticas públicas, que a partir da década
de 1990 se constituíram em uma unidade contraditória. Na medida em que avançou
o processo de privatização das políticas de previdência e saúde, a assistência social
ampliou-se como política não contributiva, “transformando-se num novo fetiche de
enfrentamento à desigualdade social, na medida em que se transforma no principal
mecanismo de proteção social no Brasil” (MOTA, 2010. p.134).
A classe dominante ao centralizar a Assistência Social como a política
salvadora das mazelas da sociedade:
imprime um novo modo de tratar a 'questão social' brasileira, focando-a
enquanto objeto de ações e programas de combate a pobreza à moda dos
organismos financeiros internacionais, donde a centralidade dos programas
de transferência de renda (MOTA, 2010, p. 140).
90
Essa estratégia apoia-se no argumento do aumento da pobreza aliado à
impossibilidade financeira do governo de manutenção da previdência e da saúde,
fazendo com que estas políticas se abram aos serviços complementares, enquanto
que o combate à pobreza e à desigualdade ocorrem pela ampliação dos benefícios
assistenciais e “ao focalizar os segmentos mais pobres da sociedade, imprime outro
desenho à política de Assistência Social, principalmente porque na expansão
tiveram centralidade os programas de transferência de renda” (MOTA, 2010, p. 134).
Mota (2010) ressalta, ainda, a relevância dos mecanismos da Política
Nacional de Assistência Social – PNAS, como o Sistema Único de Assistência Social
– SUAS, todavia, questiona-se o papel ideológico e político que esta política pública
vem assumindo ao tornar-se a única forma de enfrentamento da desigualdade.
Tem-se então a pergunta: a quem este direcionamento favorece? Que
grupos são beneficiados com este direcionamento? A resposta que se desvela a
partir da atual conjuntura das políticas sociais, é que esta, como possibilidade de
mediação para reprodução da vida social, tem ao longo do processo histórico da
sociedade brasileira, servido não somente aos que dela necessitam diretamente –
para acesso a determinados benefícios para o enfrentamento da pobreza –, mas
também a burguesia brasileira que subordinando o Estado aos seus interesses,
utilizou medidas relacionadas à proteção social para legitimar-se (MOTA, 2010).
Não temos o propósito, com estes apontamentos, de descartar a
importância da Política de Assistência Social àqueles que dela necessitam, mas
propomos com estas indagações convidar você leitor/a a refletir sobre o papel que
esta política tem assumido na conjunta brasileira, sendo plasmada como única
alternativa para o enfrentamento das desigualdades sociais. Nossa proposta parte
da premissa de se pensar em uma ação articulada com outras políticas setoriais
para que de fato esta política pública obtenha o resultado esperado, qual seja, não
substituindo outras políticas ou mesmo o trabalho, mas como mecanismo para
atendimento de determinadas necessidades de proteção social.
Conforme o exposto, faz-se necessário compreendermos como a atuação
do/a assistente social situa-se na realidade e que direcionamento social vem
91
assumindo na aplicabilidade das políticas públicas, de modo particular na Política de
Assistência Social em seus mais diversos equipamentos. Dito isto, tratamos de
apresentar a avaliação das interlocutoras desta pesquisa sobre o papel do CREAS
na Política de Assistência Social. Inicialmente, a apreciação de uma das
profissionais foi a seguinte:
Até discutimos isso em uma reunião da equipe técnica porque... Como às
vezes não conseguimos ter tanto contato com os usuários e destacando o
papel do CREAS na Política de Assistência, deveríamos trabalhar mais as
atividades de mobilização social. Eu vejo o CREAS um pouco distante
dessa realidade (Ônix).
O relato da entrevistada remete a pensar no conceito de território que se
constitui como uma das categorias essenciais para que as ações do SUAS se
articulem nos equipamentos da assistência social de acordo com a realidade local a
qual se instala. É preciso compreender também que estes equipamentos não estão
alheios às ações macroestruturais promovidas pela política. Desse modo, as
atividades de mobilização social, enquanto mecanismo de acesso a informações e
direitos podem incidir resultados em dimensões sobre as quais os equipamentos
porventura não conseguem alcançar. A este respeito o documento de Orientações
Técnicas do CREAS (2011b, p.36) orienta:
No que diz respeito às intervenções no território, pode-se destacar ações
como campanhas intersetoriais de mobilização para a prevenção e o
enfrentamento de situações de risco pessoal e social, por violação de
direitos, organizadas a partir de um esforço coletivo da rede, envolvendo a
sociedade civil organizada, as diversas políticas e os órgãos de defesa de
direitos. O CREAS, por intermédio de sua coordenação e equipe, poderá
incentivar, apoiar e participar da realização destas ações, que podem ser
realizadas em diversos formatos.
Não obstante, duas de nossas interlocutoras apresentaram outras
considerações sobre o desempenho do CREAS Regional na Política de Assistência
Social, quais sejam:
Eu acho que o trabalho do CREAS, ele tenta trabalhar de acordo com o que
sugere a política... O CREAS não está sendo omisso nas atribuições. Eu
acho que se não fosse esses entraves o CREAS executaria plenamente
suas funções. E mesmo assim podemos dizer que o Estado do Ceará ou
pelo menos em Fortaleza as violações de direitos estão sendo trabalhadas
(Ágata).
92
Dentro das atuais circunstâncias e no objetivo de garantir a proteção, o
CREAS vem sim desempenhando seu papel, mas são poucos profissionais
para executar os serviços, o que acaba sobrecarregando todos nós (Lápis
Lazuli).
Estas apreciações mostram que na ótica das interlocutoras, o CREAS
vem desempenhando de modo satisfatório o seu papel na Política de Assistência.
Contudo, é sabido que as repercussões do mercado sobre as políticas sociais
limitam e enquadram a realidade institucional. Repercussões, que perpassam
também pela dimensão da sobrecarga de trabalho, conforme pontuou Lápis Lazuli:
“mas são poucos profissionais para executar os serviços, o que acaba
sobrecarregando todos nós”. Mediante esses entraves os/as profissionais, por um
compromisso ético e político, empreendem um esforço hercúleo para que os
cidadãos que procuram os serviços do CREAS no trato com as questões referentes
à violação de direitos tenham um atendimento de qualidade, conforme preconizam
os instrumentos normativos e aqueles próprios reguladores de sua atuação
profissional. Desse modo não há como pensar na valorização da política de
assistência e/ou nos equipamentos que a compõem sem vincular esta discussão aos
seus trabalhadores, em nosso caso específico, aos/as assistentes sociais
trabalhadores/as da Política de Assistência Social. Sobre esta luta pela valorização
dos trabalhadores da assistência social, Lápis Lazuli enfatizou:
Nós enquanto profissionais, além do compromisso devemos procurar
reivindicar melhorias para o nosso trabalho e não só ficar esperando do
Estado (Lápis Lazuli).
Neste sentido, precisamos esclarecer duas questões: Em primeiro lugar, é
importante elucidar a confusa relação que ocorre entre Serviço Social e Assistência
Social, haja vista que o Serviço Social, desde sua constituição, tem a política de
assistência social como um dos campos de execução de seu trabalho na sociedade
e atua no desenvolvimento das ações dos equipamentos socioassistenciais.
Mesmo sendo no âmbito das políticas públicas intitulado nos termos de
Netto (2011) como “executor terminal das políticas sociais”, o Serviço Social possui
uma identidade profissional dinâmica que foi construída historicamente pelos/as
profissionais em face às contradições sociais que configuram a sociedade
capitalista. “[...] confundir e identificar o Serviço Social com a Assistência Social
93
reduz a identidade profissional, que se inscreve em um amplo espectro de questões
geradas com a divisão social, regional e internacional do trabalho.” (CFESS, 2009, p.
10). Em contrapartida, a Política de Assistência Social é um mecanismo público de
acesso aos serviços na perspectiva do direito social, da cidadania e da assistência a
determinadas necessidades sociais. Diz respeito a ações macroestruturais que
articulada a outras políticas garante proteção social aos cidadãos.
Em segundo lugar, é preciso romper com dimensão assistencialista que
comumente permeia a profissão e, sobretudo, ter clara a diferença entre assistência
social e assistencialismo. Sob esta relação difusa, uma das interlocutoras destacou:
O assistente social tem muitas vezes aparentado o caráter assistencialista
principalmente quando realizamos o benefício eventual para uma família
necessitada. (Pedra do Sol).
Sposati et al (2010) pontua que comumente são caracterizadas como
assistencialistas a concessão de benefícios eventuais – conforme frisou nossa
interlocutora – e/ou atividades que não permitem continuidade da ação. Ao contrário,
a assistência social “diz respeito a uma modalidade de produção de bens e serviços
a uma classe social.” (SPOSATI et al, 2010, p. 58). Sob este prisma, a assistência
social como elemento das políticas sociais é constantemente atravessada pelas
lutas de classe.
O assistencialismo constitui-se em uma modalidade de ação utilizada ao
longo da histórica pelo capital para viabilizar os serviços da assistência social sob a
lógica do controle, do favor, do paternalismo e do fetichismo. “Com isto a prática
desenvolvida
seria
assistencialista
enquanto
reiteradora
da
dependência.”
(SPOSATI et al, 2010, p. 67). O assistencialismo se faz presente na medida em que
na atuação profissional torna-se não somente a execução de uma tarefa sem as
devidas mediações, mas quando se torna a direção assumida na atuação
profissional.
Romper com as práticas assistencialistas na atuação profissional é o
desafio proposto cotidianamente aos/as assistentes sociais trabalhadores/as da
política de assistência, (re) orientando para uma prática assistencial que privilegie a
94
constituição de mediações, indo além do aparente e fazendo sobressair as
particularidades entre as necessidades e seus determinantes.
Ressaltamos que não foi possível obter das interlocutoras da pesquisa
visões mais profundas e apuradas acerca do Serviço Social na Política de
Assistência, haja vista que suas repostas se voltaram à análise do CREAS Regional
na Assistência Social, conforme destacamos anteriormente e do CREAS Regional e
a Proteção Social Especial, como veremos na próxima subseção.
3.1.1 A Proteção Social Especial
Nesta subseção, apresentamos a proteção social especial e sua
estruturação na política de assistência social no sentido de destacar alguns
apontamentos entre aquilo que é proposto pela política de assistência social e o
ponto de vista das profissionais sobre os limites e possibilidades de efetivação da
referida proteção.
A LOAS preconiza em artigo 2º que a assistência social tem como um de
seus objetivos a proteção social visando “à garantia da vida, à redução de danos e à
prevenção da incidência de riscos”. A proteção social “se fundamenta na expansão
de um padrão societário de civilidade que afiança um padrão básico de vida e
respostas dignas a determinadas necessidades sociais” (SPOSATI, 2004, p. 43
apud BRASIL, 2011b, p.16).
Dessa forma, a política de assistência social organiza-se garantindo a
proteção social sob dois níveis, a saber, a Proteção Social Básica (PSB) e a
Proteção Social Especial (PSE). O artigo 6º-A, incisos I e II da LOAS assim destaca
esses níveis de proteção:
I - proteção social básica: oferta um conjunto de serviços, programas,
projetos e benefícios da assistência social que visa a prevenir situações de
vulnerabilidade e risco social por meio do desenvolvimento de
potencialidades e aquisições e do fortalecimento de vínculos familiares e
comunitários; (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011). II - proteção social
especial: conjunto de serviços, programas e projetos que tem por objetivo
contribuir para a reconstrução de vínculos familiares e comunitários, a
defesa de direito, o fortalecimento das potencialidades e aquisições e a
95
proteção de famílias e indivíduos para o enfrentamento das situações de
violação de direitos (Incluído pela Lei nº 12.435, de 2011). (BRASIL, 1993,
p.5) (grifo nosso).
Enquanto a proteção social básica tem por objetivo trabalhar na
prevenção de situações de risco pessoal e social e no fortalecimento dos vínculos
familiares e/ou comunitários, a proteção social especial é uma modalidade de
atendimento destinada a famílias que já se encontram em situação de risco pessoal
e social que ocasionam violações de direitos.
A referida legislação ressalta, ainda, em seu artigo 6º-B que os níveis de
proteção social devem ser ofertados pela rede socioassistencial 68 mediante a
articulação integrada dos equipamentos, entidades e organizações da assistência
social, de acordo com suas especificidades. As ações da proteção social básica
destinam-se a serem desenvolvidas no Centro de Referência de Assistência Social
(CRAS) e as ações da proteção social especial no Centro de Referência
Especializado de Assistência Social (CREAS)69. (BRASIL, 1993).
Sob este prisma, entendemos ser importante para o bom funcionamento
da proteção social especial que, além do desenvolvimento dos serviços, programas
e projetos de sua competência, mantenha-se um trabalho social compartilhado junto
à proteção social básica. Em se tratando especificamente da articulação entre PSB e
PSE, uma das interlocutoras mencionou:
Eu penso que para a PSE dar conta de suas atividades é necessário que a
PSB faça sua parte na área da prevenção e do fortalecimento dos vínculos.
(Lápis Lazuli).
Esta observação de Lápis Lazuli é pertinente para alguns apontamentos.
Em primeiro lugar, a existência dos equipamentos de referência para o trabalho
social representa “a afirmação da presença do Estado na condução da política de
assistência social”. (COUTO, 2009, p. 207). Desse modo compete ao Estado a
68
Segundo a LOAS (1993, p.18) “Entendem-se por serviços socioassistenciais as atividades
continuadas que visem à melhoria de vida da população e cujas ações, voltadas para as
necessidades básicas, observem os objetivos, princípios e diretrizes estabelecidos nesta Lei.
(Redação dada pela Lei nº 12.435, de 2011)”.
69
A Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais prevê um serviço especializado para
pessoas em situação de rua de responsabilidade do Centro de Referência Especializado para
População em Situação de Rua – Centro POP.
96
responsabilidade de fornecer aos usuários nos níveis de proteção o acesso à
universalização e garantia dos direitos previstos constitucionalmente.
Em segundo lugar, não basta à existência física dos equipamentos. É
importante realizar discussões e debates com todos os agentes envolvidos –
gestores, profissionais e usuários – acerca dos serviços, a qualidade do acesso, a
estrutura dos equipamentos, a qualificação profissional, dentre outros aspectos
necessários para materializar o significado social desses equipamentos na
sociedade e se de fato estão desempenhando seu papel. (COUTO, 2009). Sob este
aspecto, uma das participantes da pesquisa exprimiu sua avaliação:
Por exemplo, eu sinto falta de um trabalho de prevenção na área da
dependência química com os adolescentes e jovens daqui de Chorozinho.
Se houvesse esse trabalho com certeza a demanda para LA e PSC – que
em sua maioria tem como causa as drogas – reduziria bastante (Lápis
Lazuli).
Em terceiro lugar, Couto (2009) faz um alerta da necessidade de reflexão
sobre o real papel das entidades da rede socioassistencial que muitas vezes
resultam no desenvolvimento de programas fragmentados da realidade social a qual
se instalavam e com um caráter centralizador e pouco participativo.
A PSE considera as situações de riscos pessoais e sociais oriundas das
vulnerabilidades sociais. É a partir do risco social que os programas, projetos e
serviços da PSE são organizados considerando também a especificidade de cada
território e do público em que incidem as violações de direitos70. Faz-se necessária a
compreensão de que nas relações familiares e/ou comunitárias – em suas
dimensões socioeconômica, cultural, histórica e política – podem ocorrer
determinadas situações geradoras de conflitos que irão demandar um trabalho social
mais especializado. (BRASIL, 2011b).
Dentre estes conflitos podemos destacar: violência física, violência
psicológica, negligência, abandono, violência sexual, situação de rua, trabalho
70
As categorias mencionadas neste parágrafo, a saber, risco social, vulnerabilidade social e território
são elementos fundamentais na organização do SUAS.
97
infantil, cumprimento de medidas socioeducativas em meio aberto, afastamento do
convívio familiar, etc.
Para o cumprimento destes serviços o CREAS, portanto, constitui-se
como o espaço destinado ao desenvolvimento destas ações. O “Creas é
responsável por coordenar e fortalecer a articulação dos serviços especializados
com a rede de assistência social e ainda com as demais políticas públicas e órgãos
do sistema de garantia de direitos.” (IPEA, 2011, p.65).
Mediante a complexidade dessas situações e o seu nível de gravidade a
PSE subdivide-se em Proteção Social de Média Complexidade e Proteção Social de
Alta Complexidade. “A divisão de competências entre estes se estabelece a partir
das implicações da ameaça ou violação de direitos para o convívio familiar”. (IPEA,
2011, p. 65).
A PNAS conceitua que os serviços da proteção social especial de média
complexidade são destinados a famílias e indivíduos com seus direitos violados,
mas que ainda mantém vínculos familiares estando estes fragilizados. Alguns
serviços previstos neste âmbito são: o Serviço de orientação e apoio sócio-familiar, o
Plantão Social, o Abordagem de Rua, o Cuidado no Domicílio, o Serviço de
Habilitação e Reabilitação na comunidade das pessoas com deficiência, as Medidas
sócio-educativas em meio-aberto (Prestação de Serviços à Comunidade - PSC e
Liberdade Assistida – LA) (BRASIL, 2005b).
Concernente à proteção social de alta complexidade, a PNAS considera
como um serviço de proteção integral, a fim de garantir a famílias e/ou indivíduos
toda a proteção necessária mediante situações de ameaça e de perda da referência
familiar e/ou comunitária necessitando privar-se deste convívio. Os serviços são:
Atendimento Integral Institucional, Casa Lar, República, Casa de Passagem,
Albergue, Família Substituta, Família Acolhedora, Medidas sócio-educativas
restritivas e privativas de liberdade (Semi-liberdade, Internação provisória e
sentenciada), Trabalho protegido (BRASIL, 2005b).
“A oferta de serviços da PSE de média e alta complexidade cabe aos
98
municípios/Distrito Federal e, nos casos específicos de oferta regionalizada de
serviços, aos estados.” (BRASIL, 2011b, p. 20), o que se confirma pelo relato de
nossa interlocutora:
A proteção social especial é um direito social e o município não tem
capacidade e nem porte para oferecer este serviço. Por essa razão ocorre a
pactuação com o Estado (Lápis Lazuli).
Emerge, portanto, o desafio à proteção social especial de além de
desenvolver suas ações, articular-se também aos órgãos da rede de proteção social,
como por exemplo, os Conselhos Tutelares, as Delegacias, os Juizados dentre
outros, promovendo um trabalho social em conjunto com esses órgãos na
minimização destas violações, tendo cada órgão ciência de suas atribuições. Em
relação ao trabalho social do CREAS com a rede de proteção, nossas entrevistadas
destacaram:
Por exemplo, se é uma denúncia relativa à criança ou adolescente,
encaminhamos ao conselho tutelar e este ao constatar a violação de direitos
retorna a denúncia ao CREAS e partir daí começa nosso acompanhamento,
por que é assim que deve proceder o trabalho do CREAS (Ágata).
No interior fazemos acompanhamento da LA e PSC diferente daqui da sede
regional que não executa este serviço. Mas existem suas falhas. Uma vez,
um juiz me encaminhou a solicitação de elaboração de relatório de dois
adolescentes que já haviam executado medida socioeducativa. Como é que
eu iria fazer um relatório se não acompanhei o processo de execução da
medida? São falhas como essas que muitas vezes, dificultam que a
proteção social especial seja efetivada em sua plenitude (Lápis Lazuli).
Segundo as participantes deste estudo não é possível a qualquer política
ou serviço de proteção manter-se fechada em si mesma na proposição de respostas
a população usuária dos serviços. Nem tão pouco executar por conta própria
serviços que são de competência de outro equipamento correndo o risco de reduzir
e imediatizar os resultados que se esperam alcançar na execução dos serviços,
programas e projetos. A complementaridade dos serviços faz parte do processo de
viabilização de direitos e todos os equipamentos públicos devem operar nesta
dimensão.
[...] os serviços de proteção especial têm estreita interface com o sistema de
garantia de direito exigindo, muitas vezes, uma gestão mais complexa e
99
compartilhada com o Poder Judiciário, Ministério Público e outros órgãos e
ações do Executivo. (BRASIL, 2005b, p.37).
Conforme o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – IPEA (2011),
mesmo a PNAS havendo estruturado os níveis de proteção no âmbito da assistência
social, fazia-se necessário um melhor esclarecimento acerca dos serviços a serem
ofertados em cada nível de complexidade, pois
[...] ressentia de uma regulamentação sobre o escopo desses serviços, que
padronizasse minimamente conteúdo, usuários, objetivos e outros aspectos
necessários à sua implementação em todo o território nacional. (IPEA,
2011, p.50).
Assim, a Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais foi
suscitada na IV Conferência Nacional de Assistência Social, em 2006, e é por seu
intermédio que torna-se possível prever quais serviços devem ser ofertados pelos
CREAS no regime de média complexidade e até mesmo quais destes serviços
podem ser realizados através de parcerias com entidades e órgãos de gestão sem
que o caráter da oferta de serviços do CREAS seja prejudicado.
Da mesma forma, o documento busca descrever os serviços a serem
oferecidos, sendo especificados o nome do serviço, descrição, usuários, objetivos,
provisões, aquisições dos usuários, condições e formas de acesso, unidade, período
de funcionamento, abrangência, articulação em rede, impacto social esperado e
regulamentações, denominando de forma padronizada os serviços previstos no
SUAS.
Na Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais71 o CREAS
executa os seguintes serviços: Serviço de Proteção e Atendimento Especializado a
Famílias e Indivíduos (PAEFI); Serviço Especializado em Abordagem Social; Serviço
de Proteção Social a Adolescentes em Cumprimento de Medida Socioeducativa de
Liberdade Assistida (LA) e de Prestação de Serviços à Comunidade (PSC); Serviço
71
Cf. BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Resolução nº 109, de 11 de
novembro de 2009. Aprova a Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais. Diário Oficial [da]
República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 25 nov. 2009, 48 p.
100
de Proteção Social Especial para Pessoas com Deficiência, Idosas e suas Famílias
e Serviço Especializado para Pessoas em Situação de Rua72.
O Programa de Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos deve
ser ofertado obrigatoriamente em todas as unidades CREAS. O Serviço de Proteção
Social a Adolescentes em Cumprimento de Medida Socioeducativa de Liberdade
Assistida e de Prestação de Serviços à Comunidade pode ser pactuado com outras
unidades CREAS para aquelas localidades que possuem mais de uma unidade. O
Serviço Especializado em Abordagem Social e o Serviço de Proteção Social
Especial para Pessoas com Deficiência, Idosas e suas Famílias podem ser
oferecidos pelo CREAS ou por outras unidades específicas a ele referenciadas
(BRASIL, 2011b).
Dito isto, convém destacar que a efetivação satisfatória dos serviços da
tipificação nacional dependem das condições estruturais favoráveis e do suporte
necessário para a sua execução, ou seja, cada serviço possui sua especificidade
tanto com relação ao público que se destina quanto em seus procedimentos
operacionais. Vejamos as considerações pontuadas por uma interlocutora da
pesquisa acerca dos serviços da tipificação nacional:
Ainda existem falhas na execução de alguns serviços. É claro que há um
esforço para se manter a qualidade do serviço, mas ainda existem falhas.
Na metrópole eu percebo falha na articulação entre a PSE e a PSB e já no
interior conseguimos fazer algumas articulações, mas não temos uma rede
de proteção estruturada. (Lápis Lazuli).
Assim atribui-se também ao CREAS a competência de coordenar os
serviços a ele designados, bem como articular-se continuamente com as unidades a
ele
referenciadas
na
oferta
de
serviços,
de
modo
que
se
garanta
a
complementaridade dos serviços nestas unidades.
No que concerne ao CREAS Regional já pontuamos anteriormente que os
serviços de LA e PSC não são executados em sua sede, haja vista que em
Fortaleza estes serviços são de responsabilidade da instância municipal. Contudo,
72
Este serviço previsto na Tipificação dos Serviços Socioassistenciais é ofertado no Centro de
Referência Especializado de Assistência Social para População de Rua – Centro POP. Não
esmiuçaremos suas particularidades, por não ser o foco desta pesquisa.
101
as equipes volantes do CREAS promovem estes serviços nos municípios que
recebem as equipes volantes.
Com relação ao PAEFI, este serviço ocorre com maior frequência no
CREAS, sendo sua maior demanda de trabalho social principalmente denúncias de
violações de direitos cometidas contra crianças e adolescentes, o que se confirma
com os relatos de nossas interlocutoras:
O maior público de atendimento é criança e adolescente (Ágata).
Quando a denúncia chega aqui são realizadas visitas domiciliares pelos
educadores sociais, não são os assistentes sociais que fazem a 1ª visita.
Nesta visita inicial eles coletam dados, informações sobre a denúncia e
agendam atendimento. Esse atendimento, ele é agendado primeiramente
para o Serviço Social principalmente quando se trata de violação de direitos
por violência física, negligência e violência psicológica. No caso de violência
sexual e quando há espaço nas agendas de atendimento dos profissionais é
então marcado o atendimento psicossocial (Ágata).
Para a execução do Serviço Especializado em Abordagem Social, o
CREAS Regional possui Educadores Sociais que se deslocam para pontos
estratégicos da cidade, a fim de identificar a incidência de trabalho infantil, situações
de exploração sexual de crianças e adolescentes, situação de rua, dentre outras. Ao
se constatar a evidência de algumas dessas ocorrências pela equipe de educadores,
o CREAS faz os devidos encaminhamentos para a rede de proteção e/ou
acompanhamento social na unidade.
Para os Serviços de Proteção Social Especial para pessoas com
deficiência, idosas e suas famílias, o CREAS Regional procede um atendimento
especializado a esse público tanto em sua sede quanto no interior. Nos
atendimentos direcionados ao idoso, o CREAS conta a parceria do Centro Integrado
de Atenção e Prevenção à Violência contra a Pessoa Idosa (CIAPREVI).
3.1.2 A Instrumentalidade no trabalho do/a Assistente Social
Nesta
subseção,
apresentamos
a
definição
da
categoria
instrumentalidade e descrevemos de forma breve como a referida categoria contribui
para a atuação profissional dos/as assistentes sociais no espaço do cotidiano
102
institucional. Não nos deteremos profundamente nesta subseção por considerar que
esta categoria merece um estudo específico que aborde todos os seus elementos,
de modo, que as discussões apresentadas procuram analisar o significado da
categoria instrumentalidade para as participantes da pesquisa e a incidência da
instrumentalidade na atuação profissional das assistentes sociais do CREAS
Regional.
Sobre a Instrumentalidade do Serviço Social, Costa (2008) 73 faz um
resgate histórico acerca do debate desta temática na profissão e de como esta
categoria foi adquirindo relevância no âmbito da atuação profissional. A autora
destaca a década de 1990 como o período em que começaram a surgir as principais
discussões sobre o referido assunto na tentativa de elucidar o lugar que ocupavam
os instrumentos e técnicas na profissão de Serviço Social.
O estabelecimento, no debate de 1980, da diferença entre a concepção
teórico-metodológica e as estratégias e técnicas e procedimentos da
intervenção profissional denotaram a preocupação em refletir sobre as
técnicas e instrumentos no exercício profissional (COSTA, 2008, p. 22).
Compondo o arcabouço teórico sobre instrumentalidade, Costa (2008)
destaca as contribuições de Hélder Sarmento, Rosa Prédes Trindade, Sandra
Campagnolli74 e Yolanda Guerra, sendo esta quem desenvolveu com maior
profundidade a discussão da instrumentalidade, “a partir da compreensão das
particularidades do surgimento do Serviço Social no marco da divisão social e
técnica do trabalho”. (COSTA, 2008, p. 33).
Nos termos de Guerra (2000, p.1), entende-se instrumentalidade como:
uma propriedade e/ou capacidade que a profissão vai adquirindo na medida
em que concretiza objetivos. Ela possibilita que os profissionais objetivem
sua intencionalidade em respostas profissionais. É por meio desta
capacidade, adquirida no exercício profissional, que os assistentes sociais
modificam, transformam, alteram as condições objetivas e subjetivas e as
relações interpessoais e sociais existentes num determinado nível da
realidade social: no nível do cotidiano.
73
Cf. COSTA, Francilene Soares de Medereiros. Instrumentalidade do Serviço Social: Dimensões
Teórico-Metodológica, Ético-Política e Técnico-Operativa e Exercício Profissional. 2008. 147 p.
Dissertação (Mestrado em Serviço Social). Programa de Pós-Graduação em Serviço Social,
Universidade Federal do Rio Grande do Norte.
74
Para conhecer as linhas de produção destes autores, Cf. COSTA (2008).
103
Acerca das dimensões da instrumentalidade, Costa (2008) sistematiza-as
de forma prática e didática na qual nos utilizaremos a guisa de definição para nosso
estudo. A autora apresenta que estas dimensões devem ser entendidas
horizontalmente, sem sobreposições de uma sobre as outras. A primeira dimensão
referencia a apreensão de teorias que propiciem uma leitura crítica da realidade,
fornecendo parâmetros para a atuação profissional. A segunda dimensão articula as
grandezas política e ética da atuação profissional e confere a adesão ao projeto
ético-político e projeto societário que contribua para a construção de uma
emancipação humana futura. A terceira dimensão refere-se aos instrumentos
técnicos utilizados na intervenção, devendo sua utilização ser constantemente
aprimorada, a fim de contribuir satisfatoriamente aos objetivos do trabalho.
Guerra (2011) apresenta alguns apontamentos sobre as referências
recorrentes dos assistentes sociais acerca do instrumental técnico enquanto
mecanismo facilitador ou limitador da atuação profissional, destacando duas ordens
de razões.
A primeira diz respeito ao fato de que a concretização das propostas de
intervenção profissional perpassa necessariamente as condições objetivas de
trabalho que, determinadas pelas relações de causalidade, apresentam-se de
maneira extremamente adversa. Contudo, o fator subjetivo por vezes surge como
um fator decisivo e modificador. Desse modo, a atuação profissional deve direcionarse ao estabelecimento de condições materiais indispensáveis para uma intervenção
que supere a dimensão pragmática e burocratizada das instituições. (GUERRA,
2011).
A segunda ordem remete à proposta metodológica marxiana. Sabe-se
que a teoria marxiana tende a (re) produzir no nível do pensamento o movimento
real do objeto, mas de modo algum tende a (re) produzir a realidade, haja vista que
esta é plena de determinações. Com isso teoria e método não se confundem. A
teoria, portanto, ilumina os processos reflexivos, a contrariedade e a negação das
determinações, mas de modo algum oferece os “instrumentos profissionais de ação
imediata sobre os fenômenos” (GUERRA, 2011, p. 29). Da mesma forma “a
104
concepção de método enquanto direção analítica” (ibidem, p. 29) não é concebida
como “um conjunto de procedimentos ou como meio de aplicação imediata do
conhecimento” (ibidem, p. 30). Existem na verdade, mediações que perpassam
esses processos, bem como determinantes objetivos e subjetivos que até são
desvelados pelo método, mas não são por ele resolvidos.
Com esta definição, Guerra procura esclarecer que a discussão da
instrumentalidade precede a discussão reducionista e equivocada de instrumentos e
técnicas
enquanto
elementos
potencializadores
ou
inibidores
da
atuação
profissional, pois refletir sobre a instrumentalidade da profissão nos remete a ir além
de definições estabelecidas, questionando “para que” e o lugar que os instrumentos
técnicos ocupam na constituição da profissão, a fim de apreender as dimensões
que, no nível mediato, as ações profissionais podem produzir (GUERRA, 2011).
A
partir
destas
considerações
pontuamos
a
compreensão
das
interlocutoras da pesquisa sobre instrumentalidade:
Para mim instrumentalidade é tudo aquilo que o profissional de Serviço
Social se utiliza para exercer a sua prática. É tudo aquilo que ele precisa
com relação a um documento, a uma entrevista, a um roteiro, o Código de
Ética e todos os conhecimentos necessários para o seu fazer (Ágata). (grifo
nosso).
Instrumentalidade é tudo aquilo que se usa para fazer o exercício
profissional. Por exemplo, reuniões de equipe, visitas, relatórios, pareceres,
etc. Você só se adequa a instrumentalidade quando chega a demanda. Fiz
algumas adaptações dos instrumentais que utilizamos aqui na sede para o
trabalho social em Chorozinho. Também criei alguns instrumentais para LA
e PSC. Para instrumentalidade também acho importante sempre fazermos
uma autoavaliação do nosso trabalho (Lápis Lazuli). (grifo nosso).
Os relatos das interlocutoras apontam questões importantes que
merecem ser destacadas. É possível, portanto, verificar que a compreensão das
profissionais sobre instrumentalidade, de modo geral, remete a “associar”
instrumentalidade aos instrumentos técnicos. Esta “associação” é algo recorrente na
profissão, que não pode ser encarada como algo comum. É preciso que seja
esclarecida,
a
fim
de
não
naturalizarmos
tomando-a
consequentemente simplificarmos a atuação profissional.
como
conceito
e
105
Sob este aspecto, Guerra (2011) menciona que as ações instrumentais
desenvolvidas pelo Serviço Social ocorrem mediante sua inserção na divisão social
e técnica do trabalho e nos espaços institucionais, onde a partir de uma
racionalidade formal-abstrata75 esta ampara e requisita as ações da profissão.
Desse modo, ao mesmo tempo em que a instrumentalidade constitui-se como a
razão de ser do Serviço Social, ou seja, traduz a funcionalidade da profissão para a
qual a sociedade a convoca, “é o que lhe possibilita a passagem das teorias às
práticas.” (GUERRA, 2011, p. 37).
Os agentes profissionais, ao mesmo tempo em que produzem uma
racionalidade objetiva mediante sua intervenção nas questões sociais,
permeadas de racionalidade, incorporam-na, não como simples reflexo da
realidade, mas mediados por procedimentos racionais que envolvem
diferentes níveis de apreensão do real [...]. [...] os agentes profissionais
recolhem as mediações postas nas objetividades sociais que produzem no
plano interventivo, recriando, ao nível do pensamento, a dinâmica dos
fenômenos e processos sobre os quais intervêm, estão inteligindo sobre
suas ações (GUERRA, 2011, p. 35).
Desse modo, a instrumentalidade constitui-se como uma racionalidade
dialética76 de caráter reflexivo e operativo, construída pelo/a assistente social, sendo
um “conduto de passagem e eixo articulador entre teorias e práticas”, ou seja, um
espaço de mediações “onde os padrões de racionalidade e as ações instrumentais
se processam” (GUERRA, 2011, p. 37-38). A “associação” feita pelas interlocutoras
remete a uma das dimensões da instrumentalidade, a saber, a dimensão técnicooperativa, que articulada a outras duas dimensões, teórico-metodológica e éticopolítica efetiva, a instrumentalidade plasmando mediações dissonantes a atuação
profissional.
Devemos destacar também que, no primeiro relato, Ágata fez menção à
dimensão ético-política ao referenciar o Código de Ética Profissional. Lápis Lazuli
75
Segundo Guerra (2011, p. 122) “o racionalismo formal-abstrato encontra seu substrato nos
processos e relações que se estabelecem no/pelo trabalho nas formações sócio-econômicas
capitalistas. Porém o seu desenvolvimento assume expressões peculiares nas diversas instituições e
organizações da sociedade burguesa”.
76
“Por Razão dialética estamos entendendo o mais alto nível de razão e como tal, crítica e
emancipatória. A razão humana é dialética, ou seja, incorpora a contradição, o movimento, a
negatividade, a totalidade, as mediações, buscando a lógica de constituição dos fenômenos, sua
essência ou substância. A razão dialética refere-se: a uma lógica objetiva que os processos sociais
portam e às condições que permitem a reconstrução desta lógica, pela via do pensamento. No
capitalismo esta razão é limitada a uma de suas dimensões: à dimensão instrumental.” (GUERRA,
2000, p. 14 – nota 7).
106
expressou em meio ao seu relato: “Você só se adéqua a instrumentalidade quando
chega a demanda [...] Também criei alguns instrumentais para LA e PSC”. Ora, esta
afirmativa de nossa interlocutora acaba sendo dissonante a afirmativa de Guerra
(2011) sobre a finalidade da instrumentalidade, já citada anteriormente em sua
definição, qual seja, que a instrumentalidade “possibilita que os profissionais
objetivem sua intencionalidade em respostas profissionais” (GUERRA, 2000, p.1).
Algumas profissionais não souberam verbalizar sua compreensão de
instrumentalidade e não foi possível extrair através de exemplos do cotidiano como a
instrumentalidade se efetiva na atuação profissional das interlocutoras. Ponderamos
que os silêncios, a falta de resposta e a associação de instrumentalidade a
instrumentos podem traduzir circunstâncias do processo de formação profissional 77,
bem como limites do cotidiano institucional podendo restringir a compreensão de
determinados conceitos, haja vista que a instrumentalidade é uma categoria
apreendida e exercitada tanto na formação quanto na atuação profissional. Mas,
mediante o fato de não haverem conceituado a categoria em questão, não podemos
afirmar – e isso seria leviano de nossa parte – que a instrumentalidade não se
materializa na atuação profissional das assistentes sociais do CREAS Regional 78, ao
contrário, a instrumentalidade se faz presente em toda atuação profissional. O que
poderíamos questionar seriam quais os desdobramentos que a instrumentalidade
refletirá em cada atuação profissional, ou seja, se será uma instrumentalidade
dialética ou alienante.
Vejamos o que as participantes da pesquisa pontuaram sobre a
materialização da instrumentalidade em sua atuação:
Silêncio da entrevistada... Como eu te falei, eu não vejo essa questão da
instrumentalidade no meu fazer, porque a gente acaba não executando tudo
que a gente vê na formação, mas teve um tempo em que eu via mais essa
instrumentalidade no meu trabalho anterior, entendeu. No Projovem onde a
gente tinha que executar ações com os jovens e com as famílias levando
informações, mobilização. Nesse tempo eu conseguia ver mais, hoje não
(Ônix). (grifo nosso).
77
Haja vista que o ensino superior também sofre rebatimentos da ofensiva neoliberal que incidem
limitando as condições de realização da formação profissional.
78
Durante a experiência de estágio supervisionado em Serviço Social na instituição constatamos que
a atuação profissional das assistentes sociais plasmava este conceito.
107
É como eu já venho dizendo... Eu não visualizo a materialização da
instrumentalidade no trabalho atual que executo, pois qualquer pessoa
poderia fazer (Ágata). (grifo nosso).
Dito isto, podemos identificar que as condições objetivas de trabalho
podem interferir na materialização da instrumentalidade profissional, o que causa um
confronto entre a instrumentalidade do Serviço Social entendida como racionalidade
dialética e a racionalidade da ordem burguesa em sua dimensão alienante. As falas
das interlocutoras refletem esse confronto que diariamente é travado no âmbito das
instituições para a efetivação do trabalho social, o que se confirma quando Ônix
relatou: “mas teve um tempo em que eu via mais essa instrumentalidade” e Ágata
“Eu não visualizo a materialização da instrumentalidade”, o que nos leva a
questionar: Que situações estão sendo estabelecidas nas instituições para limitar
e/ou impedir a efetivação de uma instrumentalidade dialética na atuação
profissional? Esses elementos devem ser problematizados para fortalecer a
instrumentalidade do Serviço Social na atuação profissional e não a sua
descaracterização.
Diante deste impasse, Guerra (2011, p. 30) sinaliza alternativas:
Ainda neste nível – do mediato – entendemos que as requisições dos
profissionais vislumbram uma modalidade de razão que permita atuar com
as dificuldades, limitações e constrangimentos colocados pelas situações
objetivas sob as quais a intervenção profissional se realiza; que possibilite
operar com os dados coletados na intervenção profissional, transformá-los
em conhecimento sobre a população atendida e revertê-los em conteúdo
dos projetos sem que, contudo, o profissional tenha que capitular diante do
pensamento conservador e reformista. (grifos originais).
Em outras palavras:
[...] o Serviço Social possui modos particulares de plasmar suas
racionalidades que conforma um “modo de operar”, o qual não se realiza
sem instrumentos técnicos, políticos e teóricos, tampouco sem uma direção
finalística e pressupostos éticos, que incorporam o projeto profissional
(GUERRA, 2011, p. 203).
Na prática profissional percebemos como a instrumentalidade é um
recurso valioso à intervenção dos/as assistentes sociais, pois inseridos nas relações
sociais capitalistas extremamente contraditórias, os espaços institucionais em sua
dinâmica rígida e conservadora apresentam inúmeras refrações da questão social
108
que desafiam os profissionais ao desvelamento de sua estrutura. Sem a apreensão
da instrumentalidade, como possibilidade interventiva, é impossível ao/a assistente
social realizar um movimento dialético articulador de mediações, correndo o sério
risco de reproduzir ações que se limitarão ao alcance institucional.
3.2 O Projeto Ético-Político do Serviço Social e as particularidades do trabalho
do/a Assistente Social na Política de Assistência Social
Buscamos refletir com o/a nobre leitor/a, nesta seção sobre a
configuração histórica do Projeto Ético-Político do Serviço Social e como os
direcionamentos deste projeto se plasmam no trabalho do/a assistente social na
política pública de assistência social ressaltando a compreensão das profissionais
entrevistadas acerca da efetivação deste projeto em sua atuação profissional.
Segundo Netto (1999) as raízes para materialização do Projeto ÉticoPolítico do Serviço Social situam-se em meio ao desenvolvimento do Serviço Social
na América Latina – com o Movimento de Reconceituação – e a particularidade
histórica brasileira datada entre a década de 1970 e 1980. Inicialmente é
interessante que façamos uma breve distinção entre projeto societário e projeto
profissional. Esses elementos são fundamentais para a composição do projeto éticopolítico das/os assistentes sociais.
Por projetos societários compreendem-se aqueles projetos que remetem
a uma imagem de sociedade a ser construída demandando determinados valores de
uma coletividade; são projetos macroscópicos com propostas para o conjunto da
sociedade. Apresentam uma dimensão política que envolve relações de poder.
Outra característica dos projetos societários segundo Netto (1999, p. 3), refere-se a
sua estrutura flexível e cambiante, ou seja, “incorporam novas demandas e
aspirações, transformam-se e se renovam conforme as conjunturas históricas e
políticas.” (NETTO, 1999).
Entende-se por projetos profissionais aqueles que refletem a autoimagem
de uma profissão mediante a eleição de valores que a legitimam na sociedade;
apontam e demarcam os objetivos e ações da profissão formulando as balizes para
109
seu exercício. Balizes essas que direcionam as normas e os comportamentos
profissionais – seja com o público-alvo de seu exercício profissional, seja com outras
profissões e organizações ou instituições onde se efetiva sua atuação. Outro fator
importante dos projetos profissionais é que estes envolvem todos os atores sociais 79
que dão concretude à profissão. Suas dimensões políticas ocorrem em sua
amplitude – relacionando-se com os projetos societários – e em sua especificidade –
considerando as particularidades de cada profissão (NETTO, 1999).
No que concerne ao Serviço Social e ao seu projeto profissional sua
contextualização ocorreu em meio a três condicionantes destacados por Netto
(1999). A primeira condição diz respeito à recusa e a crítica ao conservadorismo
profissional80 que se espraiou na categoria profissional. No momento de crise da
ditadura brasileira e de efervescência política, em que a classe trabalhadora
adentrou a cena pública em resistência à ditadura, o conservadorismo do Serviço
Social brasileiro passou a ser questionado no corpo profissional. Ou seja, as
inquietações e exigências políticas e sociais que se difundiam na sociedade também
repercutiram na profissão.
A segunda condição refere-se à produção de conhecimento que se
consolida na área de Serviço Social, a partir do diálogo com as ciências sociais.
Neste aspecto, a profissão pode aproximar-se de “matrizes teóricas e metodológicas
compatíveis com a ruptura com o conservadorismo profissional” (NETTO, 1999, p.
12), bem como aderiu ao projeto societário da classe trabalhadora. A terceira
condição apontada pelo referido autor está ligada à formação profissional, no sentido
de adequá-la às novas configurações em que a profissão se inseria, tendo a
preocupação de contribuir para um novo perfil profissional (NETTO, 1999).
Estas conquistas foram, portanto, consolidadas no Código de Ética
Profissional de 1986 que marcou o surgimento de uma vertente de ruptura com o
conservadorismo e o compromisso assumido pela profissão com a classe
trabalhadora. Este Código procurou contemplar discussões no campo da política e
79
A saber, Conjunto CFESS/CRESS, Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social
(ABEPSS), Executiva Nacional de Estudantes de Serviço Social (ENESSO), Sindicatos e demais
Associações de Assistentes Sociais. (NETTO, 1999).
80
Cf. Netto (2011).
110
da ética, mas esta não foi tão bem contemplada no documento. Somente com a sua
revisão em 1993 que o Código de Ética Profissional pode ser contemplado pela
acumulação teórica, política e ética (NETTO, 1999). “Em 1993, ético e político não
são sinônimos; são compreendidos como uma unidade, mas seus componentes têm
naturezas ontologicamente distintas.” (BARROCO, 2004, p. 35).
É sabido que existem diferentes projetos societários em constante
disputa, e este confronto é um movimento próprio do exercício político. Contudo,
instaura-se em nossa sociedade um projeto societário – projeto neoliberal – que
defende os interesses e legitima as liberdades políticas e econômicas para uma
minoria, ao mesmo tempo em que dissemina sua ideologia à população. Em
contraposição, existe outro projeto societário de uma maioria que defende condições
de vida mais favoráveis para toda a sociedade.
Compõem as defesas do projeto ético-político em questão, a saber: o
reconhecimento da liberdade como eixo central, afirmando que “este projeto
profissional se vincula a um projeto societário que propõe a construção de uma nova
ordem social, sem exploração/dominação de classe, etnia e gênero.” (NETTO, 1999,
p. 15). Em sua ótica política torna-se a favor da equidade e da justiça social sendo
um projeto radicalmente democrático. Do ponto de vista profissional, compromete-se
com a formação profissional de qualidade e com o aprimoramento intelectual
constante das/os assistentes sociais. Privilegia a relação com os usuários e o
compromisso com a qualidade dos serviços prestados (NETTO, 1999).
Desse modo, o Projeto Ético-Político do Serviço Social organiza-se a
partir de três grandes frentes: Político-organizativa, através das entidades
representativas da profissão (ABEPSS, CFESS/CRESS e ENESSO); acadêmica,
através das Diretrizes Curriculares, pesquisa e produção intelectual; jurídico-política,
com os instrumentos de regulação jurídica e de mobilização profissional (MOTA &
AMARAL, 2009).
Assim, o Projeto Ético-Político do Serviço Social teve estas bases para
sua constituição, mas dia a dia este projeto é afirmado pela categoria, haja vista ser
um projeto em constante processo, a partir dos desdobramentos assumidos pela
111
categoria profissional e as tensões sofridas na realidade social. Da mesma forma,
resslatamos que este projeto é um referencial hegemônico na profissão, mas que
exige dos profissionais sua reafirmação diária, haja vista que outras tendências
também existem no corpo da profissão.
Enfim, o projeto assinala claramente que o desempenho ético-político dos
assistentes sociais só se potencializará se o corpo profissional articular-se
com os segmentos de outras categorias profissionais que compartilham de
propostas similares e, notadamente, com os movimentos que se solidarizam
com a luta geral dos trabalhadores (NETTO, 1999, p. 16).
Mas, então surge o questionamento: Como materializar o projeto éticopolítico
do Serviço
Social
na
Política de
Assistência
Social? Quais as
particularidades que implicam neste processo?
Indagamos às interlocutoras da pesquisa acerca da materialização do
projeto ético-político na atuação profissional, vejamos as respostas que as
profissionais deram:
Visualizo o Projeto Ético-Político se materializando diariamente no meu
fazer. No compromisso que tenho com os usuários que atendo; no
compromisso dos demais profissionais também; na autonomia que é dada
ao usuário nos atendimentos, na liberdade; no oferecimento de um
atendimento de qualidade; nos esclarecimentos que proporcionamos; nos
encaminhamentos à rede de proteção, etc. (Lápis Lazuli).
Não vejo visualizando 100%, pois é como já falei. Diante de todas as
dificuldades que a gente encontra, acabamos não conseguindo por em
prática tudo, mas parcialmente sim. Tem algumas coisas que a gente
consegue estabelecer sim, mas acabamos não sendo eficazes 100% (Ônix).
Não. É como eu já venho dizendo... O setor ao qual estou inserida é muito
burocrático. Apesar de neste trabalho eu me utilizar de algumas ferramentas
para desenvolvê-lo da melhor forma possível. Fomos remanejados para lá...
Não sei se por conta do conhecimento que o assistente social tem... Eu
procuro fazer o meu trabalho da melhor forma possível, mas eu estaria
dando mais de mim se estivesse no acompanhamento. E por isso eu não
visualizo (Ágata).
É possível constatar visões diferenciadas sobre a materialização do
projeto. Aquela que visualiza o projeto se efetivando na sua atuação profissional,
outra que o vê materializar-se parcialmente e a seguinte que não visualiza a
efetivação do projeto em sua atuação. O que ocorre para que profissionais de um
112
mesmo equipamento tenham posicionamentos antagônicos com relação ao projeto
ético-político? Não deveriam ter a mesma opinião, visto que estão submetidas às
mesmas condições de trabalho? A resposta que ousamos aludir é que de fato as
condições objetivas – como já destacamos outras vezes – tornam-se um “Golias”
para a atuação dos/as assistentes sociais, mediante os diversos limites da sua
condição como trabalhadores assalariados. Contudo, no que concerne ao projeto
ético-político, Mota (2011) explicita que a cisão entre o vir a ser do projeto e sua
concretização no cotidiano institucional não está vinculado ao campo institucional no
qual o/a assistente social está inserido. Desse modo, constitui-se como um desafio
cotidiano dos profissionais que assumiram este projeto conseguirem efetivá-lo no dia
a dia. Não pretendemos rechaçar que a insatisfação decorrente da não efetivação
do projeto ético-político passa pela dimensão subjetiva, mas não deve estacionar
neste nível, podendo-se debater e reavaliar as estratégias (re)definindo os rumos de
sua atuação para plasmá-la de maneira qualitativa.
O trabalho na assistência social inscreve-se no campo da produção de
serviços
que
contemplam
as
necessidades
sociais
dos
usuários
e,
consequentemente a efetivação dos direitos assistenciais. Apesar do aumento dos
postos de trabalho – a partir das normatizações mencionadas na seção anterior – os
rumos da assistência social nas políticas sociais, ao mesmo tempo em que
imprimem limites de acesso aos usuários dos serviços, limitam o cotidiano de
trabalho dos/as assistentes sociais, o que sinaliza que estes profissionais sofrem os
mesmos rebatimentos nas condições de trabalho que os demais trabalhadores da
sociedade capitalista no espaço institucional. A consequência desta inflexão na
atuação profissional tem sido:
A centralidade da Política de Assistência Social na proteção social brasileira
que centra a intervenção na pobreza absoluta impacta diretamente o
cotidiano profissional, [...] vem exigindo um profissional com um perfil cuja
tendência é de fortalecimento das bases conservadoras do Serviço Social,
e, portanto, de mero controle de parcelas da classe trabalhadora usuária
desta política (SILVA, 2012, p. 180).
O Serviço Social tem o compromisso ético e político de romper com esta
dimensão de modo a fazer defesa de uma política de assistência social como um
dos elementos da seguridade social, articulada à previdência e à saúde, bem como
113
assumir uma atuação profissional à luz de seu projeto profissional que postule
intervenções críticas vinculadas aos direitos dos usuários e as suas demandas. Para
isso, a/o assistente social deve distanciar-se das práticas funcionalistas e
pragmáticas – que tratam as expressões da questão social como eventos individuais
e sem articulação com o meio social – que reforçam a permanência de um
conservadorismo refutado pelo corpo profissional.
É preciso reconhecer a questão social como objeto de intervenção e
matéria-prima (Iamamoto, 2011b) do Serviço Social para daí empreender esforços
propositivos e críticos, a fim de decifrar os determinantes históricos, políticos e
socioeconômicos que se aglutinam nas desigualdades sociais.
Independente da política pública ou do espaço sócio-ocupacional no qual
estão inseridas/os, as atribuições e competências dos/as assistentes sociais são
regidas pelo Código de Ética Profissional81 e pela Lei de Regulamentação da
Profissão82 devendo ser observadas tanto pelos/as assistentes sociais quanto pelas
organizações e/ou instituições em trabalham estes profissionais.
O Artigo 2º do Código de Ética inscreve como direitos dos/as assistentes
sociais:
a) garantia e defesa de suas atribuições e prerrogativas, estabelecidas na
Lei de Regulamentação da Profissão e dos princípios firmados neste
Código; b) livre exercício das atividades inerentes à profissão; c)
participação na elaboração e gerenciamento das políticas sociais, e na
formulação e implementação de programas sociais; d) inviolabilidade do
local de trabalho e respectivos arquivos e documentação, garantindo o sigilo
profissional; e) desagravo público por ofensa que atinja a sua honra
profissional; f) aprimoramento profissional de forma contínua, colocando-o a
serviço dos princípios deste Código; g) pronunciamento em matéria de sua
especialidade, sobretudo quando se tratar de assuntos de interesse da
população; h) ampla autonomia no exercício da profissão, não sendo
obrigado a prestar serviços profissionais incompatíveis com as suas
atribuições, cargos ou funções; i) liberdade na realização de seus estudos e
pesquisas, resguardados os direitos de participação de indivíduos ou grupos
envolvidos em seus trabalhos (CFESS, 1993, p. 26-27).
81
Resolução CFESS nº 273/93. Institui o Código de Ética Profissional dos Assistentes Sociais. 13 de
março de 1993.
82
Lei 8.662. Dispõe sobre a profissão de assistente social e dá outras providências. Brasília, 7 de
junho de 1993.
114
O Artigo 3º do Código de Ética inscreve como deveres dos/as assistentes
sociais:
a) desempenhar suas atividades profissionais, com eficiência e
responsabilidade, observando a Legislação em vigor; b) utilizar seu número
de registro no Conselho Regional no exercício da profissão; c) abster-se, no
exercício da profissão, de práticas que caracterizem a censura, o
cerceamento da liberdade, o policiamento dos comportamentos,
denunciando sua ocorrência aos órgãos competentes; d) participar de
programas de socorro à população em situação de calamidade pública, no
atendimento e defesa de seus interesses e necessidades (CFESS, 1993, p.
27).
O CFESS objetivando o exercício da interdisciplinaridade na assistência
social, em parceria com o Conselho Federal de Psicologia (CFP), elaborou os
“Parâmetros para atuação de assistentes sociais e psicólogos (as) na Política de
Assistência Social”. “Este documento aborda alguns parâmetros ético-políticos e
profissionais com a perspectiva de referenciar a atuação de assistentes sociais e
psicólogos/as no âmbito da política de Assistência Social.” (CFESS & CFP, 2007,
p.8). Do mesmo modo, o CFESS considerando o campo específico de trabalho na
Política de Assistência Social elaborou o documento intitulado “Parâmetros de
Atuação de Assistentes Sociais na Política de Assistência Social”. “Esses
parâmetros têm como pressuposto que a definição de estratégias e procedimentos
no exercício do trabalho deve ser prerrogativa dos (as) assistentes sociais, de
acordo com sua competência e autonomia profissional.” (CFESS, 2009, p. 2-3).
Estes instrumentos possibilitam uma aproximação do projeto ético-político
a uma assistência social vinculada ao direito social, destinada a viabilizar os serviços
sociais a quem dela necessitar. Corroborando com a Lei de Regulamentação da
Profissão, os parâmetros de atuação requisitam competências gerais para o trabalho
social na assistência social, quais sejam:
• Apreensão crítica dos processos sociais de produção e reprodução das
relações sociais numa perspectiva de totalidade; • Análise do movimento
histórico da sociedade brasileira, apreendendo as particularidades do
desenvolvimento do Capitalismo no País e as particularidades regionais; •
Compreensão do significado social da profissão e de seu desenvolvimento
sócio-histórico, nos cenários internacional e nacional, desvelando as
possibilidades de ação contidas na realidade; • Identificação das demandas
presentes na sociedade, visando a formular respostas profissionais para o
enfrentamento da questão social, considerando as novas articulações entre
o público e o privado (ABEPSS, 1996 apud CFESS, 2009, p.17-18).
115
Destacamos o relato de uma das interlocutoras da pesquisa para
exemplificar como estas competências são necessárias para uma intervenção crítica
e propositiva na Política de Assistência Social e na Proteção Social Especial:
Durante o atendimento a gente tenta perceber onde estão as lacunas
daquela fragilidade daquele acompanhamento. Muitas vezes começamos
com uma tipificação e terminamos com outra. Às vezes tentamos com muita
propriedade encaminhar aos órgãos de defesa na tentativa de melhorar
essa vulnerabilidade. A organização é feita pelo setor de denúncia. A
execução é dessa maneira: acompanhamento social, muitas vezes também
é psicossocial, o Serviço Social faz uma leitura daquela situação e trabalha
todas as questões necessárias naquele primeiro atendimento e fazemos
quantos atendimentos necessários para que a família supere a violação
(Pedra do Sol).
Pedra do Sol, ao relatar a sequência de um acompanhamento social no
CREAS Regional, destaca importantes dimensões que se efetivam em sua atuação,
a saber, a perspectiva de totalidade outrora citada, indo além do aspecto
emergencial e aparente; capacidade crítica para decifrar os elementos ocultos nas
situações de fragilidades, comprometimento com a população usuária, no sentido de
possibilitar o acesso aos serviços que contemplem sua demanda; o trabalho
interdisciplinar para apreender todas as nuances que perpassam as demandas dos
usuários; e o acompanhamento contínuo e sistemático ao usuário para o
fortalecimento dos vínculos e superação das violações.
Todos estes elementos possíveis de citar mediante este relato tornam-se
balizes para uma atuação profissional comprometida com a direção social assumida
pela profissão plasmando-se, portanto, os aspectos centrais primados pela profissão
e pelo projeto ético-político. Não podemos negar também que apesar de não
mencionados, estão imbricadas ao processo de disputas societárias, correlação de
forças entre instituição e profissionais e até mesmo entre o que deve ser realizado –
enquanto política pública – e o que é “conveniente” a ser realizado – sendo esta
política subordinada a interesses neoliberais que acabam por limitar a atuação
profissional.
É diante deste contexto que o/a assistente social se insere nas
instituições devendo ter clareza teórica e política de que as contradições da
116
realidade incidem necessariamente nas particularidades da profissão, no cotidiano
institucional e na vida dos usuários dos serviços, evitando, desse modo, o risco de
associar a atuação profissional à agudização da crise83.
Por estas razões é que Boschetti (2009) enfatiza que para se refletir sobre
as condições de trabalho na assistência social e sua relação com o projeto éticopolítico implica pensar sobre a gestão do trabalho da assistência, ou seja, cogitar no
âmbito global as condições de trabalho do/a assistente social na classe
trabalhadora. Nesta concepção a autora ressalta que se faz necessário, em primeiro
lugar, que a categoria reflita sobre qual concepção de assistência social vem
orientando a atuação profissional e, em segundo lugar, o que está para além do
trabalho cotidiano e o que se almeja alcançar com este trabalho.
83
Destacamos esse risco, a fim de evitarmos a vinculação do vir a ser da profissão às desigualdades
sociais.
117
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A guisa de finalização, apresentamos ao/a leitor/a os achados desta
investigação científica delineados, a partir dos objetivos inicialmente traçados, bem
como alguns apontamentos e questões importantes que podem ser melhor
exploradas em futuras pesquisas.
Procuramos ao longo deste caminho discutir sobre a profissão de Serviço
Social e sua inserção nos equipamentos públicos, a fim de percebermos como a
categoria de assistentes sociais tem exercido sua atuação profissional nestes
espaços, mediante as especificidades que o envolvem. Nesta pesquisa, tratamos de
investigar a atuação dos/as assistentes sociais no CREAS Regional e lançando o
olhar sobre a atuação profissional neste espaço institucional.
A pergunta de partida que norteou toda pesquisa fora analisar o fazer
profissional do/a assistente social no cotidiano institucional do CREAS Regional –
Fortaleza. Quando se pesquisa sobre categorias profissionais e seus processos de
afirmação e consolidação profissional nos remete a refletir sobre sua inserção na
sociedade vinculando-a aos processos históricos que perpassam sua trajetória.
Com o Serviço Social não é diferente. Não há como se pensar Serviço
Social sem associá-lo às circunstâncias históricas em que emergiu a profissão – sob
o tradicionalismo católico –; ao seu processo de institucionalização passando a ser
requisitado pelo Estado para o trabalho nas políticas sociais; seu amadurecimento
enquanto categoria profissional, mediante o rompimento com o conservadorismo
profissional e sua adesão a um projeto de sociedade que vislumbra a emancipação.
Estas foram algumas questões que procuramos pontuar – mesmo de forma breve –
ao longo deste ensaio por entendermos serem necessárias para situar o/a leitor/a
sobre como o Serviço Social vem exercendo sua atuação profissional na sociedade.
Desse modo, atribuímos ser relevante descobrir como vem ocorrendo a atuação
profissional do Serviço Social no CREAS Regional, mediante as particularidades
desta instituição no trato com as situações de violação de direitos vinculadas à
proteção social de média complexidade.
118
Nesta pesquisa procuramos clarificar os seguintes questionamentos:
conhecer as competências e atribuições do/a assistente social no CREAS; analisar o
significado da categoria Instrumentalidade para as participantes da pesquisa;
compreender o papel do/a assistente social dentro da equipe interdisciplinar no
CREAS; investigar os limites e possibilidades entre as condições de trabalho e a
atuação dos/as assistentes sociais na viabilização dos direitos.
Os resultados da pesquisa apresentaram que as competências e
atribuições do/a assistente social no CREAS exigem dos/as profissionais um
trabalho social específico no trato das violações de direitos. Neste sentido,
buscamos compreender qual o entendimento das participantes da pesquisa acerca
do CREAS e de sua utilidade social. Podemos constatar que as situações de
violação de direitos são, sobremaneira, expressões da questão social que se
materializam nos espaços institucionais e, portanto, matéria-prima e objeto de
trabalho do Serviço Social que refletem as desigualdades sociais e econômicas
latentes em nossa sociedade. Violações essas que ao longo da pesquisa foram
destacadas pelas participantes. Contudo, a reprodução do discurso institucional
ainda se faz presente não permitindo reflexões mais profundas sobre as expressões
da questão social que se apresentam no cotidiano institucional.
Consideramos ser importante fazer essa constatação, a fim de que não se
perca de vista que em meio a estas expressões o/a assistente social empreende
cotidianamente suas potencialidades profissionais aprimorando seu olhar crítico as
singularidades sociais evitando a naturalização das expressões da questão social e
consequentemente a simplificação de sua atuação profissional.
Constatamos que no espaço cotidiano do CREAS, a execução das
atividades profissionais, pauta-se a partir dos instrumentos normativos que norteiam
as ações da proteção social especial e da própria profissão. Contudo, podemos
perceber que as profissionais possuem atribuições distintas no equipamento e que
estas atribuições estavam atreladas as condições de trabalho estabelecidas na
unidade que acabam por incidir no nível de satisfação e de insatisfação na execução
de suas atribuições. O que podemos evidenciar é o fato de que as condições de
119
trabalho quando não estabelecidas de modo satisfatório interferem diretamente no
nível de satisfação do/a assistente social devido a não efetivação da dimensão éticopolítica em sua atuação profissional.
No espaço do plantão social, local onde o/a assistente social do CREAS
também exerce suas atribuições, percebemos que de modo geral, a visão histórica
do atendimento emergencial do plantão social, vem sendo superada pelas
assistentes sociais, contudo permanece o desafio de romper com esta dimensão
cotidianamente. Esta, inclusive, foi uma questão que chamou nossa atenção ao
longo da pesquisa e sugerimos como proposta para futuras pesquisas, compreender
as velhas e/ou novas configurações do plantão social no espaço institucional.
Verificamos nesta pesquisa que o trabalho interdisciplinar é uma dimensão
da atuação do/a assistente social exercida com frequência no espaço cotidiano do
CREAS. Pela particularidade conferida ao Serviço Social de desenvolver seu
trabalho nos serviços sociais, a interdisciplinaridade torna-se uma ferramenta
importante ao/a assistente social que propicia um diálogo aberto com outras
profissões para a leitura das diversas dimensões que perfazem o indivíduo. Neste
sentido, visualizamos que as participantes da pesquisa ressaltaram a importância
deste tipo de trabalho. Do mesmo modo, também foi possível perceber que as
condições de trabalho também prejudicam o trabalho interdisciplinar, no que
concerne ao número limitado de profissionais que dificulta o fluxo dos trabalhos no
equipamento.
Este ensaio monográfico teve como propósito enfatizar a importância da
categoria trabalho para o ser social em sua dimensão ontológica, haja vista que
diante das configurações contemporâneas do mundo do trabalho diversos
determinantes conjunturais tem incidido sobre os trabalhadores de modo a
descaracterizar a centralidade do trabalho nas relações sociais e na identidade das
categorias profissionais. O Serviço Social como as demais profissões sofre os
mesmos rebatimentos, inclusive o de não caracterizá-lo como trabalho na
sociedade. Por essa razão, este ensaio parte da premissa do Serviço Social como
trabalho inserido na sociedade e nas relações sociais que se estabelecem nos
diversos espaços sócio-ocupacionais em que empreende sua atuação.
120
No que tange as inflexões da atuação profissional das assistentes sociais
no CREAS, podemos evidenciar que as interlocutoras da pesquisa reconhecem o
trabalho a partir da configuração histórica que esta dimensão do ser social assume
nas relações capitalistas de produção, qual seja, o trabalho assalariado em seu
caráter de emprego nas relações de compra e venda de sua força de trabalho.
Sendo um dos condicionantes para a caracterização do Serviço Social como
trabalho e de seu caráter especializado na sociedade. Esta é, portanto, uma das
questões centrais da qual se deve refletir sobre o trabalho do/a assistente social.
Na tentativa de investigar os limites e possibilidades entre as condições de
trabalho e a atuação dos/as assistentes sociais na viabilização dos direitos,
procuramos discutir nesta pesquisa algumas questões que surgiram para responder
esta indagação. Neste sentido, a atuação profissional do/a assistente social se
evidencia na mediação entre o Estado, instituição e população usuária, não podendo
fugir desta relação contraditória e inserido no espaço das instituições, os
profissionais estão sujeitos aos ditames de seus empregadores que se apoiam na
condição de assalariamento do/a assistente social. No que tange ao exercício da
relativa autonomia, capacidade inerente à profissão, as profissionais entrevistadas
destacaram que esta capacidade se faz presente em sua atuação.
No que concerne distinção entre os objetivos institucionais e os objetivos
profissionais, as interlocutoras da pesquisa destacaram a convergência entre esses
objetivos. Do mesmo modo, constatamos que em alguns momentos estes objetivos
convergiam,
mediante
a
efetivação
de princípios éticos abraçados pelas
profissionais. Contudo, reforçamos a defesa de que os objetivos institucionais e
profissionais são de fato distintos, haja vista que refletem posicionamentos de
projetos societários que também são distintos.
Concernente a Política de Assistência Social, a proposta traçada
inicialmente nesta investigação fora também refletirmos sobre as condições de
trabalho na assistência social, ou seja, qual a leitura das profissionais entrevistadas
sobre as condições de trabalho nesta dimensão mais totalizante da política e a
própria atuação do Serviço Social na política de assistência. Ressaltamos que não
121
obtivemos substratos para esta análise nas respostas das profissionais, haja vista
que seus relatos nortearam tão somente a dimensão do CREAS Regional na Política
de Assistência Social e a Proteção Social Especial. Neste sentido, confirmamos
através das participantes da pesquisa, que o CREAS, de modo geral, vem
desempenhando seu papel na Política de Assistência e isto se deve em grande
parte ao esforço dos profissionais. Mas, não podemos esquecer que a lógica do
mercado que norteia as políticas sociais estabelece limites e condicionalidades a
estas políticas – como fora constatado por uma das entrevistadas a pouca
participação
do
CREAS
nas
campanhas
de
mobilização
social
–
e
consequentemente limites à atuação profissional de seus trabalhadores.
Com relação a proteção social especial, constatamos que o relato das
interlocutoras da pesquisa trouxeram reflexões importantes que sinalizamos como
propostas para futuras pesquisas, como por exemplo, a articulação entre os serviços
da proteção social e da proteção social especial, bem como a intersetorialidade
entre os órgãos de rede proteção social e a PSE.
Sobre a categoria instrumentalidade, o que podemos evidenciar neste
estudo foi o fato de que na compreensão das participantes da pesquisa sobre esta
categoria prevaleceu a dimensão dos instrumentos técnicos, ou seja, a apenas uma
das dimensões que compõem a instrumentalidade. Contatamos que existe um
embate
cotidiano
no
âmbito
das
instituições
para
a
materialização
da
instrumentalidade, conforme preconiza a profissão. Do mesmo modo, algumas
profissionais não souberam dar a definição conceitual desta categoria. Reafirmamos
que a instrumentalidade é uma importante categoria para atuação profissional
dos/as assistentes sociais enquanto capacidade que legitima sua função na
sociedade. Os processos de reflexão e apreensão teórica que possibilitam as
mediações necessárias às demandas que se apresentam, não foram devidamente
contemplados neste estudo e merecem um maior aprofundamento. Assim
sinalizamos como proposta para futuras pesquisas a apreensão da categoria
instrumentalidade no atuação profissional do/a assistente social, de modo a
contribuir com a própria categoria profissional sobre os elementos que compõem
esta categoria e, da mesma maneira, para sua efetivação na atuação profissional.
122
Sobre a efetivação do projeto ético-político na atuação profissional,
constatamos que os relatos das interlocutoras divergiram entre sua total
materialização, sua parcial materialização e a ausência de sua materialidade. Desse
modo, concluímos que, apesar do projeto ético-político efetivar-se na realidade e
estar
sujeito
aos
determinantes
objetivos
sua
materialização,
se
deve,
exclusivamente, ao corpo profissional que assumiu o compromisso de efetivá-lo na
atuação profissional. Os determinantes objetivos, de fato, são entraves, mas podem
ser superados através do debate e da (re) definição de estratégias nas instituições.
Esses são, portanto, os elementos que procuramos evidenciar, a fim de
que compreendamos como se estabelece a atuação profissional do/a assistente
social no CREAS Regional. Não temos a intenção de esgotar o assunto com esta
discussão e nem que as conclusões sejam imutáveis no universo da pesquisa. Ao
contrário, procuramos trazer nosso olhar e o que podemos desvelar de uma
pequena parcela da realidade que se apresentou em um dado momento da história.
O que concluímos é que cada vez mais que se discute sobre a inserção do Serviço
Social nos espaços institucionais, muito mais se afirma a sua concretude enquanto
profissão na sociedade e nas relações sociais. Por isso, outros voos devem ser
alçados para se refletir sobre este tema, bem como outros posicionamentos e
visões.
Agradecemos a você leitor/a por ter nos acompanhado até aqui.
Esperamos que nestas linhas tenhamos possibilitado que você conheça um pouco
mais o Serviço Social e as particularidades que envolvem esta profissão.
123
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129
ANEXOS
130
ANEXO – A
Roteiro de questionário
Este questionário fora elaborado com o objetivo de traçar um perfil das assistentes
sociais, bem como conhecer o processo de formação das profissionais e as
particularidades de sua atuação profissional.
1. Nome:_________________________________________
2. Idade:_____________ 3. Sexo:____________________
4. Religião: _______________________
5. Estado Civil: ________________________
6. Tipo de vínculo empregatício firmado na instituição: __________________
7. Carga horária de trabalho:______________________
8. Nível de atuação profissional: ( ) Coordenador ( ) técnico
9. Antes do trabalho atual teve outra experiência profissional?
( ) sim Especificar: _______________________________
( ) não.
10. Ano de conclusão do curso:__________
11. Instituição:________________________
12. Durante a graduação você participou das seguintes atividades:
( ) Monitoria;
( ) Iniciação Científica;
( ) Atividades de Extensão;
( ) Movimentos Estudantil;
( ) Estágio Obrigatório;
( ) Estágio Não-obrigatório;
( ) Participação em eventos científicos com publicações de trabalhos;
( ) Participação em eventos científicos sem publicações de trabalhos;
( ) Nunca Participou.
13. Em seu exercício profissional já participou das seguintes atividades?
( ) Conselhos de direitos;
( ) Conferências Nacionais;
( ) Conferências Estaduais;
131
( ) Conferências Municipais;
( ) Encontros do conjunto CFESS-CRESS;
( ) Outros:_________________________________
( ) nunca participou.
14. Quais os autores de referência do seu exercício profissional?
___________________________________________________________________
___________________________________________________________
15. Exerce supervisão de estágio?
( ) sim;
( ) não.
16. Quais os instrumentos/procedimentos mais utilizados no seu exercício
profissional?
( ) relatório;
( ) visita domiciliar;
( ) parecer social;
( ) reunião;
( ) entrevista;
( ) palestra;
( ) outros__________________________________________
17. Participa de capacitações?
( ) sim - frequência: ( )trimestral ( )semestral ( )anual.
( ) não.
18. Em sua instituição realizam-se reuniões de equipe?
( ) sim - frequência: ( )quinzenal ( ) mensal ( )semestral.
( ) não.
19. Existem atribuições específicas do Serviço Social na instituição?
( ) sim Especifique:_______________________________________________
( ) não.
20. Quais as questões éticas a serem observadas na execução destas atribuições?
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
_______________________________________________________
22. Você escolheria outra profissão? Por quê?
132
ANEXO – B
Roteiro de entrevista – semiestruturada
 O que é o CREAS? Qual o seu objetivo?
 Como você avalia à efetivação dos serviços descritos na tipificação dos serviços
socioassistenciais?
 Qual a sua análise acerca da realidade do Plantão Social na Instituição?
 Qual a sua compreensão/análise sobre a atuação profissional do Assistente
Social nesta instituição?
 Como o Serviço Social organiza a execução de suas atividades?
 Qual a realidade da Proteção Social Especial nos outros municípios atendidos por
este CREAS?
(pergunta destinada aos assistentes sociais que trabalham pelo CREAS em
outros municípios).
 O que você entende por instrumentalidade do Serviço Social?
 Você visualiza a instrumentalidade se materializando em seu exercício
profissional? De que forma?
 Quais as demandas que se apresentam na instituição que exigem um trabalho
interdisciplinar?
 Como se efetiva o trabalho do Assistente Social com os outros profissionais que
trabalham no CREAS?
 Qual a sua avaliação sobre papel o desempenhado pelo CREAS dentro da
Política de Assistência Social?
 Existe distinção entre os objetivos da profissão e os objetivos institucionais?
 Qual o grau de autonomia das assistentes sociais em seu exercício profissional?
 Como se materializa o projeto ético-político do Serviço Social em sua prática
profissional?
 Como você avalia as condições de trabalho estabelecidas na instituição para sua
atuação profissional?
133
ANEXO – C
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO - TCLE
Cara participante,
Sou _______________________, da Faculdades Cearenses - FAC.
Estou
desenvolvendo
um
estudo,
que
tem
como
objetivo
_____________________________________________ e será desenvolvido
_________________________________.
Esclareço que entrevistaremos _____________________________.
Neste sentido, estou solicitando sua contribuição nesse estudo. Nesta entrevista
conversaremos
sobre
vários
assuntos,
como
por
exemplo:
_____________________________________________________e você preencherá
um questionário sobre ____________________________________.
Gostaria de deixar claro que essas informações são sigilosas, e
principalmente seu nome não será em nenhum momento divulgado. Caso se sinta
constrangida, envergonhada, durante essa nossa entrevista, você tem o direito de
pedir para interrompê-la, sem causar prejuízos.
Informo ainda, que:
- Mesmo tendo aceitado participar, se por qualquer motivo, durante o
andamento da pesquisa, resolver desistir, tem toda liberdade para retirar
o seu consentimento.
- Sua colaboração e participação poderão trazer benefícios para a
compreensão de _____________________________________________.
- Estarei disponível para qualquer outro esclarecimento no
__________________________________________________________.
Diante disso, gostaria muito de poder contar com sua colaboração.
Atenciosamente,
_________________________________________________
Assinatura da Pesquisadora
Fortaleza, _____ de ___________________ de 2013.
Via pesquisador
134
ANEXO – D
TERMO DE CONSENTIMENTO PÓS–INFORMADO
Declaro que tomei conhecimento do estudo que tem como objetivo
____________________________, cujo titulo é: _____________________, a ser
realizado pelo/a pesquisador/a ___________________________, compreendi seus
propósitos e, concordo em participar da pesquisa, não me opondo a entrevista
gravada com a/o ____________________ e estou ciente que em qualquer momento
posso retirar meu consentimento em participar da mesma.
Fortaleza, _____ de ___________________ de 2013.
_________________________________
Assinatura da participante
Via participante
135
ANEXO – E
TERMO DE CONSENTIMENTO
Estamos desenvolvendo uma pesquisa intitulada ___________________.
Esta pesquisa é desenvolvida ___________________, aluna/o do curso de Serviço
Social da Faculdades Cearenses - FAC, sob a orientação da/o
_____________________, caracterizando-se como Trabalho de Conclusão de
Curso para a obtenção do título de bacharel em Serviço Social.
Com este estudo pretendemos apreender ________________________.
Dessa forma, gostaríamos de contar com a sua participação, permitindo que
realizemos entrevista e que possamos gravá-las para que nenhuma informação seja
perdida. Garantimos resguardar o seu anonimato, bem como o nome de pessoas
citadas na entrevista.
A pesquisa não trará risco a sua pessoa e você poderá desistir de
participar da mesma no momento em que decidir, sem que isso lhe acarrete
qualquer penalidade. Se necessário, poderá entrar em contato com o/a orientador/a
da pesquisa pelo telefone:__________.
____________________________
Orientador/a da Pesquisa
Tendo sido informado/a sobre a pesquisa _______________________,
concordo em participar da mesma.
Nome:
_______________________________________________________
Assinatura:
___________________________________________________
Fortaleza, ____ de ______________ de 2013.
136
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