7 - sociedade, educação e inclusão social das

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Ano 3 - N º 12 Março/Abril - 2010
SOCIEDADE, EDUCAÇÃO E INCLUSÃO SOCIAL DAS CAMADAS POPULARES
Dr. José Antonio Vianna
Professor na Universidade Estácio de Sá
E-mail: [email protected]
Resumo.
A partir da literatura, procuramos neste ensaio identificar as concepções de homem,
cultura e educação e observar as origens das preocupações acadêmicas sobre a desigualdade
social, pobreza e exclusão social e sobre a construção das representações sociais da favela e
de seus moradores. Pelo fato de a educação ser percebida como um instrumento
privilegiado no combate à desigualdade social, buscamos analisar na escola o seu caráter de
inclusão / exclusão e os Projetos de Inclusão Social pelo esporte enquanto instrumento para
fortalecer a formação escolar e a cidadania de crianças e jovens. Verificamos nas políticas
governamentais e não governamentais para a inclusão social, a educação como um eixo
articulador para a diminuição das desigualdades sociais e das suas conseqüências.
Palavras-chave: Sociedade. Educação. Projetos de Inclusão Social.
Abstract.
We look for in this essay, to analyze the concepts that had motivated the ideas on
the social inequality, until the construction of types and prejudices against the slum quarter
and of its inhabitants, which establishes relations between violence and poverty. These
perceptions have suggested the elaboration of social public politics to fight “social bad
things” associated to them. We verify in the governmental and non governmental politics,
that are inserted in the roll of action for the social inclusion, the education as a articulador
shaft for the reduction of the social inequalities and its consequences. Finally, we analyze
the contributions of the Projects of Social Inclusion through the sport for the inclusion of
the citizens of the popular layers.
Key words: Society. Education. Projects of Social Inclusion.
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INTRODUÇÃO.
No meio social ou em instituições especializadas, ao longo do tempo os diversos
povos e civilizações têm lançado mão de instrumentos de socialização de seus pares. A
educação em sentido estrito deu prioridade a educação aristocrática, na figura do indivíduo
ilustrado, responsável pela formação de crianças e jovens. A complexificação das
sociedades na era moderna, motivou a democratização da educação sistematizada. No
entanto, os ideais de igualdade no acesso à educação escolar não foram alcançados em sua
plenitude – atualmente, no início do séc. XXI, ainda existem desigualdades nas
oportunidades educacionais.
As políticas e as teorias educacionais no Brasil procuraram lidar com a
marginalidade ou a perspectiva de inclusão social, no entanto, a desigualdade de
oportunidades sociais continua relacionada à desigualdade no acesso a educação de
qualidade.
Assim, refletir sobre os aspectos que orientam a educação nacional e que interferem
nas políticas educacionais e na legislação mostra-se relevante para o refinamento das
políticas de intervenção escolar e não escolar. As questões colocadas no texto podem
estimular a reflexão dos profissionais que atuam no sistema educacional e encontram-se
inseridos no projeto pedagógico da escola, e dos profissionais envolvidos em atividades
extra-classe de formação sócio-educacional de crianças e jovens.
Neste ensaio procuramos a partir da literatura identificar as concepções de homem,
cultura e educação e observar as origens das preocupações acadêmicas sobre a desigualdade
social, pobreza e exclusão social e da construção das representações sociais da favela e de
seus moradores. Pelo fato de a educação ser percebida como um instrumento privilegiado
no combate à desigualdade social, buscamos analisar a escola no Brasil e o seu caráter de
inclusão / exclusão, e os Projetos de Inclusão Social pelo esporte enquanto instrumento para
fortalecer a formação escolar e a cidadania de crianças e jovens.
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CONTEXTO TEÓRICO
Homem, Cultura e Educação
Em busca da preservação da espécie e seu aprimoramento, quer por dificuldades
impostas pelo ambiente, quer por particularidades da espécie, o homem desenvolveu
habilidades que dependem de aprendizagem. Mesmo as atividades instintivas como
acasalamento, convivência, reprodução e defesa foram desenvolvidas pelo homem, de
forma peculiar nos diferentes grupos culturais, determinando modos de vida, convivência e
socialização dos seres humanos originários (LARAIA, 2002).
Ao ser capaz de pensar, projetar, ordenar, prever e interpretar, o homem trava com o
mundo uma relação dotada de significado e sentido, transformando a sua experiência vivida
em um discurso com significado que é transmitido aos demais seres de sua espécie e a seus
descendentes.
Foi dessa capacidade de pensar o mundo, de atribuir significado à realidade e de
buscar explicações sobre si mesmo e sobre o mundo em que vive que o homem criou um
sistema de símbolos, como as várias linguagens, por meio do qual dá significado às suas
experiências vividas.
Seu conhecimento do mundo – organizado, comunicado e
compartilhado com seus semelhantes e transmitido à descendência – se transformou em
cultura humana propriamente dita. (LARAIA, 2002).
Assim, o homem se distingue das diversas espécies animais por ter desenvolvido
habilidades que dependem de aprendizado, para adquirir formas diferenciadas de
comportamento. É necessário um longo aprendizado, para o indivíduo adquirir as marcas
do seu grupo social. Ao que tudo indica as diferenças entre os grupos sociais se explicam
pela história cultural de cada grupo.
Os padrões culturais fornecem significado à realidade social e psicológica. Os
símbolos concretos expressam o clima do mundo e o modelam. Segundo Geertz (1989), a
cultura deve ser vista como um conjunto de mecanismos de controle para governar o
comportamento humano.
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Conforme o autor, elementos da cultura como a religião, a ideologia entre outras,
são tentativas de fornecer orientações ao organismo Homem, que não pode viver num
mundo que ele é incapaz de compreender.
A religião induz a uma ética, uma visão de mundo, que modela a ordem social e a
personalidade. A religião apoia uma conduta satisfatória conforme os valores sociais
formulados por seus símbolos. Esta ética valorativa entre os valores que o povo conserva e
a ordem geral da existência dentro da qual o povo se encontra, é um elemento essencial em
todas as religiões. Os homens se comportam em função daquilo que acreditam terem
experimentado na religião.
Em sentido amplo, ideologia é o conjunto de idéias, concepções ou opiniões sobre
algum ponto sujeito a discussão (CHAUÌ, 2001). Pode ser tomada também por doutrina corpo sistemático de idéias e posicionamento interpretativo diante de determinados fatos de
algum pensador; Teoria - organização sistemática dos conhecimentos destinados a orientar
a ação humana; ou pejorativamente, é identificada como concepções sem fundamento, mera
análise e discussão vazia de idéias abstratas que não correspondem aos fatos reais.
A ideologia pode ter a função de assegurar uma determinada relação dos homens
entre si e com suas condições de existência, adaptando os sujeitos às tarefas prefixadas pela
sociedade, favorecendo a aceitação sem críticas, como naturais.
Assim, as idéias e
representações que escondem o modo real como as relações sociais foram produzidas e a
origem das formas sociais de exploração econômica e de dominação política, também
podem ser chamadas de ideologia, servindo para mascarar a diferença de interesses entre as
classes sociais (CHAUÍ, 2001).
Na concepção de Geertz (1989), a ideologia é um conjunto de representações e
normas de caráter prescritivo e regulador da ação dos sujeitos e grupos sociais.
Ao
enfatizar alguns aspectos da realidade social - podendo negligenciar ou até suprimir outros,
ou mesmo distorce-los - a ideologia contribui para a construção de modelos simbólicos da
ordem social (GEERTZ, 1989) se preocupando em estabelecer novos padrões de crença e
de valor ou defender os padrões tradicionais. Ao penetrar na educação familiar e escolar,
nos meios de comunicação de massa e em outras agências de socialização, a ideologia
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determina a repetição de fórmulas prontas e acabadas, dificultando a articulação entre o
pensar e o agir dos indivíduos, o que pode gerar o conformismo e inação.
Tanto a religião quanto a ideologia entre outras instituições sociais apresentam
estreita relação com a educação. A educação como fenômeno social e universal, é uma
atividade humana necessária à existência e funcionamento de todas as sociedades. Através
da ação educativa o meio social exerce influências sobre os indivíduos. Onde quer que se
dê o processo educativo há uma subordinação à sociedade que lhe faz exigências, determina
objetivos e lhe provê condições e meios de ação.
Assim, a prática educativa está
determinada por fins e exigências sociais, políticas e ideológicas, determinadas por valores,
normas e particularidades da estrutura social a que está subordinada (LIBÂNEO, 1994).
De forma geral a educação age no sentido de transformar os indivíduos em
membros de uma sociedade, no entanto, as sociedades contemporâneas estão marcadas pela
enorme disparidade no acesso aos bens econômicos e culturais, mantendo na marginalidade
um grande contingente da população.
O sistema escolar reproduz as condições da sociedade (PILETTI, 2002). De um
lado os currículos e conteúdos escolares cumprem uma função social positiva ao favorecer
o desenvolvimento do nível cultural e individual dos alunos, contribuir para a formação de
recursos humanos e promover a equalização social. Por outro lado, os diferentes níveis
educacionais provocam a desigualdade de oportunidades sociais e a marginalização dos
sujeitos menos escolarizados – em especial, os mais pobres.
Desigualdade social, pobreza e exclusão.
As preocupações acadêmicas sobre a questão da pobreza e marginalização,
igualdade e desigualdade parece ter suas raízes em tempos remotos. Embora o cristianismo
tenha defendido a universalidade e igualdade entre todos os seres humanos, construiu-se
culturalmente uma ordenação hierarquizada das pessoas, que passou a ser tomada como
natural.
Conforme Hirschman (1986) até a era moderna, o sistema político, social e
econômico era considerado imutável - os pobres, doentes e oprimidos, assim o eram
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considerados por motivos fortuitos, divinos ou devido a natureza humana. O entendimento
de que a ordem social pode ser construída, só se difunde no séc. XVIII.
A Revolução Francesa instaurou uma nova ordem normativa que passou a
considerar intoleráveis os determinismos sociais (REIS, 2004: 39).
Uma nova ética
procurava abolir as fontes de usurpação da população e exigir princípios de igualdade
àqueles que não gozavam dos mesmos direitos que o clero, os nobres e outros membros das
elites da época.
Segundo Schwartzman (2004), as ciências sociais abordaram as causas da pobreza e
da desigualdade diferentemente. A primeira proposição identificada por ele é a teoria de
Malthus, que imputava a culpa pela pobreza aos próprios pobres, que se multiplicavam em
uma velocidade maior do que crescia a produção de alimentos – a pobreza era atribuída à
vontade e ao caráter dos indivíduos.
Como solução para este problema, havia dois
caminhos: educar a população ou abandona-los à própria sorte.
Na mesma linha, o protestantismo observava a pobreza como um sinal da
condenação de Deus. No entanto, a visão malthusiana da pobreza contrariava o valor da
caridade defendida por diversas religiões.
Assim, no séc. XIX passou a existir a
classificação daqueles sujeitos que mereciam e dos que não mereciam serem saciados em
suas necessidades, pela caridade: os sujeitos mais próximos deveriam ser priorizados em
vez daqueles que eram desconhecidos; os órfãos e viúvos desvalidos deveriam ser
preferidos antes dos indolentes e preguiçosos.
A segunda proposição, de caráter marxista, considerava a pobreza fruto das relações
sociais, e a sua solução encontrada na luta de classes entre a burguesia e o proletariado.
Ao que tudo indica o caso brasileiro na passagem do séc. XVIII para o séc. XIX não
pode ser explicado pela teoria marxista. No final do séc. XIX, a sociedade brasileira era
formada por uma pequena minoria branca e de uma multidão de escravos libertos,
descendentes de brancos e negros, índios, brancos empobrecidos e pobres migrantes da
Europa e Japão - os marginais. Aqueles que viviam à margem da sociedade criada pela
colonização portuguesa eram a maioria da população, e não o resíduo da ordem social e
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econômica estabelecida. Esta maioria não poderia ser classificada como proletariado e
muito menos como burguesia.
O quadro parece não ter se alterado de forma importante. Percebe-se que no Brasil
de hoje, ao lado de uma economia moderna, existem milhões de indivíduos excluídos dos
benefícios e direitos sociais, como conseqüência do processo de marginalização ou de
inclusão limitada – não incorporação de segmentos da população, devido a herança
econômica, política e social. A desigualdade social é uma das principais características da
sociedade brasileira contemporânea.
Na Cidade do Rio de Janeiro, o maior contingente de excluídos está nas favelas,
local que carrega os estereótipos construídos da pobreza e dos pobres. A gênese do
processo de construção da representação social da favela pode estar nas descrições e
imagens que foram difundidas por jornalistas, médicos higienistas e engenheiros sanitários,
desde o final do séc. XIX.
Conforme a professora Lícia Valladares (VALLADARES, 2000), as representações
da elite desde o final do século XIX até a década de 1950, serviram para constituição de um
imaginário das classes médias sobre a favela e seus moradores, que podem estar presentes
ainda hoje no discurso da população.
Segundo a autora, o cortiço pode ser considerado a semente da favela. Os cortiços
do séc. XIX eram representados como o espaço que concentrava a população de alguns
trabalhadores, junto a um grande número de vadios e malandros.
A maior referência para essas representações da elite carioca era o cortiço Cabeça
de Porco. A correspondência entre a favela e o Cabeça de Porco foi estabelecida no
discurso dos formadores de opinião da elite carioca, que caracterizava esses ambientes
como antro da vagabundagem, do crime, foco de epidemias e de vícios; e pela quase
simultaneidade entre o “bota abaixo” no centro da cidade e a ocupação do morro da
Providência no início do séc. XX, chamado de Morro da “Favella” e pelo tipo de ocupação
desordenada com a presença de casebres e barracões.
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O MORRO DA FAVELLA passou a emprestar seu nome aos aglomerados de
casebres sem traçado, arruamento ou acesso aos serviços públicos que começaram a se
multiplicar na cidade do Rio de Janeiro (VALLADARES, 2000).
Desde o séc. XIX, as elites cariocas e nacionais contribuíram na elaboração de um
pensamento específico sobre a favela. A representação social da favela carioca e de seus
moradores parece ter sido fortalecida através de artigos e reportagens na imprensa e de
campanhas de saúde pública. Sobre ela passou a recair o discurso de que seus moradores
são os responsáveis pelos males da cidade.
A autora identificou nos textos do início do século uma possível associação entre o
morro da Favella e Canudos, estabelecida não apenas pela ocupação do morro da
Providência pelos ex-combatentes da guerra de Canudos, mas também pela descrição do
arraial de Canudos feita por Euclides da Cunha, no romance “Os Sertões”, de grande
penetração no meio intelectual daquela época. Canudos e seus jagunços, serviram como
modelo para pensar a população da favela, suas características e seu comportamento.
Semelhanças tais como: geografia e topografia; posição estratégica; isolado da
cidade; estrutura de uma cidadela e poder local paralelo ao poder legal, parecem ter
povoado o imaginário da sociedade carioca.
A favela era vista como uma comunidade de miseráveis com extraordinária
capacidade de sobreviver sob condição de vida precária e inusitada. Local de malandros,
mulheres perdidas e capoeiras. Como comunidade organizada, tal espaço constituiu-se um
perigo, uma ameaça à ordem moral e à sociedade na qual estava inserida. Nas primeiras
representações sobre a favela transpareceram a oposição entre cidade e favela.
A imagem da favela construída pelas classes médias, que não ousava ou necessitava
subir o morro, era instruída pelo olhar do jornalista / observador, que registrava as visitas
assistemáticas que fazia ao morro, dava testemunho e divulgava as representações sobre
pobreza com as quais comungava.
As visitas eram realizadas esporadicamente, e os
registros realizados por este “observador de fora”, que os divulgava na maioria das vezes
com um olhar de condenação. (VALLADARES, 2000).
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Com a República, engenheiros e médicos governaram a capital, tendo como
princípio a submissão da política à técnica. Seguiu-se, então, a concepção de favela como
doença, moléstia contagiosa, uma patologia social que precisava ser combatida. Fonte
direta de males ao estado físico e moral dos homens. A partir do início do século XX, as
tentativas dos republicanos radicais e dos teóricos do embranquecimento para tornar o Rio
de Janeiro uma cidade européia, através da derrubada dos cortiços onde habitavam negros e
pobres, resultou no crescimento da população pobre nos morros, charcos e demais áreas
vazias em torno do centro da cidade, que residia em construções irregulares sem infraestrutura básica de saneamento (ZALUAR; ALVITO, 1998).
Dessa precariedade urbana, resultado da pobreza de seus habitantes
e do descaso do poder público, surgiram as imagens que fizeram da
favela o lugar da carência, da falta, do vazio a ser preenchido pelos
sentimentos humanitários, do perigo a ser erradicado pelas
estratégias políticas que fizeram do favelado um bode expiatório
dos problemas da cidade, o “outro”, distinto do morador civilizado
da primeira metrópole que o Brasil teve” (ZALUAR; ALVITO,
1998: 9).
No período de 1926/1927, foram realizados campanha na imprensa e um filme
contra a favela, agregando o discurso médico-higienista com o reformismo progressista e as
novas concepções estéticas para a cidade.
O urbanista responsável pelo plano AGACHE – dec. 1930 - parece ser um dos
primeiros observadores a perceber elementos exteriores à pobreza, que justificavam a ida
dos indivíduos para a favela. O discurso dos demais observadores representava uma leitura
da favela conforme os valores próprios de sua classe social, sem procurar entender a causa
do fenômeno. (ZALUAR; ALVITO, 1998).
A natureza moral do discurso dos sujeitos da época revelava as representações sobre
pobreza, os valores e preconceitos quanto aos pobres. As elites nacionais concebiam a
pobreza e os pobres como sinônimo de vadiagem, vício, sujeira, preguiça, carregando ainda
a marca da escravidão; Pobre = negro = malandro.
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Este saber construído ao longo dos anos foi produzido a partir de um discurso moral
sobre a favela, que inspirou grande parte da literatura sobre pobreza urbana no Rio de
Janeiro.
O que fazia cada especialista, em sua prática de observação, era
uma leitura da realidade à luz do seu campo disciplinar e das
representações sobre a pobreza com as quais comungava. As
favelas eram visitadas esporadicamente, observadas de fora, na
maioria das vezes com um olhar condenador” (VALLADARES,
2000).
O Censo Demográfico de 1950 contribuiu para refutar as representações
reproduzidas por várias décadas sobre os moradores das favelas, como sendo constituídos
basicamente de malandros e desocupados, quando não de marginais (VALLADARES,
2000). Conforme informações do censo, os inativos correspondiam a uma parcela pequena
da população – 8,9%, com expressiva produtividade das mulheres.
A quantidade de
brancos – 28,96% - desmente a concepção de exclusividade de população negra.
Mesmo após estas evidências, Zaluar e Alvito (1998) observaram que ao longo do
século XX, a favela foi representada como um dos fantasmas prediletos do imaginário
urbano.
Assim, a despeito de diferentes roupagens, sempre de acordo com
um contexto histórico específico, o favelado foi um fantasma, um
outro construído de acordo com o tipo de identidade de cidadão
urbano que estava sendo elaborada, presidida pelo higienismo, pelo
desenvolvimentismo ou, mais recentemente, pelas auto-reguláveis
de mercado e pela globalização”(ZALUAR; ALVITO, 1998:15)
O pânico social das classes menos privilegiadas presentes ainda hoje no seio das
classes mais altas de nossa sociedade parece reforçar o discurso de estigmatização
demonizadora das camadas populares originado no século XIX.
Para melhor compreensão das redes de relação social e a posição desses indivíduos
na estrutura social das metrópoles, parece ser necessário utilizar a perspectiva de Wacquant
(2001) para desmascarar os conceitos elaborados externamente, através de uma reflexão
comparativa, que evidencie a história da trajetória de distribuição sócio-econômica na
sociedade brasileira e em outras sociedades.
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Conforme Wacquant (2001), a auto-imagem criada no pós-segunda grande guerra,
nos países do Primeiro Mundo - de sociedades pacíficas, coesas e igualitárias - em que “as
condições herdadas – como classe, etnicidade ou raça – seriam cada vez mais irrelevantes
para o acesso a posições sociais valorizadas” (p. 21), tem sido freqüentemente abaladas
pelas desordens sociais que foram acirradas na década de 1980, resultantes da injustiça
racial e da desigualdade social crescentes.
Segundo o autor, esses levantes podem ser devidos às transformações econômicas e
sócio-políticas desiguais e desarticuladoras, que resultaram em uma polarização de classes
sociais, combinada com a segregação racial e étnica, que estão produzindo uma divisão das
metrópoles. Nos seus estudos sobre os guetos norte americano e os banlieue francês,
Wacquant sugere que pode existir uma lógica semelhante aos arrastões ocorridos em
Copacabana, no Rio de Janeiro. (WACQUANT, 2001).
O autor identificou como a força do estigma territorial imposto aos moradores
daqueles bairros populares, a) o sentimento de indignidade pessoal, que afeta
negativamente as oportunidades sociais, nas escolas e no mercado de trabalho; b) o declínio
e o abandono provocado pela degradação simbólica dos bairros; c) a diminuição do senso
de coletividade, que pode comprometer a ação coletiva e o estigma de ser pobre em uma
sociedade rica,
(...) na qual a participação ativa na esfera do consumo tornou-se
condição sine qua non da dignidade social – um passaporte para a
cidadania mesmo entre os despossuídos (p.33) .
Podemos notar o desejo de usufruir os bens produzidos pela sociedade e sugeridos
pela mídia, embora as condições sócio-econômicas dificultem o acesso, o que empurra os
jovens sem emprego e sem aspirações futuras positivas, para ações violentas que
possibilitem adquirir dinheiro e os bens de consumo, que representem ascensão e prestígio
social, apesar da resistência das famílias, religiões e outras agências de socialização
presentes nas favelas cariocas.
Segundo Burgos (1998), a favela passou a ser notada pelos governantes brasileiros,
não pela postulação dos seus moradores, mas pelo “incômodo que causava à urbanidade
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da cidade”. Os moradores das favelas eram vistos como “almas necessitadas de uma
pedagogia civilizatória”, em vez de cidadãos possuidores de direitos.
As políticas públicas nas favelas do Rio de Janeiro, remonta à década de 1940.
Tratada como uma aberração na década de 1930, as favelas se tornaram motivo de
preocupação do Código de Obras da cidade em 1937. Como desdobramento deste, surgiu
nos anos de 1940, os parques proletários.
Contemporaneamente, permanecem os débitos de direitos sociais, civis e políticos
como principais obstáculos à integração à cidade.
A perspectiva atual nos remete aos conceitos complementares de inclusão / exclusão
social. Schwartzman (2004) sugere que o conceito contemporâneo de exclusão social
refere-se a não efetivação da cidadania aos
Indivíduos que vivem no espaço de uma sociedade nacional trazem
contribuições a essa sociedade, mas não têm acesso ao consumo dos
bens e serviços de cidadania. Embora a lei lhes garanta direitos
civis, políticos e sociais, tal garantia legal não se traduz em usufruto
efetivo de tais direitos (SCHWARTZMAN, 2004: 36).
Como preocupação básica de políticas governamentais de inclusão social, podemos
relacionar os seguintes direitos sociais: emprego, educação, previdência social e saúde. No
meio social existem também alguns mecanismos que procuram garantir que esses direitos
sejam atendidos – ONG´s, Organizações não Governamentais sem fins lucrativos e
movimentos sociais, possibilitando novas formas de inclusão, buscando corrigir os erros e
as lacunas nas formas de acesso tradicionais.
A educação aparece como principal correlato da desigualdade de renda no Brasil,
tendo um papel selecionador, devido às diferenças exercidas pelo nível sócio-econômico e
pela heterogeneidade dos sistemas educacionais no país. Portanto, os sujeitos que podem
arcar com custos elevados para escolarização de seus filhos, conseguem uma formação de
melhor qualidade do que aqueles que só podem ter acesso a escolas públicas gratuitas.
Assim, as funções sociais da educação identificadas pelos sociólogos – canal de
ascensão e mobilidade social ou mecanismo de reprodução e consolidação das
desigualdades sociais parecem estar relacionados com a expansão das oportunidades
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educacionais e de trabalho. Sob a perspectiva de transformação social, estas oportunidades
não podem prescindir de qualidade na educação e da articulação com outras intervenções
sócio-educacionais para o desenvolvimento de competências pessoais e sociais dos sujeitos
das camadas populares, para que atuem como agentes multiplicadores de uma ação
transformadora.
Reflexo de um contexto social mais amplo, as teorias educacionais revelam as
concepções da escola como instrumento de inclusão ou exclusão social.
A escola e seu caráter de inclusão(?) social.
Baseado em dados da década de 1970 - aproximadamente 50% dos alunos que
ingressavam na escola saiam analfabetos ou semi-analfabetos, Saviani (2000) abordou a
questão das concepções pedagógicas a partir do problema da marginalidade, verificando a
existência de dois grupos de teorias educacionais, que observam a educação
diferentemente: (a) um instrumento de equalização social, cabendo a ela a construção de
uma sociedade igualitária e (b) um meio de discriminação social, por ser dependente da
estrutura social - sob este viés, os grupos dominantes se apropriam dos resultados da
produção social, portanto, a escola cumpre o papel de “reforçar a dominação e legitimar a
marginalização”.
Para o primeiro grupo, a marginalidade é um desvio que deve ser corrigido através
da educação. Para o segundo grupo, a marginalidade é um fenômeno inerente a estrutura
social, e como a educação é dependente desta estrutura, ela mesma reforça e legitima a
marginalização.
O autor denomina o primeiro grupo, no qual inclui as concepções
pedagógicas Tradicional, Escola Nova e Tecnicista, de teorias não críticas, por não
perceberem a educação condicionada á estrutura sócio-econômica, respondendo aos
interesses da classe dominante.
Ao analisar o sistema educacional brasileiro, Saviani (2000) identifica nas teorias
educacionais ESCOLA DUALISTA, VIOLÊNCIA SIMBÓLICA E APARELHO
IDEOLÓGICO DO ESTADO, a denúncia do caráter reprodutivista da educação formal -
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em uma sociedade dividida em classes sociais a escola reproduz os interesses das classes
dominantes1.
O caráter reprodutor da escola pode ser notado na legislação e nas políticas
educacionais que refletem esforços de determinados grupos / classes sociais em ver seus
interesses ali representados.
Ao que tudo indica a Lei de Diretrizes e Bases da Educação – Lei 9.394/96 se
destaca pelo foco na inclusão social (BRASIL, 1996a). Segundo Piletti (2002) durante o
período republicano no Brasil, somente as leis 4024/61 e 9394/96 foram amplamente
discutidas pelos representantes da população no Congresso Nacional. As demais diretrizes
do ensino brasileiro foram estabelecidas pelas autoridades educacionais, sem a devida
correspondência com os aspectos da cultura popular, as necessidades dos alunos e da
sociedade em geral.
A princípio, a lei da educação vigente foi aprovada após 8 anos de discussão no
Congresso Nacional, é mais democrática. A lei 9394/96 estabelece as diretrizes e bases da
educação nacional, com mudanças na estrutura didática da educação básica que passa a ter
a EDUCAÇÃO INFANTIL (3 a 6 anos de idade) como complemento da educação familiar
e comunitária com perspectiva de educação integral; o ENSINO FUNDAMENTAL
(duração de 9 anos) compreendendo uma base nacional comum e uma parte diversificada; e
o ENSINO MÉDIO (mínimo de 3 anos) com foco na formação básica geral, sendo a
profissionalização compulsória. A lei avança ao possibilitar maior autonomia através do
Projeto Político Pedagógico e ao focalizar a formação do cidadão centrada na inclusão
social.
A fim de atender a proposta curricular que estabelece uma base nacional comum e
uma parte diversificada, o Ministério da Educação e do Desporto elaborou competências e
diretrizes para a educação básica. Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) passaram a
ser utilizados como referência curricular nacional para o ensino, situados nos princípios
1
VIOLÊNCIA SIMBÓLICA de Boudieu e Passeron que relaciona a marginalização econômica e a cultural;
a teoria da ESCOLA DUALISTA de Baudelot e Establet que identificam duas redes de ensino; e a teoria da
escola enquanto APARELHO IDEOLÓGICO DO ESTADO de Althusser que observa a inculcação da
ideologia dominante através da educação escolar.
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construtivistas, utilizando o conteúdo como meio para desenvolvimento das capacidades
dos alunos (BRASIL, 1996b).
Os PCNs estabelecem três dimensões dos conteúdos: uma dimensão conceitual que
sugere a aprendizagem por aproximações progressivas, em que o aluno possa adquirir
informações, vivenciar e construir generalizações; uma dimensão procedimental
relacionada ao saber fazer, para que o aluno saiba tomar decisões e realizar uma série de
ações de forma ordenada; e uma dimensão atitudinal através da prática constante, coerente
e sistemática em que valores e atitudes sejam expressos.
No entanto, dados empíricos indicam que o mau funcionamento da educação
brasileira persiste, tendo como indicadores altos níveis de seletividade, exclusão escolar,
reprovação e evasão precoce. (BRASIL, 1996c).
Os dados do PNUD / IPEA de 1996 (BRASIL, 1996c), revelam que a partir da
década de 1970 houve uma redução percentual nas taxas de analfabetismo (Tabela 1).
Tabela 1 – Taxa de analfabetismo da população com 15 anos ou mais.
Brasil – 1970 / 1996.
Anos
1970
1980
1991
1995
1996
Taxa de analfabetismo (%)
33,6
25,4
20,1
15,6
14,7
A década de 1990 apresenta uma melhoria nos índices de promoção, repetência e
evasão no ensino fundamental. No entanto, os dados encontrados também indicaram que
ocorreu na primeira série a repetência de 44% dos alunos, reproduzindo o ciclo de retenção
que somada aos fatores sócio econômicos, favorecem a evasão escolar (BRASIL, 1996c).
A retenção de grandes contingentes provoca o aumento nos gastos públicos, a
subutilização de recursos humanos e materiais nas últimas séries, devido a pequena
quantidade de alunos que chegam até lá.
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A retenção também provoca a distorção
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idade/série, o que pode ser verificado no baixo rendimento dos alunos em língua portuguesa
e matemática nos variados níveis de ensino.
Os resultados da Prova Brasil de 2005 divulgados pelo INEP2 confirma que embora
tenha havido melhoria nos índices educacionais no Brasil, esta não foi acompanhada pela
melhoria da qualidade no ensino. Alunos do 5º ao 9º ano tiveram nota 4,48 em Português
em uma escala de 0 a 10, com os seguintes critérios: alunos com notas abaixo de 2,73 são
considerados analfabetos que não compreendem pequenos contos infantis, histórias em
quadrinhos; notas abaixo de 3,67 não entendem anúncios de classificados nem identificam
sequer o tema central de um texto longo; aqueles que obtiveram notas abaixo de 4,58 não
entendem reportagens de jornal nem o sentido produzido pelo uso da pontuação.
Em matemática a nota correspondeu a 4,67 e os critérios foram os seguintes: alunos
com notas abaixo de 2,49 não sabem contar; os que não alcançaram a nota 3,44 não sabem
somar nem subtrair; notas abaixo de 4,39 não sabem ler as horas em relógios digitais nem
fazer contas com números de três algarismos; enquanto os que tiveram notas abaixo de 5,34
não sabem ler as horas em relógios analógicos nem fazer contas de multiplicação com dois
algarismos.
Segundo a Pesquisa Nacional de Amostragem de Domicílios / 2006 (BRASIL,
2006) no período de 1996/2006 a universalização do ensino de crianças na idade de 7 a 14
anos, quase foi alcançada – 97,6%. Estes dados não apresentam defasagem entre a idade e
série (ano) escolar. O percentual de jovens na faixa etária 15 a 17 anos que estavam a
escola cresceu de 69,5% para 82,2%, mas a maioria deles ainda freqüentava o ensino
fundamental.
A Síntese de Indicadores Sociais do IBGE de 2007 (BRASIL, 2007) revela que a
defasagem escolar segue uma curva decrescente - o Brasil tinha 2,4 milhões de analfabetos
na faixa etária 7/14 anos entre os quais 2,1 milhões freqüentam a escola.
Os primeiros dados da prova de avaliação dos alunos da rede pública municipal do
Rio de Janeiro realizada no início de 2009 identificaram em torno de 24 mil alunos
analfabetos funcional. Em torno de 11 mil alunos do sexto ano encontram-se em situação
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de semi-analfabetismo, quando ocorre o represamento daqueles que nos anos iniciais
tiveram aprovação automática. A estrondosa quantidade de crianças e jovens analfabetos
que freqüentam os bancos escolares coloca em xeque a qualidade do ensino e as políticas
públicas da educação, com impacto na inclusão social de crianças e jovens.
Ao comparar os dados levantados nas últimas décadas com os últimos
levantamentos realizados, podemos perceber que as metas de superação da marginalidade e
melhoria da qualidade da educação básica ainda estão distantes.
As melhorias nos índices da educação brasileira não revelam outros dados
preocupantes: apenas um em cada cinco jovens pobres chega ao ensino médio (BRASIL,
2006) enquanto nos países desenvolvidos 65% das pessoas têm nível superior (PASTORE,
2007). A contrapartida da falta de mão de obra especializada e dos poucos anos de
escolaridade dos brasileiros, tem se revelado no impedimento do crescimento do Brasil que demanda qualificação crescente da mão de obra - e no enorme contingente de
desempregados e excluídos.
A relação necessária entre a qualidade da educação e os indicadores de inclusão
social, nos leva a questionar as reais contribuições das diversas políticas de educação e,
atualmente, dos Parâmetros Curriculares Nacionais para a inclusão social dos sujeitos das
camadas populares.
Nos últimos anos, a fim de fortalecer a formação escolar e a cidadania de crianças e
jovens, instituições privadas e do terceiro setor contribuíram para a ampliação de ações
sócio educacionais, em horários alternativos ao horário escolar. O esporte tem sido um dos
instrumentos utilizados para motivar os alunos a ampliarem o tempo de escolaridade e para
a formação cidadã de crianças e jovens.
Projetos de Inclusão Social (PIS): a contribuição do esporte?
Ao que tudo indica encontra-se implícito nos PIS de organizações públicas, privadas
e do terceiro setor, as preocupações com complementação da educação formal. No entanto,
segundo Nogueira et al (2005) o uso de atividades esportivas como meio de inserção social
2
Matéria “MEC: muitas provas, poucas melhoras no ensino”, publicada no Jornal O Globo – O País, p. 12, 18
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é tão antigo quanto o aparecimento do esporte moderno, na Inglaterra. Segundo os autores a
expansão do rugby e do futebol tinham como objetivos a educação dos jovens de elite e a
disciplinação das massas populares com o sentido de incorporação da população pobre à
sociedade.3
No Brasil, um marco na utilização do esporte como um meio de garantir o direito ao
acesso aos bens culturais coletivos, aí incluída a prática de esportes, foi a instalação da
Associação Cristã de Moços – ACM. O objetivo da instituição era proporcionar aos jovens,
que se aglomeravam nas cidades brasileiras em busca do trabalho, atividades saudáveis e
motivadoras. (NOGUEIRA et al, 2005).
Da mesma forma que o conceito de inclusão / exclusão social variaram ao longo do
tempo de acordo com as transformações culturais, os projetos de inserção social
procuraram atender às representações sociais.
Ao acompanhar os diferentes PIS no Brasil, Gomes e Constantino (2005)
observaram que os projetos procuravam ampliar o acesso das pessoas às atividades físicas e
de lazer e melhorar a qualidade de vida dos sujeitos através da afirmação de direitos
fundamentais que garantissem o exercício da cidadania. Segundo os autores, uma premissa
das políticas para a implantação de projetos e programas era a de que as atividades de
esporte e lazer demonstraram ser o caminho mais rápido para a inclusão social das camadas
populares e de grupos marginalizados.
Assim, os PIS destinados a crianças e adolescentes apresentam-se
com uma função de intervenção local direcionada a uma demanda
específica: substituir alguns processos de geração de violência,
como a falta de oportunidades sociais, pela inclusão social e
desenvolvimento da cidadania, objetivando a diminuição dos
índices de criminalidade local. (GOMES; CONSTANTINO, 2005:
609).
Os projetos têm suas ações legitimadas ao possibilitarem a ocupação do tempo livre
de crianças e adolescentes com atividades esportivas, culturais e de lazer e oferecerem
formação e orientação profissional, atendimento médico e odontológico. Segundo os
de nov. de 2007.
Para observar uma discussão mais aprofundada sobre a história e os conceitos dos Projetos de Inclusão
Social no Brasil, veja Nogueira et al (2005).
3
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autores, tais procedimentos são justificados com a intenção de oferecer maiores
oportunidades de crescimento pessoal e social e auxiliar no desenvolvimento da saúde,
além de resgatar e fortalecer a cidadania (GOMES; CONSTANTINO, 2005).
Junto às propostas de ampliação de oportunidades aos sujeitos e grupos
marginalizados a partir da oferta de atividades esportivas, artísticas e culturais de caráter
multidisciplinar e multiprofissional de orientação para o trabalho, de assistência médica
básica, de complementação alimentar, de inclusão digital entre outras, encontra-se a
preocupação em compensar as deficiências da formação escolar.
As contribuições para a diminuição dos índices de repetência e evasão escolar,
devido a exigência de comprovação de que o aluno está matriculado na escola para que o
mesmo possa participar das atividades esportivas, aparece como um dos mais fortes
argumentos que justificam os PIS. Junto a esta exigência aparecem também o
acompanhamento dos conceitos nos boletins escolares e a oferta de aulas de reforço escolar.
Gomes e Constantino (2005) encontraram 1.936.030 crianças e jovens na faixa
etária de sete a 17 anos no mapeamento parcial de PIS no Brasil no ano de 2003. O número
de participantes corresponde a 5,2% da população brasileira nesta faixa etária. Segundo os
autores este percentual pode subir se forem acrescentados dados das prefeituras do interior
dos Estados não disponíveis para pesquisa.
Embora o mapeamento realizado por Gomes e Constantino (2005) revelem algumas
tendências nos PIS, as informações não explicam os altos índices de evasão que não são
revelados pelas fontes consultadas pelos autores. Existe uma tendência de sobrevalorização
dos efeitos positivos dos PIS e de omissão dos seus percalços.
Em investigação focalizada Vianna (2007) verificou que 80% dos sujeitos a quem
se destina a intervenção de inclusão social abandonam as atividades com menos de um ano
de prática, fato que colocou em dúvida o impacto do PIS.
O estudo a partir de aspectos da participação de crianças e jovens das camadas
populares em um Projeto de Inclusão Social (PIS) pelo esporte, situado na Cidade de Deus,
Rio de Janeiro, procurou analisar e discutir o valor dos dados administrativos dos
programas para darem conta de problemas relevantes como os da adesão e da alta
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rotatividade que os pode afetar, para assim refletir e apontar caminhos de refinamento dos
dados colhidos com intuito de acompanhar e avaliar o programa (VIANNA; LOVISOLO,
2009).
A investigação contou com 6.932 fichas de inscrição, referentes a 5.462 alunos de
ambos os sexos, na faixa etária de cinco a 24 anos, matriculados no projeto no período de
1998 a 2003.
Tabela 1 - Percentual de alunos por anos de prática4
Anos de
prática
Sujeitos
5462
%
100
Até 1
1-2
2-3
3-4
4-5
5-6
4338
871
177
59
16
1
79,42
15,95
3,24
1,08
0,29
0,02
Ao longo da análise os autores observaram que a eficiência dos programas pode
estar condicionada ao grau de acordo desenvolvido entre as propostas institucionais e as
expectativas dos participantes que, de modo geral, estão ligadas à racionalidades locais.
(VIANNA; LOVISOLO, 2009).
Ao que parece, quando o nível de acordo entre as políticas e pedagogia
institucionais que procuram lidar com a inclusão social dos sujeitos das camadas populares
está longe de atender as expectativas dos maiores interessados (as crianças e jovens), leva a
rotatividade e a evasão dos participantes (VIANNA, 2007) - o que nem sempre é revelado
pelos projetos e programas – o que compromete a proposta de inclusão e formação cidadã
dos participantes.
CONSIDERAÇÕES FINAIS.
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Ao que tudo indica, alguns narradores privilegiados contribuíram para a construção
de representações sociais dos sujeitos das camadas populares, que atribuíram a estes
indivíduos um status de inferioridade psicológica e moral que justificavam a marginalidade.
A partir destas representações diversas iniciativas do poder público e do poder privado no
Brasil por meio de políticas públicas e de teorias educacionais, procuraram lidar com a
marginalidade ou com a perspectiva de inclusão social, a fim de minimizar os efeitos da
desigualdade de oportunidades sociais, entre as quais a desigualdade no acesso a educação
de qualidade - que parece não terem alcançado o êxito esperado no que diz respeito aos
níveis de seletividade, exclusão escolar, reprovação e evasão precoces.
Este fenômeno pode ser devido a ausência da relação necessária entre a qualidade
da educação e os indicadores de inclusão social, coloca em dúvida a eficácia das
contribuições de diversas políticas de educação para a inclusão social dos sujeitos das
camadas populares. Os dados levantados nas últimas décadas levam a percepção de que as
metas de superação da marginalidade e melhoria da qualidade da educação básica ainda
estão distantes.
Nos últimos anos a prefeitura do Rio de Janeiro procurou minimizar a evasão
escolar e o aumento dos anos de escolaridade com a aprovação automática – o que foi alvo
de crítica de opositores políticos, professores e pesquisadores da educação. Com a mudança
do governo municipal, vieram modificações na política municipal de educação, com o
término da aprovação automática e a implantação de projetos que procuram complementar
a formação escolar com atividades extra-curriculares para alunos com maiores dificuldades
de aprendizado – Escolas do Amanhã (150 escolas situadas em bairros populares sob a
influência do tráfico de drogas ou de milícias, considerados áreas de conflito) e Mais
Educação (apoio do Governo Federal). Estes projetos parecem ter suas raízes em iniciativas
do setor privado e do terceiro setor de reforço ou complementação da educação escolar –
entre as atividades propostas destacam-se além do reforço escolar as atividades esportivas e
artísticas que acontecem no contraturno.
4
Adaptado de Vianna e Lovisolo (2009)
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As evidências apontam algumas propostas alternativas de instituições privadas e do
terceiro setor com o fim de fortalecer a formação escolar e a cidadania de crianças e jovens,
articulando a educação formal e outras intervenções sócio educacionais em horários
alternativos ao horário escolar, que tiveram o seu impacto comprometido face a grande
rotatividade de seus participantes – embora observa-se na propaganda dos órgãos oficiais e
privados a sobrevalorização dos efeitos positivos dos PIS e a ocultação dos seus percalços,
tais como os altos índices de evasão. Na escola a participação nas atividades do contraturno
escolar é obrigatória, o que em tese resolveria o problema da evasão, embora observações
assistemáticas de quem está no campo revelem faltas injustificadas dos alunos - que são
comunicadas pela direção da escola ao Conselho Tutelar - e solicitações de responsáveis
pedindo que seus filhos não permaneçam na escola em horários além de seu turno de aulas
regulares.
Destaca-se mais uma vez que uma explicação alternativa para a ineficácia das
propostas que utilizam a educação como um dos meios de inclusão social é o desacordo
entre as políticas institucionais, as expectativas dos seus agentes interlocutores e as
racionalidades de seu público alvo.
Assim, por considerar que o processo de ensino-aprendizagem é situado, atendendo
as características locais e dos seus atores, acreditamos que o investimento em pesquisas que
observem as racionalidades locais pode contribuir para a ampliação e o aprofundamento das
reflexões propostas neste texto e para o refinamento das políticas e pedagogia de inclusão
social.
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BRASIL. Ministério da Educação e do Desporto. Parâmetros Curriculares Nacionais.
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