SENTIDOS DA PARTICIPAÇÃO E REPRESENTAÇÃO DA

Propaganda
Universidade Federal de Minas Gerais
Programa de Formação de Conselheiros Nacionais
Curso de Especialização em Democracia Participativa,
República e Movimentos Sociais
SENTIDOS DA PARTICIPAÇÃO E REPRESENTAÇÃO DA
SOCIEDADE CIVIL: DESAFIOS RELACIONADOS À
LEGITIMIDADE E REPRESENTATIVIDADE DAS
ORGANIZAÇÕES DA SOCIEDADE CIVIL JUNTO AOS
CONSELHOS GESTORES
Marcelo Dayrell Vivas
Belo Horizonte
2010
MARCELO DAYRELL VIVAS
SENTIDOS DA PARTICIPAÇÃO E REPRESENTAÇÃO DA
SOCIEDADE CIVIL: DESAFIOS RELACIONADOS À
LEGITIMIDADE E REPRESENTATIVIDADE DAS
ORGANIZAÇÕES DA SOCIEDADE CIVIL JUNTO AOS
CONSELHOS GESTORES
Monografia apresentada ao Programa de
Formação de Conselheiros Nacionais da
Universidade Federal de Minas Gerais
como requisito parcial para a obtenção do
grau de Especialista em Democracia
Participativa, República e Movimentos
Sociais.
Orientador:
Guimarães
Prof.
Dr.
Juarez
Co-orientadora: Ms. Letícia Godinho
Belo Horizonte
2010
Rocha
Ao saudoso João Batista de Oliveira, pelo
exemplo de vida e de luta e por todos os
anos de militância e política dedicados à
promoção e defesa dos direitos humanos.
AGRADECIMENTOS
À Universidade Federal de Minas Gerais, pela infraestrutura, materiais e troca de
conhecimento. Aos meus orientadores, Juarez Rocha Guimarães e Letícia Godinho, pelos
esclarecimentos e pelo empenho no refinamento deste trabalho.
À Plataforma DhESCA Brasil, pelo apoio nesta especialização, pelo fomento ao debate e
pela articulação no âmbito da sociedade civil organizada brasileira. A Maria Elena
Rodrigues, pela oportunidade concedida e pelo profissionalismo. A Lúcia Moraes, pela
cooperação mútua e pelas discussões nas viagens Brasil afora.
Ao Conselho Estadual de Assistência Social de Minas Gerais, pela colaboração na cessão
dos dados e informações e pela presteza de todos os colaboradores, em especial a Beth,
Conceição, Juanita e Roberta.
Aos verdadeiros amigos, por respeitarem e compreenderem minhas inseguranças,
incertezas e silêncios. Ao Márcio e à Cris, à Ana e ao André (Almeida), ao Bruno e ao
Fabrício, ao Reinaldo e à Silvia (Sander), à tia Márcia (Ustra) e ao Hudson, ao Tulinho e à
Viviane (Mayrink), pelas longas conversas, pela companhia nos momentos difíceis e pelos
conselhos pacientes e precisos nas horas incertas.
Aos amigos de São Paulo, por preservarem a nossa amizade independentemente da
distância. Ao Renan, pelo apoio cotidiano, pelo ombro amigo e pelas discussões acaloradas.
À Eloisa, pela contínua disponibilidade, pela firmeza ética e pelos puxões de orelha na hora
certa e na medida certa, no âmbito afetivo e profissional. Ao Mateus, pela constante
lealdade, pelas duvidosas crises vivenciadas e pelo crescimento compartilhado
conjuntamente. Ao Juliano, pelas confidências, pelo companheirismo e por mostrar o valor
de uma amizade desinteressada nos meus momentos de descrença.
Aos amigos de Minas Gerais, que me acolheram e ainda acolhem em diversos momentos
como quem recepciona a um irmão. À mamy Márcia (Martini), pelo porto seguro, pela
maternidade adotada e pelas lições sobre política e militância. À Silvinha, pelo carinho
fraterno, pelo pragmatismo e pelo incentivo acadêmico. Ao Renato, pelas broncas, pelos
conselhos e pela ajuda nas curvas e atalhos. À Carol, pela força, pelo suporte maduro e
pela acolhida familiar.
Ao Igor e Renan, pelos comentários pertinentes e pela revisão minuciosa deste trabalho.
À Pipi, por ser essa irmã-amiga-mãe-colega-sócia-namorada-mulher que me escuta, acolhe,
aconselha, ouve, cuida e briga, fazendo com que eu amadureça a cada dia.
À minha família, personalizada na figura de minha mãe, meu pai, minha irmã, meu irmão e
meu cunhado, pelo cuidado, pelos perdões e pelo porto seguro. Aos meus “sogros”, pelo
carinho e pela compreensão.
Ao Ialslado, pela dignidade e por fomentar meu crescimento pessoal e por conseguir me
mostrar todos os sentimentos e sensações positivas numa relação única e primordial ao
meu aprimoramento enquanto pessoa.
A Deus, pelos desafios impostos e pela força interior para vivenciá-los.
Mas não creias que só tuas decisões
sejam acertadas e justas... Todos quantos
pensam que só eles têm inteligência, e o
dom da palavra, e um espírito superior,
ah! esses, quando de perto os
examinamos, mostrar-se-ão inteiramente
vazios! Por muito sábios que nos
julguemos, não há desar em aprender
ainda mais, e em não persistir em juízos
errôneos... Quando as torrentes passam
engrossadas pelos aguaceiros, as árvores
que vergam conservam seus ramos, e as
que resistem são arrancadas pelas raízes!
[...]
Somente num país inteiramente deserto
terias o direito de governar sozinho!
Sófocles, Antígona.
RESUMO
Dado o papel que a sociedade civil organizada vem assumindo junto à representação política
tradicional (MIGUEL, 2003; TATAGIBA, 2002), um desafio apresentado à experiência participativa
dos conselhos gestores refere-se à forma como é constituída a representação da sociedade civil
nesses espaços. Há, inevitavelmente, que se questionar o fundamento de legitimidade das
organizações da sociedade civil que atuam nos espaços participativos conquistados a partir de 1988
(AVRITZER, 2007; AVRITZER; PEREIRA, 2005). Se, por um lado, se observa uma redefinição do
papel da sociedade civil (DAGNINO, 2002; 2004), é importante, por outro, questionar e problematizar
o papel das organizações da sociedade civil enquanto agentes autorizados a “dar voz” à população e
a transmitir os problemas da esfera privada para a esfera pública. A partir de uma revisão da
literatura, este trabalho problematiza o fator de legitimação dessas organizações representadas nos
conselhos gestores (LAVALLE et al., 2006a e 2006b) e, conjuntamente, analisa a accountability
necessária a todos os atores que se apresentam na esfera pública (SÖRJ, 2004; FARIA, 2007;
SÖRJ; MARTUCELLI, 2008). Complementando esse estudo, é apresentado um caso concreto –
o Conselho Estadual de Assistência Social de Minas Gerais –, com vista a identificar, a partir da
legislação específica e das atas dos foros de eleição, a composição da representação da sociedade
civil organizada e o modo como ocorrem os processos de escolha.
Palavras-chave: Sociedade civil. Democracia. Participação.
ABSTRACT
Given the role that the organized civil society has been playing in complementation to that of
traditional political agents (MIGUEL, 2003; TATAGIBA, 2002), one of the major challenges concerning
the participation experience in the Brazilian local councils of politics consists of legitimating the way
the civil society is represented in such political spaces. In other words, it is relevant to raise questions
on the legitimacy of Brazilian civil society organizations that have been working within the participation
spaces conquered in 1988 onwards (AVRITZER, 2007; AVRITZER; PEREIRA, 2005). As the role of
the civil society has been redesigned (DAGNINO, 2002; 2004), it is important to debate the role of civil
society organizations as political agents allowed to “give voice” to the population and to transfer
problems from the private to the public sphere. Starting from a review of the literature, this study
discusses the legitimacy factors accounting for the engagement of such organizations in the Brazilian
local councils of politics (LAVALLE et al., 2006a e 2006b), and also analyzes how it impacts on the
accountability necessary for all the social agents to perform within the public sphere (SÖRJ, 2004;
FARIA, 2007; SÖRJ, MARTUCELLI, 2008). Complementarily, a case study – the Minas Gerais State
Council of Social Work – is introduced as a means to identify how the representativeness of the
organized civil society is composed and how the election procedures take place.
Keywords. Civil Society. Democracy. Participation.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO....................................................................................................... 10
2 REVISÃO DA LITERATURA................................................................................. 12
2.1 Sociedade Civil Organizada e Participação Democrática .............................. 12
2.2 Representação no Interior das Experiências de Participação........................ 17
2.3 Autorização e Legitimidade da Ação: Representação por Afinidade ............. 22
2.4 Pluralização da Representação e Fundamentos da Legitimidade ................. 25
2.5 Desafios da Representatividade e da Legitimidade ....................................... 30
3 METODOLOGIA.................................................................................................... 34
3.1 Natureza da Pesquisa e Coleta de Dados ..................................................... 34
3.2 Metodologia de Análise.................................................................................. 35
4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS ............................................................... 36
4.1 O Conselho Estadual de Assistência Social de Minas Gerais ....................... 36
4.2 O Processo de Escolha dos Representantes da Sociedade Civil ................. 38
4.3 Análise dos Dados ........................................................................................ 45
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................. 48
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................ 51
LISTA DE SIGLAS E ABREVIATURAS
APAE
Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais
CEAS
Conselho Estadual de Assistência Social
CMAS
Conselho Municipal de Assistência Social
FEAS
Fundo Estadual da Assistência Social
FSM
Fórum Social Mundial
LOAS
Lei Orgânica da Assistência Social
MST
Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra
ONG
Organização Não Governamental
OP
Orçamento Participativo
SERVAS
Serviço Voluntário de Assistência Social
SUAS
Sistema Único da Assistência Social
10
1 INTRODUÇÃO
A ampliação da participação, marco da redemocratização brasileira,
configurou-se com a criação de novos espaços de interação entre os governantes e
a sociedade civil. No âmbito da participação nas políticas públicas, os conselhos
emergem como uma típica experiência de representação na participação. Arena
intermediária entre o Estado e a sociedade civil, os conselhos de políticas são
aqueles espaços criados por lei para deliberação dos diversos atores sociais sobre
políticas públicas temáticas (AVRITZER; PEREIRA, 2005). Os principais exemplos
são os recém-criados conselhos das cidades e os conselhos de criança e
adolescente, de saúde, de assistência social e de meio ambiente. Tais conselhos
são
compostos
por
membros
da
sociedade
civil
e
por
representantes
governamentais, preferencialmente de forma paritária (DAGNINO, 2004; AVRITZER;
PEREIRA, 2005; FARIA, 2007). Tais espaços, bastante difundidos, foram agregados
por legislações temáticas e compõem um sistema nacional específico, abrangendo a
transferência de recursos, entre entes federados, via fundo vinculado ao Conselho.
Dado o papel que a sociedade civil organizada vem assumindo junto à
representação política tradicional (MIGUEL, 2003), um desafio à efetividade dos
conselhos gestores refere-se à forma como é constituída a representação da
sociedade civil nesses espaços – o que Lüchmann (2007) chama de “representação
nas experiências de participação”. Em outras palavras, há, inevitavelmente, que se
questionar o fundamento de legitimidade das organizações da sociedade civil que
atuam nos espaços participativos conquistados a partir de 1988 (AVRITZER, 2007).
Se, por um lado, se observa uma redefinição do papel da sociedade civil
(DAGNINO, 2004) a partir do crescimento da força da mídia e do enfraquecimento
dos partidos políticos (SÖRJ, 2004; MIGUEL, 2003; MELO, 2007), é importante, por
outro lado, questionar e problematizar o papel concedido às organizações da
sociedade civil enquanto agentes autorizados a “dar voz” para a população e
transmitir os problemas da esfera privada para a esfera pública. Nesse contexto,
cumpre discutir o fator de legitimação dessas organizações representadas nos
conselhos gestores e, conjuntamente, discutir como se dá a accountability1
1
Em linhas gerais, accountability refere-se a formas de controle e de prestação de contas a que
devem se submeter os detentores de cargos ou funções públicas.
11
necessária a todos os atores que se apresentam na esfera pública. Em nome de
quem, como agem e o que fazem os conselheiros não governamentais são pontos
que devem ser claramente explicitados pelas organizações da sociedade civil e
pelos demais movimentos sociais, sob risco de terem sua atuação questionada e
minorada (SÖRJ, 2004; FARIA, 2007).
Embora sejam práticas inovadoras e promissoras, os conselhos gestores
por si sós, até o momento, não necessariamente implicam uma maior participação
da sociedade civil na elaboração, formalização, controle, implementação e execução
das políticas públicas, o que vem fomentando diversos estudos acerca das práticas
participativas (MIGUEL, 2005; AVRITZER, 2007; LÜCHMANN, 2008). A relação
entre Estado e sociedade civil nos conselhos também é determinada pela forma
como são escolhidas as entidades de origem dos conselheiros. O procedimento
adotado demonstra como se constitui a representação no interior dos conselhos e
quais os fundamentos de sua legitimidade (FARIA, 2007).
Focaliza-se, no presente trabalho, a relação de representação efetiva
desenvolvida entre os membros não governamentais e a sociedade civil, analisandose o fator de legitimação dos atores presentes nos conselhos gestores (TATAGIBA,
2002; AVRITZER; PEREIRA, 2005; SÖRJ; MARTUCELLI, 2008). Em uma análise
não procedimental da democracia, o presente trabalho tem por objetivo geral estudar
– a partir de uma pesquisa bibliográfica e documental – quais fatores fundamentam
a participação de determinados atores sociais (e não de outros) nos conselhos.
Considerando-se que os atores participantes são fixados por lei ou por fóruns préformatados que, em muitos casos, são conduzidos pelo Poder Público,
a representatividade de tais atores precisa ser redefinida e/ou fundamentada em
outros critérios, como conhecimento técnico, militância histórica ou reconhecimento
entre outras organizações e movimentos. Mais explicitamente, constitui objetivo
específico do trabalho em pauta analisar o mecanismo de escolha e os fundamentos
de legitimidade do mandato dos conselheiros não governamentais no Conselho
Estadual de Assistência Social em Minas Gerais, responsável pelo planejamento,
gestão, execução, fiscalização e controle da política estadual de assistência social.
Este trabalho está estruturado em cinco capítulos, incluindo esta
introdução, em que são apresentados o tema e a justificativa desta pesquisa, bem
como os objetivos gerais e específicos do estudo em pauta. O Capítulo 2 consiste na
12
revisão da literatura, em que se estabelece uma afiliação às teorias da democracia
participativa. Nesse Capítulo, apresentam-se os conceitos de sociedade civil
organizada e os mecanismos de representação no interior de experiências de
participação, além de se discutirem questões como a representação da sociedade
civil organizada nos conselhos gestores, a categorização dos argumentos de
legitimidade apresentados
pelas
próprias
organizações
e
os
desafios
de
representatividade e legitimidade da atuação. O Capítulo 3 compreende a
categorização e descrição da natureza da pesquisa, da forma de coleta de dados e
da metodologia de análise. O Capítulo 4 analisa os dados referentes ao Conselho
Estadual de Assistência Social de Minas Gerais e apresenta uma discussão dos
dados frente à literatura especializada. O quinto e último Capítulo corresponde às
considerações finais, apresentando-se propostas para fortalecer a participação da
sociedade civil organizada e delineando-se as limitações da presente pesquisa.
2 REVISÃO DA LITERATURA
2.1
Sociedade Civil Organizada e Participação Democrática
As diversas visões acerca da participação da sociedade civil organizada
nas políticas públicas têm relação com o modo como são compreendidos o conceito
de sociedade civil organizada e as experiências de participação vivenciadas.
Conforme dispõem Arato (1995) e Schoelte (2001), a reconstrução do conceito de
sociedade civil ocorrida nas últimas décadas do século XX poderia ter-se dado com
base em interpretações fundamentadas em diferentes tradições intelectuais, como
Montesquieu, Burke, Tocqueville, Laski ou Parsons. Contudo, os principais trabalhos
nesse sentido, tais como aqueles defendidos por Habermas, Lefort, Bobbio e
O’Donnel,
filiaram-se
a
tradições
análogas
ao
discurso
neomarxista,
fundamentando-se nos estudos de Hegel, Marx e Gramsci.
O ideário de sociedade civil consolida-se no cenário latino-americano na
década de 1970, a partir do enfrentamento aos regimes ditatoriais que se instalaram
na região. De maneira geral, a sociedade civil instalou-se no imaginário brasileiro
13
como uma forma de mobilização e organização para alterar, no plano estatal,
o status quo então dominado pelos militares.
Não obstante, verifica-se que, juntamente com o debate instalado na
conjuntura política e econômica vivenciada, o termo tem ganhado novas acepções e
significados. A noção de sociedade civil, então, assume novo significado a partir da
redemocratização, com a criação e consolidação de novos espaços de participação
e luta política, quando os movimentos sociais urbanos (e.g., movimentos de moradia
e movimentos de bairro) deixam de ser o elemento central no debate acerca da
participação da sociedade civil. Nesse contexto, surgem novos atores a partir de
novas formas de associativismos emergentes na cena política. A “autonomia” frente
ao Estado deixa de ser um eixo fundante para a sociedade civil, já que, com o fim do
regime militar, “[n]ovos e antigos atores sociais [passaram a fixar] suas metas de
lutas e conquistas na sociedade política, especialmente nas políticas públicas”
(GOHN, 2005, p. 74-75).
Essas novas entidades, organizações e instituições, surgidas a partir da
redemocratização, passam a ganhar espaço na sociedade civil por meio de uma
articulação com o Estado, tomando-lhe, muitas vezes, o papel na oferta dos serviços
públicos (DAGNINO, 2004). Tem-se a modificação da forma de participação do
cidadão, com a perda de densidade dos sindicatos enquanto atores políticos
construtores de identidades coletivas e com a crise dos partidos políticos enquanto
espaços de representação de utopias (SÖRJ, MARTITUCCELLI, 2008). Com isso,
constata-se ainda a desvinculação entre os movimentos sociais, por um lado, e os
sindicatos e partidos políticos, por outro, dado o enfraquecimento sofrido pelos
últimos dois atores nos anos 1990: em outros termos, movimentos populares de
grande relevância para a sociedade não foram articulados a partir desses
tradicionais atores, como a luta pelos direitos civis e políticos, o movimento
ecológico e o movimento de mulheres.
Ainda a partir da redemocratização, as ONGs (organizações não
governamentais) se fortalecem como principais atores da sociedade civil
contemporânea, diretamente atuando na mobilização da população e não mais
como apoios aos movimentos populares – os quais, na realidade, passam a
participar de projetos dessas organizações. A emergência do “terceiro setor”, a partir
de empresas, fundações, bancos e artistas famosos, reformula toda a atuação das
14
ONGs “cidadãs” e movimentos sociais, em contraposição às chamadas “entidades
do terceiro setor” (GOHN, 2005). As ONGs tidas como cidadãs se orientam por um
projeto político2 que busca tanto transformações e mudanças sociais profundas
quanto a conquista e a ampliação de direitos, envolvendo amplas camadas da
população. Já as entidades do terceiro setor, que ganham notoriedade a partir dos
anos 1990, atuam com base em um vago projeto de humanismo e voluntariado,
focando-se na atuação junto a populações tidas como vulneráveis (i.e., os mais
miseráveis dentre os pobres), em projetos específicos e pontuais executados com
pequenos grupos em prazos predeterminados.
A partir do final da década de 1990, há o fortalecimento de alguns
movimentos e fóruns, como o Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST) e o
Fórum Social Mundial (FSM), o que recria toda uma organização e processo de
mobilização a partir de movimentos sociais dos países do Sul3, que voltaram a ter
visibilidade e centralidade como atores que impactam no processo de mudança
social. Há, de certo, diversas alterações no escopo desses movimentos,
com deslocamento de suas identidades, incorporação de outras dimensões do
pensar e agir social e a própria alteração dos projetos políticos, gerando, em alguns
casos, redefinição desses projetos a partir da articulação com outros atores sociais
(e.g., ONGs e governos) e, em outros, a fragmentação dos próprios movimentos a
partir da alteração de suas ideias e pontos de vista centrais (GOHN, 2005):
Assim, os anos noventa foram cenário de numerosos exemplos desse
trânsito da sociedade civil para o Estado [...] [D]urante esse mesmo
período, o confronto e o antagonismo que tinham marcado profundamente
a relação entre o Estado e a sociedade civil nas décadas anteriores
cederam lugar a uma aposta na possibilidade da sua ação conjunta para o
aprofundamento democrático. Essa aposta deve ser entendida num
contexto onde [sic] o princípio de participação da sociedade se tornou
central como característica distintiva desse projeto, subjacente ao próprio
esforço de criação de espaços públicos onde o poder do Estado pudesse
ser compartilhado com a sociedade. Entre os espaços implementados
durante esse período destacam-se os Conselhos Gestores de Políticas
Públicas, instituídos por lei, e os Orçamentos Participativos, que, a partir da
experiência pioneira de Porto Alegre, foram implementados em cerca de
cem cidades brasileiras, a maioria governadas [sic] por partidos de
esquerda, principalmente o Partido dos Trabalhadores (PT). (DAGNINO,
2004, p. 96)
2
3
Adotou-se aqui o termo “projeto político” conforme concebido em estudos de Dagnino (2002; 2004).
A ideia de Sul aqui discutida se refere ao Sul político, isto é, aos países da América Latina, Ásia e
África. Esse conceito vem sendo trabalhado em espaços de mobilização, como o Fórum Social
Mundial
(www.fsm.org.br)
e
o
Colóquio
Internacional
de
Direitos
Humanos
(www.conectas.org/coloquio).
15
Tendo em vista a sua força evocativa como espaço de expressão da
esperança por um mundo melhor, a ideia de sociedade civil exerce um papel
decisivo na estrutura de percepção dos cidadãos e na função que os atores sociais
conferem a si mesmos (SÖRJ; MARTITUCCELLI, 2008). Nesse cenário, é também
necessário circunscrever o que se entende por sociedade civil, tendo em vista que
se trata de um termo que pode ser interpretado segundo linhas intelectuais e
políticas
distintas
e,
por
vezes,
antagônicas.
Parte-se,
neste
trabalho,
do pressuposto de que sociedade civil corresponde à esfera da vida que não foi
colonizada pelo ethos instrumental do Estado e do mercado (VIEIRA; DUPREE,
2004). Segundo Schoelte (2001, p. 4),
[...] ‘sociedade civil’ aqui se refere ao espaço político no qual associações
voluntárias explicitamente buscam dar forma às regras (em termos de
políticas específicas, normas mais amplas e estruturas sociais mais
profundas) que governam um ou outro aspecto da vida social. Alguns
elementos da sociedade civil (geralmente caracterizados como
‘movimentos sociais’) buscam transformações radicais da ordem
dominante. Contudo, a sociedade civil também inclui tanto elementos
reformistas, que têm por objetivo apenas revisões modestas dos arranjos
governamentais já existentes, quanto elementos conformistas, que visam
reforçar as regras já estabelecidas. De fato, muitas iniciativas da sociedade
4
civil revelam um misto de tendências radicais, reformistas e conformistas.
Tal conceito remete aos estudos de Habermas (1997) acerca do espaço
público e sociedade civil organizada, descrevendo a esfera pública política como
uma caixa de ressonância na qual ecoam os problemas a serem elaborados pelo
sistema político. Esse espaço público deve ser capaz de realizar a percepção no
âmbito da sociedade de modo a identificar os problemas e reforçar sua pressão
frente ao Estado, isto é, os problemas devem ser também tematizados e
dramatizados de forma eficaz a fim de que o complexo parlamentar os assuma e
elabore politicamente. Nesse sentido, Habermas (1997, p. 92) conceitua a esfera
pública nos seguintes termos:
A esfera pública pode ser descrita como uma rede adequada para a
comunicação de conteúdos, tomadas de posição e opiniões; nela os fluxos
comunicacionais são filtrados e sintetizados a ponto de se condensarem
em opiniões públicas enfeixadas em temas específicos. [...] A esfera
4
Tradução do autor para: “[…] ‘civil society’ is taken here to refer to a political space where voluntary
associations explicitly seek to shape the rules (in terms of specific policies, wider norms and deeper
social structures) that govern one or the other aspect of social life. Some elements of civil society
(often characterised as ‘social movements’) seek radical transformations of the prevailing order.
However, civil society also includes reformist elements that seek only modest revisions of existing
governance arrangements and conformist elements that seek to reinforce established rules. Indeed,
many civil society initiatives show a mix of radical, reformist and conformist tendencies”
(SCHOELTE, 2001, p. 4).
16
pública constitui principalmente uma estrutura comunicacional do agir
orientado pelo entendimento, a qual tem a ver com o espaço social gerado
no agir comunicativo, não com as funções nem com os conteúdos da
comunicação cotidiana. (grifos como no original)
Arato (2002) ressalta que a esfera pública e a sociedade civil existem
conjuntamente: a primeira se refere aos processos parcialmente institucionalizados
de comunicação, enquanto a segunda consiste nos grupos, associações e
movimentos necessários tanto para generalizar a experiência de comunicação como
para influir politicamente nesses processos. Assim, na linha dos estudos de
Habermas (1997) e de Cohen e Arato (2000), a sociedade civil pode ser
compreendida como o espaço público não estatal composto de movimentos,
organizações e associações que captam os “ecos” dos problemas sociais na esfera
privada e os transmitem para a esfera pública política.
Gohn (2005, p. 107-108) elabora um rol, não taxativo, dos principais
protagonistas da sociedade civil organizada, tendo em vista que se trata de um
termo historicamente construído (i.e., a partir do contexto socioeconômico
vivenciado) e em constante transformação:
São as ONGs, os movimentos sociais, as comissões, grupos e entidades
de direitos humanos e de defesa dos excluídos por causas econômicas, de
gênero, raça, etnia, religião, portadores de necessidades físicas especiais;
associações e cooperativas autogestionárias de redes de economia
popular solidária; inúmeras associações e entidades com perfis variados do
Terceiro Setor; fóruns locais, regionais, nacionais e internacionais de
debates e lutas para o encaminhamento de questões sociais; entidades
ambientalistas e de defesa do patrimônio histórico e arquitetônico; redes
comunitárias de bairros, conselhos populares e setores organizados que
atuam nos conselhos institucionalizados das áreas sociais. Mas a
sociedade civil inclui também algumas empresas e fundações que atuam
segundo critérios de responsabilidade social. A maioria atua não apenas de
forma endógena, dentro da própria sociedade civil, mas participam [sic] dos
espaços e mecanismos de debates dos problemas nacionais em espaços
públicos (ainda que sejam especializadas por temáticas de atuação); e
muitas estão articuladas à própria gestão pública (nos conselhos gestores,
por exemplo).
O espaço público das democracias recentes, em especial da América
Latina e da África, está sendo gradualmente ocupado por associações, ONGs e
movimentos sociais pautados em torno de uma política de accountability social.
Trata-se de uma das variadas formas de politização com base na sociedade civil,
englobando formas de ação coletiva e de ativismo cívico cuja base consiste no
aprimoramento das instituições representativas por meio do fortalecimento dos
17
mecanismos de controle público das ações e da legalidade dos funcionários públicos
(PERUZZOTTI, 2006).
2.2
Representação no Interior das Experiências de Participação
A expansão democrática para os países do Sul, a partir dos anos 1970 e
1980, envolveu uma relação estreita com movimentos sociais que lutavam não
somente pela democratização, mas também pela ampliação da participação.
A redemocratização no Brasil, marcada pela Constituição Federal de 1988, coincidiu
com a criação de diversos mecanismos de participação que buscaram efetivar uma
democracia de resultados (GOUVÊA, 2009). Embora existam procedimentos
consolidados de organização do poder nas sociedades atuais, como eleições
periódicas e separação de poderes, a democracia deliberativa emerge como uma
alternativa de participação dos atores sociais em amplos fóruns de debate e
negociação, sem que seja ocupado o espaço de representantes eleitos.
Atuando no âmbito da formulação e implementação das políticas na
esfera governamental, assim como no planejamento e na fiscalização das ações,
os conselhos são órgãos concebidos para influir no Estado mediante as
competências conferidas pelas leis reguladoras. Trata-se, portanto, de espaços
públicos compostos de forma plural e paritária por atores governamentais e não
governamentais. Considerando-se sua natureza deliberativa, os conselhos têm
como função a formulação e o controle da execução das políticas públicas setoriais
(AVRITZER; PEREIRA, 2005) e podem ainda ser entendidos como uma típica
experiência de representação na participação.
Com base em Tatagiba (2002), podem-se destacar três características
primordiais que distinguem os conselhos gestores de outras experiências de
conselhos:
Composição paritária e plural: representação de organizações da
sociedade civil e agências do Estado, portadoras de valores e
interesses distintos e até mesmo antagônicos;
Processo dialógico: instrumento de mediação dos conflitos
inerentes à natureza dos distintos interesses em jogo; negociação
de forma pública e aberta, com argumentos passíveis de serem
18
sustentados
publicamente
a
partir
de
princípios
éticos
elementares relacionados à vida pública;
Instâncias deliberativas: competência legal para formulação e
fiscalização
da
implantação
de
políticas,
buscando
a
democratização da gestão; os conselhos gestores têm força legal
para influir no processo de produção de políticas públicas,
redefinindo prioridades, recursos orçamentários e públicos a
serem atendidos, consubstanciando a partilha do poder entre
Estado e sociedade civil.
Ampla literatura já discute os limites e avanços das teorias da
representação e da participação (BOBBIO, 1986; PITKIN, 2006; HABERMAS, 1995;
FARIA, 2000; AVRITZER, 1996, 2000; AVRITZER; SANTOS, 2002; O’DONNELL,
1988). Para além das tensões ou combinações entre representação e participação –
sejam os mecanismos da democracia deliberativa ou da democracia participativa –,
as experiências de participação têm criado novos mecanismos de representação
política bastante diversos da representação eleitoral, combinando instrumentos de
representação
com
participação
direta
e/ou
articulando
participação
com
representação da sociedade civil:
As instituições participativas que emergiram no Brasil democrático
implicaram em [sic] um aumento da representação (Gurza Lavalle,
Houtzager e Castello, 2006), seja pelo fato de que os próprios atores
sociais passaram a se denominar representantes da sociedade civil, seja
por que o Estado passou a lidar institucionalmente com uma representação
oficial da sociedade civil. Por aumento da representação, entendo o
crescimento das formas como os atores sociais exercem, nessas
instituições, a apresentação de certos temas, como a saúde ou interesses
urbanos e o fato de que, em instituições como os conselhos de políticas,
alguns atores são eleitos com o intuito de exercerem o papel de
representantes da sociedade civil. Não é difícil, no entanto, perceber que a
representação realizada pelos atores da sociedade civil é diferente daquela
exercida na instituição representativa por excelência, isto é, no Parlamento.
(AVRITZER, 2007, p. 444)
Entretanto, na tentativa de enaltecer ou questionar referidas experiências
participativas extremamente positivas do ponto de vista da democratização do
debate público, pouca atenção tem sido dada à legitimidade da participação e
representação da sociedade civil. Tal legitimidade pode ser contestada por
evidências empíricas, em face da heterogeneidade de objetivos, interesses e formas
de organização das entidades sociais. Além disso, tendo em vista a influência do
19
contexto na atuação e formulação política desses sujeitos coletivos, a experiência
tem desautorizado uma interpretação necessariamente democrática da participação
da sociedade civil nas instituições híbridas (LÜCHMANN, 2002, 2007).
A vinculação arraigada entre sociedade civil e benevolência para com os
interesses genuínos da sociedade, ou – numa representação habermasiana – uma
suposta relação imediata entre organizações sociais e o mundo da vida, tem
afastado, ou pelo menos adiado, o debate acerca da representatividade das
organizações, isto é, em nome de quem e com quais mecanismos de accountability
falam tais organizações:
Com efeito, estamos tratando de um tipo de representação que, diferente
do modelo eleitoral que identifica o representado (eleitor), esboça uma
ideia difusa dele mesmo, podendo tanto ser um segmento (ou vários
setores da população) quanto a própria entidade indicada para assumir a
representação. O caso da representação das ONGs nos conselhos é
bastante emblemático, uma vez que, como analisa Sörj (2005), estas
organizações apresentam a especificidade dada pelo fato de se
constituírem num “ator sem mandato direto de sua base de referência”
(Sörj, 2005: 21). Tendo em vista que muitas organizações são escolhidas
muito mais em função de seu grau de competência e qualificação do que
em virtude de seu vínculo com as bases, altera-se sobremaneira o debate
acerca das exigências de prestação de contas, responsividade e sanção.
(LÜCHMANN, 2007, p. 154)
Assim, a representação (ou representatividade) da sociedade civil vem
sendo pouco explorada no campo teórico, e mesmo no campo pragmático de
atuação das organizações, não se atentando para as importantes implicações
relacionadas com a reconfiguração da sociedade civil e com a participação das
entidades sociais na constituição de espaços públicos (DAGNINO, 2004). Há um
deslocamento no que se entende por representatividade, seja nos casos de
movimentos de massa de grande repercussão, como o Movimento Sem-Terra
(MST), seja nos casos das organizações não governamentais (ONGs) ou mesmo
nos fóruns e audiências relativas ao orçamento participativo (OP). Em se tratando
especificamente do MST e do OP, a representatividade desses sujeitos é, em geral
e numa noção clássica de representação, atestada pelo grande número de
participantes, enquanto nas ONGs essa discussão perpassa o reconhecimento pelo
Estado da competência técnica e/ou o conhecimento específico dessas entidades:
Portadoras dessa capacidade específica, muitas ONG passam também a
se ver como “representantes da sociedade civil”, num entendimento
particular da noção de representatividade. Consideram ainda que sua
representatividade vem do fato de que expressam interesses difusos na
20
sociedade, aos quais “dariam voz”. Essa representatividade adviria então
muito mais de uma coincidência entre esses interesses e os defendidos
pelas ONG do que de uma articulação explícita, ou relação orgânica, entre
estas e os portadores destes interesses. (DAGNINO, 2004, p. 101-102)
Dentre as
experiências
participativas
brasileiras
nesse
aspecto,
destacam-se os conselhos gestores, tanto por sua obrigatoriedade normativa quanto
por sua expansão por diversas cidades. De maneira pontual, os conselhos gestores
de políticas públicas são “espaço público de composição plural e paritária entre
Estado e sociedade civil, de natureza deliberativa, cuja função é formular e controlar
a
execução
das
políticas
públicas
setoriais”
(TATAGIBA,
2002,
p.
54).
Há, certamente, diferentes modelos de representação, em regra delineados nas leis
de criação dos conselhos, que envolvem o perfil dos segmentos representados e os
mecanismos de escolha dos participantes: paridade entre Estado e sociedade civil
(e.g., criança e adolescente, e assistência social), ou entre usuários e demais
setores (e.g., saúde); escolha dos representantes em fóruns abertos enquanto
outros conselhos já têm os segmentos a serem representados definidos previamente
pela legislação. O principal parâmetro no qual essa experiência se baseia é a
participação de organizações da sociedade civil, além da existência de algum tipo de
paridade entre Estado e sociedade civil.
Trata-se, portanto, de uma ideia de representatividade que alimenta certa
confusão no entendimento acerca dos critérios de legitimidade que estes
espaços carregam, na medida em que ora se apela para a legitimidade da
representação de pessoas ou setores com “‘uma história feita’ nas ‘lutas’
dos segmentos pró-cidadania” (Tatagiba, 2002); ora se relaciona
legitimidade com qualificação e competência dos representantes, como tem
sido o caso das ONGs (Dagnino, 2002); ora o critério de legitimidade está
ancorado na capacidade dos representantes em “expressar os interesses
do respectivo segmento social” (Teixeira, 1996). (LÜCHMANN, 2007,
p. 153-154)
Destarte, o modelo dos conselhos gestores está diretamente baseado
em um princípio da representação que ocorre por intermédio das organizações da
sociedade civil. Trata-se da dimensão da participação com foco na representação
coletiva, extrapolando a dimensão individual a partir de organizações e associações
que ocupam lugares estratégicos na sociedade civil. Inevitavelmente, o debate deve
abranger a criação e/ou o aprimoramento de mecanismos de autorização, prestação
de contas, responsividade e sanção, ainda que se trate de uma representação sem
mandato direto, como salientado por Sörj (2004).
21
Em consonância com Miguel (2003) e tendo-se em mente que a
sociedade civil é a base da prática da cidadania, inexiste a possibilidade de uma
representação política adequada sem a presença de uma sociedade civil
desenvolvida e plural. Ressalte-se, contudo, a abordagem de Dagnino (2004) quanto
aos projetos políticos distintos que norteiam a ampliação da participação da
sociedade civil. Conforme aponta a autora, existe, por um lado, um projeto neoliberal
(diretamente relacionado com os nortes do famoso Consenso de Washington) que
implica que o Estado se isenta progressivamente de seu papel de garantidor de
direitos e transfere suas responsabilidades sociais para a sociedade civil. Por outro
lado, existe também um projeto participativo fundamentado na Constituição Federal
e orientado à criação de espaços públicos nos quais haja uma crescente
participação da sociedade civil no processo de discussão e deliberação relacionado
às políticas públicas, sendo que esse projeto tem íntima relação com a luta contra o
regime militar e com a “reconciliação” entre sociedade civil e Estado ocorrida após a
redemocratização. Esses dois projetos demandam uma sociedade civil ativa e
propositiva, sendo que
[e]ssa identidade de propósitos, no que toca à participação da sociedade
civil, é evidentemente aparente. Mas essa aparência é sólida e
cuidadosamente construída através da utilização de referências comuns,
que tornam seu deciframento uma tarefa difícil, especialmente para os
atores da sociedade civil envolvidos, a cuja participação se apela tão
veementemente e em termos tão familiares e sedutores. A disputa política
entre projetos políticos distintos assume então o caráter de uma disputa de
significados para referências aparentemente comuns: participação,
sociedade civil, cidadania, democracia. Nessa disputa, onde os
deslizamentos semânticos, os deslocamentos de sentido, são as armas
principais, o terreno da prática política se constitui num terreno minado,
onde qualquer passo em falso nos leva ao campo adversário. (DAGNINO,
2004, p. 97)
Conforme debatido por Dagnino (2002) em relação à composição do
Conselho da Comunidade Solidária, centro das políticas sociais no Governo
Fernando Henrique Cardoso, a discussão acerca da representatividade da
sociedade civil passa pela confluência entre esses dois projetos políticos, correndose o risco de se reduzir a representatividade à visibilidade social e ao espaço
ocupado por determinado ator nos diversos tipos de mídia. Isso não significa,
contudo, afastar o debate acerca dos meios de comunicação, sendo de extrema
relevância entender os meios de comunicação como uma esfera de representação
política. Trata-se, sem dúvida, de um espaço privilegiado de disseminação das
22
diferentes perspectivas e projetos dos grupos em conflito na sociedade,
apresentando as vozes dos diversos segmentos políticos e permitindo que o cidadão
forme sua opinião política a partir do acesso a valores, argumentos e fatos que estão
relacionados com os projetos políticos em disputa (MIGUEL, 2003).
2.3
Autorização e Legitimidade da Ação: Representação por Afinidade
A representação da sociedade civil nos espaços participativos passou a
ser problematizada mais recentemente, existindo alguns modelos teóricos que
buscam fundamentar a legitimidade da representação no interior das experiências
de participação. No período imediatamente após a redemocratização, o foco
emergencial dos atores sociais se resumia a criar, estabelecer e cristalizar
experiências participativas com base na Constituição Federal, muito mais do que
discutir fundamentos teóricos ou argumentos de legitimidade das instituições então
criadas:
O conceito de sociedade civil é daqueles que tem se prestado às mais
diferentes interpretações, seja nas discussões acadêmicas, seja na luta
política do dia a dia. Salvo melhor juízo, a interpretação que venceu, ao
menos na prática dos anos 80, foi a de que “sociedade civil” é tudo aquilo
que não é “Estado”. Foi a partir dessa visão, correta em boa medida, que
organizações sociais passaram a autodenominar-se “representantes da
sociedade civil”. Quem se der ao trabalho de acompanhar como ocorreu a
aplicação do conceito verificará que, curiosamente, as centrais sindicais
nunca foram classificadas de “representantes da sociedade civil”, mas sim
como “entidades sindicais”. Com isso, o conceito ganhou conotação que se
poderia dizer “elitista”: OAB, ABI, UNE; algumas organizações que
surgiram durante o período pré-constituinte e que atuaram de 1986 a 1988;
organizações que espelham o movimento feminista. E algumas que
traduzem a reivindicação afro-brasileira. (FERREIRA, 1994, p. 3)
Hoje, no entanto, o debate está centrado no tipo de representação
exercida pelas organizações da sociedade civil e nos argumentos de legitimidade
que buscam fundamentar tal representação. A fim de sistematizar os debates
acadêmicos recentes sobre essa temática, esta Seção revisa um estudo de
Leonardo Avritzer publicado em 2007, qual seja: “Sociedade Civil, Instituições
Participativas e Representação: da autorização à legitimidade da ação”.
O autor discute, em um primeiro momento, a diferença entre a
representação da sociedade civil e a representação tradicional (i.e., no Parlamento),
tendo
em
vista
que
a
primeira
não
conta
com
autorização
expressa
23
(dos representados) nem com monopólio territorial5. Em linhas gerais, Avritzer
(2007) apresenta um reexame dos fundamentos do debate sobre representação e
propõe um conceito de representação relacional, dissociando representação e
autorização e descrevendo a representação como um vínculo simultâneo entre
atores sociais, temas e fóruns capazes de agregar tais atores. A partir de uma
distinção entre formas de representação, sistematizada no Quadro 1, a seguir, o
autor defende o conceito de representação por afinidade, a qual é legitimada e
autorizada pelos demais atores que atuam da mesma maneira que o representante,
isto é, a legitimação se dá pela relação com o tema (ao contrário da representação
eleitoral).
QUADRO 1 – Formas de Representação na Política Contemporânea
Tipo de
Representação
Eleitoral
Advocacia
Representação da
sociedade civil
Relação com o
Representado
Autorização por meio
do voto
Identificação com a
condição
Autorização dos atores
com experiência no
tema
Forma de
Legitimidade da
Representação
Pelo processo
Pela finalidade
Pela finalidade e pelo
processo
Sentido da
Representação
Representação de
pessoas
Representação de
discursos e ideias
Representação de
temas e
experiências
Fonte: Avritzer (2007).
O primeiro ponto do estudo refere-se à elaboração de um conceito que
abarque a representação eleitoral e a extraeleitoral (ou não eleitoral), categorizandose, neste último tipo, as diversas formas de advocacia e de participação exercidas
pela sociedade civil. Nesse sentido, Avritzer aponta que o conceito de soberania
precisa ser reinterpretado a fim de se assumir que a representação atualmente
opera numa lógica de múltiplas soberanias. Em relação à autorização, o autor
categoriza três papéis políticos no que diz respeito à representação – agente,
advogado e partícipe –, estando cada um relacionado a um tipo diverso de
autorização:
Em todos os três casos, há o elemento do “agir no lugar de”, tão ressaltado
por Hanna Pitkin. O importante é, no entanto, perceber que o “agir no lugar
de” varia de perspectiva e pode ser justificado de diferentes maneiras.
5
No que tange à soberania, há, na realidade, uma superposição de competências entre órgãos
governamentais e instituições híbridas.
24
No caso do agente escolhido pelo processo eleitoral – o caso clássico de
representação –, ele não precisa ser discutido em detalhes neste artigo
(Pitkin, 1967). Mas as mudanças recentes são essenciais nos dois últimos
casos, e vale a pena discutir a sua legitimidade. (AVRITZER, 2007, p. 456)
O que o autor chama de “advocacia de causas coletivas” refere-se a
uma advocacia de interesse público que engloba o papel de advocacy propriamente
dita, no sentido de pressão e articulação política, e a advocacia judicial estratégica,
realizada por organizações da sociedade civil com base na defesa de direitos
coletivos e difusos. Essa “advocacia de temas”, também denominada de selfauthorized representation, prescinde da escolha ou de qualquer tipo de autorização,
existindo, na realidade, uma afinidade ou identificação com a situação vivida por um
grupo de indivíduos, como no caso da Anistia Internacional e do Greenpeace:
Na melhor das hipóteses, o que se pode presumir é que, em condições
abertas de troca de informações, os atores envolvidos teriam posições
diferentes em relação a seus próprios direitos, o que, de toda maneira, é
apenas uma suposição. Nesse sentido, o elemento central da advocacia de
temas não é a autorização, e sim uma relação variável no seu conteúdo
entre os atores e os seus representantes. Se voltarmos a Cícero e sua
descrição do papel do procurador, percebemos que a identificação com a
causa se tornou mais importante que a autorização explícita para
representá-la. (AVRITZER, 2007, p. 457)
Quanto à representação da sociedade civil, trata-se do caso dos
conselhos gestores, no qual, embora haja eleições para escolha desses
representantes, o “eleitorado” pode incluir ou não todas as organizações ligadas ao
tema ou mesmo não estar organizado em associações, possuindo características
muito específicas de acordo com o espaço participativo em discussão. Enquanto a
advocacia de interesse público pode ser tida como uma representação quase
coletiva, a representação da sociedade civil é uma forma coletiva não
institucionalizada de ação que gera representação:
Este último [tipo de representação] não possui as características da
igualdade matemática da soberania, tão cara à ideia de representação
eleitoral, e não possui o elemento monopolista territorial na medida em que
partilha a capacidade de decisão com outras instituições presentes no
território. O importante em relação a essa forma de representação é que
ela tem sua origem em uma escolha entre atores da sociedade civil,
decidida frequentemente no interior de associações civis. Estas exercem o
papel de criar afinidades intermediárias, isso é, elas agregam
solidariedades e interesses parciais (Warren, 2001). Ao agregarem estes
interesses, elas propiciam uma forma de representação por escolha que
não é uma representação eleitoral de indivíduos ou pessoas. A diferença
entre a representação por afinidade e a eleitoral é que a primeira se
legitima em uma identidade ou solidariedade parcial exercida
anteriormente. (AVRITZER, 2007, p. 457-458)
25
Não se trata certamente de três tipos independentes de representação,
mas de aspectos da representação que mantêm uma relação de legitimação e
complementaridade
entre
si.
A
eleição
decide
a
maneira
como
órgãos
governamentais se relacionarão com a advocacia e a representação da sociedade
civil, mas ações estatais no sentido de ignorar as formas não eleitorais de
representação que têm por nascedouro a sociedade civil dificultam ou impedem a
implementação da agenda política pelos governantes eleitos. Como aponta Avritzer
(2007, p. 459), “[o] futuro da representação eleitoral parece cada vez mais ligado à
sua combinação com as formas de representação que têm sua origem na
participação da sociedade civil”.
2.4
Pluralização da Representação e Fundamentos da Legitimidade
A noção de representação relacional, ou por afinidade, desenvolvida por
Avritzer (2007) delimita de maneira bastante favorável a fundamentação teórica
acerca da legitimidade da participação. Alguns desafios, contudo, persistem e a
literatura política, conforme anteriormente discutido, ainda não se debruçou sobre
esse tema. Dentre os recentes estudos acerca da pluralização da representação da
sociedade civil e os desafios relacionados à legitimidade e à representatividade das
organizações civis, esta Seção aborda três artigos publicados por Adrián Gurza
Lavalle e Graziela Castello (sendo os dois primeiros publicados em conjunto com
Peter P. Houtzager), a saber: “Democracia, Pluralização da Representação e
Sociedade Civil” (2006a), “Representação Política e Organizações Civis: novas
instâncias de mediação e os desafios da legitimidade” (2006b) e “Sociedade Civil,
Representação e a Dupla Face da Accountability: Cidade do México e São Paulo”
(2008).
O primeiro artigo trata da representação virtual, ideia fundamentada em
Burke (1774)6 e debatida por Avritzer (2007) no estudo apresentado na Seção
anterior. Em linhas gerais, os autores defendem que o melhor mecanismo para
garantir a representatividade é a existência de um compromisso representativo
genuíno, que não se confunde com os dispositivos institucionais formais.
6
BURKE, Edmund. (1774), Speech to the Electors of Bristol at the Conclusion of the Poll. Disponível
em: <http://www.ourcivilisation.com/smartboard/shop/burkee/extracts/chap4.htm>. Acesso em:
20 jan. 2010.
26
Avritzer (2007), ao elaborar a noção de representação por afinidade, descarta a
contribuição de Lavalle et al. (2006a), em especial pelo fato de a teorização traçada
por Burke focar principalmente a representação não eleitoral dos reis europeus.
Conforme conclui Avritzer:
A questão, no entanto, é que, na ânsia de legitimar uma forma de
representação pós-eleitoral, Gurza Lavalle, Houtzager e Castello acabam
resgatando um argumento pela legitimidade da representação pré-eleitoral.
Ao proceder assim, eles jogam fora a criança junto com a água do banho,
não conseguindo propor um conceito de representação que vá além da
autorização via eleição. (AVRITZER, 2007, p. 451)
Como salientado, opta-se, na presente pesquisa, por adotar o conceito
de Avritzer (2007) quanto à representação por afinidade, recuperando-se as
pesquisas empíricas realizadas por Lavalle et al. (2006b) e Lavalle e Castello (2008)
quanto aos argumentos de legitimidade das organizações da sociedade civil.
Com base em survey realizado com entidades da cidade de São Paulo e/ou da
Cidade do México, os dois últimos artigos mencionados compõem estudo sobre as
funções da representação política na perspectiva de inovação democrática,
impactando diretamente na reconfiguração da representação. Tais pesquisas
abordam ainda a conexão entre as novas formas de representação política e os
mecanismos de accountability a elas associados (LAVALLE; CASTELLO, 2008).
Lavalle et al. (2006b) sistematiza três grupos de variáveis relacionadas
com as atividades de representação exercidas pelas organizações pesquisadas,
quais sejam: (i) apoiar candidatos políticos; (ii) possuir título de utilidade pública; e
(iii) realizar atividades de mobilização e reivindicação perante programas, órgãos ou
instâncias do governo7. A seguir, destaca-se a relevância dessas pesquisas, que
consiste na categorização empreendida por Lavalle et al. (2006b) quanto aos
argumentos de legitimidade, os quais são posteriormente retomados e mais bem
explicitados em Lavalle e Castello (2008).
Enquanto Lavalle et al. (2006b) analisam exclusivamente entidades da
cidade de São Paulo com compromissos de representação e averiguam quais são
os argumentos de legitimidade utilizados pelas organizações pesquisadas, Lavalle e
Castello (2008), utilizando-se também da mesma base teórica, abordam a dupla face
7
Lavalle e Castello (2008) não replicam semelhante análise para o estudo dos dados coletados em
relação à Cidade do México. Essas variáveis não foram foco de análise do presente trabalho,
tendo em vista que centram nas atividades de representação, e não no argumento de legitimação.
27
da accountability societal com base na primeira pesquisa sobre São Paulo e na
adição de dados de uma survey realizada na Cidade do México.
Nas
duas
pesquisas
mencionadas,
destaca-se
que
73%
das
organizações na cidade de São Paulo se consideram “representantes da sociedade
civil organizada”, no conceito de representação presuntiva adotado pelos autores
(i.e., os conselheiros presumem-se representantes), ao passo que, na Cidade do
México, somente 58% das organizações entrevistadas se assumem como
representantes. Nesse universo, os motivos pelos quais tais organizações se sentem
representantes foram sistematizados em seis argumentos de legitimidade, a saber:
Argumento eleitoral: as organizações defendem que mecanismos
de eleição de suas lideranças ou diretoria fundamentam sua
representatividade.
Tal
argumento
se
atenta
mais
ao
procedimento formal (eleição) do que efetivamente à legitimidade
da representação;
Argumento de identidade: as organizações apresentam a
coincidência
de
identidade
com
seus
representantes,
considerando, em geral, atributos pessoais, como gênero, raça e
orientação sexual;
Argumento de filiação: as organizações alegam que foram criadas
especificamente com o objetivo de representar os indivíduos
presentes no ato de sua criação;
Argumento de serviços: as organizações argumentam que
oferecem benefícios aos seus representados, como tratamentos
médicos, distribuição de bolsas e cestas básicas e realização de
cursos profissionalizantes;
Argumento de proximidade: as organizações afirmam que
implementam uma relação horizontal com seus representados a
fim de exercer ações de empoderamento, emancipação e
protagonismo e, assim, estimular sua participação direta na
dinâmica dos trabalhos da entidade; e
Argumento de intermediação: as organizações declaram que
exercem o papel de intermediárias entre os representados e os
28
espaços de representação (em geral, o poder público), nos quais
se reivindica a efetivação de direitos (e não favores ou serviços
beneméritos).
Dentre os argumentos apresentados, os três primeiros (i.e., filiação,
identidade e eleições) são frequentes nas pesquisas relacionadas a teorias
tradicionais da representação, mas tiveram pouca ocorrência na população
pesquisada.
Já os
argumentos
seguintes
(i.e., intermediação,
serviços
e
proximidade) têm relação com a representação presuntiva e, em alguns casos,
podem não ser compatíveis com o padrão democrático.
Cabe ainda tecer algumas considerações acerca dos argumentos de
legitimidade apresentados.
O argumento eleitoral tem fundamento no modelo de representação
política tradicional e, no caso da sociedade civil organizada, certamente goza dos
mesmos déficits e limitações já apontadas pela literatura política quanto à
representatividade.
O argumento de filiação tem maior ocorrência entre entidades de
coordenação e fundamenta-se na relação estabelecida entre os representantes e os
representados (tal como ocorre nos sindicatos).
O argumento de identidade, embora tenha sido utilizado de forma
minoritária, vem gozando de maior debate público e conta com poucos mecanismos
de accountability, responsividade e sanção, sendo tais mecanismos atributos
inerentes a uma lógica democrática (não obstante, no âmbito da sociedade civil, a
representação por argumento de identidade possa ser extremamente positiva na
correção da representação política na gestão das políticas públicas).
O argumento de serviços se afasta de maneira radical das exigências
democráticas, tendo em vista que se estabelece uma lógica de distribuição de
serviços pelo representante, sem o estabelecimento de quaisquer mecanismos de
controle ou de sanção. Cabe destacar que esse argumento é o mais recorrente entre
entidades assistenciais tanto no Brasil quanto no México, possivelmente em razão
do histórico de surgimento da política de assistência social, com prestação de
serviços assistencialistas à população carente.
29
O argumento de proximidade traz a ideia do empoderamento e a
possibilidade de que os representados se expressem diretamente, viabilizando
alguns mecanismos de accountability e tendo grande relação com a luta contra o
autoritarismo e com a atuação da Igreja Católica no âmbito da sociedade civil
(em especial a ação desenvolvida pelas pastorais nas áreas urbana e rural).
O argumento da intermediação desloca o fundamento do representado
para o espaço de representação e traz novos elementos ao debate das teorias da
representação.
É
de
se
ressaltar
o
foco
no
Estado
e,
em
especial,
no estabelecimento de mecanismos de intermediação entre os interesses dos
representantes e o poder público, ainda que inexista uma relação direta com o
público a ser representado. A intermediação foi utilizada como fundamento de
legitimidade em todos os tipos de organizações pesquisadas em São Paulo – ONGs,
entidades assistenciais, associações de base e entidades de coordenação –, sem
grande variação entre elas. Esse argumento tem relação com a advocacia de
interesse
público
apresentada
por
Avritzer
(2007),
tratando-se
de
uma
representação sem mandato expresso (portanto, sem autorização) estabelecida por
afinidade de temas. Os desafios relacionados aos mecanismos de controle e sanção
são semelhantes àqueles apresentados em debates atuais sobre a accountability
das organizações não governamentais.
Lavalle e Castello (2008) discutem ainda os mecanismos de controle
(cf. Seção 2.5). Se a accountability tem relação com a prestação de contas e com a
possibilidade de sanção, deve-se problematizar a quem as organizações que
representam a sociedade civil nos espaços de participação prestam contas, a fim de
avaliar a qualidade dessa representação:
Nesse sentido, modalidades de controle societal, nas quais se encontram
organizações civis que representam interesses, espaços de interlocução
institucionalizados e faculdades decisórias com caráter vinculante, revelamse altamente exigentes em um duplo sentido. Por um lado, satisfazem as
expectativas mais elevadas do ideário da democracia participativa, cujos
expoentes acusam frequentemente as insuficiências e distorções que
nesses espaços minam a “participação” e obstaculizam tentativas
autênticas de “partilhar o poder” – segundo a influente formulação de
Dagnino (2002). Mas, por outro lado, impõem exigências a respeito da
representatividade, responsividade e sanção dos que falam em nome dos
demais, suscitando a velha questão do controle dos controladores.
(LAVALLE; CASTELLO, 2008, p. 68)
30
Na análise apresentada no Capítulo 4, busca-se não apenas descrever a
categorização dos argumentos de legitimidade abordados pelas organizações,
mas também identificar como se verifica a lógica da representação, tendo em vista
que
os
atores
se
apresentam
em
instituições
híbridas
tanto
como
autorrepresentantes quanto como defensores dos interesses de uma categoria mais
ampla e etérea, qual seja: a sociedade civil organizada. Portanto, essa
representação tem que ser legítima não somente frente ao Estado, mas também
frente aos representados.
2.5
Desafios da Representatividade e da Legitimidade
De maneira geral, verifica-se, na composição dos conselhos, uma
participação coletiva, isto é, a autoapresentação das organizações agregada a uma
forma de representação coletiva, envolvendo organizações escolhidas para
representarem outros grupos sociais. Essa representação pretensamente tem por
fundamento a legitimidade dessas organizações em defender determinadas causas
sociais, sendo, em geral, um mandato livre na perspectiva de representação de
interesses gerais (LÜCHMANN, 2005; 2007).
Se muitos conselheiros, conforme apontam pesquisas realizadas nos
conselhos do Nordeste, ainda fundamentam sua representatividade nos processos
eleitorais pelos quais chegaram ao poder (FARIA, 2007; ALMEIDA, CUNHA, 2009a),
as condições em que tais procedimentos ocorrem precisam ser repensadas com
vistas à democratização e diversificação, permitindo que diferentes organizações
possam disputar as vagas de representantes nos conselhos. Para além da
caracterização teórica da representação da sociedade civil, os dois desafios
apontados de forma mais enfática têm sido
“1) como lidar com a ausência de mecanismos formais de autorização que
garantam a igualdade política e consentimento de todos os cidadãos? e 2)
quais são as possibilidades de accountability política desses mecanismos?”
(ALMEIDA; CUNHA, 2009a)
Destarte, a legitimidade da representação tem relação direta com a
participação ativa dos demais grupos organizados, no que tange à mobilização nos
procedimentos relativos à autorização e à prestação de contas. Assim, torna-se
31
possível e viável que a representação da sociedade civil seja precedida de um
debate público e de avaliações das ações adotadas:
[A] qualidade e a legitimidade da representação vão depender do grau de
articulação e organização da sociedade civil, ou seja, da participação.
Os fóruns de discussão de políticas públicas e de definição e escolha dos
representantes, no caso dos conselhos, ou as assembleias regionais e
temáticas, no caso do orçamento participativo, podem ser exemplos de
espaços públicos que promovem esta conexão entre representantes e
representados. (LÜCHMANN, 2007, p. 166)
A efetividade dos espaços participativos tem, em linhas gerais, relação
direta com a maior representatividade dos atores sociais envolvidos: a partilha do
poder entre Estado e sociedade civil é diretamente proporcional à maior
representatividade e legitimidade das organizações envolvidas (DAGNINO, 2002).
Ressalta-se, contudo, que a noção de representatividade de movimentos de massa,
como o MST, e de experiências participativas, como o OP, distam da conotação que
o termo possui em referência a ONGs e conselhos gestores.
No caso das ONGs, a representatividade parece ter relação direta com
determinado saber técnico ou tipo de competência que advém de determinado
conhecimento relativo a um tema específico ou segmento social, seja por relação
atual ou anterior. Como demonstrado nas pesquisas de Lavalle et al. (2006b) e
Lavalle e Castello (2008), tais organizações se veem como representantes da
sociedade civil por expressarem interesses difusos na sociedade e intermediarem
essa relação entre as demandas e seus destinatários (em regra, o poder público):
O segundo problema suscitado pelas ONGs é o da representação. Elas
não fundamentam sua legitimidade na representação numérica dos
cidadãos, mas no ethos moral e no valor intrínseco das causas que
defendem. Contudo, à medida que algumas ONGs ou outras organizações
da "sociedade civil" passam a se autoproclamar a expressão da “sociedade
civil organizada", reproduzem todos os erros e os defeitos das antigas
organizações vanguardistas. Essa visão supõe que preexiste uma
"sociedade civil" desorganizada, homogênea e naturalmente virtuosa e que
falta, somente, dar-lhe voz. Mas as contradições da sociedade se
reproduzem no nível das ONGs. Por que critério uma ONG seria mais
representativa que outra? Qual é o fundamento da legitimidade de uma
ONG e não de outra para “representar” uma “causa” em foros
internacionais? (SÖRJ, 2004, p. 80)
Dagnino (2002; 2004) entende que esse deslocamento do sentido de
representatividade, além de não ser ingênuo por servir ao projeto político neoliberal
(conforme anteriormente exposto), é fomentado pelos governos e pelas agências
internacionais, evitando o diálogo direto com os movimentos sociais, talvez por um
32
receio de politização. Esse contexto, por sua vez, fortalece a identificação entre
ONGs e sociedade civil, ou entre sociedade civil e terceiro setor. Retomando o que
foi exposto na primeira Seção deste Capítulo, o afastamento entre as ONGs e os
movimentos sociais, ou mesmo entre as ONGs e o seu público-alvo, cria uma
situação de prestação de contas e responsividade somente para com os
financiadores, sem qualquer accountability frente à sociedade civil da qual essas
organizações se dizem porta-vozes.
Também chamando a atenção para essa nova compreensão da
representação política, Sörj e Martituccelli (2008) distinguem um traço primordial na
atuação das ONGs contemporâneas se comparadas com as organizações
filantrópicas tradicionais, a Igreja, os partidos revolucionários e mesmo ONGs como
a Cruz Vermelha: a pretensão da representatividade. Trata-se daquilo que os
autores chamam de representação sem delegação, ou de autodelegação sem
representação (no sentido clássico):
O principal ator da sociedade civil contemporânea são as ONGs. O que são
as ONGs? As associações da sociedade civil (clubes culturais e esportivos,
organizações profissionais e científicas, grupos maçônicos, instituições
filantrópicas, igrejas, sindicatos, etc.) existiram ao longo do século XX.
Essas organizações representaram diretamente (ou pelo menos se
esperava que representassem) um público determinado, sendo que as
ONGs contemporâneas afirmam sua legitimidade na base da força moral
de seus argumentos e não por sua representatividade. Trata-se então de
algo novo, de um conjunto de organizações que promovem causas sociais
sem receber o mandato das pessoas que dizem representar.
(SÖRJ; MARTITUCCELLI, 2008, p. 131 – grifos como no original)
Na linha dos estudos de Avritzer (2007), verifica-se que o fundamento da
representação da sociedade civil organizada se dá por critérios alheios ao conceito
tradicional de representação. Trata-se, certamente, da defesa de causas de
interesse público em relação às quais, supostamente, os demais atores sociais
também gozam da mesma posição política. Sörj (2004) aponta a impossibilidade de
representação da sociedade civil dada sua própria constituição:
O uso do conceito de “sociedade civil” tal como praticado por alguns de
seus autoproclamados representantes é a própria negação do conceito de
espaço público. Se a "sociedade civil" é uma dimensão da esfera pública,
ela não pode ser "representada" por nenhum grupo, o que significaria o
abandono da ideia de uma esfera aberta. A esfera pública é pública pois
constitui espaço de diálogo, de encontro de opiniões diferentes, que
ninguém pode representar e do qual nenhum ator pode se apropriar, já que
estaria destruindo seus próprios fundamentos, homogeneizando uma
realidade cuja existência é a diversidade. (SÖRJ, 2005, p. 72)
33
Retomando Habermas, o que Sörj (2005) destaca é a dificuldade de se
pensar a representação a partir da compreensão da esfera pública como uma
estrutura comunicativa do agir orientado para o entendimento. Por outro lado,
a criação de espaços de deliberação política e a possibilidade de tematização de
novas questões possibilitam a constituição de uma esfera pública na qual estejam
presentes os anseios emancipatórios da sociedade civil (MORAES, 2006).
Por conseguinte, tem-se que os procedimentos que definem a forma de participação
da sociedade civil organizada nas instituições híbridas devem, necessariamente, ser
pensados a partir de mecanismos democráticos, tomando-se o cuidado de
problematizar o grau de representação, representatividade e, sobretudo, legitimidade
das organizações escolhidas:
Além da qualificação técnica, a qualificação política da representação da
sociedade civil envolve um aprendizado crucial nestes novos espaços que
trazem, como parte da sua novidade, a convivência direta com uma
multiplicidade de atores portadores de concepções e interesses diversos.
Essa diversidade é acentuada no caso de espaços de deliberação de
políticas como os Conselhos Gestores, mas está presente mesmo nos
espaços relativamente mais homogêneos (ou dos quais se esperaria uma
maior homogeneidade) como o Fórum Nacional da Reforma Urbana
(FNRU), o CCMD ou o MST e seus simpatizantes. O reconhecimento da
pluralidade e da legitimidade dos interlocutores é requisito não apenas da
convivência democrática, em geral, mas especialmente dos espaços
públicos, enquanto espaços de conflito que têm a argumentação, a
negociação, as alianças e a produção de consensos possíveis como seus
procedimentos fundamentais. (DAGNINO, 2002, p. 285)
Assim sendo, a representação no interior das experiências de
participação tem possibilitado atender às exigências democráticas da pluralidade,
mesmo
que,
em
alguns
casos,
se
permita
a
composição
por
grupos
antidemocráticos, exatamente em razão de o direito à participação nas decisões
políticas ser de extrema relevância para as teorias da democracia participativa.
Consoante salienta Raichelis (1998), o modelo dos conselhos gestores ainda está
em construção e hoje se configura como um acúmulo histórico de experiências.
Ainda que não seja o modelo definitivo, trata-se de um processo em constante
avaliação, no qual ainda estão sendo ponderados os custos da participação e quais
os limites e possibilidades que cada experiência local vem demonstrando
(TEIXEIRA; TATAGIBA, 2007).
34
3 METODOLOGIA
3.1
Natureza da Pesquisa e Coleta de Dados
Este trabalho, de natureza descritiva e qualitativa, consiste em um
estudo de caso referente à representação da sociedade civil organizada nas
instituições participativas. A fim de apurar a institucionalização da participação da
sociedade civil e o modo como têm-se dado os processos de escolha de
organizações, optou-se por delimitar duas fontes de dados complementares,
a saber: (i) legislação específica aplicável, incluindo resoluções e normas emanadas
pelo próprio Conselho em referência ao procedimento eleitoral; e (ii) atas dos
espaços de escolha das entidades a integrar o Conselho como representantes da
sociedade civil organizada. O conceito de legislação aqui adotado abrange a lei
criadora do Conselho, bem como os respectivos decretos, regimentos internos e
resoluções do Conselho que tratem da matéria.
O primeiro passo foi o contato, em Minas Gerais, com os Conselhos
Estaduais que estão relacionados com a gestão de políticas públicas e integram um
sistema nacional específico já consolidado, quais sejam: assistência social, criança e
adolescente, e saúde8. O recorte se deu em conselhos estaduais a fim de analisar
instituições que têm maior autonomia e impacto na gestão das políticas, tendo em
vista que os conselhos municipais podem adotar determinado formato de atuação
em face de características locais específicas. Não foram bem-sucedidos os pedidos
de dados junto ao Conselho Estadual de Saúde e ao Conselho Estadual de Defesa
dos Direitos da Criança e do Adolescente, os quais não responderam à solicitação
em tempo hábil que possibilitasse a realização da pesquisa. O Conselho Estadual de
Assistência Social (CEAS) aceitou apoiar esta pesquisa e forneceu todas as atas,
normativas e dados solicitados.
Em seguida, foi realizada a análise da legislação específica aplicável ao
CEAS. Buscou-se apurar a regulação legal da participação e analisar como ela é
prevista, objetivando-se ainda um maior conhecimento do funcionamento do
Conselho. A pesquisa se deu a partir dos portais legislativos disponibilizados nos
8
Os conselhos do meio ambiente e das cidades não foram consultados por ainda não estarem
consolidados em um sistema nacional com um fundo específico.
35
sítios eletrônicos do próprio Conselho, da Secretaria de Estado de Desenvolvimento
Social de Minas Gerais (à qual o Conselho está vinculado) e da Assembleia
Legislativa de Minas Gerais. Para tal pesquisa, foram inseridos como parâmetros de
busca o nome completo e a sigla do Conselho Estadual.
No início de novembro de 2009, foi formalizada a solicitação do acesso
às atas, a qual foi dirigida à presidência e à secretaria executiva do Conselho
Estadual, garantindo-se o sigilo das informações que fossem sensíveis e que
pudessem gerar implicações para a política de assistência social. A secretaria
executiva, com autorização da presidência, disponibilizou farto material para
consulta e extração de cópias, incluindo todas as atas de reuniões do Conselho
desde sua fundação. Foram selecionadas as atas relativas aos processos eleitorais,
haja vista a previsão na própria lei do CEAS de registro em atas específicas, e as
normas e resoluções relativas aos fóruns de escolha dos representantes, sendo
extraídas cópias de todo o material relevante. Considerando-se que podem ter
ocorrido alterações no processo eleitoral desde a fundação do Conselho Estadual,
foram analisados todos os documentos acerca do procedimento eleitoral, buscandose verificar quais os mecanismos de escolha adotados em cada novo mandato.
3.2
Metodologia de Análise
A metodologia de análise dos dados deste estudo buscou:
1. investigar, a partir da análise da legislação e das atas, qual(is)
fator(es) fundamenta(m) e legitima(m) a atuação de determinados
atores sociais junto ao conselho gestor da área da assistência
social em Minas Gerais;
2. analisar como funciona o mecanismo de escolha dos conselheiros
não governamentais no Conselho Estadual de Assistência Social
(CEAS) de Minas Gerais; e
3. identificar, a partir do estudo de caso, a existência de discussões e
debates acerca da natureza e legitimidade do mandato dos
conselheiros não governamentais.
36
A análise dos dados coletados partiu da metodologia qualitativa de
análise de conteúdo, considerando-se a presença ou ausência de determinada
característica na legislação e atas. De acordo com CaregnatoI e Mutti (1996),
a análise de conteúdo pode ser realizada por meio do método de dedução
frequencial ou análise por categorias temáticas: enquanto a primeira consiste na
quantificação da ocorrência repetitiva de uma mesma palavra, a segunda, realizada
no presente estudo, envolve o desmembramento do texto em unidades e a
classificação dessas unidades em categorias comuns. Referida categorização
baseou-se na revisão da literatura apresentada, sobretudo nos fundamentos de
legitimidade evidenciados por Avritzer (2007), Lavalle et al. (2006b) e Lavalle e
Castello (2008).
A forma de escolha dos representantes da sociedade civil nos conselhos
gestores obedece a certa regulamentação legal, seja de forma taxativa –
a legislação indica quais organizações e movimentos estarão representados no
Conselho – ou de forma procedimental – a legislação indica como se dará tal
escolha. A análise da legislação específica aplicável ao CEAS consistiu na primeira
etapa da coleta de dados. Buscou-se, por um lado, constatar a previsão legal de tal
participação e analisar como ela é prevista e, por outro, verificar se a participação
prevista corresponde à prática efetiva do Conselho.
Considerando-se a dinâmica e forma de funcionamento dos conselhos
gestores, os processos de escolha dos representantes da sociedade civil costumam
ocorrer em reuniões ou fóruns, com algum nível de formalização coordenado pelo
próprio conselho ou pelo órgão gestor. Por essa razão, foram analisadas as atas das
reuniões que formataram a composição do Conselho Estadual de Assistência Social
(CEAS) desde a sua formação.
4 ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS DADOS
4.1
O Conselho Estadual de Assistência Social de Minas Gerais
A participação da sociedade civil na gestão da política de assistência
social foi prevista na Constituição Federal, em seu art. 204, inc. II. A Lei Orgânica da
37
Assistência Social (LOAS) repete o dispositivo constitucional, fixando como diretriz a
“participação da população, por meio de organizações representativas, na
formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis” (art. 5º, II, Lei
nº 8.742/1991). Assim, em grande parte dos dispositivos da LOAS, estão previstas a
participação e a deliberação pelos conselhos gestores no respectivo nível federativo
(municipal, estadual ou federal).
O art. 16 da LOAS estabelece os conselhos como instâncias
deliberativas do sistema descentralizado e participativo de assistência social, sendo
instituições de caráter permanente e composição paritária entre governo e
sociedade civil. Além disso, a própria lei estabelece como condições para os
repasses de recursos para os demais entes federados: (i) funcionamento de
conselho de assistência social, de composição paritária; (ii) instituição de fundo de
assistência social, com orientação e controle dos respectivos conselhos de
assistência social; e (iii) implementação de plano de assistência social, sendo que os
conselhos e fundos devem estar em pleno funcionamento.
Em Minas Gerais, a Lei Estadual nº 12.262/1996 estatuiu a política
estadual de assistência social e criou o Conselho Estadual de Assistência Social
(CEAS), seguindo moldes semelhantes àquele estabelecido pelo art. 16 da LOAS.
Dentre as competências do CEAS, destaca-se a aprovação da política estadual de
assistência social e do Plano Estadual de Assistência Social, bem como a
convocação da Conferência Estadual de Assistência Social, conforme estabelecido
pelo art. 13 da referida lei estadual. Também competem ao CEAS: a normatização e
regulação das ações e serviços, públicos e privados, da assistência social; o registro
das entidades de âmbito intermunicipal; e o acompanhamento, avaliação e
fiscalização dos serviços de assistência social, em especial quanto ao acesso da
população a esses serviços. Em se tratando da gestão dos recursos dessa área, a
Lei atribui ao CEAS a aprovação e fiscalização do orçamento, da transferência de
recursos, da celebração de convênios, assim como o gerenciamento do Fundo
Estadual de Assistência Social (FEAS). O Regimento Interno resume tais atribuições
ao definir o CEAS como “órgão deliberativo, controlador, normativo, consultivo, de
caráter permanente, com participação paritária entre Governo e Sociedade Civil”.9
9
Considerando-se o recorte proposto, este trabalho não busca detalhar as competências legais do
CEAS nem mesmo as atribuições atinentes ao Conselho relativas à implementação e à gestão do
38
A normativa estadual estabelece que o CEAS é composto de 20
membros, dos quais 10 são representantes de órgãos governamentais e os demais
são
representantes
de
entidades
não
governamentais.
A
representação
governamental é dividida entre sete representantes de Secretarias Estaduais,
um representante dos Secretários Municipais e dois representantes governamentais
dos Conselhos Municipais de Assistência Social. A própria Lei Estadual
nº 12.262/1996 divide a representação não governamental em segmentos, sendo:
a) 2 (dois) de entidades de usuários da assistência social, de âmbito
estadual;
b) 2 (dois) de entidades de defesa dos direitos de beneficiários da
assistência social, de âmbito estadual;
c) 1 (um) de entidades representativas das instituições filantrópicas
prestadoras de serviços de assistência social, de âmbito estadual;
d) 1 (um) de entidades representativas das instituições privadas não
filantrópicas prestadoras de serviços na área de assistência social, de
âmbito estadual;
e) 2 (dois) de entidade representativa de trabalhadores na área de
assistência social, de âmbito estadual;
f) 2 (dois) representantes não governamentais dos conselhos municipais
de assistência social.
Esses representantes são eleitos em fórum próprio, com registro em ata
específica, conforme disposto na própria lei. O Decreto Estadual nº 43613/2003,
que dispõe sobre a composição de Conselhos de Políticas Públicas do Estado de
Minas Gerais, manteve a mesma divisão dos segmentos feita pela lei criadora do
CEAS, o que também é repetido no regimento interno do Conselho.
4.2 O Processo de Escolha dos Representantes da Sociedade Civil
Conforme disposto na Seção anterior, os instrumentos normativos
relacionados ao CEAS regulam de maneira ampla a composição do Conselho e
determinam que a escolha dos representantes da sociedade civil deve se dar por
eleição realizada em fórum próprio e registrada em ata específica. Esse mecanismo
é reiterado pelo Regimento Interno quando prevê, em seu art. 6º, o funcionamento
da suplência, em caso de vacância, faltas, ausências ou impedimentos, bem como
reiteradas faltas injustificadas. A substituição do representante, regida também por
Sistema Único da Assistência Social (SUAS). Com foco na gestão da política da assistência social,
a análise aqui empreendida se restringe ao processo de escolha das organizações da sociedade
civil para composição do Conselho Estadual de Assistência Social de Minas Gerais.
39
esse dispositivo, pode ocorrer mediante nova indicação do órgão governamental ou,
no caso da sociedade civil, mediante nova eleição pela respectiva categoria.
Dados
esses
procedimentos,
foram
analisados
os
documentos
referentes ao processo eleitoral de escolha dos representantes da sociedade civil no
CEAS, em especial os regulamentos eleitorais. Além disso, foram verificadas as
atas, resoluções e publicações na Imprensa Oficial que apresentam e regulam a
sistemática de escolha, desde a fundação do Conselho, para os mandatos
1997/1999, 1999/2001, 2001/2003, 2003/2005, 2005/2007, 2007/2009 e 2009/2011.
O processo de escolha, organizado de forma eleitoral, foi detalhado pela
Resolução nº 007/1996, a qual prevê que as entidades, para participarem como
eleitoras, devem se cadastrar munidas da documentação exigida. Cada processo
eleitoral definiu quais documentos eram exigíveis: por exemplo, enquanto o primeiro
e quarto processos eleitorais exigiram documentação semelhante àquela requerida
para registro da entidade no CEAS, o segundo e terceiro exigiram somente dois
atestados de funcionamento fornecidos por Conselhos Municipais de Assistência
Social (CMAS), o que demonstra a regularidade da entidade e sua atuação em mais
de um município. Em algumas atas analisadas, verificou-se que os conselheiros
eleitos consideraram a documentação exigida como um possível fator impeditivo da
participação de um maior número de entidades nos procedimentos eleitorais.
Após a fase de habilitação como eleitoras, as entidades podem se
candidatar a uma das vagas no CEAS, devendo para tanto apresentar pedido de
registro de candidatura no prazo estabelecido pela Resolução. Ressalte-se que o
processo eleitoral escolhe 20 representantes, sendo 10 titulares e 10 suplentes,
e cada organização cadastra-se mediante as categorias estabelecidas pela Lei
Estadual.
As eleições ocorrem durante um dia, sendo que cada entidade tem
direito ao número de votos correspondente à categoria de vagas a ser preenchida.
Cabe destacar que, nos dois primeiros processos eleitorais, as entidades escolhiam
representantes nas seis categorias previstas como representação da sociedade civil;
a partir de 2000, contudo, os representantes não governamentais dos conselhos
municipais passaram a ter votação em separado, sendo realizada em conjunto com
a escolha dos representantes governamentais dos CMAS. Em geral, foram
realizadas palestras no início dos trabalhos no dia da eleição, logo após a explicação
40
do processo eleitoral. Em seguida, cada entidade dispunha de determinado tempo
para sua apresentação e procedia-se ao processo de votação durante todo o dia.
Encerrado o horário predeterminado, iniciava-se imediatamente a apuração e eram
então definidos os eleitos como titulares e suplentes. Somente após a eleição,
a entidade indicava o representante no Conselho, o que atesta que a representação
no Conselho é institucional e não pessoal (sendo vedada ainda a participação de
pessoas que estivessem vinculadas à Comissão Eleitoral).
Foram analisadas as atas dos processos eleitorais, assim como as
primeiras atas de reuniões ordinárias e extraordinárias do Conselho, a fim de
verificar a existência de discussões e deliberações acerca da noção de
representação nas experiências de participação. Em linhas gerais, os debates
registrados nas atas perpassavam a tentativa de identificar fatores e motivos que
limitavam ou impediam a participação de um maior número de organizações nos
processos eleitorais, ressaltando-se um interessante debate acerca da natureza e da
necessidade de parceria com o Serviço Voluntário de Assistência Social
(SERVAS)10.
Chegou a ser instituído, no período de 1997 a 1999, um grupo de
trabalho específico sobre a vacância de representações no Conselho. Os debates
desse grupo se centraram na baixa divulgação do CEAS, na exigência excessiva de
documentos para habilitação das entidades candidatas e eleitoras e também na
fraca articulação da sociedade civil organizada. Esse diagnóstico gerou um segundo
processo eleitoral ainda durante o primeiro mandato, a fim de preencher as vagas
remanescentes de titulares e suplentes. Nesse período, os conselheiros ainda
estavam debatendo a função do CEAS, existindo registros restritos nas atas
analisadas, tais como: “papel do CEAS: estimular, incentivar, definir políticas,
fomentar criação de Conselhos” (cf. ata da terceira reunião ordinária, realizada em
8 de maio de 1997) e “o papel principal do Conselho é apreciar e aprovar propostas
10
O SERVAS é uma associação civil sem fins lucrativos que tem como objetivo promover e executar
ações sociais em Minas Gerais, podendo ser equiparado às organizações assistenciais de
beneficência coordenadas pelas primeiras-damas nas diversas unidades da Federação.
Fundado em 1951 pela então primeira-dama do Estado, Sarah Kubitscheck, para dar apoio à
maternidade e à infância, o SERVAS posteriormente estendeu seu trabalho para a área
educacional. Em 1956, a entidade foi desvinculada do Governo Estadual e, a partir de 1966, passou
a apoiar programas de geração de emprego e renda. Destaca-se que, embora se trate de órgão
não governamental, o SERVAS é presidido pela esposa do Governador ou do Vice-Governador,
ou ainda por pessoa indicada pelo Chefe do Poder Executivo, além de receber recursos estatais
(por determinação de decreto) e de ser fiscalizado pela Auditoria Geral do Estado.
41
que venham do Governo do Estado nesta área” (cf. 12ª plenária ordinária, realizada
em 6 de março de 1998).
A seguir, sistematiza-se a composição do Conselho Estadual de
Assistência Social em relação à representação da sociedade civil organizada desde
a sua criação.
3º
mandato
2001/
2003
2º
mandato
1999/
2001
1º
mandato
1997/
1999
Mandato
Categorias
Conselho
Central da
Sociedade
São Vicente
de Paula
Vaga
Associação
dos
Deficientes do
Oeste de
Minas
Vaga
Federação
dos
Aposentados
e Pensionistas
de Minas
Gerais
Associação
dos
Deficientes
Físicos do
Oeste de
Minas
Associação dos
Deficientes do
Oeste de Minas
Federação das
APAEs
Federação das
APAEs
Vaga
Federação das
Associações
dos Deficientes
de Minas
Gerais
Federação das
APAEs
T
S
T
S
T
S
ENTIDADES DE USUÁRIOS DA
ASSISTÊNCIA SOCIAL
Federação das
Associações de
Moradores de
Minas Gerais
Associação
Nacional de
Gerontologia
Movimento de
Reintegração
das Pessoas
Atingidas pela
Hanseníase
Conferência
Nacional dos
Bispos do Brasil
Conferência
Nacional dos
Bispos do Brasil
Federação das
Associações de
Deficientes de
Minas Gerais
Inspetoria São
João Bosco
Associação
Cristã de Moços
Associação de
Apoio a
Criança e ao
Adolescente
Cáritas
Brasileira
Federação
Brasileira das
Instituições de
Excepcionais, de
Integração Social
e Defesa da
Cidadania
Federação das
Indústrias do
Estado de Minas
Gerais / Serviço
Social da Indústria
Associação
Cristã de Moços
Vaga
Vaga
Vaga
Federação
Brasileira das
Instituições de
Excepcionais, de
Integração Social
e Defesa da
Cidadania
Vaga
Associação Cristã
de Moços
NÃO
FILANTRÓPICAS
Vaga
FILANTRÓPICAS
Centro de
Recuperação e
Reabilitação das
Vítimas do
Álcool e das
Drogas
Federação
das
Associações
de Moradores
de Minas
Gerais
Associação
Nacional de
Gerontologia
Federação
das
Associações
de Moradores
de Minas
Gerais
ENTIDADES DE DEFESA DOS
DIREITOS DE BENEFICIÁRIOS DA
ASSISTÊNCIA SOCIAL
ENTIDADES REPRESENTATIVAS DAS
INSTITUIÇÕES PRIVADAS PRESTADORAS
DE SERVIÇOS
Associação
Microrregional
dos Assistentes
Sociais do
Circuito das
Águas – AMAS
Sindicato dos
Psicólogos
Conselho
Regional de
Serviço Social
Sindicato dos
Trabalhadores
em Instituições
Beneficentes,
Religiosas e
Filantrópicas
Vaga
Sindicato Único
dos
Trabalhadores
da Saúde
Vaga
Vaga
Vaga
Conselho
Regional de
Serviço Social
Vaga
Conselho
Regional de
Serviço Social
ENTIDADES REPRESENTATIVAS DE
TRABALHADORES NA ÁREA DA
ASSISTÊNCIA SOCIAL
42
CMAS
Itajubá
CMAS
Belo
Horizonte
CMAS
João
Monlevade
CMAS
Campo
Belo
CMAS
Curvelo
CMAS
Divinópolis
CMAS
Mariana
CMAS
Betim
CMAS
Contagem
CMAS
Ipatinga
CMAS
Ipatinga
CMAS
Belo
Horizonte
(CMAS)
REPRESENTANTES NÃO
GOVERNAMENTAIS DOS
CONSELHOS MUNICIPAIS
DE ASSISTÊNCIA SOCIAL
QUADRO 2 – Organizações da Sociedade Civil no Conselho Estadual de Assistência Social de Minas Gerais
Conselheiro
6º
mandato
2007/20
09
5º
mandato
2005/20
07
4º
mandato
2003/20
05
Mandato
Categorias
Vaga
Federação das
Associações de
Moradores de
Minas Gerais
S
Instituto dos
Missionários
Sacramentinos de Nossa
Inspetoria São
João Bosco
Federação
dos
Aposentados
e Pensionistas
Associação
Profissionalizante do Menor
de Belo
Horizonte
Associação
dos
Deficientes
Físicos do
Oeste de
Minas
Associação de
Deficientes de
Betim
T
Associação
Jesuíta de
Educação e
Assistência
Centro de
Integração
Empresa Escola
Vaga
Cáritas
Brasileira
Federação
das APAEs
Ação Social
Arquidiocesana
S
Centro de
Integração
Empresa Escola
Serviço Social da
Indústria
Federação
Brasileira das
Instituições de
Excepcionais, de
Integração Social
e Defesa da
Cidadania
Sindicato das
Instituições
Beneficentes,
Religiosas e
Filantrópicas de
Minas Gerais
Serviço Social da
Indústria
Instituto dos
Missionários
Sacramentinos
de Nossa
Senhora
Associação
dos
Deficientes
Físicos do
Oeste de
Minas
Inspetoria São
João Bosco
Serviço Social da
Indústria
Associação
Cristã de Moços
Instituto dos
Missionários
Sacramentinos de Nossa
Senhora
Federação
dos
Aposentados
e Pensionistas
Associação dos
Deficientes
Físicos de Betim
Ação Social
Arquidiocesan
a
Federação dos
Aposentados e
Pensionistas
de Minas
Gerais
União
Brasileira de
Educação e
Ensino
S
T
Federação
Brasileira das
Instituições de
Excepcionais, de
Integração Social
e Defesa da
Cidadania
Inspetoria São
João Bosco
União
Brasileira de
Educação e
Ensino
Cáritas
Brasileira
NÃO
FILANTRÓPICAS
Associação
dos
Deficientes
Físicos do
Oeste de
Minas
FILANTRÓPICAS
Federação das
APAEs
ENTIDADES DE DEFESA DOS
DIREITOS DE BENEFICIÁRIOS DA
ASSISTÊNCIA SOCIAL
T
ENTIDADES DE USUÁRIOS DA
ASSISTÊNCIA SOCIAL
ENTIDADES REPRESENTATIVAS DAS
INSTITUIÇÕES PRIVADAS PRESTADORAS
DE SERVIÇOS
CMAS
Cataguases
Sindicato dos
Psicólogos
Sindicato dos
Psicólogos
Sindicato Único
dos
Trabalhadores
da Saúde
Conselho
Regional de
Serviço Social
Sindicato dos
Trabalhadores
das Instituições
Beneficentes,
Vaga
CMAS
Varginha
CMAS
Belo
Horizonte
CMAS
Três
Marias
CMAS
Três
Marias
CMAS
Sete
Lagoas
CMAS
Timóteo
CMAS
Juiz de
Fora
CMAS
Três
Marias
CMAS
Ipatinga
(CMAS)
CMAS
Contagem
CMAS
Betim
Sindicato Único
dos
Trabalhadores
da Saúde
43
REPRESENTANTES NÃO
GOVERNAMENTAIS DOS
CONSELHOS MUNICIPAIS
DE ASSISTÊNCIA SOCIAL
Sindicato dos
Trabalhadores
em Instituições
Beneficentes,
Religiosas e
Filantrópicas
Sindicato dos
Psicólogos
Conselho
Regional de
Serviço Social
Sindicato Único
dos
Trabalhadores
da Saúde
Conselho
Regional de
Serviço Social
ENTIDADES REPRESENTATIVAS DE
TRABALHADORES NA ÁREA DA
ASSISTÊNCIA SOCIAL
QUADRO 2 – Organizações da Sociedade Civil no Conselho Estadual de Assistência Social de Minas Gerais
Conselheiro
S
T
Movimento das
Donas de Casa
e dos
Consumidores
de Minas
Gerais
Vaga
Associação
Profissionalizante do Menor
de Belo
Horizonte
Federação das
APAES
Vaga
Social
Associação
dos
Deficientes
Físicos do
Oeste de
Minas
Federação
dos
Aposentados
e Pensionistas
Senhora
ENTIDADES DE DEFESA DOS
DIREITOS DE BENEFICIÁRIOS DA
ASSISTÊNCIA SOCIAL
Vaga
ENTIDADES DE USUÁRIOS DA
ASSISTÊNCIA SOCIAL
Associação Jêsuíta de Educação e Assistência Social
Inspetoria São
João Bosco
FILANTRÓPICAS
Sindicato das
Instituições
Beneficentes,
Religiosas e
Filantrópicas de
Minas Gerais
Serviço Social da
Indústria
NÃO
FILANTRÓPICAS
ENTIDADES REPRESENTATIVAS DAS
INSTITUIÇÕES PRIVADAS PRESTADORAS
DE SERVIÇOS
Fonte: elaborado pelo próprio autor, com base no material disponibilizado pelo CEAS.
Legenda: T – titular; S – suplente.
7º
mandato
2009/20
11
Mandato
Categorias
Sindicato dos
Trabalhadores
das Instituições
Beneficentes,
Religiosas e
Filantrópicas
Sindicato Único
dos
Trabalhadores
da Saúde
Religiosas e
Filantrópicas
44
CMAS
Lagoa
Santa
CMAS
Três
Marias
Sindicato dos
Psicólogos
CMAS
Juiz de
Fora
CMAS
Ipatinga
(CMAS)
REPRESENTANTES NÃO
GOVERNAMENTAIS DOS
CONSELHOS MUNICIPAIS
DE ASSISTÊNCIA SOCIAL
Conselho
Regional de
Serviço Social
ENTIDADES REPRESENTATIVAS DE
TRABALHADORES NA ÁREA DA
ASSISTÊNCIA SOCIAL
QUADRO 2 – Organizações da Sociedade Civil no Conselho Estadual de Assistência Social de Minas Gerais
Conselheiro
45
A proposta é identificar quais organizações da sociedade civil
participaram do CEAS durante os sete mandatos exercidos até a presente data.
Essas informações estão apresentadas no Quadro 2 (cf. páginas 41 e 42), que ainda
registra as organizações suplentes, tendo em vista que tais conselheiros também
podem participar das reuniões e ter direito a voz, não podendo, contudo, votar nem
ocupar lugar à mesa do Conselho, quando presente o titular.
4.3 Análise dos Dados
A partir dos dados coletados, é possível sistematizar quais organizações
da sociedade civil têm ocupado os espaços de representação junto ao conselho
gestor da área da assistência social em Minas Gerais.
Uma das lacunas verificadas refere-se a um processo de discussão e
debate públicos sobre o papel do Conselho e a representação da sociedade civil
nesse espaço. A escolha nítida pelo mecanismo eleitoral afasta as justificativas
acerca da representação no interior do CEAS dos outros fundamentos de
legitimidade, inclusive da noção tradicional das entidades assistenciais de prestação
de serviços à comunidade (LAVALLE et al., 2006b; LAVALLE; CASTELLO, 2008).
As organizações, no CEAS, são eleitas pelos seus pares para ocupar tal
representação, sequer sendo aprofundado o debate acerca dos fundamentos de
legitimidade da representação como trabalhado em Avritzer (2007). Aquelas
entidades que têm interesse em participar do processo de escolha podem se
cadastrar previamente; contudo, inexiste um debate aprofundado sobre o papel da
representação, nem mesmo acerca do papel do CEAS.
Resta claro que tais análises decorrem da leitura das atas, por serem
documentos oficiais que “registram o processo de deliberação e são devidamente
aprovad[o]s pelos seus participantes, o que indica que eles concordam com o
registro e a forma como foi realizado” (ALMEIDA; CUNHA, 2009b). Sabe-se,
contudo, que muitas discussões não são registradas em atas, ou o são de maneira
pontual. Eventuais debates ocorridos em determinado processo eleitoral podem não
ter sido transcritos nas atas, mas também não implicaram mudanças significativas
nos procedimentos de escolha, ao menos não de maneira institucionalizada e
publicizada pelas resoluções do CEAS e regulamentos eleitorais analisados.
46
Outra consideração cabível é em relação à baixa participação dos atores
sociais na escolha dos representantes do CEAS. Na grande parte dos processos
eleitorais, o número de entidades eleitoras foi pouco superior ao número de
entidades candidatas, isto é, as organizações que participaram dos fóruns de eleição
foram aquelas que se candidataram acrescidas de um reduzido número de
organizações somente eleitoras. Por esses mesmos motivos, falta de candidaturas
implicaram mandatos com representações suplentes vagas. Assim, a entidade eleita
para titularidade foi a única candidata, existindo ainda titularidades vagas no primeiro
e no sétimo mandato. Embora essa baixa participação não invalide o papel do CEAS
quanto ao controle social, trata-se de ponto de interesse ao debate, tendo em vista
que o modelo de conselhos gestores pode não estar atendendo aos anseios da
sociedade civil organizada quanto à ampliação da participação (RAICHELIS, 1998;
TATAGIBA, 2002).
Ainda no que se refere à composição do CEAS, há certa alternância de
categorização das entidades: há ocorrências de organizações eleitas como entidade
de usuários da assistência social em um mandato e como entidades de defesa dos
direitos de beneficiários da assistência social em outro mandato; ou entidades
representativas das instituições privadas prestadoras de serviço em um mandato e
entidades de defesa dos direitos de beneficiários da assistência social em outro
mandato; e ainda organização eleita como entidade filantrópica em um mandato e
como não filantrópica no mandato seguinte. Isso pode ocorrer tanto por conta de
mudança da atuação da organização, ou pela atuação em mais de um segmento, ou
ainda pela mudança de critérios de classificação em cada regulamento eleitoral.
De fato, a alteração de tais critérios pode ser um mecanismo efetivo para embasar a
representação nas atividades efetivamente desenvolvidas, e não somente em sua
existência jurídico-formal.
Ainda não está clara a representação dos segmentos sociais atendidos
pela assistência, como crianças e adolescentes, idosos e pessoas com deficiência.
Embora na maior parte dos mandatos estejam presentes organizações com atuação
específica nessa temática, a fixação legal dos grupos a serem representados no
CEAS (e, em geral, nos conselhos gestores da assistência, já que o modelo decorre
da
LOAS)
pode
estar
limitando
uma
maior
participação
e
uma
maior
representatividade das organizações da sociedade civil (ALMEIDA; CUNHA, 2009a;
47
2009b). Esse parece ser o caso, em especial, do último mandato analisado: há uma
nítida migração das entidades que foram eleitas tradicionalmente como entidades de
usuários da assistência social e que foram candidatas como entidade de defesa dos
direitos de beneficiários da assistência social no mandato 2009-2011, verificando-se
inclusive vacância de uma titularidade e de duas suplências naquela categoria
original11.
Verifica-se, ainda, de maneira geral, a permanência do mesmo grupo de
entidades atuando como representantes da sociedade civil no CEAS. Durante os
sete mandatos analisados, constata-se a participação de 30 organizações da
sociedade civil, sendo que 43% delas atuaram na posição de conselheiros titulares
ou suplentes em três ou mais mandatos. Destaca-se a participação do Conselho
Regional de Serviço Social e da Associação dos Deficientes Físicos do Oeste de
Minas, eleitos em todo o período, e da Federação das APAES, que atuou em seis
mandatos. Foram conselheiros em cinco mandatos o Sindicato Único dos
Trabalhadores da Saúde, o Sindicato dos Psicólogos, o Serviço Social da Indústria,
a Inspetoria São João Bosco, a Federação dos Aposentados e Pensionistas de
Minas Gerais e a Federação das Associações de Moradores de Minas Gerais.
Além disso, participando de quatro mandatos, foram constatadas as presenças do
Sindicato
dos
Trabalhadores
das
Instituições
Beneficentes,
Religiosas
e
Filantrópicas, da Associação Cristã de Moços e da Federação Brasileira das
Instituições de Excepcionais, de Integração Social e Defesa da Cidadania.
Na medida em que não há alternância na ocupação dos cargos, verifica-se uma
restrita participação social, tendo em vista que não há novas entidades envolvidas
no processo de escolha.
Quanto à natureza institucional, observa-se ainda uma participação
constante de ramificações da Igreja Católica, em especial da Conferência Nacional
dos Bispos do Brasil, da Cáritas Brasileira e da Ação Social Arquidiocesana, além de
organizações de cunho católico sem vinculação jurídica direta com a Santa Sé,
como a Associação Cristã de Moços, o Instituto dos Missionários Sacramentinos de
11
A migração das entidades para categorias diversas de representantes gerou distorções no
processo de representação no Conselho no mandato 2009-2011, como parece indicar a eleição do
Movimento das Donas de Casa e dos Consumidores como representantes dos usuários da
assistência social, tendo sido a única entidade candidata naquela categoria. Cabe destacar que o
segmento de donas de casa e o segmento de consumidores não são tradicionalmente atendidos
pela política de assistência social (cf. art. 2º da Lei nº 8.742/1993).
48
Nossa Senhora, a Associação Jesuíta de Educação e Assistência Social e o
Conselho Central da Sociedade São Vicente de Paula. Tal fato por si só não pode
ser interpretado de maneira negativa, haja vista o papel exercido por setores da
Igreja Católica na luta pela redemocratização e também na área da assistência
social (LAVALLE; CASTELLO, 2008). No mesmo sentido, destaca-se a grande
participação de entidades sindicais no CEAS, inclusive com reiterados mandatos, o
que não necessariamente significa que tais sindicatos mantenham seu papel de
representação dos interesses da sociedade, como era verificado na primeira metade
do século XX (SÖRJ; MARTITUCCELLI, 2008).
Quanto aos Conselhos Municipais de Assistência Social, cumpre
observar que, como a partir do terceiro mandato passou-se a ter escolha de
representantes apartada das organizações da sociedade civil, encontra-se, na
verdade, uma representação híbrida, isto é, o CEAS em certa medida possui
representação governamental, representação da sociedade civil e um terceiro tipo
de representação que corresponde aos Conselhos Municipais da Assistência Social,
sendo
dois
representantes
governamentais
e
dois
representantes
não
governamentais. Esse fato pode ser verificado em especial pela falta de registro da
entidade de origem do conselheiro municipal não governamental – o que o legitima a
participar aqui é a atuação no CMAS, e não o fato de ser atuante em entidade de
cunho estadual ou não.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os conselhos gestores são espaços participativos, criados por lei,
no qual Estado e sociedade civil organizada compartilham a gestão das políticas
públicas. O presente trabalhou buscou discutir como é constituída a representação
da sociedade civil, problematizando o fator de legitimação dessas organizações
representadas nos conselhos gestores. O conceito de sociedade civil adotado
baseou-se em Habermas (1997) e em Cohen e Arato (2000), sendo o espaço
público não estatal composto de movimentos, organizações e associações que
transmitem para a esfera pública os problemas sociais captados na esfera privada.
49
Dado que os debates sobre representação da sociedade civil vêm sendo
realizados de forma restrita, este trabalho buscou realizar revisão bibliográfica sobre
os mecanismos de autorização, prestação de contas (accountability), responsividade
e sanção, focando nos fundamentos de legitimidade das organizações da sociedade
civil atuantes junto aos conselhos. Nesse sentido, destacou-se a proposta de
representação relacional ou por afinidade (AVRITZER, 2007), de acordo com a qual
se pauta a legitimação no procedimento adotado, na relação com o tema e no
vínculo simultâneo entre atores sociais. Dissocia-se, destarte, a representação em
duas modalidades12: representação eleitoral e representação da sociedade civil (não
eleitoral).
Em seguida, analisou-se a categorização proposta por Lavalle et al.
(2006b) e por Lavalle e Castello (2008) quanto aos argumentos de legitimidade das
organizações da sociedade civil. A partir de survey realizada com entidades sociais
da cidade de São Paulo e/ou da Cidade do México, os dados foram sistematizados
em seis argumentos de legitimidade, quais sejam: argumento eleitoral; argumento de
identidade; argumento de filiação; argumento de serviços; argumento de
proximidade; e argumento de intermediação. Tais argumentos auxiliam na
compreensão do sentido de representação presuntiva, isto é, no entendimento das
motivações pelas quais as organizações se veem como representantes da
sociedade civil.
Os estudos de Avritzer (2007), de Lavalle et al. (2006a; 2006b) e de
Lavalle e Castello (2008) são convergentes ao compreenderem a representação da
sociedade civil para além da autorização ou do mandato expresso. Tais estudos,
portanto, se aproximam da proposta de Sörj e Martituccelli (2008) ao entenderem
que a representatividade das organizações tem relação com seu reconhecimento
pelos demais atores sociais em razão de determinado saber técnico ou tipo de
competência que advém de algum conhecimento relativo a um tema específico ou
segmento social, seja por relação atual ou anterior.
O estudo de caso realizado buscou, por sua vez, analisar como têm-se
dado os processos de escolha de organizações no conselho gestor da área da
12
Embora o autor apresente ainda a advocacia de causas coletivas como modalidade de
representação, trata-se de uma atuação na qual não se insere o debate da legitimidade e que,
consequentemente, prescinde de autorização.
50
assistência social em Minas Gerais, considerando sua obrigatoriedade legal
decorrente da Lei Orgânica da Assistência Social. Conforme salientado, inexiste um
processo de discussão aprofundado ou realização de debates públicos sobre o
papel do Conselho, nem mesmo sobre a função de representação da sociedade civil
nesse espaço. Foi verificada a baixa participação dos atores sociais na escolha dos
representantes do CEAS, restrita às organizações candidatas e a um pequeno
número de entidades eleitoras não candidatas, com reduzida alteração do grupo de
organizações representantes da sociedade civil que compõem o Conselho desde a
sua formação. Diversos mandatos tiveram representações suplentes vagas,
destacando-se a vacância ocorrida no último mandato analisado (2009/2011), o que
pode ensejar um afastamento do modelo de conselhos gestores em relação aos
anseios participativos da sociedade civil organizada.
A continuidade das discussões apresentadas pode e deve envolver
outras instituições híbridas e outros atores sociais. A presente pesquisa focou-se na
análise das atas de reuniões e na normativa aplicável ao Conselho Estadual de
Assistência Social, não abrangendo entrevistas aos conselheiros a fim de captar
suas percepções sobre como e em que medida o próprio conselho representa a
sociedade civil. Além disso, a ampliação para outros conselhos temáticos ou ainda
para conselhos de outros Estados pode demonstrar quadro diverso àquele ora
apresentado. Ademais, a pesquisa não apresentou nova categorização específica
para os fundamentos de legitimidade da representação nos conselhos gestores,
adotando modelo sistematizado por Lavalle e Castello (2008).
Por fim, compete destacar que a experiência dos conselhos está
institucionalizada em todo o país e o desafio consiste em vislumbrar e criar
mecanismos de sanção e prestação de contas para as organizações da sociedade
civil, estabelecendo-se espaços permanentes de diálogo e deliberação entre
representantes e representados. A abertura dos conselhos gestores a uma maior
participação social, com uma maior divulgação e flexibilização dos critérios formais
de candidatura, pode vir a conceder maior efetividade e representatividade a tais
instituições híbridas. A sistematização da experiência dos conselhos municipais e
estaduais pode também contribuir no aprimoramento da gestão participativa das
políticas públicas, considerando a restrição da participação democrática verificada
no modelo atualmente adotado.
51
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