PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Matemática Gabriel Ferraz Rubinger de Queiroz UM ESTUDO DIRIGIDO SOBRE A RELATIVIDADE DOS CAMPOS ELÉTRICO E MAGNÉTICO Belo Horizonte 2016 Gabriel Ferraz Rubinger de Queiroz UM ESTUDO DIRIGIDO SOBRE A RELATIVIDADE DOS CAMPOS ELÉTRICO E MAGNÉTICO Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação em Ensino de Ciências e Matemática da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Ensino de Ciências e Matemática. Orientador: Prof. Dr. Lev Vertchenko Área de concentração: Física Belo Horizonte 2016 FICHA CATALOGRÁFICA Elaborada pela Biblioteca da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais Q3e Queiroz, Gabriel Ferraz Rubinger de Um estudo dirigido sobre a relatividade dos campos elétrico e magnético / Gabriel Ferraz Rubinger de Queiroz. Belo Horizonte, 2016. 170 f. : il. Orientador: Lev Vertchenko Dissertação (Mestrado) – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Matemática. 1. Física - Estudo e ensino. 2. Eletrodinâmica. 3. Relatividade (Física). 4. Eletromagnetismo. 5. Estudo dirigido. 6. Feynman, Richard P. (Richard Phillips), 1918-1988 - Crítica e interpretação. 7. Vygotsky, Lev Semionovich, 1896-1934. Crítica e interpretação. I. Vertchenko, Lev. II. Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências e Matemática. III. Título. CDU: 53:37.02 Gabriel Ferraz Rubinger de Queiroz UM ESTUDO DIRIGIDO SOBRE A RELATIVIDADE DOS CAMPOS ELÉTRICO E MAGNÉTICO Dissertação apresentada ao Programa de PósGraduação em Ensino de Ciências e Matemática da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Ensino de Ciências e Matemática. Área de concentração: Física ______________________________________________________________ Prof. Dr. Lev Vertchenko - PUC Minas (Orientador) ______________________________________________________________ Profa. Dra. Júlia Esteves Parreira - PUC Minas (Banca Examinadora) ______________________________________________________________ Profa. Dra. Adriana Gomes Dickman - PUC Minas (Banca Examinadora) Belo Horizonte, 31 de março de 2016. Ao meu irmão Felipe. AGRADECIMENTOS A Deus que, através de pessoas humanas e de Sua Infinita Bondade, amparou-me na elaboração e finalização deste trabalho. A todos que, de algum modo, ajudaram-me nesta “maratona”. RESUMO Este trabalho aborda um texto de um renomado físico norte-americano, cujo tema é a conexão intrínseca entre a Teoria da Relatividade Especial (TRE) e o Eletromagnetismo Clássico, isto é, alguns elementos introdutórios de Eletrodinâmica Relativística. O físico mostra que os efeitos relativísticos de dilatação temporal e contração de Lorentz estão naturalmente contidos no contexto da Teoria Eletromagnética, mesmo se a velocidade entre referenciais inerciais for muito baixa. Assim, sob a ótica da TRE, campos e forças elétricas e magnéticas tornam-se grandezas e conceitos completamente relativos; porém, as equações de Maxwell se preservam (não necessitando de correção relativística) em qualquer destes referenciais. A invariância da carga elétrica elementar, junto ao princípio de conservação da carga (além dos efeitos citados acima), leva o cientista a concluir pela compatibilidade entre TRE e Eletromagnetismo. Isto é destacado a partir de abordagem teórica, clássica, das forças atuantes numa carga de prova, em distintos referenciais inerciais – o que, para curtos intervalos de tempo, está de acordo com os postulados de Einstein. Nosso propósito consistiu em elaborar um material pedagógico para estudo dirigido, baseado no texto do cientista, a fim de ser aplicado em curso superior de Física ou afim. Os pressupostos teórico-pedagógicos adotados provêm de uma obra de importantes estudiosos da Pedagogia (relacionada ao ensino superior) e também de ideias e pensamentos atribuídos à Teoria histórico-social e a um de seus principais pensadores. Estes fundamentos pedagógicos permitiram, por exemplo, justificar a importância de pré-requisitos para o estudo/leitura do texto do físico, assim como de uma potencial discussão a respeito de noções significativas deste. O texto, no idioma português, foi aplicado para a leitura em uma “oficina” com alunos universitários. Nesta, também se passou um material experimental, contendo questões sugeridas e uma errata daquele. Infelizmente, não houve tempo suficiente para a tentativa de resolução destas questões – o que se propôs como atividade extraclasse. Mas os participantes do encontro fizeram a leitura de texto; e se iniciou o diálogo sobre alguns aspectos relevantes do tema contido. Antes da leitura, foram preenchidos pré-saberes faltantes relacionados à TRE. Como não se recebeu nenhum conjunto de respostas esperadas às questões (devido a problemas encontrados), julgou-se útil a produção de questionário a fim de avaliar o material e a aplicação; este foi respondido apenas por dois participantes. Outras duas pessoas, que não estiveram na oficina, também auxiliaram neste trabalho, ao fazer a leitura do texto, resolver parcialmente as questões e responder o questionário. Foram feitas algumas modificações no material aplicado. Elaborou-se, ainda, um documento suplementar com respostas às questões sugeridas e considerações sobre importantes aspectos do texto – ou correlatos –, documento que pode ser valioso para o autoestudo do leitor, para correção das questões e esboço de discussão com estudantes. Este suplemento foi passado a todos os participantes da oficina; e também aos (dois) não participantes que contribuíram com este trabalho. Os resultados (dados) coletados no questionário indicam que o aqui proposto tem potencial em ser eficiente numa futura aplicação, auxiliando o estudo/compreensão do texto em questão. Além disso, foram levantadas humildes sugestões para o aprimoramento da oficina e algumas recomendações para a aplicação do material e discussão de texto. Palavras-chave: Ensino de Física. Ensino superior. Ensino de ciências e Matemática. Eletrodinâmica Relativística. Relatividade dos campos elétrico e magnético. Feynman. Teoria da Relatividade Especial. Eletromagnetismo. Material pedagógico. Estudo dirigido. Bordenave e Pereira. Vygotsky. Teoria Histórico-social. ABSTRACT This work addresses a text of a renowned American physicist, whose theme is the connection between the Special Theory of Relativity (STR) and the Classical Electromagnetism, that is, some introductory elements of Relativistic Electrodynamics. The physicist shows that the relativistic effects of time dilation and Lorentz contraction are naturally inserted in the scope of Electromagnetic Theory, even if the velocity between inertial frames is very low. Thus, from the perspective of STR, magnetic and electric fields and forces become completely relative concepts; however, Maxwell´s equations remain with the same mathematical form (do not require relativistic correction) in any of these frames. The invariance on the elementary electric charge and the principle of charge conservation (in addition to the effects mentioned above), allow the scientist to conclude that STR and Electromagnetism are compatible. This is highlighted from a classical theoretical approach of the forces acting on a test charge (in different inertial frames) – which, for short time intervals, is in accordance with Einstein´s postulates. Our purpose has been to develop a pedagogical material for the study to be guided by a Professor, material based on the scientist’s text, for use in undergraduate Physics course (or similar). The pedagogical assumptions are from a work of important scholars of the Pedagogy (related to higher education) and also from thoughts and ideas of the Sociocultural theory and one of its leading thinkers. These pedagogical foundations allowed, for example, justify the importance of prerequisites for study/reading of the text, as well as a potential dialogue about relevant textual notions. The text, in Portuguese, has been applied for reading during a “workshop” with university students. The material prepared has also been delivered, containing errata and proposed questions. Unfortunately, there was not enough time to the attempt to solve these questions – which has been proposed as homework. However, the text reading has been made by the meeting participants; and a dialogue on some relevant notions of the text has started. The prior knowledge, concerning STR, has been exposed before the reading. We have received no answers to the questions (due to the problems faced); therefore, we have thought it would be valuable make a questionnaire in order to evaluate the material and the meeting – which was answered only by two participants. Two other individuals, who were not in the workshop, have also helped our work: they have read the text, partially resolving the questions and answering our questionnaire. Some modifications have been done on the applied material. In addition, it is produced a document with answers to the suggested questions and considerations about important notions on the text – or correlated –, which may be valuable to the self-study, to correct questions and help on discussion with students. This supplement has been delivered to the workshop participants and to the (two) non-participants who contributed to this research. The information collected from the evaluation questionnaire indicates that our proposal has potential to be efficient in a future application, assisting the study/comprehension of the text. Moreover, humble suggestions for the workshop improvement and some recommendations regarding the material application (and discussion of the text) have been raised. Keywords: Physics Education. Higher Education. Mathematics and science Education. Relativistic Electrodynamics. Relativity of magnetic and electric fields. Feynman. Special Theory of Relativity. Electromagnetism. Pedagogical material. Bordenave and Pereira. Vygotsky. Sociocultural Theory. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO…………………...………………...………………………………...….15 1.1 Motivações.........................................................................................................................15 1.2 Justificativas......................................................................................................................17 1.3 O conteúdo desta dissertação...........................................................................................27 2 REFERENCIAIS TEÓRICO-PEDAGÓGICOS..........................................................29 2.1 Justificativas para a escolha de referenciais teórico-pedagógicos...............................29 2.2 Ideias orientadoras de Bordenave e Pereira..................................................................31 2.3 Vygotsky e a Teoria Histórico-social...............................................................................37 3 METODOLOGIA.............................................................................................................43 3.1 A ideia de uma oficina.....................................................................................................43 3.2 Aplicação da oficina.........................................................................................................48 3.2.1 Exposição teórica...........................................................................................................48 3.2.2 Leitura de texto...............................................................................................................63 3.2.3 Discussão do texto (resolução de dúvidas)....................................................................65 3.3 A proposta de um questionário avaliativo.....................................................................68 3.3.1 Elaboração do questionário...........................................................................................69 3.3.2 Aplicação do questionário...............................................................................................70 3.3.3 Análise de dados..............................................................................................................72 3.4 Principais dificuldades encontradas neste trabalho.....................................................74 3.5 Avaliação de respostas do formulário avaliativo e algumas sugestões para o aprimoramento da oficina...............................................................................................77 3.6 Algumas modificações no material e suas possíveis potencialidades..........................81 3.6.1 Considerações ao estudante............................................................................................81 3.6.2 Questões propostas..........................................................................................................82 3.6.3 Errata..............................................................................................................................85 3.7 Comentários sobre a elaboração do material: algumas justificativas e descrições....86 3.7.1 A Introdução ao estudante...............................................................................................86 3.7.2 Errata..............................................................................................................................87 3.7.3 Questões propostas..........................................................................................................88 3.7.4 Material suplementar......................................................................................................94 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS...........................................................................................97 4.1 Resumo geral....................................................................................................................97 4.2 Considerações sobre a eficácia da oficina.....................................................................99 4.3 Considerações para trabalhos futuros.........................................................................105 REFERÊNCIAS............................................................................................................109 APÊNDICE A – Material elaborado e Suplemento....................................................113 APÊNDICE B – Conjunto de respostas recebidas para o questionário (formulário) avaliativo elaborado.......................................................................................................163 15 1 INTRODUÇÃO Esta dissertação discorre a respeito de uma proposta de ensino-aprendizagem, para o nível superior, que tem como base um texto de Richard Phillips Feynman (1918 - 1988). O texto aborda elementos introdutórios de Eletrodinâmica Relativística, tema que geralmente está ausente em várias coleções de Física básica, para o nível abordado. Analogamente, a literatura disponível – sobre as pesquisas em ensino deste tema –, para o nível superior, é escassa (ou quase inexistente). Tendo contato com o texto em uma disciplina deste curso (de Mestrado), o autor julgou-o bem interessante e rico, haja vista a relativa simplicidade e profundidade da discussão dada pelo físico. Isto atuou, até certo ponto, como circunstância inicial para este trabalho. 1.1 Motivações A motivação para o trabalho ocorre devido a alguns fatores. Os principais seriam a admiração do autor por alguns dos grandes nomes da Física, como Albert Einstein (1879 1955) e Richard Feynman; e, também, o contínuo interesse em temas fascinantes da Física Moderna – como, por exemplo, a Teoria da Relatividade Especial (TRE) – e em sua história. Um dos objetivos do Mestrado Profissional em Ensino de Ciências e Matemática é a elaboração de um material didático – em nosso caso uma proposta para o ensino de Física – com o intuito de auxiliar, de alguma forma, estudantes e/ou professores. Assim, a possibilidade de que a proposta, e também esta dissertação, coopere neste sentido é uma grande fonte motivacional. Por estar, frequentemente, a ler e estudar livros ou artigos dos físicos matemáticos anteriormente citados e, de modo análogo, materiais (tanto técnicos como de divulgação) relacionados à Física Moderna, o autor decidiu, por bem, abordar algum assunto interligado à Teoria da Relatividade Especial neste trabalho. Embora o autor, atualmente, não tenha experiência em lecionar o tema, no nível em que é aqui abordado, seu Trabalho de Conclusão de Curso (de graduação) versou a respeito desta teoria, com a consequente aplicação de uma proposta – para o ensino médio – em uma escola estadual de Belo Horizonte, Minas Gerais, no primeiro semestre de 2011. A monografia deste trabalho intitulou-se Ensino de conceitos fundamentais da Teoria de Relatividade Restrita através de seminários para o Ensino Médio (Queiroz, 2011). Assim, a presente dissertação e o material a ela relacionado consistem, até certo ponto, no desejo do autor em dar continuidade, dar uma maior vazão em seus estudos 16 sobre tópicos de Física Moderna; o que equivale a dizer que também tem por finalidade um maior conhecimento de conteúdo, tanto em seus aspectos formais, conceituais, históricos etc., quanto ao que diz respeito às noções pedagógicas estudadas. Dessa forma, o autor espera que o fluxo de estudos dos últimos anos, esta continuação (em boa parte feita isoladamente, mas com os valiosos ensinamentos e indicações de leitura de seu orientador), tenha contribuído, de uma maneira ou de outra, na produção de um fruto – este trabalho em sua totalidade. Enfim, este fruto pode não estar muito bem desenvolvido, mas a possibilidade de que seja utilizado, adaptado, aprimorado, por outros (e/ou até sirva como referência, indicação de leitura), já traz satisfação e indicação de sua validade. Nossa proposta didático-pedagógica consiste em material elaborado para o ensino superior, direcionado aos estudantes, professores de Física ou a qualquer leitor que deseje estudá-lo e dele retirar algum proveito. Mas cremos que a proposta seja mais significativa para o curso superior de Física, o que se deve principalmente ao fato de que (para que o leitor possa obter algum proveito no material) são necessários pré-requisitos, isto é, conhecimentos prévios para uma leitura ativa de um texto de Feynman (destacados mais adiante). Estes conhecimentos – no que se refere à Teoria da Relatividade Especial – são geralmente mais abordados em cursos de Física e Astronomia, e devem ser preenchidos tanto pelo estudante quanto pelo professor que desejar utilizar o material com seus alunos. O texto, aqui enfocado, está presente na coleção Lições de física de Feynman (Feynman; Leighton; Sands, 2008), em tradução para a língua portuguesa brasileira. Este texto, denominado ‘A relatividade dos campos magnéticos e elétricos’, está na edição definitiva (brasileira) desta coleção, no volume II, capítulo 13: Magnetostática; e corresponde à seção 13-6. A preparação da proposta também foi estimulante, pois elaborar uma espécie de material de ensino contribuiu muito nos estudos, leituras etc., do autor deste documento. Dada a importância do tema do texto em questão – e sua relevância para o ensino –, o que se tentará justificar adiante, buscou-se estratégia útil, válida, para seu enfoque pedagógico. A que cremos mais adequada foi uma espécie de estudo dirigido, proposta por Bordenave e Pereira (2015). Estes autores destacam o claro propósito de fornecer certos elementos orientadores (mesmo que a título experimental) para o planejamento e escolha de atividades pedagógicas; e uma das finalidades de seu livro seria contribuir com formas de responder menos teoricamente, e mais praticamente, às dificuldades do ensino superior. Enfim, a proposta tem o intuito de que aluno e professor venham a explorar, a compreender melhor, conteúdo(s) do texto; isto se buscou, principalmente, por meio das 17 valiosas ideias dos autores acima (dentre outras), como a leitura ativa de texto básico e interessante e a sugestão de questões claras e simples – o que deve constituir um desafio à capacidade analítica do estudante. 1.2 Justificativas Acreditamos que o texto, que serve como base neste trabalho, é material bem significativo para estudantes e professores interessados em instigantes e importantes conteúdos da Física, assim como nos escritos de Feynman. Com efeito, o texto do físico aborda noções que mostram a conexão íntima entre o Eletromagnetismo e a Teoria da Relatividade Especial (TRE). Abordar um texto de Richard Feynman, que foi – e ainda é – um autor bem renomado, não é um grande diferencial neste trabalho. Afinal, poder-se-ia adotar texto tão bom quanto o de Feynman (ou melhor), mas proveniente de autor desconhecido do público da área. Porém, cremos que a reputação do cientista e de sua coleção – assim como suas valiosas contribuições à Física – pode ser um fator pertinente no despertar do interesse inicial do leitor. Em boa parte, a coleção de Feynman não é uma obra de introdução à Física – ou, digamos, uma obra elementar – para o ensino superior. Mas esta contém diversos trechos e textos que podem ser bem aproveitados em várias disciplinas e níveis do curso de Física (ou de uma área afim). O texto aqui adotado é básico em muitos aspectos, pois seu nível matemático é razoável, sem o uso de cálculos complicados de análise vetorial, sistemas de coordenadas de difícil visualização etc. Também, o conhecimento da TRE e do Eletromagnetismo Clássico (necessários à leitura ativa do texto) não precisa ser avançado. Em relação à primeira, apenas saberes mais básicos como as previsões da contração de Lorentz e da dilatação temporal, o momentum (linear) relativístico – e o entendimento elementar do conceito de referencial inercial e do Princípio da Relatividade de Einstein – já são suficientes. Relativamente ao último, é necessário o conhecimento básico das leis de Ampère da magnetostática e de Gauss da eletricidade (na forma integral). Obviamente, também é preciso um conhecimento de certas noções básicas do cálculo integral e diferencial. Apresentamos, assim, os pré-requisitos para uma boa leitura do texto em questão, que devem ser preenchidos por alunos e professores. Estes saberes prévios, juntamente a uma percepção do nível matemático do texto, mostram que este é básico para o ensino superior, ou seja, pode se aplicar em muitos cursos de Física ou afins (a partir de certos níveis, períodos). E, ainda que Feynman aborde alguns aspectos um pouco intrigantes, sutis, como a diferença 18 teórica existente entre a força elétrica e a magnética – mesmo para velocidades relativas muito baixas entre os referenciais inerciais –, seu texto pode ser denominado básico para o tema em questão. Isto porque determinados aspectos que conectam o Eletromagnetismo à TRE realmente têm estas características intrigantes; pelo menos do ponto de vista do autor desta dissertação. Sem dúvida, o texto aborda questões relacionadas quase que apenas à Física, enfocando uma descrição clássica de interação eletromagnética sob o ponto de vista da TRE, utilizando conceitos de força e apontando importantes noções do formalismo teóricoconceitual do Eletromagnetismo e da TRE – como a de que os efeitos relativísticos de dilatação do tempo e contração do espaço podem ser “tomados emprestados” pela Teoria Eletromagnética, a fim de que esta se compatibilize com a TRE. Este aspecto mostra que estes efeitos já estão contidos no Eletromagnetismo e aponta para a não contradição lógica entre as duas teorias. Enfim, alguns aspectos significativos presentes no texto, tornam-no interessante para uma fração significativa de leitores que realmente gostam da Física. Argumentos, com o objetivo de justificar que o texto de Feynman é interessante e básico, para o ensino superior, são bastante pertinentes em nossa proposta, pois, como veremos adiante – em capítulo que discorre sobre referenciais teórico-pedagógicos –, estas características parecem essenciais para certos autores. Enfim, apontamos já alguns argumentos que fundamentam a abordagem (leitura ativa) do texto em curso superior de Física ou afim. A literatura capaz de fundamentar a ênfase pedagógica no texto adotado (e/ou de textos semelhantes), ou seja, de apontar a relevância, a validade do(s) tema(s) para o nível superior, é praticamente inexistente. Buscamos livros e artigos a este respeito; porém, os escritos encontrados tratam completamente (ou quase) de noções teóricas, experimentais, históricas e filosóficas de conteúdos que abordam tanto a TRE quanto a Teoria Eletromagnética. Nenhuma proposta ou experiência didática sobre o tema, em nível superior, foi encontrada por nós. Assim, elaboramos aqui nossas próprias justificativas para a abordagem do texto e de assuntos interligados. Com efeito, sabemos que o planeta está repleto de tecnologia e progresso científico; e com a evolução da Física Moderna, a Teoria da Relatividade Especial está sendo aplicada e testada diariamente (TAYLOR; WHEELER, 1992). Esta teoria, também, acaba por tomar parte – direta ou indiretamente – da vida do homem contemporâneo. A Física Moderna – e com ela a Relatividade – realmente iniciou uma reviravolta na visão científica (EINSTEIN, 2005), surgindo de tal modo para explicar fenômenos que a Física Clássica não conseguiu (o 19 que engendrou uma nova visão de mundo). Esta Física atendeu (e atende) necessidades que aparecem diariamente, tornando-se cada vez mais básicas para o ser humano – uma gama de conhecimentos que vai além dos limites científicos e tecnológicos, na influência de outras áreas do saber (PINTO; ZANETIC, 1999, p. 1). Entretanto, o autor desta dissertação sustenta a opinião de que a Física não explica uma boa parcela dos fenômenos, mas os descreve; em muitos casos, com alta precisão e beleza. Talvez devido a esta maravilhosa função ela extrapole os limites da ciência, influenciando outros ramos do conhecimento, como a Filosofia por exemplo. Isto colabora na justificativa do ensino-aprendizagem da TRE e de conteúdos que a integram a outras teorias – como o Eletromagnetismo. E as verificações experimentais da TRE são inúmeras; p. ex., Hewitt menciona que a dilatação temporal foi várias vezes confirmada em laboratório, através de aceleradores de partículas. Este autor também fornece um valioso exemplo sobre a participação da Relatividade na vida do homem atual, ao citar relógios atômicos que orbitam a Terra e tomam parte no sistema GPS – uma tecnologia atualmente abundante –, mas que necessitam de correção relativística temporal (HEWITT, 2002). No caso destes relógios satélites, as diferenças temporais ocorrem devido ao seu movimento relativo a relógios fixos no referencial terrestre e, também, devido às variações do campo gravitacional (TAYLOR; WHEELER, 1992). Observa-se aqui, portanto, apenas um pequeno fragmento da importância da Relatividade no cotidiano atual; uma teoria que não é, de forma alguma, destituída de embasamento empírico – sendo seus efeitos observados rotineiramente. Assim sendo, podemos dizer que a previsão de dilatação do tempo, de certa maneira, se relaciona com a vida humana, por meio da tecnologia de GPS. Além disso, parte da tecnologia atual está intrincadamente relacionada aos antigos e modernos satélites artificiais e aceleradores de partículas, ou pelo menos provém de pesquisas e programas relacionados à construção e desenvolvimento destes aparatos. Estes argumentos nos mostram um pouco da significância de certos conteúdos da TRE e da conexão desta com disciplinas da Física Clássica, com a evolução tecnológica, e até mesmo com o dia-a-dia humano. Analogamente, a Teoria Eletromagnética também tem esta importância, haja vista que o seu desenvolvimento experimental e matemático foi imprescindível no progresso da tecnologia, da Física, das engenharias; e, como cita Einstein (1999), a TRE só pôde surgir com o advento do Eletromagnetismo e com o consequente 20 aprimoramento da Óptica. Estas são considerações a favor da ênfase, no ensino superior, em assuntos integradores que, de certo modo, unificam vários aspectos destas teorias. O autor deste documento crê que, através de uma reflexão atenta e de leituras, é possível compreender que qualquer ciência séria é uma fração da bagagem cultural humana. Zanetic (1989) explicita a necessidade de que a Física e, de forma geral, todas as ciências, sejam compreendidas como parte da cultura. Um ótimo exemplo do relacionamento da TRE (e também de incoerências surgidas no contexto do Eletromagnetismo) com a cultura filosófica – à época da juventude de Einstein – se deu na influência da epistemologia de E. Mach (1838 - 1916) no jovem pensador e, por conseguinte, em sua abordagem inicial da Teoria da Relatividade Especial. Ramayana Gazzinelli relata que “No início de sua vida científica, Einstein sofreu forte influência da epistemologia radicalmente positivista de Mach, mas afastou-se dela na maturidade.” (GAZZINELLI, 2009, p. 20). Segundo as concepções de Mach, não eram válidas proposições científicas não empiricamente comprovadas, o que – naquele período – levou-o a rejeitar os modelos para o éter eletromagnético, a ideia de espaço absoluto etc.; e apesar de que o éter foi pressuposto como real no escopo do Eletromagnetismo daquela época (GAZZINELLI, 2009), este se mostrou desnecessário, supérfluo, na formulação da TRE (GAZZINELLI, 2009; EINSTEIN, 2005). Exemplos da relação entre a TRE, Filosofia e Teoria Eletromagnética também podem contribuir para justificar a abordagem de temas integradores das teorias. Afinal, a História da Física e as implicações filosóficas decorrentes de suas teorias são parte integrante da evolução desta ciência, podendo ser ótimas fontes de inspiração e incentivo para alunos, professores, pesquisadores etc., no estudo de um conteúdo, na elaboração de uma aula, no estímulo a uma pesquisa etc. Enfim, até para que o leitor compreenda um texto mais avançado – sobre aspectos históricos, filosóficos – relacionado à Física, é preciso ter ao menos certo conhecimento elementar da parte formal e conceitual do tema, teoria(s) em questão. Estas considerações, a respeito da vigorosa relação entre TRE, Filosofia, Eletromagnetismo etc., não são um intuito importante neste trabalho, mas é útil ressaltá-la. Afinal, esta confere alguma validade ao ensino de aspectos correlacionados às duas teorias físicas, visto que o conhecimento do formalismo teórico auxilia no entendimento de noções históricas/filosóficas (e vice-versa) – conforme cremos. Claramente, a validade deste último argumento parece depender muito de qual tema, teoria, está em questão. Uma estudante da PUC Minas referiu-se ao relacionamento do Eletromagnetismo com a TRE, presente no texto de Feynman, como intrigante. Embora esteja fora de nosso escopo, com o material elaborado, isto parece mostrar (até certo ponto) que conteúdos que integram o 21 Eletromagnetismo à TRE são passíveis de suscitar questionamentos de natureza filosófica; como se sabe da história da evolução das ideias físicas, a própria TRE forneceu abundante material para os filósofos. Então, o estudo/leitura de assuntos integradores entre as teorias poderia ser pertinente para auxiliar no desenvolvimento da habilidade de questionamento, de julgamento da validade e significado das informações. Este argumento também nos parece valioso a fim de fundamentar o enfoque nos tópicos que reúnem as duas teorias. Embora o professor tenha liberdade para discutir temas que apontem a intrincada relação entre o Eletromagnetismo, a TRE e a Filosofia (ou outro conteúdo da cultura humana), neste trabalho somente se sugere a discussão de ideias mais essenciais de um ponto de vista físico, contidas no texto, com os estudantes; a intenção seria tentar promover um melhor entendimento do texto adotado. Enfim, cremos que somente os aspectos relacionados à essência das ideias físicas sejam necessários para uma melhor compreensão; noções filosóficas e históricas (como as citadas anteriormente) entram aqui como justificativas para o tratamento de conteúdos integradores da TRE e Eletromagnetismo, dada a importância destes em um melhor entendimento daquelas noções (e vice-versa) – conforme acreditamos. Ao longo desta dissertação (talvez principalmente no capítulo final) levantamos algumas ideias, aspectos físicos, que cremos serem mais significativos, isto é, de certa maneira essenciais no texto de Feynman. A necessidade do ensino-aprendizagem da TRE, nos cursos de Física, é inegável; e quase dispensa comentários. O advento da teoria legou uma nova busca de leis físicas gerais, no sentido de serem válidas em qualquer referencial inercial (EINSTEIN, 1999). A principal novidade da TRE, talvez, não é a derrocada dos conceitos de espaço e tempo absolutos, mas a reformulação (ou renovação) de um princípio de simetria para o movimento reto e uniforme. Pois é evidente que esta teoria põe em evidência leis, constantes, intervalos e propriedades físicas fundamentais que se mantêm as mesmas, independentemente do movimento relativo entre observadores inerciais; porém, a teoria também põe em destaque grandezas relativas que dependem do sistema inercial. Como exemplo de grandezas relativas e invariantes, temos as forças e campos elétricos e magnéticos – grandezas vetoriais dependentes do referencial inercial – e a carga elementar, uma propriedade física escalar invariante (contida em um elétron ou próton). Aqui, é valioso o comentário de Gazzinelli. Segundo este, os postulados da TRE tornam sem significado as ideias de espaço e tempo absolutos; assim, por vezes destacase o aspecto relativístico da teoria. Mas esta propõe justamente o oposto: a procura por leis físicas invariantes, que não dependam do sistema inercial escolhido (GAZZINELLI, 2009, p. 26). 22 Com o surgimento da TRE, a reformulação de noções antes consideradas intuitivas fez-se necessária; talvez principalmente a de que a luz – e os objetos com massa de repouso não nula – obedecia(m) às composições clássicas de velocidade. Mas a renovação de ideias e conceitos como estes só se tornou possível com o surgimento empírico e teórico da Teoria Eletromagnética. Isto equivale a dizer que a própria TRE só pôde advir desta teoria. Pois assim enfatiza Einstein: [...] a Teoria da Relatividade (Especial) surgiu da eletrodinâmica e da óptica. Nestes domínios, ela não modificou muita coisa nos enunciados da teoria, mas simplificou significativamente o edifício teórico, isto é, a derivação das leis. [...]. Ela tornou a teoria de Maxwell-Lorentz tão plausível, que teria sido universalmente aceita pelos físicos mesmo que a experiência não tivesse falado com tanta eloquência em seu favor (EINSTEIN, 1999, p. 41). Este é mais um ponto a favor da abordagem de tópicos que se entrelaçam no contexto destas teorias, em qualquer curso superior de Física. Além disso, Einstein relaciona o Princípio da Relatividade justamente ao Eletromagnetismo, ao postular que “[...] as mesmas leis da eletrodinâmica e da óptica serão válidas para todos os sistemas de coordenadas nos quais valem as equações da mecânica, [...]” (EINSTEIN, 2005, pp. 143-144). As equações da mecânica – às quais o cientista se refere – são as atualmente chamadas de relativisticamente corrigidas, pois o físico se mostra ciente desta questão em seu artigo pioneiro sobre a TRE. Assim, é fácil perceber que o Eletromagnetismo, que forneceu o conhecimento para as postulações de Einstein, forma, juntamente à TRE, um conjunto teórico que atuou como um dos pilares da construção da Física Moderna. Portanto, temos já aqui bons argumentos que indicam a significância dos conteúdos unificadores entre as teorias; e que também apontam a importância deste edifício teórico na evolução da Física atual. Também pelo fato de que, certamente, as equações de Maxwell atuaram como diretriz na busca por outras leis com igual privilégio – o de preservarem suas formas matemáticas em quaisquer sistemas inerciais –, pode ser válido enfocar assuntos que inter-relacionam à TRE ao Eletromagnetismo em cursos superiores de Física. John Stachel, na introdução da obra O ano miraculoso de Einstein: cinco artigos que mudaram a face da física (Einstein, 2005), ao discutir as transformações de Lorentz, afirma que a TRE as interpretou como elementos de um conjunto de simetria espaço-temporal pertencentes a uma nova cinemática. Assim, a TRE garantiu à Física um poderoso guia na procura de novas teorias dinâmicas de campos e partículas, também colaborando, paulatinamente, numa percepção mais profunda do papel da simetria na Física (EINSTEIN, 2005, p. 119). 23 Em resumo, dadas as considerações anteriores, como não ressaltar aos graduandos do século XXI ao menos um pouco da forte conexão entre Eletromagnetismo e TRE, seja a partir de abordagem teórico-conceitual, histórica e/ou filosófica? Afinal, trata-se de um ramo da Física que auxiliou como ótimo guia (não apenas o único) na descoberta de outras leis, teorias – e que reformulou a simetria entre referenciais em movimento relativo retilíneo e uniforme. Além disso, a partir da TRE, a Teoria da Relatividade Geral pôde ser elaborada; e a compatibilização da Teoria da Relatividade Especial com a Mecânica Quântica resultou na Eletrodinâmica Quântica. O autor deste texto não estudou matematicamente a Teoria da Relatividade Geral e a Eletrodinâmica Quântica, mas sabe que seus fundamentos e princípios inauguraram novas visões da matéria, da luz, energia, espaço-tempo etc.; e das interações entre partículas e suas estranhas propriedades. Percebe-se, então, que a conexão entre a TRE e a Teoria Eletromagnética é realmente profunda. Também, a Teoria da Relatividade Especial, nos dias atuais, tem grande prestígio na Física de Partículas, onde se coleta inúmeras confirmações de sua validade (TAYLOR; WHEELER, 1992). Relativamente à lei da constância no valor da velocidade da luz (no espaço livre), a TRE levou a uma interpretação mais moderna deste invariante, isto é, como um fator de conversão entre espaço e tempo; até hoje, este valor é aceito como limite inatingível de velocidade para partículas que possuem massa de repouso (TAYLOR; WHEELER, 1992). Porém, o mais interessante aqui é que esta quantidade para a velocidade luminosa, geralmente designada por c, surge diretamente das equações de Maxwell, tendo sido calculada por este cientista (GAZZINELLI, 2009; HEWITT, 2002). Então, percebe-se que o postulado da TRE (da invariância de c) é na verdade uma lei eletromagnética, mas que precisou de uma interpretação particularmente difícil. Nestas últimas páginas percebemos que, com efeito, há um profundo relacionamento entre Eletromagnetismo e TRE; e a ênfase didática em temas unificadores fica válida e até vigorosa, dada a importância destes conteúdos (de um modo geral), que aqui foi justificada – até certo ponto – pelas considerações acima. Enfim, esforçamo-nos na apresentação de algumas fundamentações que, de certa forma, justificam a significância do arcabouço teórico composto pelas duas teorias, sua forte conexão e sua validade (geral) no ensino superior – seja de aspectos integradores formais, conceituais e até histórico-filosóficos. Com a pretensão de finalizar estas justificativas, apresentamos nossas últimas argumentações, em boa parte baseadas em um importante documento da Sociedade Brasileira de Física (SBF). Com razão, a extensão e o aprimoramento do ensino-aprendizado de Física 24 Moderna – e, por conseguinte, da proposta de materiais que possam contribuir para tais fins – também se justifica pela maior inserção do Brasil no cenário da Física internacional, nas últimas décadas. A Sociedade Brasileira de Física esclarece, neste documento, que o país possui “[...] acesso garantido aos principais complexos de pesquisa de altas energias do planeta.” (SOCIEDADE BRASILEIRA DE FÍSICA, 2011, p. 155). De certa maneira, isto é de se estranhar, devido à má qualidade educacional da nação (de forma geral). Mas, afinal, a Física de Partículas e Altas Energias tem relação direta com a TRE e o Eletromagnetismo. Isto também pode estimular a abordagem de tópicos integradores das teorias nos cursos de Física (ou, talvez, até de ciências afins), pois certos graduados acabam por fazer opções de pós-graduação em diversas áreas científicas e/ou tecnológicas. O documento citado – ao discorrer sobre a ‘Potencial Contribuição Brasileira’ (na área de Física de Partículas e Campos) – também enfatiza a importância da manutenção de políticas científicas que proporcionem a contínua participação brasileira em grandes centros de pesquisa, não apenas de doutores, mas “[...] também de alunos que irão formar a próxima geração de pesquisadores.” (SOCIEDADE BRASILEIRA DE FÍSICA, 2011, p. 164). Esta possibilidade é fator positivo para uma provável maior inserção de elementos de Física Moderna (que têm relação com a Física de Partículas) nos cursos de Física, assim como para a produção e teste de materiais didáticos – na tentativa de auxiliar neste objetivo. Sabe-se que todas – ou quase todas – as principais áreas da Física se relacionam à atual Física de Partículas, algumas mais, outras bem menos. Uma das principais teorias da ciência contemporânea, a Eletrodinâmica Quântica (intrinsecamente ligada à Física de Partículas), só se desenvolveu com a participação fundamental da TRE e de todo saber adquirido sobre a ciência eletromagnética, a Mecânica Quântica etc. Para um bom estudo da Eletrodinâmica Quântica, obviamente, é necessário (ao menos) um conhecimento básico da Teoria da Relatividade Especial, do Eletromagnetismo Clássico, Mecânica Quântica etc., e os temas integradores entre quaisquer destas teorias podem ser muito valiosos. Outro ponto interessante, destacado pela SBF, é a constatação de que as políticas ligadas à Ciência, Tecnologia e Inovação (em prol de um desenvolvimento sustentável) passam pela melhoria da formação de professores e do ensino básico nacional (SOCIEDADE BRASILEIRA DE FÍSICA, 2011). Noutras palavras, a SBF parece afirmar que o crescimento científico e tecnológico depende, inevitavelmente, da melhoria educacional em seus aspectos mais gerais, básicos; ou que a ciência e tecnologia brasileiras estariam em um nível superior se a política tratasse a educação com mais zelo – principalmente o nível básico. 25 Os argumentos dos últimos parágrafos seriam, então, a favor da extensão de tópicos de Física Moderna no ensino superior; e, obviamente, da proposta de leitura de textos (que possam ajudar neste intuito) e de preparação e experimentação de materiais com este possível potencial. Em resumo, os argumentos deste item da introdução apontam a validade de conteúdos que unificam a TRE e o Eletromagnetismo. Em um país que aparenta ganhar mais espaço na Física estrangeira, com acesso (até os dias atuais) aos melhores laboratórios de alta energia do mundo – apesar de sua deficiente educação geral –, e que, ao menos nos últimos anos, vem sustentando políticas que possibilitam a frequente participação de brasileiros nestes centros de pesquisa, é muito importante e válido o desejo de melhoria do ensino de temas de Física Moderna – ou ao menos de assuntos que contêm alguns elementos e aspectos significativos desta Física (que contribuíram e contribuem em sua evolução). Analogamente, é valiosa a elaboração de materiais e o uso de textos na tentativa de colaborar. Considerações feitas aqui, na intenção de justificar a pertinência de conteúdos integradores de quaisquer ramos da Física Moderna e Contemporânea – entre estes e/ou destes com a Física Clássica –, também justificam, até certo ponto, a significância dos assuntos que unem a TRE e o Eletromagnetismo, haja vista a enorme importância destes no desenvolvimento da Física nos últimos duzentos anos e seu profundo relacionamento com diversas (e bastante importantes) áreas físicas. Outro argumento para este trabalho, que não é propriamente uma justificativa (mas uma consideração passível de conferi-lo um pouco mais de significância), é o de que existem erros no texto – nas edições brasileira e norte-americana aqui usadas. Assim, elaborou-se uma errata da versão brasileira do texto (comparando-a com uma original em inglês). Sendo que, futuramente, poderá ser lançada uma edição com os erros parcial ou totalmente corrigidos (se já não o tiver sido feito), a presença dos equívocos não constitui, de fato, uma justificativa. Mas como fundamentaremos, estes podem efetivamente prejudicar o leitor mais inexperiente e/ou desatencioso, e a existência da errata poderia auxiliar numa leitura mais cuidadosa do texto – caso se use as edições aqui abordadas. Com razão, talvez correções de vários textos da coleção de Feynman ainda precisam ser feitas, pois, havendo tantos erros em outros textos desta – como os encontrados pelo autor deste documento em nosso texto base –, não é possível denominar definitiva, de modo algum, esta edição brasileira. Então, este trabalho vem, até certo ponto, contribuir nesta divulgação ao leitor, alertando a comunidade científica (ainda que minimamente) para a questão de erros na edição brasileira de Feynman (2008), ‘Reimpressão 2009’ – que pode ser pior do que se pensa. 26 As políticas citadas pela SBF podem retirar algum proveito de várias pesquisas em educação (nacionais e estrangeiras), incluindo as pesquisas em ensino de Física. Assim, este trabalho em sua totalidade – que é apenas uma destas pesquisas – pode, de algum modo, vir a contribuir (ainda que minimamente) em algum valioso fator; seja estimulando pesquisas semelhantes; sendo usado, adaptado, aprimorado por um leitor; servindo como referência ou indicação de leitura; ou apenas por compor mais uma humilde tentativa de contribuição ao ensino da Física que, somada a tantas outras que foram (e estão sendo) feitas no país e mundo afora, forma um leque de saberes que não pode ser desprezado. Afinal, políticas referentes à ciência, inovação, técnica etc., são essenciais para o crescimento científico-tecnológico, econômico e social de uma nação em desenvolvimento, dependendo, em boa parte, da pesquisa educacional. Finalmente, destaque-se a potencial importância deste trabalho para a formação do professor. O material pedagógico elaborado – e esta dissertação – pode subsidiar o educador na leitura/estudo do texto de Feynman e na percepção de importantes aspectos deste – assim como de noções correlatas. O tema envolvido no texto, por vezes, está ausente (ou é pouco abordado) em várias coleções de livros de Física Básica. Assim, nosso trabalho pode fornecer auxílio ao docente no estudo introdutório deste tema, que, de certo modo, abarca a integração entre a TRE e o Eletromagnetismo Clássico. Também, apresentamos certas ideias e conceitos (de referenciais teórico-pedagógicos adotados) que podem ser guias úteis para contribuir com outras pesquisas; além do seu potencial em auxiliar o professor na aplicação do estudo aqui sugerido. Dentre os elementos pedagógicos, constam algumas orientações de Bordenave e Pereira (2015) e certos conceitos de Vygotsky e Teoria histórico-social. Em relação aos primeiros autores, acreditamos que o mais valioso são as potenciais funções positivas esperadas no estudo dirigido. No que concerne aos últimos, estão elementos teóricos que remetem à significância de pré-requisitos – e do diálogo professor-aluno – para a leitura e compreensão de texto. Por fim, mencione-se a potencialidade desta pesquisa para o professor de ensino médio. Claramente, o material aqui preparado é inadequado neste nível de escolaridade. Porém, o texto utilizado enfoca alguns aspectos passíveis de se abordar, de modo simples e útil, com aluno do ensino médio. Estes são a invariância da carga elétrica elementar, a lei de conservação da carga e simples noções sobre a relatividade do campo elétrico e magnético. Assim, o texto de Feynman, mais este trabalho, pode ajudar o docente a preparar boa discussão (e/ou algum texto) a respeito destes assuntos. O educador pode até mostrar, de 27 alguma forma adequada, adaptada, que o problema inicial do texto leva à conclusão de que deve haver interação entre cargas elétricas no referencial inercial da partícula carregada, que apenas pode ser considerada, na perspectiva clássica, como uma força elétrica atuante nesta – o que requer que o fio (ou uma seção deste) esteja positivamente carregado em S´, apesar de neutro em S. Enfim, o que se pretende ressaltar é que o professor pode conseguir adequar, adaptar, estes assuntos para o nível, até mostrando que a TRE se incorpora ao Eletromagnetismo – permitindo descrição coerente para a interação em ambos os referenciais. Obviamente, se o educador vislumbrar ser possível a adequação do tema, deve respeitar os pré-requisitos dos estudantes, em relação à TRE, ao Eletromagnetismo, e no que concerne à simplificação da matemática, de palavras, conceitos, postulados etc. De acordo com o usualmente abordado neste estágio de ensino, cremos que o tema seria mais adequado para o terceiro ano deste; os pré-saberes, devidamente adaptados, devem ser todos cobertos – caso necessário. Outra colocação contundente é a de que o docente pode conseguir mostrar a não violação da lei de conservação da carga no texto. Enfatize-se, enfim, que não estamos a propor o uso do texto de Feynman e do material elaborado no nível médio, mas apenas a levantar a possibilidade de debate (de conteúdos importantes) e/ou de adaptação textual. Assim, recomendamos ao professor prender-se somente àquilo que julgar passível de ser adequado. As últimas funções positivas deste trabalho, para o docente de ensino médio, seriam a de auxiliar-lhe no autoestudo do texto enfocado, mas também a de indicar-lhe alguns elementos pedagógicos valiosos. Embora a obra e as ideias de Bordenave e Pereira (2015), aqui destacadas, tenham sido direcionadas ao ensino superior, é provável que abarquem alguns elementos válidos em outros níveis – o que entra como sugestão para a observação e avaliação do educador. 1.3 O conteúdo desta dissertação Apresentamos sucintamente, neste item final do capítulo introdutório, as demais partes deste documento. No segundo capítulo, abordaremos nossos referenciais teórico-pedagógicos, iniciando com justificativas para a escolha destes, e depois passando por certas ideias orientadoras de Bordenave e Pereira – nosso principal referencial – e finalizando com conceitos e ideias de Vygotsky e da Teoria histórico-social. O terceiro capítulo versa a respeito da metodologia, iniciando com o relato, descrição, de uma espécie de oficina ministrada para estudantes do ensino superior – realizada com o intuito de se aplicar 28 experimentalmente um material elaborado para auxiliar no estudo do texto de Feynman. Mais adiante, neste capítulo terceiro, se discorre sobre a proposta de um questionário avaliativo, ou seja, é explanada a tentativa de avaliar (ainda que minimamente) a oficina e o material aplicado nesta. Ainda neste capítulo, são abordadas várias dificuldades encontradas na realização deste trabalho – no que concerne à aplicação, avaliação etc. –, são avaliadas respostas de formulário avaliativo e apresentadas algumas sugestões para o aprimoramento da oficina; certas modificações introduzidas no material e suas possíveis potencialidades são também apresentadas, além de comentários a respeito da produção do material (contendo justificativas e descrições). Finalmente, no quarto e último capítulo constam nossas considerações finais, compostas pelas seguintes seções: um resumo geral (que versa sobre alguns pontos que o autor considerou relevantes nesta pesquisa), argumentos sobre a eficiência da oficina – que nos esforçamos em correlacionar ao referencial teórico e aos resultados colhidos em formulário –; e, por fim, apontamentos em relação a trabalhos futuros. Após o capítulo final encontra-se a lista de referências bibliográficas do corpo do texto desta dissertação; após esta lista estão os apêndices. O primeiro, apêndice A, contém o material elaborado – e modificado – seguido do texto do material suplementar. Em diante, vem o apêndice B com as imagens do conjunto de respostas obtidas para o questionário avaliativo, finalizando este documento. 29 2 REFERENCIAIS TEÓRICO-PEDAGÓGICOS Nossos referenciais teórico-pedagógicos são apresentados, justificados e explicitados neste capítulo. É preciso apresentar os referenciais a fim de justificá-los; assim, as justificativas (logo adiante) contêm implicitamente a apresentação dos mesmos. 2.1 Justificativas para a escolha de referenciais teórico-pedagógicos Em pesquisas bibliográficas, feitas no portal da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) e no buscador Google®, não encontramos textos, artigos, livros etc. que apontam o enfoque pedagógico, a nível superior, do texto de Feynman e/ou de assuntos correlacionados; isto equivale a dizer que não se encontrou elementos, fontes, que enfatizam, mostram, a aplicação didática de livros (textos) técnicos sobre conteúdos integradores do Eletromagnetismo e TRE – em cursos superiores de Física ou afins. Estas fontes devem ser raras. Com efeito, os livros, artigos etc., a respeito do tema, versam bastante sobre aspectos teóricos, isto é, referentes ao edifício matemático-conceitual destes assuntos unificadores – ou sobre o rico conteúdo histórico e/ou filosófico da conexão existente entre estas teorias. Outra constatação é a de que temas a respeito da inter-relação entre a Teoria Eletromagnética e a TRE estão praticamente ausentes de grande parte dos livros técnicos de Física básica, incluindo coleções comuns nos cursos superiores afins às ciências físicas. Em sua maioria, estes livros dão maior significância às partes cinemática e mecânica da TRE. Assim, achamos por bem procurar referências que abordam a leitura/estudo – a nível superior – de forma mais abrangente, geral, deparando-nos com a ótima obra de Juan Díaz Bordenave e Adair Martins Pereira, Estratégias de ensino-aprendizagem (Bordenave; Pereira, 2015). Também se deve apontar que não foram encontradas referências sobre o estudo e leitura de textos técnicos de Física (de qualquer tema) a nível superior. Estas fontes apontariam sua importância e dariam fundamentos para a elaboração experimental de material didático – começando pela leitura. Segundo os autores citados anteriormente, o ensino superior atualmente enfrenta diversos problemas; e as opiniões sobre quais são os melhores princípios pedagógicos e metodologias didáticas para este ensino seriam divergentes. Em seu livro, os autores visam dois importantes intuitos: proporcionar modos de responder mais praticamente do que teoricamente a estes problemas, e comunicar as possíveis respostas de forma mais simples do 30 que técnica. Também são propostas, ainda que a título experimental, diversas ideias orientadoras sobre planejamento de ensino e escolha de atividades didáticas (BORDENAVE; PEREIRA, 2015). Assim, buscamos certas ideias destes, para tentar elaborar e fundamentar boa parte de nossa proposta de material didático, com a intenção de proporcionar uma melhor compreensão do texto de Feynman (tanto da parte do aluno quanto do professor). Os autores, quando discorrem sobre estudo dirigido, destacam que este “[...] parte da leitura de um texto escolhido pelo professor, [...]” (BORDENAVE; PEREIRA, 2015, p. 266). Esta citação fundamenta, até certo ponto, a utilização de bons textos técnicos no ensino superior; o que parece não carecer de muita justificativa, dada a significância quase inegável da leitura/estudo de bons livros, textos, artigos etc. em cursos superiores. Analogamente, as considerações dos autores de que o texto em questão deve ser básico e interessante, e de que os alunos devem trabalhar muito na interpretação textual (BORDENAVE; PEREIRA, 2015, p. 266), também fundamentam a adoção deste referencial. Isto ocorre porque realmente cremos que o texto de Feynman preenche tais características, exigindo uma postura mais ativa do estudante. O livro de Bordenave e Pereira parece bem atual e contextualizado, estando já em sua 33ª edição. Surgiu a partir de diálogos mantidos pelos autores com cerca de quinhentos professores universitários que participaram do curso de Metodologia de Ensino Superior, oferecido pelo Instituto Interamericano de Ciências Agrícolas (Iica), em Escolas e faculdades brasileiras de Agronomia, Veterinária, Zootécnica e Engenharia Florestal, a partir de 1969. Embora diversos exemplos práticos da obra estejam mais direcionados às ciências agrárias, os autores afirmam que “[...] os princípios pedagógicos têm aplicação universal e que a metodologia didática é aqui tratada de forma bastante geral.”. Assim, o livro é também útil para outras disciplinas (BORDENAVE; PEREIRA, 2015, p. 9). Outros aspectos pedagógicos e teóricos, aqui escolhidos, são atribuídos ao cientista Lev Vygotsky (1896 - 1934) e à Teoria histórico-social (ou histórico-cultural) que, em parte significativa, surgiu dos estudos deste pensador. A razão para esta escolha ocorre porque estas noções formam um vasto conjunto científico, macro, sob o qual se encaixam inúmeras propostas e trabalhos pedagógicos, materiais didáticos, ideias e inspirações para avalizar a interação entre indivíduos, entre professor e aluno etc. Enfim, as ideias de Vygotsky (e Teoria histórico-social) conferem significado à questão dos pré-requisitos, justificam a mediação, a discussão entre professor e aluno, relacionando desenvolvimento e aprendizagem. Por estes motivos elas são adotadas, embora tenham menor participação que as de Bordenave e Pereira. O corpo de saberes referentes à Vygotsky é uma espécie de “guarda-chuva” sob o qual se acomodam vários modos de 31 trabalho em conjunto com alunos ou indivíduos quaisquer; já os primeiros autores estariam mais próximos de uma espécie de estratégia específica aqui adotada, constituindo nossa fonte principal. 2.2 Ideias orientadoras de Bordenave e Pereira No capítulo X do livro destes autores, ‘O desenvolvimento da atitude científica nos alunos’, encontram-se as principais concepções usadas em nossa estratégia, de elaborar uma espécie de estudo dirigido para o texto de Feynman. É útil recordar nossa principal intenção com a elaboração deste material, que consiste em tentar promover um melhor estudo do texto-base do que um leitor o faria lendo-o apenas uma vez, sem nenhuma espécie de subsídio. No início do tópico relativo a este tipo de estudo, os autores enfatizam que se trata de uma atividade feita pelos alunos, com roteiros indicados previamente pelo professor. A atividade começa, então, pela leitura de texto escolhido pelo professor; leitura que deve ser ativa, e não passiva. Assim, num estudo dirigido, utilizando sua própria criatividade em interpretar e extrapolar o conteúdo textual, “[...] o aluno, seja individualmente, seja em grupo, terá que trabalhar bastante no texto entregue pelo professor, [...]” (BORDENAVE; PEREIRA, 2015, p. 266). As utilidades do estudo em questão (se bem elaborado) seriam cinco funções positivas. Descreveremos estas funções (que têm um papel muito importante em nossa proposta/experiência) quase que apenas com nossas próprias palavras. Anunciemo-las não na ordem de Bordenave e Pereira, mas das mais às menos significativas no contexto deste trabalho – conforme acreditamos. Primeiramente, as mais pertinentes seriam a de que o estudo dirigido apresenta-se aos estudantes como um desafio à sua capacidade analítica e criadora – não como leitura a mais –, e também os motiva, pois, ao se abordar um texto básico e interessante, a curiosidade se desperta. Em segundo lugar, vem a valiosa noção de que se incentiva o aluno a perceber lacunas no texto e a julgar a validade de suas afirmações, o que desenvolve a capacidade de observar e avaliar (consciência crítica) (BORDENAVE; PEREIRA, 2015, p. 266). Mas seria bom adotar uma postura pouco menos otimista que a dos autores, e afirmar que esta espécie de estudo é capaz de motivar os alunos (ou ao menos uma boa parcela destes), quando se utiliza um texto básico e interessante, tendo potencial em despertar-lhes curiosidade. Desse modo, o estudo se mostraria – possivelmente para uma boa fração de 32 estudantes – como desafio à capacidade analítica e criadora (e não como leitura adicional qualquer). Relativamente à segunda utilidade citada, poderíamos dizer que a capacidade de consciência crítica – em observar, avaliar – tem potencial de se aprimorar, se elevar, ao se estimular os alunos no julgamento da validade de afirmações e na percepção de lacunas textuais. Bordenave e Pereira não esclarecem o que seriam as lacunas de um texto. Ao menos em várias partes do livro em que se fez a leitura/estudo, não se encontrou descrição, definição (ou exemplificação) deste termo. Mas, em consulta às acepções do Dicionário eletrônico Houaiss da língua portuguesa 1.0, encontramos a primeira delas, que se refere a um significado que pode ser aceito: “espaço vazio, real ou imaginário; falha, falta.”, pois o primeiro exemplo desta acepção é justamente “um texto com grandes l.” (HOUAISS, 2009). Daí poder-se-ia interpretar a palavra como trechos ausentes, incorreções, falhas de qualquer natureza etc., ou até como conteúdo que poderia estar presente para melhor descrição, análise e exemplificação de alguns trechos. As demais funções positivas, também importantes como as primeiras aqui explicitadas, consistem na ideia de que o estudo dirigido desenvolve a capacidade analítica, pois a compreensão do tema contido no texto básico se alcança pela análise cuidadosa deste; de que o estudo ensina a integração de ideias, pois se espera que os estudantes organizem suas ideias na síntese final; e, por fim, de que este “Excita o talento criador ao oferecer oportunidades de manifestações pessoais de tradução, interpretação e extrapolação.” (BORDENAVE; PEREIRA, 2015, p. 266). Esta última função positiva talvez não seja de grande significância aqui; no entanto, ela poderá manifestar validade em algum aspecto. De maneira análoga ao considerado para as duas primeiras funções, é útil ser menos direto e, de certo modo, menos otimista que Bordenave e Pereira. Daí, ressaltaríamos que um estudo dirigido não necessariamente desenvolve a capacidade de análise, mas contribui em seu aprimoramento quando há entendimento do tema do texto – através do esforço, do cuidado analítico do leitor. Logo, teria o potencial de auxiliar na integração de ideias, pois é esperada, numa espécie de síntese final, a organização destas pelos alunos. Alguns argumentos anteriormente apresentados apontam que, realmente, pode se considerar o texto básico e interessante, características cruciais para nossos autores – pois atrairia a curiosidade no leitor (BORDENAVE; PEREIRA, 2015). E ainda que a coleção do cientista não seja introdutória (comparada a outras de Física elementar de nível superior), esta possui muitos textos, trechos, que podem ser bem aproveitados num curso de Física (ou afim). 33 Com razão, o texto do físico é básico em vários aspectos (seu nível matemático é razoável, o conhecimento de TRE para a leitura pode ser elementar etc.), ainda que sejam tratadas algumas noções meio intrigantes – como a de que o fio está neutro num referencial e carregado noutro. Afinal, determinados aspectos que conectam o Eletromagnetismo à TRE já têm esta característica intrigante. Isto, de certo modo, é bom para nossa proposta, pois se encaixa no argumento de Bordenave e Pereira (2015, p. 266), de que “[...] o estudo dirigido é apresentado aos alunos como um desafio à sua capacidade analítica e criadora, [...]”. Ora, se o estudo assim pode se apresentar ao leitor, também o texto que lhe serve como base pode fazêlo. Para alunos e professores que realmente gostam de Física teórica, o texto é, sem dúvida, interessante, tendo bom potencial em gerar interesse nos que preenchem os prérequisitos para leitura. Pois este versa quase que apenas sobre elementos teóricos, numa descrição de interação eletromagnética sob a ótica da TRE, usando conceitos clássicos de força e apontando significativos aspectos teórico-conceituais integradores do Eletromagnetismo e da TRE – como o de que a Teoria Eletromagnética já tem formulação relativística (GAZZINELLI, 2009). A possibilidade do texto de Feynman em despertar interesse concorda plenamente com uma das funções positivas de Bordenave e Pereira (2015), ao motivar os alunos. Outra consideração importante, nesta pesquisa, refere-se ao fato de que – para a leitura ativa – são necessários pré-requisitos, seja da parte do estudante ou do professor. Bordenave e Pereira, no capítulo II de sua obra (intitulado ‘O que é aprender’), abordam um pouco desta temática no estudo de casos, partindo da observação real de situações de aprendizagem; e esclarecem: Observa-se também nos exemplos acima que toda aprendizagem se baseia em aprendizagens anteriores. Fonseca não poderia aprender a inseminar uma vaca se não conhecesse previamente vários aspectos da anatomia animal, bem como a existência de diversos tipos de instrumentos. Dias não poderia entender o assunto de estatística matemática se não conhecesse centenas de conceitos e princípios que intervêm no assunto atual (BORDENAVE; PEREIRA, 2015, p. 25, destaque do autor). Apenas relacionando estes fatos às valiosas ideias experimentais de nossos principais referenciais pedagógicos, concluímos que o estudante ou professor não compreenderá o texto (ou, pelo menos, não o entenderá bem) se não tiver o conhecimento prévio introdutório de certos elementos, já mencionados. 34 Os autores abordam esta temática (relativa aos saberes prévios, ou aprendizagens anteriores), pois ela é um dos pontos-chave para fornecer possíveis respostas do problema da aprendizagem, ou seja, em que consiste (a aprendizagem) e como se poderia facilitá-la. Eles partem de mensurações reais do procedimento (segundo sua orientação), procurando discernir seus elementos, processos, que seriam os pontos-chave que vêm à tona pela observação de experiências (BORDENAVE; PEREIRA, 2015, pp. 23-24). Enfim, a abordagem destes é mais prática, empírica; e no que diz respeito aos pré-requisitos, será aqui complementada com certos elementos da teorização de L. Vygotsky e Teoria histórico-social. Passemos, agora, à descrição das orientações de Bordenave e Pereira (2015) no tocante ao planejamento de estudo dirigido. No item ‘Como planejar o estudo dirigido’ os autores indicam três etapas: síncrese, análise e síntese. Na primeira, uma visão sincrética, global do texto, seria solicitada do aluno, por intermédio de simples normas dadas pelo professor; também, títulos e subtítulos seriam observados, com o fim de se adquirir uma visão estrutural ou de organização do trabalho a se estudar. Na segunda etapa (análise) seriam propostas questões claras e simples a serem feitas – seja interpretando ou associando ideias, as intenções do autor, desenvolvendo a criatividade e exercitando o raciocínio e imaginação. Enfim, a etapa final (síntese) deveria propor a resolução de problemas práticos, baseando-se no que o estudante leu e assimilou. Ainda nesta, o professor solicitaria “[...] conclusões do aluno, sobretudo quando for possível a pesquisa complementar.” (BORDENAVE; PEREIRA, 2015, p. 267). Preferimos crer, em relação à etapa de síntese, que problemas práticos basear-se-iam no que o aluno provavelmente assimilou, pois não parece fácil postular até que ponto (em média) a assimilação ocorre (a não ser que se faça pesquisa adequada). Mas atividades práticas não têm muito significado em nosso contexto, pois a ênfase do texto é quase puramente teórica; uma experiência de pensamento idealizada, aproximada, que não enfoca aplicações mais técnicas, de engenharia etc. Assim, a última etapa não é abordada neste trabalho, a não ser em relação ao fato de que a ideia de pesquisa complementar foi, de certo modo, elaborada; no sentido de que se produziu um material de suplemento para questões sugeridas no material – contendo algumas considerações sobre aspectos correlacionados à TRE, ao Eletromagnetismo e ao texto de Feynman. Também, as etapas não foram seguidas com rigor, pois dependem significativamente do tema, texto, da disponibilidade de condições ao professor e aluno etc. Por estas razões, referimo-nos à proposta de material não propriamente como um estudo dirigido (segundo estes autores), mas como uma espécie deste. 35 A ideia a respeito da observação de título, subtítulos etc., para perceber a estrutura, organização, pode ser útil ao texto de Feynman – tomado isoladamente –, haja vista que seu único título já nomeia um aspecto valioso do tema integrador entre a TRE e o Eletromagnetismo. Esta ideia também pode ter utilidade na obtenção desta percepção se aplicada ao material em sua totalidade. As últimas ideias orientadoras, de Bordenave e Pereira (2015), em referência ao estudo dirigido, são as do quarto item: ‘Como elaborar um estudo dirigido’. Praticamente não se fez uso destas ideias, devido a uma falha meio grosseira presente no livro, somente percebida (pelo autor deste texto) após elaboração e aplicação do material para certos estudantes; e, inclusive, depois de preparar um tipo de questionário avaliativo – que foi respondido por alguns. Acreditamos que a falha pode ter prejudicado a preparação e até a aplicação da proposta. Ela é um pouco complicada de se perceber, pois o item quatro está fora do seu devido lugar, além de não ter a formatação que o destaque – diferentemente dos outros três. Com efeito, este item está inserido em um quadro (que contém o primeiro exemplo de estudo dirigido dado pelos autores), constando como quase todo o texto da ‘IV Parte’ do primeiro exemplo. Esta parte se caracteriza pelo termo: Painel de correção. Porém, logo abaixo deste vem o título do quarto item – citado acima –, que versa apenas sobre aspectos passíveis de se aplicar em qualquer estudo, aparentemente sem menção específica ao referido painel (e ao exemplo sobre domesticação de animais) (BORDENAVE; PEREIRA, 2015, pp. 269-270). Os aspectos do item, que podem atuar como noções muito valiosas para a avaliação do material (já que não se procurou segui-las), estão divididos em cinco seções: objetivos; seleção de texto; análise do texto; elaboração das questões; e, por fim, análise do estudo dirigido pelo próprio docente, antes de aplicar. Nestas seções, as ideias são sucintamente delineadas pelos autores, e agiriam como questionamentos – que o professor pode responder enquanto prepara o material para estudo. A primeira (objetivos) apresenta apenas duas perguntas, a saber: “que informações desejo que meus alunos adquiram?” e “que habilidades intelectuais eles precisam desenvolver?” (BORDENAVE; PEREIRA, 2015, p. 269). A segunda (seleção de texto) já nos aponta mais ideias, relativas ao questionamento do seguinte: o que há no texto a fim de satisfazer os objetivos selecionados; o que este possui para gerar interesse nos estudantes; o que o texto tem relacionado à unidade e às necessidades dos alunos; como deveria ser passado a eles (impresso ou no próprio livro etc.); se a linguagem textual se adéqua ao público; e, por fim, de o texto ter sido escolhido entre os melhores sobre o tema (BORDENAVE; PEREIRA, 2015, p. 269). Cremos que este último aspecto, sobre escolha do texto, é muito importante. Ao destacar estas ideias com nossas 36 próprias palavras, estamos, até certo ponto, tentando expressá-las melhor que Bordenave e Pereira. Em relação à terceira seção (análise do texto), estes apontam que o professor deve proceder na avaliação de determinados elementos, a saber: termos novos; novos conhecimentos (tanto dos que vêm à tona de forma clara quanto dos que precisam de explicação); possibilidades para que associações e relações sejam feitas pelos estudantes, e também para que raciocinem; extensão textual; necessidade de adaptação, reestruturação ou condensação (BORDENAVE; PEREIRA, 2015, p. 270). A questão da análise de termos e conhecimentos novos é bem valiosa. Realmente, vários conceitos, ideias etc. – relativas à Física – surgem frequentemente com nomes distintos, o que, até certo ponto, pode ser considerado um novo saber – no sentido de que o leitor amplia seu horizonte de vocabulário. Isto é significativo no que diz respeito ao estudante. Quanto à elaboração de questões (quarta seção) de Bordenave e Pereira (2015, p. 270), estes enfatizam, primeiramente, que a leitura deve ser orientada quanto à “terminologia, fatos, conceitos, classificação, análise, crítica.”. Em segundo lugar, destacam que a assimilação de conhecimento e o desenvolvimento de habilidades deve se orientar por intermédio da elaboração de perguntas que exijam: respostas elaboradas mentalmente, revisão de classificação, formulação de esquema e/ou relação entre fatos; explicação de termos; formulação de conceitos próprios e/ou extrapolação; interpretação gráfica, de símbolos e/ou legenda; crítica ou avaliação; e, finalmente, [...] conhecimentos apresentados no texto e, mais ainda, a associação de conhecimentos adquiridos anteriormente requerendo o uso de habilidades intelectuais. Podem ser usadas questões abertas, ordens diretas, perguntas de múltipla escolha, perguntas verdadeiro-falso, ou a técnica de lacunas (BORDENAVE; PEREIRA, 2015, p. 270). Percebe-se que os autores mantêm uma postura abrangente no último quesito, isto é, eles abarcam muitos elementos orientadores. Obviamente, pautar-se em todos estes na preparação de questões é praticamente impossível, pois dependem do texto (de seu tema, extensão, linguagem etc.), das necessidades dos alunos e da disponibilidade de diversas condições. Isto implica que, para certo texto básico – como o de Feynman –, algumas orientações aplicam-se mais, mas outras não têm muito sentido. Enfim, na última seção, que consiste em análise do estudo (pelo professor) antes de aplicar, Bordenave e Pereira (2015) propõem que o educador resolva as questões, verificando- 37 as em relação à clareza e compreensão. A disposição destas questões e o tempo gasto na resolução também devem ser analisados; e, por fim, partindo-se dos objetivos, devem ser preparados meios de avaliação do estudo dirigido. A correção pode se dar de várias maneiras, ou seja, de modo global, individual, em grupo, cruzada, em painel etc. 2.3 Vygotsky e a Teoria Histórico-social Foram já citados Vygotsky e a Teoria histórico-social, nas justificativas para a escolha de nossos referenciais teórico-pedágicos; nestas, ressaltamos que esta teoria (junto aos estudos do cientista) compõe uma área científica abrangente, no sentido de que se insere em diversas formas de trabalho, materiais didáticos, com alunos – ou outros indivíduos –, fundamentando a interação com estes. Ao nos referirmos à mencionada teoria (histórico-social) de Vygotsky, importa-nos o que foi (e é) aplicado no ramo educacional, usualmente entendido como provindo de Vygotsky e/ou do desenvolvimento de suas ideias. Enfim, tentaremos expor, relacionar, ideias que, por vezes, livros e artigos associam ao pensador e à sua teoria. Segundo Ferrari (2008), Vygotsky atribuía um papel essencial às relações sociais no processo de desenvolvimento intelectual e cognitivo, isto é, as interações sociais dos indivíduos entre si e com o meio no qual habitam são cruciais nestes amadurecimentos. O autor desta dissertação considera este elemento muito importante. Embora a noção acima possa parecer (para alguns) bastante óbvia, os conteúdos relacionados à Psicologia educacional, com razão, são bem complexos. Vygotsky, citado por Toassa (2013, p. 65), estava ciente da complexidade do tema há mais de oitenta anos atrás, ao afirmar que a “[...] psicologia pedagógica lida com fatos e categorias de caráter e ordem mais complexos que uma reação ou um reflexo isolado e, em geral, que tudo aquilo pesquisado pela ciência atual sobre a atividade nervosa superior do ser humano.”. Esta crença possivelmente se estende, em parte, para a atualidade, apesar de que também se sabe que as pesquisas sobre a mente e cérebro humanos – e os aspectos cognitivos relacionados – sofreram enormes avanços desde a época do pensador. Outra concepção relevante de Vygotsky diz respeito às zonas de desenvolvimento. Na proposta de estudo aqui desenvolvida, parte-se do pressuposto de que os alunos já se encontram na zona de desenvolvimento real (ZDR), um conceito parcialmente descrito na obra A formação social da mente, de Vygotsky (Vigotski, 1998). Talvez este conceito – e o referente à zona de desenvolvimento proximal (ZDP) – sejam os mais conhecidos e divulgados (atribuídos à Vygotsky), além de serem amplamente adotados em teorias 38 educacionais, psicológicas etc.; fato que facilmente se percebe em disciplinas pedagógicas da graduação e em livros, artigos sobre o assunto. Segundo Vygotsky, o aprendizado deve se combinar de algum modo com o nível de desenvolvimento de uma criança. O nível em que a criança se encontra é denominado nível de desenvolvimento real. Daí, a zona de desenvolvimento seria uma espécie de distância entre este nível real – conhecido a partir da solução independente da criança – e um nível de desenvolvimento potencial, conhecido pela solução de problemas sob a orientação de um adulto e/ou de colega mais adiantado (VIGOTSKI, 1998). Portanto, a zona de desenvolvimento proximal (ou potencial) determina-se por problemas que a criança não é capaz de resolver independentemente, fazendo-o apenas com assistência; assim, encontram-se nesta zona funções ainda não amadurecidas, mas em processo de maturação. Noutras palavras, Vigotski (1998) defende que o desenvolvimento mental retrospectivamente se caracteriza pela zona real, enquanto o desenvolvimento prospectivamente é caracterizado pela zona proximal. Estas concepções foram estendidas, aplicadas, por pesquisadores da educação, aos indivíduos adultos, como se percebe nitidamente em livros e artigos sobre o tema. É bem interessante a interpretação de Carlos Fino, ao ressaltar que a ZDP é, essencialmente, uma área de dissonância cognitiva, correspondente ao potencial do aprendiz; este autor afirma: Representando a ZDP a diferença entre o que o aprendiz pode fazer individualmente e aquilo que é capaz de fazer com a ajuda de pessoas mais experimentadas, [...], esta formulação de Vygotsky reforça, simultaneamente, a importância do princípio de prontidão, que implica a necessidade do aprendiz ter alcançado um determinado estado de aptidão para apreender determinado material cognitivo (FINO, 2001, p. 281). A elaboração de Vygotsky pode ser interligada às ideias de Bordenave e Pereira. Vimos que estes últimos confirmam a necessidade de pré-requisitos (o que denominam aprendizagens anteriores) para o ensino superior, partindo do estudo de casos, ou seja, da experimentação real de aprendizagem. Estas pré-aprendizagens estariam relacionadas, então, ao estágio de aptidão – ou a uma espécie de princípio de prontidão, como destaca Fino (2001) – alcançado pela criança ou adulto, e que caracteriza a ZDR. O desenvolvimento retrospectivo da estrutura mental (inter-relacionado ao que a pessoa resolve, soluciona, independentemente do auxílio de outros) consistiria, desse modo, nas funções, conhecimentos, aprendizagens etc. já amadurecidas e conectadas à zona real de um indivíduo. 39 Aplicando estes argumentos ao texto de Feynman, conclui-se que o conhecimento prévio introdutório de determinados conteúdos (já citados) é imprescindível para uma boa leitura ativa do texto, errata etc., e também para a resolução de questões. Caso os prérequisitos não estejam bem amadurecidos na estrutura cognitiva real do leitor (compondo sua ZDR), é bem possível que a leitura ativa seja prejudicada, pois o leitor provavelmente não produzirá o devido esforço necessário ao estudo – usando-o na interpretação textual. Daí, de forma análoga, a tentativa de resolução das questões se prejudicará, uma vez que o leitor será incapaz – ou pouco capaz – de bem interpretar ideias, intenções do autor etc., exercitando o raciocínio. Sobre o fato de que as concepções de ZDR e ZDP se aplicam aos adultos, Seth Chaiklin (2011), por exemplo, ao enfatizar que a ZDP atualmente aparece em muitas obras de Psicologia geral – bem como na maioria dos manuais de Psicologia do desenvolvimento e educação –, cita que o conceito tem sido amplamente empregado ou citado em estudos sobre ensino-aprendizagem nas mais variadas áreas do conhecimento; em distintas populações de alunos (inclusive crianças com dificuldades de aprendizagem, déficit intelectual); em adultos; em pesquisas sobre tecnologia de informação; em discussões sobre a formação de professores e de profissionais de enfermagem etc. Também Deborah W. Kilgore (1999) aplica a zona de desenvolvimento próximo em adultos, e Myriam N. Torres (1996) a emprega em discussões a respeito da formação de professores, ou seja, em pessoas adultas; estas duas últimas são citadas por Chaiklin (2011). Kilgore, p. ex., propõe uma teoria de aprendizagem coletiva que, como crê a autora, é mais adequada que teorias individualizadas no estudo de pessoas e grupos engajados em ação coletiva de defesa e promoção de uma visão social em comum. Enfim, se a ZDP é aplicável nos adultos – e, portanto, nos estudantes de ensino superior –, também a ZDR o é, pois os dois conceitos estão intrincadamente relacionados, sendo mutuamente dependentes. Então, certas noções teóricas de Vygotsky têm larga validade e aplicação em pesquisas educacionais (bem como na Psicologia); estas concepções, de certa forma, complementam alguns relatos empíricos de Bordenave e Pereira (2015) (sobre a pré-aprendizagem, aqui mencionados), dando mais significado aos pré-requisitos e apontando a relevância do desenvolvimento cognitivo real – a fim de que o indivíduo avance no desenvolver de habilidades, saberes etc. Assim, a questão dos pré-saberes é de grande importância no estudo dirigido aqui proposto, de uma maneira geral. Segundo Ivan Ivic (2010, pp. 12-13), a teoria de Vygotsky compõe um paradigma importante da psicologia do desenvolvimento, ao insistir nos aportes da cultura, nas interações 40 sociais e na dimensão histórica do desenvolvimento mental; este paradigma – assim como a teoria de Jean Piaget (1896 - 1980) – é uma notável teoria do desenvolvimento mental. Ainda de acordo com Ivic, Vygotsky também elaborou terminologia passível de exprimir um corpo teórico original por ele criado. E a especificidade de sua teoria deveria ser definida, ao menos, por certos termos essenciais: interação social, signo e instrumento, sociabilidade humana, funções mentais superiores, cultura e história etc.; em resumo, poder-se-ia denominar este conjunto de teoria sócio-histórico-cultural do desenvolvimento das funções mentais superiores (IVIC, 2010, pp. 14-15). Sirgado (1991) afirma que a psicologia histórico-social de Vygotsky concebe o psiquismo como construção social, e encontra na mediação semiótica um importante conceito, correspondente à ideia da intervenção de fatores, elementos terceiros que possibilitem interação entre dois outros termos de uma relação. Dessa forma, como ressaltam Tunes, Tacca e Júnior (2005), é comum identificar o professor como um mediador, atribuindo-se esta ideia à Teoria histórico-social. Estes autores (ao discorrerem sobre o professor e sua atuação no ensino) destacam que existe o imperativo de penetrar e interferir no psiquismo do aluno – notadamente em seu pensamento – quando o professor se empenha em estimular a aprendizagem; esta necessidade antecederia a tudo, orientando a escolha dos modos de ensinar. Estas concepções, citadas nos últimos parágrafos, compõem um leque de conceitos, ideias e inspirações passíveis de fundamentar, avalizar, a interação entre professor e aluno – que é uma interação social. Ora, na teoria de Vygotsky, o ser humano é caracterizado pela sociabilidade primária, o que equivale a dizer (mais categoricamente) que as pessoas são geneticamente sociais – como afirma Henri Wallon, citado por Ivic (2010, p. 15). Hoje, esta tese é quase confirmada por recentes observações do desenvolvimento social na primeira infância, sendo, em parte, orientada geneticamente (IVIC, 2010). Cremos que alguma espécie de discussão do professor com estudantes, até certo ponto, poderia auxiliar na compreensão textual. Nesta proposição, parte-se do pressuposto de que o professor se engaje na aprendizagem de seus alunos, tendo o intuito (ainda que inconsciente) de penetrar-lhes os psiquismos – isto é, os pensamentos –, e também de que o docente, conjuntamente aos estudantes, constitui um significativo grupo social interativo. As citações, concepções, ideias, anteriormente colocadas, fundamentam estes nossos argumentos. Ivic (2010, p. 16) afirma que, na teoria vygotskyana, o ser humano necessariamente possui seu prolongamento nos outros; mas considerado em si, não estaria completo. Esta ideia é bastante valiosa, segundo a opinião do autor deste texto, e parece valer em diversos aspectos 41 da vida humana (talvez em quase todos), o que, grosso modo, reforça a tese histórico-social do desenvolvimento mental. Também segundo este autor, “Encontramos, ainda em Vygotsky, mas sob uma maneira diferente, o fenômeno do interpsiquismo: do ponto de vista psicológico, o indivíduo tem seus prolongamentos, de uma parte, nos outros, e de outra, nas suas obras e na sua cultura [...]” (IVIC, 2010, p. 20). Assim, pode-se dizer que um conjunto interativo social, formado por professor e estudantes, compõe-se numa relação de termos (pessoas) com seus prolongamentos psicológicos, seja do professor no aluno e vice-versa; e de cada um destes com o produto cultural, ou seja, o(s) conteúdo(s), matéria em questão. Continuando sua apresentação da extensão psicológica do indivíduo humano, Ivic (2010, p. 20) enfatiza que, deste modo, o desenvolvimento não se restringe apenas às alterações interiores na pessoa, mas que também se mostra como desenvolvimento passível de assumir duas formas diferentes: criação de instrumentos exteriores para produzir mudanças psicológicas internas; elaboração de auxiliares externos enquanto tais. Em relação ao primeiro (instrumentos exteriores), Ivic cita que há uma diversidade destes – orientados ao próprio homem – que podem ser usados no controle, coordenação etc. de suas próprias capacidades. Dois destes instrumentos, na opinião do autor desta dissertação, seriam os mais importantes da História ou estariam entre eles, isto é,“[...] a língua escrita e falada [...]” (IVIC, 2010, p. 20). E, em nosso contexto, é precisamente a língua falada o principal instrumento exterior na proposta de discussão entre professor e estudantes – sobre ideias/aspectos mais essenciais presentes em um texto (explícitas ou implícitas). Então, retomando a percepção de Tunes, Tacca e Júnior (2005), o professor seria associado, de certo modo e até certo ponto, a uma espécie de mediador que – tendo feito um bom esboço de discussão e refletido sobre ideias significativas – possui o imperativo de adentrar, influir, a estrutura do pensamento de seus alunos. Nesta intenção, a discussão oral iniciada e estimulada pelo educador teria possibilidade de produzir modificações internas na psique, por meio da língua falada como instrumento, elemento terceiro, externo, dirigida aos próprios participantes da discussão – os termos da relação. Enfim, isto pode ser útil para melhor compreensão de texto pelo aluno, dado o papel essencial que, de acordo com Ferrari (2008), Vygotsky garantia às relações sociais – no desenvolvimento intelectual e cognitivo. Noutras palavras, a interação social professor-aluno com um produto da cultura (um texto, suas noções importantes etc.) é passível de estimular a aprendizagem (que se correlaciona ao amadurecimento cognitivo, intelectual), ao gerar mudanças psicológicas nas estruturas mentais. 42 43 3 METODOLOGIA No presente capítulo, discorremos sobre uma proposta de oficina com o objetivo de aplicar o material elaborado para estudo dirigido. É também apresentada nossa proposta de avaliação do material. Obviamente, as argumentações, considerações deste capítulo, podem ser concatenadas aos referenciais teórico-pedagógicos, às justificativas (dentre outros aspectos) anteriormente constantes – ou ainda a certas ideias, fundamentações, julgadas úteis. 3.1 A ideia de uma oficina A oficina, devidamente combinada com o Coordenador do curso de Física da PUC Minas – Professor Flávio de Jesus Resende –, ocorreu em uma quinta-feira, 14 de maio de 2015, tendo início às 15 horas e 20 minutos (no campus Coração Eucarístico). A sala utilizada abarcava perfeitamente atividades feitas com um máximo em torno de 15 a 20 alunos. O título da oficina foi ‘Conexão entre a Relatividade Especial e o Eletromagnetismo – A relatividade dos campos magnéticos e elétricos de Richard P. Feynman.’. Preparou-se um pequeno banner (cartaz) formal – em papel A4 – para o encontro, com o fim de ser exposto e auxiliar em sua divulgação; este é mostrado na Figura 1, na página seguinte. 44 Figura 1 – Cartaz preparado para a divulgação da oficina Departamento de Física e Química Curso de Física OFICINA: Conexão entre a Relatividade Especial e o Eletromagnetismo - A relatividade dos campos magnéticos e elétricos de Richard P. Feynman A oficina abordará texto de R. P. Feynman que trata da relação entre a Teoria da Relatividade Especial e o Eletromagnetismo. Feynman demonstra que os efeitos relativísticos de contração do espaço e dilatação do tempo estão presentes no contexto da Teoria Eletromagnética, mesmo se a velocidade entre referenciais inerciais for muito baixa. Sob o ponto de vista da Relatividade Especial, os campos e as forças elétricas e magnéticas tornam-se grandezas e conceitos completamente relativos, mas as equações de Maxwell se preservam (não necessitam de correção relativística); a lei de invariância/conservação da carga elétrica e os Postulados de Einstein são satisfeitos. Gabriel Ferraz Rubinger de Queiroz Graduado em Física pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – PUC Minas (2011). Tem experiência nas áreas de Ensino de Física. Atualmente é mestrando do Programa de Pós Graduação em Ensino de Ciências e Matemática da PUC Minas Serão sorteados quatro livros: Sobre as leis da física, de R. Feynman; O ano miraculoso de Einstein: cinco artigos que mudaram a face da física e A Teoria da Relatividade Especial e Geral, de A. Einstein; Teoria da relatividade especial, de Ramayana Gazzinelli. Pré-requisito: Fundamentos do Eletromagnetismo Quinta-feira 14 de maio de 2015 às 15h20min Laboratório A - sala 120 do prédio 34 Inscrições: [email protected] (até 10 de maio) Fonte: Arquivo pessoal 45 No banner – formatado pelo Prof. Flávio de Jesus Resende –, procuramos já apontar o tema textual (de modo bem geral), se assim se pode dizer, isto é, a conexão entre a Teoria da Relatividade Especial e o Eletromagnetismo. Com efeito, é possível que o título do texto não seja muito propício para descrevê-lo, haja vista que Feynman vai além da questão da relatividade dos campos, produzindo uma discussão relativamente curta e profunda sobre a relação existente entre ambas as teorias. Assim, acreditamos valiosa uma breve citação de alguns aspectos textuais importantes neste cartaz, o que pode ter gerado no participante ao menos uma ideia (ainda que vaga) de assunto contido explícita ou implicitamente no texto. É interessante fazer um paralelo do banner com uma proposição da fase de síncrese de Bordenave e Pereira (2015), isto é, a de que estudantes devam observar títulos, subtítulos, adquirindo uma visão estrutural, organizacional, do trabalho a estudar – na primeira etapa de um estudo dirigido. Neste trabalho, a leitura do aluno da descrição textual no cartaz entraria como uma espécie de proposta até certo ponto complementar à de Bordenave e Pereira. Obviamente, a informação em um cartaz de divulgação deve ser objetiva, organizada, possivelmente sucinta, até para que os potenciais participantes tenham vontade de lê-lo. Claramente, a preparação de um banner é diferente do sugerido pelos autores acima; porém, tal instrumento pode fornecer, grosso modo, uma sucinta visão global do tema e/ou espécies de “subtítulos” de certos aspectos, conteúdos relevantes do texto – ou correlacionados. O banner foi enviado via e-mail, pelo Prof. Flávio de Jesus Resende, para diversos estudantes do curso de Física da PUC Minas. No que concerne aos pré-requisitos – tendo em conta dificuldades encontradas –, foi realmente necessário solicitar apenas a matéria referente aos fundamentos de Eletromagnetismo, disciplina em que os estudantes têm, pelo menos, um contato introdutório com as leis fundamentais desta teoria – em sua forma integral. O cartaz também foi exposto no prédio 34 (onde circulam inúmeros estudantes de ciências exatas, informática etc.), com o objetivo de reforçar o convite e também estendê-lo a possíveis participantes destes cursos, interessados no tema. A abordagem de diversas dificuldades (com as quais nos deparamos nesta aplicação experimental) será feita posteriormente nesta dissertação; também serão produzidas considerações, sugestões etc., com a intenção de que o professor procure contorná-las. Nosso propósito original era o de convidar somente alunos que preenchessem todos os pré-requisitos aqui descritos. Inclusive, as questões propostas foram elaboradas a partir desta pressuposição. Quanto ao conhecimento de determinados elementos (básicos) de cálculo integral e diferencial, cremos que estava já implícito nos fundamentos da Teoria 46 Eletromagnética, ou seja, os estudantes que cursaram esta matéria já tiveram contato, ao menos, com certas noções e aplicações destes cálculos. Além disso, a resolução de questões matemáticas, em nosso material, não exige saberes avançados do cálculo, mas consiste em exercícios mais básicos que possuem simetria geométrica cilíndrica – de campos estáticos relacionados a um condutor cilíndrico (fio) reto e infinito. Estes exercícios são geralmente feitos por muitos alunos das ciências físicas, engenharias e cursos afins. A ideia de sorteio de livros veio do autor deste documento. Como justificaremos adiante, houve o problema referente ao público, isto é, verdadeiramente se deparou com a possibilidade da falta de quorum. Além dos quatro livros listados no cartaz, sorteou-se ainda um quinto, que não precisa ser citado; o sorteio não teve influência em nossa proposta de estudo, de oficina e no que já foi aqui considerado etc. Também, nenhum participante mencionou-o ou cobrou-o. Este se fez apenas após a oficina, e somente o autor deste texto dele se recordou. Porém, é válido crer que pode ter estimulado a participação de um ou outro aluno. Participaram sete estudantes da PUC Minas, seis homens e uma mulher (aparentemente todos com idades entre 20 e 32 anos, pelo que se constatou nos perfis de alguns, na rede social Facebook®). Dentre estes, cinco do curso de Física, um rapaz da Engenharia Eletrônica e de Telecomunicação e outro rapaz que não solicitou inscrição ao Prof. Flávio de Jesus Resende. Após o encontro, o autor desta dissertação contatou os seis participantes identificados, pela rede social acima, solicitando-lhes informação sobre o sétimo; no entanto, não o identificamos. Tendo lhes questionado (logo antes do início da oficina) quais os seus cursos de graduação, permanece apenas a lembrança de que este último era aluno de algum curso de engenharia. Os nomes dos alunos, seus respectivos cursos e emails acadêmicos foram enviados ao e-mail pessoal do autor deste texto pelo Prof. Flávio Resende – até a noite anterior à oficina. Consideramos útil preparar um texto introdutório, uma espécie de apresentação de nossa proposta de estudo do texto de Feynman, da errata, das questões etc. Este texto foi denominado ‘Considerações ao estudante’. Nosso propósito inicial era enviá-lo por e-mail (com certa antecedência) aos alunos, solicitando-lhes, por gentileza, sua leitura atenciosa antes do encontro; porém, devido a problemas com os prazos de inscrição e disponibilidades de tempo, foi praticamente inviável enviar-lhes o documento antes da oficina. Isto poderia ter sido realizado, mas somente na véspera do encontro. As ‘Considerações ao estudante’ foram passadas aos alunos junto à errata do texto e às questões elaboradas (mais as devidas referências bibliográficas destas partes e algumas folhas 47 em branco para respostas/resolução). Isto consistiu no material impresso entregue ao aluno. Obviamente, também se disponibilizou o texto de Feynman (em português). Sabia-se de antemão que não haveria tempo para a leitura das ‘Considerações ao estudante’ durante a oficina. Assim, os participantes foram advertidos a este respeito, e lhes solicitamos a leitura desta parte em casa. Foram realizadas modificações nas ‘Considerações ao estudante’, após a aplicação experimental. Com efeito, este documento estava meio longo, com certos trechos possivelmente desnecessários. Cremos que isto poderia repelir alguns leitores. A tentativa de mudança inspirou-se em Bordenave e Pereira (2015), autores que exemplificam estudos dirigidos mais concisos – além de outras atividades com esta característica. Porém, o encurtamento do texto introdutório ao estudante não foi bem sucedido; provavelmente isto ocorreu devido ao esforço do autor deste em ressaltar todos os aspectos, no texto, julgados pertinentes para o estudo. Também, deve ser tomada em conta a prolixidade deste autor (por vezes excessiva). Citamos, anteriormente, a real possibilidade de falta de quorum. Uma alternativa para o problema, vislumbrada em reunião previamente combinada na PUC Minas (com o Coordenador do curso de Física, o autor deste texto e seu orientador), foi solicitar apenas o pré-saber de disciplina relativa aos fundamentos de Eletromagnetismo – em que, conforme mencionado, estariam já implícitas noções básicas de cálculo. Daí, vimo-nos obrigados a tentar (de algum modo eficaz) cobrir os pré-saberes referentes à Teoria da Relatividade Especial. Pedir aos alunos o estudo independente do tema seria inviável na prática, haja vista o caráter voluntário da oficina, o relativamente curto intervalo de tempo (do dia desta reunião até o encontro) e o não conhecimento de texto, material etc. – bem sucinto e de qualidade –, capaz de explanar os saberes prévios da TRE (de modo elementar ao universitário) necessários à boa leitura do texto. Mesmo que se encontrasse tal material, ou preparássemos algum adequado, ter-se-ia falhado em tal processo, pois muitos alunos atrasaram as inscrições. De fato, suspeitamos que os atrasos ocorreriam, e estipulamos a data limite de inscrição, 10 de maio – como está no cartaz (banner) anterior –, mais como uma estratégia para estimular e adiantar inscrições do que propriamente um prazo limite. Enfim, se resolveu que o conteúdo referente à TRE devia ser exposto (no início da oficina e antes da leitura textual) pelo autor deste documento. Isto se fez através de uma aula razoavelmente curta – utilizando exposição visual em quadro e oral. 48 3.2 Aplicação da oficina Passemos, agora, a seções que se referem à aplicação feita durante o encontro, principalmente no que diz respeito à abordagem teórica de conteúdos da Teoria da Relatividade Especial (pré-requisitos faltantes), à leitura do texto de Feynman e à breve discussão (diálogo) – em sala de aula – sobre algumas importantes noções textuais. 3.2.1 Exposição teórica Com o objetivo de ganhar tempo, o autor deste texto deixou já preparada, no quadro, a maior parte da exposição visual relativa à TRE, além de separar previamente, para cada possível participante, doze conjuntos do material impresso com o texto de Feynman (que lhes foi disponibilizado) e mais algumas folhas em branco para respostas. A aula foi preparada, pensada, e algumas notas de aula produzidas, contendo quase tudo o que se expôs no quadro. É importante ressaltar que se perguntou aos participantes se já haviam visto disciplina que aborda a TRE ou, ao menos, se sabiam a maior parte dos elementos básicos (contração espacial, dilatação temporal, Princípio da Relatividade de Einstein etc.) a nível elementar. Como apenas dois alunos levantaram as mãos, partiu-se para a exposição do conteúdo – o que se deu no começo do encontro. Os estudantes se atrasaram um pouco, e a oficina teve início cerca de 10 a 15 minutos após o previsto; o autor deste texto decidiu aguardar ao menos a presença de quatro participantes para começar – a fim de se ter um público razoável, mas também porque dois alunos mais adiantados informaram que outros já estavam por vir. Os demais (dois ou três) atrasaram-se apenas mais alguns minutos. Destaque-se que, em relação aos pré-saberes da TRE, se cometeu um erro: foi esquecido o momento linear relativístico, isto é, não se atentou para o fato de que este também deveria ter sido abordado na oficina. Inclusive, nas ‘Considerações ao estudante’, impressas e entregues, esqueceu-se de citá-lo como pré-conhecimento pertinente para a leitura ativa; entretanto, isto foi feito em novo documento dirigido ao aluno – quando foram feitas alterações no material, mais discutidas adiante. A exposição de assuntos da TRE ocorreu basicamente de acordo com o descrito adiante, iniciando-se pelo efeito de dilatação do tempo. Fez-se um desenho do relógio de luz, uma experiência de pensamento bastante enfocada em livros técnicos de Física sobre a teoria. O desenho consistia simplesmente em dois referenciais inerciais, S e S´ (a mesma simbologia usada por Feynman), no qual se 49 considera S´ como em movimento uniforme e reto relativamente à S, e S é tomado como “em repouso”. Para isso, introduziu-se um vetor velocidade u em S´, desenhando-se os eixos y´ e y (paralelos) relativamente afastados um do outro, e x´ e x quase coincidentes (x´ muito pouco acima), apenas com a finalidade de visualização. Marcou-se as origens O e O´ dos sistemas coordenados; desenhou-se os espelhos superior e inferior, estacionários em S´ e paralelos aos eixos x´ e x; marcou-se um ponto – no espelho inferior, à meia distância de seus extremos – donde seria emitido e detectado (recebido) um raio luminoso (ou um fóton), após sua reflexão no espelho superior. Assim, o autor deste texto afirmou que começaria abordando este fenômeno (dilatação temporal), fazendo uso de experiência pautada nesta espécie de relógio pensado. Descreveu-se o par de referenciais, seus eixos coordenados etc., e o movimento como relativo, isto é, partiase do ponto de vista de que estávamos no referencial S em “repouso”, e que S´ se movia em relação à nós com velocidade u constante (o movimento ocorrendo apenas ao longo de x e x´). Mas, para um observador fixo em S´, é o sistema inercial S que se movimenta em sentido contrário, com velocidade –u. Afirmou-se bem que S´ apenas se movia ao longo do sentido positivo do eixo x com velocidade constante, mas que também se podia considerar a perspectiva contrária (devido à relatividade do movimento). Também se deixou claro que os eixos x e x´ deveriam ser tomados como coincidentes. O autor deste documento cometeu uma pequena falha em relação à descrição do conceito de referencial inercial (um de nossos pré-saberes), pois somente após citar o termo por vezes atentou-se para a necessidade de sua descrição. Este foi bem descrito, mas apenas de forma mais elementar, isto é, como referenciais em movimento reto uniforme (MRU) um relativo ao outro, nos quais é possível desprezar quaisquer forças gravitacionais. Também foi bem destacado que determinadas áreas da superfície terrestre podem ser aproximadamente tomadas como bons referenciais inerciais – devido ao campo gravitacional relativamente fraco e às suas variações muito sutis em certas regiões superficiais da Terra. Foi rapidamente enfatizado que na existência de interação (e/ou variação) gravitacional significativa – e/ou quando os referenciais são acelerados – deve se considerar a Teoria da Relatividade Geral, que incorpora a gravidade e/ou referenciais acelerados. Além disso, afirmou-se que o termo inercial provinha do fato de que, neste tipo de referencial, a lei de inércia de Galileu deve ser válida. Muito do que foi falado aos alunos, assim como os rascunhos de aula, baseou-se em autores como Gazzinelli (2009), Hewitt (2002), Taylor e Wheeler (1992) e Einstein (1999). Preocupamo-nos em destacar certos assuntos da TRE apenas de modo introdutório, estando 50 cientes de que o conteúdo físico apresentado contém aproximação, abstração, sutilezas etc., podendo ser expresso de modos ainda melhores, mais detalhados etc. Na continuação da exposição, destacou-se que o relógio luminoso possui mecanismo simples, facilitando a comparação dos intervalos de tempo Δt (em S) e Δt´ (em S´) (GAZZINELLI, 2009). Esta consideração de Gazzinelli é pertinente, pois o relógio indica de forma elegante e prática a previsão de dilatação temporal, aplicando a lei da constância no valor da velocidade da luz no espaço livre e a ideia de evento (neste caso, a emissão e a recepção da luz num mesmo ponto do espelho inferior, por meio de um foto emissor-detector imaginário). Adiante, são mostrados nas Figuras 2 e 3 os primeiros rascunhos de aula: 51 Figura 2 – Frente da primeira folha do rascunho Fonte: Elaborado pelo autor 52 Figura 3 – Verso da primeira folha do rascunho Fonte: Elaborado pelo autor Continuando a descrição da simplicidade deste relógio, o autor ressaltou que este é assim chamado, pois, mede intervalos de tempo periódicos, iguais ao tempo gasto pela luz em sua viagem de ida e volta, ou melhor, o tempo necessário para que, após o instante da emissão, a luz se reflita no espelho superior e retorne ao emissor-detector. Isto foi bem 53 enfatizado a fim de se chegar à ideia de eventos, isto é, destacar que na TRE geralmente se trabalha com este conceito (evento) que, a priori, é definido por uma posição e um instante de tempo – medidos em certo referencial inercial (EINSTEIN, 1999). Assim, os eventos tomados seriam a emissão e a posterior detecção da luz no emissor-detector; o que também se ressaltou bem. Dos rascunhos anteriores, apenas os desenhos, títulos (‘Dilatação do tempo’, ‘O relógio de luz, experiência de pensamento’) e a frase que explicita o ponto de vista abordado – de S´ em movimento relativamente à S em repouso, com velocidade constante para a direita – foram passados na lousa. Iniciou-se, então, a descrição do fenômeno, ao dizer que o intervalo de tempo medido por um observador em S´, entre os dois eventos, iria diferir do medido por observador em S, entre os mesmos dois eventos. Fez-se, aqui, uso do termo de Feynman, afirmando-se que, na comparação de intervalos temporais entre dois referenciais inerciais, os intervalos devem ser correspondentes – ou seja, mensurados entre os mesmos dois eventos. Esta declaração foi previamente pensada, é claro; o autor deste texto julga ser este o melhor termo (em português) para se referir aos intervalos de tempo na TRE, que somente encontrou no texto de Feynman (2008, p. 13–11). Começou-se a dedução da equação, que relaciona Δt e Δt´, pelo termo cΔt´ ; explicouse que este é a distância total (velocidade multiplicada pelo intervalo de tempo em S´ ) percorrida pela luz em seu caminho de ida e volta, medida em S´. Daí partiu-se para a explanação da Figura 3 dos rascunhos (acima), a perspectiva do observador em S, ressaltando ao aluno que, neste referencial inercial, S´ move-se uniformemente para a direita junto ao relógio que ali está estacionário. Assim, a trajetória correspondente do raio consiste em duas linhas retas em diagonal, uma para a ida do raio e outra para seu retorno ao foto emissordetector. Assim, do ponto de vista de S, a luz tem a componente de valor constante u de velocidade ao longo do eixo x; logo, deve se mover diagonalmente em S. Neste momento, enfatizou-se a lei da invariância no valor de velocidade da luz no espaço livre. Afirmou-se que este valor c é sempre o mesmo, em quaisquer referenciais inerciais; noutras palavras, se apontou que o módulo desta velocidade não depende do movimento relativo uniforme entre a fonte (emissor) e o observador, sendo igual para todas as frequências eletromagnéticas. É interessante notar que todos pareciam concordar com esta lei. A constância de c – que, por vezes, é considerada um dos postulados de Einstein – pode ser tomada como saber já presente na estrutura cognitiva de alunos, quando estes preenchem os pré-requisitos da TRE. Pois, cremos que indivíduos que têm conhecimento da dilatação 54 temporal, momentum linear relativístico etc., também conhecem tal lei – que é muito mais simples. Mas, em nossa exposição, foi cauteloso incluir este saber, uma vez que boa parte dos estudantes não preenchia os assuntos referentes à TRE. Enfim, a citada lei foi bem descrita; é preciso pouco tempo para tal. A esta altura, mais ou menos, um aluno fez perguntas confusas sobre o movimento relativo do relógio, os pontos de vista dos observadores etc. Explicitou-se, então, que o relógio está fixo em S´, e se deve pensar como este é observado neste referencial inercial (próprio ou de repouso), mas também como seria visto em S – um referencial onde o relógio está em movimento (relativo). A confusão do aluno serviu para esclarecer um pouco estas ideias. Até este momento haviam decorrido entre 10 e 15 minutos de oficina. Pelo o que se conseguiu captar, o estudante não havia percebido a relatividade do movimento, os distintos pontos de vista etc. Aparentemente, o aluno captou certas noções após a descrição acima. O autor deste documento confessa que, nestes minutos iniciais, estava meio ansioso e também preocupado com o tempo disponível. Por isto, talvez tenha se apressado um pouco na exposição, não se mostrando, de certo modo, aberto aos questionamentos. Recorde-se que a maioria da exposição visual foi previamente passada na lousa, incluindo partes dos rascunhos mostrados e a maior parte da dedução da equação referente à dilatação temporal. Isto facilitou muito, pois a descrição, até certo momento, consistiu apenas em apontar elementos no quadro. Apesar de que a exposição inicial possa ter sido um pouco apressada, o autor se preocupou em transmitir certas informações objetivas – que foram pré-pensadas, planejadas, escritas. Retornando ao relato da aula, informou-se que apenas interessava o módulo de distâncias, velocidades, intervalos temporais, em cada referencial inercial. Portanto, não era preciso considerar o vetor u para a luz, em S, bastando-se aplicar a lei da constância de c no espaço livre. Assim, a distância total percorrida pelo raio, em S (os dois trajetos em diagonal), é cΔt. Sendo o movimento uniforme e reto, estas diagonais são iguais e valem cΔt /2 cada uma; já a distância total percorrida pelo emissor-detector, na perspectiva de S, é uΔt. Sendo a metade desta uΔt/2, aplicamos o teorema de Pitágoras nos triângulos equivalentes da Figura 3, sabendo que o cateto transverso ao movimento (a distância entre os espelhos) iguala cΔt´ /2 (metade da distância viajada pela luz, em S´, em seu trajeto total neste referencial). Certas conclusões, do parágrafo anterior, foram ressaltadas um pouco rapidamente aos alunos; afinal, estas envolvem mais raciocínio geométrico do que conhecimento físico. Portanto, seguindo-se a matemática, obtemos a equação Δt = γ Δt´, mostrada na Figura 4: 55 Figura 4 – Frente da segunda folha do rascunho Fonte: Elaborado pelo autor Boa fração destes cálculos já constava na lousa, bastando explicá-los. O restante se deduziu facilmente. A matemática envolvida é muito simples, de tal modo que, aparentemente, não houve problema em sua compreensão. Após deduzir a equação, partiu-se para sua descrição; explicitou-se o fator de Lorentz γ, descrevendo-o como variável dependente apenas do valor de velocidade relativa u entre dois referenciais inerciais, sempre maior ou igual a um. Enfatizou-se que, quando u = 0, γ = 1, isto é, os intervalos temporais entre dois eventos são iguais, pois não há movimento uniforme relativo; há apenas um referencial inercial nesta situação. Destacou-se bem que, nas velocidades relativas cotidianas (inclusive de aviões a jato), na prática, não existe diferença significativa entre os intervalos de tempo, pois os valores de velocidade são muito pequenos se comparados a c. Logo, u2 /c2 é ainda menor, e γ tende a um. 56 Cremos que foi útil explicitar 1 , e fazer alguns comentários sobre este, pois está u2 1 c2 assim escrito em boa parte das equações do texto de Feynman. Também se apontou que a equação mostra que Δt é maior do que Δt´ quando γ é maior que um, mas que as diferenças temporais somente são apreciáveis se a velocidade u é significativa em relação a c. Relembrou-se, rapidamente, que os intervalos de tempo comparados devem ser correspondentes, ou seja, medidos entre os mesmos dois eventos. Neste ponto, vem uma consideração interessante. Afirmou-se que, no texto a ser feita a leitura, a velocidade relativa entre os referenciais inerciais é muito baixa; por conseguinte, do ponto de vista prático, os intervalos temporais podem ser considerados iguais nos dois referenciais. Mas teoricamente, a diferença temporal (dilatação do tempo) é uma previsão relativística que pode ser tomada no Eletromagnetismo, a fim de se mostrar que esta teoria se concilia (é compatível) com a TRE, não havendo contradição lógica entre ambas. Finalizando a dilatação temporal, introduziu-se o conceito de intervalo de tempo próprio (ou local ou de repouso). Ressaltou-se que este intervalo, entre dois eventos determinados, é o tempo decorrido em um referencial inercial no qual os eventos ocorrem numa mesma posição. Este corresponde ao menor tempo possível entre os eventos em questão; assim, é uma quantidade matemática invariante. Estas considerações foram feitas recordando-se o exemplo de relógio de luz – no qual é fácil perceber que o tempo próprio ocorre em S´ –, ainda que o desenho referente à perspectiva de S´ já houvesse sido apagado. Também, pelo desenho do panorama observado em S, destacou-se que, neste referencial, os eventos (emissão e detecção) ocorrem em posições diferentes – embora no mesmo emissordetector pensado. Dessa maneira, tem-se, em S, um intervalo de tempo denominado relativo, sempre maior que o tempo próprio. O autor se recorda de enfatizar que o maior tempo relativo (Δt) pode ser percebido pelo maior trajeto total viajado pela luz, em S, o que é feito com o mesmo valor de velocidade c (GAZZINELLI, 2009; TAYLOR; WHEELER, 1992; HEWITT, 2002). Estas últimas colocações, previamente pensadas, estudadas (nas vésperas do encontro), baseiam-se principalmente nestes autores. Adiante, nas próximas páginas, estão dois desenhos (Figuras 5 e 6) que exemplificam a previsão de dilatação temporal. Um refere-se ao referencial inercial S´ de repouso (ou referencial próprio) do relógio de luz – no qual o relógio se encontra estacionário; o outro já mostra a perspectiva em um referencial S no qual o relógio (fixo em S´ ) se move para a direita, um referencial inercial em que se mede um intervalo de tempo maior do que o próprio 57 (entre os dois eventos considerados). Pode-se imaginar S como certa região “plana” da superfície terrestre (um laboratório científico) que se comporta muito aproximadamente como sistema inercial; S´ pode ser pensado como o próprio relógio luminoso que movimentase em relação ao laboratório (S) “em repouso”. Estes desenhos não foram utilizados na oficina (foram preparados após esta), mas são valiosos como instrumento didático ao leitor/docente e para ilustrar melhor a experiência de pensamento enfocada no encontro: Figura 5 – O ponto de vista de um observador inercial em S´ Fonte: Elaborado pelo autor 58 Figura 6 – O ponto de vista de uma observadora inercial em S (figura girada em 90 graus no sentido anti-horário) Fonte: Elaborado pelo autor Ao fazer um paralelo com o texto de Feynman, o autor deste documento mencionou, rapidamente, que distintos intervalos temporais, em dois referenciais inerciais, aparecem no 59 texto. Porém, o conceito de evento não é estritamente necessário, pois, no enfoque da interação eletromagnética abordada é preciso atentar-se, grosso modo, para a duração da força em cada referencial inercial, que se compõe de intervalos muito curtos. Daí partiu-se para a apresentação da previsão de contração espacial. Enfatizou-se que o espaço se sujeita a um efeito tão estranho quanto o relacionado ao tempo, mas que é, de certa maneira, mais fácil de descrever. Para um objeto em repouso, medir-se-á o comprimento de repouso deste – o maior comprimento possível para o objeto, medido no referencial inercial em que o objeto se encontra estacionário. Mas, havendo movimento uniforme relativo a um observador, este medirá o objeto contraído na direção de movimento. Descreveu-se o caso de uma régua, uma simples situação de pensamento, com a finalidade de exemplificação. Obviamente, estas considerações sobre a contração de Lorentz são muito simples; todavia, destacou-se que, na verdade, não são os objetos que se contraem quando em MRU relativo, mas o próprio espaço. Noutras palavras, não é a matéria em si que sofre a contração. A realidade é que os objetos estão espacialmente estendidos (EINSTEIN, 1999). Assim podemos vislumbrar melhor esta previsão relativística. Se um observador inercial se move, o espaço se contrai na direção de seu movimento – em consequência, os objetos estariam contraídos. A concepção de que não é a matéria que se contrai, mas o próprio espaço no qual esta se estende, foi bem destacada aos estudantes. Também se explicitou a equação L = L´ /γ, ressaltando que, ao contrário do intervalo de tempo próprio, o comprimento próprio (de repouso) L´ se divide pelo fator de Lorentz, o que resulta em comprimentos relativos L menores que L´ (quando γ > 1). No caso do tempo próprio ocorre o oposto, pois os tempos relativos Δt – entre dois eventos – resultam maiores que Δt´ (se γ > 1). Foi afirmado brevemente que, para a contração relativística, não é preciso considerar-se conceitos de evento (no nível em que se abordava) para uma descrição introdutória do assunto. Ao menos assim crê o autor desta dissertação. Em diante, partiu-se para a exemplificação. Citou-se que as melhores confirmações experimentais da TRE se encontram na Física Contemporânea relacionada às partículas. O único exemplo dado foi o do múon (partícula μ), ressaltando-se o valor de sua vida média de repouso Δt´, ou seja, o intervalo de tempo (médio) para a existência da partícula, num referencial inercial no qual o múon está em repouso. O valor médio de Δt´, segundo Gazzinelli (2009, p. 30), é cerca de 2 x 10–6 segundos. Citou-se, então, que esta partícula é instável (GAZZINELLI, 2009), isto é, se forma e desintegra, solicitando ao participante que imaginasse o múon fixo no referencial de um laboratório terrestre; se o cientista detecta sua formação e desintegração numa mesma posição, é medido um intervalo de tempo próprio 60 (pois a partícula está estacionária), uma vida de repouso da partícula. Porém, se é planejado experimento para detectar a formação e a consequente desintegração do múon, em um referencial inercial no qual este se move (p. ex., utilizando acelerador linear de partículas), observar-se-á um intervalo de tempo relativo maior (vida relativa) para μ. Este tempo depende de γ, isto é, da velocidade entre o múon e o laboratório (os referenciais inerciais), assumindose que esta velocidade é sempre constante. Mencionou-se que isto devia ser tomado apenas como experiência pensada, pois o autor deste texto não sabia se o procedimento (como relatado) realmente poderia ser feito com múons. Foi escrita a vida média de repouso desta partícula, destacando-se que, na velocidade de aproximadamente 0,998c – em relação à Terra –, μ apresenta vida média relativa Δt de cerca de 30 x 10–6 s (GAZZINELLI, 2009, p. 31). Não se fez cálculo a este respeito, no intuito de salvar tempo; afinal, tratava-se somente de um simples exemplo numérico de evidência observacional da previsão. Além disso, recordou-se rapidamente que certas regiões da superfície terrestre podem ser tomadas como um bom referencial inercial. Um aluno questionou se a experiência do relógio de luz já havia sido realizada. O autor deste texto disse acreditar que não, pois nunca leu nada sobre corpos macroscópicos acelerados até velocidades significativas em relação à c. Para exemplificar a comprovação da contração do espaço, mencionou-se um fato também referente ao múon. Isto foi interessante, pois um rapaz conhecia o fenômeno, chegando a expressá-lo em parte. Enfim, apenas enfatizou-se bem que, no referencial da Terra, cientistas observam múons serem formados em certas altitudes atmosféricas; porém, a vida média de repouso (≈ 2 microssegundos), classicamente, não é suficiente para que a partícula alcance a superfície do planeta, tendo velocidade aproximada de 0,998c em relação a este. Segundo a dilatação temporal, a vida média relativa (tomada no referencial terrestre) é suficiente para que μ alcance a superfície. Mas agora interessa o efeito de contração espacial; de acordo com este, o espaço atmosférico – no referencial próprio (de repouso) do múon – está contraído. Neste referencial inercial, sua vida média de repouso é capaz de fazê-lo alcançar a superfície (GAZZINELLI, 2009). Decidiu-se não esboçar, na lousa, dados numéricos sobre a contração de comprimento para esta partícula, como planejado em rascunhos (abaixo), pois o tempo disponível estava meio abreviado. Enfim, a maioria das considerações feitas na oficina foi realmente pensada, estudada previamente. Também se ressaltou que as experiências citadas, com relógios de luz e réguas, deviam ser tomadas apenas como experimentos de pensamento; e foi dado, na 61 intenção de que o participante estudasse em casa, o melhor valor atualmente aceito para c. De acordo com Taylor e Wheeler (1992), c = 299.792.458 m/s. Adiante, nas Figuras 7 e 8, encontram-se os últimos rascunhos de aula: Figura 7 – Verso da segunda folha do rascunho Fonte: Elaborado pelo autor 62 Figura 8 – Última página do rascunho Fonte: Elaborado pelo autor Foi cortada a maior parte da metade inferior da Figura 7, onde havia equívocos que se rabiscou e desprezou. A última página contém a porção bem inferior rabiscada, posteriormente ao encontro; trata-se de dados sobre a contração de Lorentz no referencial de 63 repouso do múon, não explicitados no quadro e nem oralmente, devido ao tempo faltante. Além disso, tentou-se resumir certos fragmentos das últimas duas páginas, a fim de ganhar tempo (ainda que minimamente), não usando grifos nem certos parênteses, trocando palavras ou omitindo-as, não usando destaques em valores, resultados etc. É útil ressaltar isto, pois a questão referente ao tempo foi um dos maiores empecilhos na aplicação experimental do material. A última consideração feita, antes da leitura do texto, diz respeito ao Princípio da Relatividade de Einstein; destacou-se que este e a lei da constância de c no espaço livre compõem os postulados da TRE (ou postulados de Einstein). Afirmou-se que o princípio pode ser assim enunciado: a forma matemática das equações fundamentais da Física é independente do referencial inercial, ou seja, é a mesma em qualquer destes sistemas. Ainda se ressaltou, grosso modo, que “a cara” destas equações não depende do sistema inercial; estas se preservam, mantêm seu formato. Destacou-se bem que, por exemplo, as equações fundamentais do Eletromagnetismo (equações de Maxwell) obedecem ao Princípio de Relatividade einsteiniano. Entretanto, a Mecânica newtoniana não o obedece, e necessitou de correção relativística. Apesar disto, para baixas velocidades, esta descreve muitos fenômenos de maneira excelente. 3.2.2 Leitura de texto Em diante, solicitou-se aos participantes a leitura atenciosa do texto de Feynman. Enfatizou-se bem a existência de erros no texto em português entregue, para o qual se disponibilizava a errata. A ideia original, do autor deste documento, seria solicitar a leitura do texto sem a errata, pedindo ao aluno que tentasse descobrir estes equívocos e que, de algum modo, destacasse seus trechos suspeitos; em seguida seria passada a errata, para conferência e correção textual. Isto se inspirou na orientação de Bordenave e Pereira (2015, p. 266), já aqui citada, em estimular os alunos a julgar a validade de informações e a captar lacunas em um texto – o que, segundo estes autores, ajuda a desenvolver a habilidade de observar e avaliar (consciência crítica). Também, esta primeira opção possivelmente não interromperia o fluxo de leitura; daí, conforme cremos, seria mais adequada. Mas estando breve o tempo, julgou-se melhor solicitar ao participante que assim o fizesse ou que lesse o texto concomitantemente à errata. Pediu-se que desprezassem as ‘Considerações ao estudante’, pois sabíamos de antemão que não haveria tempo para tal leitura. A leitura do texto se iniciou aproximadamente uma hora após o começo do encontro, 64 já com todo o material impresso necessário. É válido destacar que um e outro estudante captaram alguns erros no texto em português – uns dois ou três equívocos –, pois os relataram ao autor desta dissertação que, conferindo a errata, confirmou-os. Podemos crer que estes realmente perceberam os erros sem consulta prévia à errata. A leitura transcorreu tranquilamente, silenciosamente; alguns alunos pareciam, de vez em quando, trocar ideias sobre o texto. Julgou-se útil um período em torno de 25 - 30 minutos para uma leitura atenciosa – até para que se pudesse reler algum trecho não compreendido etc., mas também porque, num estudo dirigido, o aluno deve trabalhar bastante no texto, segundo a recomendação de Bordenave e Pereira (2015). Enfim, não se pretendeu, em momento nenhum, apressar a leitura; isto estaria na contramão da nossa proposta e em desacordo com o principal referencial teórico-pedagógico. Uns vinte minutos após o início da leitura, o autor deste documento (que observava equações do texto) reparou que, em seus rascunhos, a simbologia matemática referente ao comprimento estava distinta da de Feynman (2008). Enquanto nós e o cientista utilizamos L para o comprimento relativo do fio, em S´, foi utilizado L´ na lousa para seu comprimento de repouso, em S, ao passo que Feynman (2008) utiliza Lo para este. No texto, tanto na edição em português quanto na original em inglês (aqui utilizadas), alguns símbolos são usados confusamente; p. ex.: na figura 13–11 (b), L´ indica o comprimento relativo do condutor (em S´), enquanto no corpo do texto este se indica por L (FEYNMAN; LEIGHTON; SANDS, 2008, p. 13-9; FEYNMAN; LEIGHTON; SANDS, 1964, p. 13-8). Além desta, existem certas confusões no texto brasileiro, que constam na errata. Assim, percebendo que poderia haver mais confusão, ressaltou-se aos alunos que Lo representa o mesmo que L´, escrito no quadro, explicitando que a equação L = L´/γ equivale à L = Lo /γ; daí, desta última temos L = Lo , que por sua vez, equivale à equação 1 1 v2 c2 13.22 usada por Feynman (2008, p. 13-9): L = Lo 1 v2 . Estas quatro últimas equações c2 foram explicitadas no quadro. A esta altura, já se percebia que não haveria tempo para que os alunos procedessem na tentativa de resolução das questões. Como ressaltado, não se podia apressar-lhes a leitura neste intuito, pois se solicitou que a fizessem com cuidado, atenção. Também, como orientam Bordenave e Pereira (2015, p. 266), “a compreensão do tema contido no texto básico é 65 alcançada pela análise cuidadosa do mesmo.”. Assim, apressar (ou até interromper) a leitura entraria em contradição total com esta proposta. 3.2.3 Discussão do texto (resolução de dúvidas) Partiu-se, então, após a leitura, para uma breve discussão sobre aspectos pertinentes do texto, conforme cremos. Um destes já havia sido destacado durante a exposição anterior à leitura, ou seja, o que diz respeito ao Princípio da Relatividade de Einstein. Ressaltou-se que este é por vezes denominado (em outras obras) um dos postulados da TRE (ou de Einstein), não importando muito se chamado de primeiro ou segundo postulado – o que é apenas uma convenção. Julgou-se valioso apontar isto, porque o aluno poderia conhecê-lo somente por denominação similar (e não por ‘Princípio da Relatividade’, como está no texto). Enfim, recordou-se rapidamente este princípio. Daí, uma das colocações mais relevantes é a de que, no texto, o princípio pode ser assim “vislumbrado”: ao obter expressão para a força magnética, em S, Feynman parte de uma equação já obtida pela lei de Ampère da magnetostática. Analogamente, ao obter equações para força e campo elétricos, em S´, o físico também toma uma expressão obtida previamente (para o campo eletrostático), que vem da lei de Gauss da eletricidade. Ora, estas leis de Gauss e Ampère não necessitaram de correção relativística. Os estudantes pareciam interessados nestes apontamentos. A discussão seguiu-se com a questão: foi perguntado aos participantes se conseguiam captar que, se no referencial inercial S é observada interação atrativa de natureza eletromagnética (entre o portador de carga e o fio condutor), também em S´ deve ser observada uma interação atrativa de mesma natureza. Consequências logicamente absurdas foram destacadas – caso a partícula elétrica não se aproximasse do fio em S´ –, como p. ex., se esta permanecesse em movimento relativo uniforme ao fio neste referencial, ou ainda se fosse repelida em S´, ao passo que no referencial S é sempre atraída. Também se mencionou rapidamente que a força, nos dois referenciais, deve ser de natureza eletromagnética, pois a interação gravitacional entre a partícula e o condutor é muitíssimo pequena, e pode ser desprezada; as interações nucleares, por sua vez, atuam apenas em distâncias muito curtas, comparáveis ao diâmetro de núcleos. Todos pareciam concordar com estas colocações e percebê-las razoavelmente. Afirmou-se que a abordagem do texto é válida apenas em intervalos de tempo muito curtos, pois, uma vez que a força atua na partícula de prova, esta acelera e o movimento relativo não mais é uniforme; assim, os referenciais deixam de ser inerciais. Mas, em intervalos temporais 66 muito curtos, cada qual medido em seu referencial, os sistemas são muito aproximadamente inerciais (e a TRE pode ser aplicada). Também, destacou-se que a força magnética depende da velocidade; portanto, no referencial inercial próprio da partícula não pode haver força magnética, pois a carga desta está em repouso ali. Em certo momento, rabiscou-se no quadro a equação para a força magnética, F = qv x B, afirmando-se que, em S´, o vetor v da partícula é nulo. Assim, a força (em S´) deve ser uma força elétrica e o fio deve estar carregado neste referencial, enquanto está neutro em S. Logo, a força em S é devida ao campo magnético, ao passo que em S´ se deve ao campo elétrico. Também há campo magnético em S´, mas este não age na carga de prova, pois, a velocidade desta neste referencial é nula. Então, concluímos que campos e forças elétricas e magnéticas são totalmente dependentes do referencial inercial. Uma estudante não captava o fato de um fio eletricamente neutro em um referencial inercial, mas carregado noutro. Ela colocava certas questões, de certo modo, similares à seguinte: ‘Só porque o observador se move relativamente ao fio, em S´, deve observá-lo eletricamente carregado? A participante ainda aparentava estar confusa com noções a respeito do conceito de velocidade, como a de que a velocidade inicial da partícula era igual à de arraste dos elétrons de condução. Isto foi valioso para se recordar que Feynman enfoca o caso especial no qual estas velocidades se igualam. Assim, solicitou-se à moça que imaginasse a partícula elétrica adentrando o campo magnético de S, tal como está no texto; se a partícula tem velocidade em relação ao campo, o único presente em S (e a velocidade não é paralela a este), há apenas força magnética na partícula. Daí pediu-se à participante imaginar ter velocidade igual à da partícula, estando junto a esta. Dessa forma, a velocidade da carga, neste sistema S´, é zero – por conseguinte, não há interação magnética. Todavia, a partícula também deve aproximar-se do fio em S´, pois seria ilógico vê-la ser atraída no referencial S do fio em repouso, mas exibindo comportamento de partícula livre no referencial da carga em repouso. O autor desta dissertação crê que a descrição para a carga líquida não nula em S´, que envolve a relatividade da simultaneidade para os elétrons livres do fio, poderia confundir mais a aluna. Dessa maneira, limitou-se a dizer que a partir do efeito de contração espacial em S´ (e utilizando a matemática), o físico mostra que deve existir campo elétrico neste referencial inercial. O experimento de pensamento, capaz de descrever esta carga líquida diferente de zero (e, portanto, o campo elétrico do referencial S´), consiste na seguinte constatação: um observador inercial está estacionário, em S´, juntamente aos elétrons livres do fio. Porém, neste referencial, o fio se move para a esquerda – observe a figura 13–10 (b) do texto; assim, a base direita do fio condutor se aproxima do observador em repouso na posição 67 da carga q em S´, de tal modo que “se vê” um elétron sair por esta base (direita) antes que outro entre pela base esquerda, que se afasta do observador. Em consequência, surge um vácuo eletrônico (a ausência de uma unidade de carga elementar negativa) que consegue descrever a carga líquida positiva em S´. Obviamente, esta ideia é uma abstração, pois, na prática, há um grande número de elétrons livres. Então, pode-se também pensar que em um intervalo de tempo muito curto, decorrido em S´, uma quantidade média de elétrons sai pela direita antes que aproximadamente a mesma quantidade penetre pela esquerda. Um aluno tentava descrever algumas noções para a garota. Enfim, acredita-se que ela as percebeu parcialmente, mas não as aceitava. Com efeito, certos aspectos envolvidos no texto são intrigantes; o autor deste documento, por exemplo, julgou que a conservação da carga era violada no texto. Mas com o auxílio de seu orientador (e leitura adicional), percebeu que isto não procede. O que ocorre é que a carga elétrica líquida – em qualquer sistema eletricamente isolado – se conserva. O sistema do texto, como um todo, não pode ser formado apenas pelo fio condutor, mas deve conter uma fonte de voltagem (e possivelmente outros elementos de circuito). Assim, se o fio – ou uma porção deste – é percebido como positivamente carregado por um observador inercial em S´, o restante do sistema fica carregado com igual módulo de carga negativa neste referencial. Ora, se uma quantidade de elétrons sai do fio antes que outra penetre, existe um excedente de elétrons na outra parte (no restante) do sistema – a partir da perspectiva de S´. Se a carga líquida (total) em S é nula no sistema eletricamente isolado, também será nula em S´, uma vez que as cargas líquidas não nulas (neste referencial inercial) se compensam: a carga positiva na estrutura do fio balanceia exatamente a negativa – contida no resto do sistema. As considerações do parágrafo acima nos remetem a um questionamento interessante: o que provém a carga líquida positiva (no fio) e negativa (no restante do sistema), do ponto de vista de S´ ? Estas cargas líquidas apenas se manifestam devido à presença da bateria – ou de uma voltagem qualquer –, que fornece a energia necessária para a corrente. Sem a bateria não haveria corrente em nenhum dos referenciais. Em S, o fio continuaria neutro; em S´ – referencial da carga de prova – o fio estaria contraído, mas esta contração se manifestaria igualmente para os núcleos atômicos e elétrons, e as densidades líquidas de carga positiva e negativa se balanceariam. Noutras palavras, caso não houvesse bateria, o simples movimento do fio – em S´ – não o tornaria carregado. As partículas de cargas opostas se encontrariam estacionárias umas em relação às outras, em ambos os referenciais. Não só a corrente seria nula nestes referenciais inerciais, mas também não haveria nenhum campo interagindo com a partícula de prova; esta se comportaria como partícula livre. 68 A percepção de aspectos significativos, contidos no texto, parece melhor à medida que se reelabora as ideias sobre o tema e conteúdos correlacionados. Enfim, talvez tenha sido um erro não tentar explanar as considerações anteriores sobre a relatividade da simultaneidade para elétrons livres em S´, sobre o fato de que o sistema não pode ser composto apenas pelo fio mostrado por Feynman, e de que a carga líquida (total) deve se conservar no sistema em sua totalidade. De qualquer modo, não haveria tempo para uma boa descrição dessas noções; o autor deste texto, também, ainda não havia bem elaborado suas ideias a respeito. No fim do encontro, enfatizou-se que o texto envolve abstração, idealização etc., mas é útil para mostrar, teoricamente, que efeitos da TRE – como contração espacial e dilatação temporal – podem ser tomados no Eletromagnetismo, ou seja, esta teoria já possui formulação relativística, sendo compatível com a Teoria da Relatividade Especial. Isto implica que não há contradição lógica interna entre ambas. O fim do diálogo, principalmente com a aluna, pode ter sido valioso para afirmar alguma noção textual não captada por alguns participantes; afinal, estes estavam em silêncio e pareciam atentos ao debate, que terminou por volta de 17 horas e 10 minutos. Por esta hora, boa parte dos alunos aparentava desejar ir embora; com razão, alguns deviam ter compromissos. Assim, solicitou-se que procedessem nas questões propostas em casa (consultando o texto), entregando-as depois ao Professor Flávio Resende. Insistiu-se nisto, dizendo-lhes que as resoluções eram importantes para um trabalho de Mestrado. Aparentemente, eles concordaram. Além disso, lhes foi disponibilizado o texto em língua inglesa, e prometida a entrega de material suplementar (com resoluções e respostas comentadas e considerações sobre o texto e aspectos correlatos), para autocorreção e/ou para refazer as questões, após tentativa(s) com consulta ao texto. Combinou-se que este poderia ser enviado via internet. Por fim, fez-se o sorteio dos cinco livros como prometido. Ninguém o cobrou ou mencionou-o, mas todos permaneceram para este. 3.3 A proposta de um questionário avaliativo Os itens (seções terciárias) adiante versam sobre o formulário (questionário) de avaliação, preparado e disponibilizado na própria internet. Primeiramente, são feitas considerações a respeito da preparação do mesmo; em seguida, é discutida sua aplicação e feita uma simples análise de alguns dados. 69 3.3.1 Elaboração do questionário Foi elaborado um questionário utilizando o aplicativo JotForm®. Nosso propósito inicial era preparar um documento para avaliar o material e a oficina, partindo-se da crença de que todas as atividades seriam feitas, ou seja, de que haveria tempo hábil a fim de que os alunos tentassem resolver as questões. Assim, fez-se um rascunho, um razoável esboço deste primeiro – anteriormente à oficina –, que foi abandonado. Foram feitas tentativas no intuito de que os estudantes resolvessem as questões em casa, retornando-nos suas respostas. Mas não se obteve sucesso. Dessa forma, percebeu-se a necessidade de elaboração de um novo questionário (adaptado à realidade vivenciada). Produziu-se um documento mais breve, curto, para se responder na própria internet. O aplicativo citado, JotForm®, é facilmente encontrado pelo buscador Google®. É uma ferramenta grátis de qualidade razoável, mas útil, pois o link referente ao questionário pôde ser enviado via e-mail e facilmente postado nos perfis de Facebook® dos participantes. Além disso, as respostas são automaticamente enviadas ao e-mail do autor do formulário. O questionário em branco está disponível em: https://form.jotformz.com/51476541085659. A intenção do questionário foi a de coletar informações capazes de auxiliar-nos na avaliação da proposta como um todo, isto é, do material experimental preparado e do encontro. Cientes do problema referente à disponibilidade de tempo, julgamos bem valioso elaborar algo a respeito, como se percebe na terceira pergunta. Nesta, enfatiza-se o tempo insuficiente para a continuação de discussão e tentativa de resolução das questões sugeridas, solicitando-se sugestões para que isto pudesse realizar-se com maior proveito. É importante reparar que – na pequena introdução ao questionário – deixou-se claro que sugestões e críticas poderiam ser feitas no corpo das respostas. Tentamos, assim, obter informações passíveis de auxiliar na proposta de sugestões para contornar problemas, fazer-nos perceber equívocos, falhas, possíveis alternativas (e até propor melhorias, modificações, no material em questão). Sendo o texto interessante e básico, como propõem Bordenave e Pereira (2015) (e como se tentou justificar), abordando relevantes aspectos da relação intrínseca entre TRE e Eletromagnetismo, achou-se conveniente elaborar uma questão (primeira questão) para o relato de aspectos, conceitos etc., que mais despertaram interesse, atenção e/ou se mostraram como novidades para o leitor. Esta questão pode ser válida a fim de se obter alguma ideia do que foi compreendido pelo leitor e/ou até de seu nível de conhecimento sobre o tema. O intuito da segunda pergunta consistiu em tentar captar do leitor a percepção ou não da conexão entre as duas teorias em questão, de modo mais direto. O relacionamento, 70 compatibilidade, entre ambas é o tema do texto de Feynman, até certo ponto; no mínimo, é um dos aspectos mais globais e significativos deste, sendo uma de suas principais intenções. Isto se evidencia quando o físico propõe: “Mas vamos ver o que nosso conhecimento da relatividade pode nos dizer sobre as forças magnéticas se supusermos que o princípio da relatividade pode ser aplicado – e ele pode – ao eletromagnetismo.” (FEYNMAN; LEIGHTON; SANDS, 2008, p. 13–7). Também no fim do texto, Feynman (2008, p. 13–11) conclui e enfatiza que – considerados em conjunto – eletricidade e magnetismo se conciliam com a TRE. Portanto, a segunda pergunta é valiosa neste trabalho. Já se comentou a terceira pergunta. A quarta e última (que se compõe de dois itens) versa a respeito da utilidade, importância, de grande parte do material elaborado. Questiona-se o leitor sobre a relevância da tentativa de resolução das questões (e da análise da errata) em contribuir para a compreensão textual etc. – e até para a própria resolução, ao se tratar da errata. 3.3.2 Aplicação do questionário Já se apresentou o questionário (avaliativo) e foram comentados certos aspectos referentes a este. Neste item, destacaremos alguns problemas enfrentados em sua aplicação e faremos considerações sobre respostas, apenas a título retrospectivo, ou seja, tentar-se-á concatenar algumas respostas que possam ser pertinentes para o já escrito nesta dissertação. Determinadas dificuldades, encontradas neste trabalho, já foram levantadas. O problema da disponibilidade de tempo também ocorreu no período de aplicação do questionário, após o encontro, e não apenas durante este (que consistiu na aplicação relatada) e antes deste – a fase preparatória do material e da oficina. Também, houve o quorum relativamente baixo de sete alunos, enviando-se o questionário aos seis identificados. A expectativa de recebimento de respostas deste foi muitíssimo pequena, para não dizer quase nula. Outra dificuldade contundente diz respeito ao fato de que os estudantes estavam próximos ao período de provas finais, entrega de trabalhos etc.; em várias disciplinas, isto já se inicia na segunda quinzena de maio e começo de junho. A atividade acadêmica, para diversos alunos e professores, torna-se mais acelerada nesta época. Somando-se a voluntariedade de nossa proposta, a chance em se obter retornos diminui ainda mais. Claramente, a proximidade de atividades, provas, finais, relaciona-se à disponibilidade de tempo dos participantes. Além disso, destaque-se que alguns alunos, nos últimos períodos de 71 graduação, já lecionam. Isto foi confirmado pelo orientador do autor deste texto, e checado em certos perfis de rede social. Ainda, a moça participante do encontro mencionou a escola em que lecionava, durante conversa informal após a oficina. O questionário avaliativo foi-lhes enviado no dia 29 de maio de 2015, via e-mail e perfil de Facebook®. Um mês após a oficina, havíamos recebido apenas a resposta (de formulário avaliativo) de A, aluno do curso de Física, que a enviou logo no dia seguinte, 30 de maio. Repare-se que este, um rapaz, aparentava ser o mais interessado no encontro. Quase dois meses após a oficina, o autor desta dissertação esteve muito preocupado, pois se solicitou aos alunos a tentativa de resolução das questões em casa – disponibilizando-lhes o texto (em português e em inglês), sua errata, questões propostas etc. Também, foi enfatizado no fim do encontro que não necessariamente todas as questões deveriam ter respostas/resolução; a proposta era tentar resolvê-las consultando o texto e errata. Além disso, informou-se que as respostas, resoluções, de questões poderiam ser enviadas por meios eletrônicos – caso desejassem –, e que se procuraria contatar todos. Mas, passados uns cinquenta dias do encontro, ninguém as havia entregado (como informalmente combinado). Tampouco foram enviadas ao e-mail ou perfil pessoal de Facebook® do autor deste texto. Percebeu-se então que, muito possivelmente, não receberíamos mais retornos de formulário avaliativo, muito menos de questões do material sugerido. Afinal, os alunos já estavam de férias. Logo, o autor deste texto insistiu um pouco, pela rede social, para que ao menos o documento de avaliação fosse respondido. Afirmou-se que as questões (do estudo dirigido) não necessariamente precisavam ser enviadas, entregues, mas que apenas fossem feitas junto à leitura texto, respondendo o formulário avaliativo em seguida. Assim se fez, pois, havia pouca esperança de retorno de resoluções do material. E o tempo para continuação/produção desta dissertação já estava breve. Mas esta pequena insistência foi razoável, pois se recebeu o questionário avaliativo de B, aluno da Engenharia Eletrônica e de Telecomunicação. Este, inclusive, antes de enviar o formulário, enviou e-mail ao autor deste texto com algumas dúvidas sobre o texto de Feynman. Seus questionamentos foram respondidos rapidamente, mas com cuidado. Com tão poucas respostas de questionário avaliativo, considerou-se valioso enviá-lo para algumas pessoas selecionadas que não participaram da oficina. Obviamente, escolhemos possíveis participantes que preenchiam todos os pré-requisitos, mas que também não fossem “especialistas” no tema do texto. Estes possuíam o livro em português ou ao menos tinham acesso a ele (como consultado); assim, foram-lhes enviadas eletronicamente as ‘Considerações ao estudante’, a errata, questões propostas etc. – o mesmo material impresso 72 entregue aos alunos na oficina. Também lhes indicamos um site, do California Institute of Technology (Caltech), em que está disponível – para domínio público – a coleção de Feynman original, no idioma inglês, apenas para leitura; neste, não há nenhum dos erros encontrados (no texto) nas edições brasileira e norte-americana avaliadas. Esta informação lhes foi passada, junto a outras sobre os equívocos contidos no texto. Foi informado, ainda, todo o necessário para localizar o texto na obra, como título, volume, páginas etc., encaminhando-se o link para o questionário avaliativo. Como estes não tomaram parte no encontro, pediu-se lhes que, no campo Curso/período, informassem sua formação acadêmica e que desprezassem o trecho ‘[...] e na introdução dada pelo professor’ da primeira pergunta. Em relação à terceira pergunta, ressaltamos a falta de tempo para terminar a discussão e resolver as questões em uma oficina, solicitando-lhes somente alguma opinião, ideias, a fim de produzir um encontro com bom proveito. Finalmente, lhes informamos que poderiam enviar apenas as respostas do formulário; as resoluções/respostas de questões – propostas no material – ficariam a critério de quem as quisesse enviar. Esta atitude foi boa, conforme cremos, porque recebemos formulários de mais dois indivíduos, C e D. Destes, um homem jovem com pouco mais de trinta anos, recém-formado em Física na PUC Minas, e uma ex-colega de Mestrado do autor deste documento, de cinquenta e poucos anos. O aplicativo JotForm® agrupou as quatro respostas, que depois foram inseridas como imagens no apêndice B. 3.3.3 Análise de dados Poucos questionários avaliativos foram obtidos, apesar do esforço e insistência; assim, não faremos análise de discurso baseada em autores que dela tratam. Afinal, quatro formulários compõem uma amostra bem fraca a fim de se obter conclusões pertinentes mais gerais. Dessa maneira, as respostas adquirem caráter mais pessoal, não representando ideias, conclusões, que poderiam ser, até certo ponto, atribuídas a uma coletividade; o que se reforça pelo fato de termos formulários de dois participantes da oficina e de dois não participantes. Além disso, recorde-se que não se recebeu nenhum conjunto de respostas às questões do material. Em relação às considerações retrospectivas sobre as respostas do formulário, destaquese, de início, o mencionado por A na primeira pergunta. Este considera interessante “[...] a forma como a teoria eletromagnética já continha, em seu cerne, a teoria da relatividade 73 espacial (sic).”. O jovem aponta justamente um dos aspectos mais significativos do texto, já aqui citado – ainda que com outras palavras, mas que remetem à mesma conclusão. Como se apontou, a conexão, conciliação, entre estas teorias é, de certa forma, o tema do texto; ou ao menos uma das principais intenções de Feynman. Em segundo lugar, aponte-se o citado por B, que escreve em resposta à terceira pergunta do formulário: “Como a agenda de todos em uma universidade é corrida, [...]”. Claramente, este trecho não abarca o conteúdo da resposta e o contexto da questão, mas é útil para destacar um dos problemas encontrados mais contundentes: a disponibilidade de tempo nas universidades (em nosso caso, da parte dos estudantes). A menção de B vale particularmente para o período posterior ao encontro – próximo a provas e trabalhos finais. Some-se a isto a voluntariedade da proposta. Contudo, é claro que sua citação não é geral; ele apenas esclarece que, para muitos, o ritmo acadêmico é apressado em vários períodos. Em terceiro lugar, apontemos duas menções de C, que não participou da oficina. A primeira é sua resposta completa para a segunda pergunta: “Sim. A questão da relatividade das forças e campos elétricos e magnéticos (que dependem de um referencial inercial) e a lei da conservação da carga elétrica.”. Nesta, são destacados mais dois aspectos valiosos do texto. Com efeito, o primeiro destes toma parte no título do texto e é bem importante, pois, sob a ótica da TRE, conceitos de força e grandezas de campo (elétrico(a) e magnético(a)) são completamente dependentes do referencial inercial, apesar de que as equações fundamentais do Eletromagnetismo se preservam em qualquer um destes – sem correção relativística e em concordância com o Princípio da Relatividade einsteiniano. Este aspecto, por exemplo, foi resumido no banner. O segundo destes diz respeito à invariância/conservação duma propriedade inerente da natureza, fonte da luz e que independe da velocidade relativa e da energia da partícula elétrica, o que é muito bem exemplificado por Feynman. Em suma, C destaca duas significativas noções textuais, que também são intenções do físico. A outra importante menção desta pessoa, segundo cremos, é a de que “Ler repetidas vezes o texto facilita sua compreensão, ajuda na resolução das questões [...]”. Esta consta no item (b) da quarta pergunta. De certa forma, isto remete à proposição de Bordenave e Pereira, ao defenderem que a compreensão de tema em um texto básico se alcança pela cuidadosa análise do mesmo, o que auxiliaria a desenvolver a capacidade analítica (BORDENAVE; PEREIRA, 2015). O autor desta dissertação concorda plenamente com esta citação de C, pois, em sua experiência pessoal com o texto, nos dois últimos anos, percebeu claramente que suas ideias sobre este se aprimoraram a partir de releituras. Obviamente, a reelaboração, reanálise, 74 destas ideias, também se deve ao estudo de outros textos e assuntos correlatos; porém, não se pode negar a grande utilidade da releitura/análise do texto nesta cooperação. O questionário avaliativo também é parte integrante desta pesquisa, embora não sejam possíveis conclusões mais abrangentes, dado o pequeno número de respostas, como ressaltado. Até certo ponto, já se tentou relatar algumas impressões obtidas sobre a reação e as respostas (de participantes e não participantes) com as atividades propostas, tanto na oficina como após. Colocamos certos arquivos em anexo, ao invés de explicitá-los neste texto, pois são um tanto longos. Disponibilizar o link para o formulário avaliativo, em branco, confere certa fidelidade ao que se fez. Assim, o leitor tem acesso a conteúdo que ainda está na internet, caso o aplicativo responsável esteja ainda online. Havendo disponibilidade ao livro-texto de Feynman, o estudante ou professor que queira ler/estudar e contribuir com esta proposta, poderia até enviar o formulário – o que poderia ser útil, p. ex., numa hipotética complementação, melhoria, deste trabalho. Finalizando este item, façamos duas considerações: primeiramente, poderia ter sido útil incluir um campo para a idade do indivíduo no formulário, o que pode ser pertinente em pesquisa educacional. Em segundo lugar, a solicitação de período aproximado (para o curso) ocorre, pois, recorrentemente alunos de Física e engenharias se atrasam em algumas matérias, terminando por cursar disciplinas de vários períodos no mesmo semestre letivo. Ao menos, esta é a impressão do autor deste documento, quando aluno de graduação. 3.4 Principais dificuldades encontradas neste trabalho Foram apresentadas, nesta dissertação, certas dificuldades em todo o processo deste trabalho. Façamos, então, uma análise pouco mais detalhada destas, a fim de se captar como foram desfavoráveis, o que se poderia fazer para evitá-las etc. Em relação à disponibilidade de tempo dos participantes, já se enfatizou praticamente tudo: a agenda universitária acelerada, o iminente período de provas finais, os compromissos de trabalho etc. Estas desvantagens são claras. Imagine-se, em comparação, se o estudo dirigido é aplicado em um grupo sem iminentes atividades acadêmicas e compromissos de trabalho, com folga em suas agendas etc. A possibilidade de se obter respostas/resoluções das questões elaboradas – assim como de formulários – seria maior. No que concerne à nossa tentativa de aplicação, provavelmente nada (ou quase nada) poderia ter sido feito para evitar os problemas do parágrafo anterior. Pois desde fins de 2014, 75 o autor desta dissertação trabalhava e estudava a fim de produzir algum material relacionado ao texto de Feynman – com a ajuda de seu orientador. Mas sendo humano e falível, a primeira proposta ficou difícil para os possíveis alunos, além de um tanto longa; esta não foi aplicada/testada e logo percebemos sua inadequação. O processo precisou quase que ser reiniciado; além disso, o autor deste trabalho já havia se deparado com os erros do texto em língua portuguesa, tendo sido necessária a preparação de errata. A elaboração desta foi meio cansativa, devido ao cuidado, atenção especial, para não confundir a simbologia que utiliza a “linha” (S´, ρ´ etc.) com a que não o faz (S, ρ etc.). E ainda julgamos útil fazer uma comparação dos erros no texto em português com algum original em língua inglesa; a versão em inglês optada foi uma mais antiga, de 1964, por ser talvez ainda mais usada e difundida. Assim, o material relacionado ao estudo dirigido, possivelmente adequado para aplicação/teste, apenas ficou pronto no final de abril, início de maio de 2015. Mas as expectativas iniciais eram de que assim estivesse em fins de janeiro, início de fevereiro daquele ano; desse modo, nada pôde ser feito para contornar os problemas citados. Outro fator agravante foi a produção das ‘Considerações ao estudante’. Não que a proposta deste documento seja ruim, mas porque precisa de tempo considerável para se elaborar. Enfim, a fim de que um professor evite as dificuldades mencionadas no início deste item, a sugestão é de que se aplique o estudo logo no início do semestre ou ano letivo. E a fim de se evitar a indisposição de participantes em responder o formulário avaliativo na internet, pode ser válido aplicá-lo impresso na oficina (durante um primeiro encontro ou posterior). A voluntariedade da nossa aplicação experimental foi outro empecilho, que dispensa comentários sobre seu caráter desfavorável. Em uma hipotética e futura oficina, a sugestão, então, é que a atividade seja pontuada. Claramente, aqui importam alguns fatores relevantes, como a disciplina em que se deve encaixá-la. Cremos que o mais adequado seria alguma que aborda conteúdos da TRE ou ao menos os fundamentos do Eletromagnetismo na forma integral. Obviamente, se deve atentar para todos os pré-requisitos, preenchendo-os antes da aplicação. O relativamente pequeno quorum, em nosso encontro, também foi desfavorável, pois um número maior de estudantes aumentaria a expectativa de formulários entregues (e de respostas/resoluções das questões sugeridas). Por outro lado, um maior quorum também exigiria um tempo mais longo de discussão e resolução de dúvidas – após a leitura – a respeito do texto e seu tema. Desse ponto de vista, isto seria desfavorável em nossa aplicação – dada a escassez de tempo enfrentada. Em um hipotético encontro, sugeriríamos que o professor tentasse adequar o tempo disponível para diálogo de acordo com a quantidade média de 76 participantes esperada – caso seja possível estimá-la. É um pouco difícil especular um bom número de alunos para aplicação e avaliação da proposta. Caso se consiga a resolução das questões em sala, acreditamos que algo em torno de 12 a 15 alunos estaria razoavelmente bom. Assim sendo, seria também pertinente uma solução para que todos (ou quase todos) respondessem o formulário avaliativo. Opções para contornar o problema de baixo quorum, em nosso caso, foram realmente escassas. Primeiramente, ressalte-se o pequeno número de estudantes atualmente presentes em cursos de Física. Referências a este respeito são dispensáveis, pois o fato é facilmente notável na pequena quantidade de formandos nestes cursos ou quando se compara esta a certos cursos, com número bem maior de estudantes. Até a presente data, o número de alunos em cursos de Física é relativamente pequeno em grande parte das universidades/faculdades brasileiras (comparado aos formandos e graduandos de determinados cursos). Em segundo lugar, para atrair mais estudantes de cursos afins, possivelmente seria necessário um tempo maior de divulgação e uma propaganda mais vigorosa da oficina. Ora, no relativamente curto período (da reunião com o coordenador até o encontro) fez-se praticamente tudo para evitar o baixo comparecimento – inclusive o sorteio de livros. O Professor Flávio Resende (Coordenador) enviou e-mails com o banner a praticamente todos os alunos da Física que preenchiam os requisitos prévios; este também foi exposto no Instituto de Ciências Exatas e Informática (ICEI), a fim de atrair outros estudantes. Somando-se o caráter voluntário da proposta, cremos que seria ingênuo esperar um número maior de participantes, digamos, de 12 a 15 alunos. De certo modo, houve sorte com sete estudantes – o que poderia ter sido menor. A fim de se evitar o baixo quorum, em futura aplicação, poder-se-ia pontuar a atividade. Porém, este problema também pode ocorrer pelo pequeno número de alunos em cursos de Física; assim, se determinada disciplina tem poucos matriculados, uma solução poderia consistir na junção de disciplinas distintas, desde que se atente para os pré-saberes. Como exemplo, alunos de disciplina que abarca assuntos da TRE se juntariam aos do Eletromagnetismo. Mas o problema mais sério, enfrentado por nós, foi o tempo faltante para a tentativa de resolução das questões do material de estudo, o que prejudicou sua aplicação experimental – não sendo possível a análise das respostas deste (e as possíveis conclusões, ainda que parciais, sobre estas). A seriedade do problema se evidencia pela pergunta (no formulário) a fim de avaliá-lo, isto é, de que ideias, propostas etc., fossem colocadas na intenção de evitá-lo. Tentou-se contatar os participantes a fim de combinar um segundo encontro. Com efeito, ao sugeri-los informalmente o novo encontro, no fim da oficina, muitos se 77 manifestaram favoravelmente. Uma destas tentativas fez-se via Facebook®, enviando mensagens privadas com o objetivo de marcar dia e horário – conveniente para todos ou quase todos. Mas apenas uma aluna enviou resposta, informando sua disposição para um novo encontro, na intenção de discutir a intrigante questão relacionada ao Eletromagnetismo. Também, dois estudantes se manifestaram, ao orientador deste trabalho, favoráveis à continuação. Porém, ninguém enviou confirmação, disponibilidade de horário etc., nem via email ou rede social, apesar de uma pequena insistência. Isto ocorreu, provavelmente, devido à escassa disponibilidade de tempo dos alunos (seus compromissos acadêmicos, de trabalho, e a agenda já apertada para muitos – naquele momento). Vimo-nos, então, obrigados apenas a solicitar-lhes que tentassem responder/resolver as questões, acompanhados do texto, e que respondessem ao formulário. Cremos que não havia nada mais a se fazer na tentativa de continuar a oficina. Além disso, o prazo para a produção desta dissertação se abreviava; se houvesse o novo encontro (ou outra aplicação experimental) no segundo semestre de 2015, não haveria tempo para escrevê-la. Isto consistiu em uma dificuldade inevitável. 3.5 Avaliação de respostas do formulário avaliativo e algumas sugestões para o aprimoramento da oficina Façamos uma avaliação das respostas à terceira pergunta do formulário, que podem indicar possíveis soluções para o problema do tempo durante a oficina (e talvez para outros problemas) e/ou sugestões para sua melhoria. A resposta de A, participante, é um pouco confusa; este aparenta sugerir, no início, um segundo dia de encontro, desde que os alunos resolvam as questões previamente. Acreditamos que seria uma ótima opção para contornar o problema em nossa aplicação, se pudéssemos fazê-lo na segunda metade de 2015. Também cremos que a continuação da oficina teria sido ótima para progredir no debate de aspectos importantes do texto, apenas iniciado na aplicação experimental. Além disso, sabemos que os estudantes não fariam todas as questões em casa, mas tentariam fazer o que conseguissem. Pois não são poucas as questões propostas; algumas exigiriam, possivelmente, uma não pequena capacidade crítica, de análise, abstração, raciocínio – além do fato de que, muitas vezes, é completamente natural precisar recordar-se de algum conceito, denominação, lei etc. (ainda que se tenha feito um bom curso teórico). Então, podemos sugerir que uma boa alternativa de continuação (para nosso caso ou outro parecido) seria solicitar a releitura cuidadosa do texto em casa, seguida da tentativa de resolução das questões – consultando-se o texto sempre quando preciso. Daí, o professor 78 continuaria a discussão neste segundo encontro, solicitando aos participantes que tentassem progredir na resolução, fornecendo-lhes subsídios objetivos. Uma espécie de correção – ou pré-correção – poderia ser feita. Assim, o professor atuaria apontando e concatenando alguns elementos, ideias etc., para que os próprios alunos elaborassem respostas, corrigissem e/ou resolvessem questões. Se a continuação só puder ser feita em semestre/período letivo posterior, seria proveitoso o professor insistir na releitura atenciosa e dar boa ênfase no prosseguimento da discussão, inclusive na recordação de alguns conhecimentos prévios. As sugestões acima nos remetem à orientação de Bordenave e Pereira (2015, p. 266), de que o aluno deve esforçar-se bastante no estudo de texto, no uso de sua própria criatividade interpretativa e de extrapolação de conteúdo. Pois solicitar-se releitura, progressão, avanços na resolução etc., mais a ideia de que o educador apenas indique e recorde conceitos, leis (sem resolver as questões, mas auxiliando objetivamente na obtenção de resultados), põe em destaque o trabalho do aluno. Cabe aqui também a valiosa orientação de que o professor deve “resolver ele mesmo as questões elaboradas [...]” (BORDENAVE; PEREIRA, 2015, p. 270), o que seria uma parte da análise do estudo pelo docente, antes de aplicá-lo, como defendem estes autores. Possivelmente, apenas assim uma eficiente “pré-correção” será feita. O autor deste documento resolveu/respondeu por duas vezes, antes da oficina, todas as questões do material, pois os participantes poderiam requerer o seguimento da oficina em algum dos dias seguintes, a fim de auxiliá-los na resolução e formulação de respostas. A “segunda parte” da resposta de A para a terceira pergunta, isto é, “[...] caso não seja possível a realização de um segundo dia de oficina, ao invés de tratar a parte das transformações de Lorentz, abordar diretamente a discussão que se sugere sobre a relação do electromagnetismo e a TRE”, sugere que a discussão de texto se faça diretamente, sem o enfoque do conteúdo referente à TRE. Ora, isto não foi possível em nossa experiência, pois certos alunos não possuíam este conhecimento – como confirmado ao questioná-los logo no início do encontro. E o participante se confunde, pois equações de transformação de Lorentz (para coordenadas espaciais e instantes temporais de um evento qualquer) não foram abordadas na oficina, talvez nem citadas; este aparenta se referir às relações entre intervalos temporais e espaciais, nos dois referenciais inerciais. Todavia, se os alunos contemplassem todos os pré-requisitos, a ideia inicial seria ir diretamente para o debate, após leitura do texto e sua errata. A resposta de B para a terceira pergunta também é interessante. Este propõe disponibilizar previamente o material para a oficina, possivelmente referindo-se ao texto de Feynman. Isto pode ser útil, p. ex., se o professor o disponibiliza solicitando sua cuidadosa 79 leitura em casa; e antecipa que uma discussão e estudo importantes serão feitos em sala. Desse modo, o educador pode até estimular uma leitura mais atenta. Também, pode-se já advertir os alunos sobre os erros, pedindo-lhes que tentem percebê-los e que destaquem trechos suspeitos. Assim, posteriormente seria entregue a errata para conferência e análise, o que pode se fazer junto à releitura ativa do texto – atentando-se mais nos trechos incorretos, tentando melhor captar seus significados e as intenções do autor. Outra opção é disponibilizar-se o texto (livro) juntamente à errata; neste caso, o professor poderia sugerir a opção de leitura/estudo acima ou que se fizesse a leitura textual concomitantemente à da errata. Em qualquer caso, é ótimo solicitar a leitura atenciosa, cuidadosa, a ser feita quantas vezes necessárias – obviamente, dentro do tempo disponível. Chamar a atenção para estas considerações pode ser valioso principalmente para os mais interessados. Os últimos argumentos são consistentes com o proposto por Bordenave e Pereira: que a compreensão do tema de texto básico se alcança pela cuidadosa análise do mesmo; que no estudo dirigido o estudante deve trabalhar muito neste texto (BORDENAVE; PEREIRA, 2015, p. 266). Ora, leitura e releituras cuidadosas, atenciosas, naturalmente abarcam um cuidado analítico, assim como a ideia de se perceber (e conferir) erros em certa versão do texto. Isto também implica uma maior participação e esforço dos alunos. Em todo o processo, as questões referentes à pontuação, ao tempo, número de estudantes etc., devem ser bem analisadas pelo educador. Seguindo-se o acima exposto, seria feito um diálogo, ressaltando-se algumas noções importantes do texto – o que B aparenta chamar de debate. O “tira dúvidas” destacado por este estaria já contido nesta discussão, debate. Enfim, as questões seriam passadas em diante, ficando quase que a título experimental, pois o retorno que delas se obteve – através de formulários avaliativos – é escasso. Estas colocações, assim como outras apresentadas, são humildes sugestões para o melhoramento da aplicação. A resposta de B para a terceira pergunta (segundo crê o autor deste documento) ressalta bem o esforço que se faz necessário da parte do estudante. De certa forma, tentamos interligar certas respostas dos formulários a algumas ideias (se possível construindo relações com nossos referenciais teóricos), na intenção de sugerir melhorias tanto para experiência similar à nossa quanto para outras. Vejamos a resposta de D (que não participou na oficina) à terceira pergunta. Esta guarda certa semelhança com a de B, ao sugerir que “[...] para maior proveito da matéria, o texto deveria ser dado numa semana e a discussão deveria ser feita noutra.”. A semelhança está em se sugerir a disponibilização prévia do material ao aluno. Enfim, ambos parecem recomendar a leitura de texto previamente à 80 oficina. Dessa perspectiva, a resposta de D não é inovadora em relação às outras já apresentadas; sua ideia de que a discussão ocorra em semana posterior concorda com B, quando este propõe que “[...] a palestra poderia ser direcionada a um debate ou tira dúvidas.”, após a disponibilização do texto. Contudo, disponibilizar o texto de Feynman antecipadamente exige que todos os prérequisitos sejam respeitados. Afinal, este aborda conhecimentos anteriores muito importantes em seu entendimento. Solicitar sua leitura sem respeitar estes conhecimentos nos remete à Bordenave e Pereira (2015), que orientam que o texto em questão deve ser básico e interessante. Ora, se o leitor não contempla os requisitos prévios, o texto não pode ser considerado básico – muito menos interessante. A leitura com requisitos prévios faltantes é capaz de desmotivar o leitor, pois as características textuais exigidas (básico e interessante) não mais se manifestam. Daí, a curiosidade do aluno possivelmente não se desperta, o que contradiz a primeira função positiva, para um estudo dirigido, enunciada por Bordenave e Pereira (2015, p. 266): a de ser capaz de motivar os estudantes, pois o uso de texto básico interessante lhes desperta a curiosidade. Também, a leitura com pré-requisitos faltantes estaria na contramão do que é chamada de leitura ativa por estes autores. A resposta de C (não participante do encontro), também à terceira pergunta, sugere a realização duma mesa-redonda. Aurélio Buarque de Holanda Ferreira define este termo como a “Reunião de pessoas entendidas ou abalizadas que discutem ou deliberam, em pé de igualdade, sobre determinado assunto.” (FERREIRA, 1999, p. 1322). De forma parecida, Houaiss (2009) define a palavra como “discussão ou conferência em que todos aqueles que dela participam estão em pé de igualdade”. Mas cremos que esta ideia não tem validade em nossa proposta; em rápidas pesquisas (em sites e artigos na internet), constata-se que a denominada mesa-redonda aproxima-se mais de uma espécie de reunião de especialistas em certo tema. Assim, não seria adequado estender a ideia a um grupo formado por um professor e sua turma. Relativamente à sugestão de “Outras oficinas ligadas ao tema.”, mencionada ainda por C na terceira pergunta, acreditamos que se enquadra em recomendações já citadas por outros que responderam o formulário. Aliás, esta sugestão levantou a questão do que vem a ser uma oficina, ou seja, se existe definição, descrição, para o termo. Neste trabalho, o termo oficina é utilizado simplesmente como uma espécie de sinônimo de reunião com alunos, para aplicar experimentalmente um material dirigido ao estudo. Bordenave e Pereira (2015) definem como laboratório ou oficina (workshop) uma reunião de pelo menos doze indivíduos sob a orientação de especialistas, de natureza bem prática, aplicada, cujos objetivos são, com efeito, muito específicos – e definidos a partir do 81 que as pessoas aprenderão a melhor executar na oficina. A lista de pessoal necessário na preparação de um bom laboratório (oficina) evidencia a complexidade da técnica; de fato, é preciso ao menos cinco espécies de pessoas – inclusive especialistas consultores. Os participantes devem se dividir em equipes, cada uma com local, materiais adequados e um instrutor-assessor acompanhante. A proposta inclui também palestras de especialistas consultores, discussão em pequenos grupos e em plenário, exercícios práticos etc. (BORDENAVE; PEREIRA, 2015, pp. 200-201). Mas esta técnica é demasiadamente complexa para nossa proposta e desnecessária para o material de estudo aqui sugerido, uma vez que envolve pessoas e atividades totalmente dispensáveis, além de uma natureza eminentemente prática e com finalidades bem específicas – algo inadequado para o estudo do texto em questão. Portanto, o termo oficina entra aqui apenas como mera denominação “técnica”, referindo-se ao encontro com os alunos universitários, para o qual se tentou propor sugestões de melhorias. 3.6 Algumas modificações no material e suas possíveis potencialidades Consideremos, adiante, algumas alterações produzidas no material de aplicação experimental, isto é, nas ‘Considerações ao estudante’, nas questões propostas e errata. Levantemos, também, algumas potenciais funções positivas do material. 3.6.1 Considerações ao estudante Certas modificações, feitas no primeiro material, dizem respeito às ‘Considerações ao estudante’, um documento que consistia numa espécie de introdução para o aluno – uma apresentação de nossa proposta de estudo do texto de Feynman. Acreditamos que alguns leitores poderiam sentir-se repelidos pelo documento, pois o texto introdutório era de tamanho significativo; daí se tentou encurtá-lo. A depender do tempo disponível, é até possível ler a nova introdução no início de uma oficina. Pode-se especular que a não leitura de um texto introdutório, em nossa aplicação, foi desfavorável, pois estaria em desacordo com a orientação de Bordenave e Pereira (2015), de que na primeira fase de estudo deve se solicitar do aluno uma visão global do texto (através de normas dadas pelo professor). Assim, títulos e subtítulos seriam observados, captando-se a estrutura do trabalho a ser feito. Como o texto de Feynman tem apenas um título, esta última ideia não deveria valer para este. Mas uma introdução ao leitor pode fornecer-lhe uma “visão” mais geral, global, do 82 texto em estudo e da proposta; ainda, pode ser capaz de gerar alguma perspectiva sobre esta. Enfim, destaque-se que as alterações feitas nas ‘Considerações ao estudante’ dizem respeito, principalmente, à tentativa de encurtar este documento. 3.6.2 Questões propostas Não se fez nenhuma alteração na primeira questão do material de aplicação experimental. Ressaltemos primeiramente uma modificação realizada na segunda e na quinta questões. Com efeito, tentamos descrever as mudanças na ordem numérica das questões, mas certa alteração produzida nestas duas é de igual natureza. Logo, é mais prático relatá-las juntamente. Com razão, Feynman não utiliza nenhum sistema de coordenadas vetoriais, ainda que vetores sejam representados em figuras, em negrito no corpo do texto, e as equações vetoriais de força magnética (para o referencial inercial de repouso do fio) e relativística de movimento sejam escritas, nos textos em português e em inglês americano aqui estudados. A segunda questão solicitava a obtenção de expressões para o valor do campo magnético B e para o vetor força magnética F atuante na partícula elétrica, no referencial inercial S do fio. A quinta solicitava expressões para o valor do campo E´ e para o vetor F´ atuantes nesta partícula, no referencial desta. Mas o autor desta dissertação percebeu que obter resultados vetoriais destas forças quase não possui utilidade, apenas complicando as questões. Pois é fácil captar, por regras mnemônicas da mão direita, que a força magnética em S somente pode estar em direção contida no plano da página da figura 13–10 do texto, perpendicular ao eixo longitudinal do fio e apontando para este. O mesmo ocorre com a força elétrica na partícula negativa, em S´, a partir do raciocínio de que o fio está positivamente carregado com densidade de carga uniforme neste referencial. Podemos concatenar estas alterações à orientação de Bordenave e Pereira (2015, p. 267), de que o professor formule “[...] questões claras e simples para serem respondidas seja com base no texto, seja interpretando a ideia ou intenção do autor, associando ideias, exercitando o raciocínio [...]”. Ora, solicitar resultados vetoriais não auxilia em nada para a compreensão do tema que, até certo ponto, consiste na compatibilidade e relacionamento entre Eletromagnetismo e TRE – além de alguns aspectos relevantes e integradores destas teorias. Assim, a complicação vetorial discorda de Bordenave e Pereira (2015), no que diz respeito à simplicidade de questões. 83 Poder-se-ia elaborar desnecessariamente algum sistema vetorial, o que não estimula a interpretação de ideia ou intenção de Feynman. Isto poderia prejudicar um pouco a aplicação do estudo, no caso em que os alunos tentem resolver as questões, gastando tempo desnecessário naquelas duas. Portanto, podemos enxergar possíveis potencialidades nestas modificações. Porém, quem muito valoriza estes entes matemáticos pode discordar deste argumento, crendo, por exemplo, que auxiliam o aluno a lidar com sistemas vetoriais. Mas este tipo de auxílio não toma parte em nossos objetivos. Como Bordenave e Pereira (2015) destacam a clareza de questões, introduzimos nos enunciados da segunda e quinta o fato de que o fio deve ser considerado infinito para os cálculos, pois Feynman aparenta não explicitar isto no texto – pois pode tê-lo feito em seções anteriores. Os desenhos adaptados, também, podem sugerir que o raio e diâmetro do fio reto seriam significativos em relação ao seu “comprimento”; poder-se-ia pensar que as considerações de simetria não seriam aplicáveis. Logo, resolveu-se esclarecer, na segunda questão (o que também é válido para a quinta), que se mostra apenas uma seção do condutor – e que este deve ter características tais para ser considerado infinito. Julgou-se útil uma pequena alteração no enunciado da terceira questão, incluindo-se que a velocidade média de arraste (dos elétrons de condução) também é denominada velocidade de migração em outras obras; p. ex., em Serway e Jewett (2008, p. 770). Também se incluiu o termo “de repouso”, ao citar o referencial S do fio de cobre, a fim de ressaltar que a velocidade de arraste destas partículas é válida neste referencial inercial. Alterou-se a pergunta ao final da redação da quarta questão, ainda no interesse da clareza, enfatizando-se o questionamento sobre a existência de carga líquida não nula. No primeiro material questionava-se apenas sobre carga líquida; logo, o aluno poderia responder “sim”, tendo em mente uma carga líquida nula ou não nula – e a resposta não ficaria explícita. De fato, há carga interna líquida (positiva) no fio, do ponto de vista de S´. Mas no texto, isto pode aparentar ser paradoxal com a lei de conservação da carga elétrica. Com efeito, Feynman apresenta ρ´ diferente de zero após ótimas considerações sobre a lei da invariância/conservação da carga, numa experiência de pensamento, idealizada e aproximada (o que se nota no fato de que os intervalos de tempo devem ser bem curtos, em seus respectivos referenciais). Também, antes da expressão para ρ´, lê-se no texto em português: “[...] um fio neutro, com uma corrente passando, deve parecer carregado quando colocado em movimento.” (FEYNMAN; LEIGHTON; SANDS, 2008, p. 13–8, destaque nosso). Analogamente, no original em idioma inglês, não aparenta estar claro que o fio, de fato, se 84 encontra carregado em S´ (ao menos para o autor desta dissertação), o que pode trazer a impressão de que este somente parece como carregado em S´ – mas, na verdade, não está. Digamos, enfim, que o trecho pode suscitar dúvidas a este respeito. As considerações do parágrafo acima provêm de dúvidas que surgiram no autor deste documento, ao produzir as questões. A sutileza do experimento, a ótima exemplificação do físico sobre a conservação da carga líquida, mais o trecho citado, pode levar-nos à conjectura de que ρ´ > 0 é apenas um resultado teórico para mostrar a relatividade dos campos elétrico e magnético e a compatibilidade da TRE com o Eletromagnetismo. Tudo isto justifica a alteração na pergunta da quarta questão, não só para torná-la clara, mas também para tentar incrementar seu potencial em levantar dúvidas semelhantes no leitor, levando-o a debater com o professor ou até mesmo a conclusões corretas. Mais adiante, argumenta-se a fim de mostrar que não existe incoerência entre o enfoque do texto e a lei de conservação da carga. De qualquer modo, o assunto deveria ser posto em discussão pelo professor. Fez-se uma pequena alteração no enunciado do item (b) da quinta questão, destacando-se que as equações eletromagnéticas, mostradas em questões, não necessitaram de correção relativística para serem aplicadas no texto. Esta nova redação tem potencial em recordar o fato de que equações atribuídas à Maxwell preservam iguais formas matemáticas nos dois referenciais inerciais (ou em qualquer outro). Na sexta questão, incluiu-se a palavra ‘inercial’ na terceira linha do enunciado, no interesse da clareza. Também nesta intenção, julgamos pertinente incluir o termo ‘correspondentes’ (para os intervalos temporais) na redação da sétima, pois a igualdade na variação de momentum relativístico transverso (em ambos os referenciais inerciais) ocorre apenas nestes intervalos – tomados entre os mesmos dois eventos. Assim, é possível que a modificação auxilie a perceber este aspecto, até porque Feynman utiliza o referido termo, além de poder contribuir na recordação de que Δt = γ Δt´ vale somente para estes intervalos de tempo. No item (a) da oitava questão, julgou-se relevante alterar o trecho “[...] podem se relacionar matematicamente? Para o pequeno valor [...]” por “[...] se relacionam matematicamente, de acordo com a previsão teórica? Na prática, para o pequeno módulo [...]”. Até certo ponto, esta mudança foi feita por causa do próprio texto de Feynman, que indica diferença entre o previsto teoricamente e o que se pode considerar, na prática, nas velocidades relativas muito baixas imaginadas pelo cientista. 85 Com efeito, Feynman (2008, p. 13–10) afirma que ao se comparar o módulo de F´ com o de F, observa-se que as forças são quase idênticas nos dois sistemas inerciais; na realidade, temos F´ = γF. Isto destaca a previsão teórica, que é válida, pois em uma experiência real em velocidades tão medíocres (como da ordem de 10 –4 m.s –1) as previsões relativísticas devem ser esperadas – mesmo que indiretamente e levando-se em conta efeitos que possam influenciar os resultados. Todavia, para vários efeitos práticos, as forças se igualam nas muito baixas velocidades do texto; a diferença entre F e F´ é tão ínfima que pode ser desprezada deste ponto de vista. De fato, v2/c2 é da ordem de 10 –25 para a velocidade que se calcula na terceira questão; em uma simples calculadora científica, γ iguala um. Enfim, a modificação pode indicar os dois enfoques em questão (teórico e prático), tornando o item (a) mais de acordo com a ideia de Bordenave e Pereira (2015): em se preparar questão clara a ser resolvida a partir do texto, da interpretação e associação das ideias, da intenção do autor etc. Ainda na oitava questão, foram substituídos os termos ‘valores’ e ‘valor’ por ‘módulos’ e ‘módulo’, o que não é muito importante para o entendimento dos enunciados, mas pode ser válido a fim de que estes fiquem mais coerentes com as mudanças na segunda e quinta questões (sobre a natureza vetorial das forças). Também, alterou-se bastante a redação do item (c), mantendo o cerne da pergunta. O novo enunciado consiste em: O obtido em (a) e (b) mostra a previsão relativística, que é válida, entre as forças do texto; ambas, cada qual atuando em um referencial inercial, se compatibilizam com o Eletromagnetismo Clássico e a Teoria da Relatividade Especial. Qual efeito relativístico pode ser considerado na explicação da diferença prevista entre estas forças? Tente descrever, interpretar, a correlação deste efeito com as forças. Esta alteração ocorre, pois, cremos que os antigos trechos “mesmo diferentes” e “[...] da diferença entre estas forças?” não concordavam com o modificado no item (a), podendo estar dissonantes com os argumentos a respeito da diferença teórica e igualdade prática das forças em baixas velocidades. A nova redação aponta ao leitor que a diferença é uma previsão válida que, de alguma maneira, mesmo indireta, se confirmaria. 3.6.3 Errata Outras possíveis potencialidades do material aqui elaborado dizem respeito à errata. A significância desta, para o estudo em questão – caso este se faça com alguma das edições aqui utilizadas –, está no auxílio que é capaz de prestar ao leitor na compreensão textual, para a resolução de questões, interpretação de intenções e ideias de Feynman etc. Em suma, a errata 86 tem potencial em contribuir para que se trabalhe bastante no texto, concordando, portanto, com a recomendação de Bordenave e Pereira (2015). As alterações neste documento consistem no seguinte: primeiramente, se incluiu um oitavo erro presente numa figura do texto – nas duas versões adotadas –, encontrado após a aplicação da oficina. Em segundo lugar, julgamos relevante fazer uma alteração no texto inicial da errata (logo após a ‘Introdução ao estudante’), ressaltando que os três volumes originais – em inglês – da coleção de Feynman, que contém o texto do estudo, foram lançados pelo California Institute of Technology (Caltech) e pelo ‘The Feynman Lectures Website’ em um endereço eletrônico, mostrado em nota de rodapé da ‘Introdução ao estudante’. Cremos que mencionar o conteúdo eletrônico é pertinente para o mundo globalizado, em que a internet tem importância indiscutível. Afinal, este pode ser muito bem aproveitado em leitura do texto enfocado ou de vários outros importantes capítulos e textos da obra. Posteriormente, serão feitas mais considerações sobre a errata. 3.7 Comentários sobre a elaboração do material: algumas justificativas e descrições A seguir, façamos comentários a respeito da produção das seções do material, principalmente no intuito de justificá-las e descrevê-las. 3.7.1 A Introdução ao estudante Assim como as ‘Considerações ao estudante’, nas quais fizemos algumas modificações, a ‘Introdução ao estudante’ – que substituiu aquela – é igualmente uma apresentação de nosso material de estudo do texto de Feynman, uma espécie de introdução ao leitor. A inspiração para tentar encurtar o primeiro documento, que originou o segundo, veio de Bordenave e Pereira (2015) – que exemplificam estudos dirigidos e diversas atividades didáticas mais concisas. Produziu-se o novo documento informando a localização do texto na obra, breves dados biográficos do físico, uma sucinta e informativa descrição a respeito do texto, a existência de erros (e a capacidade destes em prejudicar o leitor) e as atividades que cremos serem as mais importantes: leitura ativa e questões sugeridas. Uma introdução ao leitor pode lhe fornecer alguma perspectiva mais geral do texto, global, numa informativa e concisa descrição de importantes elementos textuais. Esta nova descrição textual, na ‘Introdução ao estudante’, é quase cópia de parte do nosso banner. Também, o texto introdutório pode ser 87 capaz de gerar alguma visão sobre a proposta – ao informar a respeito das questões sugeridas, errata etc. Finalmente, ressalte-se que a nova introdução ficou somente um pouco mais curta que a primeira; o que possivelmente ocorre devido à prolixidade do autor desta dissertação que, ao mesmo tempo em que tentou minimizar este fator, procurou garantir um material que informa elementos pertinentes para o estudo. 3.7.2 Errata Com efeito, o texto de Feynman (nas edições estudadas) possui erros que podem confundir e prejudicar o leitor. Pois não são erros tipográficos que mal atrapalham a leitura, como a ausência (e/ou grafia incorreta) de palavras pouco importantes. Feynman aborda dois referenciais inerciais, e estes equívocos – em boa parte – trocam um pelo outro, invertendo seus atributos. Por exemplo, S é trocado por S´ (e vice-versa) e a simbologia referente à densidade de carga é confundida. Isto justifica a produção da errata e sua relevância para o estudo, caso este se dê com alguma das versões aqui utilizadas. Na verdade, não se fez errata para estas duas edições, mas apenas para a brasileira; porém, os erros do texto, encontrados nesta, foram comparados com um original em inglês de 1964 – uma antiga versão que ainda pode ser mais encontrada e utilizada do que outras mais recentes. A comparação consistiu em verificar se os equívocos constavam ou não no original; nem todos estão presentes neste. Corrigimos os erros procurando detalhá-los, isto é, explicando porque estão incorretos, fornecendo as devidas correções e apontando se estão ou não no original citado. Não se fez errata do texto em língua inglesa, pois o tempo disponível para elaborar o material, aplicá-lo e redigir esta dissertação esteve sempre abreviado. Contudo, breves recomendações para adaptar a errata, caso se utilize o original citado, são passadas posteriormente. Tanto em aplicação na qual o professor fizer uso deste original, quanto da edição brasileira, o material eletrônico lançado pelo Caltech pode ser muito útil. Imagine-se o caso em que os alunos não resolvem/respondem boa parte das questões em um hipotético encontro, por falta de tempo e/ou por outros fatores; se os livros devem ser recolhidos, o educador pode propor a continuação do estudo em casa. E se uma grande fração dos participantes não tem acesso ao livro, mas lê em inglês, a ideia torna-se valiosa. Para os que não leem este idioma e não possuem acesso ao livro em português, uma continuação em sala junto ao texto brasileiro 88 deve ser propiciada. Isto também justifica a alteração na errata – incluindo-se a menção ao conteúdo eletrônico – e a ‘Introdução ao estudante’, na qual se cita o endereço deste. 3.7.3 Questões propostas Em relação à primeira, formulou-se algo com a intenção de tentar despertar mais o leitor para o que, conforme cremos, é o problema inicial do texto, a saber: “[...] no sistema S´ não pode haver nenhuma força magnética na partícula, porque sua velocidade é zero. Será que, com isto, ela permanecerá parada? Veríamos coisas diferentes acontecendo nos dois referenciais?” (FEYNMAN; LEIGHTON; SANDS, 2008, p. 13–7). Transformando as indagações de Feynman em afirmações, obtemos possíveis respostas para esta questão inicial, ou seja, a partícula ficaria estacionária em seu referencial inercial, comportando-se como partícula livre, e o Princípio da Relatividade de Einstein seria violado. Esta questão concorda muito bem com uma preciosa orientação de Bordenave e Pereira (2015): a de se formular questões claras e simples para serem respondidas interpretando ideia, intenção, do autor, associando ideias, exercitando o raciocínio e a imaginação etc. Assim, esta possui o potencial em estimular o aluno na análise do problema em questão, na integração de certas ideias (ou de distintas maneiras de expressá-las), no pensamento crítico etc. Dessa forma, a primeira questão pode alavancar a percepção do problema inicial, ajudar no julgamento da validade das indagações do cientista (e, portanto, do referido problema) e contribuir no preparo da estrutura cognitiva – a fim de que outras ideias sejam mais bem relembradas, reelaboradas. Estas considerações baseiam-se em certas funções positivas, do estudo dirigido, descritas por Bordenave e Pereira (2015). Vale citar o retorno positivo sobre a primeira questão, dada por D no questionário avaliativo: “Resolvi apenas a primeira e concordo que foi importante na compreensão do texto.”. A segunda questão é simples, do ponto de vista da aplicação da lei de Ampère da magnetostática para obtenção dos módulos de campo e força magnéticos no referencial inercial S do fio. Envolvendo certo cálculo, a situação abarca ótima simetria – num exercício básico resolvido em vários cursos de engenharia e afins –, na qual há um campo estático (mas não uniforme) circundando um fio cilíndrico bem longo conduzindo corrente constante. Os produtos escalar e vetorial, nesta questão, são muito simples para obter módulos – e a orientação de F obtém-se facilmente com alguma regra mnemônica da mão direita. Além disso, a abordagem de Feynman vale somente em intervalos de tempo muito curtos; assim, para a força e campo magnéticos atuantes na partícula elétrica, em S, é preciso preocupar-se 89 apenas com seus módulos e orientações instantâneas (iniciais). Analogamente, estes argumentos valem para a quinta questão, em que se solicita módulos de força e campo elétricos atuantes na partícula, em S´. As diferenças mais significativas são a orientação do campo E´ e o fato de que a fonte deste campo interagente não é a corrente constante existente em S´, mas a densidade de carga líquida uniforme e diferente de zero. Também, o sentido de F´ é mais facilmente vislumbrado, mas igual ao de F. Os apontamentos do parágrafo acima nos levam a crer que estas duas questões de resolução matemática são simples, podendo contribuir, por exemplo, para exercitar o raciocínio – como propõem Bordenave e Pereira (2015). A quinta questão pode ser razoavelmente útil na associação, retomada, de ideias e conceitos, um fator importante destacado por estes autores. Pois no cálculo de módulos de E´ e F´ (com termos iguais aos de Feynman) se deve retomar o conceito de densidade de carga, substituindo-se a carga interna, em S´, por ρ´AL´; além disso, a densidade líquida não nula ρ´ (de S´), a princípio, já teria sido obtida na quarta questão – daí se pode obter expressão com termos iguais ao do texto. Até aqui, as considerações sobre a quinta questão referem-se apenas ao item (a). O objetivo é produzir nossas colocações na ordem das questões; entretanto, como as modificações feitas na segunda questão também dizem respeito ao item (a) da quinta, achamos útil considerá-las conjuntamente. No item (b) da quarta pergunta do formulário, a resposta de B vem como retorno positivo a respeito das questões (e possivelmente das já aqui abordadas): As questões propostas foram interessantes, sim. Pude perceber que foram colocadas questões em que se tinha de obter equaçoes do eletromagnetismo, questões de destinadas a se fazer uma breve explicação sobre a relatividade e o fator de Lorentz e questões de física mais simples. Elas ajudam a fixar as idéias desenvolvidas no texto e a comprova - las. Porém, um material com as respostas seriam também interessantes ao final da proposta (sic). As colocações do estudante, que participou da oficina, nos remetem a proposições de Bordenave e Pereira (2015), como a de que as questões sejam respondidas com base no texto, interpretando ideias do autor etc. Cremos que a segunda e o item (a) da quinta são mais facilmente resolvidos se o leitor analisa figuras, leis e equações, e algumas explanações do texto. Ou seja, não basta o saber prévio das leis eletromagnéticas envolvidas e de certos elementos de cálculo. O leitor comum possivelmente precisará do texto não apenas nestas questões, mas também em outras. 90 Passemos à terceira questão. Esta tem o intuito de levar o leitor a perceber que, em geral, os módulos de velocidade clássica de elétrons condutores são bem baixos em finos fios ordinários do cotidiano (de cobre (Cu), por exemplo) –, se comparados às velocidades da maioria dos objetos macroscópicos do dia-a-dia. Cremos que todos os dados e condições necessárias para o cálculo se encontram na terceira, podendo-se considerar a questão clara e simples. Caso não obtenha expressão que estime esta velocidade, o leitor provavelmente consultará o texto, onde se explicita que a corrente, em S, pode ser dada por ρ_vA. Pela análise de texto e figuras, vê-se que v = v_ e se obtém uma equação para v_. O cálculo envolve algum raciocínio, pois a densidade de átomos (igual à de elétrons livres) deve ser convertida de cm3 para m3 e multiplicada pela carga por elétron – o módulo invariante da carga elementar. Ou seja, acreditamos ser útil calcular ρ_ primeiramente; também, é preciso cautela com as unidades, por exemplo, em relação ao diâmetro do fio. Por conseguinte, podese crer que a questão atende proposições de Bordenave e Pereira (2015), estando clara, simples e passível de contribuir no exercício do raciocínio e na consulta ao texto. A quarta questão tem a possibilidade de estimular a capacidade de análise. Pois, se a carga líquida em um objeto eletricamente isolado se conserva, compreende-se que a densidade desta pode variar quando há contração relativística do espaço – e que há uma relação geral entre as densidades de repouso e relativa de carga elétrica. A capacidade analítica e de raciocínio entraria na obtenção de equações entre densidades de carga para os elétrons livres e para os átomos positivamente carregados (fixos na estrutura do condutor), pois cada relação envolve os dois referenciais em questão. O mais contundente, nas respostas de B, é sua crença de que as questões, em geral, auxiliam a fixar ideias do texto e a comprová-las, isto é, ajudam a retomar ideias, intenções, do físico, auxiliando na verificação teórica – o que cremos ser bem válido para a quarta questão. Pois esta é capaz de mostrar matematicamente o aspecto da relatividade de campos elétricos e magnéticos, a contração de Lorentz (aplicada no cômputo da densidade líquida de carga em S´) e o fato de que o fio realmente surge carregado neste referencial inercial. Estas respostas de questionário avaliativo são aqui analisadas mais como opiniões pessoais, não conclusões gerais; o retorno dos questionários é insuficiente para tais conclusões. Mesmo assim, a resposta do aluno tem sua relevância. Discutimos, anteriormente, a modificação feita na pergunta da quarta questão – o questionamento sobre a carga líquida não nula no corpo do fio, em S´ – e as possíveis potencialidades desta. Um ótimo argumento que mostra que ρ´ > 0, em S´, não viola a 91 conservação da carga, é o fato de que o fio reto não é o sistema físico do texto, que também deve incluir uma fonte de voltagem (e possivelmente outros elementos de circuito). E, no sistema como um todo, eletricamente isolado, a carga líquida é invariante; sendo nula em S, o será em S´. Isto não invalida a abordagem de Feynman, pois, se o fio (ou uma seção deste) está positivamente carregado em S´, o restante do sistema (neste referencial) possui carga líquida negativa e de igual módulo. Apresentamos neste terceiro capítulo, no item 3.2.3, uma ideia que descreve este fenômeno. As considerações anteriores indicam, até certo ponto, a significância da pergunta na quarta questão, pergunta que pode se concatenar a uma função citada por Bordenave e Pereira (2015): estimular o desenvolvimento da capacidade de observar e avaliar (consciência crítica), ao se tentar despertar a captação de lacunas no texto e o julgamento da validade de suas afirmações. Em suma, a pergunta é passível de estimular esta função, ao menos minimamente e a depender do leitor. As lacunas contidas no texto diriam respeito, então, à dúvida que pode surgir em relação à carga no fio em S´ e à lei de conservação, que não pode ser e não é violada na experiência do texto. Pode ser valioso que o educador (após a leitura ativa e antes de entregar as questões) suscite a reflexão sobre estas lacunas, sem explicitar a resposta da pergunta da quarta questão – a fim de estimular o estudante a pensar. Pode-se interligar esta reflexão à orientação de Bordenave e Pereira (2015, p. 267): elaborar questões a serem feitas a partir da associação de ideias, exercício do raciocínio etc. Enfim, o professor atuaria no auxílio à integração de alguns elementos. Na redação do item (b) da quinta questão introduz-se o fato de que Feynman aplica cada lei eletromagnética, envolvida no texto, em determinado referencial, sem corrigi-las relativisticamente – o que pode ser válido para indicar, relembrar, que as equações de Maxwell já têm formulação relativística, mantendo suas formas inalteradas em qualquer referencial inercial. Também são ressaltadas as constantes μo e εo, presentes nas formas das equações apresentadas por nós, enfatizando-se que estas constantes se correlacionam a outra importante quantidade física. Destacar a permissividade elétrica e a permeabilidade magnética, para o espaço livre, é uma tentativa de recordar o leitor da simples correlação matemática entre estas e a constante c, uma correlação idêntica em qualquer sistema inercial. A redação de introdução também confere certa clareza às perguntas seguintes, que discorrem principalmente sobre a velocidade da luz no espaço livre, a quantidade implícita na introdução do item. Esta invariante está explícita em grande parte das equações do texto, tanto para grandezas de S quanto de S´, o que pode ser útil para mostrar teoricamente sua invariância. Visualizamos c, também, em boa parte das equações que relacionam quantidades 92 eletromagnéticas e que contêm o fator γ – oriundo da aplicação da contração de Lorentz. Isto destaca um pouco a união entre Eletromagnetismo e TRE, por meio de matemática simples. Esta união indica que o postulado de Einstein, da invariância de c, é uma lei naturalmente presente no Eletromagnetismo. Enfim, cremos que se satisfaz a ideia de Bordenave e Pereira (2015) ao se solicitar, em perguntas do item (b) da quinta, a análise cuidadosa do formalismo matemático (com um questionamento claro a se responder com base no texto). Além disso, é preciso alguma habilidade em associar ideias e de raciocínio, para uma boa resposta discursiva relacionada à lei da constância da velocidade luminosa no espaço livre, à correlação intrínseca entre esta e os invariantes μo e εo, e/ou sobre alguma noção correlata. A sexta questão poderá demandar um maior esforço, no que concerne ao encadeamento do raciocínio matemático para o cálculo, à associação de algumas ideias, à percepção da intenção de Feynman em mostrar que “[...] temos o mesmo resultado físico quando analisamos o movimento de uma partícula movendo-se ao longo de um fio num sistema de coordenadas em repouso com respeito ao fio, ou num referencial em repouso com respeito à partícula.” (FEYNMAN; LEIGHTON; SANDS, 2008, p. 13–11). Um maior esforço do leitor não contradiz Bordenave e Pereira (2015); pelo contrário, uma vez que estes consideram o estudo dirigido como atividade que exige muito esforço na extrapolação e interpretação do conteúdo textual – usando criatividade própria (BORDENAVE; PEREIRA, 2015, p. 266). E esta ideia não se opõe à formulação de questões simples, pois a simplicidade proposta por estes autores não significa facilidade, mas que as questões podem ser bem aproveitadas por quem preenche os pré-saberes de um modo mais elementar, e se interessa, esforça, na leitura e consulta ao texto (e a possíveis auxiliares, como a discussão com o professor e/ou a errata). A relação solicitada na sétima questão é muito simples, e consiste na equação 13.33 do texto: Δt = t´ . Porém, interpretar o resultado, tentar descrevê-lo dando-lhe algum v2 1 c2 significado, não é tão simples no caso do texto em questão – pois se lida com uma interação de natureza eletromagnética em intervalos temporais muito curtos, em seus respectivos referenciais inerciais. Não é utilizada a ideia de evento que, a priori, se define por um instante de tempo e uma posição em cada referencial inercial (EINSTEIN, 1999). Feynman pode ter concluído que esta ideia complicaria seu simples tratamento matemático. Também, não há um fenômeno para o qual existe um tempo próprio médio, como para partículas que são formadas e se desintegram (por exemplo, o múon, mencionado na oficina). Dessa forma, interpretar 93 Δt = γ Δt´, descrevendo a dilatação temporal em uma experiência pensada, é um pouco complicado. Então, acreditamos que a sétima se encaixa na proposta de Bordenave e Pereira – que também justifica a questão –, de que o aluno deve trabalhar bastante no texto, “[...] usando sua própria criatividade na interpretação e na extrapolação do conteúdo [...]” (BORDENAVE; PEREIRA, 2015, p. 266). Isto abarcaria interpretar e associar ideias e intenções do físico, raciocinar e imaginar que um evento, para a partícula elétrica, pode ser vislumbrado como uma coordenada transversa – que é invariante. Assim, após as atuações das forças durante curtíssimos intervalos temporais correspondentes, cada força em seu referencial, a variação de momentum transverso da partícula será igual para uma mesma coordenada y = y´ (o evento final). Para o evento inicial, poder-se-ia considerar y o = y o´ = 0. E, sendo Δt > Δt´, F deve assumir um módulo menor que o de F´, para que um impulso de igual módulo se comunique à partícula, em S e em S´ – e sua variação de momentum transverso seja a mesma. Na oitava questão, é possível crer que (ao menos para boa parte dos leitores) será preciso consulta e releitura atenciosa em fragmentos do texto, para conferir o explicitado em enunciados, analisar equações, integrar ideias etc. A questão, assim como outras, também exige algum esforço do aluno na interpretação e, até certo ponto, extrapolação de conteúdo. O efeito de dilatação temporal, na experiência estudada, é bem sutil. Porém, este efeito explica a diferença prevista para as forças, pois, para que se tenha o mesmo momentum transverso, as forças devem equacionar-se de forma oposta à prevista para o tempo, mantendo igual valor para o fator de Lorentz – uma vez que o módulo da velocidade entre S e S´ é constante. Então, F´ t , o que seria uma possível resposta matemática para o item (c) da última questão. =γ= F t´ Enfim, as considerações para descrição, interpretação, da inter-relação entre a dilatação temporal e a diferença entre as forças podem ser semelhantes às anteriormente apresentadas para a sétima questão. A distinção (do último item) da oitava para a penúltima questão é que nesta se solicita a relação entre intervalos de tempo e alguma descrição para a mesma; já naquele item, se pergunta qual efeito concilia a diferença entre F´ e F. Enfim, os dois itens são parecidos, e cremos que para interpretá-los, respondê-los, faz-se necessária a associação de ideias e intenções do autor, trabalhando com os conceitos de força, momentum linear relativístico, tempos correspondentes etc. Podemos acreditar que as questões propostas auxiliariam as funções positivas de Bordenave e Pereira (2015). Ora, o esforço demandado em várias questões – seja na interpretação, releitura, uso de abstração e extrapolação do tema – passa quase 94 necessariamente pela cuidadosa análise textual, o que pode estimular a capacidade analítica. Seguindo as ideias destes autores, pode-se afirmar que o trabalho do aluno ainda requer que as informações do texto sejam bem julgadas e que se tente perceber lacunas ali presentes. Estas são, ao menos, tentativas de interpretar as proposições destes, uma vez que estas estão postas de maneira bem concisa e aparentemente muito abrangente. Além disso, pode-se crer que estão intimamente interligadas umas às outras. Com efeito, tentamos manter a mesma simbologia matemática de Feynman em nossas questões. As formas utilizadas para equações de Maxwell, no material sugerido, são comuns em livros de Física Básica do ensino superior, embora possam diferir razoavelmente das adotadas por Feynman (em partes anteriores ao texto). Cremos que foram escritas de modo simples e conhecido dos leitores. 3.7.4 Material suplementar Preparamos um texto suplementar com resoluções e respostas comentadas das questões, considerações sobre aspectos que julgamos pertinentes no texto (e algumas noções correlatas). Este material fica totalmente a título experimental, pois não se aplicou nem se obteve retorno algum dele, sua leitura não foi feita no encontro, não foi usado em discussão/correção e nem avaliado em questionário. Ressalte-se que foi completamente preparado antes da oficina, já com a finalidade de ser entregue aos participantes após esta. Também foi enviado aos dois não participantes da oficina que responderam o formulário, aparentemente procederam na leitura do texto e ao menos tentaram iniciar a resolução das questões sugeridas, contribuindo com esta pesquisa. Esperou-se um tempo razoável, após a oficina, para enviar o material citado, pela simples razão de que aguardávamos retornos de respostas/resoluções das questões, ou seja, era preciso garantir algum tempo para o estudo/leitura. Além disso, esperávamos receber formulários avaliativos. Enviamos o documento suplementar em 11 de agosto de 2015, através da rede de mensagens do Facebook® – convertido para um arquivo PDF. Destaque-se que a intenção do autor desta dissertação, ao elaborar este material, foi a de auxiliar o leitor na autocorreção e estudo das questões. Este foi feito com cuidado, imaginando-se, por exemplo, o caso em que o professor não dispõe de tempo para corrigir ou ajudar os alunos a fazê-lo. E os docentes necessitam de um subsídio para uma espécie de précorreção das questões com os alunos, caso possam e desejem fazê-la. Enfim, não se preparou 95 um texto para especialistas, mas um documento passível de auxiliar qualquer professor de Física (ao nível superior) que preencha os pré-requisitos do texto de Feynman. Ainda é possível que o material suplementar ajude o leitor a reelaborar suas ideias (ao menos minimamente). Esta crença ocorre porque o autor deste documento esforçou-se bastante na tentativa de concatenar, relacionar, o abordado nas questões com o conteúdo textual e com relevantes noções. Noutras palavras, se tentou correlacionar alguns elementos que apontam a integração da TRE e Eletromagnetismo. O professor pode ainda encontrar auxílio na preparação de discussão; ou ao menos o suplemento pode lhe indicar ou recordar certas noções que são valiosas em um debate. Não se fez nenhuma modificação e/ou revisão no documento (nem nas resoluções da segunda e quinta questões, a respeito do caráter vetorial das forças), pois o tempo para finalizar este trabalho se esgotava. Ou melhor, a única revisão (e alterações) produzida no material suplementar é a usualmente feita pelo autor após tudo o que redige. Ao dizermos que não se realizou alteração/revisão no suplemento, temos em mente as mudanças por vezes feitas quando já se aplicou, avaliou etc., um texto – e/ou quando o autor reelabora, aprimora, suas ideias e conhecimento. Assim, a revisão/melhoria do documento fica como proposta futura. Por fim, destaque-se uma resposta ao item (b) da quarta pergunta (do formulário), que contribui na justificativa e aponta a significância deste documento em subsidiar o leitor, pelo menos na perspectiva pessoal do aluno B: “Porém, um material com as respostas seriam também interessantes (sic) ao final da proposta.”. 96 97 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Neste último capítulo, são apresentados alguns pontos – em um resumo bem geral – que o autor deste documento julgou relevantes (ou que, ao menos, deveriam ser levantados, recordados, retomados, a fim de concluir). Considerações sobre a eficácia da oficina constam no segundo item (seção) do presente capítulo. Finalizando, são apontadas possíveis propostas de trabalhos futuros no terceiro item. 4.1 Resumo geral Abordamos, neste trabalho, um rico texto do renomado físico norte-americano Richard Feynman. Este, de certo modo, envolve alguns elementos bem introdutórios sobre Eletrodinâmica Relativística, colocando em ênfase a relatividade de conceitos de força e grandezas de campo elétrico e magnético, ao mostrar que as previsões relativísticas de contração de Lorentz e dilatação temporal podem ser aplicadas ao Eletromagnetismo Clássico – a fim de conciliá-lo com a Teoria da Relatividade Especial. Noutras palavras, o físico mostra que o Eletromagnetismo já possui formulação relativística; estas previsões podem ser naturalmente aplicadas em seu contexto. Em considerações anteriores, levanta-se a possibilidade de que o leitor seja conduzido a um paradoxo aparente (no que se refere à conservação da carga líquida), pois o fio – ou uma seção deste – está neutro em um referencial, mas carregado noutro. Porém, nossos argumentos mostraram que isto não invalida a abordagem do texto, pois o sistema físico não pode consistir apenas no fio. Baseando-se em colocações anteriores, poderia ser útil, então, uma discussão para suscitar a reflexão do aluno a este respeito, estimulando-o a pensar; esta se daria após a leitura e antes da resolução de questões – sem explicitar respostas ao participante. Se o professor vier a corrigir as questões, seria valioso enfatizar certos argumentos a respeito, mostrando claramente que não há incoerência com a lei de conservação da carga elétrica. Exemplos dados por Feynman, observados no cotidiano, fazem-nos concluir que a carga elementar não pode depender da velocidade e nem da energia associada às partículas atômicas. Assim, a carga líquida em um objeto eletricamente isolado se conserva em qualquer referencial inercial. Este é um aspecto significativo e bem exemplificado no texto; outro, que está implícito, é o fato de que a forma matemática das leis eletromagnéticas aplicadas (cada qual num referencial) não precisou de correção relativística. Também, é relevante que a 98 constante c (valor de velocidade da luz no espaço livre) apareça em expressões de grandezas tanto de S quanto de S´. Estes dois últimos aspectos nos remetem aos postulados de Einstein. Os três parágrafos acima indicam noções importantes do texto, que poderiam ser levantadas pelo professor. A sugestão é que, em uma discussão inicial após a leitura e retificação do texto, o educador suscite o pensamento do aluno sobre estas noções (ou outras correlatas), sem explicitar-lhe respostas. Em seguida, numa possível correção, poder-se-ia aprofundar o debate, por exemplo, ressaltando bem os postulados da TRE, recordando que Δt e Δt´ devem ser bem curtos (para que os referenciais possam ser considerados inerciais), debatendo o fato de que, em velocidades relativas muito pequenas – como a obtida na terceira questão –, o Eletromagnetismo Clássico já incorpora a TRE; e esta coerência interna entre as teorias fornece a descrição clássica para a interação que deve ocorrer em S´. Apresentamos justificativas que validam abordar o texto e/ou tema semelhante ao deste, em curso superior de Física ou afim. Por exemplo, as noções apontadas acima indicam que o texto de Feynman é interessante. Este é introdutório para o tema, com nível matemático simples, abordando apenas campos estáticos (embora não uniformes); e os pré-conhecimentos necessários ao seu estudo (e à tentativa de resolução das questões) não precisam ser avançados. Assim, a orientação de Bordenave e Pereira é satisfeita, pois o texto é também básico. Em relação aos referenciais teórico-pedagógicos, cremos que Vygotsky e a Teoria histórico-social fundamentam bem a discussão professor-aluno. Suas abrangentes ideias sustentam e se aplicam a um não pequeno número de trabalhos na educação. O diálogo professor-aluno é aqui apenas sugerido, levantado, mas carrega ao menos algum potencial em estimular o pensamento do estudante, auxiliá-lo a perceber lacunas textuais e julgar a validade de afirmações. Até certo ponto, este argumento se interliga à Bordenave e Pereira (2015, p. 266), no sentido de que o diálogo aumente a capacidade do texto – durante e após a resolução de questões –, e também do material em geral, em despertar a habilidade de consciência crítica. Destacou-se detalhadamente o encontro (oficina) planejado para aplicar o material de experimentação. Foi preciso cobrir pré-requisitos, uma vez que estes são saberes necessários ao estudo de determinado tema. Acreditamos que se conseguiu abarcar, de modo razoável, grande parte dos conteúdos planejados. Os participantes fizeram leitura individual e o debate se iniciou após esta; também, entregou-se a errata para correção. Infelizmente, não houve tempo para que tentassem resolver as questões. Porém, como ressaltado, esta tarefa lhes foi solicitada para casa. 99 A ideia de um formulário eletrônico, com intuito de avaliar o material e o encontro, foi valiosa. Esta se mostra ainda mais pertinente pelo fato de que não recebemos nenhum conjunto de respostas/resoluções das questões sugeridas. Como o retorno do formulário foi escasso (apenas duas respostas de participantes), considerou-se útil contatar outras pessoas para que cooperassem com a pesquisa. Mais dois indivíduos, que não foram à oficina (mas preenchiam os pré-saberes), responderam o formulário; a estes se enviou todo o material para o estudo, além de importantes informações. Suas participações também se resumiram em responder o formulário. Apesar do pequeno feedback, o autor desta dissertação crê que, das quatro respostas, duas ou três vieram de pessoas que realmente mostraram interesse no texto de Feynman. As dificuldades encontradas, como a falta de tempo durante o encontro, a voluntariedade da atividade etc., com efeito, dificultaram a análise de dados, no sentido de que não foi possível retirar conclusões mais gerais, mas apenas colher opiniões pessoais – ainda que significativas. Mesmo assim, conseguimos propor humildes sugestões para melhor aplicar o material; também, foi possível concatenar, de forma satisfatória, alguns “elementos” às ideias orientadoras de Bordenave e Pereira. Com razão, procurou-se justificar e descrever todas as partes integrantes do material. Estão são mutuamente dependentes, ou seja, a leitura/estudo isolada de cada uma não tem muito significado no contexto de nossa proposta. Enfim, pode-se crer que, se bem aplicadas conjuntamente, as partes são capazes de contribuir para melhor compreensão do texto de Feynman – e até de noções correlacionadas –, em relação à que se teria em única leitura isolada do texto. Passemos à análise final sobre a eficácia da aplicação do material em uma futura e hipotética oficina. 4.2 Considerações sobre a eficácia da oficina Serão elaboradas, neste item, considerações e argumentos sobre a eficiência da oficina proposta. Tentar-se-á comparar estas colocações com nosso principal referencial teórico e com os resultados, dados, coletados no formulário. Pode-se dizer que o material, se bem aplicado, é passível de propiciar uma análise mais cuidadosa do texto em questão – do que a que seria feita em única leitura isolada. Bordenave e Pereira (2015) sustentam que a cuidadosa análise leva à compreensão do tema do texto básico; isto, por sua vez, desenvolve a habilidade analítica. Foram apresentados alguns argumentos que mostram, por exemplo, que muitas questões sugeridas necessitam de 100 associação de ideias, raciocínio, percepção de lacunas, observação de expressões matemáticas etc. – o que se daria junto à releitura/consulta ao texto. Outras considerações indicaram que parte significativa das questões deve ser feita com base no texto e na interpretação de ideias, intenções, do autor. Ora, estas colocações apontam que as questões propostas podem, então, contribuir para melhorar a análise textual; por conseguinte, auxiliariam na compreensão. Mas, e no que diz respeito à aplicação do material, isto é, à proposta de oficina, encontro com universitários? Como se tentaria aprimorar a aplicação, fazer com que esta seja mais eficaz? Primeiramente, não existe eficiência total em educação; o planejamento do ensino de Física, as atividades didáticas etc., podem ser, portanto, sempre mais bem planejadas e também modificadas a fim de se adaptarem às variações temporais, culturais, geográficas, tecnológicas, de pensamento e cognição etc. Em segundo lugar, apontou-se um fator que não pode ser desprezado pelo educador: os pré-requisitos para aplicação de determinada atividade, texto. Estes foram bem fundamentados aqui, tanto em relação ao referencial de Vygotsky quanto ao de Bordenave e Pereira. O primeiro introduz a ideia de uma espécie de estágio de desenvolvimento cognitivo real, enquanto o segundo nos demonstra – por meio de pesquisas empíricas – a importância das aprendizagens anteriores. De qualquer modo, é possível perceber que estas préaprendizagens se correlacionam ao estágio de desenvolvimento cognitivo do indivíduo. Poderíamos afirmar, de certo modo, que os pré-saberes compõem o leque de conhecimentos bem estruturados na mente de uma pessoa. Assim, como ressaltado anteriormente (em sugestões de aprimoramento para a oficina), é muito valioso que o professor não poupe esforços a fim de preencher todos os préconhecimentos para a leitura ativa do texto. Afinal, é fácil captar que o conhecimento elementar destes é imprescindível para a análise cuidadosa. Caso não sejam respeitados, não se pode denominar o texto básico e interessante. Além disso, a compreensão do assunto não seria alcançada. A recomendação, então, é que o professor utilize o máximo tempo possível para bem cobrir os pré-requisitos, sem retirar tempo das outras atividades. Se for preciso abarcar muito conteúdo, poder-se-ia fazê-lo em mais de uma aula (exposição) teórica – a fim de não cansar demasiadamente os estudantes. Também se pode indagá-los sobre seus présaberes e, caso o educador julgue ser útil, pode relembrar-lhes conteúdos já estudados – dos quais não se recordam bem. Outro fator importante, para bem aplicar o material, diz respeito à leitura. Antes da leitura textual, cremos ser valiosa a da ‘Introdução ao estudante’; foram introduzidos alguns argumentos que apontam sua pertinência. É importante disponibilizar tempo suficiente para 101 leitura cuidadosa de todos os itens, principalmente o texto de Feynman. Afinal, segundo Bordenave e Pereira (2015), o estudante deve aplicar muito trabalho no texto entregue. Recorde-se que se levantou a ideia de pedir a leitura de texto sem a errata, solicitando ao estudante a tentativa de descoberta dos erros e a posterior conferência com a errata, corrigindo o próprio texto – o que pode estimular o julgamento da veracidade de informações e a captação de lacunas. Enfim, este procedimento estaria em concordância com Bordenave e Pereira (2015), podendo auxiliar a capacidade de consciência crítica sem interromper o fluxo de leitura. Seria também significativo solicitar a releitura de trechos corrigidos, a fim de melhor compreendê-los. Assim, enfatizamos ao professor/leitor que não abrevie o tempo de leitura e, se possível, solicite a releitura cautelosa do texto para casa – por exemplo, na situação em que uma discussão, seguida da entrega das questões, apenas se dará num encontro seguinte. Cremos que as considerações deste item são bastante relevantes para se tentar aplicar de modo satisfatório. Afinal, é adotado um texto cuja experiência de pensamento, idealizada e aproximada, envolve um intrigante problema inicial – texto em estilo linguístico diferente de boa parte das obras técnicas. O leitor/estudante comum precisará não apenas de pré-saber elementar, mas também de tempo para a análise cuidadosa, reflexão, integração de ideias, percepção de validade e de erros, de intenções e ideias do autor etc. Podemos crer que estas colocações apontam para a ideia de leitura ativa, indicada por Bordenave e Pereira (2015, p. 266), ao menos para o texto em questão (e até porque baseamo-nos nestes para produzi-las). Enfim, também a discussão – após a leitura – sobre aspectos significativos, indicados no início deste capítulo (e também apontados em outros pontos da dissertação), pode ser capaz de potencializar a análise cautelosa de texto e, portanto, a sua compreensão. A sugestão é que o professor suscite a reflexão do aluno sobre estes aspectos, auxiliando seu pensamento (sem explicitar-lhe respostas). Isto pode contribuir ainda mais para que o discente trabalhe muito no texto, durante o estudo das questões e/ou em releitura futura – usando sua criatividade própria na interpretação e extrapolação do conteúdo, como sugerem Bordenave e Pereira (2015). Afinal, o debate a respeito de noções relevantes contidas em qualquer texto (básico interessante) pode ajudar a despertar a curiosidade, o que, segundo estes autores, motiva o leitor (BORDENAVE; PEREIRA, 2015, p. 266). O diálogo sugerido, sobre os aspectos citados, seria apenas em nível elementar. Noutras palavras, cremos que somente o relacionado à essência das ideias físicas já seria útil para auxiliar o estudo. Esta proposição se concatena à ideia de que o educador se engaje em contribuir com o aluno ao discutir, penetrando-lhe o psiquismo; e também de que o docente, 102 mais os estudantes, forma um grupo social interativo. Estas últimas colocações relacionam-se à Vygotsky e Teoria histórico-social. Assim, sugeriríamos ao professor que reflita sobre as importantes noções textuais mencionadas (e sobre estas considerações finais) e, se necessário, elabore um rascunho para discussão. Finalmente, podemos especular que o debate estimulado pelo docente ajude a produzir alterações internas na psique, através da língua falada – o instrumento externo, elemento exterior – e dirigida aos próprios interlocutores. O último dos argumentos, no intuito de dar mais eficiência à oficina, seria o de se fazer (caso preciso) uma boa correção de questões com os alunos, tentando sempre interligar elementos contidos nestas com relevantes noções do texto – além de outras relacionadas. Nossa sugestão é que, nesta tentativa, o professor atue para auxiliar o discente a integrar ideias, o que concorda com a orientação de Bordenave e Pereira (2015) – de se organizar ideias numa espécie de síntese final. Para isto, o material de suplemento (além de alguns trechos desta dissertação) pode ser útil. Mas a proposta de correção fica mais a título experimental, haja vista que, em nossa oficina, esta nem foi iniciada; e não se fez leitura/debate utilizando o texto suplementar. Por isto mesmo, entra aqui como humilde recomendação. Recordamos ao educador que resolva as questões antes de aplicar, como propõem Bordenave e Pereira (2015, p. 270) para a análise do estudo dirigido pelo próprio docente. E no que concerne à nossa aplicação (oficina), o que se poderia dizer sobre eficácia, eficiência? De fato, quase todos os pré-requisitos foram preenchidos, e cremos que isto foi feito de maneira razoável. Apenas o conceito de momentum linear relativístico foi esquecido. Em relação à leitura e retificação textual, disponibilizou-se tempo suficiente. Entretanto, ao percebermos que o tempo do encontro estava breve, solicitamos a leitura concomitantemente à errata ou conforme a indicação anterior (de se procurar erros e destacar partes suspeitas, posteriormente confrontando-as com a errata e retificando o texto). Assim, passou-se o texto junto à errata. No que diz respeito à discussão, esta apenas se iniciou, como já afirmado. Logo, o diálogo pensado e planejado em esboço, pelo autor desta dissertação, poderia ter abarcado mais aspectos pertinentes e, por conseguinte, subsidiado mais o aluno na análise textual cuidadosa durante hipotética resolução de questões. Sustentamos esta conjectura, pois, as interessantes noções textuais podem despertar curiosidade; se uma primeira leitura não foi eficaz neste objetivo, um melhor debate poderia tê-lo feito com mais vigor – o que motivaria mais o aluno, segundo Bordenave e Pereira (2015). Alguns argumentos apontam certa ineficácia em nossa oficina. No entanto, isto não invalida este trabalho nem o faz menos relevante do que se houvesse obtido “sucesso”. 103 Cremos que os resultados de pesquisas e aplicações em educação são, por vezes, complicados de serem vislumbrados. Obviamente, estes dependem do tipo de pesquisa, material abordado, dos pesquisadores, público-alvo, metodologia, das experiências anteriores e de outros diversos fatores. Destaque-se que, aqui, não se lidou com o intelecto humano passivo – para o qual, por exemplo, se depende apenas de resposta(s) simples, como em pesquisas de intenção de voto (que requerem pouquíssimo esforço intelectual e tempo do indivíduo). Lidamos, sim, com o intelectualmente ativo, que precisa mostrar algum esforço, curiosidade, interesse etc., disponibilizando seu tempo. As colocações anteriores, no que se refere ao fato de que foi abordado o intelecto ativo, são coerentes com Bordenave e Pereira (2015), uma vez que estes orientam que o estudante se esforce bastante em leitura ativa do texto proposto. Apesar de percebermos certa ineficácia em nossa aplicação, a proposta ainda poderá ser aplicada e avaliada, aprimorada, adaptada etc. Além disso, poderá ser valiosa para o autoestudo de docentes, alunos, curiosos e/ou até para adaptação, recorte – a fim de ser enfocada no ensino médio. Some-se a isto a crença de que o material possui potencial de ser bem sucedido e avaliado em curso superior de Física. Em primeiro lugar, esta crença vem de algumas respostas do formulário avaliativo. Por exemplo, no item (b) da quarta pergunta, A ressalta que as questões sugeridas “[...] trabalham com aquilo que foi abordado no texto do Feynman.”. Também, este escreve que “São exercícios que ajudam a enxergar melhor como a TRE se relaciona com o electromagnetismo.”. Estas respostas indicam a potencialidade das questões em auxiliar o leitor na compreensão de tema e de significativas noções textuais. A resposta de B, na primeira pergunta avaliativa, mostra que foi entendido um importante aspecto do texto: “[...] a não contradição existente na ação dos campos magnético e elétrico quando se muda o referencial adotado, [...]” (sic). Em outras palavras, B percebeu que a relatividade dos campos citados é compatível com os resultados esperados. Ainda, na segunda pergunta, este participante enfatiza que conseguiu captar a conexão intrínseca existente entre TRE e Eletromagnetismo, garantindo um retorno positivo a respeito da exposição teórica a fim de cobrir pré-saberes: Sim, foi possível. O que mais me ajudou nesta percepção foi a exposição inicial do Gabriel, esclarecendo sobre o fator de Lorentz (embora a exposição tenha sido em pouco tempo para a atividade elaborada), a explicação da relação entre os temas no texto de Feynman (a exposição matemática e por meio de figuras foi importante) e [...]. 104 A estas colocações de B, adicionem-se suas considerações para a quarta pergunta. O discente destaca, no item (a), que problemas de entendimento textual se tornam fáceis sem o auxílio da errata e, no último questionamento, aponta que as questões são interessantes e que contribuem na confirmação e fixação de ideias, intenções, de Feynman. Logo, o estudante fornece algumas possíveis funções positivas do material aqui preparado. Quanto ao respondido por C, não participante da oficina, levantemos suas citações na primeira pergunta, na qual afirma ser a demonstração de que há um íntimo relacionamento entre Eletromagnetismo e TRE (em que a primeira teoria abarca as previsões relativísticas de dilatação temporal e contração espacial) uma noção que lhe despertou interesse, “[...] apontando para uma compatibilidade entre as teorias, mas que preservam as equações de Maxwell, sem que haja nenhuma modificação no formalismo matemático do Eletromagnetismo.”. Já se mencionou, mas é válido recordar, que C destaca (na segunda pergunta) a noção da relatividade das forças e campos elétricos e magnéticos e o princípio de conservação da carga. Portanto, esta pessoa indica que o tema do texto, além de elementos significativos deste, é passível de despertar interesse. Também, C ressalta dois destes elementos que contribuíram em sua percepção da conexão entre as teorias; isto indica, até certo ponto, a capacidade do texto em mostrar (de modo simples, através destes aspectos) esta inter-relação. Mencione-se que C foi colega de Mestrado do autor desta dissertação; assim, é provável que já possuísse algum conhecimento do texto, pois este foi passado em disciplina deste curso. Isto não exclui, de nenhum modo, que uma boa releitura tenha lhe motivado uma melhor (re)análise textual e, por conseguinte, aprimorado sua compreensão – até porque C relata, no item (b) da quarta pergunta, que embora não tenha feito todas as questões, ainda pretendia fazê-lo, pois através delas teve “[...] a oportunidade de ler o texto várias vezes, o que é muito útil. Ler repetidas vezes o texto facilita sua compreensão, ajuda na resolução das questões e nos mostra claramente a relação existente entre o Eletromagnetismo e a TRE.”. Dessa forma, C levanta uma possível função positiva das questões, isto é, a de que – ao menos em parte – devam ser resolvidas com base no texto e na interpretação de ideias do autor. Isto concorda com Bordenave e Pereira (2015). São valiosas, ainda, suas colocações sobre a importância da errata (ver resposta ao item (a) da quarta pergunta do formulário). No que diz respeito a D, cite-se sua menção, na primeira pergunta avaliativa, sobre o fato de que a carga elétrica é propriedade intrínseca da matéria (o que lhe interessou no texto e/ou se mostrou como novidade), e também o seguinte fragmento, na segunda pergunta: “É em virtude das relações entre referenciais é que percebemos um campo elétrico, magnético ou eletromagnético e é a Teoria da Relatividade que veio formalizar todo fenômeno que possa 105 decorrer, [...]”. Esta citação é indicativa de que D, aparentemente, compreendeu bem a relatividade destes campos, que fica isenta de contradições ao se considerar a TRE e suas previsões, postulados. Ainda, é válida sua consideração, ao responder o item (b) da quarta, de que a primeira questão do material (a única por ele respondida) foi útil para a compreensão. Enfim, as respostas deste último, mas principalmente as anteriormente apresentadas, fornecem elementos bastantes para mostrar que o material preparado e proposto tem potencial para ser bem aproveitado e avaliado, ou seja, há uma boa possibilidade de que uma futura oficina venha a ser eficaz. Recorde-se também que, devido à escassez de feedback, as respostas de formulários adquirem uma natureza mais individual do que coletiva. Ainda assim, estas levantam alguns atributos bem positivos em relação ao texto, às questões sugeridas e/ou à errata para a edição brasileira abordada. Determinadas respostas, assim como considerações aqui produzidas, foram até concatenadas às proposições de Bordenave e Pereira (2015), estando coerentes com estas. Logo, poder-se-ia afirmar que nossa aplicação experimental obteve, sim, alguma eficácia – embora esta possa ser bem potencializada. 4.3 Considerações para trabalhos futuros Como enfatizado acima, não se fez revisão do texto do material suplementar, apesar de que este foi redigido com cuidado e sempre verificando as equações. Esta revisão fica como possível proposta futura, principalmente se viermos a receber retornos positivos de aplicação do material. Uma boa revisão seria valiosa para adequar o suplemento às modificações feitas nas questões. Entretanto, cremos que as mudanças nestas não alteraram substancialmente o esperado como resposta e/ou resolução, de tal forma que o texto suplementar pode ser bem aproveitado e avaliado. Além disso, ressaltou-se que não foi elaborada errata para o texto da antiga edição norte-americana adotada. Isto também entra como ideia futura, pois a errata somente do texto em língua inglesa auxiliaria bem na leitura deste. Como prometido, seguem-se orientações para adaptar a errata preparada, a fim de que possa ser aplicada com o original de 1964. Primeiramente, recomendamos ao professor deletar os equívocos, relatados na errata, que não constam no texto norte-americano – renumerando-os. Como apenas se comparou os erros da edição em português brasileiro com a original, é possível que existam outros erros nesta. Assim, em detalhada leitura desta, caso o educador encontre mais equívocos, deve incluí-los no documento, descrevendo-os, isto é, mostrando porque estão incorretos e fornecendo útil retificação – assim como fizemos em grande parte do arquivo. As citações de trechos 106 incorretos, do livro em português, devem ser trocadas pelas respectivas do texto em inglês. A extensão e clareza da errata produzida permitem que facilmente se encontrem os trechos correspondentes em inglês. Ainda, sugerimos retirar as menções a parágrafos (que podem estar diferentes no original), ao próprio texto norte-americano, e que sejam adaptadas as referências às páginas. Argumentos sobre as possíveis origens de erros no texto brasileiro devem ser excluídas. A introdução do documento (logo após a ‘Introdução ao estudante’) que contém a errata e as questões sugeridas não precisa de nenhuma adaptação. Porém, o curto texto – após o título que inicia a errata propriamente dita – necessita ser adaptado ou, ao menos, deletado, uma vez que se refere aos erros do livro brasileiro. Então, sugerimos ao docente que elabore uma breve introdução, no lugar deste curto texto, apenas destacando que são apontados e devidamente corrigidos, descritos, os erros deste original. O professor deve localizar o texto na adaptação, citando capítulo, seção etc. Outra espécie significativa de trabalho futuro seria a aplicação do material, pelo próprio autor da dissertação, em curso superior de Física ou afim – o que poderia gerar, em consequência, a redação de um artigo a respeito. Obviamente, tentar-se-ia evitar ao máximo as dificuldades encontradas no encontro aqui descrito. Cremos que o maior esforço se daria no sentido de evitar – ou ao menos minimizar – empecilhos como escassez de tempo, voluntariedade, ausência de pré-requisitos etc. Também, outra interessante proposta seria outro professor aplicar nosso material e, consequentemente, redigir alguma espécie de artigo a respeito. Aliás, a produção do artigo poderia até ser feita juntamente com o autor desta dissertação. Por exemplo, caso este seja contatado por um educador, interessado no material e em sua futura aplicação, poderia contribuir na redação. Imaginemos o docente que está a lecionar a TRE e julga que o material será valioso para estudo dirigido em seu curso – a fim de introduzir o tema do texto de Feynman. Pode ser preciso preencher alguns pré-requisitos (ou até recordá-los) antes de abordar a proposta. Ainda, uma discussão com os discentes, semelhante à sugerida, pode ser preparada; e também uma possível correção. Por fim, o artigo seria escrito, e a nova experiência poderia até ser comparada a aqui relatada. Cremos que esta última proposta é mais adequada se o professor fizer a leitura desta dissertação. Mas, na situação em que o docente aplicador não fez a leitura desta, pode ser preciso a ajuda do autor para o diálogo com estudantes e/ou para correção de questões. Neste caso, também acreditamos ser importante o subsídio do autor para elaboração do artigo, a fim de contribuir com elementos a respeito dos referenciais teórico-pedagógicos e/ou de suas conexões com a proposta, o texto enfocado, aplicação experimental, dados coletados etc. Em 107 suma, o que se pretende ressaltar é que uma possível aplicação futura e/ou redação de artigo pode ser feita em conjunto ou isoladamente – pelo autor desta e/ou por outrem. Também, a ideia de que o autor desta escreva algum artigo versando sobre o tema do texto de Feynman (e/ou a respeito de elementos interligados) que, de certa maneira, abrange a relação TRE-Eletromagnetismo, é uma proposta muito válida. Afinal, os assuntos que conectam estas teorias são bem interessantes e relevantes, não só do ponto de vista teórico, mas também conceitual, histórico, filosófico, e do que foi legado para o progresso da Física e do conhecimento humano em geral. 108 109 REFERÊNCIAS BORDENAVE, Juan D.; PEREIRA, Adair M. Estratégias de ensino-aprendizagem. 33. ed. Petrópolis: Vozes, 2015. CALIFORNIA INSTITUTE OF TECHNOLOGY. The Feynman Lectures on Physics. Disponível em: <http://www.feynmanlectures.caltech.edu/>. Acesso em: 19 jan. 2016. CHAIKLIN, Seth. A zona de desenvolvimento próximo na análise de Vigotski sobre aprendizagem e ensino. Tradução Juliana Campregher Pasqualini. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 16, n. 4, out./dez. 2011. Disponível em: <http://www.scielo.br/pdf/pe/v16n4/a16v16n4.pdf>. Acesso em: 02 fev. 2016. EINSTEIN, Albert. A Teoria da Relatividade Especial e Geral. Rio de Janeiro: Contraponto, 1999. EINSTEIN, Albert. O ano miraculoso de Einstein: cinco artigos que mudaram a face da física. 2. ed. Rio de Janeiro: Ed. UFRJ, 2005. FERRARI, Márcio. Lev Vygotsky, o teórico do ensino como processo social. Nova Escola, out. 2008. Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/formacao/lev-vygotsky-teorico423354.shtml>. Acesso em: 02 fev. 2016. FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. 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Este texto é parte de um capítulo da edição definitiva de sua famosa coleção Lições de física de Feynman – em tradução para a língua portuguesa brasileira (FEYNMAN; LEIGHTON; SANDS, 2008); e consta no volume II, capítulo 13: Magnetostática (a obra completa possui três volumes). Cada capítulo dos livros se divide em seções; o texto abordado corresponde à seção 13–6. A paginação da obra não é usual, sendo feita pelo número do capítulo seguido do número da página do capítulo em questão; assim sendo, nosso texto vai das páginas 13–7 a 13–11. O texto nesta edição brasileira, que vem da ‘Reimpressão 2009’, contém vários erros – que o autor deste trabalho encontrou. Desse modo, elaborou-se uma errata deste. Caso exista edição e/ou reimpressão posterior, alguns (ou todos) erros podem já estar corrigidos. Também julgamos necessário comparar os erros descobertos nesta versão brasileira com algum original mais antigo, no idioma inglês; isso ocorre porque estes originais são ainda bem encontrados na comunidade acadêmica. A edição original adotada data de 1964; nesta, o texto também está no vol. II, cap. 13: Magnetostatics, correspondendo à seção 13–6: The relativity of magnetic and electric fields (págs. 13–6 a 13–11) (FEYNMAN; LEIGHTON; SANDS, 1964). As referências completas de todos os livros utilizados neste material se encontram no fim deste. Esta proposta de estudo destina-se principalmente aos estudantes e professores de curso superior de Física ou afins, que já possuam um conhecimento introdutório de temas da Teoria da Relatividade Especial (TRE) e do Eletromagnetismo, a saber: o Princípio da Relatividade de Einstein, o conceito de referencial inercial, a contração do espaço, a dilatação do tempo, o momentum linear relativístico, as leis de Ampère da magnetostática e de Gauss da eletricidade, e alguns fundamentos de cálculo. O texto a ser feita leitura realmente está numa das mais importantes e renomadas coleções de livros-texto de Física, bastante reconhecida no meio acadêmico-científico (um 114 clássico da Física dos últimos cinquenta anos). A obra é ainda estudada mundialmente por físicos iniciantes e experientes, tendo sido vertida para no mínimo doze línguas; possivelmente nenhuma outra coleção de Física exerceu impacto tão grande e duradouro. Feynman foi um dos maiores físicos da América e um dos pioneiros da Teoria da Eletrodinâmica Quântica, dividindo o Prêmio Nobel de Física – em 1965 – com Sin-Itiro Tomonaga e Julian Schwinger. Elaborou importantes diagramas, usados nas teorias de partículas. Em 1972, recebeu a Medalha Oersted de Ensino, da qual tinha orgulho e afeto; foi considerado um grande professor e um visionário da nanociência. (FEYNMAN; LEIGHTON; SANDS, 2008; FEYNMAN, 2012). O texto de R. Feynman trata da conexão intrínseca entre a Teoria da Relatividade Especial (TRE) e o Eletromagnetismo. O físico mostra que os efeitos relativísticos de contração do espaço e dilatação do tempo já estão presentes na Teoria Eletromagnética, mesmo se a velocidade entre dois referenciais inerciais for muito baixa. Do ponto de vista da TRE, os campos e as forças elétricas e magnéticas tornam-se grandezas e conceitos totalmente relativos, mas as equações de Maxwell se preservam (não necessitam de correção relativística) – o que equivale a dizer que estas, que tomam parte no formalismo teórico fundamental do Eletromagnetismo, mantêm a mesma forma matemática, a mesma “cara”, em qualquer referencial inercial. Também, o texto mostra a lei da invariância/conservação da carga elétrica e a validade dos Postulados de Einstein. As atividades mais importantes (segundo cremos) deste material são a proposta de uma leitura ativa do texto pelo estudante, seguida da tentativa de resolução de questões sugeridas – acompanhada do texto. Acreditamos que estas questões estão claras e simples – o que não é sinônimo de facilidade –, devendo ser respondidas com base no texto, numa cuidadosa tentativa de interpretação de ideias e intenções de Feynman. De certa forma, isto equivale a dizer que se crê ser muito importante o esforço atencioso, na tentativa de integrar, reelaborar certas ideias – à medida que se procede na resolução. Além disso, cremos ser preciso que o aluno trabalhe muito na proposta, exercitando o raciocínio, a observação cuidadosa, a análise/avaliação da redação de Feynman e de suas equações. Estas últimas considerações baseiam-se, em boa parte, nas orientações da obra de Bordenave e Pereira. Grosso modo, podemos dizer que esta proposta assume algumas características de um estudo dirigido, conforme proposto por estes autores, que indicam que (nesta espécie de estudo) o aluno “[...] terá que trabalhar bastante no texto entregue pelo professor, usando sua própria criatividade na interpretação e na extrapolação do conteúdo do texto.” (BORDENAVE; PEREIRA, 2015, p. 266). 115 Julgamos útil esclarecer ao aluno que os erros no texto da ed. brasileira (aqui adotada) realmente podem causar confusão, atrapalhando a leitura, a compreensão textual e a resolução de questões propostas. Isto se deve principalmente ao fato de que Feynman aborda dois referenciais inerciais no texto; em vários erros, a simbologia usada para estes e seus atributos é confundida, ou seja, trocada, usando-se a de um no lugar do outro – o que confunde um referencial com outro e, com razão, possivelmente confunde e prejudica o leitor. Assim, pode ser valioso que o aluno, durante a leitura e antes de resolver as questões, destaque trechos que suspeitar como incorretos, conferindo/analisando posteriormente a errata – e corrigindo os equívocos em seu livro (no caso em que sejam utilizadas as versões brasileira e/ou original citadas).1 Isto pode ser bem importante para a posterior resolução de questões; também pode ser pertinente no estímulo à percepção de “lacunas” textuais e no julgamento da validade de informações, o que segundo Bordenave e Pereira (2015), é passível de auxiliar a capacidade de observar e avaliar (consciência crítica). Em nota de rodapé abaixo 2, disponibiliza-se um link que dá acesso à obra completa de Feynman (aqui citada) apenas para leitura, em inglês, na qual nosso texto não possui nenhum dos erros mostrados na errata. Por fim, ressalte-se ao aluno que se elaborou o documento ‘Material Suplementar’, com respostas e resoluções comentadas das questões, considerações sobre aspectos que julgamos importantes no texto (e certos elementos correlatos). Uma possível potencialidade deste material de suplemento, segundo cremos, é auxiliar o aluno numa espécie de autocorreção/estudo das questões sugeridas; acreditamos que o material deve ser utilizado apenas após a tentativa cuidadosa de se trabalhar em todas as questões – juntamente ao texto de Feynman. Se seu professor não dispõe de tempo para uma espécie de pré-correção das questões, o documento pode ser útil a fim de que se refaça e/ou corrija as questões (ou ao menos como leitura complementar, acompanhada do texto de Feynman). Provavelmente, estas questões devam ser combinadas com o professor. O material suplementar é a última parte deste estudo, constando antes das referências bibliográficas deste. 1 O aluno também pode ler o texto concomitantemente à errata; possivelmente, esta questão deverá ser discutida/combinada com o professor e depende da versão do texto adotada e da disponibilidade de tempo. Somente foram comparados os erros encontrados nesta ed. brasileira com o original americano mencionado, verificando se estes constavam ou não neste – e fornecendo correções e explicações para os trechos incorretos; assim, o original em questão pode conter erros adicionais. 2 O ‘California Institute of Technology’ (Caltech) disponibiliza no site http://www.feynmanlectures.caltech.edu/ os três vol. da obra, somente para leitura, não sendo permitido qualquer tipo de cópia parcial ou completa. O último acesso foi feito em 17 de junho de 2015. A data de postagem, atualização etc. da obra não estava claramente indicada até a data do último acesso; de acordo com informação de copyright, no rodapé do site, esta parece ser de 2013. 116 ERRATA DE UMA EDIÇÃO DO TEXTO BRASILEIRO; QUESTÕES PROPOSTAS AO LEITOR. Ao analisar esta errata com cautela, seria útil corrigir os erros em seu texto, tornando-o confiável para as atividades propostas. Assim, não há o risco de se esquecer das incorreções em leituras/consultas futuras. A correção, somada à leitura deste documento, pode auxiliar na análise e compreensão textual. Os três volumes originais em idioma inglês, da obra The Feynman Lectures on Physics (Feynman; Leighton; Sands), foram lançados pelo California Institute of Technology (Caltech) e pelo The Feynman Lectures Website em um site na internet. O conteúdo é de alta qualidade e disponível apenas para leitura; seu endereço consta na segunda nota de rodapé da Introdução anterior. O texto está no capítulo 13, seção 13–6. Neste caso, as seções formam links. Errata do texto A relatividade dos campos magnéticos e elétricos, em tradução para o português brasileiro; comparação dos erros encontrados na versão brasileira com um original norte-americano. Apontamos e corrigimos erros do texto brasileiro de Feynman (2008), comparando-os com um original de 1964, isto é, verificando se os equívocos ocorrem ou não neste (FEYNMAN; LEIGHTON; SANDS, 1964). Não se comparou o texto brasileiro ao original do qual a obra foi traduzida, pois não se teve acesso a ele, mas também porque um original mais antigo ainda pode ser mais utilizado. Edições/reimpressões brasileiras mais recentes do que a estudada (caso existam) podem estar total ou parcialmente retificadas, no que se refere ao texto abordado. Erro 1: Está logo no início do quarto parágrafo: “No referencial S´, claramente existe uma força magnética na partícula.” (p. 13–7). Correção: Ao invés de S´, leia-se S (sem o símbolo ´ ); pois é em S em que claramente existe força magnética na partícula. Este erro não consta no original em inglês consultado, podendo ser erro tipográfico surgido na versão brasileira ou noutra edição original posterior. Erro 2: No 15º parágrafo: “Esta carga deve ser igual a ρoLoA, porque as cargas são as mesmas [...]” (p. 13–9). Correção: ρoLoA é igual à ρoLoAo. Feynman se refere à carga Q num referencial S´ (= ρLAo) e enfatiza que esta deve igualar-se à carga num referencial S (= 117 ρoLoAo), a fim de obter uma relação geral entre as densidades de carga relativa e de repouso para certo agrupamento de partículas elétricas – que posteriormente é aplicada no experimento do texto. Isto não é bem um erro, mas uma pequena confusão em símbolos usados no corpo do texto e na Figura 13–11 (p. 13–9); nesta, se representa a área transversal do fio por A e seu comprimento relativo por L´, enquanto que no corpo do texto se acham representações distintas destas grandezas. Mas o importante é compreender que A = Ao e L´= L < Lo. No original americano também há esta confusão. Erro 3: Está no próprio enunciado da Figura 13–11, que se encontra incompleto: “Se uma distribuição de partículas carregadas em repouso tem uma densidade de cargas ρo as mesmas cargas terão densidade [...] quando vistas de um referencial com velocidade v.” (p. 13–9). Correção: As reticências indicam o local em que faltam termos matemáticos no texto, pois estes estão no original de 1964, e consistem na expressão: ρ= o ; isto é provavelmente um erro tipográfico. v2 1 c2 Erro 4: No 17º parágrafo, bem no final da pág. 13–9, na seguinte afirmação sobre densidades de carga negativa: “Na Eq. (13.23) ρo = ρ´_ , porque as cargas têm a densidade ρ´_ quando o fio está em repouso [...]” (p. 13–9). Correção: Recorde-se que a densidade de carga negativa, em cada referencial inercial do experimento pensado por Feynman, refere-se apenas à carga somada de todos os elétrons de condução. Está correto que os elétrons livres têm densidade de carga negativa de repouso ρo = ρ´_ , pois se encontram em repouso no referencial inercial S´; entretanto, está errado que as cargas destes elétrons têm densidade ρ´_ quando o fio está em repouso, pois, no referencial S deste, a densidade destas é representada por ρ_. Bastava afirmar-se “Na Eq. (13.23) ρo = ρ´_ para cargas negativas (elétrons de condução). Temos então que” para um bom entendimento do trecho, pois o que vem antes deste trecho é suficiente para a interpretação. Este erro se encontra no original; pode ser um equívoco de tipografia que se propagou ou um erro de Feynman. Erro 5: Na pág. 13–10: “Temos, pelo menos, uma força na mesma direção nos dois pontos de vista; a força elétrica em S possui a mesma direção [...]” (p. 13–10). Correção: Ao invés de “força elétrica em S ”, leia-se “força elétrica em S´ ”, pois esta força só se manifesta em S´. O original está correto; talvez, o erro surgiu no texto brasileiro por falha de tipografia. 118 Erros 6 e 7: Estão na última página do texto, penúltimo parágrafo: “[...] no sistema S existem linhas de campo elétrico, que não encontraremos passando por nós com velocidade v no sistema S. No sistema S´ não existe nenhuma linha de campo elétrico!” (p. 13–10). Correção: No sistema S não existem linhas de campo elétrico, mas somente de campo magnético; e em S´ existem linhas dos dois campos. Assim, o trecho fica correto com as modificações: “[...] no sistema S´ existem linhas de campo elétrico, que não encontraremos passando por nós com velocidade v no sistema S. No sistema S não existe nenhuma linha de campo elétrico!”. Estes dois erros deste fragmento não constam no original, e podem ter surgido na ed. em português aqui utilizada ou num original posterior ao analisado. Erro 8: Consta na última figura do texto, Figura 13–12 (p. 13–11). Trata-se de algo bem simples: o sentido dos campos magnéticos B e B´ – em (a) e (b) da figura, respectivamente – está invertido. Ao invés do sentido anti-horário mostrado (no plano do papel), o sentido correto é o horário, assim como está na versão online mencionada. Este equívoco também consta no original de 1964, podendo ser erro do autor ou de tipografia que se propagou – ou até da edição brasileira. Caso o leitor possua conhecimentos razoáveis do idioma inglês, talvez outros erros possam ser identificados em edições norte-americanas – quando já se tem certo conhecimento do texto, tema e abordagem de Feynman. 119 Questões propostas ao leitor Apresentamos as seguintes questões, a serem realizadas após a leitura do texto: 1. Esta primeira questão envolve a percepção do problema a ser resolvido: qual seria a consequência se, na mudança do referencial inercial do fio para o da partícula, continuássemos a considerar o fio como eletricamente neutro? 2. Obtenha as expressões para o módulo do campo magnético B ao redor do fio e para o módulo da força magnética F, que atuam na partícula de prova, no referencial inercial do fio (S). Para isto, use a lei de Ampère da magnetostática, indicada abaixo. Por simplicidade, adote – assim como Feynman – a velocidade vo da partícula de prova (no referencial do fio) como igual à velocidade média de arraste v_ dos elétrons de condução neste referencial. Obs.: Nas Figuras 1 e 2 destas questões (e também na Figura 13–10 do texto de Feynman) se representa apenas uma seção do fio reto cilíndrico e infinito – longo o suficiente para que seu diâmetro seja desprezível em relação ao comprimento. B ∙ dl = μo i linha (A lei de Ampère, na forma de integral, como usualmente apresentada em várias obras de Eletromagnetismo). Figura 1 – O referencial do fio Fonte: Adaptado de Feynman, 1964, p. 13–7 (1) 120 3. Esta questão tem por finalidade fazer uma avaliação do módulo da velocidade média de arraste (também denominada velocidade de migração) em condutores ordinários, como finos fios de cobre (Cu) residenciais. Os valores típicos de velocidade para os elétrons livres da corrente são, geralmente, bem pequenos quando comparados aos objetos “clássicos” do cotidiano. Calcule o módulo da velocidade de arraste dos elétrons de condução no referencial S de repouso de um fio de cobre, cujo diâmetro vale 1,00 milímetro e que conduz corrente i = 1,00 ampère. Considere a densidade de átomos do cobre equivalente a 8,48 x 1022 átomos/cm3 (em condições normais de temperatura e pressão), e o módulo de carga elétrica elementar e = 1,60 x 10–19 coulomb; suponha ainda que cada átomo contribui com um elétron livre na condução. 4. Mostre como o fio, eletricamente neutro em seu referencial de repouso, torna-se não neutro (carregado) no referencial da partícula de prova. Evidencie a alteração relativística dos comprimentos nos volumes usados para cálculo de densidades de carga. Pergunta: Estando o fio eletricamente carregado, do ponto de vista do referencial S´ (da partícula de prova), haverá carga elétrica líquida não nula no fio? 5. a) Obtenha as expressões dos módulos do campo elétrico E´ e da força elétrica F´ que interagem com a partícula de prova no referencial desta (S´ ). Utilize a equação para a lei de Gauss da eletricidade, abaixo indicada. Na Figura 2 é representada uma seção do fio reto, considerado infinito. E´ ∙ dS´ = sup erfície Qint erna o (A lei de Gauss da eletricidade, na forma de integral, como usualmente apresentada em várias obras de Eletromagnetismo). (2) 121 Figura 2 – O referencial da partícula de prova Fonte: Adaptado de Feynman, 1964, p. 13–7 b) As equações 1 e 2 apresentadas (na 2ª questão e no item (a) desta) são uma das formas matemáticas de duas leis gerais do Eletromagnetismo, que podem ser nomeadas lei de Ampère da magnetostática e lei de Gauss da eletricidade, respectivamente; cada uma destas leis foi aplicada em certo referencial inercial – S ou S´ – por Feynman. Isto foi feito sem a necessidade de corrigir, modificar, relativisticamente as equações para estas leis. Elas contêm quantidades físicas, μo e εo, que podem se definir matematicamente por expressões que contêm outra quantidade física de enorme importância no advento da Teoria da Relatividade Especial; na verdade, μo, εo e esta outra quantidade estão intrincadamente correlacionadas matematicamente. Perguntas: Analisando cuidadosamente as equações de Feynman, aponte qual é a outra quantidade física (explícita na maioria das equações de seu texto). Esta quantidade aparece “igualmente” nas expressões para grandezas de ambos os referenciais inerciais, isto é, tem igual valor absoluto, tanto em S quanto em S´ ? O que se pode dizer, inferir sobre ela? O que podemos concluir sobre εo e μo, a permissividade elétrica e a permeabilidade magnética, respectivamente, para o espaço livre? 6. O valor do momento relativístico – em um determinado eixo de um referencial inercial – pode ser dado por p = m u ; onde v representa o valor de velocidade da partícula v2 1 c2 no referencial inercial em que se quer determinar o momento, e u o valor da componente desta velocidade ao longo do eixo escolhido neste referencial. No texto de 122 Feynman, é enfatizado que a variação no valor dos momentos transversos (ou transversais) da partícula, Δpy e Δpy´ – nos referenciais S e S´, respectivamente –, é a mesma. Isso equivale a dizer que o momento transverso da partícula é igual (independente do referencial) em pontos de mesma coordenada transversa y = y´; prove isto, ou seja, mostre que as expressões para py e py´ são equivalentes (py = py´ ). 7. Qual a relação entre intervalos de tempo correspondentes no referencial inercial do fio (S) e no da partícula (S´ )? Interprete o resultado, ou seja, tente descrevê-lo de alguma forma, conferindo significado para esta relação. 8. a) Como os resultados para os módulos da força elétrica F´ – da 5ª questão – e da magnética F (obtido para o referencial do fio estacionário (S) na 2ª questão) se relacionam matematicamente, de acordo com a previsão teórica? Na prática, para o pequeno módulo de velocidade, calculado na 3ª questão – em concordância com as pequenas velocidades consideradas por Feynman –, o que se pode dizer sobre estas duas forças? b) Use a equação relativisticamente correta do movimento e o resultado da 7ª questão para obter a mesma relação (entre os módulos de F e F´) encontrada no item (a) desta questão. c) O obtido em (a) e (b) mostra a previsão relativística, que é válida, entre as forças do texto; ambas, cada qual atuando em um referencial inercial, se compatibilizam com o Eletromagnetismo Clássico e a Teoria da Relatividade Especial. Qual efeito relativístico pode ser considerado na explicação da diferença prevista entre estas forças? Tente descrever, interpretar, a correlação deste efeito com as forças. O autor disponibiliza seu e-mail para contato, [email protected], a respeito de dúvida, crítica, sugestão, informação de erros etc., sobre este trabalho. 123 MATERIAL SUPLEMENTAR RESOLUÇÃO COMENTADA DAS QUESTÕES; CONSIDERAÇÕES AOS ESTUDANTES E PROFESSORES (PARA A CONDUÇÃO DE DISCUSSÕES E REFLEXÃO). Introdução Não se pretende, aqui, com as resoluções, comentários, considerações etc. apresentadas a seguir, retirar a autonomia do professor em relação aos estudantes; mas, pelo contrário, desejamos apresentar um material na tentativa de auxiliar o leitor na percepção da riqueza do texto de Feynman e – obviamente – na correção de nossas questões propostas. O texto do físico norte-americano mostra que a Teoria da Relatividade Especial pode ser tomada emprestada a fim de que o Eletromagnetismo se torne coerente na descrição de interação eletromagnética exemplificada pelo autor. Ele também ressalta a relatividade das grandezas de campo e conceitos de força elétrica e magnética; o que dá nome ao seu texto. Apesar desta relatividade, Feynman enfatiza que uma descrição eletromagnética completa é invariante, ou seja, um fenômeno elétrico e/ou magnético encontra descrição – em concordância com as mesmas leis fundamentais do Eletromagnetismo (equações de Maxwell) – em qualquer referencial inercial. Assim, as equações do Eletromagnetismo são válidas em todos os referenciais inerciais, mantendo sempre a mesma forma matemática em qualquer um deles. Desse modo, o Princípio da Relatividade de Einstein e a lei da invariância no valor absoluto da velocidade da luz (no espaço livre) são satisfeitos. Podemos perceber, então, que existe uma íntima conexão entre a teoria clássica do Eletromagnetismo e a Teoria da Relatividade Especial. 124 1ª QUESTÃO: A primeira questão diz respeito a uma contradição que surge se continuamos a considerar o fio como eletricamente neutro no referencial inercial da partícula (S´ ); o que, na verdade, trata-se de um paradoxo aparente. A consequência em considerar-se o fio descarregado (neutro) no referencial da partícula conduz a uma espécie de absurdo físico; pois se, no referencial do fio em repouso (S), um observador ali estacionário vê a partícula aproximar-se do fio, também no referencial S´ esta deve aproximar-se deste. Em outras palavras, um observador estacionário no referencial inercial da partícula vê uma interação atrativa – entre o fio e a partícula –, assim como outro observador estacionário, desta vez no referencial inercial do fio, também testemunha uma interação atrativa entre os dois objetos. Afinal, seria um absurdo lógico um observador, em repouso com respeito ao fio, observar a partícula adentrar o campo magnético B e paulatinamente aproximar-se do fio, enquanto outro observador (movendo-se inicialmente junto à partícula) a observasse sempre estacionária em relação a ele – sem nenhuma força atuante nesta, sem alteração de velocidade da partícula e sem aproximação do fio. Esta seria a estranha consequência se continuamos a considerar o fio como eletricamente neutro no referencial S´ da partícula de prova; no referencial S (do fio), obviamente, temos a atuação de uma força magnética atrativa – devida ao campo magnético gerado pela corrente –, mas em S´ não teríamos nenhuma força atuando na partícula, e esta se comportaria, portanto, como uma partícula livre – pois a velocidade da partícula em S´ é nula. Se, pois, não há força magnética em S´ (v = 0) – e a interação gravitacional é extremamente pequena em ambos os referenciais inerciais, a ponto de podermos desprezá-la –, que tipo de força deve atuar sobre a partícula neste referencial S´? Forças de origem nuclear não podem ser, pois se supõe apenas um ente físico elementar (um elétron, p. ex.), como partícula de prova, nas proximidades de um fio conduzindo corrente. Finalmente, na experiência pensada por Feynman (2008), também devemos supor a inexistência de quaisquer forças resistivas e de interação com partículas, átomos, fótons, moléculas etc. Em suma, a experiência de Feynman (2008) preocupa-se somente com a interação existente entre uma partícula negativa elementar e um fio condutor de matéria ordinária (cobre, por exemplo) conduzindo corrente estática. A interação (força) atuante na partícula, em S´, só pode ser descrita, portanto, por um formalismo teórico que inclua a teoria eletromagnética. Grosso modo, podemos fazer uma analogia com a interação gravitacional: se um observador – fixo com respeito à superfície da Terra (em um referencial S) – vê um projétil 125 ser abandonado de um avião em movimento reto e uniforme, colidindo com o solo, também um observador estacionário no interior da aeronave (referencial S´ ) – com velocidade inicial igual à desta – testemunhará a atração gravitacional. Este exemplo é uma mera analogia; em ambos os casos, desconsideramos as interações – da partícula elétrica e do projétil – com moléculas, átomos, fótons etc. e qualquer espécie de força resistiva (de atrito). No texto de Feynman (2008), preocupamo-nos apenas com interações descritas pela teoria eletromagnética clássica; e, nesta analogia, somente com a interação gravitacional clássica. Logo, do mesmo modo que seria absurdo observar o projétil – no referencial S´ da aeronave – permanecendo em repouso relativamente a esta (sem sofrer a ação da gravidade terrestre), também seria totalmente incoerente observar a partícula elétrica – no referencial S´ do texto de Feynman – como partícula livre. Em suma, a partícula em S´ não pode permanecer sem a ação de uma força descrita por teoria que inclua o Eletromagnetismo. Como esta força não pode ser magnética em S´, pois forças magnéticas são dependentes da velocidade – e a velocidade da partícula em S´ é nula –, não podemos continuar a considerar o fio como eletricamente descarregado neste referencial. Então, embora o fio esteja descarregado (neutro) no referencial inercial S, ele está eletricamente carregado no referencial inercial S´. Feynman demonstra que existe descrição teórico-conceitual (que intimamente relaciona o Eletromagnetismo e a Teoria da Relatividade Especial) para a interação na partícula no referencial inercial S´. Para chegar a esta conclusão, Feynman (2008) se vale de previsões da Teoria da Relatividade Especial; através de uma destas previsões, ele demonstra o fato de que o fio condutor, realmente, se encontra carregado no referencial inercial S´ (da partícula). Também é interessante reparar em um importante aspecto, citado na Introdução deste material suplementar: em ambos os referenciais inerciais do texto, S e S´, as formas matemáticas para as equações de Maxwell são as mesmas; ou seja, estas equações fundamentais do Eletromagnetismo não se alteram, preservando seu formalismo, sua “cara”, em ambos os referenciais inerciais de Feynman. E mais ainda: as formas matemáticas das equações de Maxwell se preservam (sendo escritas identicamente) não só nos dois referenciais do texto abordado, mas em qualquer referencial inercial. Porém, é necessário atentar para o fato de que existem grandezas nestas equações – como os campos elétrico e magnético – que podem variar de um referencial inercial para outro, mas também quantidades físicas constantes (invariantes). Dessa maneira, alguma forma matemática (das equações de Maxwell) para cálculo de campo elétrico estático pode ser usada (escrita) no referencial de repouso do fio (S); mas já sabemos, de antemão, que E em S deve ter resultado nulo, pois o fio está eletricamente neutro neste referencial. E a mesma forma matemática para cálculo de 126 campo elétrico estático também é válida no referencial inercial de repouso da partícula (S´ ), com a ressalva de que o campo elétrico neste referencial não pode mais ser nulo; pois, como concluímos, o fio deve estar carregado em S´. Enfim, não se pretende aqui – para a 1ª questão – dar uma resposta única para a incompatibilidade gerada como consequência de considerar-se o fio eletricamente descarregado em S´; mas, o intuito é tornar evidente ao leitor como a percepção deste problema a ser resolvido é rica, podendo servir até como discussão introdutória. Assim, o professor pode auxiliar na promoção de uma reflexão inicial em seus alunos, utilizando esta questão no enfoque da riqueza do “problema de Feynman”. Uma boa e breve discussão do problema envolvido no texto, por si só, já pode ser capaz de introduzir (de forma bem introdutória) importantes noções como a relatividade dos campos elétrico e magnético e a preservação das equações de Maxwell, referente ao fato de que, em todos os referenciais inerciais, a teoria eletromagnética clássica é aplicável – estando em compatibilidade com a Teoria da Relatividade Especial. 2ª QUESTÃO: No cálculo do valor de campo magnético – no referencial do fio (S) –, basta utilizarmos a lei de Ampère da magnetostática. Sendo este campo estático em S (não variando no decorrer do tempo t deste referencial inercial), pois a corrente em S é estacionária, devemos obter uma expressão para seu valor que varie apenas com a distância radial r ao eixo longitudinal do fio; pois se considera um fio reto, muito longo (que tende ao infinito) e de formato cilíndrico. A lei de Ampère da magnetostática, na forma integral, é geralmente dada pela equação 1 do enunciado desta questão. O valor absoluto da velocidade da luz no espaço livre, c, é uma constante obtida por Maxwell em suas equações, designada por c = então, μo = 1 o o ; 1 , e a equação para a lei mencionada – escrita com os termos usados por oc 2 Feynman (2008) em seu texto – fica: linha B ∙ dl = i oc 2 (3) 127 Este problema exibe simetria cilíndrica, e a integral de linha fechada para o campo magnético B é feita ao longo de uma circunferência concêntrica ao eixo longitudinal do fio (cujo plano que a contém corta transversalmente o fio); como B e dl são paralelos e tangentes em qualquer ponto da circunferência – e o valor de B é constante em todos os pontos desta, a uma distância radial r qualquer –, a integral no lado esquerdo da equação 3 iguala-se a: B dl = B 2πr; onde a integral do elemento dl é o próprio comprimento 2πr da linha circunferência. Assim, igualamos este último resultado ao lado direito de 3, e obtemos: B= i 2r o c 2 = vA 2r o c 2 (4) Onde a corrente elétrica i – no referencial de repouso do fio (S) – foi substituída pela expressão dada por Feynman (2008, p. 13–8), i = ρ_vA. O leitor facilmente pode provar que ρ_vA é dimensionalmente coerente com a unidade de corrente, o ampère [A]. Portanto, ao obtermos a expressão do valor de B para qualquer distância r ao eixo do condutor, temos uma equação válida para o valor deste campo, em S, na posição da partícula de prova. O vetor B é tangente em todos os pontos duma superfície cilíndrica imaginária que simetricamente envolva o fio – e perpendicular ao eixo longitudinal deste. A direção/sentido de B é dada pela regra da mão direita para o campo magnético; na posição da partícula de prova q, o vetor B “entra” no plano do papel. Pode-se tentar visualizar a simetria na figura mostrada no enunciado. Para obter o vetor força magnética, F, que atua na partícula de prova, em S, deve-se tomar a equação: F = qvo B (5) A equação 5 provém da expressão mais geral para a força eletromagnética Feletromag. = qE + (qv B); geralmente atribuída à Lorentz. Em nosso caso de fio neutro em S, a força atuante na partícula é puramente magnética neste referencial. Não é necessário, aqui, introduzir um sistema de coordenadas cilíndricas circulares, com uma base de vetores unitários, para o cálculo de F (magnética); precisamos apenas respeitar a definição de produto vetorial e a regra de mão direita para determinação da 128 direção/sentido do produto vetorial vo B, no referencial do fio. Efetuando-se este produto, na posição da carga de prova, obtém-se uma força magnética F radial ao eixo longitudinal do fio; assim, introduzimos um unitário r (radial), que aponta no sentido do aumento do módulo de r (afastando-se do eixo do condutor): F = qvo vA (r) = q Av 2 (r) 2r o c 2 2r o c 2 (6) Onde se considerou o valor de velocidade vo igual ao valor de v_ = v (velocidade de arraste dos elétrons condutores em S), isto é, o caso especial tomado por Feynman (2008, p. 13–8), em que vo = v. Repare que, sendo a carga q uma propriedade material escalar e, neste caso, negativa, o sentido de F é contrário ao de um eixo radial que se afasta do fio reto; então, a orientação desta força é radial apontando para o fio. A regra da mão direita (para determinação de força magnética) é bem explicada por Serway e Jewett (2008) 3. Relembre-se que o vetor resultante, em um produto vetorial, é sempre perpendicular aos vetores envolvidos na operação. No texto de Feynman, B e vo são perpendiculares, o que, pela definição de magnitude do produto vetorial, faz com que F tenha seu módulo máximo, igual a q Av 2 . O resultado 2r o c 2 obtido em 6 é semelhante ao de Feynman (2008, p. 13–8), expresso na equação 13.21, com exceção do vetor unitário r. É interessante reparar que, aqui, já aparece uma razão matemática bastante recorrente na Teoria da Relatividade Especial, v2/c2. Até este ponto do texto, Feynman ainda não recorreu a nenhum efeito ou previsão relativísticos; entretanto, ele já discorreu sobre o fato de que o magnetismo não é uma “coisa” independente, como se pode imaginar. (FEYNMAN; LEIGHTON; SANDS, 2008, p. 13–7). Noutras palavras, podemos dizer que este resultado magnético obtido para o referencial do fio em repouso não é absoluto para o fenômeno em questão; ou seja, este referencial inercial (S) não é privilegiado para a descrição de campo magnético. E, de modo análogo, para a descrição da força atuante na partícula elétrica. Na verdade, todos os referenciais inerciais estão em pé de igualdade; isto se interliga ao fato de que a grandeza de campo magnético é relativa: 3 O autor deste material pôde constatar que, com razão, existem algumas (senão várias) variações do que se denomina regra da mão direita, inclusive em livros e notas de aula (na internet) para cursos superiores; p. ex., para a determinação de produto vetorial, esta regra é – às vezes – chamada de regra do parafuso direito. As variações parecem ocorrer tanto no nome dado à regra quanto em técnicas mnemônicas envolvendo o polegar e os outros dedos da mão direita. 129 [...] este vetor dependerá de qual sistema de referência escolhemos para especificar a velocidade das cargas. Mas não falamos nada sobre qual o referencial apropriado para se especificar o campo magnético. Verifica-se que qualquer referencial inercial pode ser usado. (FEYNMAN; LEIGHTON; SANDS, 2008, p. 13–7). Sendo o Princípio da Relatividade einsteiniano válido no Eletromagnetismo, devemos encontrar outras descrições compatíveis com as leis fundamentais desta teoria no referencial inercial da partícula de prova (S´ ), e em qualquer outro referencial inercial. Assim, os conceitos de forças e grandezas de campo magnético e elétrico são relativos; mesmo assim, não há um referencial privilegiado (absoluto) para o Eletromagnetismo e para a propagação da luz; uma descrição de natureza eletromagnética, em sua totalidade, é invariante. (FEYNMAN; LEIGHTON; SANDS, 2008; EINSTEIN, 1999). 3ª QUESTÃO: No cálculo do módulo da velocidade de arraste dos elétrons de condução, em S, vamos partir da equação dada por Feynman (2008, p. 13–8) para a corrente elétrica, que pode ser expressa por i = ρ_vA; onde ρ_ é a densidade de carga negativa de condução no referencial do fio de cobre em repouso, v = v_ é o valor médio da velocidade (do arraste) da distribuição de elétrons condutores neste referencial, e A é a área transversa do fio – que é invariante, pois as dimensões transversas ao movimento não sofrem alteração relativística. Isolando v_ , e escrevendo a área em função do diâmetro d do fio, temos: v_ = i d 2 (7) 2 _ A única quantidade física não conhecida para o cálculo de v_ é ρ_ (para o cobre), sua densidade de carga negativa de condução no referencial do fio. A quantidade de átomos de cobre por unidade de volume (nas CNTP) é cerca de 8,48 x 1022 átomos/cm3 (SERWAY; JEWETT, 2008, p. 770); e, como cada átomo contribui com um elétron livre de corrente, temse (8,48 x 6 3 1022 elétrons de condução/cm3) 10 cm = 8,48 m3 x 1028 elétrons de condução/m3. Agora, basta multiplicarmos este resultado pela carga elementar – de módulo e = 1,60 x 10–19 C –, o que nos fornece o módulo da densidade negativa de condução: 1,3568 x 1010 C/m3 de 130 densidade absoluta de carga para ρ_. O leitor também pode obter este resultado utilizando a densidade de massa do cobre, sua massa molar e a constante de Avogadro, que podem ser dados, respectivamente, pelos valores: 8,96 g/cm3 (a 20 oC = 293 K); 63,54 g/mol e 6,02 x 1023 mol –1 (RESNICK; HALLIDAY; KRANE, 2007). Finalmente, substituindo os valores fornecidos no enunciado desta questão para a corrente i, o diâmetro d (= 1,00 mm = 10–3 m), e o calculado para ρ_ , obtém-se: C / s v_ = 2 10 3 C m 2 10 1,3568 x 10 x 3 2 m 1,00 = 9,38 x 10–5 m/s (8) (com três algarismos significativos) O resultado obtido em 8 é da ordem de grandeza de 10– 4 m.s –1, isto é, um valor de velocidade média de arraste em torno de apenas um décimo de milímetro por segundo. O módulo desta velocidade é medíocre quando comparado aos valores cotidianos comuns, como, p. ex., o de um carro que translada a 110,0 Km/h (≈ 30,6 m/s); o que nos dá uma razão (da ordem de grandeza) de 10–6 para a velocidade de arraste dividida pela velocidade do carro. O texto de Feynman demonstra que as previsões da Teoria da Relatividade Especial podem ser levadas em consideração, no contexto do Eletromagnetismo, até quando os valores de velocidades entre os referenciais inerciais são da ordem de grandeza – ou próximas – da calculada acima. Com efeito, Feynman não especifica a composição química, o valor de corrente e o diâmetro do condutor etc. na proposta de seu texto, mas considera o problema “para as pequenas velocidades.” (FEYNMAN; LEIGHTON; SANDS, 2008, p. 13–10). A razão entre o módulo da velocidade de arraste calculado e o da luz, v_ , é muitíssimo c pequena, da ordem de grandeza 10–13. Vemos, portanto, que existe a possibilidade teórica de enfocar a íntima conexão entre o Eletromagnetismo e a Teoria da Relatividade Especial – com um tratamento matemático razoável – mesmo em velocidades relativas (entre referenciais inerciais) usualmente menores do que as observadas na vida cotidiana e consideradas em muitos estudos teóricos de Mecânica Clássica. 131 4ª QUESTÃO: Em um longo fio reto e cilíndrico, de comprimento próprio Lo em seu referencial de repouso (S), tem-se densidade de carga – para certa distribuição de cargas no corpo do fio – dada por ρo = Q ; onde LoAo é o volume próprio (medido no referencial de repouso) do fio Lo Ao e Ao é sua área de seção reta. Em um referencial inercial com velocidade paralela ao eixo longitudinal do fio reto, o comprimento Lo se contrai por um fator inverso ao de Lorentz, isto é, por 1/γ (um dividido por gama); o que nos dá um comprimento relativo L: L = 1 Lo = Lo 1 v2 1 c2 = Lo 1 v 2 (9) c2 Este é o resultado 13.22 do texto de Feynman (2008, p. 13–9). Assim, no referencial inercial em movimento relativo ao fio (S´), este apresenta um comprimento L menor que Lo; logo, o volume do fio também será menor no referencial da partícula. Lembre-se que o fator de Lorentz, γ, é sempre um positivo maior do que um (1) quando v é diferente de zero, e seu inverso fica entre zero e a unidade. O efeito da contração de Lorentz (ou contração do espaço) é uma previsão da Teoria da Relatividade Especial usada por Feynman (2008) a fim de concluir que o fio, no referencial inercial S´ de repouso da partícula, possui densidade volumétrica de carga líquida não nula. É interessante reparar que esta consideração relativística faz surgir o fator γ nas expressões para os valores de força e campo elétricos – em S´. Aqui entra uma lei de invariância – e também de conservação – de grande importância no arcabouço teórico-conceitual do Eletromagnetismo, da Teoria da Relatividade Especial e da Física em geral; trata-se da questão da invariância (e conservação) da carga elétrica. Podemos afirmar que a carga líquida associada a qualquer conjunto de partículas (que não recebe nem perde nenhum portador de carga), digamos alguns prótons e elétrons, é sempre a mesma, independentemente do movimento relativo entre o conjunto de partículas e um observador; noutras palavras, a carga líquida contida numa partícula – ou em certa coleção delas – é sempre uma propriedade escalar invariante que não depende da velocidade, ou seja, uma quantidade física que se preserva em qualquer referencial inercial. Por exemplo, imagine uma partícula com carga q que se move em relação à superfície da Terra com valor de velocidade 0,5c (metade do valor da velocidade da luz no espaço livre), o que é simétrico à superfície 132 terrestre mover-se a 0,5 c relativamente a esta partícula “em repouso” no referencial da órbita da Terra. Um observador estacionário na superfície do planeta mediria sempre o mesmo valor de carga q da partícula. Porém, as densidades de carga podem variar, pois os volumes do espaço se alteram quando há movimento relativo entre referenciais inerciais; e, segundo Feynman (2008), importa somente esta noção (no cálculo de densidades de carga), a de que o volume de espaço varia devido à contração do comprimento (ou contração de Lorentz). A lei de invariância da carga elétrica, junto ao efeito de contração do comprimento, permite-nos deduzir uma expressão geral para densidades de carga de certa distribuição de partículas na Teoria da Relatividade Especial. A densidade de carga líquida no fio, no referencial inercial S´ (da partícula de prova), é chamada por Feynman de ρ´. Vamos obtê-la; assumindo que a carga líquida Q contida em certo conjunto de partículas (eletricamente isolado) deve ser invariante tanto em um referencial S quanto num referencial inercial S´, ou em qualquer outro sistema inercial, podemos obter um resultado geral a ser aplicado ao fio. Primeiramente, a área de corte reta do fio, Ao, é uma dimensão transversa ao movimento que não se altera. Usando o resultado 9 – que relaciona os comprimentos relativo L e de repouso (próprio) Lo –, evidenciamos a alteração relativística do comprimento nos volumes usados no cálculo de densidades (de carga) ρo = Q Lo Ao Q ρ= e (10) v2 Ao Lo 1 c2 Aqui, ρo e ρ são densidades de carga gerais para qualquer distribuição de partículas carregadas; sendo ρo a densidade de carga em repouso, ρ a densidade de carga relativa e Q a carga líquida contida na distribuição (quantidade invariante). Assim, fica evidente a previsão da contração de Lorentz; e, isolando Q nas equações 10, obtemos a igualdade: Ao Lo 1 v2 o Lo Ao c2 ou o 1 (11) v c2 2 133 A última igualdade é um resultado mais geral para densidades de carga na Teoria da Relatividade Especial, no nível de nosso interesse. Ela é dada por Feynman (2008, p. 13–9) em sua equação 13.23. Vamos aplicá-la ao exemplo do autor. As cargas positivas (prótons nucleares) estão todas estacionárias no referencial do fio (S); se há um elétron condutor por átomo (em S), então temos N(Z – 1) elétrons estacionários neste referencial, cujas cargas são balanceadas por uma idêntica quantidade de prótons. Z é o número atômico do elemento constituinte do condutor e N é o número total de átomos deste elemento no fio. Assim, não é necessário contabilizar densidades de carga de N(Z – 1) elétrons mais N(Z – 1) prótons no referencial S, pois estas partículas estão estacionárias no referencial de repouso do fio (S); e a densidade e a carga líquida (delas somadas) são nulas neste e em qualquer outro referencial. Preocupemo-nos, então, somente com a carga elétrica referente a um próton em cada núcleo do fio mais a carga do conjunto dos elétrons de condução; a densidade de carga líquida destas partículas é nula – no referencial inercial do fio! –, pois o número de elétrons de condução iguala-se ao de N prótons, e a carga total destes elétrons divide-se pelo mesmo volume que a carga total dos prótons – o volume do fio em repouso (em S). Para cargas positivas, a densidade de carga de repouso ρo – em S – nada mais é do que uma densidade positiva de repouso ρ+ (referente à soma das cargas de cada próton líquido por núcleo); porém, no referencial da partícula (S´) (no qual o fio está em movimento), estas mesmas cargas positivas movem-se com velocidade –v (menos v), tendo-se para elas, em S´, uma densidade positiva relativa ρ´+; o que, segundo o resultado geral 11, nos dá: ρ´+ = (12) v2 1 c2 Para a distribuição de elétrons de condução, concluímos que estas partículas têm sua densidade de carga negativa de repouso, ρ´_, no referencial S´ – pois estão estacionárias neste referencial inercial; contudo, estes elétrons se movem em S, tendo sua densidade de carga relativa ρ_ no referencial do fio em repouso. Daí, ρ_ = ´_ 1 (13) v c2 2 134 obtemos o resultado acima, que corresponde à equação 13.25 de Feynman (2008). Somandose as densidades de carga ρ´+ e ρ´_, obtidas para S´, temos a densidade de carga líquida ρ´ no referencial da partícula de prova: ρ´ = – ρ+ 1 v c 2 2 + = v2 1 c2 2 v2 v 1 c2 c2 = v2 v2 1 1 c2 c2 (14) Onde se substituiu ρ_ por –ρ+ (menos ρ+) em 13, pois estas duas densidades se referem ao referencial S; e, estando o fio neutro neste referencial inercial, a igualdade ρ+ + ρ_= 0 deve ser satisfeita. O resultado para ρ´ confirma que o fio condutor tem densidade líquida de carga diferente de zero em S´; existe, assim, um campo elétrico E´ neste referencial que interagirá com a partícula que ali está inicialmente estacionária. A relatividade dos campos magnéticos e elétricos já pode ser vislumbrada nos resultados matemáticos apresentados, uma vez que no referencial do fio em repouso (S) a soma das densidades de carga positiva e negativa é nula, o que resulta em um campo elétrico E = 0. Entretanto, a soma de densidades de carga observadas no referencial inercial da partícula de prova (S´) não é nula (ρ´ ≠ 0), o que faz surgir um campo elétrico E´ diferente de zero; assim, este tipo de campo existe em S´, mas não em S. Recorde-se também que, no referencial S do fio, há somente campo magnético; e este tipo de campo também está no referencial S´ da partícula, mas com valor diferente de B (em S) – embora B´ e B tenham mesma direção e sentido, como veremos adiante. Mas ficam os questionamentos: há carga elétrica líquida (no fio) do ponto de vista do referencial inercial S´ ? Sendo a carga uma quantidade que se conserva, teria o fio carga interna líquida zero em S´ (referencial da partícula), assim como no referencial S – mesmo havendo densidade de carga não nula (ρ´ ≠ 0) em S´ ? Isto suscita uma questão sutil e delicada. Ela não é explicitada por Feynman. Sabendo que a conservação (invariância) da carga elétrica não pode ser violada, poderíamos suspeitar que a carga (não a densidade) líquida no corpo do fio – em S´ – seja também nula. Mas não, a carga líquida no fio, no referencial S´, é diferente de zero; o que não viola a lei de 135 conservação da carga. Aqui entra em cena a noção da relatividade da simultaneidade, que se refere ao fato de que dois eventos simultâneos em um referencial inercial não são simultâneos em outro, exceto em um caso específico. Suponha que, no referencial S do fio de Feynman (como representado na Figura 13–10 (a) (2008, p. 13–7)), que está neutro, um elétron sai pela base direita do fio ao mesmo tempo em que outro elétron entra pela base esquerda. Com efeito, sendo a corrente i estática, ρ_ uniforme e a área de corte reta do fio invariante, a velocidade de arraste dos elétrons de corrente mantém-se a mesma – de acordo com i = ρ_vA. Assim, em qualquer instante de tempo t do referencial S, igual número de elétrons sai e entra no fio – o que o mantém neutro. Obviamente, o exemplo de Feynman é idealizado; assim, não consideramos nenhum efeito, flutuação no valor de grandezas (como ρ_, p. ex.) e perturbações externas que possam gerar campo elétrico e carga líquida em S. Um observador em movimento perpendicular ao eixo longitudinal do fio, na Figura 13–10 (a) (2008, p. 13–7), ao longo da reta que mantém iguais distâncias das bases do fio, também constata a entrada de um elétron por uma base do fio simultaneamente à saída de outro pela outra base; este é o caso específico mencionado acima, em concordância com Taylor e Wheeler (1992). Porém, segundo a Teoria da Relatividade Especial, em outros referenciais inerciais estes dois eventos (entrada de um elétron por um lado e saída de outro elétron por outro lado) não são simultâneos; assim, no referencial S´ (da partícula), um elétron sai pela base direita antes que outro entre pela esquerda, pois o observador se move para a direita; e a distância de percurso da luz desta base até o observador (em S´) é menor, o que o faz detectar a saída de um elétron pela direita antes da entrada de outro pela esquerda. Isto origina uma carga líquida positiva no fio de Feynman, do ponto de vista de S´, o que está de acordo com a densidade ρ´ positiva e com o campo elétrico E´ que devem existir no referencial S´ da partícula de prova. Obviamente, a descrição anterior é apenas uma experiência de pensamento. É válido tentar imaginá-la a partir da Figura 13–10 (b) do texto (2008, p. 13–7); também, na prática, lidamos com uma quantidade enorme de elétrons livres (o que pode se perceber na resolução da 3ª questão). Imaginar que um elétron sai do fio antes que outro entre é apenas uma simplificação útil. Não há nenhum problema mais profundo com o fato de que o fio deixa de estar neutro na passagem do referencial inercial S para o S´, pois a lei de conservação da carga não é violada. A conservação da carga elétrica deve ser local, e se relaciona ao fato de que um portador de carga (em um sistema físico “em repouso”) pode se mover de um local para outro e/ou permanecer estacionário dentro da fronteira do sistema; mas nunca desaparecer e – simultaneamente – aparecer em outro lugar do sistema em questão. Se isto ocorresse, um observador em MRU relativo ao sistema poderia observar a não simultaneidade destes 136 eventos (o desaparecimento e surgimento de um elétron, p. ex.); portanto, este observador concluiria que, em certo intervalo do seu tempo, o elétron sumiu ou houve um elétron extra. Assim, a lei de conservação da carga só valeria corretamente no referencial do sistema considerado em repouso, isto é, deveria haver um referencial privilegiado, absoluto; o que viola o Princípio da Relatividade. Na experiência de Feynman (2008), obviamente, há um sistema que contém o fio, uma bateria (ou outra fonte qualquer) e, como é possível imaginar, outros elementos de circuito. Mas o que mais importa é que a carga líquida interna ao sistema deve se conservar, estando este isolado (eletricamente); mesmo que a carga líquida no corpo do fio seja nula em S e positiva em S´. Também, esta lei de conservação no experimento de Feynman (2008) é compatível com a verificação de que deve ser local; afinal, temos portadores de carga em movimento e em repouso (em S e S´) na estrutura do fio de Feynman (2008), da fonte – e talvez em outros dispositivos –, mas não partículas carregadas que desaparecem e reaparecem em outro local, o que segundo Feynman “[...] é impossível, de acordo com o princípio da relatividade de Einstein. Logo, é impossível haver conservação não local da carga. O caráter local da conservação da carga é coerente com a teoria da relatividade.” (FEYNMAN, 2012, p. 71). Esta questão é valiosa, pois neste ponto já se vislumbra a relatividade de campos magnético e elétrico até quando a velocidade relativa entre referenciais inerciais é bem pequena (da ordem obtida na 3ª questão, ≈ 10– 4 m.s –1). É significativo que o leitor perceba, no aspecto da relatividade destes campos, a importância da Teoria da Relatividade Especial a fim de tornar compatíveis (nos dois referenciais inerciais de Feynman) descrições teóricas provindas da mesma teoria: o Eletromagnetismo Clássico. Enfim, a partir da consideração de contração espacial, o físico deduz uma expressão de densidade líquida de carga não nula em S´, e conclui pela existência do campo E´ neste referencial; também, utilizando a noção de relatividade da simultaneidade, mostramos (de modo razoavelmente convincente) que há carga líquida positiva no fio em S´. O fator γ 1 1 v2 c2 na equação obtida para ρ´ não vem de correções relativísticas no formalismo matemático do Eletromagnetismo, mas sim da Teoria da Relatividade Especial (previsão de contração do espaço) – que já inclui o Eletromagnetismo no seu arcabouço teórico e conceitual, sem precisar modificá-lo. Além disso, vimos que a carga elétrica de um sistema isolado eletricamente se conserva em todos referenciais inerciais; esta é uma lei fundamental do Eletromagnetismo – e da Física Moderna –, tanto é que Feynman (2012) a denomina um 137 grande princípio de conservação. Afinal, a carga é uma propriedade intrínseca à estrutura de boa parte da matéria conhecida; Feynman (2008), no texto aqui estudado, explicita duas observações cotidianas que implicam na invariância (e conservação) dessa propriedade. Uma aponta que um objeto inicialmente descarregado (em certa temperatura) tornar-se-ia carregado quando aquecido; a outra nos indica que uma substância qualquer se carregaria na ocorrência de simples reações químicas. Mas estes efeitos nunca foram observados. As explicações de Feynman (2008) a este respeito são muito boas, e é válido relê-las com cuidado e atenção. Repare que a observação referente ao aquecimento de um objeto também é válida se este for resfriado, de acordo com a explicação de Feynman; em resumo, um objeto inicialmente neutro – em certa temperatura – tornar-se-ia eletricamente carregado quando sua temperatura variasse. É claro que, nas observações mencionadas por Feynman (2008), os objetos – sistemas – devem estar eletricamente isolados. A lei de conservação e invariância da carga elétrica é um dos aspectos mais pertinentes do texto de Feynman (2008), que tentamos enfatizar nos comentários desta 4ª questão, juntamente à relatividade dos campos magnético e elétrico e ao fato de que o efeito da contração de Lorentz pode ser “emprestado” pela Teoria da Relatividade Especial – a fim de se começar a vislumbrar a relatividade destes campos e a compatibilização desta teoria com o Eletromagnetismo. 5ª QUESTÃO: Item (a): Primeiramente, vamos obter a expressão para o valor do campo elétrico E´, como indicado por Feynman (2008) em sua equação 13.28. Lembre-se que o campo elétrico somente se manifesta em S´; e aqui usaremos a equação da densidade líquida de carga ρ´ no referencial inercial da partícula (S´). Esta equação se encontra no resultado 14. É bom que se imagine sempre o fio em movimento ao nos referirmos ao referencial S´ da partícula de prova – referencial inercial no qual esta partícula está em repouso, mas não o fio. Isto é evidenciado na Figura 13–10 (b) (2008, p. 13–7) do texto; assim, em S´, o fio se move para a esquerda e realmente está positivamente carregado (o que pode se visualizar na Figura 13–12 (b) (2008, p. 13–11) de Feynman). Poderia ser útil, neste momento, que o leitor revisse (com atenção) as figuras de Feynman citadas acima – e relesse seus respectivos enunciados com cuidado –, pois estas se referem ao referencial S´ da partícula elétrica. A Figura 13–12 (b) (2008, p. 13–11) ilustra razoavelmente bem a relatividade dos campos magnético e elétrico nos sistemas inerciais S e S´. 138 Antes do cálculo do valor de E´ (no referencial S´), façamos algumas argumentações sobre as equações indicadas – em enunciados de nossas questões – para duas importantes leis do Eletromagnetismo. A lei de Gauss da eletricidade escrita para S´ (dada no enunciado desta 5ª questão), sup erfície E´ ∙ dS´ = Qint erna , eq. 2, é uma das formas de simbolizar-se o matematicamente a lei de Gauss da eletricidade. A equação foi escrita para o referencial da partícula em repouso (S´), ou seja, usamos um símbolo [´] para representar grandezas e elementos físicos e matemáticos com caráter relativo; e abstemo-nos do símbolo a fim de apresentar propriedades e quantidades físicas invariantes (constantes). Isto é bem importante – no nível aqui abordado –, pois, apesar da existência do que se denomina invariante e do se denomina relativo, a forma matemática da lei de Gauss da eletricidade é a mesma tanto em S´ quanto em S. Grosso modo, podemos dizer que a equação desta lei tem igual “cara” em qualquer referencial inercial, isto é, não é necessário acrescentar nem retirar nada da equação; mas apenas avaliar os termos relativos (que podem variar na passagem de um referencial para outro) e os invariantes. Aliás, não apenas esta lei mantém sua forma em todos os referenciais inerciais, mas todas as leis fundamentais da teoria eletromagnética (geralmente chamadas de equações de Maxwell). E mais ainda: todas as leis fundamentais da Física são as mesmas em qualquer referencial inercial. Este é um dos enunciados do que hoje pode se denominar ‘Princípio da Relatividade de Einstein’ (que deve ser de conhecimento do leitor); que significa que as equações para as leis fundamentais da Física se preservam, isto é, mantêm seu formalismo, sua aparência, em todos os referenciais inerciais. Assim, a expressão aqui descrita para a lei de Gauss da eletricidade também é válida no referencial S do fio em repouso; todavia, esta lei não precisa ser aplicada neste referencial, pois, de antemão, sabemos que E é nulo em S. A carga líquida interna ao fio é zero no referencial do fio em repouso (ρ+= – ρ_); e isto garante não ser preciso aplicar a lei de Gauss para a eletricidade no referencial S. É interessante apontarmos que, o formato da lei de Gauss da eletricidade (escrito acima), explicita a carga interna de um sistema – em nosso caso, do fio; recorde-se que a carga elétrica interna (líquida) ao fio, no referencial S´, não é nula. Discutiu-se isto nas considerações da 4ª questão utilizando a noção da relatividade da simultaneidade, onde se concluiu que a Qinterna no fio – em S´ – não pode ser zero; com efeito, esta carga líquida no fio é positiva no referencial inercial da partícula (S´), mesmo que a Qinterna líquida no fio seja nula em S. Isto não viola a lei de conservação da carga elétrica; e caso o leitor não se lembre de nossos argumentos a este respeito, na resolução da questão anterior, é útil a releitura de certos 139 trechos desta. Enfim, como a carga líquida (no fio!) difere na mudança do referencial S para o S´, podemos usar a simbologia Q´interna no cálculo de campo elétrico em S´; todavia, preferimos não usar este símbolo na equação dada no enunciado desta questão, para enfatizar que a carga líquida em uma partícula – ou em um sistema como um todo, eletricamente isolado – é invariante, independente do movimento. Enfim, aplicando a lei de Gauss da eletricidade em S´, temos: E´ ∙ dS´ = sup erfície Q´int erna = o E´ ∙ dS´ + contorno cilíndrico E´ ∙ dS´ + base esquerda E´ ∙ dS´ (15) base direita Este cálculo também exibe simetria cilíndrica, e a integral na superfície (área) cilíndrica fechada, que envolve o fio reto – cujo comprimento pressupõe-se ser bem maior que o diâmetro –, divide-se em três integrais de superfícies abertas (que formam a superfície total do cilindro); estas superfícies (áreas) podem ser vistas na Figura 2 deste material, adaptada do próprio texto de Feynman (1964), isto é, adaptada de figura igual à Fig. 13–10 (b) de Feynman (2008, p. 13–7). A integral no contorno cilíndrico (o envoltório do cilindro) mais as integrais de suas bases esquerda e direita nos dá a integral fechada E´ ∙ dS´ completa na sup erfície área cilíndrica do referencial S´. Repare que, nas bases (que nada mais são do que círculos perpendiculares ao eixo do fio), por argumentos vetoriais, vemos que o campo elétrico E´ é sempre tangente às superfícies circulares. Lembre-se que o fio considerado é infinitamente longo, mas é preciso tomar certo comprimento finito L (relativo) no referencial S´; assim, o fio continua infinitamente além das bases. Então, o campo E´ é sempre perpendicular ao elemento infinitesimal de área dS´; elemento sempre normal à superfície. Logo, o produto escalar (interno) E´ ∙ dS´, nas bases circulares, se anula; e as integrais na base esquerda e direita também se anulam: base esquerda E´ ∙ dS´ = 0 e E´ ∙ dS´ = 0 (16) base direita Considera-se que a densidade de carga ρ´, no referencial de repouso da partícula (S´), é uniforme; dessa forma, os argumentos vetoriais mencionados podem ser válidos. 140 Também por argumentos vetoriais – e considerando-se ρ´ uniforme –, pode-se visualizar que E´ é sempre normal à superfície do contorno cilíndrico e, portanto, paralelo ao elemento dS´. Assim, o produto escalar E´ ∙ dS´, na integral do contorno, fica igual ao módulo de E´ multiplicado pelo módulo de dS´; e o resultado 15 se torna: E´ ∙ dS´ = sup erfície Q´int erna = o E´ dS´ (17) contorno cilíndrico Sendo que E´ tem sempre o mesmo valor para certa distância r perpendicular ao eixo do fio (E´ é estático); e como dS´ = S´ (a área do contorno do cilindro), obtemos: contorno cilíndrico Q´int erna = E´ S´ = E´ 2πrL o (18) Onde S´ = 2πrL; portanto, o valor do campo elétrico E´, no referencial inercial da partícula de prova, fica: E´ = ´ A ´ Ao L Q´int erna = = 2r o 2rL o 2rL o Obtivemos o último termo (mais à direita) fazendo ρ´ = (19) Q´ ; assim, a carga interna Q´ V´ se iguala à ρ´Ao L. O volume relativo V´ do fio, em S´, é dado por V´ = Ao L. Atente-se para o fato de que a área de seção transversal do fio condutor é representada por Ao = A, pois Feynman (2008) usa para esta estes dois termos – o que é desnecessário, pois as dimensões transversais ao movimento relativo entre referenciais inerciais não sofrem alteração relativística. Calculamos a expressão para ρ´ – que é positiva – em S´ (referencial da partícula), 2 v c 2 = ρ´; este cálculo está na 4ª questão e no texto de Feynman (2008). Logo, v2 1 c2 o termo mais à direita em 19 se torna: 141 E´ = A v2 c2 (20) v2 2 o r 1 c2 Esta é a expressão para o valor de campo elétrico E´ – no referencial inercial S´ – como escrita por Feynman (2008) em sua equação 13.28. Este resultado também mostra a questão da relatividade do campo elétrico; com razão, como o leitor deve saber, há campo elétrico em S´, mas não em S. A expressão 20 demonstra que o valor de E´, em S´, não pode ser nulo; já sabíamos disto de antemão, pois o fio está positivamente carregado no referencial de repouso da partícula. Obviamente, a relatividade dos campos magnético e elétrico também se aplica às forças engendradas por estes na partícula elétrica. Somos já capazes de explorar melhor o aspecto da relatividade do campo magnético na experiência de Feynman (2008). Este campo está nos dois referenciais inerciais do texto; em S, ele é devido à corrente estática i neste referencial, uma corrente de elétrons livres; em S´, o campo magnético se deve à corrente (também estática) i´ que se manifesta neste referencial: o fio, em movimento no referencial S´, leva consigo uma distribuição de partículas positivas (prótons), fixas em sua estrutura. A distribuição tem valor de velocidade v´+ = – v (para a esquerda); reveja a Figura 13–10 (b) do texto de Feynman (2008, p. 13–7) e repare que esta velocidade é simplesmente o negativo do vetor vo (velocidade da partícula de prova em S). As cargas positivas são representadas, em S´, pela densidade de carga ρ´+ ; uma densidade relativa de carga positiva, pois estas se movimentam no referencial S´ da partícula de prova. Recorde-se que a soma destas cargas (contidas em prótons nucleares) é a carga total de N prótons, onde N é o número de átomos de certa porção do fio infinito tomada para estudo. Os demais prótons nucleares também se movem no referencial S´ (junto ao fio), mas suas cargas (e densidades de carga) não precisam ser contabilizadas, pois se contrabalanceiam pelas cargas dos demais elétrons atômicos. Em resumo, Feynman preocupa-se apenas com o total de elétrons livres (que se supôs ser um por átomo na 3ª questão) que concorrem com igual número de prótons nucleares – também um por átomo (por núcleo); os demais elétrons e prótons estão em repouso uns em relação aos outros. E na ausência de movimento relativo entre eles, suas cargas (e densidades de carga) se balanceiam em qualquer referencial inercial. A equação 12 – ou 13.24 de Feynman (2008) – nos dá a relação entre as densidades de carga 142 positiva em S e S´: ρ´+ = = γ ρ+; onde a densidade ρ+ é uma densidade de repouso, v2 1 c2 pois as cargas positivas estão estacionárias em S, e ρ´+ é uma densidade de carga relativa – pois estas mesmas cargas se movem junto ao fio em S´. Sendo γ = 1 1 maior do que um, v c2 2 em nosso caso (v ≠ 0), ρ´+ fica maior que ρ+. O procedimento para cálculo do valor do campo magnético B´, em S´, é igual ao utilizado no cálculo deste campo em S; isto indica que podemos usar a mesma forma de equação de Maxwell (lei de Ampère da magnetostática), usada no referencial do fio (S), para calcular o valor de B´ no referencial inercial da partícula (S´). Pois as equações de Maxwell se preservam, mantendo sua forma, seu formato, em qualquer referencial inercial; e devemos apenas analisar quantidades que variam (ou podem variar) na passagem de um referencial para o outro. Assim, admitindo que o campo magnético varia – de S para S´ –, pois o valor de corrente varia, podemos escrever a lei de Ampère da magnetostática para S´, B´ ∙ dl´ = μo i´, de tal modo a destacar o símbolo [´ ] nas linha quantidades que sofrem variação. Como i´ é dada ρ´+ (–v)A (assim como i = ρ_vA), e substituindo-se μo por 1 (que são todas quantidades constantes), obtemos que o valor de oc 2 B´ – após um rápido cálculo – é B´ = ´ vA . Aqui, o infinitesimal dl´ = dl, pois estes são elementos matemáticos 2r o c 2 transversais; portanto, invariantes ao MRU relativo no texto de Feynman (2008). Também a circunferência na qual se faz a integral dl´ possui comprimento invariante, 2πr, pois é linha uma circunferência transversa ao movimento (assim como r), que não se altera; e a simetria para o cálculo é igual à da obtenção do valor de B, com B´ e dl´ paralelos. Optamos por usar 1 ao invés de μo, a fim de que nossos resultados fiquem semelhantes aos de Feynman. oc 2 Podemos comparar o resultado de B´ com o do valor de B, obtido para S; para isto, basta utilizar a relação entre as densidades de carga positiva (indicada acima e no texto) e a igualdade ρ+ = – ρ_. Fica, então, como sugestão ao leitor obter B´ = γ B, que é a relação entre 143 os valores dos campos magnéticos, para determinada distância radial r ao eixo (longitudinal) do fio, nos dois referenciais do texto. Todos os campos de Feynman (2008), B, E´ e B´, são estáticos; e somente o campo magnético B´ não atua na partícula de prova, pois a velocidade desta – em seu referencial próprio – é nula. Não há força magnética em S´. Recorde-se que B (magnético) existe apenas na perspectiva de um observador em S, enquanto E´ (elétrico) e B´ apenas na perspectiva de um observador em S´; ou seja, estes campos são totalmente relativos. Embora observemos a mesma espécie de acontecimento físico nos dois referenciais de Feynman, a atração da partícula pelo fio, as grandezas de campo usadas na descrição da interação (de natureza eletromagnética) são completamente dependentes do referencial inercial escolhido. “Forças elétricas e magnéticas são parte de um mesmo fenômeno físico – a interação eletromagnética das partículas. A separação desta interação em parte elétrica e magnética depende muito do sistema de referência [...]”, destaca Feynman (2008, p. 13–11). Isto equivale a dizer que, em qualquer referencial inercial, observaríamos uma atração entre a carga de prova e cargas no fio, mas o(s) tipo(s) de campo(s) e força(s) engendrada(s) na partícula elétrica por este dependem completamente do referencial usado no estudo da experiência de Feynman (2008). Como ressalta o cientista, em outro referencial que não S ou S´, encontrar-se-ia uma mistura diferente dos campos elétrico e magnético. Lembre-se que os resultados encontrados para campos e forças (neste material e no texto) valem para o caso especial em que vo (da partícula em S) é igual à velocidade de arraste dos elétrons de condução, em S. Também, ao dizermos que os campos de Feynman são estáticos, eles o são em relação ao tempo de seu respectivo referencial inercial; cada campo, B, E´, B´, existe apenas em um referencial. Em relação ao fato de que as equações de Maxwell se preservam em todos os referenciais inerciais, alguns comentários adicionais são pertinentes. Por exemplo, se em S´ (um sistema com velocidade uniforme vo relativamente à S) tivéssemos um campo magnético variável em função do tempo t´ – distante do fio de Feynman (2008) –, produzido por corrente variável em outro fio, a lei de Gauss da magnetostática possuiria a mesma forma neste referencial S´ ? Sim, esta lei continuaria correta e com igual formalismo matemático; só não seria mais aplicável nesta situação. Para o cálculo do campo magnético em certo ponto do espaço e instante, em S´, precisaríamos da lei de Ampère generalizada. Mas o formalismo matemático associado a estas leis se mantém em qualquer referencial, pois são equações de Maxwell. Do mesmo modo, a lei de Gauss da eletricidade também é correta e se conserva no referencial S do fio de Feynman. Esta só não precisa ser aplicada neste referencial inercial, pois a carga e densidade líquidas são nulas em S. Enfim, todas as equações de Maxwell se 144 preservam em qualquer referencial inercial, sem a necessidade de nenhuma correção relativística; é necessária, sim, a análise de características do(s) campo(s) em determinado referencial, isto é, de grandezas e quantidades físicas que lhes originam e de suas possíveis alterações – que podem se modificar na mudança de referencial inercial ou no próprio referencial em questão. Assim, podemos estudar quais equações de Maxwell são mais apropriadas em cada caso. Para finalizar o item (a) desta questão, vamos obter o vetor força elétrica que age na partícula de prova – em seu próprio referencial S´; é fácil perceber que este vetor é radial ao eixo longitudinal do fio, pois o campo elétrico estático (em S´) também é radial a este eixo. As linhas de campo são retas perpendiculares à superfície do condutor, afastando-se deste, porque o fio está carregado positivamente no referencial da partícula. Logo, basta inserir um unitário radial r positivo – na expressão do campo E´ – para obtermos o vetor E´; e como o campo elétrico, em S´, pode ser dado por E´ = F´/q , temos que F´ = q E´ = q A v2 c2 2 o r 1 (r) (21) v c2 2 Onde a carga q, no texto de Feynman (2008), é um invariante escalar negativo. Assim, percebemos que a força elétrica F´ tem sentido contrário ao de E´, mas está na mesma reta de ação (radial). O resultado 21 é coerente, pois as forças magnética F e elétrica F´ têm orientações iguais, cada qual em seu respectivo referencial inercial; o que não poderia ser diferente, pois a experiência de Feynman envolve uma interação de natureza eletromagnética atrativa. A atração eletromagnética deve se observar não apenas nos dois referenciais do texto, mas em qualquer outro; seria um absurdo lógico a partícula elétrica aproximar-se do fio no referencial de repouso deste (S), mas permanecer estacionária – ou ser repelida, afastandose do fio – em seu referencial próprio e/ou em outro qualquer. Em suma, segundo o Princípio da Relatividade einsteiniano, não somente as equações fundamentais do Eletromagnetismo (de Maxwell) são idênticas – preservando os seus formatos matemáticos em quaisquer referenciais inerciais –, mas todas as leis fundamentais da Física. Estas leis descrevem acontecimentos físicos (em nosso caso, a interação eletromagnética em S e S´) logicamente coerentes com as observações experimentais em distintos referenciais inerciais. Enfim, apesar de que temos conceitos de força diferentes nos referenciais de Feynman (2008), a força 145 magnética (em S) e a elétrica (em S´) nos dão resultados físicos compatíveis – como mostrado por Feynman e em considerações posteriores deste material. A relatividade das forças elétricas e magnéticas provém da relatividade dos campos a elas associados; também, na abordagem de Feynman (2008), vimos que foi possível concluir pela relatividade destas forças partindo de leis e previsões como a invariância da carga elementar, a contração do espaço, a variação relativística de densidades de carga etc. E mesmo na existência de tantas grandezas, quantidades e conceitos relativos, certos resultados físicos devem mostrar-se iguais, como p. ex., o valor da carga na partícula de prova. As forças F e F´ de Feynman apenas podem ser relacionadas em sua equação 13.30 porque o valor q é o mesmo (invariante). Caso a carga contida na partícula dependesse de sua velocidade (e, por conseguinte, dependesse do referencial inercial), não se poderia equacionar F´ e F como faz Feynman (2008); assim, os resultados físicos não seriam coerentes em S e S´, estando em contradição com o Princípio da Relatividade. A medição de carga deve resultar em valores idênticos, para quaisquer referenciais; esta é uma boa maneira de se enfatizar a lei de invariância (e conservação) da carga elétrica. Observando o leitor as expressões 13.21 e 13.29 de Feynman – do valor de força magnética e elétrica, respectivamente –, facilmente notará que estas apenas se relacionam matematicamente se a carga elétrica líquida q da partícula for um invariante escalar. Isto é verdade para qualquer sistema na natureza, que esteja eletricamente isolado. Assim, mesmo que haja recebimento/perda de energia pelo sistema e/ou ocorrência de reações químicas em seu interior, a carga líquida sempre é invariante (se conserva). A lei de invariância/conservação da carga elétrica é muito importante na ciência; afinal, como afirma Feynman (2012), a carga é a propriedade fonte do campo eletromagnético. Item (b): A outra quantidade física à qual o enunciado deste item se refere – explícita na maior parte das equações de Feynman (2008) – é o valor absoluto da velocidade da luz no espaço livre (vácuo), geralmente designado por c; uma constante para qualquer frequência de onda eletromagnética – visível e invisível ao olho humano. Podemos dizer que c é mais um invariante que aparece no sistema teórico interligado ao Eletromagnetismo e à Teoria da Relatividade Especial, além da propriedade de carga elétrica, das equações de Maxwell, dentre outros; seu valor mais preciso, atualmente aceito, é 299.792.458 m.s –1, em unidades do Sistema Internacional (EINSTEIN, 1999; TAYLOR; WHEELER, 1992). Podemos perceber a invariância (ou constância) de c, no texto de Feynman, pelas seguintes considerações. A 146 velocidade da luz, no referencial S do fio em repouso, aparece já na equação 13.21 para o valor de força magnética F. Mas, o valor da velocidade luminosa, no espaço livre, que surge elevado ao quadrado (c2) nesta equação de Feynman (2008), vem diretamente da lei de Ampère da magnetostática. O leitor pode comprovar isto ao substituir μo por 1 na eq. 1 oc 2 deste material e fazer o cálculo de campo e força magnética que atua na partícula de prova – em S. Recorde-se que o valor de c é dado por 1 o o . Mas c também surge nas equações 13.28 e 13.29 de Feynman, sempre ao quadrado; desta vez, a quantidade c2 nestas equações provém da expressão para a densidade líquida (positiva) de carga ρ´, evidenciada na equação 13.27 do texto. Em última instância, c2 aparece nas equações para o valor de campo e força elétrica, em S´, pois vem da adoção de Feynman (2008) do efeito relativístico da contração do espaço – expresso em sua equação 13.22. Assim, para que os valores de força elétrica F´ e magnética F possam ser relacionados em 13.30 – e também para que possamos provar (mais adiante) que o momento transverso da partícula é invariante em ambos os referenciais inerciais de Feynman (2008) –, devemos assumir que c tem igual valor absoluto em equações para grandezas dos dois referenciais do texto. Noutras palavras, c deve possuir o mesmo valor absoluto na equação 13.29 (para F´ no referencial S´) e na equação 13.21 (para F no referencial S), para que se possa relacionar estas forças e concluir pela coerência dos resultados físicos em ambos os referenciais inerciais. Caso c fosse uma quantidade relativa, o adequado seria usar símbolos e/ou subscritos distintos para esta velocidade nas equações de S e S´ – assim como faz Feynman para diversas grandezas relativas e variáveis. Porém, c surge como constante nas equações para grandezas de qualquer referencial inercial, sendo, por conseguinte, independente do movimento relativo entre estes. E isto é confirmado pela experiência. Deve ser de conhecimento do leitor, por exemplo, a famosa experiência óptica de Michelson-Morley (ou outros avanços empíricos que também comprovam a constância de c). Afinal, se a invariância no valor de velocidade luminosa (no espaço livre) não tivesse provas da observação, Feynman (2008) não poderia concluir pela compatibilidade entre o Eletromagnetismo e a Teoria da Relatividade Especial. E, se c não fosse constante, a permissividade elétrica εo e a permeabilidade magnética μo, para o espaço livre, também não o seriam; pois εo = 1 e μ = 1 . Dessa forma, poderíamos esperar que o formalismo o o c 2 oc 2 matemático das equações de Maxwell não se preservasse, sendo dependente de um referencial absoluto, privilegiado; neste caso, o Princípio e a Teoria da Relatividade Especial de Einstein 147 não seriam válidos – juntamente às previsões de dilatação temporal e contração espacial. Entretanto, c, μo e εo são quantidades físicas invariantes, intrincadamente relacionadas entre si e às equações de Maxwell. Pode parecer aparentemente absurdo que a velocidade de propagação da radiação eletromagnética tem sempre o mesmo módulo no espaço livre, independente do movimento relativo entre a fonte de luz e o observador. A constante c traz à tona, de certa forma, a intrincada relação entre as grandezas de espaço e tempo; segundo Taylor e Wheeler (1992), c pode ser interpretada – ao utilizarmos unidades iguais para as medidas de tempo e espaço – como um fator de conversão entre estas grandezas. Esta constante também evidencia de certo modo a conexão íntima entre os formalismos teóricos do Eletromagnetismo e da Teoria da Relatividade Especial, como se percebe no texto de Feynman (2008), p. ex., ao observarmos suas equações para densidades de carga – válidas mesmo quando a velocidade relativa entre dois referenciais inerciais é muito pequena. 6ª QUESTÃO: Esta, talvez, é a questão mais difícil deste material, no que se refere ao procedimento de cálculo; entretanto, ela envolve noções interessantes. Em primeiro lugar, deve-se deixar claro ao leitor que a abordagem em Feynman (2008) insere-se somente no contexto da teoria clássica do Eletromagnetismo e da Teoria da Relatividade Especial. Podemos desconsiderar qualquer interação gravitacional; também, desconsideram-se quaisquer efeitos ou previsões relacionados às teorias quânticas, assim como quaisquer forças de resistência/atrito mecânico. Enfim, só nos interessam referenciais inerciais, ou melhor, referenciais inerciais bem aproximados; assim, as variações de velocidade da partícula elétrica de prova q – devido às forças que nela atuam, cada qual em um referencial – devem ser tomadas como bastante pequenas, de tal maneira que o referencial S´ de repouso desta partícula (a própria partícula!) mantenha-se quase que somente em movimento reto e uniforme em relação ao referencial S (de repouso do fio). Noutras palavras, o movimento entre a partícula e o fio seria, na prática, muito próximo de um movimento relativo uniforme; e as variações de velocidade da partícula seriam muitíssimo sutis. Com este propósito, vamos tomar intervalos de tempo – nos referenciais S e S´ – bem pequenos; ao invés da notação de Feynman (Δt e Δt´ ), utilizemos elementos infinitesimais de tempo dt e dt´ para os referenciais inerciais S e S´. 148 A partir da equação do enunciado da 6ª questão, p = m u , vamos escrever a v2 1 c2 expressão para o valor do momento relativístico transverso da partícula em S. A partícula possui velocidade longitudinal vo neste referencial (que, de fato, é sua velocidade inicial no referencial S). Devido à força magnética radial – que atua apenas em S (apontando para o fio) –, temos uma sutil variação na velocidade, de acordo com as considerações acima. Assim, a partícula tem, após um intervalo de tempo muito curto dt decorrido em S, um pequenino vetor velocidade uy radial e para baixo. A velocidade resultante da partícula (em S) é a soma vetorial de vo com uy; mas somente nos interessa v2 (sempre positivo), que é o quadrado do valor de velocidade v no referencial em questão – primeiramente em S –, dado pela soma dos quadrados dos valores de vo e uy: vo2 + uy2 = v2. Logo, segundo a equação anterior, o valor de momento transverso (ou transversal) da partícula, em S, é escrito como py = mu y mu y = v uy 1 o c2 v2 1 c2 2 2 (22) Onde m é a massa de repouso da partícula negativamente carregada. Através de considerações semelhantes, escrevemos a expressão para o valor de py´. Repare que agora, no referencial inercial S´ (da partícula), esta possui apenas uma bem pequena velocidade radial uy´ – após decorrido um tempo infinitesimal dt´ no referencial S´. Esta velocidade lhe é conferida, agora, pela força elétrica, que age apenas em S´. Enfim, a expressão do momento transversal, em S´, fica: py´ = mu y ´ v2 1 c2 = mu y ´ 1 (23) u y ´2 c2 Onde v2 foi simplesmente substituído por uy´ 2, pois o valor de velocidade da partícula, em S´, é apenas uy´. 149 Escrevendo os valores de uy e uy´ como derivadas temporais, obtemos uy = dy e uy´= dt dy´ ; também, sabemos que na existência de movimento relativo entre dois ou mais dt´ referenciais inerciais manifesta-se o efeito da dilatação do tempo. Esta previsão relativística nos aponta que relógios em repouso (estacionários) em diferentes referenciais inerciais não terão o mesmo ritmo (pressupõe-se que todos estes relógios são igualmente construídos). Noutras palavras, na Teoria da Relatividade Especial – quando os efeitos gravitacionais podem ser desprezados –, o ritmo do tempo em dois referenciais em movimento retilíneo uniforme (MRU) entre eles se mostrará diferente. Aqui, entra um aspecto importante que devemos enfatizar. Assim como Feynman (2008) toma emprestado o efeito da contração de Lorentz – que pôde ser usado na contabilidade das densidades de carga elétrica –, ele também se vale do efeito de dilatação temporal a fim de conciliar a igualdade dos momentos transversos. Vemos aqui que duas noções relativísticas são explicitamente utilizadas, propiciando descrições eletromagnéticas clássicas que estão em concordância com as equações de Maxwell e com a Teoria da Relatividade Especial. A partir da invariância/conservação da carga, da contração de Lorentz (ou contração do espaço) etc., o texto de Feynman nos permite concluir pela relatividade dos conceitos de campo elétrico e magnético, pois o fio está carregado em S´ (mas não em S) – e, como já vimos, as intensidades do campo magnético devem diferir de um referencial inercial de Feynman (2008) para o outro. De modo análogo, concluímos também pela relatividade das forças elétrica e magnética, pois em S a força é de natureza magnética e em S´ de natureza elétrica. E, com a previsão da dilatação temporal, veremos que os resultados físicos previstos, em concordância com a Relatividade Especial, são compatíveis com nossas descrições eletromagnéticas. Com efeito, intervalos de tempo Δt e Δt´ correspondentes (entre os mesmos dois eventos) – medidos em seus respectivos referenciais S e S´ – são relacionados, por Feynman, pela equação Δt = t´ v2 1 c2 em 13.33. Como o leitor deve saber, 1 1 é v c2 2 geralmente denominado fator de Lorentz, representado pela letra grega γ (gama). Como optamos por escrever os bem curtos intervalos de tempo como incrementos infinitesimais (dt e dt´ ), esta equação resulta em dt = γ dt´. Devemos destacar que o que chamamos de ‘eventos’ não são exclusivos de determinado referencial inercial; ou seja, eventos possuem existência independente no espaço-tempo (TAYLOR; WHEELER, 1992). Na Teoria da 150 Relatividade Especial, geralmente se trabalha com o conceito de evento, acontecimentos aos quais são definidos (pelo menos teoricamente), em certo referencial inercial, um instante de tempo e uma posição espacial (EINSTEIN, 1999). Na experiência de pensamento de Feynman (2008) não são especificados eventos quaisquer; o que não é necessário. Não precisamos nos preocupar com a introdução de sistemas de coordenadas para definir posições; porém, sabemos que as coordenadas transversas y e y´ são invariantes (y = y´), não sofrendo alteração relativística. Assim, também dy = dy´, de tal forma que se pode representar o valor dy´ dy = ; dt´ dt´ e, de dt = γ dt´, ainda obtemos dy dy = =γuy dt dt (24) de velocidade uy´ – como uma derivada – por dt´ dt . Então: uy´ = Em 24, temos o resultado uy´ = γ uy ; substituindo este no termo mais à direita da eq. 23 do momento transverso py´, em S´, temos: py´ = mu y 1 uy 2 2 (25) c2 2u y Onde o termo 1 – , no interior da raiz quadrada, é manipulado de tal modo que c2 2 2 2u y 2 2u y 1 – = 2 c2 c2 2 1 uy2 . Assim, retornando o último resultado para = 2 c2 2 dentro da raiz quadrada em 25, obtém-se: mu y py´ = 1 2 uy 2 c2 = mu y 1 2 2 . Neste resultado, o termo mais à direita é u vo y c2 c2 equivalente à expressão do momento transverso py, escrita em 22. Portanto: 151 py = py´ (26) Chegamos à igualdade almejada. Se o valor da componente transversa (ou transversal) do momento da partícula de prova é invariante, também os valores de variações deste momento – entre iguais coordenadas y final = y´ final ey inicial = y´ inicial – serão igualmente invariantes em ambos os referenciais inerciais de Feynman (2008), isto é, Δpy = Δpy´. Neste contexto, é de grande validade a citação de Feynman, que conclui que: [...] temos o mesmo resultado físico quando analisamos o movimento de uma partícula movendo-se ao longo de um fio num sistema de coordenadas em repouso com respeito ao fio, ou num referencial em repouso com respeito à partícula. No primeiro caso, a força era puramente “magnética”, já no segundo, puramente “elétrica”. (FEYNMAN; LEIGHTON; SANDS, 2008, p. 13-11, destaques do autor). Ou seja, a abordagem de Feynman demonstra que, sob a ótica da Teoria da Relatividade Especial, podemos mostrar que a teoria clássica do Eletromagnetismo é compatível com o arcabouço formal e conceitual da Teoria da Relatividade Especial; isto implica que não existem contradições lógicas internas entre estas teorias, ao menos no nível em que se está a considerar. Na passagem do referencial S (em repouso com respeito ao fio) para o referencial inercial S´ (em repouso com respeito à partícula), ocorre a mudança na descrição do conceito de força atuante na partícula – primeiramente magnética e depois elétrica. Todavia, as duas descrições nos dão resultados físicos totalmente coerentes e compatíveis com as teorias citadas, isto é, com as leis de Ampère da magnetostática e de Gauss da eletricidade, com a lei da invariância no valor c, com a invariância/conservação da carga, com o Princípio da Relatividade etc. Apesar de que foram utilizadas duas equações de Maxwell distintas – para campos estáticos do texto e deste material –, uma para magnetostática e outra para a eletricidade, sem conexão aparente entre o campo magnético de S e o campo elétrico de S´, na própria natureza há um íntimo relacionamento entre estes campos, interligado ao Princípio da Relatividade. Este aspecto é ressaltado por Feynman (2008, p. 13–7), e pode-se percebê-lo no fato de que as descrições dadas pelos conceitos de força (magnética em S e elétrica em S´ ) fornecem iguais resultados físicos. 152 7ª QUESTÃO: A relação entre intervalos de tempo Δt medidos no referencial S (do fio em repouso) e intervalos de tempo Δt´ medidos no referencial inercial S´ (da partícula em repouso) é dada pela equação 13.33 de Feynman (2008, p. 13–11), Δt = t´ = γ Δt´. É preciso que o leitor v2 1 c2 compreenda que estes intervalos temporais – Δt em S e Δt´ em S´ – devem ser correspondentes, como afirma Feynman: “Precisamos, obviamente, comparar Δpy com Δp´y para intervalos de tempo correspondentes Δt e Δt´.” (FEYNMAN; LEIGHTON; SANDS, 2008, p. 13–11). Esta correspondência refere-se ao fato de que os intervalos de tempo, em cada referencial, devem ser mensurados entre os mesmos eventos; como destacado na 6ª questão, eventos têm existência independente. O leitor pode imaginar, por exemplo, o evento inicial da experiência de Feynman como a formação (e/ou emissão) da partícula negativa – um elétron, p. ex. – em um processo nuclear ou atômico capaz de fazê-lo, ou que a partícula provém de uma fonte qualquer. Obviamente, pressupõe-se que, no evento inicial, a partícula é emitida com velocidade inicial vo (paralela ao fio) igual à velocidade média de arraste dos elétrons de condução no referencial S. Os instantes para este evento poderiam ser especificados por t inicial = t´inicial = 0. Como optamos por escrever a equação 13.33 na forma diferencial (dt = γ dt´ ), pois estamos a tomar intervalos de tempo como elementos infinitesimais, o evento final poderia ser a observação/detecção da partícula, em coordenada transversal final y = y´, quando seu momento transverso variou dpy = dpy´. Lembre-se que esta variação de momentum ocorre após atuação das forças magnética e elétrica, nos respectivos tempos infinitesimais dt e dt´ – em seus respectivos referenciais inerciais. Feynman (2008, p. 13–11) destaca que “intervalos de tempo que se referem a partículas que se movem parecem ser maiores que aqueles no referencial de repouso da partícula.”. Mas há aí uma incorreção, ou mais provavelmente um descuido do físico nesta citação, pois os intervalos temporais aos quais se refere não parecem ser maiores, mas realmente o são. Podemos descrever melhor este fenômeno mencionando a Física de Partículas; por exemplo, observa-se que a vida média de uma partícula instável qualquer (que sofre algum tipo de decaimento/desintegração) é maior quando esta se encontra em MRU relativo ao referencial inercial de um laboratório. Expressando isto melhor: o intervalo de tempo Δt, medido para a vida média da partícula – por relógios estacionários no referencial inercial de um “laboratório” –, é maior quando a partícula está em MRU relativamente a este 153 laboratório do que quando ela está em repouso no referencial do laboratório. O que se chama de laboratório pode ser um moderno acelerador de partículas ou até a própria Terra, pois, partículas instáveis que são formadas/emitidas na porção superior da atmosfera (com valores de velocidade próximos de c) são detectadas na superfície terrestre; múons, como exemplo, vêm da parte atmosférica mais alta, como radiação secundária de raios cósmicos (TAYLOR; WHEELER, 1992; GAZZINELLI, 2009). Esta questão é útil para auxiliar o leitor a compreender melhor a citação do texto, pois intervalos temporais mensurados para a vida média de partículas instáveis – em velocidades significativas em relação à luminosa – são realmente maiores quando tomados por relógios estacionários no referencial do laboratório do que quando tomados/calculados para o referencial da partícula. Outra finalidade desta questão foi descrever a dilatação temporal, dando alguma interpretação para os distintos intervalos correspondentes Δt e Δt´, e também citar poucos exemplos de confirmações experimentais. Em suma, podemos afirmar que há um intervalo de tempo próprio, medido no próprio referencial inercial de repouso da partícula; este intervalo é sempre menor que o intervalo temporal correspondente medido em qualquer outro referencial inercial. Para a vida média de uma partícula instável, concluímos, então, que há uma vida média de repouso, medida no referencial inercial da própria partícula; assim, esta vida média de repouso, que é um intervalo de tempo próprio, sempre se mostra menor que a vida média da partícula instável em qualquer outro referencial inercial. Em termos de eventos, podemos ressaltar: o intervalo de tempo próprio – entre dois eventos – é o intervalo Δt´ medido num referencial inercial (por relógios fixos neste) no qual estes eventos ocorrem na mesma posição; em qualquer outro referencial inercial o intervalo de tempo Δt, entre os mesmos eventos, é maior que o intervalo próprio por um fator γ = 1 1 (GAZZINELLI, v c2 2 2009; TAYLOR; WHEELER, 1992). Este é o significado da equação Δt = γ Δt´ contida em Feynman (2008). Logo, no texto do físico, Δt´ pode ser considerado um intervalo de tempo próprio, pois refere-se ao referencial de repouso da partícula negativa. E embora Feynman (2008, p. 13–11, destaque nosso) reconheça que “[...] nossa partícula está inicialmente em repouso em S´ [...]”, ele assume que, para pequenos tempos, podemos esperar Δt = γ Δt´; e tudo mostrar-se-á correto (FEYNMAN; LEIGHTON; SANDS, 2008). Por isto utilizamos infinitesimais de tempo, para dar uma boa ênfase ao fato de que os tempos tomados – em cada referencial – devem ser bastante curtos, a fim de que as acelerações produzidas na partícula de prova (pelas forças, em seus respectivos referenciais) sejam também bem pequenas, sutis. 154 Assim, a variação no valor de momento transversal pode também ser abordada, em nossos cálculos, como elementos dpy = dpy´. Desse modo, tomamos os referenciais em movimento relativo como inerciais, com boa aproximação. 8ª QUESTÃO: Item (a): A relação matemática entre os valores de força magnética F e elétrica F´ – em seus respectivos referenciais inerciais S e S´ – pode ser obtida de modo simples. Não nos preocuparemos com a questão de que alguma ou outra equação de Feynman (2008) possa resultar em valores negativos, na substituição dos termos nas expressões. Feynman deixa claro que se está a considerar o módulo destas forças. Também, aplicando uma regra de mão direita em S, e sabendo que o fio está positivamente carregado em S´, concluímos facilmente que F e F´ têm igual direção e sentido (radial e “para baixo”, apontando para o fio). Assim, nos dois referenciais a partícula elétrica é atraída pelo fio, o que não poderia ser diferente, pois violaria o Princípio da Relatividade. Na 5ª questão, a equação 21 (eq. 13.29 de Feynman A (2008)) contém o valor de força elétrica: F´ = q E´ = q v2 c2 2 o r 1 . Temos, portanto, uma v c2 2 força puramente elétrica que atua na partícula de carga q, no referencial de repouso desta (S´ ); sendo ρ+ uniforme e A e v = v_ constantes, o valor de força elétrica que atua em um elétron de prova, por exemplo, dependerá apenas da distância r ao eixo longitudinal do fio. Isto pode ser vislumbrado na equação escrita acima. Dada a expressão para F (magnética) – presente no termo mais à direita da equação 6 deste material, e na equação 13.21 de Feynman –, e substituindo-se ρ_ por – ρ+ na expressão para F = F´ = q v 2 = q Av 2 2r o c 2 v2 c2 2 o r 1 c2 A q Av 2 q Av 2 = , vamos obter: 2r o c 2 2r o c 2 1 v2 1 c2 = F 1 (27) v2 1 c2 Onde, segundo o considerado acima, desprezamos o sinal negativo vindo de – ρ+, pois nos interessam apenas os valores absolutos (módulos) das forças. 155 Repare que, assim como F´, o valor de força magnética (no referencial S) também depende apenas da distância radial r ao eixo do fio; e, de acordo com o resultado 27, podemos escrever a relação entre estas forças como F´ = γ F, em concordância com a expressão obtida por Feynman (2008), na equação 13.30. A relação F´ = γ F ressalta a relatividade dos conceitos de força elétrica e de força magnética; no exemplo pensado por Feynman (2008) – um caso especial em que a velocidade de um portador de carga é igual à velocidade de arraste de elétrons condutores da corrente (no referencial de repouso do fio condutor) –, vemos que os conceitos de força mudam não apenas de espécie, mas também em seus valores previstos para uma mesma coordenada transversa y = y´, na qual temos um mesmo resultado físico. Em outras palavras, as forças elétrica e magnética (no contexto da teoria eletromagnética clássica) são, de fato, conceitos relativos, dependentes do referencial inercial utilizado para descrever uma interação eletromagnética; e a experiência do texto mostra bem este aspecto, pois, como enfatiza Feynman (2008), no referencial S de repouso do fio a força é puramente “magnética”, ao passo que no referencial S´ de repouso da partícula a força é puramente “elétrica”. E as forças de Feynman devem diferir em valor de acordo com a relação acima, mesmo em velocidades medíocres entre os referenciais inerciais – como a obtida na 3ª questão. Analogamente, vemos que a questão da relatividade destas forças se relaciona intrincadamente à relatividade dos campos da experiência de Feynman (2008), pois um campo magnético e um campo elétrico estáticos (em S e S´, respectivamente) são “os responsáveis” por engendrar as forças na partícula de prova. Então, podemos enfatizar que, em S, há um campo totalmente magnético, enquanto que, em S´, temos os dois tipos de campo – muito embora somente o campo elétrico interaja com a partícula carregada. Estas considerações são suficientes para nos convencermos que os conceitos de força e as grandezas de campo (do Eletromagnetismo clássico) são, com efeito, relativos, dependentes do movimento uniforme reto entre sistemas de referência. Recorde-se o leitor que aqui estamos a tratar uma experiência idealizada de Feynman (2008), na qual os intervalos de tempo e os valores das variações de momentos transversos da partícula foram tomados como infinitesimais, em seus respectivos referenciais. Apesar de que os valores de força são diferentes, de acordo com F´ = γ F, podemos dizer que, no caso de velocidades relativas tão baixas como a da 3ª questão (da ordem de 10– 2 4 m.s –1 ), as forças elétrica e 2 magnética são praticamente iguais. Pois v /c , na prática, é uma razão que pode se considerar nula, dada por de 10– 25 108 (10 4 m.s 1 ) 2 = ; e que resulta na ordem de grandeza (299.792.458m.s 1 ) 2 8,98755179x 1016 . Desse modo, o fator γ é praticamente igual a um, e as forças se igualam. Daí 156 também a citação de Feynman: “[...] para as pequenas velocidades que estamos considerando, as duas forças são iguais. Podemos dizer que, para pequenas velocidades, entendemos o magnetismo e a eletricidade apenas como “duas maneiras de olhar para a mesma coisa”.” (FEYNMAN; LEIGHTON; SANDS, 2008, p. 13–10). Isto nos aponta a profunda conexão entre o magnetismo e a eletricidade, ou seja, o fato de que um campo magnético estático não é absoluto, independente do referencial, assim como um campo elétrico estático; como aponta Feynman (2008), na própria natureza existe uma relação íntima entre estes campos. Com efeito, os dois tipos de campo dependem do referencial inercial, não sendo independentes, mas podendo ser tomados em conjunto, segundo Feynman (2008), como um único campo eletromagnético. Enfim, dizer que as forças F´ e F são iguais em ambos os referenciais de Feynman, é dizer que, do ponto de vista prático, podemos desprezar os efeitos relativísticos em sua experiência; assim, dois observadores inerciais distintos – um em S e outro em S´ – medirão praticamente o mesmo valor de força. Entretanto, embora o observador em S´ saiba que, na prática, sua minúscula velocidade (≈ 10– 4 m.s –1) pode ser desprezada, e o valor de força (em S´) pode ser calculado usando-se a expressão do valor de força magnética, ele também sabe que, na verdade, a força em S´ é elétrica (que, no baixo valor de velocidade relativa, se iguala à magnética de S). Isto equivale a dizer que estamos cientes do fato de que, do ponto de vista experimental, as duas forças concordam nestas pequenas velocidades – portanto, estas forças fornecem como que duas formas de perceber a mesma interação eletromagnética atrativa partícula-fio. Item (b): A equação relativisticamente correta do movimento é escrita por Feynman (2008) (no final da pág. 13–10), sendo dada por F = dp/dt; onde F não representa mais apenas a força magnética atuante no portador de carga em S, mas a força resultante numa partícula qualquer em determinado referencial inercial; e dp/dt é a derivada do vetor momentum relativístico da partícula em relação ao tempo do referencial em questão. Este vetor momentum, em três dimensões, pode ser definido por p = mv = mv (GAZZINELLI, 2009). Não v2 1 c2 precisamos desta equação nesta questão, mas é válido ressaltá-la para que o leitor perceba que as equações da Mecânica newtoniana precisaram ser reformuladas/corrigidas 157 relativisticamente, o que não foi necessário para o Eletromagnetismo clássico. Adiante, argumentaremos um pouco mais sobre este importante aspecto. Obtivemos a relação entre os valores das forças elétrica e magnética de Feynman (2008), F´ = γ F, a partir de expressões obtidas para estas. Mas, pela equação dt = γ dt´, e usando o momento relativístico da partícula de prova de Feynman, podemos obter a mesma relação entre forças. Repare que, ao considerarmos intervalos de tempo e variações nos valores de momento transversal da partícula (em S e S´) como infinitesimais, podemos também tomar as forças F´ e F como tendo praticamente iguais orientações. É bom destacarmos isto, pois a força magnética em certo ponto do espaço e instante de um referencial inercial (que age numa partícula carregada de sinal conhecido) é dependente da direção e sentido da velocidade da partícula em relação ao campo magnético naquele ponto e naquele instante de tempo. Logo, é fácil visualizar que em intervalos temporais não curtos (decorridos no referencial S) a direção (e também o valor) da força magnética F varia; porém, para nossos curtos infinitesimais dt e dt´, consideremos F e F´ com a mesma orientação. Assim, também desconsideramos o caráter vetorial da força e do momento, pois ambas as forças atuam somente ao longo da direção transversal ao fio, variando o momentum da partícula apenas desta componente. Já sabemos que os momentos transversos são iguais (py = py´) para uma mesma coordenada y = y´; então dpy = dpy´, e aplicando a equação do movimento relativisticamente correta no valor da força elétrica F´, temos que F´ = dp y ´ dt´ dp y dt dp y dt F (28) Onde fizemos dt´ = dt /γ e encontramos o valor de força magnética, que pode se representar por dp y dt = F. Na verdade, Feynman (2008) usou a equação F = dp/dt a fim de obter a igualdade dos momentos transversos (em S e S´) e concluir que os resultados físicos se compatibilizam. Provamos a igualdade destes momentos através de um cálculo, talvez mais convincente, utilizando uma expressão para o valor de uma componente de momento relativístico. Esta questão mostra-se útil para explorarmos um pouco a noção de que o Eletromagnetismo é compatível com a Teoria da Relatividade Especial, embora a Mecânica newtoniana não o seja – e as forças de Feynman (2008) se transformem na passagem de um 158 referencial para outro. Podemos vislumbrar isto constatando que as equações fundamentais da teoria eletromagnética clássica – usadas por Feynman no cálculo das expressões para os valores de campos e forças (B e F; E´ e F´), em seus respectivos referenciais – são a lei de Ampère da magnetostática e de Gauss da eletricidade. Estas leis, assim como as outras equações de Maxwell, não precisaram de reformulação/correção com o advento da Teoria da Relatividade Especial, diferentemente das leis da Mecânica newtoniana. Perceba, no texto de Feynman (2008), que as expressões obtidas para B e F, E´ e F´, provêm diretamente das leis eletromagnéticas fundamentais citadas anteriormente. É verdade que nas equações para a 1 força e campo elétricos do texto, F´ e E´, aparece o fator de Lorentz γ v2 1 c2 ; mas este não vem das equações do Eletromagnetismo mencionadas, mas sim da consideração do efeito de contração de Lorentz do fio (no referencial S´), que é “tomado emprestado” da Teoria da Relatividade Especial a fim de propiciar uma descrição eletromagnética (em S´) coerente com o arcabouço teórico do Eletromagnetismo e com o Princípio da Relatividade. Assim, é obtida uma expressão para a densidade de carga ρ´ – no referencial de repouso da partícula – que é diferente de zero e que possui o fator γ. Este fator, por conseguinte, surge na expressão do valor de força elétrica (repare a equação 13.29 de Feynman (2008)), e assim como foi feito no item (a) desta questão, os valores das forças são relacionados por F´ = γ F. Isto implica dizer que, em última instância, γ surge nesta relação porque vem da contração de Lorentz, e não porque este fator (ou outro termo/fator matemático qualquer) deva ser incluído em equações de Maxwell. Contudo, vimos que a mesma relação (entre forças) é obtida usando-se dp/dt (em y = y´) e também a previsão de dilatação temporal (aqui expressa por dt = γ dt´ ), o que nos leva ao último item desta questão. Em suma, o Eletromagnetismo se preserva, isto é, suas equações fundamentais (de Maxwell) são válidas em qualquer referencial inercial, sem necessidade de modificação quando há MRU relativo entre dois ou mais referenciais, inclusive em velocidades significativas em relação à c. Apesar disso, fica aqui evidente que as forças clássicas não são invariantes; no caso do Eletromagnetismo clássico, a força pode variar também em seu tipo (elétrica e/ou magnética). Item (c): O efeito relativístico, que pode ser utilizado na descrição da diferença entre as forças elétrica F´ e magnética F – que atuam na partícula elétrica nos referenciais inerciais S´ e S, 159 respectivamente –, é a dilatação do tempo. Já se enfatizou que o intervalo de tempo próprio (medido em um referencial inercial no qual dois eventos ocorrem na mesma posição) é o menor intervalo temporal entre estes eventos – considerando-se somente intervalos mensurados em referenciais inerciais. A relação entre intervalos de tempo foi escrita por nós como dt = γ dt´; onde se constata que dt´ representa o tempo próprio mensurado no referencial de repouso da partícula (S´). Portanto, dt representa o geralmente denominado intervalo de tempo relativo, pois não é medido no referencial próprio (ou de repouso) da partícula ou dos eventos – isto é, em referencial inercial no qual os eventos “estão em repouso” (ocorrem na mesma posição). Como imaginado na 7ª questão, o evento inicial de Feynman (2008) poderia ser a emissão de um elétron em processo nuclear ou atômico (ou por fonte qualquer) com velocidade inicial vo (paralela ao fio), no referencial S, igual à velocidade de arraste dos elétrons de corrente. Definiríamos os instantes deste evento, em S e S´, por t inicial = t´inicial = 0; e o evento final seria a detecção do elétron (em iguais coordenadas transversas y = y´) em ambos os referenciais, quando seu momento transversal variou dpy em S e dpy´ em S´. Como já provamos aqui, “[...] o momento transverso da partícula deve ser o mesmo em ambos os referenciais S e S´.” (FEYNMAN; LEIGHTON; SANDS, 2008, p. 13–10). Assim, também as variações deste momento são iguais (dpy = dpy´) após as forças F e F´ atuarem no elétron em seus respectivos referenciais inerciais, durante distintos intervalos de tempo dt e dt´ – a partir do evento inicial (instante zero). Ou seja: F dt = dpy F´ dt´ = dpy´ (29) Onde se desconsiderou o caráter vetorial das forças, pois ambas agem apenas transversalmente nos intervalos de tempo bem curtos. Repare que as equações 29 nada mais são do que outra forma de se expressar a lei (relativística) de movimento do elétron, em S e S´, assim como descrita em 28. Pela igualdade dos momentos transversais, vemos que F dt = F´ dt´; o que é escrito por Feynman (2008) de forma um pouco diferente no último resultado de seu texto. Podemos descrever a diferença entre F e F´ – através da dilatação temporal – ao analisarmos bem a igualdade F dt = F´ dt´; ambos os valores de força, tanto magnética F quanto elétrica F´, variam em função do tempo de seu respectivo referencial inercial. Isto se dá pelo fato de que os campos estáticos de Feynman não são uniformes; dessa maneira, os valores F e F´ também não o são, variando em função da distância r (que é a mesma para S e S´, pois é transversal) ao centro do fio. Em outras palavras, os valores de força F e F´ são 160 inversamente proporcionais à r, aumentando à medida em que o elétron se aproxima do fio; de tal modo que F (magnética) varia no decorrer do tempo t de S, e F´ (elétrica) varia no decorrer de t´ de S´. Recorde-se que, para que o intervalo temporal próprio dt´ (medido em S´) seja menor que o intervalo relativo correspondente dt (medido em S) – de acordo com dt´ = dt/ γ –, o ritmo do tempo t deve ser mais rápido do que o de t´. Isso implica que, a partir do evento inicial (quando o elétron é emitido com velocidade vo no referencial S), o valor de força magnética em S aumenta menos do que o valor de força elétrica em S´, para intervalos temporais correspondentes. Porém, o menor aumento da força magnética em S é compensado pelo maior tempo dt de atuação desta em S, ao passo que o maior aumento da força elétrica em S´ se compensa pelo menor tempo dt´ de atuação desta neste referencial. E, segundo Feynman (2008), isto acontece após curtos e correspondentes intervalos de tempo dt e dt´ (em nossa notação), de tal forma que a partícula negativa tenha iguais momentos transversos nos dois referenciais. Então, para o evento final (detecção do elétron) – que ocorre em igual coordenada y = y´ –, o valor de F´ tem maior módulo que F, de acordo com F´ = γ F. Entretanto, a força elétrica age durante o tempo próprio dt´, o menor tempo entre os eventos, enquanto a força magnética age por um maior intervalo de tempo relativo dt. Enfim, para v2/c2 na ordem de 10 –25 , a razão aproximada para a bem pequena velocidade relativa entre os referenciais inerciais (v ≈ 10 –4 m.s – 1 ), como calculada na 3ª questão – valor típico de velocidade de arraste (ou de migração) para elétrons de condução –, o fator γ é igual a um (ou melhor, tende a um). Isto dificulta o uso de um exemplo numérico nesta ordem de grandeza (ou próxima). Mas reforça a afirmação de Feynman (2008) sobre o fato de que, na prática, a força magnética (em S) e a força elétrica (em S´) – na experiência por ele pensada – são iguais. Em suma, o texto de Feynman (2008) permite-nos vislumbrar a íntima conexão entre a Teoria da Relatividade Especial, o magnetismo e a eletricidade, pois, sob a ótica da Teoria da Relatividade Especial e suas previsões, o físico demonstra o vigoroso vínculo entre as denominadas força elétrica e força magnética. Os distintos intervalos de tempo, medidos cada qual em seu sistema inercial, compensam a diferença entre as forças do experimento de Feynman, preservando resultados físicos compatíveis com o Eletromagnetismo. Para alcançar estes resultados, Feynman utiliza a Relatividade Especial, uma teoria coerente com o Eletromagnetismo clássico. Nas palavras de Gazzinelli: “[...] a eletrodinâmica de Maxwell é uma teoria relativisticamente correta, [...]. Ela não exige modificações, [...] já tem, de fato, uma formulação relativística.” (GAZZINELLI, 2009, p. 101). 161 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS DO MATERIAL E SUPLEMENTO BORDENAVE, Juan D.; PEREIRA, Adair M. Estratégias de ensino-aprendizagem. 33. ed. Petrópolis: Vozes, 2015. CALIFORNIA INSTITUTE OF TECHNOLOGY. The Feynman Lectures on Physics. Disponível em: <http://www.feynmanlectures.caltech.edu/>. Acesso em: 17 jun. 2015. EINSTEIN, Albert. A Teoria da Relatividade Especial e Geral. Rio de Janeiro: Contraponto, 1999. 136 p. EINSTEIN, Albert. O ano miraculoso de Einstein: cinco artigos que mudaram a face da física. 2. ed. Rio de Janeiro: Ed. UFRJ, 2005. 224 p. FEYNMAN, Richard P.; LEIGHTON, Robert B.; SANDS, Matthew. Lições de física de Feynman. ed. definitiva. Porto Alegre: Bookman, 2008. v. 2. Reimpressão 2009. FEYNMAN, Richard P.; LEIGHTON, Robert B.; SANDS, Matthew. The Feynman Lectures on Physics. Reading, Massachusetts: Addison-Wesley, 1964. v. 2. Second printing. __________, Richard P. Sobre as leis da física. Rio de Janeiro: Contraponto: Ed. PUC-Rio, 2012. Título original: The Character of Physical Law. GAZZINELLI, Ramayana. Teoria da relatividade especial. 2. ed. São Paulo: Blucher, 2009. RESNICK, Robert; HALLIDAY, David; KRANE, Kenneth S. Física. 5. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2007. v. 2. SERWAY, Raymond A.; JEWETT, John W., Jr. Princípios de física: eletromagnetismo. São Paulo: Cengage Learning, 2008. v. 3. 2. reimpr. da 1. ed. de 2004. TAYLOR, Edwin F.; WHEELER, John Archibald. Spacetime physics introduction to special relativity. 2nd ed. New York: W. H. Freeman and Company, 1992. Eleventh printing. 162 163 APÊNDICE B – Conjunto de respostas recebidas para o questionário (formulário) avaliativo elaborado Imagem 1 – Frente do questionário de A Fonte: Arquivo pessoal 164 Imagem 2 – Verso do questionário de A Fonte: Arquivo pessoal 165 Imagem 3 – Frente do questionário de B Fonte: Arquivo pessoal 166 Imagem 4 – Verso do questionário de B Fonte: Arquivo pessoal 167 Imagem 5 – Frente do questionário de C Fonte: Arquivo pessoal 168 Imagem 6 – Verso do questionário de C Fonte: Arquivo pessoal 169 Imagem 7 – Frente do questionário de D Fonte: Arquivo pessoal 170 Imagem 8 – Verso do questionário de D Fonte: Arquivo pessoal