CEFAC CENTRO DE ESPECIALIZAÇÃO EM FONOAUDIOLOGIA CLÍNICA AUDIOLOGIA OTITE MÉDIA EM CRIANÇAS: Incidência e Conseqüências SIMONE FERREIRA Campo Grande 2000 CEFAC CENTRO DE ESPECIALIZAÇÃO EM FONOAUDIOLOGIA CLÍNICA AUDIOLOGIA OTITE MÉDIA EM CRIANÇAS: Incidência e Conseqüências Monografia de conclusão de Curso de Especialização em Audiologia, Orientadora: Mirian Goldenberg SIMONE FERREIRA Campo Grande 20 2 RESUMO O objetivo desta pesquisa teórica foi estudar as conseqüências da otite média em crianças na idade escolar e se o nível sócio-econômico interfere na incidência desta patologia. Para tanto, foi pesquisado a anátomo-fisiologia da audição, a etiologia, incidência, sintomatologia e conseqüências. Através desta pesquisa foi possível destacar alguns aspectos interessantes, pois aproximadamente 80% das crianças nas idades pré-escolar e escolar sofrem uma perda auditiva temporária durante o ano letivo. De acordo com um levantamento realizado no Centro de Controle e Prevenção de Doenças nos Estados Unidos, constatou-se que 24,5 milhões de visitas a médicos tiveram como principal causa a otite média. As estatísticas comprovam que 76,95% de todas as crianças apresentaram pelo menos um caso de otite antes dos 6 anos de idade, sendo que 50% tiveram um caso antes de 1 ano e 75% antes de 2 anos. Outros fatores apontados pelos autores como de risco para uma criança ser propensa à otite, são: ser do sexo masculino, pertencer a uma classe de nível sócioeconômico baixo, ter história de otite média recorrente em irmãos, infecção precoce, não ter recebido aleitamento materno, estar em creche e estar exposto à fumaça. Este trabalho poderá contribuir para a prevenção e atendimento as crianças na idade pré-escolar e escolar com otite média, esclarecendo os profissionais de diversas áreas que atuam com esta clientela. Conscientizando os pais e a sociedade como um todo, com o intuito de prevenir e amenizar o declínio do desempenho comunicativo e social destas crianças. 3 SUMARY The objective of this theoretical research was to study the consequences of the otitis in children in the school age and if the socieconomic level interferes in the incidence of this pathology. For so much, it was researched the anatom-phisiology of the audition, the etiology, symptomatology and consequences. Through this research, it was possible to detach some interesting aspects, because approximately 80% of the children in the preschool and scholar ages suffer a temporary auditory loss during the school yer. In agreement with a gathering accomplished in the control and Prevention of Diseases Center in the United States, it was verified that 24,5 million visits to doctors had as main cause the medium otitis. The statistics show that 76,95% of all the children presented at least one case of otitis before 6 years. 50% had a case before on year and 75%, before two years. Other factors pointed by the authors as of risk are: to be of the masculine sex, to belong to a class of low socioeconomic level, to have history of medium otitis in siblings, precocious infection, not to have nursing, to be in nurseries and to be exposed to the smoke. This work can contribute to the prevention and attendance to the children in the preschool and scholar ages with medium otitis, clarifying professionais from several areas that act with this clientele. Becoming aware parents and the society as 4 a whole, in order to prevent and to soften the decline these children’s talkative and social acting. 5 Dedico este trabalho a minha filha Laura, por ensinar-me o quanto é maravilhoso ser mãe. 6 Dedico este trabalho à meus pais por terem me incentivado na formação profissional e me orientado a sempre buscar os melhores ensinamentos. 7 Dedico este trabalho aos pacientes que me motivaram a pesquisar sobre este assunto. Agradeço aos professores do CEFAC que transmitiram o seu conhecimento e em especial a professora Mirian Goldenberg, por ter nos inspirado a arte da pesquisa e orientado na execução deste trabalho. 8 Agradeço as minhas colegas de curso que com carinho e amizade me incentivaram neste estudo, pois a caminhada se faz mais rápida quando a compartilhamos com alguém. “Não seja impaciente! Não tenha pressa em chegar ao fim. Deixe que o tempo amadureça os frutos, de modo que possa colhe-los amadurecidos. Caminhe com segurança e constância, porque tudo nos chegará na hora exata e mais oportuna Os frutos amadurecidos à força não são tão saborosos quanto os que amadurecem naturalmente Saiba esperar com paciência e não desanime”. (236p. PASTORINO C. T.) 9 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ............................................................................................................................... 1 2. DISCUSSÃO TEÓRICA ..................................................................................................................3 2.1. Anatomia e Filosofia da Audição....................................................................... 3 2.1.1. Orelha Externa ............................................................................................ 4 2.1.2. Orelha Média............................................................................................... 5 2.1.3. Orelha Interna ............................................................................................. 6 2.2. Classificação das Alterações Auditivas............................................................. 8 2.3. Otite Média........................................................................................................ 9 2.3.1. Definição ..................................................................................................... 9 2.3.2. Etiologia .................................................................................................... 11 2.3.3. Diagnóstico ............................................................................................... 12 10 2.3.4. Sintomatologia .......................................................................................... 13 2.3.5. Tratamento................................................................................................ 14 2.3.6. Classificação ............................................................................................. 15 2.3.6.1. Otite Média Aguda ................................................................................. 15 2.3.6.2. Otite Média Crônica................................................................................ 19 2.3.6.3. Otite Média Crônica Colesteatomatosa.................................................. 21 2.4. Incidência........................................................................................................ 23 2.5. Conseqüências ............................................................................................... 26 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS ..........................................................................................................30 4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..............................................................................................32 11 1. INTRODUÇÃO A linguagem é um dos aspectos importantes do desenvolvimento da criança, e sua aquisição mantêm íntima relação com múltiplos fatores, entre os quais destacam-se o biológico, o afetivo e o social. Da adequada condições desses fatores e de sua interação será estabelecido este processo que entende-se como comunicação. Para aprender a falar, o ser humano precisa ter perfeitos órgãos sensoriais, motores e de articulação, além de um processo normal de evolução do sistema nervoso. É a partir desses elementos que ele desenvolve uma linguagem correta, clara e lógica, imprescindível à sua integração social. Tendo em vista a importância da linguagem, fica fácil avaliar a problemática vivida por indivíduos portadores de alguma perda parcial ou total nessa área, produzindo um impacto devastador na sua vida, tornando-o desajustado ao meio em que vive e provocando reflexos na sua aprendizagem. Um dos sentidos que possibilita que isto ocorra adequadamente é a audição e para tanto é necessário a integridade do sistema auditivo. A audição é uma sensação fundamental a vida, pois é a base da comunicação humana. O órgão responsável pela audição é o ouvido, o qual encontra-se localizado na intimidade do osso temporal e é composto pela orelha externa, orelha média e orelha interna. Dessas partes, a mais importante é a última, pois sua porção anterior, a cóclea, abriga o órgão de corti, que é uma estrutura mecano-receptora essencial à audição. Portanto, o objetivo desta pesquisa é estudar a fisiologia da audição, os problemas resultantes por otites e sua incidência em criança, afim de poder contribuir com este estudo para a conscientização e orientação da população para maior controle dos fatores etiológicos aos distúrbios da audição, pois a integridade deste sistema é importantíssima para o desenvolvimento normal da fala e da linguagem. Esta pesquisa teve como principal motivação o desejo de contribuir para a prevenção de problemas auditivos ocorridos na infância, a fim de que estas crianças tenham uma melhor qualidade 1 de vida, pois a integridade do sistema auditivo, constitui um pré-requisito para a aquisição e desenvolvimento normal da linguagem. Tendo em vista que os primeiros anos de vida de uma criança são críticos para o desenvolvimento da fala e da linguagem, a prevenção ou a identificação de qualquer perda auditiva nesta fase é importante. De acordo com Santos, citado por Schochat (1996), aproximadamente 80% (oitenta por cento) das crianças nas idades pré-escolares e escolar sofreram uma perda auditiva temporária durante o ano escolar. Através de um levantamento realizado no Centro de Controle e Prevenção de Doenças nos Estados Unidos, constatou-se que 24,5 milhões de visitas à médicos teve como principal causa a otite média. Estes dados justificam o interesse das áreas, dentre elas a Fonoaudiologia, em estudar este assunto. Através da divulgação do conhecimento adquirido teoricamente, será possível colaborar para uma melhor conscientização dos pais, professores, profissionais afins e a sociedade como um todo, com o intuito de propiciar uma melhor qualidade de vida destes indivíduos. 2 2. DISCUSSÃO TEÓRICA O desenvolvimento normal da linguagem, possibilita a criança organizar e entender o mundo que a rodeia, interagir com o meio, adquirir conhecimentos, compreender e transmitir pensamentos. Para que esta aprendizagem do processo da comunicação ocorra é necessário que certas condições básicas estejam íntegras, como os fatores biológicos, afetivos e social. A criança aprende ao receber informações através de seus sentidos, portanto, a integridade do sistema auditivo é essencial para aquisição da fala e da linguagem. 2.1. Anatomia e Filosofia da Audição A audição é uma sensação fundamental a vida, pois é a base da comunicação humana. Azevedo, citado por Schochat (1996), relata que a integridade anátomo-fisiológica do sistema auditivo tanto em sua porção periférica como central, constitui um pré-requisito para a aquisição e desenvolvimento normal de linguagem. Durante o primeiro ano de vida ocorre o processo de maturação do Sistema Auditivo Central. Concomitantes com a maturação da função auditiva estão o desenvolvimento da fala e as habilidades da linguagem (Santos, 1996). O órgão responsável pela audição é o ouvido, o qual encontra-se localizado na intimidade do osso temporal e divide-se em orelha externa, orelha média e orelha interna. Santos e Russo (1991) referem que o ouvido tem como funções principais o equilíbrio e a audição. Tanto um papel quanto o outro desempenhados por este órgão, são de vital importância para o homem, pois o primeiro possibilita a sua locomoção e o segundo para que possa desenvolver sua linguagem e realizar adequadamente o processo da comunicação oral. 3 2.1.1. Orelha Externa A orelha externa, segundo Costa, Cruz e Oliveira (1994), é formada pelo pavilhão e pelo conduto auditivo externo. O pavilhão é formado por cartilagens cobertas por pele e sua finalidade é coletar as ondas sonoras e dirigi-las para o meato auditivo externo. As principais funções desse meato auditivo externo são: proteção e ressonância sonora. A proteção é exercida pela cera produzida por glândulas ceruminosas da pele do meato. Santos e Russo (1991) referem que o conduto auditivo externo tem como função principal conduzir o som até a membrana timpânica. Serve também para estabelecer comunicação entre o ouvido médio e o meio externo. O meato auditivo externo tem 2.5 cm de comprimento e termina na membrana timpânica. A membrana timpânica encontra-se na porção final do conduto auditivo externo, separandoo do ouvido médio. É uma estrutura delgada, côncava, semitransparente, tem a forma de um cone cujo ápice está voltado para dentro do ouvido médio. Mede aproximadamente 1,5 cm de diâmetro e está dividida em duas partes: uma tensa, que ocupa a maior área e é constituída por quatro camadas de tecido e a parte flácida ou membrana de Scharapnell, que ocupa a porção mais superior da membrana e é constituída por duas camadas de tecidos. Está firmemente fixada a parede do conduto auditivo externo por um anel de tecido fibroso denominado anel timpânico. Segundo Hungria (1988), a membrana do tímpano é comparável à placa rígida de um microfone que funciona por pressão, pois recebe vibrações acústicas de um só lado, transmitindo-as à cadeia ossicular. Além de sua função vibratória, a membrana do tímpano desempenha também o papel de anteparo protetor da janela redonda, de modo que as ondas sonoras atingem a membrana desta janela com a pressão acústica reduzida ao mínimo e em oposição de fase em relação as ondas sonoras que chegam à janela oval. 4 2.1.2. Orelha Média Santos e Russo (1991) descrevem que a cavidade timpânica ou orelha média é um espaço dentro da porção petrosa do osso temporal preenchido por ar, com o formato irregular e medindo, no seu diâmetro vertical, 15mm, e na horizontal, 6mm, apresenta seis paredes que são praticamente paralelas entre si, dando a esta cavidade um formato de cubo alongado. Costa, Cruz e Oliveira (1994) relatam que na orelha há três elementos importantes para a transmissão sonora: a trompa de Eustáquio, os músculos timpânicos e o sistema timpânico ossicular. A trompa de Eustáquio, segundo os mesmos autores, é o canal que comunica a nasofaringe com a orelha média, permitindo a entrada de ar nessa cavidade e igualando as pressões do lado externo e interno, deixando a membrana timpânica livre para vibrar. A maioria das infecções da orelha média derivam de infecções nasais que se propagaram pela trompa de Eustáquio. Os músculos timpânicos são: o músculo tensor do tímpano e o músculo do estribo. Quando o ouvido recebe sons de grande intensidade, estes músculos se contraem, aumentando a resistência a transmissão sonora de sons graves, havendo uma queda de aproximadamente 30 db de intensidade devido à maior rigidez da cadeia ossicular, protegendo assim o ouvido interno e as células do órgão de corti contra lesões. O sistema tímpano-ossicular, de acordo com Costa, Cruz e Oliveira (1991), é formado pela membrana timpânica, martelo, bigorna e estribo, de tal modo interligados que transmitem as vibrações da membrana timpânica à janela oval. Este sistema tímpano-ossicular é um transformador de energia, cuja finalidade é igualar as impedâncias do ouvido médio e interno para uma transmissão sonora efetiva, que ocorre através de dois mecanismos: hidráulico e de alavanca. Os efeitos hidráulicos e de alavanca, conjunta e aumentam a pressão sonora de 22 vezes, equivalente a um aumento de 30 db, permitindo assim, que toda a energia sonora que chega à membrana timpânica atinja a base do estribo, perilinfa e o órgão de Corti. 5 2.1.3. Orelha Interna A orelha interna, de acordo com Hungria (1988), é o segmento do aparelho auditivo em que a vibração sonora se transforma em estímulo nervoso específico ao nível do órgão de Corti de onde é conduzido aos centros corticais da audição, em que se consuma o fenômeno consciente da sensação sonora. Enquanto o ouvido externo, o ouvido médio e os líquidos labirínticos constituem o aparelho transmissor das ondas sonoras, o órgão de Corti é o aparelho receptor e analisador do som. Santos e Russo (1991) relatam que o ouvido interno está contido na porção petrosa do osso temporal; constitui-se por uma série de canais e passagens dentro do osso que recebeu o nome de labirinto ósseo. O labirinto ósseo apresenta as seguintes porções: vestíbulo, cóclea e três canais semicirculares: aqueduto coclear, aqueduto vestibular e meato acústico interno. É preenchido por um líquido denominado perilinfa, que apresenta maior concentração de sódio. Dentro do labirinto ósseo encontramos uma série de ductos membranosos onde estão alojadas as estruturas sensoriais de recepção dos estímulos auditivos e posturais e está também preenchido por um líquido denominado endolinfa, que apresenta maior concentração de potássio. O labirinto membranoso é constituído pelas seguintes estruturas: ducto e saco endolinfático, sáculo, utrículo, ductos semicirculares e ducto coclear. A cóclea, segundo as mesmas autoras, se constitui de um cone achatado, formado por 2 ou 3 voltas enroladas em torno de um eixo ósseo central denominado modíolo. Dentro do modíolo encontra-se vasos que irrigam a cóclea, as fibras nervosas do ramo coclear, as fibras nervosas do nervo vestíbulo-coclear e o gânglio espiral. Esse osso imite projeções ósseas ao seu redor, que recebe o nome de lâmina espiral óssea. É dividida pelo labirinto membranoso em três partes ou rampas: timpânica, média ou coclear e vestibular. As rampas timpânicas e vestibular são preenchidas por perilinfa e desempenham um papel importante na transmissão mecânica da energia sonora para as estruturas sensoriais contidas na rampa média. Estabelecem contato no ápice da cóclea em uma região denominada helicotrema, permitindo que as ondas produzidas pelo estribo na perilinfa do vestíbulo possam ser transmitidas para a rampa vestibular e timpânica. 6 A rampa vestibular está em contato direto com o vestíbulo, enquanto que a rampa timpânica está em contato com o ouvido médio através da membrana da janela redonda. O ducto coclear ou rampa média se encontra em contato direto com a parede óssea da cóclea, cápsula ótica ou labirinto ósseo, ligando a lâmina espiral óssea ao ligamento espiral. E, dessa forma delimitando o espaço da rampa timpânica, encontra-se a membrana basilar. Superiormente a rampa média é delimitada pela membrana de Reissner, que separa o ducto coclear da rampa vestibular. Segundo Santos e Russo (1991), é sobre a membrana basilar que se encontra o órgão sensorial da audição ou órgão de Corti, que é constituído pelas células ciliadas sensoriais (internas e externa) e por células de sustentação. Sobre as células ciliadas internas e externas encontra-se uma membrana gelatinosa que recebe o nome de membrana tectória e tem um papel importante na estimulação dos ciclos destas células toda vez que a onda sonora atinge o ducto coclear. Costa, Cruz e Oliveira (1991) acrescentam que as células ciliadas externas constituem o amplificador coclear, sendo importantes no mecanismo de amplificação do estímulo para determinar o funcionamento das células ciliadas internas, que seriam as unidades receptoras e codificadoras cocleares e teriam como papel importante na seletividade frequêncial da cóclea. Os mesmos autores descrevem o processo de transdução mecano-elétrica do seguinte modo: o som determinaria a oscilação da membrana basilar alternadamente em direção à rampa superior e inferior da cóclea, a membrana tectorial vai se colocar com padrão diferente da membrana basilar, estes descolamentos destas membranas determinarão o aparecimento de forças tangenciais sobre os ciclos das células ciliadas externas provocando a inclinação deles, pois estão em contato com a membrana tectorial. Essa inclinação dos cílios determina a abertura dos canais de potássio com conseqüente entrada de potássio na célula e essa para despolarização determina o aparecimento de fenômenos elétricos nas células ciliadas. Em seguida, há liberação dos neurotransmissores e a formação de uma mensagem sonora codificada em impulsos elétricos, que é transmitida ao sistema nervoso central pelo nervo acústico. Costa, Cruz e Oliveira (1991) relatam que as fibras aferentes primárias que vêm do gânglio espiral do órgão de Corti chegam ao núcleo coclear ventral e dorsal, fazendo sinapse nesses núcleos do bulbo. Do núcleo coclear ventral, fibras nervosas dirigem-se para o complexo olivar dos dois lados, 7 onde outra sinapse ocorre. O complexo olivar de cada lado recebe fibras dos dois ouvidos. Nesse nível, portanto, já pode ocorrer comparação das características sonoras que chegam aos dois ouvidos, para detecção da direção do som. Do núcleo coclear dorsal partem fibras que se dirigem para o lado oposto fazendo sinapse no núcleo do lemnisco lateral. Deste parte fibras que se projetam para o colículo inferior, sendo algumas delas cruzadas. Do colículo inferior as fibras passam ao corpo geniculado medial sem cruzar e daí ao córtex auditivo no lobo temporal. Na cadeia neoronal das vias auditivas, da cóclea ao colículo inferior, a informação sensorial sofre um processamento crescente, pela sintonia das unidades nervosas, pela maior complexidade das respostas e pela maior participação de informações do ouvido contralateral. As vias auditivas enviam projeções ao sistema reticular ativador e ao cerebelo. (Costa, Cruz e Oliveira, 1991) 2.2. Classificação das Alterações Auditivas Azevedo, citado por Schochat (1996), refere-se que os distúrbios da audição, podem interferir na aquisição e desenvolvimento da linguagem alterando o desenvolvimento social, psíquico e educacional da criança. Northern e Downs (1989) referem que é urgente atacar os problemas auditivos das crianças, pois a prevenção da perda auditiva infantil protege o direito das crianças à sua condição humana essencial, que repousa sobre a função ótima da linguagem. As perdas auditivas, de acordo com Santos e Russo (1991), podem ser divididas em: condutivas, neurosensoriais, mistas, centrais e funcionais. Segundo as mesmas autoras, são consideradas perdas condutivas aquelas que resultam de patologia que atingem a orelha externa e ou média, reduzindo, dessa forma, a quantidade de energia sonora a ser transmitida para o ouvido interno. 8 As perdas neurosensoriais são aquelas que resultam de distúrbios que comprometem a cóclea ou o nervo coclear (VII par). As perdas auditivas mistas são aquelas onde aparecem componentes condutivos e neurosensoriais em um mesmo ouvido. Por perda auditiva central entende-se aquela que atinge a via auditiva central, ou seja, a porção do nervo coclear e de suas conexões, que se encontram entre o núcleo coclear e o córtex do lobo temporal. As perdas auditivas funcionais são aqueles pacientes cujo comportamento auditivo, não corresponde aos limiares tonais apresentados. 2.3. Otite Média A otite média, em suas diferentes formas e manifestações, tem sido muito pesquisadas especialmente quando se refere a populações infantis, consideradas como de maior risco para esta patologia. 2.3.1. Definição Santos, citado por Schochat (1996), refere que a otite média é uma da doenças infecciosas mais comuns nas crianças É definida como uma inflamação da orelha média que pode ser causada por diversos fatores: infecção (viral ou bacteriana), disfunções da tuba auditiva, depressão do estado imunológico, alergias, problemas ambientais e, em alguns casos, problemas sociais. 9 A maior incidência de otite média ocorre em crianças pequenas e bebês, isto pode ser explicado pela imaturidade do sistema imunológico e também pela imaturidade estrutural e funcional da tuba auditiva. Para Kirk e Gallagher (1991), a otite média refere-se a infecções que provocam acúmulo de fluído no ouvido médio. Se a condição for crônica ou não for tratada, pode causar perdas auditivas de leves a moderadas, pois a condução do som através do ouvido médio é perturbada. Segundo Costa, Cruz e Oliveira (1994), a otite média é definida como um processo inflamatório da fenda auditiva e representa uma das doenças infecciosas mais prevalentes, constituindo-se em um problema de saúde pública de caráter mundial. O impacto sócio e econômico dessa afecção é imenso devido ao processo inflamatório em si, ao comprometimento do estado geral e à perda funcional auditiva, reversível ou não, que quase sempre carrega consigo. Hungria (1998) complementa que as otite médias, são desencadeadas, na sua quase totalidade, em virtude de infecções das fossa nasais, cavidades sinusiais, paranasais e rinofaringe, propagadas ao ouvido médio através da tuba auditiva ou trompa de Eustáquio, e excepcionalmente, podem decorrer de perfurações traumáticas da membrana do tímpano através do meato acústico externo ou de infecções hematogênicas. Katz (1989) refere que a otite média aguda freqüentemente está associada à infecção respiratória, que ascende pela tuba auditiva. As bactérias que mais comumente causam otite média aguda são estreptococos, pneumococos ou heamophilus influenzae. 10 Northern e Downs (1989) dividem a otite média em categorias gerais que são: otite média sem efusão, com efusão e com perfuração da membrana timpânica. Podem ser classificadas em aguda (o –21 dias), subaguda (de 22 dias à 8 semanas) e crônica (mais de 8 semanas). Na otite média com efusão ou na otite média com perfuração, o fluído ou secreção pode ser caracterizado como seroso, purulento ou mucosos. 2.3.2. Etiologia Quanto à etiologia, os mesmos autores referem que podem ser isoladas bactérias na secreção do ouvido médio em até 80% dos casos, sendo que o streptococus pneumonie é o agente etiológico mais comum em todas as faixas etárias, 30 à 40% dos casos, haemophilus influenzae é responsável por 20% dos casos, e outras bactérias são responsáveis por uma parcela menor dos casos de otite média aguda. Santos e Russo (1991) referem que a causa básica da otite média aguda é a quebra deste mecanismo fisiológico, e isto se inicia com a disfunção da tuba auditiva, causada por fatores diversos como: adenóides hipertrofiados, reações alérgicas, obstrução nasal, infecções das vias aéreas superiores e outros. Para Northern e Downs (1989), a disfunção da trompa de Eustáquio tem sido considerada como fator significativo no desenvolvimento da otite média. 11 2.3.3. Diagnóstico O diagnóstico, segundo as autoras, baseia-se em manifestação clínica, exames físicos da membrana timpânica, possivelmente impedânciometria e audiometria de rotina. Segundo Duncan, Schmidt e Giugliani (1996), o diagnóstico é feito por meio da otoscopia. Na otite média aguda, a membrana timpânica encontra-se alterada, podendo haver hiperemia, opacidade e abaulamento, com diminuição ou ausência aneumático, é possível verificar a mobilidade do tímpano e sua diminuição indica presença de líquido no ouvido médio ou pressão anormal do mesmo. O abaulamento da membrana timpânica é sinal mais indicativo de otite média aguda supurada. A otite média aguda, de acordo com os mesmos autores, se não tratada adequadamente, pode trazer complicações passíveis de seqüelas. Entre as complicações incluem-se perfuração da membrana timpânica, mastoidite, meningite, abcessos cerebral, labirintite, colesteatoma, paralisia do nervo facial e tromboflebite cerebral. Com o uso adequado da terapia antimicrobiana, a maioria das complicações supurativas é rara. A perda da audição, temporária ou persistente, é uma das seqüelas mais prevalentes. Existe uma preocupação avante aos atrasos de linguagem nas crianças que apresentam episódios de otite no período crítico de aquisição da linguagem. Costa, Cruz e Oliveira (1994) referem que o diagnóstico da otite média aguda é especialmente fácil em adultos, em crianças pequenas e recém-nascidas às vezes fica muito difícil, devido as dificuldades anatômicas e a falta de colaboração 12 das crianças. No adulto, a história é sempre clara e específica, variando os sintomas de acordo com a forma clínica ou estágio da doença. 2.3.4. Sintomatologia Conforme estudo realizado foi observado que a otalgia, autofonia e hipoacusia são os sintomas mais comuns que podem aparecer isolados ou em conjunto, precedidos ou concomitantes com infecções respiratórias da otite média aguda. Os sintomas específicos da otite média, segundo Northen e Downs (1989) são: otalgia, prurido ou dor em pontadas, otorréia, hipoacusia e perturbações do equilíbrio. E citam como sintomas sistêmicos: febre, sono, agitação, irritabilidade e algum desconforto. Na criança, dependendo da idade, as queixas podem não ser tão específicas, aparecendo em forma de febre, irritabilidade, choro intenso ou moderando, anorexia, diarréia e vômitos. Em alguns casos, a criança ao mamar deixa subitamente o seio ou a mamadeira em razão de dor à sucção e à deglutição. Otorréia pode-se seguir ao quadro acima ou aparecer inesperadamente e significa quase sempre perfuração timpânica com drenagem de material do ouvido médio. Hungria (1988) complementa a sintomatologia referindo que o quadro de otite média aguda pode evoluir e se curar sem que se verifique perfuração da membrana do tímpano, como também, pode verificar-se evolução no sentido de perfurar a membrana timpânica, constituindo a otite média aguda simples perfurada, que a dor é mais intensa, com irradiações para a mastóide e região temporal, com 13 freqüência acompanhada de pulsações auriculares sincrônicas com os batimentos cardíacos, reveladoras de empiema da caixa de tímpano. Finalmente, há indícios cada vez mais seguros de que a otite média prejudica o desenvolvimento das habilidades cognitivas das crianças, alterando negativamente seu comportamento. 2.3.5. Tratamento Quanto ao tratamento da otite média aguda, Hungria (1988) refere que consiste em aplicações do calor úmido e brando sobre o ouvido e analgésicos, ao mesmo tempo em que se deve recomendar ao paciente para não assoar o nariz com força, de modo a evitar agravações da otite e repercussão dolorosa no interior do ouvido. Em alguns casos também é indicada a paracentese na metade inferior da membrana timpânica de modo a precipitar a drenagem de exsudatos, retidos sob pressão no interior da caixa do tímpano. No lactante, faz-se sempre a paracentese sob controle microscópico, antibióticos, podem se fazer necessário quando há temperatura elevada, dor intensa e agressão ao estado geral. Northern e Downs (1989) presumem cinco procedimentos usados atualmente na prevenção da otite média: adenoideotomia acompanhada ou não de amigdalectomia, profilaxia antimicrobiana; uso de timpanostomia com colocação de tubo, reduziu significativamente o número de casos de otite média purulenta; uso liberal da miringotomia como tratamento adjunto aos antimicróbicos e a administração de vacina antipneumocócica polivalente. 14 Kirk e Gallagher (1991) referem que não se deve neglicenciar o tratamento imediato da otite média e a avaliação cuidadosa na fase pré-escolar no caso de suspeita de perda auditiva. 2.3.6. Classificação De acordo com o estudo realizado foi possível observar diversas classificações da otite média. 2.3.6.1. Otite Média Aguda Segundo Costa, Cruz e Oliveira (1994), o “Committee on Definitionand Classification of Otitis Média”, procura uniformizar a classificação da otite média aguda e é ela que será tomada como base: otite média aguda sem efusão e com efusão. Na otite média aguda sem efusão ou não supurativa existe um processo inflamatório da mucosa do ouvido médio, porém, sem formação de nenhuma coleção líquida na caixa timpânica, seja serosa, mucoide ou purulenta. Pode advir de uma obstrução tubária com ou sem participação de agente infeccioso viral ou bacteriano. A sintomatologia pode limitar-se a uma sensação de plenitude auricular ou otalgia mais ou menos intensa e em geral, é coincidente com infecções respiratórias, especialmente virais, como a gripe. A otoscopia mostrará maior ou menor hiperemia da membrana timpânica com mobilidade normal ou revelando discreta espessamento. 15 Essa forma clínica pode curar espontaneamente ou evoluir para um quadro de otite média aguda com efusão na forma serosa ou purulenta. Não deve existir um tratamento padronizado para tal situação. A otite média aguda com efusão, segundo os mesmos autores, pertence à patologia desse grupo a presença de coleção líquida na caixa timpânica: serosa, supurativa ou necrosante. A otite média aguda serosa caracteriza-se pela presença de fluído na caixa timpânica com aspecto seroso, transparente e com freqüência citrino. É tipicamente iniciada por uma obstrução tubaria. A queixa principal é de plenitude auricular, autofonia e freqüentemente hipoacusia. Esses sintomas costumam melhorar com a mudança de posição da cabeça do paciente por mobilização do fluído para fora do miolo da janela redonda, que na postura supina fica ocupada. A otoscopia pode mostrar aspectos diferentes da membrana timpânica, ou seja, opaca; retraída e com mobilidade diminuída à otoscopia pneumática. A impedânciometria mostra uma curva timpanométrica plana com ou sem a presença de reflexos estapedianos. Em geral curam espontaneamente quando a infecção respiratória desaparece, ou pode persistir exigindo auxílio terapêutico. O tratamento desse tipo de condição é controvertido. Para Santos, citado por Schochat (1996), a presença de otite média secretora ou serosa pode resultar em audiometrias que variam de 0 à 55 DBNA. A autora refere que a criança pode ser considerada um ouvinte normal ou apresentar uma perda leve à moderada e que a perda condutiva, mesmo leve, pode produzir uma sensação de abafamento do som o que não ocorre na perda auditiva neurossensorial do mesmo grau. Esta alteração na qualidade da audição da criança 16 faz com que ela, além de sentir dificuldade para ouvir, tenha dificuldade para perceber a riqueza de detalhes que uma informação pode trazer. Segundo Sebastian (1986), a otite média secretora ou serosa, é comum entre os 4 e 10 anos, ainda que exista nas demais idades, porém em menos proporção. Refere que a audiometria tem muita importância nestes casos. Podem ser crianças com doenças de ouvido vagas e repetidas, com queda da audição, podendo encontrar hipoacusia ao redor de 40 à 45 db. Na impendânciometria indica curva tipo C ou B, quando existe também um problema da tuba auditiva. A otite média aguda supurativa, segundo Costa, Cruz e Oliveira (1994), se caracteriza pela presença de pus na caixa timpânica por contaminação bacteriana, com grandes alterações da mucosa do ouvido médio. Pode instalar-se rapidamente, em geral, no decorrer de uma infecção respiratória ou ser parte de uma seqüência das formas anteriormente citadas. Na criança pode aparecer de forma surpreendente pouco sintomática, já no adulto, a dor profunda no ouvido é o principal sintoma, seguido da sensação de ouvidos tapados, hipoacusia, astemia, cefaléia e febre. Tonturas com ou sem nistagmos podem ocorrer e servirão de sinal de alarme para uma labirintite. Nas crianças a febre é em geral alta com choro intenso, irritabilidade, anorexia, diarréia e vômitos. A otoscopia mostrará uma membrana timpânica mais ou menos hiperemiada, espessurada em sua translucidez, podendo estar abaulada para fora por pressão intratimpânica. A otoscopia pneumática mostrará uma membrana com mobilidade prejudicada. As vezes, a infecção pode adquirir características mais agressivas, invadir e destruir a trabiculação da mastóide, tornando-a uma cavidade única. O tratamento tem nos antimicrobianos seu aliado mais importante. As otites 17 supurativas adquirem um caráter recidivante muito freqüente, recebendo a denominação de otites de repetição. Para Costa, Cruz e Oliveira (1994), a otite média aguda necrotizante é apenas uma variante da forma anterior, quando se instala em pacientes imunologicamente debilitados, como é o caso de crianças portadoras de sarampo, escarlatina, varicela, coqueluche e outras em geral causada pelo Streptococus pyogenes se caracteriza pela rapidez de instalação, abundante supuração e grande destruição dos tecidos. Pode acontecer necrose da cadeia ossicular. A otoscopia em geral já surpreende uma perfuração timpânica grande ou total, as vezes com exposição do cabo de martelo. O tratamento antibiótico é o mesmo da otite média aguda supurada havendo no entanto, indicação do uso de gotas auriculares antibióticas e acompanhamento do paciente com freqüentes aspirações. Trata-se de uma doença mais freqüente entre as comunidades de condições socio-econômicas baixas. Jerger e Jerger (1989) descrevem a padrão audiológico geral da otite média que caracteristicamente mostram perda auditiva condutiva bilateral. O grau de perda está tipicamente entre 20 dBNA, podendo ocorrer variações no grau da perda nos diferentes estágios da doença, sendo que nos estágios iniciais pode ocorrer audição normal e nos estágios mais avançados da otite média pode ocorrer perda auditiva maior que 40 dBNA. A curva audiométrica pode variar com o progresso da doença. Os valores de inteligibilidade de fala geralmente são normais. A impedânciometria caracteristicamente mostra timpanogramas anormais, medidas de complacência estática reduzidas e ausência de reflexos, em pacientes com membranas timpânicas intactas. Nos pacientes com membranas timpânicas perfuradas avaliam a habilidade 18 para sustentar ou retirar pressão negativa ou positiva induzida na cavidade do ouvido médio, com ou sem deglutição. 2.3.6.2. Otite Média Crônica A otite média crônica simples, segundo Hungria (1988), e quase sempre secundária a uma otite média aguda necrosante, que se caracteriza por um grau de moderada intensidade e cessa, geralmente, pela restauração dos tecidos inflamados a um estado de quase normalidade, mas deixando como seqüela uma perfuração da parte tensa da membrana timpânica. As lesões a mucosas, podem ser irreversíveis em determinados pontos e a cura espontânea. Quando se verificar , faz-se por intermédio de reparação fibrosa cicatricial. Northern e Downs (1989) referem que a otite média crônica na maioria das vezes instala-se na infância, entre os 5 e os 10 anos de idade. A otite média crônica, de acordo com Costa, Cruz e Oliveira (1994, tem sido definida como um processo inflamatório crônico, localizado na fenda auditiva, associado ou não a uma perfuração da membrana timpânica e a otorréia crônica. Ao contrário da otite média aguda, em que o processo inflamatório se desenvolve subitamente e a resolução é de forma rápida e completa, a otite média crônica geralmente está associada a quadros inflamatórios mais insidiosos, persistentes e destrutivos. Quanto à etiologia, para os mesmos autores, algumas das principais situações que iniciam a instalação de um processo inflamatório crônico no ouvido médio são: otite média de repetição, otite média aguda necrotizante, trauma, fatores socio-econômicos e geográficos. Tais como desnutrição, higiene inadequada, baixa qualidade de moradia e grande densidade demográfica. 19 Quanto ao diagnóstico, o portador de otite média crônica supurativa apresentará uma história de pelo menos alguns meses de evolução, referindo uma otorréia intermitente, inodora, que se acentua quando há penetração de água ou quando ocorrem resfriados. Raramente haverá dor, a não ser em surtos de reagudização importantes. Sendo a patologia bilateral, a queixa de hipoacusia poderá ser referida ou deduzida no caso de criança que apresentem mau desempenho escolar, assista a televisão com volume alto, etc. Excepcionalmente haverá relato de tontura e, esporadicamente, em adultos poderá ocorrer zumbido. A audiometria, segundo os autores supra-citados, revelará uma disacusia condutiva de grau variável, dependendo do tempo de evolução e da severidade de cada caso. O tratamento clínico da otite média crônica simples é usado antibioticoterapia sistêmica e limpeza local são as medidas mais eficazes no controle da infecção local. Costa, Cruz e Oliveira (1994) referem que a otite média crônica, trata-se de otite crônica de etiologia específica, causada pelo bacilo da tuberculose. A infecção do ouvido médio parece processar-se através da tuba, mesmo que a infecção pulmonar ainda esteja inaparente. O quadro clínico, à semelhança do quadro pulmonar, tem característica insidiosa e indolor no início. Há edema da mucosa do ouvido médio e a membrana timpânica pode apresentar perfuração rapidamente, proporcionando a saúde de material líquido fino, esbranquiçado e inodoro. O quadro segue um curso insidioso e crônico, que repercute pouco sobre o estado geral e responde mal ao tratamento clínico dirigido a uma infecção crônica bacteriana. 20 Hungria (1988) refere que pode-se encontrar na O.M.T. surdez do tipo misto, de transmissão e neurossensorial, esta última traduzindo impregnação tóxica do órgão de Corti. O tratamento consiste na cura da lesão primária e nos curativos antisépticos locais, sendo que atualmente a estrepotomicina e o ácido paraminossalicílico vieram melhorar extraordinariamente o prognóstico. Nos casos em que surgem complicações, paralisia facial e mastoidite, está indicada a cirurgia para a remoção dos sequestros ósseos. 2.3.6.3. Otite Média Crônica Colesteatomatosa Katz (1989) refere que a otite média crônica colesteatomatosa, em alguns casos, estão associados a longos períodos de pressão negativa na orelha média e infecções recorrentes, podendo encontrar um cisto, chamado colesteatoma. Costa, Cruz e Oliveira (1994) definem os colesteatomas como estruturas císticas revestidas por epitélio escamoso estratificado, repousando sobre um estroma fibroso de espessura variável, o qual pode conter alguns elementos do forro mucoso original. Os colesteatomas, segundo Katz (1989), são formados por detritos epitélicus e seu tamanho aumenta lenta e provocam a erosão do osso com o qual entram em contato e podem produzir sérias complicações intracranianas, se provocarem a erosão da dura-mater da fossa, média ou posterior do seio lateral ou invadirem o canal semicircular lateral. Também pode produzir uma paralisia facial, se o nervo facial for atingido na orelha média ou mastóide. Geralmente, há história de otorréia por muitos anos e, em geral, seu odor é fétido. Pode ocorrer tontura ou vertigem 21 verdadeiro, se o canal semicircular lateral for atingido. Freqüentemente, os colesteatomas destroem as estruturas ossiculares. Costa, Cruz e Oliveira (1994) referem que os colesteatomas podem ser classificados, de acordo com sua provável etiologia, em duas categorias: congênitas e adquiridas. Os colesteatomas congênitos, são encontrados em quatro regiões dentro do osso temporal: tímpano mastóide, ápice petroso, ângulo ponto-cerebelar e forame jugular. Os colesteatomas adquiridos, por sua vez são divididos em dois subgrupos, dependendo de estarem ou não associados a otites médias prévias: primárias, ou seja, sem história prévia de otite média, desenvolvem a partir de uma retração da membrana timpânica. E secundárias, formados a partir da migração do epitélio procedente do conduto auditivo externo através de uma perfuração marginal da membrana timpânica. Segundo os mesmos autores, os colesteatomas normalmente estão associados a histórias de patologias otológicas de longa duração e com quadros clínicos insidiosos, cujas achados mais característicos são a otorréia crônica e a perda auditiva também pode ocorrer sangramento, otalgia, vertigem e cefaléia. Katz (1989) refere que dependendo da extensão do colesteatoma, de sua localização e das estruturas comprometidas, a perda auditiva pode variar de leve a total. As vezes, um dos componentes da cadeia ossicular pode estar destruídos e, ainda assim, a audição continuar em níveis razoáveis, bons, porque o colesteatoma forma uma ponte sobre esta interrupção e auxilia a transmissão do som. Quanto ao tratamento das otites médias crônicas colesteatomatosas é primariamente cirúrgico. De acordo com os vários autores estudados foi possível relatar diferentes classificações das otites médias. 22 2.4. Incidência Conforme revisão bibliográfica, muitos aspectos tem sido apontados em relação a incidência da otite média, considerando fatores como faixa etária mais comprometida, sexo mais atingido em relação a época do ano e fatores de risco. A incidência da otite média, segundo os autores, é mais comum nos primeiros anos de vida. Os diferentes estudos nessa área consideram como fatores predisponentes no desenvolvimento da patologia de ouvido médio, condições tais como moradias populosas (Anderson e Wednemberg, 1970), antecedentes familiares, estado nutricional e alterações climáticas. E mostrou ser em função da idade, sexo, raça (maior em branco que negro, maior em meninos), fatores genéticos e sócioeconômicos. Assim sendo, pode-se verificar que as condições sócio-econômicas e culturais cooperam para fazer da populações de baixa renda, uma população alvo para problemas de saúde em geral e, em particular, para problemas de ouvido médio. As estatísticas da incidência de otite média são impressionantes: 76,95% de todas as crianças apresentaram pelo menos um caso de otite antes dos 6 anos de idade, 50% das crianças tiveram um caso antes de 1 ano e 75% antes de 02 anos. Costa, Cruz e Oliveira (1994) referem que apesar de todas as faixas etárias serem atingidas por essa doença, a população alvo é a infantil, com um pico de prevalência máxima entre os 06 e os 36 meses coadjuvado por um outro pico de menor amplitude entre os 04 e os 07 anos. Estima-se que 95% de todas as crianças 23 nos E.U.A. tenham tido uma ou mais infecções do ouvido médio antes de completar 05 anos de idade. Kirk e Gallagher (1991) referem que a otite média é uma das doenças infantis mais comum, atacando uma em cada 8 crianças que ocorra seis ou mais vezes antes dos 6 anos. De acordo com Santos, citado por Schochat (1996), aproximadamente 80% das crianças nas idades pré-escolar e escolar sofreram um perda auditiva temporária durante o ano escolar. Através de um levantamento realizado no Centro de Controle e Prevenções de Doenças, nos Estados Unidos, constatou-se que 24,5 milhões de visitas a médicos teve como principal causa a otite média. Segundo a autora, alguns fatores têm sido apontados como de risco para uma criança ser propensa à otite, como: - sexo masculino, história de otite média recorrente em irmãos, infecção precoce, não ter recebido aleitamento materno, estar em creche e exposição à fumaça de cigarro em casa. A população institucionalizada, como em creches, torna-se um grupo de características semelhantes, à medida que as crianças permanecem por longo período de tempo em um mesmo ambiente e sob as mesmas condições ambientais de alimentação, de higiene e de saúde. Esses fatores são agravantes para problemas respiratórios e consequentemente problemas auditivos (ventilação auditiva deficiente, contaminação e manutenção deste quadro por períodos maiores). O maior ou menor período de amamentação foi considerado como outro fator importante na determinação da ocorrência e duração de episódios de otite média. 24 INGVARSON.et al (1982) referem-se a mais alta taxa de incidência da otite aguda na faixa etária de 6 a 11 meses, considerando que o risco negligível anterior a esta faixa pode estar associado ao efeito protetor da imunoglobulina maternal e a menor exposição a infecções do trato respiratório superior. Segundo o autor, em estudo prospectivo da otite média em crianças relatam a influência da variação sazonal na ocorrência da otite média aguda verificando maior número de casos no período crítico de inverno. BILES et al (1980) referem-se a maiores proporções de crianças que experienciaram episódios recorrente de otite média naquelas nascidas no período de verão e início de outono, sugerindo que, o fato de atingirem a idade de seis meses no período de médio inverno favoreceu a aquisição de infecções do trato respiratório, associada a perda de proteção materna de anticorpos e à maior exposição junto a outras crianças. Para Duncan, Schmit e Giugliani (1996), entre os fatores que contribuem para uma maior incidência de otite média aguda em crianças pequenas incluem-se a anatomia da tuba auditiva (relativamente mais curta e menos angulada no lactente), menor quantidade e rigidez do apoio cartilaginoso da trompa, tecido linfóide relativamente hipertrofiado e freqüência aumentada de infecção das vias aéreas superiores nesta faixa etária. Além disso, a incidência de otite média aguda é maior em portadores de alergia respiratória, processos gripais de repetição, fissura palatina (reparada ou não), síndrome de Down, fibrose cística, descinesia mucociliar e imunodeficiência. Tem sido evidenciado o papel protetor exercido pelo leite materno contra episódios de otite média aguda e de otite média recorrente. 25 Para os autores, a otite média aguda está intimamente relacionada com a disfunção da tuba auditiva. A permeabilidade aumentada a tuba, pode levar a otite média de refluxo pela passagem de secreções nasofaríngeas não desejáveis para o ouvido médio. A obstrução da tuba auditiva levam a uma pressão negativa no ouvido médio fazendo com que a mucosa do ouvido produza uma secreção (otite secretora) que pode contaminar se entrar em contato com secreções da nasofaringe. O assoar do nariz, o espirro, o choro e a deglutinação com as narinas obstruídas facilitam a passagem de secreção da nasofaringe para o ouvido médio. 2.5. Conseqüências Em relação às complicações e seqüelas das otites médias, Costa, Cruz e Oliveira (1994) relatam que as complicações podem ser divididas em dois grandes grupos: complicações intratemporais e extratemporais. As intratemporais incluem perfurações da membrana timpânica, hipoacusia de condução ou neurossensorial (ou suas combinações), lesões ossiculares, paralisia facial, mastoidite, labirintite e petrosite. As extratemporais podem ser divididas em intracranianas (abcesso estradural, subdural ou cerebral, meningite, tramboflebite do seio lateral, hidrocefalia otítica) ou estracranianas (abcesso retrocurricular, zigomático e de Bezold). Santos, citado por Schochat (1996), refere que diversos fatores sofrem a interferência dos diferentes tipos e seqüelas da otite média: maturação psicofisiológica, percepção, fala e linguagem, educacional e comportamento interpessoal. 26 cognição, acompanhamento Sabe-se, também, que distúrbios severos na recepção dos estímulos auditivos podem interferir de maneira negativa no desenvolvimento normal da linguagem. A atenuação do sinal que vai para o cóclea, como ocorre na otite média serosa, pode provocar um distúrbio na recepção auditiva e isto também pode ser causa de atraso na aquisição da linguagem. Estas crianças podem apresentar dificuldades educacionais que podem aparecer na hora em que vão aprender a ler e a trabalhar com situações eminentemente verbais. A fala é composta por uma cadeia de fonemas, que são interdependentes no contexto, ou seja, o aspecto acústico de um fonema depende do outro que antecede o que sucede. Para o adulto, que tem sua linguagem adquirida, uma perda auditiva leve pode dificultar sua vida, mas utiliza-se de pistas que a alta redundância da sinal de fala lhe dá, para associado as experiências de linguagem anteriores que tem, suprir sua deficiência e manter seu nível de compreensão da linguagem. Na criança este conhecimento está em desenvolvimento e a especificidade de cada sinal acústico se torna essencial. Segundo a autora supra-acima, as inconsistências na mensagem da fala que podem ser causadas pela flutuação na recepção do sinal auditivo, podem atrasar a aquisição das estruturas das unidades perceptuais da fala. Para Kirk e Gallagher (1991), as características de uma criança com perda auditiva leve serão, em muitos aspectos, mais semelhantes às de uma criança com audição normal do que às de uma criança surda, cuja condição causará uma série de outros problemas sérios, ligados a sua incapacidade de receber ou expressar mensagens e pensamentos através do som. 27 De acordo com estes autores, o problema fundamental de comunicação das crianças surdas consiste em duas partes significativas: as limitações de um modo de comunicação com outras pessoas e as limitações progressivas no desenvolvimento normal da linguagem. Cada uma dessas limitações afeta gravemente os processos de desenvolvimento da criança, bem como, as áreas de realização acadêmica, ajustamento social, pessoal e ocupacional. Segundo Simonek e Lemes (1989), uma perda leve ou moderada poderá resultar numa dificuldade para ouvir de forma plena, as mensagens, levando ao aparecimento de problemas no desenvolvimento e integração das percepções, que poderão desencadear sérios problemas de aprendizagem. Lopes Filho (1997) refere que o diagnóstico precoce realizado durante o primeiro ano de vida possibilita a intervenção, médica e ou fonoaudiológica, ainda no período crítico de maturação e plasticidade funcional do Sistema Nervoso Central permitindo um prognóstico mais favorável em relação ao desenvolvimento global da criança. As alterações auditivas, segundo o mesmo autor, são decorrentes de comprometimento do sistema tímpano ossicular, de caráter flutuante, podem comprometer a habilidade de processamento dos estímulos sonoros cujos parâmetros acústicos variam em função da diminuição temporária e periódica da acuidade auditiva. A percepção auditiva, de acordo com Behlau e Russo, envolve a recepção e a interpretação dos estímulos sonoros através do sentido da audição. Desta forma, a percepção auditiva é parte do processamento auditivo que envolve uma análise complexa do sinal acústico, integrando a informação em modelos auditivos. É um processo adaptável, modificável e influenciado pela aprendizagem. 28 Santos, citado por Schochat (1996), refere que as crianças com comprometimento da orelha média devem ser avaliados e tratados pelo otorrinolaringologista e reavaliados audiologicamente pós-tratamento. A autora cita a importância de um programa de prevenção, com objetivo de evitar a ocorrência de alterações auditivas. Este programa deve incluir conscientização e orientação da população para maior controle dos fatores etiológicos dos distúrbios da audição e orientação a profissionais da área da saúde e da educação. Vieira, Vieira, Ávila e Pereira (1995) acrescentam que a prevenção fonoaudiológica consiste na eliminação dos fatores que interferem na aquisição e desenvolvimento dos padrões da fala, linguagem e audição. É fundamental que os aspectos da fala, da linguagem e da audição sejam considerados atributos da saúde e que suas manifestações patológicas, que comprometem a competência e o desempenho comunicativo verbal e não verbal, gerem sofrimento, insucesso social e limitem a capacidade de criar e transformar o mundo, comprometendo a qualidade de vida do indivíduo. 29 3. CONSIDERAÇÕES FINAIS Esta pesquisa teve como principal motivação, o intuito de colaborar para a prevenção e conscientização da população em geral, sobre a incidência e as conseqüências da otite média. O objetivo foi estudar a otite média e suas conseqüências em crianças na idade escolar e verificar se o nível sócio-econômico interfere na incidência desta patologia. Para tanto, foi pesquisada a fisiologia da audição, etiologia, sintomatologia, tratamentos, incidências e conseqüências da otite média nas crianças. Através deste estudo, foi possível destacar alguns aspectos interessantes: em primeiro lugar, a incidência da otite média de acordo com as estatísticas, 80% das crianças na idade pré-escolar e escolar sofrem uma perda auditiva temporária durante o ano letivo, 76,95% de todas as crianças apresentam pelo menos um caso de otite média antes dos 6 anos, 50% antes de 1 ano e 75% antes de 2 anos de idade. Outro aspecto apontado pelos autores estudados seriam os fatores de risco para uma criança ser propensa à otite média: ser do sexo masculino, pertencer a uma classe de nível sócio-econômico baixo, ter história de otite média recorrente entre irmãos, ter tido infecção precoce, não ter recebido o aleitamento materno, estar em creche e ou em contato com fumaça de cigarro constantemente. O último aspecto é referente às principais conseqüências da otite média: problemas de aprendizagem, atraso na aquisição da fala e da linguagem, problemas emocionais e comportamentais, alteração no desenvolvimento cognitivo e integração das percepções auditivas e dificuldade de socialização. 30 Portanto, verificou-se que para uma criança ter um adequado desenvolvimento cognitivo e lingüístico é necessário à integridade do sistema auditivo central e periférico, pois a audição permite ao indivíduo receber, transmitir e decodificar a mensagem, comunicando e interagindo com o mundo que o cerca. Sendo que a audição uma vez lesada total ou parcialmente limita esta compreensão, prejudicando o seu desenvolvimento comunicativo e social. A otite média, considerada como a doença mais comum na infância, deve ser encarada como um problema básico de saúde e para tanto se fazem necessário levantamentos epidemiológicos para adoção de medidas necessárias. Este trabalho poderá contribuir para a prevenção e atendimento de crianças em idade pré-escolar e escolar com otite média, esclarecendo profissionais de diversas áreas, assim como, para a conscientização dos pais e da sociedade como um todo sobre como prevenir e minimizar as alterações do desenvolvimento comunicativo, educacional e social destas crianças. A partir desta pesquisa, pretendo realizar um trabalho de conscientização e prevenção da otite média em postos de saúde e escolar municipais, estaduais e particulares do município onde atuo, através de panfletos informativos, palestras educativas para professores e pais de alunos, reuniões com profissionais de áreas afins, promover um chá da tarde como a fonoaudióloga para discutir sobre este assunto e fazer um levantamento através de um questionário sobre a ocorrência de otite média em crianças atendidas nestes locais, para possíveis encaminhamentos, orientações e intervenções fonoaudiológica quando houver necessidade. Acredito que através de um trabalho abrangente e integrado com outros profissionais é possível reduzir os prejuízos causados pela otite média, uma vez que esta atinge em sua maioria as crianças. 31 < 4. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANDERSON, H. & WEDNEMBERG, E. - Genetic Aspects of Hearing Impairments in Children. Acta Otolaryngol, 69:77, 1970, in JERGER, S. & JERGER, J. - Manual for Clinical Evaluation, Little Brown and Company. Boston, 1981. AZEVEDO, M. F. de. – Programa de Prevenção e Identificação Precoce dos Distúrbios da Audição, In SCHOCHAT, E. – Processamento Auditivo, São Paulo, Ed. LOVISE, 1996. – (Atualidades em Fonoaudiologia) p. 75 – 105. BILES, R. W.; BUFFER, P. A. & O´DONELL, A. A. - Epidemiology of Otitis Media: A Community Study. Am. J. Public Health, 70 (6): 593-598, 1980. COSTA, S. S. da; CRUZ, O. L. M.; OLIVEIRA, J. A. A. de; e colaboradores – Otorrinolaringologia: Princípios e Práticas, Porto Alegre, Artes Médicas, 1994, 573 p. DUNCAN, B. B., SCHMIDT, M. 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