As construções de deslocamento à esquerda de sujeito no PB: um

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Universidade Federal do Rio de Janeiro
As construções de deslocamento à esquerda de sujeito no PB:
um estudo em tempo real de curta duração
Mayara Nicolau de Paula
2012
As construções de deslocamento à esquerda de sujeito no PB:
um estudo em tempo real de curta duração
Mayara Nicolau de Paula
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa
de Pós-Graduação em Letras Vernáculas da
Universidade Federal do Rio de Janeiro como
quesito para a obtenção do Título de Mestre em
Letras Vernáculas (Língua Portuguesa).
Orientadora: Professora Doutora Maria Eugenia
Lamoglia Duarte
Coorientadora: Professora Doutora Mônica
Tavares Orsini
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2012
As construções de deslocamento à esquerda de sujeito no PB:
um estudo em tempo real de curta duração
Mayara Nicolau de Paula
Orientadora: Professora Doutora Maria Eugenia Lamoglia Duarte
Coorientadora: Professora Doutora Mônica Tavares Orsini
Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Letras
Vernáculas da Universidade Federal do Rio de Janeiro como quesito para a obtenção
do Título de Mestre em Letras Vernáculas (Língua Portuguesa).
Examinada por:
______________________________________________________
Presidente: Profª. Doutora Maria Eugênia Lamoglia Duarte – UFRJ
______________________________________________________
Profª. Doutora Maria Conceição de A. Paiva – UFRJ
______________________________________________________
Prof. Doutor Sérgio Leitão Vasco – Universidade Estácio de Sá
______________________________________________________
Suplente: Profª. Doutora Sílvia Regina de O. Cavalcante – UFRJ
______________________________________________________
Suplente: Profª. Doutora Ângela Marina Bravin dos Santos – UFRRJ
Rio de Janeiro
Fevereiro de 2012
P324c
Paula, Mayara Nicolau de.
As construções de deslocamento à esquerda de sujeito
no PB : um estudo em tempo real de curta duração /
Mayara Nicolau de Paula. – Rio de Janeiro: UFRJ, 2012.
101 f. : il. color. ; 30 cm.
Orientadora: Profª Drª Maria Eugênia Lamoglia Duarte.
Co-orientadora: Profª Drª Mônica Tavares Orsini.
Dissertação (Mestrado em Letras Vernáculas) –
Departamento de Letras Vernáculas, Faculdade de Letras,
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro,
2012.
Bibliografia: f. 98-101.
1. Gramaticalização. 2. Mudança linguística. 3.
Português brasileiro. I. Título. II. Duarte, Maria Eugênia
Lamoglia. III. Orsini, Mônica Tavares.
CDD 401.9
Ficha elaborada pela Biblioteca José de Alencar – Faculdade de Letras/UFRJ
RESUMO
O presente trabalho investiga as construções de tópico marcado denominadas
deslocamento à esquerda de sujeito (DE sujeito) no PB. Tais construções se
caracterizam por estabelecer uma relação de correferencialidade entre o tópico, termo
sobre o qual se faz uma declaração, e o sujeito da oração comentário, como no exemplo
A jaguatirica adultai, elai é pequena. O estudo das construções de tópico marcado
ganhou destaque com o trabalho pioneiro de Pontes (1987) e, desde então, têm sido
objeto de várias análises (cf. Orsini e Vasco 2007). O objetivo deste estudo é refinar a
análise das referidas estruturas, visto serem elas uma evidência do “encaixamento” da mudança na representação do sujeito pronominal, conforme evidencia o trabalho de
Duarte (1995). O estudo dessas estruturas visa também contribuir para a discussão sobre
a possível inclusão do PB no grupo de línguas com proeminência de tópico e sujeito,
segundo a tipologia proposta por Li e Thompson (1976). Desta forma, tendo como
aporte teórico o modelo de estudo da mudança proposto por Weinreich, Labov e Herzog
(2006 [1968]) associado ao modelo de Princípios e Parâmetros (Chomsky, 1981), este
trabalho faz uma investigação em tempo real de curta duração – “painel” e “tendência”
(cf. Labov 1994) das construções de DE sujeito na fala popular carioca, utilizando como
corpus dados coletados das amostras do projeto PEUL-UFRJ (entrevistas da década de
1980 e de 2000 com informantes que não possuem ensino superior completo). Os
resultados obtidos, tanto no Estudo de Painel quanto no Estudo de Tendência, revelam
que a periferia esquerda da sentença aparece preenchida por pronomes e por SNs, não
havendo restrição quanto ao traço semântico e à especificidade [+/- animado/humano;
+/- específico] do tópico de terceira pessoa, nem quanto ao tipo sintático da oração em
que a construção ocorre. Essa ausência de restrições associada a um conjunto de
características morfossintáticas do PB atual o afasta, por um lado, das línguas românicas
de sujeito nulo, como o espanhol, o italiano e o PE, que não admitem DE sujeito, e, por
outro, de sistemas como o francês (e mesmo o inglês), línguas de sujeito expresso, que
admitem a construção com maior número de restrições. Este comportamento contribui,
em última instância, para a interpretação de que o PB parece se assemelhar as línguas
com proeminência de tópico e de sujeito, conforme tipologia proposta por Li e
Thompson (1976).
Palavras-chave: tópico marcado, deslocamento à esquerda de sujeito, mudança
linguística, estudo em tempo real de curta duração
ABSTRACT
This study aims to refine the analysis of a marked topic construction usually referred to
as left dislocated subject (LD) in Brazilian Portuguese (BP). Such constructions are
characterized by the correlation they establish between a peripherical topic and the
subject in the comment sentence as in The adult oceloti iti is small. This kind of structure
was pointed out by Duarte (1995) as an evidence of the “embedding” of the change in the representation of pronominal subjects in BP. We owe the first studies about a
number of different topic constructions in BP to the pioneer work of Pontes (1987),
which has been followed by many others (cf. Orsini e Vasco, 2007). The study of LD
subjects in BP aims to contribute to the discussion about the possible inclusion of BP
among the subject and topic prominent languages, according to the typology proposed
by Li and Thompson (1976). Using the support of the theory of language change as
proposed by Weinreich, Labov and Herzog (2006 [1968]) associated with the Principles
and Parameters theory (Chomsky 1981), this study presents an investigation of left
dislocated subjects using the model of study of change called “short term real time –
panel and trend studies”, as proposed by Labov (1994). Our data comes from the two samples of PEUL – UFRJ project (the interviews were carried out in the early 80’s and in 2000 with undergraduate speakers of Rio de Janeiro). Our two analyses, either for
panel and for trend study, reveal that the left periphery of the sentence can exhibit a
pronoun or an NP, and that third person elements are not restricted by the semantic
feature [+/- animated/human] or especificitity [+/- specific] or by the syntactic function
of the sentence they can appear. Such absence of structural restrictions associated with a
set of morphosyntactic changes in progress in BP, sets it apart either from romance null
subject languages, such as Spanish, Italian and EP, which do not allow LD subjects or
non-null subject languages such as French and English, which accept the structure but
with a number of restrictions. It might be a suggestion that BP fits in “the subject and topic” orientation according Li & Thompson´s (1976) typology.
Key words: marked topics, left-dislocated subjects, language change, short term real
time study: panel and trend studies
A realização deste trabalho foi financiada por uma bolsa CNPq.
AGRADECIMENTOS
Não existe maneira diferente para começar esses agradecimentos, por isso as
primeiras pessoas a serem citadas serão meus pais. Não encontro as palavras exatas para
expressar o quanto sou grata por vocês sempre apoiarem minhas escolhas, Cláudio e
Regina, se não fossem vocês nada disso seria possível. Para melhorar ainda me deram
de presente uma irmã linda! Narely, muito obrigada por tudo também, por suas
tentativas de entender minha pesquisa e por todas as vezes que você me matou de rir
confundindo deslocamento à esquerda com deslocamento à direita de qualquer outra
coisa que não o sujeito! Não tenho palavras para agradecer a vocês três, afinal quem
pode querer família melhor que essa, uma família que ao final do meu mestrado sabe
direitinho identificar exemplos de construção de tópico em conversas e na televisão e
sabe explicar pra quem quer que seja o objetivo do meu trabalho. Amo vocês!
Agradeço a Deus, pois sei que Ele foi uma presença fundamental ao longo de
toda a minha vida.
À Mônica Tavares Orsini, por estar junto comigo desde os primeiros passos
dessa longa caminhada, um muito obrigado não seria suficiente. Agradeço imensamente
a você que ouviu minhas ideias ainda imaturas, tirou minhas dúvidas, me ensinou muita
coisa. Mônica, sem a sua orientação em todos os aspectos, essa dissertação não teria
sido possível.
À Maria Eugênia Lamoglia Duarte que apareceu no momento mais oportuno e
conduziu brilhantemente esse período de trabalho que ainda não está nem perto do final.
Muito obrigada por estar disposta a compartilhar todo seu imenso conhecimento
comigo.
Não posso, de maneira alguma, deixar de agradecer aos meus amigos. Todos e
cada um de vocês tiveram um papel especial nesse caminho que eu escolhi pra minha
vida. Clarissa, você entra na categoria “sem vocês essa dissertação não teria saído”, obrigado pela formatação de todos os meus power points, artigos e dessa dissertação, e
também pelo chocolate pra acalmar o desespero e pela companhia sempre presente nos
momentos bons e ruins.
Agradeço aos amigos da UFRJ, que estiveram ao meu lado desde a aprovação
no mestrado até essa difícil conclusão. Ainda bem que chegamos todos juntos até aqui,
fazendo parte de uma turma maravilhosa. Ana, Caio, Elaine, Érica, Diego, Priscila,
Janaína (Dupla, valeu por cada momento que passamos juntas, por cada matéria, cada
congresso e cada trabalho cabeludo que você desenvolveu comigo.). Agradeço ao
Matheus e a Rachel pelas muitas risadas e momentos de diversão, vocês me fazem
lembrar que as coisas sempre dão certo no final! Agradeço à Paula que, literalmente,
começou a dar os primeiros passos juntos comigo em 2006/1, amiga só a gente sabe o
que foi passar pela graduação em inglês quando tudo que a gente queria estava logo ali
no departamento de vernáculas!
Aos amigos de fora da faculdade, um imenso obrigado. Ao Daniel (que se
tornou um grande conhecedor do DE sujeito), à Raquel (suas palavras de conforto foram
e são essenciais), Marcele, Natália, Tati, Leo, Jaque... enfim, resolvi correr o risco de
listar nomes, mas confesso que o medo de esquecer alguém é grande, então esse
agradecimento se aplica a todos os meus amigos queridos, que de alguma maneira
foram parte disso tudo.
Aos professores da UFRJ que muito me ensinaram nesses dois anos de
mestrado, um muito obrigado muito especial porque vocês abriram portas e janelas pra
mim.
A realização deste trabalho não seria possível se eu não tivesse tanto a
agradecer.
SUMÁRIO
Introdução
1
Capítulo 1 - Pontos de partida
4
1.1 – As construções de tópico marcado
4
1.2 – As construções de tópico marcado na tradição gramatical
16
1.3 – Os estudos sobre tópico marcado no PB
17
Capítulo 2 - Pressupostos Teóricos e Metodológicos
30
2.1 – O modelo de estudo da mudança, segundo Weinreich, Labov e Herzog
(2006 [1968])
29
2.2 – A Teoria de Princípios e Parâmetros
33
2.2.1 – Mudanças paramétricas em curso no PB
34
2.3 – Tipologia das línguas
38
2.4 – Objetivos e hipóteses
44
2.5 – Procedimentos Metodológicos
46
2.5.1 – A Amostra
46
2.6 – Os grupos de fatores
48
Capítulo 3 – A análise dos dados
57
3.1 – O Estudo de Tendência
3.1.1 – A natureza gramatical do tópico
3.1.1.1 – A distribuição dos tópicos representados por pronomes
3.1.2 – A estrutura interna dos tópicos representados por SN
57
57
58
62
3.1.3 – Natureza gramatical dos tópicos vs Natureza gramatical do
correferente
64
3.1.4 – Presença vs Ausência de Material interveniente
69
3.1.5 – Fatores de natureza semântica: Traço e especificidade do tópico 71
3.1.6 – Configuração sintática da estrutura em que ocorrem tópico e
correferente
76
3.1.7 – Os fatores sociais
79
3.2 – O Estudo de Painel
84
3.2.1 – Natureza gramatical do correferente
86
3.3 – O que dizem os resultados
90
3.4 – O PB e outras línguas românicas
92
Conclusão
95
Referências Bibliográficas
98
LISTA DE TABELAS
2.1 – Distribuição dos informantes – Estudo de Tendência – Anos 80
47
2.2 – Distribuição dos informantes – Estudo de Tendência – Ano 2000
47
2.3 – Distribuição dos informantes – Estudo de Painel – Indivíduos com mudança no
nível de escolaridade
47
2.4 – Distribuição dos informantes – Estudo de Painel – Indivíduos sem mudança no
nível de escolaridade
48
3.1 – Distribuição percentual dos dados segundo a natureza do tópico – Anos 80
57
3.2 – Distribuição percentual dos dados segundo a natureza do tópico – Anos 2000
57
3.3 – Distribuição das ocorrências de DE sujeito com tópico preenchido por pronome de
primeira pessoa
59
3.4 – Distribuição das ocorrências de DE sujeito com tópico preenchido por pronome de
terceira pessoa
62
3.5 – Estrutura interna do tópico SN – Anos 80
62
3.6 – Estrutura interna do tópico SN – Ano 2000
61
3.7 – Estrutura do correferente em relação à estrutura do tópico – Anos 80
65
3.8 – Estrutura do correferente em relação à estrutura do tópico – Ano 2000
65
3.9 – Distribuição da natureza do material interveniente
69
3.10 – O traço semântico e a especificidade do tópico – Anos 80
72
3.11 – O traço semântico e a especificidade do tópico – Ano 2000
72
3.12 – Tipo de sentença em que ocorre a estrutura de DE
76
3.13 – A natureza gramatical do tópico por faixa etária – Anos 80
79
3.14 - A natureza gramatical do tópico por faixa etária – Anos 2000
79
3.15 – A natureza gramatical do tópico por escolaridade – Anos 80
81
3.16 – A natureza gramatical do tópico por escolaridade – Anos 2000
81
3.17 – A natureza gramatical do tópico por gênero – Anos 80
82
3.18 – A natureza gramatical do tópico por gênero - Ano 2000
83
3.19 – Uso de SN em oposição ao pronome na posição de tópico - Indivíduos com
mudança no nível de escolaridade
84
3.20 – Uso de SN em oposição ao pronome na posição de tópico – Indivíduos sem
mudança no nível de escolaridade
85
3.21 – Uso de do pronome como correferente – Indivíduos com mudança no nível de
escolaridade
86
3.22 – Uso de do pronome como correferente – Indivíduos sem mudança no nível de
escolaridade
86
3.23 – Cruzamento do grupo natureza do tópico com o grupo natureza do correferente –
Indivíduos com mudança no nível de escolaridade
88
3.24 – Cruzamento do grupo natureza do tópico com o grupo natureza do correferente –
Indivíduos sem mudança no nível de escolaridade
88
3.25 – Padrões de mudança no indivíduo e na comunidade, segundo Labov (1994)
90
LISTA DE FIGURAS
3.1 – Ocorrência de SNs em posição de tópico (vs pronome) segundo a faixa etária
80
3.2 – Ocorrência de SNs em posição de tópico (vs pronome) por anos de escolaridade 82
3.3 – Ocorrência de SNs em posição de tópico (vs pronome) por gênero
83
1
INTRODUÇÃO
As estruturas de tópico marcado, termo utilizado por Brito, Duarte e Matos
(2003), ganharam visibilidade nos estudos linguísticos a partir do clássico artigo de Li e
Thompson (1976), que será descrito no Capítulo 2 desta Dissertação, tendo despertado o
interesse dos linguistas brasileiros a partir dos anos 80, graças ao trabalho pioneiro de
Pontes (1987). As construções se caracterizam por apresentar um sintagma na periferia
esquerda da sentença sobre o qual se faz uma proposição, o que chamamos de
comentário. Tomando por base o trabalho de Pontes (1987), inúmeros estudos acerca
desse tema foram desenvolvidos no português brasileiro (PB), associando tais
construções a um conjunto de mudanças pelas quais passa nosso sistema.
No PB, encontram-se quatro estratégias diferentes de construções de tópico
marcado: anacoluto ou tópico pendente, topicalização, deslocamento à esquerda e
tópico-sujeito, sendo este último inapropriadamente incluído no grupo, já que se refere à
estrutura em que tópico e sujeito se fundem, ocupando a posição normalmente reservada
ao sujeito sintático (cf. Berlinck, Duarte e Oliveira, 2009). Este estudo, porém, focaliza
exclusivamente a construção que apresenta um tópico (nominal ou pronominal) na
periferia esquerda da sentença retomado por um elemento equivalente na posição de
sujeito do comentário (doravante DE sujeito), como verificamos nos exemplos abaixo:
(1)
[Esse grupo]i, elei faz três viagens por ano. (Zil, 4, 001 )
(2)
[O Brasil] i, veja bem, elei começou a ser migrado por baixo. (Tad, 4,00 )
(3)
[Eu]i, antes de entrá pra escola, eui fui alfabetizado. (Fla, 3, 00)
As construções de DE sujeito foram apontadas por Duarte (1995) como
evidência do encaixamento da mudança na representação do sujeito pronominal no PB.
Isso se explica pelo fato de que essas estruturas são mais frequentes em línguas que
marcam negativamente o parâmetro do sujeito nulo (PSN) e, conforme nos mostra o
1
A identificação dos exemplos retirados da amostra utilizada neste trabalho será feita da seguinte
maneira: identificação do informante, faixa etária e ano da entrevista.
2
referido estudo, o PB passou de língua [+ sujeito nulo] para [- sujeito nulo], no que diz
respeito aos sujeitos referenciais. Desse modo, entendemos que, já que uma mudança
linguística nunca acontece isoladamente no sistema, havendo sempre “efeitos colaterais” (cf. Weinreich, Labov e Herzog (2006 [1968]), as estruturas de DE sujeito
são reflexos da mudança na marcação do PSN, pois, nas línguas românicas de sujeito
nulo, como o italiano, o espanhol e o português europeu, uma estrutura de DE, com um
pronome na periferia e um na posição de sujeito, não seria uma estrutura esperada,
como veremos nas seções que seguem.
O trabalho tem como foco, portanto, desenvolver uma análise das construções
de DE sujeito na fala popular do PB. Nosso objetivo específico é refinar a análise tanto
do elemento que pode ocupar a posição de tópico quanto do que ocupa a posição de
sujeito, a fim de, numa perspectiva interlinguística, incrementar a discussão em torno do
status do PB no que se refere à tipologia das línguas proposta por Li e Thompson
(1976). Trabalhos feitos anteriormente (Pontes, 1987; Vasco, 1999, 2006; Orsini, 2003;
Vasco e Orsini, 2007) apontam para o fato de que o PB não se comporta como uma
língua prototípica de proeminência de sujeito, mas se apresenta como um sistema misto,
com proeminência de sujeito e de tópico. A partir dessas conclusões, trabalharemos co m
a hipótese de que nosso sistema não impõe restrições no que diz respeito à natureza dos
constituintes licenciados para ocupar a posição de tópico. Essa hipótese se justifica pelo
fato de que a não existência de restrições sobre os elementos que podem ocupar essa
posição é um dos traços característicos das línguas que apresentam construções de
tópico marcado como básicas e frequentes, segundo Li e Thompson (1976).
Utilizaremos o modelo de estudo da mudança em Tempo Real de Curta
Duração, que compreende o Estudo de Tendência e o Estudo de Painel (Labov, 1994),
para mostrar o comportamento das construções de DE sujeito na fala popular do Rio de
Janeiro em dois períodos de tempo diferentes, anos 80 e ano 2000. Seguiremos a
metodologia da Sociolinguística Variacionista, tomando como base teórica a Teoria da
Mudança Linguística (Weinreich, Labov e Herzog (2006 [1968], particularmente no que
se refere ao encaixamento da mudança, além de pressupostos da Gramática Gerativa,
mais especificamente da Teoria de Princípios e Parâmetros (Chomsky, 1981), no que
diz respeito ao comportamento das línguas românicas em relação à realização nula vs
plena do sujeito gramatical.
3
O presente trabalho divide-se em três capítulos. O primeiro, intitulado “Pontos de partida”, apresenta a conceituação das construções de tópico marcado e de
deslocamento à esquerda; a abordagem da gramática tradicional em relação às
construções de tópico e uma revisão dos principais estudos precedentes relacionados ao
nosso tema. No segundo capítulo, são apresentados os pressupostos teóricos que
sustentam o trabalho, nossos objetivos e hipóteses e os procedimentos metodológicos: a
amostra utilizada e os grupos de fatores linguísticos e extralinguísticos considerados na
análise. O terceiro capítulo apresenta os resultados da análise dos dados para cada
período de tempo estudado, tanto na perspectiva da comunidade quanto do indivíduo,
além de trazer algumas reflexões acerca da mudança linguística a partir do confronto
dos resultados obtidos em cada tipo de estudo realizado. Por fim, diante dos resultados,
apresentamos as considerações finais.
4
CAPÍTULO 1 – PONTOS DE PARTIDA
1.1 – As construções de tópico marcado
As estruturas de tópico marcado diferenciam-se das sentenças SVO por
apresentarem um elemento na periferia esquerda, externo à sentença seguido por um
comentário, que se caracteriza por ser uma sentença completa. Tais estruturas não se
organizam em torno da relação sujeito + predicado, mas sim de um tópico + comentário.
O tópico tem o papel de anunciar (ou retomar) o tema do discurso e limitar o escopo de
aplicação da sentença comentário. Diferente do sujeito, o tópico não é um argumento
selecionado pelo predicador, ou seja, não precisa ter qualquer relação com os
predicadores da sentença. (cf. Li e Thompson, 1976)
Como o conceito de tópico não fazia parte da perspectiva da gramática
tradicional (esse conceito só passaria a fazer parte dos estudos gramaticais a partir do
desenvolvimento da Linguística na segunda metade do século XX), o que temos hoje,
no âmbito da descrição tradicional, é uma ambiguidade entre os conceitos de sujeito e o
que entendemos por um tópico. Vejamos a definição para o termo sujeito encontrada em
Cunha e Cintra (2001): “o sujeito é o ser sobre o qual se faz uma declaração; o
predicado é tudo aquilo que se diz do sujeito”. Em uma gramática escolar, a definição é
semelhante: “sujeito é o ser de quem se diz alguma coisa ou o termo a que se refere o predicado...” (Campedelli e Souza, 1999). O predicado, por sua vez, é definido como
sendo a parte da oração que faz referência ao sujeito. Apesar de, em alguns casos,
sujeito e tópico serem elementos coincidentes, temos sentenças em que os dois
constituintes ocuparão posições diferentes. Para casos como esse, a definição tradicional
de sujeito está inadequada.
Perini (2004, p.12) faz uma crítica às gramáticas tradicionais no que diz
respeito à definição de sujeito apresentada por elas. De acordo com o autor, definições
como a de Cunha e Cintra citada acima misturam critérios sintáticos e semânticos e não
dão conta de todas as estruturas sentenciais do português. Exemplos apresentados por
Perini (2004, p. 15) mostram com clareza a diferença entre os conceitos em questão:
(1)
a) Carlinhos corre como um louco.
5
b) Esse bolo eu não vou comer.
Em (1a), o sujeito “Carlinhos” é, de fato, o termo sobre o qual se faz uma declaração, ou seja, coincide com o tópico. Em (1b), não verificamos a mesma
coincidência, já que temos uma declaração sobre “esse bolo” e não sobre o sujeito “eu”.
As definições apresentadas acima fariam mais sentido se fossem aplicadas aos conceitos
de tópico e comentário, uma vez que o tópico anuncia o tema do discurso, é sobre ele
que se fará uma declaração ou um comentário. O sujeito, por sua vez, (embora
normalmente coincida com o tópico – o ser sobre o qual se faz uma declaração) deveria
receber uma definição de ordem sintática, associada a seu estatuto de argumento
selecionado pelo o verbo e com o qual entra em relação de concordância, seja ela
foneticamente realizada ou não. É o que se observa em (1a), em que sujeito e tópico
coincidem. No entanto, deve existir a consciência de que estamos tratando de categorias
distintas, que devem, portanto, receber definições diferentes para dar conta dos casos
em que não coincidem. E, embora concordemos com a crítica de Perini, não podemos
criticar uma gramática que remonta a uma tradição secular. O que é necessário, na
verdade, é atualizar conceitos a partir de descrições com base em estudos linguísticos
em dados contemporâneos.
É isso que fazem Brito, Duarte e Matos (2003) em um dos capítulos da
Gramática da Língua Portuguesa (Mateus et alii, 2003), que apontam coincidência entre
tópico e sujeito em estruturas como (2), que seria, portanto, uma sentença de tópico não
marcado, semelhante ao exemplo (1a):
(2)
Os miúdos telefonaram.
SUJEITO PREDICADO
TÓPICO
COMENTÁRIO
(Brito, Duarte e Matos p. 490)
Já em (3), tópico e sujeito são categorias diferentes, o que caracteriza as
construções de tópico marcado:
(3)
a) Fruta...
[-]
adoro melão.
b) O Pedro...
[os miúdos]
vieram com ele da escola.
6
c) Aos miúdos,
[-]
oferecemos-lhes CDs.
d) Aos miúdos,
[-]
oferecemos – CDs.
TÓPICO
SUJEITO
PREDICADO
COMENTÁRIO
(Brito, Duarte e Matos p. 490)
As autoras concluem que todas as sentenças são estruturas de tópico –
comentário (o que, de certa forma, justifica a definição tradicional para o sujeito) e
estabelecem a distinção entre tópico marcado e tópico não marcado. Sentenças de tópico
marcado são aquelas em que não há coincidência entre sujeito e tópico e sentenças de
tópico não marcado são aquelas que se configuram sintaticamente como estruturas
SVO.
O trabalho de Li e Thompson (1976), que será examinado detalhadamente no
capítulo 2 (seção 2.3), pioneiro na discussão tipológica das línguas segundo a orientação
para o sujeito ou para o tópico, já apresenta uma concepção semelhante à encontrada em
Brito, Duarte e Matos (2003), uma vez que que entende os sujeitos como tópicos
gramaticalizados, o que significa dizer que todas as sentenças são estruturas de tópicocomentário, porém, em alguns casos, os tópicos se vincularam ao verbo, conferindo a
eles traços de sujeito.
Para o PE, Brito, Duarte e Matos (2003, p.492) apresentam as seguintes
estruturas de tópico marcado: tópico pendente, deslocamento à esquerda de tópico
pendente, deslocamento à esquerda clítico, topicalização e topicalização selvagem.
(a) Tópico pendente: se caracteriza pela ausência de conectividade entre o elemento na
posição de tópico e qualquer constituinte no comentário. Correspondem aos chamados
anacolutos no PB e, para as autoras, podem ser de dois tipos (i) tópico regido por
locução prepositiva ou (ii) tópico SN.
(4)
a) [Quanto ao debate de ontem à noite], é forçoso reconhecer que há políticos
que falam sobre um país que não conhecem. (Brito, Duarte e Matos , p. 492)
7
b) [Fruta], adoro melão. (Brito, Duarte e Matos , p. 490)
A relação entre o tópico e o comentário é comandada pela Condição de
Relevância, segundo as autoras. Esse tipo de estrutura só é gramatical no PE em
contextos de frase raiz, como observamos no exemplo a seguir, considerado
agramatical:
(5)
* Ele acredita que [filmes estrangeiros], estamos a ver o filme até o fim e não
sabemos do que se trata. (Brito, Duarte e Matos, p. 494)
(b) Deslocamento à esquerda de tópico pendente: o tópico se vincula a um elemento
no interior do comentário; eles apresentam conformidade de traços de pessoa, gênero e
número. A essas estruturas é atribuído um grau de sintatização fraco. Contudo, ele está
presente, ao contrário das sentenças de tópico pendente, que apresentam grau mínimo de
sintatização. Segundo as autoras, essas estruturas são agramaticais em contextos
encaixados, como mostra (6) e o sujeito só pode ser retomado em PE se não houver
adjacência sintática entre os dois elementos, como em (7). No caso, a oração principal
“ouvi dizer” quebra essa adjacência.
(6)
* Toda a gente me disse que [o João]i... não lhei pagaram o ordenado desse
mês. (Brito, Duarte e Matos, p. 494)
(7)
[O João]i ... ouvi dizer que elei tinha ido passar férias a Honolulu. (Brito,
Duarte e Matos , p. 493)
(c) Deslocamento à esquerda clítico: o tópico vincula-se a um correferente, que deve
ser obrigatoriamente um clítico e, por essa razão, apresenta traços de conformidade
referencial, categorial, casual e temática com o tópico:
(8)
[Os gerentes]i, trata-osi como se fossem míseros contínuos. (Brito, Duarte e
Matos, p. 494)
8
Essas estruturas apresentam um elevado grau de sintatização e não estão
restritas a contexto de frase raiz (como as anteriores), porém são sensíveis a ilhas
sintáticas, já que podem ocorrer no interior de qualquer oração (principal ou
subordinada), como se vê em (9 a, b), mas não em estruturas como (9 c), em que vemos
o tópico não adjacente e seu correferente no interior de uma relativa, considerada uma
oração da qual não se pode mover um elemento, uma sugestão de que, ao contrário da
deslocamento de tópico pendente, a deslocamento clítica envolve movimento:
(9)
a) [(A)o João]i, não lhei pagaram o ordenado desse mês.
b)Disseram-me [que [ao João]i, não lhei pagaram o ordenado desse
mês].(Brito, Duarte e Matos ., p. 495)
c) * [Ao João]i, não encontro artigos [que lhei possam ser úteis]. (Brito,
Duarte e Matos, p. 495)
(d) Topicalização: essas estruturas apresentam um elevado grau de sintatização, em que
o tópico é resultado de movimento e se vincula a uma categoria vazia no comentário:
(10)
[Piscina]i, não sabia que tinha ___i . (Brito, Duarte e Matos, p. 497)
Assim como as sentenças de deslocamento à esquerda clítico, as topicalizações
podem ocorrer em contextos encaixados (não são restritas à frase raiz),como em (11a) e
também são sensíveis a ilhas sintáticas, como mostra (11b):
(11)
a)Lamento [que [esse artigo]i, o coordenador não tenha incluído ___i na
bibliografia da cadeira]. (Brito, Duarte e Matos, p. 498)
b) *[Piscina]i, nunca fui ao clube de golfe que tem ___ i . (Brito, Duarte e
Matos, p. 498)
(e) Topicalização selvagem: é um tipo de topicalização próprio da modalidade oral do
PE. Exibe algum grau de sintatização, pois apresenta (i) conectividade referencial, o
9
tópico e a categoria vazia compartilham o referente e (ii) temática, ambos recebem o
mesmo papel temático. Porém, não apresentam (i) conectividade categorial, já que o
elemento muda de categoria ao ser movido do interior da sentença para a posição à
esquerda e (ii) casual, já que tópico e a posição de onde ele foi extraído recebem casos
distintos. Observe-se que o tópico em (12) aparece sem a preposição, que seria
obrigatória para dar caso ao SN “essa cerveja”, caso ocupasse a posição de complemento oblíquo de “gostar’, de onde foi movido:
(12)
[Essa cerveja]i, eu não gosto ___ i . (Brito, Duarte e Matos, p. 501)
Ocorre tipicamente em contexto de frase raiz, embora a agramaticalidade das
sentenças em contexto encaixado seja considerada duvidosa pelas autoras como vemos
no exemplo (13):
(13)
* / ? Todos sabem que [essa cerveja]i, eu não gosto ___ i. (Brito, Duarte e
Matos, p. 501)
Segundo as autoras, no PE, a supressão de preposição só é possível quando esta
é desprovida de conteúdo semântico, desempenhando unicamente a função de
atribuidora de caso como vimos em (12 acima), ao contrário das preposições que
introduzem adjuntos e complementos circunstancias como mostra (14):
(14)
a) * O João, conversei ___ na festa. (Brito, Duarte e Matos, p. 501)
b) [Com o João]i, conversei ___i na festa. (Brito, Duarte e Matos, p. 501)
No PB temos algumas construções de tópico semelhantes às do PE e outras que
se diferenciam. A tipologia adotada nesta dissertação para o PB tem base em Vasco,
1999, 2006; Orsini, 2003; Berlinck, Duarte e Oliveira (2009)2.
2
O estudos das construções de tópico marcado no PB tiveram início com Pontes (1987) e as primeiras
análises empíricas foram desenvolvidas por Callou et alii (1993)
10
(a) Anacoluto: Em relação ao tópico pendente (anacoluto) não há diferença,
encontramos esse tipo de construção tanto no PB quanto no PE. São as que mais se
aproximam das sentenças encontradas em línguas de tópico prototípicas, já que nesse
tipo de estrutura não existe ligação sintática entre o tópico e o comentário; tem-se
somente uma relação semântica, isto é, uma relação de aboutness.
(15)
a) Embora [evitar filho] [eu respeito a igreja]. (Vasco, 2006 - fala popular)
b) [A religião], [ah você deixa de fazer muita besteira]. (Vasco, 2006 fala
popular)
Temos, nos exemplos (15) os tópicos “evitar filho” e “a religião” ligados
apenas por uma relação semântica à sentença comentário.
(b) Topicalização: o tópico possui vinculação sintática com uma categoria vazia no
interior do comentário, de onde teria sido movido. A topicalização é uma estratégia
comum ao PB, havendo, inclusive, na modalidade oral ocorrências de topicalização de
oblíquos com ou sem supressão de preposição, como mostra o exemplo (16b), em que o
SP com valor locativo se movimenta para a posição de tópico, tendo a preposição
apagada.
(16)
a) [Lago]i também acho __i bonito. (Orsini, 2003 fala culta)
b) [Paris]i eu não pago hotel ___i . (Orsini, 2003 fala culta)
(c) Tópico-sujeito: o tópico é reinterpretado como sujeito da sentença, apresentando,
inclusive, concordância com o verbo. Construções como essas são encontradas no PB e
não no PE.
(17)
a) O meu carro furou o pneu. (Pontes, p.35)
b) O seu regime entra muito laticínio? (Pontes, p. 17)
11
Essas estruturas ocorrem com verbos inacusativos e impessoais, que não
projetam argumento externo, estando, portanto, a posição de especificador do Sintagma
Flexional disponível para ser preenchida pelo tópico. O grupo das construções do tipo
tópico-sujeito reúne diferentes estruturas, novas no sistema e que ainda requerem um
refinamento em sua análise.
(d) Deslocamento à esquerda: nas construções de DE, o tópico tem vínculo com um
correferente no interior da sentença comentário. Esse vínculo pode ser com elementos
que desempenhem diferentes funções sintáticas.
(18)
a) [Esse problema de puxar pela criança]i (...) eu acho que issoi não funciona
muito. (fala culta – PB)
b) [Essa lagoa]i, eu tive... conheci elai foi num sábado. (fala culta – PB)
As estruturas a serem trabalhadas aqui são aquelas em que o tópico está
vinculado a um correferente que ocupa a posição de sujeito na sentença comentário, são
os chamados deslocamentos à esquerda de sujeito (DE sujeito). Estruturas como (19),
são frequentes no PB, mas não são comuns no PE:
(19)
a) [Os vizinhos]i, qualquer coisa elesi comunicam à gente [Eri, 3, recontato]3
b) [O assaltante]i, elei tem que pegá e corrê. (Orsini, 2003 fala culta)
O pronome nominativo eles é quem desempenha a função sintática de sujeito
no exemplo (19 a), é com ele que o tópico os vizinhos estabelece a relação de
correferencialidade. Assim como em (19b), o sujeito é ele e é correferente do tópico o
assaltante. Nesse tipo de construção, o tópico pode se apresentar tanto por um sintagma
nominal (exemplo 20 a) quanto por um pronome (exemplo 20 b). E o correferente no
interior da sentença comentário também pode ser um SN (exemplo 21 a) ou um
pronome (exemplo 21 b).
3
Os exemplos identificados desse modo são retirados do corpus do presente trabalho. Informam o nome
do informante, faixa etária e período da entrevista.
12
(20)
a) [O Mike Tyson]i, elei parte pra cima. (SN) [Rei, 3, 2000]
b) [Nós que somos do teatro]i, a gentei sabe disso. (pronome) [Adr, 2, 2000]
(21)
a) [A pessoa]i, muitas vezes, a pessoai não quer nada. [Joa, 4, 2000]
b) [A produção]i, quando sendo uma coisa maior, elai te exije muito. [Adr, 2,
2000]
O trabalho de Braga (1987), que será discutido mais adiante, aponta que as
estruturas de DE sujeito desempenham funções discursivas no sistema. A autora afirma
que o pronome correferente aparece antes do verbo quando o sujeito é longo ou quando
entre eles aparece algum tipo de material interveniente. Sendo assim, esse pronome
funciona “como um lembrete do sujeito ao verbo” (Braga, 1987, p. 114). Entendemos
que, uma vez inserida no sistema, a estrutura de DE sujeito passará a funcionar com fins
discursivos, na visão de Braga (1987), o pronome ocorre para facilitar o processamento
da informação.
Embora as estruturas de DE também estejam presentes em outras línguas
românicas, a sua ocorrência com um tópico correferente ao sujeito não é comum a
todas. Em relação ao italiano Ochs e Duranti (1979 apud Duarte, 1995) assinalam, com
base em análise de dados que não existem construções de DE sujeito. Segundo os
autores, todos os elementos deslocados são coindexados com clíticos, ou seja, trata-se
de uma deslocamento à esquerda clítico, em que o tópico retoma um complemento. A
ausência de DE sujeito é explicada pelos autores pelo fato de o italiano ter como default
o sujeito nulo, graças à rica flexão verbal. Em línguas de sujeito preferencialmente
vazio não seria natural esperar um sujeito “duplicado”, quando o sujeito merece ênfase ou contraste, quem aparece é o pronome fraco.
O trabalho de Rivero (1980 apud. Duarte, 1995) para o espanhol revela que DE
só é atestado em estruturas de “deslocamento à esquerda clítico”, como em (22). A construção de DE sujeito pode ocorrer desde que o pronome receba ênfase ou esteja
numa construção com valor contrastivo. (cf. Rivero (1980) como em (23).
13
(22)
[Al partido carlista]i , dicen que no loi legalizaron para las elecciones.
(Rivero, 1980: 363, apud Duarte, 1995)
(23)
[Juan]i, me dicen [que éli (si) quiere hablar]. (Rivero, 1980 p.363, apud
Duarte, 1995)
Para o francês, por outro lado, Barnes (1986) aponta que 81% dos casos de DE,
obtidos em um corpus oral, foram referentes à retomada do sujeito. A autora afirma que
ocorrências de deslocamento com estruturas que não são sujeito são raras. O trabalho
aponta SNs com traço [+ humano] sendo retomado por pronomes pessoais como o il
conforme mostramos no exemplo (24):
(24)
a) [Nancy]i ellei aimerait beaucoup ça. (Barnes, p. 216)
Nancyi, elai adoraria isso.
b) On était oblige, [le mec]i ili m’a poussée! (Barnes, p. 217)
Fomos obrigados, o carai elei me empurrou!
No geral, a categoria mais comum na posição de tópico é a de pronome
pessoal, sendo o pronome de primeira pessoa o mais frequente (69% dentro da classe
dos deslocamentos com pronome) São estruturas estilo: moi – je como vemos em (25)
(25)
[Moi]i jei bois énormément. (Barnes, p. 209)
Eui eui bebo muito.
Quando temos um SN na posição de tópico, a retomada mais comum, segundo
a autora, é com o clítico impessoal ce ou ça como vemos em (26), os sintagmas com
traço [- animado] só licenciam esse tipo de retomada com demonstrativo.
(26)
a) Moi je trouve que [la cuisine]i ci’est l’endroit le plus important d’une maison. (Barnes, p. 210)
Eu, eu acho que a cozinhai (essa)i é a parte mais importante de uma casa.
14
b) J’avais un philosophe, un type [donc [la matière principale]i ci’est la philosophie.] (Barnes, p.220)
Eu conhecia um filósofo, um tipo cujo assunto principali estei é a filosofia.
Barnes afirma que DE sujeito no francês não se refere exclusivamente a
elementos dados no discurso; pelo contrário, ela pode introduzir elementos novos sem
qualquer função contrastiva ou entoação específica. As sentenças ocorrem
majoritariamente em contexto matriz, porém elas também aparecem em contexto
encaixado, ainda que em menor quantidade, como no exemplo (26 b) acima.
O artigo de Avanzi (2011), escrito, portanto, 25 anos após o de Barnes, nos traz
informações novas sobre as restrições apontadas no texto de 1986. Trata-se de estudo
prosódico sobre as construções de deslocamento à esquerda de sujeito, baseado em 70
enunciados do francês parisiense. Nosso interesse recai sobre os dados apresentados,
que nos permitem rever as informações contidas em Barnes. De fato, pelo que afirma
Avanzi, o traço [-animado] não impede a retomada por um pronome pessoal. A
restrição parece recair sobre o traço [-específico] (nas palavras do autor, um SN que
define uma classe), independentemente do traço de animacidade. Veja-se, por exemplo,
a sentença a seguir, em que o SN “les femmes” (“as mulheres” ou “mulheres”) tem
referência menos específica (ou genérica), sendo retomado por um demonstrativo “ce”, a que o autor se refere como uma forma “intermediária” ou “semilexical”:
(27)
a) [les femmes ]i ci´est toutes des menteuses
[as mulheres]i, essasi são todas mentirosas / [mulheres]i, essasi são umas
mentirosas.
Os demais dados revelam que SNs com o traço [+/-animado], são retomados por
pronomes, desde que com o traço [+específico]. Em (27 b - f), temos exemplos de
tópicos pronominais e nominais com o traço [+h/+espec] em contextos de raiz ou em
encaixadas:
(27)
b) [moi]i jei suis mariée
[eu]i eui sou casada’
15
c) [lui]i ili fasait du roller
[ele]i elei praticava patins (andava de patins, praticava patins, patinava)
d) alors [la plus grande]i ellei s´apelle Guilaine
então [a mais velha]i elai se chama Guilaine
e) [les petits que j´ai]i ilsi sont vraiment très independentes
os [pequenos que eu tenho]i (= meus filhos) elesi são muito independentes
f) je crois [que [Michel] ili il´a perdue ma bague de fiançailles
eu acho que [o Michel]i elei perdeu a minha aliança de noivado
Em (27 g - k), temos os dados que nos fornecem as informações adicionais: tópicos
nominais com o traço [-h/+espec] em contextos de raiz ou em encaixadas:
(27)
g) [l´année universitaire]i elleii commence demain
[o ano universitário]i elei começa amanhã.
h) [les horaires de bac]i ilsi sont fixes effectivement
[os horários do bac]i (vestibular) elesi são rígidos.
i) [tes chaussures de danse]i ellesi ont une particulairité
[teus sapatos de dança]i elesi têm uma peculiaridade.
j) ce comme ça [la vie]i ellei est dure
é assim mesmo [a vida]i elai é dura
k) c´est à dire [que [ ses idées]i au début [eles]i peuvent être três bonnes
isso significa que [suas ideias]i a princípio elasi podem ser muito boas.
Em resumo, o francês parece ter perdido restrição à animacidade para a
retomada pronominal, mas mantém a restrição ao traço [-específico]4
4
Agradecemos à professora Maria da Conceição Paiva, que nos forneceu o texto de Avanzi, além de nos
ter passado uma ocorrência também recente de DE com o traço [-a], num enunciado produzido em janeiro
de 2012 pela presidente do FMI em rede de televisão francesa:
16
1.2 – As construções de tópico marcado na tradição gramatical
As construções de tópico não chamaram a atenção dos gramáticos tradicionais,
já que eles eram influenciados pela sintaxe ocidental. Para tais autores, o português é
uma língua de sujeito-predicado. As estruturas de tópico marcado são, portanto, tratadas
pelas gramáticas normativas ora como casos de objeto pleonástico ora como figuras de
sintaxe.
Cunha e Cintra (2001), Lima (1989) e Bechara (2001), ao apresentarem o
conceito de anacoluto, estrutura em que há uma “quebra na sintaxe”, que hoje corresponde ao que referimos acima como “tópico pendente”, elencam exemplos que
incluem também o que se conhece na linguística contemporânea como casos de
deslocamento à esquerda de tópico pendente, visto haver correferencialidade entre o
tópico e um sintagma no interior do comentário, conforme se verifica nos exemplos:
(28)
a) [Umas carabinas que guardava atrás do guarda-roupa]i, a gente brincava
com elasi, de tão imprestáveis. (Cunha e Cintra, p. 630)
b) Bom! Bom! [Eu]i parece-mei que ainda não ofendi ninguém. (Cunha e
Cintra, p. 631)
c) Olha: [eu]i, até de longe com os olhos fechados, o senhor não mei engana.
(Lima, p. 490)
d) [A pessoa que não sabe viver em sociedade] i, contra elai se põe a lei.
(Bechara, p. 595)
Cunha e Cintra (2001) e Bechara (2001) fazem referência a outro tipo de
construção além dos anacolutos: são estruturas que envolvem os complementos verbais.
Cunha e Cintra afirmam que as construções com objeto pleonástico têm como objetivo
[La croissance]i ellei depend de la confidence.
‘O crescimento ele depende da confiança’
17
enfatizar o objeto, sendo, portanto, figuras de estilo. Encontramos exemplos referentes
tanto ao objeto direto quanto ao objeto indireto:
(29)
a) [As posições]i, conquistara-asi umas após as outras. (Cunha e Cintra,
p.626)
b) [Paisagens]i, quero-asi comigo. (Cunha e Cintra, p.626)
c) [Ao homem mesquinho]i basta-lhei um burrinho. (Cunha e Cintra, p.626)
d) [Ao aluno]i, sempre lhei dei muita atenção. (Bechara, p.422)
Bechara faz referência à topicalização e sua leitura segue a mesma linha dos
outros gramáticos tradicionais. Entende a topicalização como uma simples transposição
de um complemento para a esquerda do verbo. Devido a tal transposição, um clítico
entra na posição deixada pelo complemento.
(30)
[O lobo]i, o caçador oi viu. (Bechara, p. 417)
As estruturas em (29) e (30) assemelham-se às descritas por Brito, Duarte e
Matos (2003) como “deslocamento à esquerda clítico” e não são características do PB
contemporâneo, visto o PB se caracterizar pelo desaparecimento dos clíticos de terceira
pessoa, preferindo objetos vazios. Os autores as consideram como marcas expressivas, o
que as coloca como traços de estilo simplesmente.
1.3 – Os estudos sobre tópico marcado no PB
A partir do trabalho de Eunice Pontes publicado em 1987, o interesse pelas
construções de tópico marcado ganha força no PB. Em seu livro O tópico no Português
do Brasil, Pontes reúne os quatro tipos de construções de tópico, já discutidas na seção
1.1 deste capítulo: anacolutos; tópico-sujeito; topicalização e o deslocamento à
esquerda.
18
A diferença básica entre a topicalização e o DE é a presença ou não de um
pronome cópia no interior do comentário. Especificamente sobre as estruturas que são o
tema desta dissertação, Pontes apresenta uma seção sobre construções com pronome
cópia. Segundo os dados examinados pela autora, essas estruturas apresentaram 100%
dos exemplos com tópico sendo um elemento dado (já mencionado no contexto do
discurso), além disso, quando o tópico é um SN, este é sempre definido, como se
verifica nos exemplos (31 b e c).
Os exemplos são (Pontes, p. 78):
(31)
a) [Ele]i, o livro delei não é lá essas coisas.
b) [Eu acho que esses dois casos do português] i, elesi...
c) [Esse buraco]i, menina, taparam elei outro dia.
d) [E aquele lá]i, não dá pra colar elei?
A autora destaca que não encontrou nenhum caso de DE em que o tópico fosse
indefinido ou genérico. Para ela, o SN tópico nas sentenças de DE funciona como um
elemento coesivo no discurso, seu significado parece ser “falando de SN...” ou “quanto a SN...”. A entonação específica, a pausa ou quebra entonacional são frequentes nas
construções com pronome cópia, apesar de não serem obrigatórias, afirma a autora.
Acerca da curva entonacional das construções de DE, Orsini (2003) mostra que estas
construções se caracterizam pelo fato de, frequentemente, o tópico apresentar uma curva
descendente, seguida de pausa entre ele e o comentário.
É interessante observar que alguns casos de retomada são classificados como
problemáticos. A autora afirma ter dúvidas sobre o status de pronome cópia de
estruturas como (32) (Pontes, p.81):
(32)
a) Eu quero lembrar que [a argumentação] i, eu restringi o sentido dessa
palavrai quando...
b) [Os fiscais]i, essesi, resolviam questões de política e advogavam.
19
c) [Shampoo-Johnson’s]i, essei eu posso usar.
O primeiro caso é uma expressão anafórica que retoma o tópico. Nos casos
seguintes, temos pronomes demonstrativos que, assim como a expressão anafórica,
desempenham o papel de retomar o tópico. Entretanto, a autora se questiona se devem
ser considerados pronomes-cópia ou se estão ali apenas para dar ênfase.
Apesar do questionamento acerca do status do elemento que retoma o tópico,
os casos acima podem ser interpretados como ocorrências de deslocamento à esquerda,
já que, no interior do comentário, há, nessas estruturas, uma espécie de retomada do SN
que está na posição de tópico, embora não sejam exclusivamente pronomes.
Em relação à ocorrência do pronome-cópia, a autora apresenta a hipótese de
que ele seja uma marca morfológica das construções de tópico marcado. Sua presença
foi observada em maior número quando os dados analisados eram de DE sujeito, ou
seja, quando o tópico e o sujeito da sentença comentário são correferentes. Nos casos
em que o tópico é correferente a outros elementos da sentença, a ocorrência de
pronomes-cópia é menor. Observando os exemplos, podemos entender o raciocínio da
autora (Pontes, p. 19):
(33)
a) [Essas regras]i, sejam da base, sejam da ES, elasi são construídas...
b) [Essa competência]i, elai é de natureza mental...
Em casos como (33 a) é possível ver claramente a diferença entre tópico e
sujeito através de suas posições; o tópico ocupa a posição no início da sentença
enquanto o sujeito ocupa a posição no início da oração. Entretanto, seria difícil prever se
um elemento é tópico ou sujeito se ele está no início da oração e da sentença como em
(33 b). O papel do pronome-cópia nesse caso seria o de desfazer essa possível confusão
e caracterizar o tópico.
Pontes entende que a função mencionada acima não é a única a ser
desempenhada pelo pronome-cópia. A autora afirma que, em alguns casos, sua presença
pode ser explicada pela distância entre o elemento à esquerda da sentença e o verbo a
que está ligado. Segundo Pontes, “a análise das construções tópicas nos coloca
20
inevitavelmente no nível do discurso.” Ou seja, o pronome cópia aparece quando o
falante sente necessidade de deixar claro o referente da sentença. Essa conclusão será
ampliada em inúmeros trabalhos realizados a partir do caminho aberto por ela.
Na esteira do trabalho de Pontes, também seguindo uma linha funcionalista
temos o trabalho de Braga e Mollica (1986) e Braga (1987). O primeiro trata de tópicos
marcados e não marcados com o objetivo de testar o efeito de fatores de natureza
discursiva, semântica e psicolinguística nas marcas segmentais ou suprassegmentais que
podem aparecer entre o sujeito e o verbo. A presença de um pronome é entendida aqui
como marca segmental que retoma o sujeito (na nossa análise considerado o tópico) e as
sentenças de DE sujeito são analisadas ao lado das estruturas de sujeito-predicado (que
não apresentam marcas segmentais entre sujeito e verbo). As marcas suprassegmentais
seriam a pausa e a entoação, por exemplo. Entre os contextos apontados pelas autoras
encontram como favorecedores de DE sujeito, estruturas que constituem explicações
(exemplo 34), em geral acompanhadas também de marcas suprassegmentais (aqui
representadas pela vírgula) e as enumerações (exemplo 35) definidas como
“construções em que o sujeito / tópico faz referência aos elementos de um conjunto
relativamente bem delimitado” (Braga e Mollica 1986, p.26).
(34)
porque [o Hulk]i, elei tem um problema. (Braga e Mollica, 1986)
(35)
- Onde você joga futebol?
- Na rua. [Os garotos]i, elesi pintaram, fizeram a área, o meio de campo, aí a
gente ficou lá jogando. (Braga e Mollica, 1986)
Outro fator considerado pelas autoras é o traço semântico do SN tópico ou
sujeito, por exemplo. Elas verificam que o traço [+ humano] favorece marcas
segmentais e suprassegmentais, enquanto o traço [- humano] motiva marcas
suprassegmentais. Isso quer dizer que as retomadas pronominais (DE sujeito) são
favorecidas pelo traço [+humano], informação que poderá ser testada no capítulo 3 da
presente dissertação.
Braga (1987), que focaliza somente os fatores psicolinguísticos (relacionados
ao processamento), trabalha com três variáveis que, por hipótese, condicionariam o
aparecimento de um correferente de natureza pronominal nas construções de DE sujeito.
21
Os grupos de fatores trabalhados foram: (a) número de sílabas do sujeito; (b) presença
de elementos interferentes entre o sujeito e seu predicado; (c) presença de elementos
pós-verbais. A escolha dos grupos parece indicar a suspeita da autora de que quanto
maior a distância entre o sujeito e o verbo, mais difícil fica o processamento da
informação. Por essa razão, o sujeito se manifesta duplamente por meio de um
correferente. Isso significa que a autora trabalha dentro de uma perspectiva funcionalista
– a maior distância entre o “sujeito” e o predicado motivaria a presença do pronomecópia.
Em relação aos dois primeiros grupos, a hipótese foi confirmada. A presença
de sujeitos mais longos ou de material interveniente com maior número de sílabas,
como ocorre na presença de orações relativas, tornam mais provável a presença de
correferente que retome esse sujeito. A presença do pronome, segundo a autora,
“facilita o processamento da informação” (Braga 1987, p.114), que fica prejudicada
pela distância.
(36)
a) [A Ângela de matemática]i, elai é muito ruim. (Braga, p. 107)
b) Mas [o Éder]i, no outro jogo, elei não foi grande destaque. (Braga, p. 109)
No exemplo (36 a), temos um caso classificado como sujeito longo pela autora.
Em (36 b), observamos a presença de material interveniente entre o sujeito e o verbo.
As duas estruturas em questão favorecem a presença de um pronome, que nessa visão
serve para reforçar a identificação do sujeito.
Os resultados referentes a terceira variável nos mostram que a presença do
pronome correferente condiciona o aparecimento de algum elemento pós-verbal,
contribuindo para o equilíbrio da sentença que já estaria muito “pesada” à esquerda devido a “dupla manifestação do sujeito 5”, é o que mostra o exemplo (37).
(37)
[Esse aí]i, elei gosta das coisa muito certa. (Braga, p. 112)
A hipótese de Braga (1987) sobre a influência do tamanho dos sujeitos é
questionada no trabalho de Orsini (2003), em que a autora afirma que a maior parte dos
5
Termo empregado pela autora ao referir-se as construções de DE sujeito.
22
dados encontrados não apresenta um tópico longo (com mais de 7 sílabas) e a
distribuição é equilibrada no que diz respeito a existência de tópicos curtos ou longos
nas diferentes estratégias de construção tópico marcado, ou seja, os tópicos longos não
aparecem somente nos casos de DE. Destaque-se, finalmente, que os trabalhos de Braga
e Mollica (1986) e Braga (1987) se concentram em estruturas com um SN em posição
de tópico. Até o trabalho de Duarte (1995), não temos conhecimento de estruturas de
DE com um pronome em posição de tópico. Foi a partir desse trabalho que surgiria em
1999 o artigo de Kato sobre pronomes fortes e fracos no PB, que será mencionado
juntamente com o trabalho de Orsini, que, dentro de outra perspectiva, faz uma análise
sintática e prosódica dos quatro tipos de construções de tópico presentes no PB. A
autora encontra 314 casos de DE sujeito, o que totaliza 79% de seus 398 dados de DE.
Esse resultado indica a clara preferência por deslocamentos de sujeito em detrimento
dos complementos. Um tipo de dado de DE sujeito muito recorrente no trabalho em
questão foi o seguinte:
(38)
[Eu]i eui trago inclusive de lá.
No que diz respeito a dados como o do exemplo acima, a autora cita Kato
(1999) sobre a emergência de um quadro de pronomes fortes quase homófonos aos
pronomes fracos no PB. Vejamos o paradigma adaptado de Kato (1999):
(39)
Me, I saw him yesterday.
Moi, j´lai vu hier
Eu, eu (o) vi (ele) ontem.
A questão em torno de dados como (38) é se, de fato, tratamos de um caso de
deslocamento à esquerda do sujeito ou a repetição do pronome é simplesmente uma
hesitação do informante.
Como no caso do DE sujeito o tópico está vinculado a essa categoria, Orsini
nos mostra que ele privilegia o traço [+ animado], característico do sujeito, enquanto o
traço [- animado] aparece mais com Top, já que é mais comum ao objeto. O
deslocamento à esquerda privilegia tópicos definidos (86% segundo a autora), no
23
entanto não é uma construção que licencie somente esse tipo de estrutura. Temos abaixo
um exemplo de tópico indefinido:
(40)
[Um apartamento com um banheiro só] i, elei já vale menos. (Orsini, p.127)
O trabalho de Orsini aponta para uma recategorização do PB segundo a
tipologia das línguas de Li e Thompson. Os resultados indicam que compartilhamos um
conjunto de características com as línguas de tópico. Conforme a autora afirma, o PB:
“codifica superficialmente o tópico por meio de uma posição definida na
sentença;
prefere sujeitos plenos a vazios, que só ocorrem em línguas de proeminência
de sujeito;
apresenta construções semelhantes ao tópico chinês, estruturas prototípicas de
tópico -comentário;
estabelece uma relação de correferência entre tópico e comentário, o mesmo
não ocorrendo com o sujeito;
não sofre restrições quanto à natureza do elemento topicalizado;
define a sentença tópico-comentário como sendo básica, isto é, não derivada
6
de outra .” (Orsini 2003, p.178)
Esses seriam alguns requisitos para se caracterizar uma língua de tópico, e o
PB atende a todos eles.
Ainda na perspectiva da Sociolinguística paramétrica, temos os trabalhos de
Vasco (1999 e 2006). Vasco (1999) analisa as construções de tópico marcado no PB e
no PE oral. Uma diferença importante encontrada pelo autor é que o PB apresenta um
número maior de anacolutos que o PE (12% no PB e 7,5% no PE) A baixa frequência,
certamente decorre do fato de o PE ser língua de proeminência de sujeito.
Os resultados encontrados no trabalho de Vasco (1999) são muito interessantes
no que diz respeito à diferenciação das gramáticas do PB e PE. Sobre os casos de
deslocamento à esquerda, o autor constata uma diferença entre os usos nas duas línguas:
no PB encontramos mais sujeitos deslocados (83% contra 34,5% no PE) enquanto no
PE o maior número de deslocamentos é de objeto direto (9,5% no PB e 43,5% no PE).
A diferença encontrada por Vasco para as ocorrências de DE sujeito se explica pelo fato
de o sistema do PB passar por mudanças, principalmente em relação ao Parâmetro do
6
Essa informação se aplica especificamente a algumas sentenças de anacoluto.
24
Sujeito Nulo, que não acontecem no PE. Outro tipo de construção que o autor relaciona
à tendência de o PB preencher os sujeitos é a estrutura de tópico-sujeito que não é
encontrada no PE, como em:
(41)
A casa tem o problema da liberdade. (Vasco, 2006)
Vasco (2006), dando continuidade ao estudo das construções de tópico
marcado, apresenta uma análise da fala popular do PB. O estudo corrobora as ideias do
trabalho anterior, já que vai ao encontro da constatação de que o PB é uma língua mais
próxima daquelas que se caracterizam por ter orientação para o discurso, diferentemente
do que ocorre no PE.
As construções de DE sujeito, de acordo com os dados do autor, estão em
distribuição muito equilibrada quando tratamos da faixa de idade dos informantes
(Vasco 2006, p. 136), o que não nos indica uma mudança em curso no sistema. Assim
como na análise de 1999, as estruturas de DE sujeito são maioria no conjunto das
construções de deslocamento à esquerda em todas as faixas etárias estudadas pelo autor.
É interessante notar que as sentenças de DE sujeito são maioria nos dados, das 1292
frases com tópico marcado 334 são desse tipo, ou seja, 26% do corpus em estudo.
Em relação à natureza do correferente, 77% das sentenças de DE sujeito têm
um pronome reto como retomada, é o tipo mais frequente de acordo com o autor. Essa
retomada com pronome reto não é comum nas outras línguas românicas. Vasco afirma
que no PE isso só ocorre quando o tópico já é um pronome, como em (42):
(42)
[Eu]i, portanto, eui dizia... (Vasco 2006, p.39)
No PB, além de ser licenciada, essa estratégia é muito recorrente seja com
elementos animados ou não na posição de tópico. Esse é mais um traço que distancia o
PB das línguas de sujeito.
Assim como Orsini (2003), Vasco analisa fatores linguísticos como status
informacional do tópico, tipo sintático da oração em que ocorre, natureza do material
interveniente, adjacência sintática entre outros. Seus resultados não se distanciam
muito daqueles encontrados por Orsini em seu trabalho comentado anteriormente, ou
seja, PB culto e popular parecem não diferir muito no que diz respeito às construções de
25
tópico marcado. A sugestiva semelhança nos resultados encontrados é mais bem
descrita em Vasco e Orsini (2007). Nesse trabalho, os dois autores confrontam os
resultados da fala culta e popular para as quatro estratégias de construção de tópico.
Para o deslocamento à esquerda de sujeito, temos uma grande proximidade nos
resultados, 55% na fala culta e 51% na fala popular e, assim como já havia sido atestado
anteriormente, Top e DE estão em distribuição complementar nas duas modalidades de
fala.
Os resultados confirmam a predominância de DE sujeito e Top de objeto direto
no PB, o que já havia sido relacionado com a tendência da nossa língua de preencher
sujeito e apagar objeto. Retomando a discussão em torno do fato de as construções de
tópico serem sentenças básicas nas línguas de tópico, o trabalho em questão apresenta
uma nova distribuição das construções de tópico no PB. Essa redistribuição divide as
estruturas da seguinte maneira: (1) construções de língua de tópico; (2) deslocamento à
esquerda e (3) topicalização. O tipo (1) abrange os anacolutos, os tópicos-sujeito e as
topicalizações sem preposição 7, que agora são consideradas sentenças básicas. As
construções de língua de tópico somaram 35% das estruturas de tópico na fala culta e
39% na fala popular segundo dados do trabalho. A proposta de redistribuição é mais um
passo na interpretação do PB como uma língua que compartilha muitas características
com as línguas de tópico segundo a tipologia de Li e Thompson (1976).
Essa complementaridade entre Top de objeto e DE sujeito no PB tem sido
objeto de estudo desde o trabalho de Callou et alii (1993), tendo sido atestada nos
trabalhos acima citados e em Belford (2006), que desenvolve um estudo comparativo
entre as duas estruturas na fala popular do PB, com base em princípios funcionalistas,
como a informatividade e a contrastividade.
Confirmando os resultados de Braga e Mollica (1986) e Braga (1987), Belford
conclui que a presença de elementos intervenientes favorece a presença de pronomes
correferentes. Das 230 sentenças analisadas pela autora (incluindo casos de DE sujeito +
casos de ordem canônica), 38 têm material interveniente8, o peso relativo evidencia o
favorecimento, como observamos na seguinte afirmação: “o peso relativo (. 91) 7
Topicalizações de oblíquo que perdem a preposição são reanalisadas por esses autores como sentenças
geradas dessa maneira, ou seja, não são fruto de movimento. Exemplo: As freirasi, a gente morria de rir
___i sabe? (PB culto)
8
Estão incluídas nesse grupo sentenças de DE sujeito e sentenças SVO.
26
representa um alto indicativo para o favorecimento de DE quando na presença de
elemento interferente, resultado este encontrado, também, por Braga (1987)”. (Belford
2006, p.72)
A natureza do verbo, a dimensão do SN e o traço de animacidade seriam outros
propulsores das estruturas com correferente. Todos os grupos apresentaram resultados
que confirmam as hipóteses da autora, ou seja, DE sujeito é uma construção favorecida
por verbos nocionais, SNs longos e com traço [+ humano].
Belford tece comentários a respeito da baixa ocorrência de dados de DE
sujeito, o que não corresponde à observação da fala do dia a dia, segundo a própria
autora. No entanto, é importante que se leve em conta o fato de as sentenças de
deslocamento terem sido colocadas ao lado das sentenças SVO como variantes de uma
mesma variável, o que certamente contribuiu para o baixo número de dados
encontrados. Uma observação interessante sobre o corpus utilizado diz que o estilo da
entrevista não favorece DE e sim Top, já que são respostas rápidas e curtas.
O trabalho de Mendes (2009) trata especificamente de construções de DE
sujeito e utiliza os inquéritos do NURC – Salvador para desenvolver um estudo em
tempo real da fala culta daquela região. A autora constata a preferência dos falantes pela
construção de tópico do tipo Deslocamento à esquerda de sujeito com estrutura formada
por sintagma nominal (SN) e retomada anafórica com pronome pessoal de 3ª pessoa.
O trabalho de Decat (1989) é o precursor dos estudos das construções de tópico
numa perspectiva diacrônica. A autora afirma que os trabalhos existentes até aquele
momento tinham se detido no nível sincrônico (como Pontes, 1987). Portanto, ela busca
traçar a trajetória das construções em questão com base em dados coletados de cartas e
diários dos séculos XVIII, XIX e XX.
Nesse trabalho, a diferença entre Top e DE não é levada em consideração. A
autora focaliza a ocorrência das construções de tópico em geral, que, de acordo com ela,
já estão presentes na língua há algum tempo com ou sem pronome cópia. A divisão
estabelecida fica entre construções de sujeito e construções de complemento. No caso
das primeiras, que se aproximam do DE sujeito, a autora destaca “a pequena ocorrência de elemento correferente realizado por pronome pessoal; nesse caso, a correferencia se
estabelecia através de pronomes indefinidos, demonstrativos e mesmo por um numeral”
(Decat 1989, p.117). Observamos esse tipo de correferência no exemplo (43) em que
um demonstrativo retoma o tópico SN.
27
(43)
[O reumatismo]i essei é que (...) parece que me deixará em paz este inverno.
(1864)
Em relação à retomada do tópico com o pronome nominativo, a autora diz que
“essa tendência a inserção do pronome lexical sujeito reflete o resultado da mudança no sistema da língua” (Decat 1989, p.132). Não podemos nos esquecer de que DE com
retomada com pronome pessoal, além de ser uma estrutura mais recente – da segunda
metade do século - certamente ligada à mudança na marcação do PSN, é uma estrutura
da língua oral, sendo evitada (e sistematicamente corrigida) na escrita.
A aproximação do fenômeno das construções de tópico com a inserção no
sistema de novas estratégias justifica-se pelo princípio do encaixamento. Sendo assim,
as construções de tópico do tipo DE sujeito estão relacionadas, segundo Decat, com o
enfraquecimento da morfologia verbal. Essa e todas as outras mudanças encaixadas
observadas no estudo das construções de tópico permitem que a autora chegue à
conclusão de que o PB é uma língua que apresenta características de língua mista, como
já havia sugerido Pontes (1987).
Outros estudos inspirados em Decat (1989) já tentaram traçar o caminho das
sentenças de tópico marcado no PB. Seabra (1994) apresenta um trabalho intitulado
“Uma abordagem diacrônica das construções de tópico em português” em que,
baseada em Decat, desenvolve uma análise de materiais escritos dos séculos XV e XX.
Na mesma linha, Araújo (2006) apresenta um estudo de construções de deslocamento à
esquerda no PE nos séculos XVIII e XIX e do PB, século XIX. Essa autora conclui que,
no período em questão, ainda não era possível observar diferenças sintáticas entre as
estruturas do PE e do PB, o que não nos permite afirmar que uma língua é de sujeito e a
outra de tópico.
No que tange às construções de DE sujeito no PB, estas decorrem, como
dissemos acima, da mudança na marcação do PSN, conforme apontado primeiramente
por Duarte (1995). A autora focaliza o estudo do sujeito e a mudança na marcação do
Parâmetro do Sujeito Nulo (PSN) e tem como objetivo observar a maneira pela qual a
mudança se processa e quais fatores contribuem e quais retardam esse processo. A
28
autora chama essas sentenças de “duplo sujeito9” e afirma que elas são exclusivas de língua não pro-drop.
Duarte (1995) apresenta uma análise das construções no PB falado e observa
que nosso sistema impõe menos restrições sobre o tópico quando comparado a outras
línguas, como o italiano, o espanhol e o francês. Por exemplo, no PB o tópico não
precisa ser necessariamente dado e definido, a autora encontra ocorrências de tópico
indefinido como (44):
(44)
a) Eu acho que [um trabalho]i, elei teria que começar por aí. (Duarte, p.109)
b) [Um homem comum] i elei tem o conforto compatível com a dignidade de
uma pessoa humana, entendeu? (Duarte, p.109)
Observamos que os tópicos um trabalho e um homem comum não apresentam
marcas formais de definitude, ou seja, um artigo ou pronome definido, porém estão na
posição de tópico das estruturas acima sem que isso as torne agramaticais.
A autora também comenta a presença de pronomes de referência arbitrária
ocupando a posição de tópico como o caso de (45) em que o você não possui valor de
segunda pessoa, mas sim uma referência genérica.
(45)
[Você]i, quando vocêi viaja você passa a ser turista... (Duarte, p.111)
O trabalho de Duarte apresenta exemplos da estrutura de DE sujeito sendo
utilizada em contextos de rádio e TV, por exemplo. Isso nos mostra que as construções
estão se espalhando pela fala de toda a comunidade, inclusive na fala mais monitorada.
A autora observa que a preferência pela representação fonética do sujeito pronominal
“...anuncia o afastamento do PB do grupo de línguas de sujeito nulo licenciado por
Agr, ao exibir uma estrutura que essas línguas não exibem.” (Duarte 1995, p.114). A
estrutura parece estar tão bem inserida no sistema que já é possível encontrar dados na
9
Tal nomenclatura é empregada com base na noção de Li e Thompson que entendem existir um sujeito
do discurso e um sujeito da sintaxe
29
escrita, que é uma modalidade mais conservadora. Duarte apresenta exemplos como
(46), (Duarte, p.115):
(46)
a) [A nasalidade fonológica]i, além de opor significados, elai tem uma
interpratação diferente... (prova de estudante universitário)
b) [Eu, a mamãe, o José e o João] i nósi estamos no jantar do banco. (bilhete
escrito por criança de 7 anos)
Apesar dos exemplos de escrita, a construção ainda não se inseriu nessa
modalidade em seu registro mais formal. A autora afirma ter encontrado somente um
dado de jornal da década de 1990 em que o escritor parece ter feito uma retomada
acidental devido à distância entre sujeito e verbo.
Neste capítulo, apresentamos as estruturas de tópico marcado presentes tanto
no PE quanto no PB, com base em gramáticas descritivas, e, de forma mais breve, no
francês, no espanhol e no italiano. Foi descrita a tipologia adotada para a classificação
das construções de tópico marcado. Foram feitas observações específicas sobre as
estruturas de DE sujeito, que são o tema deste trabalho, e discutidas algumas de suas
características básicas. Em seguida, mostramos como as construções de tópico são
tratadas na gramática tradicional e em trabalhos empíricos de cunho sincrônico e
diacrônico no Português Brasileiro. Finalmente, ressaltamos, através do trabalho de
Duarte (1995), que o surgimento dessas construções é reflexo da mudança na marcação
do PSN. Em linhas gerais, os resultados discutidos no capítulo 1 apontam para a
interpretação do PB como uma língua que se afasta das línguas românicas orientadas
para o sujeito e se aproxima das línguas mistas, isto é, línguas com proeminência de
tópico e sujeito.
30
CAPÍTULO 2 – PRESSUPOSTOS TEÓRICOS E METODOLÓGICOS
2.1 – O modelo de estudo da mudança, segundo Weinreich, Labov e Herzog (2006 10
[1968])
No clássico estudo de W, L e H [2006 (1968)], são apresentados os
pressupostos do estudo da mudança linguística dentro da perspectiva variacionista. Os
autores introduzem o conceito de “heterogeneidade ordenada” e afirmam que toda língua sofre mudanças que pressupõem um estágio anterior de variação das formas que
estão competindo na comunidade linguística. Assim, a variação não ocorre de maneira
aleatória: pelo contrário, é estruturada e passível de sistematização, sujeita a um limite
imposto pelo sistema. Por outro lado, as mudanças consolidadas estão “encaixadas” no sistema em que ocorrem, o que significa dizer que deixam vestígios ou consequências,
que não podem ser atribuídos ao acaso.
De acordo com os autores, existem cinco questões que devem ser levadas em
consideração para o estudo da mudança linguística, a saber:
a) A restrição: diz respeito aos fatores linguísticos e sociais que atuam, favorecendo ou
desfavorecendo uma mudança e condicionando seu percurso. Este é um aspecto
extremamente relevante para o presente trabalho, já que estamos refinando a análise dos
contextos em que ocorrem as construções de DE sujeito em dois períodos de tempo
distintos. A questão das restrições permitirá verificar se há contextos que impedem ou
limitam as construções de DE sujeito. Enquanto no francês, por exemplo, construções
de DE sujeito sofrem restrições (Barnes, 1986; Avanzi, 2011), no PB, as descrições até
aqui apresentadas parecem revelar que não há restrições à ocorrência de tais estruturas.
b) A transição: para que haja uma mudança no sistema é necessário um período de
variação. No decorrer deste período, as formas linguísticas alternantes coexistem até
que uma se torna obsoleta e cai em desuso. É importante ressaltar que a mudança é um
10
Utilizo aqui a versão traduzida para o português por Marcos Bagno.
31
processo contínuo e um período de variação pode permanecer por um longo tempo na
língua sem que uma das formas seja eleita pelos falantes.
c) O encaixamento: este aspecto se refere à relação de um fenômeno específico com
outras mudanças que acontecem ou que aconteceram no sistema. Nesta dissertação, o
encaixamento é fundamental, já que a presença das construções de DE sujeito no PB são
evidência da remarcação do valor do parâmetro do sujeito nulo (PSN), visto o sistema
ter passado de [+ sujeito nulo] para [- sujeito nulo].
d) A avaliação: quando duas ou mais possibilidades de uso estão em jogo, os falantes
atribuem um valor positivo ou negativo a cada uma delas. A avaliação varia de acordo
com o fenômeno em questão e influencia muito no rumo da mudança. Ela está
diretamente relacionada ao componente social. Não fizemos teste de avaliação, mas, a
julgar pela frequência dessa estrutura em entrevistas, aulas, exposições em congresso e
programas de televisão, não temos dúvida de que ela não é sujeita a avaliação negativa
nem se encontra no nível de consciência do falante;
e) A implementação: procura entender a razão de uma mudança ocorrer em um dado
momento e em um dado lugar e não em outro momento qualquer e em um lugar
diferente. Permite-nos também observar os contextos que mais prontamente aceitam
uma nova forma bem como os que mais resistem a ela.
Nesta análise sobre as construções de DE sujeito, será desenvolvido um estudo
em Tempo Real de Curta Duração, conforme propõe Labov (1994). Os primeiros
trabalhos variacionistas observavam a mudança em “tempo aparente” ou em “tempo real de longa duração”. O modelo referido como estudo em tempo aparente observa a
mudança através da comparação entre diferentes faixas etárias. Segundo Tarallo (1990),
“O estudo em tempo aparente é feito através de um recorte transversal na amostra sincrônica em função da faixa-etária dos informantes... a variante deve ser
correlacionada aos diversos grupos etários.” No entanto, esse tipo de estudo pode não
traduzir o que efetivamente está acontecendo na comunidade linguística no que se refere
à correlação que deve ser feita entre a variável idade e os indícios de mudança
encontrados, visto que os resultados não esclarecem se o predomínio da variante
32
inovadora na fala do grupo mais jovem é reflexo de uma mudança linguística em
progresso, ou seja, uma forma inovadora que está se instalando na língua, ou se é
apenas decorrente de uma diferenciação etária, ou seja, os falantes alteram seu
comportamento linguístico ao longo da vida, e a análise de grupos mais jovens em
relação aos mais velhos mostra o mesmo comportamento, fato que não significa
mudança no sistema. A solução para este problema estaria, segundo Labov, na
conjugação dos resultados em tempo aparente com os resultados de estudos em tempo
real.
O estudo em tempo real de longa duração tem como objetivo acompanhar o
caminho de um fenômeno variável através de um período mais longo de tempo. Esse
tipo de estudo não está isento de problemas, já que precisa recorrer a textos escritos para
levantar dados de sincronias passadas. A dificuldade está em saber se o material, de
fato, retrata o uso da comunidade linguística da época ou se sofreu, por exemplo,
alterações de edição e pressões por parte das regras prescritas pelas gramáticas
tradicionais (por se tratar de língua escrita). Uma maneira de solucionar parcialmente
esse problema é confrontar dados retirados de textos pertencentes ao mesmo gênero
textual, para que as conclusões sobre as sincronias passadas tenham maior credibilidade.
No estudo em tempo real de curta duração, proposto por Labov (1994),
observa-se a mudança em intervalos de tempo menores. Esse modelo de estudo, que
compreende o Estudo de Painel e o Estudo de Tendência, permite a comparação de duas
ou mais sincronias com intervalos de uma geração pelo menos.
O Estudo de Painel investiga a possível mudança linguística sofrida por um
indivíduo, cuja fala deve ser gravada nos dois intervalos de tempo. Esse modelo é
trabalhoso e demanda muito tempo, já que a primeira amostra deve ser grande o
suficiente para dar conta das eventuais perdas de informantes e dificuldades que
naturalmente se enfrentam no momento de recontactá-los. Então, para que um estudo
desse tipo seja possível, é necessária uma amostra da população em um período X e os
informantes dessa mesma amostra deverão compor a segunda amostra em um período
Y. Uma grande questão levantada nesse tipo de estudo diz respeito ao intervalo de
tempo necessário entre as duas amostras para que seja detectada alguma alteração no
comportamento linguístico do indivíduo. Considera-se que um período de cerca de 18
anos é suficiente, pois representa o espaço de uma geração. (cf. Paiva e Duarte, 2008)
33
O Estudo de Tendência consiste na análise de amostras aleatórias da mesma
comunidade em dois períodos de tempo. Neste modelo, precisamos de indivíduos
diferentes, mas que sejam organizados segundo os mesmos parâmetros nos dois
intervalos de tempo. Esse estudo dá conta do comportamento da comunidade como um
todo, pois entende que, sendo um grupo escolhido de maneira aleatória, ele pode ser a
representação geral da comunidade. Nesse caso, é importante que a comunidade não
tenha sofrido grandes transformações sociais, pois elas podem interferir nos resultados.
Esse estudo é o mais geral e é ele que pode nos fornecer maiores informações sobre
mudanças, já que analisa a comunidade em uma perspectiva mais ampla. Esse modelo
apresenta, entretanto, o problema de não tratar das mudanças no nível do indivíduo, o
que será feito através do estudo do tipo painel.
Entendemos, portanto, que os dois tipos de Estudo em Tempo Real de Curta
Duração não são 100% satisfatórios sozinhos, mas se complementam, como
observamos nas palavras de Paiva e Duarte (2008, p.189) “apenas a conjugação de ambos (painel e tendência) pode fornecer o instrumental metodológico necessário para
elucidar aspectos relativos às duas dimensões da mudança, no indivíduo e na
comunidade...”
2.2 – A Teoria de Princípios e Parâmetros
Para realizar uma pesquisa nos moldes de W, L e H [2006 (1968)], explicitada
na seção anterior, é necessário que se tenha uma teoria linguística, que nos permita
levantar hipóteses e grupos de fatores, buscar e identificar as restrições, a
implementação e o encaixamento da mudança. Na presente pesquisa, levamos em conta
o quadro da Teoria Gerativa de Princípios e Parâmetros.
O modelo de Princípios e Parâmetros (Chomsky 1981) afirma que a Gramática
Universal (componente biológico de todo ser humano) é composta por princípios e
parâmetros. Os princípios são gerais, rígidos e invariáveis, além de serem
compartilhados por todas as línguas do mundo. Tomemos como exemplo o Princípio da
Projeção Estendida, que garante a existência de um sujeito estrutural em todas as
orações, independentemente da língua.
34
Os parâmetros são flexíveis e abertos, podendo ter dois valores; eles são
comutadores linguísticos, segundo Raposo (1992). Sendo assim, marcam a diferença
entre as línguas, podendo ser positiva ou negativamente marcado a depender da
gramática. A fixação do seu valor é determinada pelos dados linguísticos primários.
Tomemos a explicação de Mioto et alii (2007) como exemplo para um tipo de
parâmetro, o Parâmetro da Ordem: em nenhuma língua natural a ordem dos
constituintes em uma sentença é aleatória, ou seja, alguns elementos nucleares serão
precedidos e outros serão seguidos por outros elementos. Tomando o verbo como
núcleo, o autor mostra que em português o verbo é seguido pelo seu complemento
(núcleo inicial). Em japonês, o verbo é precedido por seu complemento (núcleo final).
Desse modo, uma criança, adquirindo o português, fixaria o parâmetro com o valor
positivo ([+ núcleo complemento]) em relação à ordem, diferentemente da criança que
adquire o japonês, que acionará o mesmo parâmetro com valor negativo ([- núcleo
complemento]).
O presente estudo não trata de um fenômeno variável específico, mas entende
que seu objeto de análise se relaciona a um conjunto de mudanças morfossintáticas em
curso no PB, em especial à mudança na marcação do valor do Parâmetro do Sujeito
Nulo. Ou seja, o ponto principal desta dissertação é descrever as construções de DE
sujeito, sob a hipótese de que elas estão encaixadas na mudança paramétrica relacionada
à remarcação do valor do Parâmetro do Sujeito Nulo (descrita na próxima seção), que
ocorre no PB. A união da Teoria da Variação (uma teoria de estudo da mudança) com o
modelo de Princípios e Parâmetros (uma teoria linguística) tem possibilitado grandes
avanços nos estudos de sintaxe (cf. Paiva e Duarte 2003 e 2006).
2.2.1 – Mudanças paramétricas em curso no PB
A mudança pela qual passa o sistema do PB em direção aos sujeitos
preenchidos é atestada nos trabalhos de Duarte (1993, 1995, entre outros). O Parâmetro
do Sujeito Nulo (PSN) é apresentado como um dos princípios da Gramática Universal,
dentro do quadro de Princípios e Parâmetros apresentado acima. Tal princípio prevê que
todas as línguas projetam uma posição de sujeito (cf. Princípio da Projeção Estendida) e
o parâmetro de variação entre elas está justamente no fato de que, em algumas línguas,
35
o sujeito pode não se realizar foneticamente/lexicalmente, enquanto em outras deve ser
obrigatoriamente representado foneticamente, ainda que através de um expletivo lexical,
como é o caso do inglês e do francês. As línguas ocidentais que compartilham a
propriedade de apresentar sujeitos nulos, ou seja, são positivamente marcadas em
relação ao Parâmetro do Sujeito Nulo, costumam exibir um quadro flexional rico. Tal
fato nos faz inferir que a ocorrência de sujeitos nulos se relaciona ao paradigma da
flexão verbal com um número de oposições capazes de licenciar e identificar um sujeito
nulo, como o italiano, o espanhol e o português europeu11.
A trajetória do PB em direção ao preenchimento pronominal está diretamente
ligada ao enfraquecimento das flexões verbais. De acordo com Duarte (1993),
chegamos a um paradigma que apresenta apenas três formas distintivas. Este é usado,
principalmente, por falantes mais jovens que substituíram o pronome nós pelo a gente.
Um quadro flexional mais reduzido exige um maior preenchimento do sujeito. É isto
que ocorre no sistema do inglês, por exemplo, que é uma língua de sujeito
obrigatoriamente pleno e pode ser considerado pobre em flexões verbais.
O percurso dessa mudança não atinge todos os tipos de sujeitos ao mesmo
tempo. Mas o fato é que o PB tem se distanciado do PE, visto que a gramática lusitana
ainda prefere os sujeitos nulos, enquanto o PB preenche cada vez mais a posição do
sujeito nos mais variados contextos. A mudança em direção aos sujeitos preenchidos
segue uma hierarquia de referencialidade, começando a se implementar nos sujeitos de
1ª e 2ª pessoas (que têm o traço inerentemente [+humano]) e prossegue com os de
terceira pessoa, de menor grau de referencialidade, (já que estes podem manifestar os
traços [+/-humano] ou [+/-animado] combinados ao traço [+/-específico]). Os sujeitos
proposicionais, que retomam uma oração, sendo representados nas línguas de sujeito
nulo por uma categoria vazia ou um demonstrativo neutro (“isso”), são afetados mais lentamente, enquanto os sujeitos não argumentais, isto é, os sujeitos das orações
impessoais, são os contextos de maior resistência para o preenchimento pronominal.
Essa hierarquia referencial, reproduzida a seguir, atua na implementação do sujeito
pleno e do objeto nulo e foi proposta por Cyrino, Duarte e Kato (2000).
11
Nas línguas orientais, em que os verbos não têm flexões, o sujeito nulo é licenciado e identificado pelo
tópico (cf. Duarte, 2008)
36
não-argumento
proposição
[±humano]
[+humano]
3 p.
2 p. 1 p.
[±animado] [±específico]
[-ref]< ----------------------------------------------------------------> [+ref.]
(Cyrino, Duarte e Kato 2000, p.59)
Pelo fato de a mudança na marcação do valor do PSN já ter atingido vários
contextos ao longo da hierarquia referencial, é possível afirmar que o PB não se
comporta mais como uma língua de sujeito nulo. Embora não tenha desenvolvido um
expletivo lexical para preencher a posição de sujeito nas sentenças impessoais, utiliza
estratégias como (i) a inserção de algum pronome, como ilustrado em (1 a) ou (ii) o
alçamento de elementos referenciais para a posição de sujeito.
(1)
a) Não é como no Rio de Janeiro que [você] i em cada esquina vocêi tem um
bar pra você tomar um lanche. (fala popular - Duarte, 2003)
b) Não é como no Rio de Janeiro que em cada esquina [-]expl tem um bar pra
você tomar um lanche.
Relacionando as etapas de implementação do sujeito no PB às construções de
DE sujeito, podemos observar, com certa frequência, ocorrências com um tópico de
referência definida retomado por um pronome, como ilustrado em (2):
(2)
a) [eu]i antes de entrá pra escola eui fui alfabetizado [Fla, 3, 2000]
b) [A televisão]i, por incrível que pareça, elai é uma faca de dois gumes.
[Mgl, 4, 8]
Da mesma forma, os sujeitos de referência arbitrária, inerentemente
[+humanos], aparecem com as formas pronominais você e a gente em construções de
DE, ocupando tanto a posição de tópico quanto a de sujeito da sentença comentário.
37
(3)
[Você]i, quando você viaja, [você]i passa a ser turista. (fala culta – Duarte,
1995)
Interessa-nos, ao estabelecer a vinculação entre as etapas de implementação da
mudança no valor da marcação do PSN e às construções de DE sujeito, investigar se
estas deixam de apresentar restrições tanto em relação ao elemento que ocupa a posição
de tópico quanto ao elemento que ocupa a posição de sujeito em virtude do processo de
mudança já estar bastante adiantado, uma vez que estas são reflexo daquela. Também é
relevante observar se há mudança ou não na frequência destas construções com tópico e
sujeito com referentes de 1ª, 2ª ou 3ª pessoa, proposicionais e não argumentais de um
intervalo de tempo para o outro.
Paralelamente à mudança na marcação do parâmetro do sujeito nulo, o PB
apresenta mudança na marcação do Parâmetro do Objeto Nulo (PON), mas em direção
contrária: está se tornando uma língua [+objeto nulo]. O processo de apagamento do
objeto anafórico caminha na direção contrária ao do preenchimento do sujeito. Se
voltarmos ao continuum de referencialidade proposto por Cyrino, Duarte e Kato (2000),
também é possível delinear o percurso dessa mudança que tem os referentes [+
animado] e [+ humano] como os contextos de maior resistência.
A referência ao PON é feita por conta da complementaridade que parece existir
entre as construções de DE sujeito e as topicalizações de objeto no PB, atestada,
primeiramente, por Callou et alii (1993) e confirmada pelos trabalhos de Vasco (1999 e
2006) e Orsini (2003). Um sistema que passa a preferir essa categoria vazia opta pela
estrutura de topicalização, que se caracteriza, justamente, por deixar a posição do
correferente vazia. Essas construções, assim como as estruturas de DE sujeito, são,
portanto, decorrentes de mudanças paramétricas no PB. Em (4), temos um exemplo de
topicalização de objeto direto, em que o tópico é retomado por uma categoria vazia no
interior do comentário e, em (5), uma construção de deslocamento à esquerda de sujeito,
em que o tópico é retomado pelo pronome ele na posição de sujeito.
(4)
E carnei, aqui em casa nós fazemos ____i de várias formas. (fala culta)
(5)
[O leite gelado ou quente]i, elei sola muito o bolo. (fala popular)
38
2.3 – Tipologia das línguas
Li e Thompson (1976) apresentam uma proposta de classificação tipológica das
línguas. De acordo com esses autores, há quatro tipos de línguas, que se distinguem
segundo o tipo de estrutura sintática mais recorrente: sujeito – predicado ou tópico –
comentário.
Apesar de, segundo os autores, a noção de sujeito sempre ter sido considerada
a básica, seu clássico artigo defende a ideia de que algumas línguas se estruturam em
torno da relação tópico – comentário. Sendo assim, as línguas podem se diferenciar no
que diz respeito às estratégias de construção de sentenças: algumas apresentam
proeminência de sujeito; outras, proeminência de tópico.
Os quatro tipos básicos de língua são:
(a) línguas com proeminência de sujeito – aquelas em que a estrutura das sentenças
favorece uma descrição com base na relação gramatical sujeito-predicado. Exemplo:
indonésio;
(b) línguas com proeminência de tópico – aquelas em que, ao contrário do modelo
anterior, a relação tópico-comentário determina a estrutura das sentenças. Exemplo:
chinês e lisu;
(c) línguas com proeminência de tópico e de sujeito – as que exibem, com igual
importância, os dois tipos de construção sentencial: sujeito - predicado e tópicocomentário. Exemplo: japonês e coreano;
(d) línguas sem proeminência de tópico e de sujeito – línguas em que sujeito e tópico
se misturam, deixando de ser categorias distintas. Exemplo: tagalog e illocano.
Os autores destacam que a sentença básica de cada tipo de língua (tópico comentário ou sujeito - predicado) não bloqueia a existência do outro tipo de estrutura,
fato que se comprova pela presença de construções de topicalização em línguas de
proeminência de sujeito. A questão é que “algumas línguas podem ser mais 39
criteriosamente descritas tomando o conceito de tópico como básico, enquanto outras
são descritas com mais critério com base na noção de sujeito” 12 (1976, p. 60).
As línguas de tópico compartilham as seguintes características, quando
comparadas as com proeminência de sujeito: (a) codificam superficialmente o tópico,
seja por apresentar uma marca morfológica, seja por ele ocupar uma posição específica
na sentença; (b) rejeitam construções passivas, bloqueando-as ou caracterizando-as
como estruturas marginais; (c) autorizam sujeitos vazios, em estruturas em que o
sujeito não carrega papel semântico, preferem manter a posição vazia à preenchê-la com
um expletivo; (d) manifestam grande frequência de duplos sujeitos13: sentenças em
que o tópico não tem qualquer relação com o verbo são básicas e frequentes; (e)
controlam a correferência: nas línguas de tópico, a correferência com constituintes
apagados é controlada pelo tópico e não pelo sujeito; (f) apresentam verbo em posição
final: as línguas de tópico tendem a deixar o verbo nessa posição; (g) não impõem
restrições sobre o tópico: qualquer constituinte pode ocupar a posição de tópico; (h)
apresentam construções de tópico como sentenças básicas: as estruturas com tópico
não são derivadas.
Os critérios que estabelecem distinção entre tópico e sujeito são sete: (a)
definitude - o sujeito, ao contrário do tópico, não precisa ser necessariamente definido;
(b) relações selecionais - o tópico é uma categoria que não precisa estabelecer qualquer
relação com o verbo da sentença, ao contrário do que ocorre com o sujeito, que é
selecionado pelo predicador, verbal ou nominal; (c) o verbo determina o sujeito, mas
não o tópico - o tópico não é determinado pelo verbo, visto tais categorias não
estabelecerem qualquer tipo de relação; (d) papel funcional - o sujeito, diferentemente
do tópico, pode não desempenhar papel algum na sentença (é o que ocorre com os
sujeitos expletivos lexicais, como it ou il, em inglês e francês, respectivamente,
referidos na literatura gerativista como empty ou dummy subjects); (e) concordância
verbal - a concordância do sujeito com o verbo é obrigatória em algumas línguas,
12
No original: “Our typological claim will simply be that some languages can be more insightfully
described by taking the concept of topic to be basic, while others can be more insightfully described by
taking the notion of subject as basic.”
13
Para os autores, o termo duplo sujeito significa o que chamamos, neste trabalho, de construção de
anacoluto. Em Brito, Duarte e Matos (2003), as estruturas são denominadas sentenças de tópico pendente.
Ex: Fish (tópico), red snapper (sujeito) is delicious. (japonês) – Peixe, o red snapper é delicioso.
40
enquanto a concordância do tópico com o predicador é rara; (f) posição inicial na
sentença – o tópico, por ser uma categoria discursiva, fica preferencialmente na posição
inicial, ao contrário do sujeito, que pode ter maior liberdade dentro da sentença; (g)
processos gramaticais - só o sujeito atua em processos como a reflexivização e
passivização; o tópico não tem relação com tais processos.
De acordo com os autores, é papel do tópico e não do sujeito limitar a
aplicabilidade da predicação a um domínio restrito. Ou seja, o tópico remete ao ser
sobre o qual se declara algo, logo ele é o “centro das atenções” da estrutura em que ocorre. Essa função pode coincidir com a do sujeito sintático, pois, nas construções de
tópico marcado, há duas categorias: o tópico e o sujeito. Quando não se tem um tópico
marcado há coincidência entre tópico e sujeito, como mostrado no capítulo 1. O
exemplo (6) ilustra essa situação:
(6)
Os meninos correm muito.
Li e Thompson apresentam a proposta de que as línguas estão distribuídas ao
longo de um continuum cujas extremidades são línguas com proeminência de tópico e
línguas com proeminência de sujeito. Desta forma, as línguas se distribuem neste
continuum em função de suas características pertinentes às categorias de tópico e de
sujeito: algumas estão mais próximas das línguas de sujeito, como o inglês, enquanto
outras, como o lisu, dialeto pertencente à família das línguas sino-tibetanas (falado na
Ásia), estão mais próximas das línguas orientadas para o discurso (línguas de tópico).
Existem línguas que estão no meio do continuum, como o japonês, que seriam aquelas
descritas como línguas com proeminência de tópico e de sujeito. Trabalhos
desenvolvidos no Brasil desde inícios dos anos 80, incluindo o estudo pioneiro de
Eunice Pontes, apontam para o fato de o PB ser uma língua desse tipo, em que as
noções de tópico e de sujeito são igualmente importantes, já que o sistema compartilha
algumas características com as línguas de tópico, como, por exemplo, a existência de
sentenças de anacoluto (duplo sujeito, nos termos de Li e Thompson). Em (7), reúnemse construções desse tipo retiradas dos trabalhos de Vasco (1999 e 2006) e Orsini
(2003):
(7)
a) [Corrida de cavalo], [eu] nunca fui ao jóquei clube (Orsini, 2003-fala culta)
41
b) [Quem faz Letras], [vocês] devem ter esse conhecimento... (Vasco, 2006fala popular)
c) [Doce], [eu] gosto de gelatina, gosto de pudim... (Orsini, 2003 - fala culta)
Esse tipo de estrutura é tomado por Li & Thompson como um “medidor” da localização das línguas ao longo do continuum. Quanto mais anacolutos uma língua
apresenta, mais próxima ela está das línguas de tópico.
As construções de tópico-sujeito evidenciam a relação não discreta entre as
categorias de sujeito e tópico, corroborando a interpretação de Li e Thompson de ser o
sujeito um tópico gramaticalizado, ou seja, existe uma relação diacrônica entre as duas
categorias. No processo de gramaticalização, algumas propriedades do tópico são
enfraquecidas e as estruturas se integram aos verbos, ganhando traços característicos de
sujeito (como a capacidade de entrar em relação de concordância com o verbo, nas
línguas que exibem morfologia de concordância). As sentenças denominadas tópicosujeito (cf. Vasco e Orsini, 2007) que ocorrem no PB seriam evidências dessa
integração como mostram os exemplos abaixo retirados de Pontes (1987, p.35):
(8)
a) O meu carro furou o pneu.
b) O jasmim amarelou as pontas.
c) Essas janelas ventam muito.
Em casos como os ilustrados acima, o tópico é reanalisado como sujeito, o que
se evidencia pela concordância que pode acontecer entre verbo e tópico. A frase, Essas
janelas ventam muito, por exemplo, poderia ser proferida, segundo Pontes (p.36), em
oposição a “Venta muito por essas janelas”. É por essa razão que, em algumas línguas,
propriedades do tópico são compartilhadas pelo sujeito.
O seguinte esquema é apresentado pelos autores (Li e Thompson 1976, p. 485):
42
Tp
(A) topic notion integrated into basic sentence structure; topic and
subject are distinct
(D)
Both Tp and
Sp
topic
sentences
become
less marked,
more
basic
(B)Nei
ther Tp nor Sp
topic becomes
more closely
integrated into
case
frame of verb
Sp
(C) topic has become integrated into case frame of verb as a subject;
subject and topic often indistinct, subjects having some non-topic
properties; sentences with clear topics are highly marked
Observamos no esquema um comportamento circular das estruturas, ou seja:
(A) Línguas de tópico - a noção de tópico integrada na estrutura sentencial
básica; tópico e sujeito distintos > (B) Línguas sem tópico e sujeito - o tópico se torna
mais estreitamente integrado à estrutura argumental do verbo > (C) Línguas de sujeito o tópico se tornou integrado à estrutura argumental do verbo como um sujeito; sujeito e
tópico são frequentemente indistintos, sujeitos apresentam algumas propriedades de
não-tópico; sentenças com tópicos claros são fortemente marcadas > (D) Línguas de
tópico e sujeito – as sentenças de tópico se tornam menos marcadas, mais básicas >
(A)...
É inegável que o PB apresente características de língua de sujeito e a maior
parte das nossas sentenças siga o padrão SVO, porém a existência de traços
compartilhados com as línguas de tópico também é um fator que merece análise. O PB
além apresentar construções de tópico marcado, inclusive as do tipo anacoluto, reúne
outras características de língua de tópico como: a codificação superficial do tópico por
43
meio de uma posição específica na sentença e a não imposição de restrições sobre o
elemento na posição de tópico.
No que tange às construções de deslocamento à esquerda, objeto de estudo
deste trabalho, Li e Thompson apresentam várias sentenças de DE sujeito retiradas das
línguas orientais. Nestes dados em (9), observamos diversos tipos de elementos
ocupando a posição à esquerda.
(9)
a) Net - ben shu yijing chuban le (mandarim) (1976, p. 479)
[Esse livro]i (tópico), [esse]i já foi publicado.
b) Ibu anak itu , die membeli sepatu (indonésio) (1976, p. 470)
[A mãe daquela criança]i (tópico), [ela]i comprou sapatos.
c) Tamen shed dou bu lai (mandarim) (1976, p. 481)
[Eles]i (tópico), [nenhum deles]i está vindo.
d) ana nya lathyu khu – a (lisu) (1976, p. 472)
[Cães]i (tópico), [eles]i mordem as pessoas.
Nas sentenças acima, podemos encontrar tópicos definidos, como nos dois
primeiros exemplos, mas encontramos também tópicos pronominais, caso do terceiro
exemplo, e, no último exemplo, um tópico sem qualquer marca formal de [+definido].
Em relação ao traço de definitude do tópico, construções do tipo anacoluto,
apontadas como características de línguas de tópico pelos próprios autores, também
aparecem no texto com tópicos indefinidos formalmente, como observamos no exemplo
abaixo:
(10)
a) Gakko-wa (tópico) buku-ga (sujeito) isogasi-kat-ta (japonês) (1976, p.462)
Escola (tópico), eu estava ocupado.
b) ho o na - qho yi ve yo (lahu) (1976, p. 468)
Elefantes (tópico), os narizes são grandes.
44
Sentenças como essas nos mostram que até mesmo em línguas orientais com
proeminência de tópico, como o lahu, e com proeminência de tópico e sujeito, como o
japonês, encontramos casos de tópicos sem marcas formais de definitude. A posição dos
autores em relação à definitude é a de que tópicos com referência genérica são
definidos, pois pertencem a uma classe de itens conhecida e identificada pelo falante
através do contexto. Sendo assim, nos exemplos em (9 d) e (10) teríamos tópicos
definidos contextualmente, ainda que sem marcas formais. Os autores não apresentam
uma distinção entre os conceitos de definitude e de especificidade. Na visão deles,
definitude se refere ao âmbito contextual. Sendo assim, tal conceito acaba se
sobrepondo ao âmbito formal, já que os exemplos não apresentam marcas formais
quanto ao traço [+definido], mas são considerados definidos pelo contexto.
Orsini (2003) estabelece uma diferenciação entre os traços de definitude e
especificidade. Nesse trabalho, a autora considera os artigos definidos, os pronomes
demonstrativos, possessivos e pessoais, os nomes próprios, os quantificadores
universais e os plurais com numerais como marcas de um referente [+ definido]. Os
artigos indefinidos, quantificadores existenciais, plurais sem artigo e ausência de marca
são interpretados como marcas de [-definido]. Isso significa dizer que os referidos
exemplos seriam tópicos indefinidos, já que se trata de nomes nus.
A presente dissertação se concentra na questão da especificidade, entendida
como um aspecto de natureza semântica e de natureza formal (associa-se o sentido a
presença ou ausência de marcas de definitude). A presença do traço [+ específico]
indica que o falante se refere a um objeto único, enquanto sua ausência (traço [específico]) indica que o falante faz referência a um conjunto ou grupo.
2.4 – Objetivos e Hipóteses
Tomando por base o estudo empírico de Duarte (1995) sobre o comportamento
do PB em relação ao Parâmetro do Sujeito Nulo e o princípio do encaixamento da
mudança linguística de W, L e H [2006 (1968)], ambos já discutidos acima, este
trabalho objetiva investigar as construções de DE sujeito, em dois períodos distintos de
tempo, na fala popular carioca, tendo em vista que o PB era [+ sujeito nulo] e passou a
ser [- sujeito nulo].
45
Pretendemos, portanto, refinar a análise (a) do tipo de elemento que pode
ocupar a posição de tópico e (b) da natureza do correferente (elemento cópia) na posição
sintática de sujeito. Os resultados aqui obtidos contribuirão para o incremento da
discussão em torno do status do PB no que se refere à tipologia das línguas proposta por
Li e Thompson (1976). Trabalhos anteriores sobre as construções de tópico marcado
(Pontes, 1987; Vasco e Orsini, 2007), ao analisarem o PB com base nessa tipologia,
apontam para o fato de nosso sistema não se comportar como uma língua de
proeminência de sujeito, apresentando características que o aproximam das línguas de
tópico.
Observaremos se a hierarquia de referencialidade, proposta para o percurso da
mudança na marcação dos valores dos parâmetros do Sujeito Nulo, atua no fenômeno de
DE sujeito, havendo, por hipótese, no segundo período de tempo estudado, uma maior
diversificação da natureza gramatical e do traço semântico do tópico retomado na
posição de sujeito.
Por estar se tornando uma língua de sujeito preenchido, o PB aceita as
estruturas de DE sujeito assim como o francês. No entanto, nossa língua difere destas no
que diz respeito à sua orientação, nos termos de Li e Thompson (1976). O PB parece se
comportar como uma língua mista, em que tópico e sujeito são igualmente importantes
e, por isso, licencia uma variedade maior de estruturas para ocupar a posição de tópico.
Ou seja, o PB parece apresentar menos restrições a esse tipo de estrutura do que as
outras línguas românicas de sujeito preenchido.
A hipótese que norteia esta análise é a de que pronomes pessoais e SNs,
definidos ou não, podem ocorrer na posição de tópico e podem ser retomados por um
pronome nominativo ou outro SN, o que indicaria a ausência de restrição, havendo, em
função do percurso da mudança na marcação do valor do PSN, um aumento da
frequência de construções com SN na posição de tópico no segundo período investigado
e consequente diminuição das estruturas de DE sujeito com pronomes na posição de
tópico.
46
2.5 – Procedimentos Metodológicos
A metodologia de trabalho a ser desenvolvida aqui é a de um Estudo em
Tempo Real de Curta Duração – Estudo de Tendência e de Painel - nos moldes de
Labov (1994), já apresentado na seção 2.1 deste capítulo.
Os dados deste trabalho foram submetidos ao programa Goldvarb 2001. Não
empreendemos uma análise com base em pesos relativos porque a escolha entre DE
sujeito com tópico SN ou DE sujeito com tópico pronome não constitui uma regra
variável. A análise aqui desenvolvida pressupõe um levantamento de grupos de fatores
linguísticos e extralinguísticos utilizados na codificação e processamento dos dados.
Tudo isso foi feito seguindo os passos da Sociolinguística Quantitativa Laboviana (cf.
Guy e Zilles, 2007).
2.5.1 – A Amostra
A amostra utilizada neste trabalho é composta por entrevistas sociolinguísticas
do acervo do Projeto PEUL14 (Programa de Estudos Sobre o Uso da Língua – UFRJ).
Os informantes são do Rio de Janeiro e não possuem nível superior completo de
escolaridade, caracterizando-se como uma amostra de fala popular. As entrevistas estão
divididas de acordo com gênero, faixa etária e escolaridade. Em relação à faixa etária,
temos quatro subgrupos: 7-14 anos; 15-25 anos; 26-49 anos e acima de 50 anos. Quanto
à escolaridade, os indivíduos são divididos de acordo com os anos de estudo: 5-8; 9-11
ou mais de 11 anos de estudo. O banco de dados do projeto disponibiliza três grandes
amostras de fala, que serão por nós utilizadas, a amostra Censo que abrange entrevistas
realizadas na década de 1980 e duas amostras posteriores realizadas em 2000 (cerca de
19 anos depois). Uma delas é o Recontato e a outra é uma nova amostra com indivíduos
que não fizeram parte das gravações nos anos 80.
As tabelas a seguir mostram a distribuição dos indivíduos por célula para o
Estudo de Tendência:
14
www.letras.ufrj.br/peul
47
Escolaridade
5-8 anos de
escolaridade
9-11 anos de
escolaridade
+11 anos de
escolaridade
ANOS 80
Gênero
Masc
Fem
Masc
Fem
Masc
Fem
7-14 15-25 26-49
SAM
SEB
ADRL
LEI
JOA
ALE
PAU
VAS
ADR
FAT
ARI
LEO
DAV
SAN
EVE
+50
JAN
JOSS
NAD
CAR
MGL
Tabela 2.1: Distribuição dos informantes – Estudo de Tendência – Anos 80
Escolaridade
5-8 anos de
escolaridade
9-11 anos de
escolaridade
+11 anos de
escolaridade
ANO 2000
Gênero 7-14
Masc
Fem
MCA
Masc
RAF
Fem
ROB
Masc
Fem
-
15-25
AND
ADR
ISA
GIL
GLA
26-49
REI
SIM
JOR
ANA
ADRI
FLA
+50
JOA
ZIL
RAM
MAR
TAD
EUC
Tabela 2.2: Distribuição dos informantes – Estudo de Tendência – Ano 2000
Os informantes utilizados para o Estudo de Painel estão dispostos de acordo
com a tabela 2.3 e 2.4. Eles foram separados em dois grupos: no primeiro grupo, estão
informantes que tiveram mudança no nível de escolaridade de um período para outro e,
no segundo, estão os que mantiveram o mesmo nível de escolaridade:
ANOS 80
ANO 2000
Anos de
Anos de
Informante
Idade
Idade
escolaridade
escolaridade
Eri59 F
9
5-8
25
9-11
Adr57 F
10
5-8
26
5-8
Adr63 F
12
5-8
28
+11
Fat23 F
15
9-11
33
+11
San39 F
15
9-11
33
+11
Leo38 M
18
9-11
36
+11
Tabela 2.3: Distribuição dos Informantes – Estudo de Painel – Indivíduos com mudança
de Escolaridade
48
ANOS 80
ANO 2000
Anos de
Anos de
Informante
Idade
Idade
escolaridade
escolaridade
Jup06 F
18
5-8
35
5-8
Lei04 F
25
5-8
43
5-8
Dav42 M
31
9-11
48
9-11
Jos26 M
32
5-8
48
5-8
Eve43 F
42
9-11
59
9-11
Mgl48 F
52
9-11
70
9-11
Jan03 M
56
5-8
74
5-8
Nad36 F
57
5-8
74
5-8
Joss35 F
59
5-8
75
5-8
Ago33 M
60
5-8
77
5-8
Tabela 2.4: Distribuição dos Informantes – Estudo de Painel – Indivíduos sem Mudança
de Escolaridade
2.6 – Os Grupos de Fatores
Apresentamos a seguir os grupos de fatores levantados para a análise das
construções de DE sujeito. A escolha dos mesmos foi feita com base (a) em estudos
anteriores sobre as construções de tópico no PB (Pontes, 1987; Orsini, 2003; Vasco.
2006) e (b) na hierarquia de referencialidade. Os grupos de natureza linguística foram
elaborados, principalmente, no sentido de oferecer uma caracterização (i) do tipo de
elemento que ocupa a posição de tópico (a estrutura interna do tópico representado por
SN; natureza gramatical do tópico; o traço e a especificidade do tópico e (ii) do
elemento correferente que ocupa a posição de sujeito (sua natureza gramatical) e (iii) do
contexto sintático em que ocorre a estrutura de DE sujeito (configuração sintática da
estrutura em que ocorrem tópico e correferente). Além dos citados acima, há ainda o
grupo presença vs ausência de material interveniente cujo objetivo é levantar a
frequência da presença x ausência de elementos entre o tópico e o sujeito, bem como a
sua natureza, quando ocorrem. Uma vez que desenvolvemos um trabalho baseado no
modelo da Sociolinguística, grupos de fatores sociais também foram levados em
consideração.
Elegemos como variável dependente o fato de a posição de tópico ser ocupada
ou por um pronome ou por um sintagma nominal. No que tange aos tópicos
49
pronominais, estes podem ser preenchidos por um elemento nominativo ou
demonstrativo.
(11)
[Ele]i antes de ir elei chamou a polícia. [Joss,4,8]
(12)
[Esse daí]i, essei gosta de peixinho. [Jan,4,8]
Os tópicos em (11) e (12) são, respectivamente, um pronome nominativo e um
pronome demonstrativo.
A outra possibilidade de realização da variável dependente é como um SN.
Nesse caso, o tópico pode ser um SN simples ou complexo.
(13)
[Meu primo]i, elei joga no Botafogo. [Sam,2,8]
(14)
[A pessoa que tem uma religião]i, elei antes de fazer qualquer coisa ele pensa.
[Joss,4,8]
Temos em (13) um exemplo de tópico com SN simples e em (14) um tópico
com SN complexo, já que o núcleo pessoa é modificado por uma oração relativa.

Natureza gramatical do tópico
Esse grupo reúne todas as categorias gramaticais presentes na hierarquia
referencial proposta por Cyrino, Duarte e Kato (2000). Ele é fundamental para que, ao
cruzarmos com a natureza do correferente, possamos ter uma descrição detalhada das
possíveis combinações que a língua permite, bem como quais são os contextos
favorecedores para cada um desses cruzamentos. Esperam-se encontrar ocorrências de
tópico representando todas as categorias propostas, já que trabalhamos com a hipótese
de ausência de restrição por parte do sistema.
(a) Pronomes de 1ª pessoa (singular e plural)
(15)
[Eu]i, logicamente, isso eui não posso dizer pra você. [Dav,3,8]
50
(b) Pronomes de 3ª pessoa (singular e plural)
(16)
[Ela]i, quando a gente começa a querer fazer física, elai tem que se pentear.
[Eri,1,8]
(c) Pronomes com referência arbitrária
(17)
[Você]i a partir de vinte e nove anos vocêi é considerada velha. [Ana,3,0]
(d) Pronomes demonstrativos
(18)
[Esse]i, na primeira elei morreu. [Jan,4,8]
(e) Sintagmas nominais
(19)
[Os carros da Globo]i, elesi vêm em cima da calçada. [Lei,2,8]

Estrutura interna do tópico representado por SN
Esse grupo reúne 3 subfatores e tem como objetivo descrever a constituição do
SN que está na posição de tópico. A descrição feita baseia-se na terminologia proposta
por Brito, Duarte e Matos (2003). Nossa hipótese é a de que qualquer SN pode ocupar a
posição de tópico, tenha ele a margem esquerda preenchida ou não.
(a) Determinante ou quantificador + nome - SNs preenchidos à esquerda
(20)
[O professor Aragão]i, elei tinha xis cruzeiro pra gastar no que ele precisasse.
[Vas,3,8]
(b) Determinante ou quantificador + nome + modificador ou complemento – SNs
preenchidos à esquerda e à direita
(21)
a) [A Ângela de matemática]i, elai é muito ruim. [Eri,1,8]
51
b) [o cara que estuda letras]i, p..., na França elei não faz francês. [Fla, 3, 2000]
(c) Nome nu – SN sem preenchimento em qualquer uma das margens
(22)
[Robalo]i, robaloi aqui é comum. [Jan,4,8]

Natureza gramatical do correferente
O grupo em questão trata de todas as possibilidades de retomada encontradas
em nosso corpus. Como trabalhamos apenas com casos de DE sujeito, os correferentes
sempre serão relativos a essa função. Eles podem ser:
(a) SN
(23)
[A Cláudia]i ah! a Cláudiai foi discutir [com a]- [com a]- com a dona Márcia.
[Joa, 3, 80]
(b) Pronome nominativo
(24)
[O doutor Luis]i, elei é diretor desse posto de saúde. [Mgl,4,8]
(c) Pronome demonstrativo
(25)
[Esse negócio de contrato]i, issoi dura pouco né... [Jor,3,0]
Esse grupo é extremamente relevante para que possamos cruzar as estratégias
de retomada possíveis com a natureza do tópico, bem como delinear a natureza
morfológica dos correferentes. O nominativo é a categoria mais esperada no caso desse
grupo, uma vez que estamos tratando da posição de sujeito. Entretanto, outras estruturas
não são bloqueadas pelo sistema.
52

Presença vs ausência de material interveniente
O grupo que trata do tipo de material interveniente entre tópico e correferente é
um fator recorrente nos trabalhos relativos a construções de tópico marcado no PB
desde o trabalho de Braga (1987). Esse estudo constatou que a presença de material
interveniente entre tópico e comentário favorece a ocorrência de retomadas nas
construções de DE sujeito por distanciar o tópico do verbo da sentença. Por meio deste
grupo, será possível observar, além da natureza do material interveniente, a frequência
com que ele ocorre, em confronto com a ausência de qualquer tipo de material. Foram
levantados os seguintes subfatores:
(a) Interrupção
(26)
[Eu]i <fo...> eui falo o que é mau e sei que eu falo também o que é bom. [Leo,
2, 8]
(b) Marcador discursivo
(27)
[O Brasil] i, veja bem, elei começou a ser migrado por baixo. [Tad,4,0]
(c) Expressão adverbial
(28)
[A minha mãe]i, muitas vezes, elai gosta de opinar na vida dos filhos. [Dav, 3,
8]
(29)
[Ele]i pra mim elei é mais carinhoso. [Eri, 1, 8]
(d) Sintagama oracional (oração finita ou não finita)
(30)
[Tad,4,0]
[Eu]i ganhando na loteria um bom dinheiro eui começaria pela parte social.
53

O traço semântico e a especificidade do tópico
Este grupo investiga os traços [+/- animado], [+/- especificífico] e [+/humano] dos SNs e pronomes de terceira pessoa que ocupam a posição de tópico.
Cruzando os resultados deste grupo com o anterior, será possível observar o percentual
de ocorrência das construções de DE sujeito, nos dois períodos estudados, ao longo do
continuum de referencialidade de Cyrino, Kato e Duarte (2000). Esse grupo reúne as
seguintes combinações:
(a) [+ humano; + específico]
São casos em que o tópico apresenta traços de pessoa determinada.
Entendemos aqui a questão da especificitude nos termos de Du Bois (1980, apud Orsini,
2003) para quem esta noção está associada ao fato de o falante ter em mente um objeto
único, determinado, ainda que o ouvinte não possa reconhecê-lo; por outro lado, a
ausência de especificitude caracteriza um objeto não identificável, já que o falante tem
em mente um conjunto.
(31)
a) [O Luís Carlos]i, eu acho que elei é filho da Isolda. [Adr,1,8]
b) [Ela]i, acho que (inint) elai falô que já era o terceiro assalto dela. [Sim, 3,
2000] (falando de uma senhora que foi assaltada)
(b) [+ humano; – específico]
O tópico apresenta o traço [+ humano], porém a referência é genérica. As
ocorrências aqui, em sua maioria, fazem referência a grupos de pessoas ou pessoas
indeterminadas.
(32)
[O carioca]i eu acho que elei fala muito errado. [Mar,4,0]
(c) [- humano; + específico]
Nesse grupo, estão os tópicos que fazem referência a animais, definidos na
situação de comunicação.
54
(33)
Mas [o peixe daqui]i, elei vai frito, vai cozido, ensopado com batata. [Jan,4,8]
A combinação [– humano; + específico] se assemelha ao próximo grupo, que
inclui os tópicos com traço [- humano] e [- específico]. Ambos tratam exclusivamente
de animais, já que separamos os sintagmas em humanos e animados.
(d) [- humano; – específico]
(34)
Às vezes [um peixe inferior]i, elei pode ficar muito bom. [Jan,4,8]
(e) [– animado; + específico]
Para esse grupo, foram considerados os dados que apresentam um tópico não
humano e com referência definida.
(35)
[A Beija flor]i, todo ano elai é campeã. [Dav,3,8]
(f) [– animado; – específico]
Temos, por fim, o grupo que abarca os tópicos não humanos com referência
genérica.
(36)
a) [Uma viagem pra Brasília]i, elai é super bem vinda. [San,3,R]
b) Mas [ela]i crua, elai é mais saudável [Jan, 4, 80] (falando de ostras)
Construções do tipo (e) e (f) são muito relevantes para este trabalho, já que são
ocorrências de um tópico não humano sendo retomado por um pronome nominativo.

Configuração sintática da estrutura em que ocorrem tópico e seu
correferente
O objetivo desse grupo é determinar em que contextos sintáticos aparecem as
construções de DE sujeito. Com base na nossa hipótese de que o PB não tem restrições,
é esperado que elas apareçam inclusive em contextos de subordinadas, diferenciando-se
do PE que não licencia tal estrutura.
55
(a) DE na sentença matriz
(37)
[Minha cunhada]i, elai é crente. [Rei,3,0]
(b) DE na sentença encaixada: quando tanto o tópico quanto o correferente
encontram-se no interior de uma oração subordinada
(38)
Acho que [essa mudança]i, elai não vem assim sem ninguém fazer nada.
[Pau,2,8]
(c) Tópico e sujeito sem adjacência: quando a cópia está dentro da subordinada e o
tópico vai para a periferia da matriz.
(39)
a) [O gaúcho]i, por exemplo, eu tenho a impressão de que elesi têm, assim
uma certa semelhança... [Jan,4,8]
b) [O Engenho da rainha e Inhaúma]i eu acho assim que elesi são um só.
[Joa,4,0]

Fatores sociais
Embora os fatores sociais estejam implícitos num estudo em tempo real de
curta duração, reiteramos aqui que os fatores extralinguísticos considerados na análise
foram gênero, faixa etária e escolaridade dos informantes. Naturalmente, o período da
entrevista e a identificação dos informantes15 também foram fatores que integraram o
estudo. Trabalhos anteriores não conferem grande destaque para os fatores sociais no
que diz respeito às construções de tópico marcado.
Orsini (2003), por exemplo, encontra uma distribuição equilibrada para a
frequência de DE em relação à faixa etária e ao gênero. No mesmo caminho, estão os
resultados obtidos por Vasco (2006), que aponta um equilíbrio na distribuição das
15
Esse grupo se aplica apenas aos informantes do Estudo de Painel.
56
ocorrências de DE sujeito pelas diferentes faixas etárias: 73% na faixa 1 – mais jovem;
77% na faixa 2; 75% na faixa 3 – mais velha.
Neste capítulo, apresentamos o modelo de estudo da mudança e a teoria
linguística por nós adotada, que constituem o arcabouço teórico que norteia este estudo.
Apresentamos a seguir a tipologia das línguas a ser utilizada e, posteriormente,
detalhamos os objetivos e hipóteses do trabalho. Na seção de metodologia,
apresentamos a amostra e os procedimentos da pesquisa, além de listarmos os grupos de
fatores que integrarão a análise que será desenvolvida no capítulo seguinte.
57
CAPÍTULO 3 – A ANÁLISE DOS DADOS
Neste capítulo serão apresentados os resultados obtidos na análise do corpus.
Buscamos, como já apresentado no capítulo anterior, (a) investigar se há alguma
mudança no comportamento das estruturas de DE sujeito da década de 1980 para 2000
e (b) apontar as características estruturais dessas construções nos dois períodos de
tempo.
3.1 – O Estudo de Tendência
Foram encontrados 209 dados de DE sujeito na década de 1980 e 143 dados em
2000. A diferença na quantidade de dados certamente se deve ao fato de as entrevistas
dos anos 80 serem mais longas do que as feitas em 2000. Contudo, nosso foco não está
no aumento do número de ocorrências, mas na possível redução de restrições estruturais
para as construções estudadas.
3.1.1 – A natureza gramatical do tópico
Quanto à natureza do elemento que ocupa a posição de tópico, as tabelas 3.1 e
3.2 apresentam a distribuição das ocorrências e os percentuais obtidos para cada período
de tempo estudado.
Anos 80
Natureza do tópico
Nº de oco
%
Pronome 1ª
67
32
Pronome 3ª
37
18
Pronome arb
13
6
Pronome dem
5
2
SN simples
77
37
SN complexo
10
5
Total
209
100
Tabela 3.1: Distribuição percentual dos
dados segundo a natureza do tópico –
Anos 80
Ano 2000
Natureza do tópico
Nº de oco
%
Pronome 1ª
26
19
Pronome 3ª
16
11
Pronome arb
10
7
Pronome dem
3
2
SN simples
77
54
SN complexo
11
7
Total
143
100
Tabela 3.2: Distribuição percentual dos
dados segundo a natureza do tópico –
Ano 2000
58
Nos anos 80, ao agruparmos todos os tipos de pronome, vemos que a frequência
de tópicos pronominais é superior, totalizando 58% contra 42% de tópico SN. Dentre os
tópicos pronominais, o pronome de primeira pessoa é o mais recorrente. Por outro lado,
no ano 2000, os tópicos com SN totalizam 61%, contra 39% de tópicos pronominais.
Em ambas as sincronias, os pronomes de primeira pessoa são os mais frequentes,
seguidos pelos de terceira. Os pronomes com referência arbitrária (ou indeterminada) e
demonstrativos são os menos frequentes. Essa diminuição no percentual de pronomes
pode, entretanto, se dever a peculiaridades das entrevistas, mas a maior ocorrência de
SNs nos permitirá investigar bem a nossa hipótese de que o PB não impõe restrições à
natureza gramatical do tópico.
As informações fornecidas pela distribuição nos possibilitam pensar sobre uma
de nossas hipóteses, a de que o sistema do PB não impõe restrições quanto à natureza do
elemento que ocupa a posição de tópico, como já foi verificado por Duarte (1995),
Orsini (2003) e Vasco e Orsini (2007).
3.1.1.1 – A distribuição dos tópicos representados por pronomes
Com base nas informações trazidas pelas tabelas acima, temos, entre as
construções com pronome, em ambos os períodos de tempo, um predomínio daquelas
com pronome de 1ª pessoa. Elas configuram 32% do uso no primeiro período de tempo
estudado e 19% no segundo.
Tal comportamento se justifica pelo modelo de entrevista aqui utilizado que
parece ser um contexto propício para o surgimento de dados com pronomes de primeira
pessoa. Nessas entrevistas do tipo DID (diálogo entre informante e documentador), o
documentador formula questões genéricas, estimulando o informante a falar sobre suas
experiências pessoais. Na tabela 3.3 reunimos os dados de pronome de primeira pessoa
em termos de distribuição entre singular e plural:
59
Anos 80
Nº oco
%
Ano 2000
Nº oco
%
1ª pessoa singular
60
89,5
22
85
1ª pessoa plural
7
10,5
4
15
Total
67
100
26
100
Tabela 3.3: Distribuição das ocorrências de DE sujeito com tópico preenchido por
pronome de 1ª pessoa
A distribuição percentual dos dados é semelhante nos dois períodos de tempo:
há um predomínio de tópico preenchido por pronome de primeira pessoa do singular.
Em (1), temos um exemplo de tópico preenchido por pronome de primeira pessoa do
singular e, em (2), primeira pessoa do plural, com diferentes combinações dos pronomes
nós e a gente ocupando tanto a posição de tópico quanto de sujeito.
(1)
a) [Eu]i, eui, com ela, sou totalmente aberta. [Joa, 3, 80]
b) [A gente]i, aí a gentei não ia casar agora não. [Sam, 2, 80]
A primeira pessoa do plural exibe diferentes combinações dos pronomes nós e
a gente.
(2)
a) [A gente]i, quando a professora sai para ir em alguma- na sala de alguma
pessoa, a gentei faz muita arte. [AdrL, 1, 80]
b) Aí [a gente]i, nós doisi tivemos muitos atritos. [Dav, 3, 80]
c) [Nós duas]i, a gentei conversa bastante. [Joa, 3, 80]
O pronome a gente se mostrou mais recorrente do que o nós nessa amostra,
totalizando 9 casos, enquanto o nós só aparece duas vezes. Não encontramos casos de
nós retomado por nós nem nos dados dos anos 80, nem em 2000. Esse pronome também
não aparece em 2000; todos os casos de primeira pessoa do plural nesse período
apresentam o pronome a gente. O não aparecimento de nós na retomada do tópico,
60
ilustrado em (1c) acima, confirma a hipótese de Duarte (1995) de que os falantes evitam
a desinência <-mos> e, por conseguinte, uma estrutura com sujeito na primeira pessoa
do plural (Nós/ Eu e ele) geralmente leva a uma construção de DE com retomada com a
gente.16
Em relação aos pronomes de segunda pessoa, não tivemos nenhum caso nessa
amostra, em nenhum dos dois períodos analisados. Isso se deve ao fato de, nesse tipo de
entrevista, o entrevistado raramente se dirigir ao entrevistador, já que não se pode dizer
que haja uma interação que caracterize um diálogo natural. Em geral, os dados de
segunda pessoa partem do entrevistador.
O uso de você aparece somente com referência arbitrária 17, possibilidade já
atestada nos trabalhos de Duarte (1995, 2009). A preferência por formas nominativas
expressas para a representação do sujeito levou a mudanças na expressão da
indeterminação, que também prefere, na fala, as formas nominativas você e a gente.
Nada mais natural do que esses pronomes aparecerem, como reflexo da mudança na
marcação do valor do PSN, em construções de DE. Encontramos, na posição de tópico,
6% de pronomes com referência arbitrária nos anos 80 e 7% em 2000. As estruturas em
questão estão exemplificadas em (3) e (4). Embora os dados sejam muito poucos, você
já superava a gente em 80 (6 dados contra 4) e mantém esse comportamento em 2000 (7
contra 3).
(3)
Um dia de semana [a gente]i quando a gente quer trabalhar, a gentei acorda
cedo. [Sam, 2, 80]
(4)
a) [Você]i a partir de vinte nove anos, vocêi é considerada velha. [Ana, 3,
2000]
b) Quando cê pára de trabalhá [você]i, eu senti isso, parece que cêi vai
emburrecê. [Euc, 4, 2000]
16
17
Sem a retomada com a gente, teríamos “Nós duas conversamos bastante”.
Na segunda pessoa do singular, além do você, temos a forma cê, pronome fraco correspondente ao
você. Exemplificada em (4b)
61
Ao olharmos para as construções com pronome de terceira pessoa, constatamos
que este foi o segundo tipo de pronome mais usado nas duas sincronias (cf. tabelas 3.1 e
3.2). Encontramos casos de 3ª pessoa tanto no singular (exemplo 5 a e b) quanto no
plural (exemplo 5 c e d) nas duas amostras. A tabela 3.4 reúne os valores obtidos para
pronome de terceira pessoa no singular e no plural. Em termos absolutos, é importante
registrar que o número de ocorrências de tópico com pronome de terceira pessoa é
pequeno, sendo os casos de plural ainda menos recorrentes.
Anos 80
Nº oco
%
Ano 2000
Nº oco
%
3ª pessoa
singular
33
89
14
87,5
3ª pessoa plural
4
11
2
12,5
Total
37
100
16
100
Tabela 3.4: Distribuição das ocorrências de DE sujeito com tópico preenchido por
pronome de 3ª pessoa
(5)
a) [Ele]i, elei tá sempre precisando de carinho, né? [Jor, 3, 2000]
b) [Ele]i, antes de ir, elei chamou a polícia. [Jos, 4 , 80]
c) [eles]i, elesi não têm na verdade nada a acrescentá, entendeu? [Fla, 3, 2000]
d) [eles]i, elesi disseram que não descartam nenhuma possibilidade, até de
adoção. [Euc, 4, 2000]
O número de ocorrências de tópicos preenchidos por pronomes demonstrativos
não é significativo e tampouco tem grande relevância no conjunto de pronomes, uma
vez que são os pronomes pessoais que mais nos interessam neste trabalho. Em (6), estão
reunidos todos os casos. Em ambos os períodos, o tópico preenchido por pronome
demonstrativo é a estratégia menos frequente (2%).
(6)
a) [esse]i, na primeira elei morreu. [Jan, 4, 80]
b) [isso]i, essa fasei acontece com todas elas. [Eve, 3, 80]
62
c) [esse daí]i, essei gosta de peixinho. [Nad, 4, 80]
d) [esse]i, elei não, que já é um homem feito. [Nad, 4, 80]
e) [essa aí]i elai veio de um lugar também que ela adorava. [Jos, 4, 80]
f) eu prefiro achar que [aquele que se cala] i, elei observou as consequências.
[Joa, 4, 2000]
g) [aqui]i, por exemplo, aquii é muito engraçado. [Joa, 4, 2000]18
3.1.2 – A estrutura interna dos tópicos representados por SNs
As tabelas a seguir apresentam a estrutura interna dos SNs tópicos, destacando
os elementos que ocupam a margem esquerda e a margem direita:
Anos 80
Estrutura interna do SN tópico
Determinante ou quantificador + nome
Determinante ou quantificador + nome + modificador ou complemento
Nome nu
Total
Nº oco
59
23
5
87
%
67
26
7
100
Tabela 3.5: Estrutura interna do SN tópico – Anos 80
Ano 2000
Estrutura interna do SN tópico
Determinante ou quantificador + nome
Determinante ou quantificador + nome + modificador ou complemento
Nome nu
Total
Nº oco
66
19
3
88
%
75
21
4
100
Tabela 3.6: Estrutura interna do SN tópico – Ano 2000
18
Em (6 g) o tópico é preenchido por um advérbio de valor locativo, que foi computado junto com os
demonstrativos na nossa análise.
63
Os SNs que têm somente a margem esquerda preenchida, por determinante ou
quantificador, exemplo (7), são os mais frequentes nos dois períodos, totalizando 67%
na década de 80 e 75% em 2000.
(7)
a) [O paulista]i, elei fala um pouquinho cum a voz meio fanhosa. [Rei, 3,
2000]
b) [noventa por cento dos carioca]i, eu acredito, elesi gosta de cinema.
[Jor, 3 , 2000]
Com percentuais de 26% e 21% para cada período respectivamente,
encontramos SNs com determinantes à esquerda e modificadores ou complementos à
direita. Esses modificadores podem ser SAdjs e SPs simples, como exemplificado em (8
a, b) ou orações relativas (o que chamamos de SN complexo), como mostram as
sentenças (8 c, d):
(8)
a) [a jaguatirica adulta]i, elai é pequena. [Leo, 2, 80]
b) [os carro da globo]i, elesi vêm em cima da calçada. [Lei, 2, 80]
c) [a pessoa que usa muito a voz pra trabalhá] i, elai deveria fazê um trabalho
pra se protegê. [Adr, 2, 2000]
d) Esses- [essas pessoas que moram aqui na frente] i, ela- elasi, mais
perturbam [Joa, 3, 80]
Finalmente, em relação aos nomes nus, isto é, sem determinantes ou
modificadores, estes aparecem em menor frequência, geralmente no singular 19 podendo
ter referência específica ou genérica, como vemos nos exemplos em (9):
19
O PB se distingue das demais línguas românicas por preferir nomes contáveis com referência genérica
no singular (cf. Marafoni, 2010)
64
(9)
a) porque [Romário]i elei falô mesmo que ele sai. [Sim, 3, 2000]
b) [Robalo]i, é.. Robaloi aqui é comum. [Jan, 4, 80]
c) [marmelada]i- a marmeladai existe em qualquer lugar, não é? [Dav, 3, 80]
d) [Natália]i, elai é ela é minha amiga. [Mca, 1, 2000]
A análise da estrutura do SN revela dois dados importantes: o alto percentual
de estruturas sem elemento à direita do N nos permite colocar em discussão a hipótese
da distância entre o núcleo do tópico e a presença de retomada na sentença comentário.
Outro fator relevante é o fato de aparecerem SNs nus, em geral nomes de referência
genérica e novos no contexto discursivo, o que pode ser argumento contra o caráter
presumivelmente definido do tópico. Trataremos essa baixa restrição como um
comportamento que classifica o PB como língua mista, já que nesse tipo qualquer
sintagma está autorizado a ocupar a periferia esquerda da sentença, sem a necessidade
de ser definido ou específico. A próxima subseção trata do cruzamento da natureza
gramatical do tópico com a do correferente.
3.1.3 – A natureza gramatical do tópico x a natureza gramatical do correferente
Outro fator relevante para o estudo das construções de DE é a natureza do
correferente e sua relação com a natureza do tópico. Nossa hipótese é a de que o PB
não apresenta restrições para este cruzamento, podendo o tópico (SN ou pronome) ser
retomado tanto por um SN quanto por um pronome, independentemente de seu feixe de
traços semânticos. Na tabela abaixo, apresentamos os resultados obtidos para cada
período de tempo.
65
Anos 80
Tópico SN
Tópico pronome
Tópico demonstrativo
Total
Correferente SN
Nº oco
20
%
83
Nº oco
3
%
12
Nº oco
1
%
5
Nº oco
24
%
100
Coreferente pronome
67
36
114
62
3
2
184
100
Tabela 3.7: Estrutura do correferente em relação à estrutura do tópico – anos 80
Ano 2000
Tópico SN
Tópico pronome
Tópico demonstrativo
Total
Correferente SN
Nº oco
13
%
86
Nº oco
2
%
14
Nº oco
-
%
-
Nº oco
15
%
100
Coreferente pronome
71
58
50
40
1
2
122
100
Tabela 3.8: Estrutura do correferente em relação à estrutura do tópico – ano 2000
Nas duas tabelas, a retomada por pronome demonstrativo não aparece 20 já que
ela foi pouco frequente, portanto não foi computada nesta tabela. Nos anos 80, tivemos
apenas uma ocorrência de tópico pronome demonstrativo sendo retomado por
demonstrativo. Em 2000, passamos a 6 casos com correferente demonstrativo, sendo 3
com SN e 3 com demonstrativo na posição de tópico 21. Em (10) temos os exemplos da
estrutura em que um demonstrativo retoma um tópico SN.
(10)
a) [Esse negócio de contrato]i, issoi dura pouco, né? [Jor, 3, 2000]
b) [a família]i... eu acho que tem que sê issoi a base de tudo [Adr, 2, 2000]
c) [aquele negócio da Glória Maria ter sumido, desaparecido] i... aquiloi, tá na
cara, que foi um "cala a boca" [Joa, 4, 2000]
20
A diferença no valor total dos SNs presente nas tabelas se deve ao fato de os tópicos retomados por
demonstrativo não terem sido apresentados.
21
Todas as ocorrências de tópicos preenchido por pronomes demonstrativos estão listadas nos exemplos
de número 6.
66
Ao confrontarmos natureza do tópico X natureza do correferente constatamos
uma divisão muito clara dos resultados, indicando que o tópico SN, seja ele simples ou
complexo, favorece uma retomada por outro SN, enquanto tópico pronome favorece
retomada por outro pronome. Essa primeira combinação (SN + SN) concentra os
valores mais elevados: 83% nos anos 80 (compreendendo: 75% para SNs simples e 8%
para SNs complexos) e 86% em 2000, período em que só ocorrem SNs simples. Essa
situação é ilustrada em (11)
(11)
[A solução]i, então a soluçãoi é essa. [Rei, 3, 2000]
Apesar de destacarmos que a retomada por SN é favorecida pela presença de
um SN na posição de tópico, é importante observar que, quando a retomada é por
pronome nominativo, a presença de SNs tópicos é bastante frequente (com 36% nos
anos 80 e 58% em 2000). Os exemplos em (12) reúnem dados com SN simples (12a) e
SN complexo (12b) retomados por pronome nominativo podendo este SN ser [+/humano], [+/- específico]
(12)
a) [Meu irmão]i na noite de domingo, elei vai a missa a noite. [Ana, 3, 2000]
b) [A pessoa que usa muito a voz pra trabalhá]i, elai deveria fazê um trabalho
pra se protegê. [Adr, 2, 2000]
Quando temos um tópico pronominal, a preferência é que ele seja retomado por
outro pronome, como em (13), os valores de 62% e 40%, nos anos 80 e 2000
respectivamente, para os pronomes nominativos evidenciam essa preferência:
(13)
[Ela]i eu acho que elai ainda gosta mais de mim do que eu próprio dela. [Dav,
3, 80]
Como já afirmamos no início da subseção, a retomada por pronomes
demonstrativos não foi produtiva na nossa amostra (ainda que um pequeno aumento de
1 para 6 ocorrências seja observado), o mesmo não ocorrendo com a retomada por
67
pronome nominativo, inclusive quando temos um tópico [- animado], como nós vamos
apresentar na subseção 3.1.5.
A retomada por um SN não se mostrou produtiva quando o tópico era um
pronome nominativo em nenhum dos dois períodos. Encontramos apenas 12% nos anos
80 e 14% em 2000, isso totaliza apenas 5 casos no conjunto da amostra estudada, que
estão reproduzidos em (14). As construções são um tipo de aposto, em que o falante
procura esclarecer, na posição de sujeito, qual é o referente do pronome que está na
posição de tópico. Acreditamos que esse tipo de construção seja de uso mais geral nas
línguas:
(14)
a) [Eles]i- aquelas crianças de lái mete a mão no bolso das pessoas. [Sam,
2,80]
b) aí [ele]i o padrinhoi- o padrinho segura as duas vela. [Adr, 1, 80]
c) [Eles]i- meus filhoi não são contrário a geração de hoje. [Nad, 4, 80]
d) [ele]i o Tiagoi não tá fazendo nada. [Rob, 1, 2000]
e) que [eles]i um dia esses jovensi pintaram a cara [Ram, 4, 2000]
No que tange às retomadas pronominais, porém, agora com tópicos também
pronominais, deve ser feita uma observação. No que diz respeito aos dados com
pronomes em posição de tópico retomados pelo mesmo pronome sem material
interveniente, só foram considerados os que tiveram a hipótese de hesitação descartada
pela audição das gravações. Assim, casos como (15) foram excluídos da análise, pois
foram interpretados como hesitação por parte do falante. Em (16), exemplificamos as
construções que foram analisadas, sejam as que apresentam material interveniente entre
o tópico e a retomada (16 a, b), sejam as que não foram interpretadas como hesitação
(16 c):
(15)
Eu, eu, eu... não sou filha única não. [Joa, 3, 80]
68
(16)
a) [eu]i, no princípio, eui não tava pensando que era um assalto. [Sim, 3,
2000]
b) [eu]i, quando entrei no hospital, antes de bota o pé aqui dentro do hospital,
eui já imaginei o que que eu ia fazer... [Jor, 3, 2000]
c) [Eu]i, eui faço um monte de coisa com papel. [Eri, 1, 80]
O mesmo procedimento foi tomado para descartar casos de hesitação quando o
tópico é um pronome de 3ª pessoa retomado por pronome idêntico na posição adjacente
de sujeito. O exemplo em (17) ilustra um dos casos computados na análise, ou seja, de
não hesitação:
(17)
[eles]i, elesi não têm na verdade nada a acrescentá, entendeu? [Fla, 3, 2000]
Segundo Kato (1999 apud Orsini, 2003) construções como essas são uma
evidência de que o PB apresenta um paradigma de pronomes fortes, localizados na
periferia do Sintagma Flexional, e outro de pronomes fracos, que vão, aos poucos,
substituindo os pronomes nulos, como os do inglês e francês (me e I; moi e je,
respectivamente). Porém, no nosso caso, ambos se apresentam com a mesma forma – o
pronome nominativo. A única diferença se refere ao pronome você que apresenta, às
vezes, uma forma fraca cê, quando na posição de sujeito (Especificador do Sintagma
Flexional), ou seja, como pronome fraco.
O foco da análise das tabelas 3.7 e 3.8 recai sobre o tipo de correferente e nos
mostra que a retomada por pronome nominativo é significativamente mais frequente do
que a retomada por SN. Encontramos em números absolutos 184 contra 24 retomadas
por SN nos anos 80 e 122 contra 15 em 2000, o que representa 88% das retomadas nos
anos 80 e 85% em 2000. Desse modo, observamos que a retomada pronominal é a
estratégia mais comum, seja o tópico um pronome ou um SN. Passemos ao grupo que
trata da presença ou ausência de material interveniente entre o tópico e o sujeito.
69
3.1.4 – Presença vs Ausência de material interveniente
Nossos dados mostram que a presença de material entre o tópico e sua
retomada é ligeiramente mais frequente nas duas amostras – 56% na década de 80 e
58% em 2000 (o que significa que, nos dois períodos, a presença de material supera
levemente a ausência). Vejamos, na tabela 3.9, os resultados para a presença de material
interveniente, distribuídos conforme a natureza do material.
Anos 80
Ano 2000
Nº oco
%
Nº oco
%
Interrupção22
15
13
19
20
Marcador discursivo
6
5
11
11
Adjuntos adverbiais23
58
52
36
37
Sintagma oracional
30
27
27
29
Total
109
100
93
100
Tabela 3.9: Distribuição da natureza do material interveniente
A distribuição percentual do tipo de material interveniente, em termos
hierárquicos, é a mesma nas duas sincronias. Os adjuntos adverbiais são os mais
recorrentes tanto nos anos 80 quanto em 2000, (exemplos em (18)), seguidos dos
sintagmas oracionais (exemplos em (19)).
(18)
a) mas [eu]i esse ano eui não boto não, porque acho que fica feio. [Eri, 1, 80]
b) E [eu]i, infelizmente, eui moro em área de risco. [Tad, 4, 2000]
c) mas [eu]i, por mim, eui acho que existe. [Ale, 1, 80]
(19)
a) [a pessoa]i... se a pessoa acha que aquilo ali é bom pra ela, então a pessoai
segue aquele seu destino [And, 2, 2000]
22
A interrupção se distingue da hesitação por apresentar material fonético diferente de hesitações e
reformulações.
23
Aqui foram considerados os advérbios, os sintagmas preposicionais e os sintagmas nominais com
função adverbial.
70
b) [Eu]i quando estou num grupo de amigo, eui só falo, sabe? [Leo, 2, 80]
Quanto à interrupção, exemplificada em (20), o comportamento foi semelhante
nos dois períodos.
(20)
a) Mas elesi <at...> elesi disseram que não descartam nenhuma possibilidade,
até de adoção. [Euc, 4 ,2000]
No que diz respeito aos marcadores discursivos, observamos que foi a estrutura
menos utilizada nas duas sincronias.
(21)
a) [A minha mãe]i, né? Elai teve aneurisma [Adr, 2, 2000]
b) [O Brasil]i, veja bem, elei começou a ser migrado por baixo... [Tad, 4,
2000]
Segundo Braga (1987), quanto mais distante o sujeito estiver do verbo, maior
chance ele terá de aparecer retomado na sentença, ou seja, maior chance de ocorrer uma
estrutura de DE sujeito. Para a autora, isso confirma a função do pronome correferente,
que é a de “lembrete da cabeça do SN sujeito que se agrega ao verbo e, enquanto tal, facilitador do processamento da informação.” (Braga, 1987, p.111)
Assim como Braga (1987), Belford (2006) confirma a hipótese de que a
presença de material interveniente entre o SN (considerado nas referidas análises o
“verdadeiro sujeito”, que, na nossa análise é um tópico) e o predicado favorece a retomada pronominal. A autora afirma que o falante tem a preocupação de evitar
qualquer falha na comunicação e, por isso, utiliza o pronome cópia como um lembrete
do referente. Em sua análise de peso relativo, a autora encontra .91 para o uso de DE em
relação à presença de material interveniente, contra apenas .09 para a ausência desse
material, o que mostra um claro favorecimento de DE nesse contexto 24.
24
Lembremo-nos de que as autoras não trataram de estruturas com um pronome em posição de tópico.
71
Nossos resultados reforçam a ideia de que a presença do material interveniente
é um importante fator na retomada do SN transformando uma estrutura S V em Top S
V. Já temos evidências de que a construção de DE sujeito não é “motivada” pela distância, já que existem línguas que não retomam o sujeito mesmo nesses contextos.
No entanto, não se pode negar que, uma vez ocorrida a mudança na marcação do PSN,
aumentam as ocorrências de DE sujeito no sistema do PB e fatores de natureza
discursiva podem ser os controladores do uso dessa ferramenta. A subseção seguinte
apresenta a análise da natureza semântica do elemento na posição de tópico.
3.1.5 – Fatores de natureza semântica: traço semântico e especificidade do tópico
Nesta seção, decidimos associar ao traço semântico [+/- animado], relevante
nos estudos pertinentes à trajetória do preenchimento do sujeito, traços relativos à
especificidade do SN, tomando como base a hierarquia referencial proposta por Cyrino,
Kato e Duarte (2000). Segundo as autoras, num processo de mudança em direção ao
preenchimento do sujeito, os itens [+ referenciais] e [+ humanos], no ponto mais alto da
hierarquia (à direita da linha) são os primeiros a se tornarem plenos. A hierarquia
referencial está representada no esquema abaixo:
não-argumento
proposição
[±humano]
[+humano]
3 p.
2 p. 1 p.
[±animado] [±específico]
[-ref]< ----------------------------------------------------------------> [+ref.]
(Cyrino, Duarte e Kato 2000, p.59)
Os pronomes de primeira pessoa bem como os de referência arbitrária, todos
com traço inerentemente [+humano], são excluídos dessa análise. Os pronomes de
terceira pessoa foram incluídos neste grupo, visto que se comportam como os SNs por
conterem o traço semântico do referente que está sendo retomado no discurso. As
tabelas 3.10 e 3.11 reúnem esses resultados:
72
Pronome de 3ª
Nº OCO
%
Nº OCO
%
+humano +específico
46
54
35
94
+ humano - específico
17
20
- humano +específico
4
4
- humano - específico
3
3
- animado +específico
14
16
- animado - específico
2
2
1
6
Total
87
100
36
100
Tabela 3.10: traço semântico e especificidade do tópico – Anos 80
Anos 80
SN
SN
Pronome de 3ª
Nº OCO
%
Nº OCO
%
+humano +específico
49
56
16
100
+ humano - específico
17
19
- humano +específico
- humano - específico
- animado +específico
18
20
- animado - específico
4
5
Total
88
100
16
100
Tabela 3.11: traço semântico e especificidade do tópico – Ano 2000
Ano 2000
Conforme já foi detalhado no capítulo 2, os traços levados em consideração na
nossa análise foram [+ / - humano]; [+ / - animado] e [+ / - específico]. Encontramos
seis possibilidades de combinação de traços que nos permitiram uma análise semântica
detalhada do elemento que está na posição de tópico.
Nos dois períodos de tempo, os tópicos nominais se caracterizam por
apresentar preferencialmente sintagmas com os traços [+ humano + específico] (54% e
56%). São nomes próprios, em geral familiares, amigos e personalidades (22 a) ou
nomes comuns, em geral relativos a membros da família, conhecidos, que exibem à
esquerda um determinante, como se pode observar nos exemplos (22 b, c). A
distribuição percentual nos mostra um comportamento semelhante no que diz respeito a
essas estruturas nos dois períodos estudados.
(22)
a) porque [Romário]i elei falô mesmo que ele sai. [Sim, 3, 2000]
b) [Meu irmão]i, na noite de domingo, elei vai na missa a noite. [Ana, 3,
2000]
73
c) Inclusive, [essa menina que faz minha unha mesmo] i, elai é assim, na casa
dela é assim. [Lei, 2, 80]
No caso dos pronomes de terceira pessoa com os traços [+ humano +
específico], podemos observar que são numericamente menos frequentes que os SNs,
mas, ainda assim, do conjunto de 37 pronomes na primeira sincronia e 16 na segunda,
todos, exceto um caso, têm esses traços, como se vê em (23).
(23)
a) [Ele]i, parece que elei sofreu muito quando era pequeno. [Joa,3, 80]
(falando do marido)
b) Mas [ela]i, que nem outro dia, elai mandou a gente não ir pra fora.
[Adr, 1, 80] (falando da professora)
Assim como o subfator anterior, os SNs com os traços [+ humano – específico]
mantêm suas frequências estáveis nas duas sincronias: 20% nos anos 80 e 19% em
2000. Nesse caso, apesar de o tópico apresentar o traço [+ humano] sua referência é
genérica, ou seja, refere-se a grupos ou pessoas indeterminadas, como nos exemplos em
(24). Os tópicos desse grupo não devem, entretanto, ser confundidos com os tópicos
pronominais de referência arbitrária. Esses últimos não podem ser retomados por um
pronome de terceira pessoa:
O cara – ele....
* você – ele...
(24)
a) [O carioca]i, eu acho que elei fala muito errado. [Mar, 4, 2000]
b) [o cara que, p..., que é mais safo]i elei vai procurá outra coisa. [Fla, 3,
2000]
O traço [+ humano] aparece com maior frequência nas duas amostras.
Entretanto, temos, nos anos 80, casos de SNs com os traços [- humano + / - específico].
74
Assim, na década de 1980, há 4% de tópicos cujo SN é [- humano / + específico] e 3%
de tópicos cujo SN é [- humano / - específico]. Os tópicos aqui fazem referência a
animais, já que optamos por separar [– humano] e [+ / - animado]. Os exemplos em (25)
apresentam os tópicos com o traço [-humano / + específico] e [- humano /– específico]
respectivamente (a não ocorrência de dados desse tipo em 2000 não significa, pois, que
o tópico rejeite esse feixe de traços).
(25)
a) [Aquela cachorra]i, ali fora, com a gente elai é uma... dentro de casa não
deixa ninguém entrar. [Jos, 4, 80]
b) [A jaguatirica adulta]i, elai é pequena, ela não cresce mais do que essa
mesa. [Leo, 2, 80]
O SN tópico com traços [– animado / + específico], exemplificado em (26), são
menos frequentes hierearquicamente em 80 do que em 2000, ainda que as frequências
sejam muito próximas.
(26)
a) [O... Engenho da Rainha e Inhaúma]i, eu acho assim..., que elesi são... um
só! [Joa, 4, 2000]
b) [Esses passeio que eu faço tudo]i elei é de graça. [Zil, 4, 2000]
O SN tópico [– animado / – específico] apresenta 2% nos anos 80 e 5% em
2000, sendo, em ambas as sincronias, o feixe de traços menos recorrente. Assinale-se
que o tópico [- animado] com referência genérica (exemplo 27 a) foi menos recorrente
do que o [– animado] com referência específica (exemplo 27 b) nos dois períodos
analisados. É exatamente com esse conjunto de traços ([- animado / - específico]) que
temos, nos anos 80, a única ocorrência de pronome na posição de tópico, como se
ilustra em (27 c)
(27)
a) E [a produção]i, quando sendo uma coisa maior, elai te exige muito [Adr,
2, 2000]
75
b) [A quadra do meu colégio]i, elai já estava para sair há mais de dez anos.
[Fat, 2, 80]
c) Mas [ela]i crua, elai é mais saudável25. [Jan, 4, 80]
Este grupo, que envolve aspectos de natureza semântica, nos permite
caracterizar, de maneira detalhada, o constituinte que está na posição de tópico. O SN
tópico é preferencialmente [+ humano / + específico], reunindo 54% dos dados na
década de 1980 e 56% em 2000 26. A segunda combinação de traços mais recorrente na
amostra de 80 foi [+ humano/- específico], enquanto na amostra de 2000 foi [- animado
/ + específico], sendo que o [+ humano / – específico] aparece em terceiro lugar com um
valor muito próximo (20% para o primeiro e 19 % para o segundo). Os traços [- humano
/ - específico] são os menos frequentes na primeira sincronia e não aparece na segunda,
havendo um menor número de ocorrências, portanto, de DE sujeito.
Os resultados aqui apresentados nos possibilitam concluir que, nos dois
períodos estudados, as construções de DE sujeito são mais frequentes com tópicos [+
humano + especifico], ou seja, esse feixe de traços favorece a manifestação das
construções de deslocamento à esquerda de sujeito seja com tópicos SN, seja com
tópicos pronominais de terceira pessoa. Esse resultado confirma a conclusão de Braga e
Mollica (1986) em relação aos tópicos SNs. Orsini (2003) também alcança resultado
semelhante. A autora afirma que o condicionamento mais significativo para a
manifestação das construções de deslocamento é o traço semântico 27: referentes com o
traço [+ animado] favorecem essa construção, enquanto referentes com o traço [animado] favorecem as construções de topicalização, que deixam uma categoria não
preenchida em seu interior, este comportamento é reflexo da complementaridade
existente entre Top e DE, já apresentada no capítulo 2.
No entanto, podemos afirmar que o PB não oferece restrições à construção de
DE com o tópico [-humano] e [-animado], podendo ele ser mais ou menos específico;
25
Neste exemplo, o referente é o nome ostra conforme se pode verificar num trecho maior da entrevista:
“[Põe limão], sim. [(inint)-] ("não falei porque a senhora não") tinha perguntado, mas ("quer) põe um
limãozinho na ostra. Mas ela crua, ela é mais saudável.”
26
Consideramos aqui tanto os SNs simples quanto os SNs complexos.
27
No trabalho de Orsini (2003), o traço [+ animado] reúne as ocorrências de [+ humano].
76
este último traço (a especificidade) já havia sido comentado na presença de elementos
sem determinantes (SNs nus), por exemplo, quando tratamos da estrutura do SN.
Considerando que, em relação ao preenchimento do sujeito, os de terceira
pessoa com referente [+humano / +específico] foram preenchidos antes daqueles com
traço [- humano ou – animado] é natural esperar que a frequência das construções de
DE sujeito acompanhe a hierarquia de referencialidade dos sujeitos: contextos menos
resistentes a implementação do sujeito favoreceram construções de DE sujeito, fazendo
com que sua frequência seja elevada; contextos mais resistentes ao preenchimento do
sujeito revelarão menos ocorrências de DE sujeito. Os sujeitos com o traço [-animado] e
os genéricos são os mais resistentes à mudança em direção ao sujeito pronominal
preenchido. Em consequência, a incidência de construções de DE sujeito com o tópico
reunindo estes traços são menos frequentes.
A seção seguinte apresenta os resultados obtidos para o grupo configuração
sintática da estrutura em que ocorrem tópico e correferente.
3.1.6 – Configuração sintática da estrutura em que ocorrem tópico e seu
correferente
Os resultados da variável configuração sintática da estrutura em que ocorrem
tópico e correferente podem ser vistos na seguinte tabela:
Anos 80
Ano 2000
Nº oco
%
Nº oco
%
DE na sentença matriz
166
79
116
80
DE na sentença encaixada
30
14
16
11
Tópico e sujeito sem adjacência
13
7
11
9
Total
209
100
143
100
Tabela 3.12: tipo de sentença em que ocorre a estrutura de DE
Como já havia sido mostrado em trabalhos anteriores (cf. Orsini, 2003), nossos
dados mostram que o contexto raiz é, de longe, o contexto preferido das construções de
DE, nas duas sincronias, mais uma vez ilustrado em (28):
77
(28)
[O Brasil] i, veja bem, elei começou a ser migrado por baixo. [Tad, 4, 2000]
No entanto, embora em percentual mais baixo, as ocorrências de DE sujeito no
interior de orações subordinadas (aqui tratados como DE na sentença encaixada)
constituem um resultado muito importante para a nossa análise, pois, segundo Brito,
Duarte e Matos, a “deslocamento à esquerda de tópico pendente” não ocorre em contextos encaixados no PE.28 Os exemplos em (29 a, b) mostram uma construção de
DE também presente na amostra, em que o tópico ocorre dentro de uma subordinada
completiva de verbo; em (29 c, d), vemos a ocorrência no interior de uma subordinada
adverbial:
(29)
a) Acho [que [ele]i primeiro elei começou, assim.] [Sam, 2, 80]
b) acho [que [essa mudança]i, elai não vem assim sem ninguém fazer nada]
[Pau, 2, 80]
c) De preferência você não bota leite gelado nem quente, você bota em
temperatura normal [porque [o leite gelado ou quente]i, ele pode assim- elei
sola muito o bolo]. [Dav, 3, 80]
d) [se [uma professora]i elai quer ter sucesso na sua profissão, (se) ela quer
ser reconhecida como uma boa professora], ela vai ter que se aprimorar.
[Eve, 3, 80]
Devemos mencionar ainda as construções em que tópico e o sujeito não estão
adjacentes, já que o primeiro está na oração matriz e o segundo, no interior da oração
subordinada, como vemos em (30). Tal estrutura pode ocorrer em língua de sujeito nulo,
como o português europeu e o espanhol (cf. Rivero 1980 apud Duarte, 1995 para o
espanhol), mas o sujeito, em tais casos, recebe ênfase por estar numa construção com
valor contrastivo. Não é o que se observa em (30). Os exemplos em (30 a, b) foram
28
Note-se que as autoras se referem ao deslocamento de outros constituintes, já que a estrutura de DE
sujeito não ocorre nas línguas de sujeito nulo.
78
produzidos por diferentes falantes, não se caracterizando por apresentar valor
contrastivo. Em (30 c), vemos um exemplo com o pronome você, de referência
arbitrária:
(30)
a) [O carioca]i eu acho [que elei fala muito errado]. [Mar, 4, 2000]
b) [O gaúcho]i, por exemplo, eu tenho impressão [de que elesi têm, assim,
uma certa semelhança com o castelhano] [Jan, 4, 80]
c) quando cê pára de trabalhá / [você]i, eu senti isso, parece [que cêi vai
emburrecê]. [Euc, 4, 2000]
Esses resultados são, de fato, importantes: podemos dizer que a construção de
DE sujeito no PB ocorre tanto em contexto raiz quanto em contexto encaixado. Há
também construções em que o tópico se encontra na oração matriz e o correferente no
interior da subordinada, não havendo, portanto, adjacência sintática. Registre-se
também que estas construções não são marcadas no PB, ou seja, não possuem valor
contrastivo.
Nossa análise dos fatores linguísticos revela informações importantes acerca
dos dois períodos estudados. O tópico é predominantemente preenchido por pronome
nos anos 80, sendo a grande maioria pronomes de 1ª pessoa. Em 2000, observamos uma
mudança nessa representação. O tópico passa a ser, em sua maior parte, preenchido por
um SN que não sofre restrições quanto ao traço semântico ou a especificidade. No que
diz respeito às retomadas, elas são preferencialmente feitas através de pronomes
nominativos, independentemente dos traços semânticos e do tipo do tópico. Verificamos
que a retomada por SNs só é favorecida quando outro SN ocupa a posição de tópico.
Quanto ao material interveniente, observamos que os mais recorrentes são os
adjuntos adverbiais e os sintagmas oracionais. A presença de algum tipo de material
entre o tópico e a retomada foi ligeiramente mais frequente do que a ausência na nossa
amostra, tanto nos anos 80 quanto em 2000. Por fim, no que tange à configuração
sintática da sentença em que ocorre DE sujeito, constatamos que, embora apareça mais
frequentemente na sentença raiz, não há restrições ao aparecimento de DE em contextos
79
encaixados, nem em contextos em que o tópico se encontra na oração matriz e o
correferente, na subordinada, sem possuir valor contrastivo. Passaremos agora à
apresentação dos resultados obtidos para as variáveis sociais.
3.1.7 – Os fatores sociais
O primeiro fator social a ser apresentado é a faixa etária, importante
instrumento para verificar a mudança em tempo aparente. Embora estejamos fazendo
um estudo da mudança em tempo real de curta duração, acreditamos ser interessante
observar inicialmente as faixas nas duas sincronias. Os valores para uso de SN e
pronome na posição de tópico estão na tabela abaixo, distribuídos segundo as faixas
etárias.
Anos 80
Faixa etária
7-14
15-25
26-49
+ de 50
Total
SN
Nº OCO
3
34
22
28
87
%
3
39
25
32
100
PRONOME
Nº OCO
17
28
53
24
122
%
14
23
43
19
100
Tabela 3.13: A natureza gramatical do tópico por faixa etária – Anos 80
Ano 2000
Faixa etária
SN
PRONOME
Nº OCO
%
Nº OCO
%
7-14
17
20
18
32
15-25
6
7
7
12
26-49
33
38
12
22
+ de 50
31
35
19
34
Total
87
100
56
100
Tabela 3.14: A natureza gramatical do tópico por faixa etária – Ano 2000
A tabela 3.13 revela que, nos anos 80, em relação ao tópico SN, há maior
incidência na faixa 2, seguido pelas faixas 4 e 3, respectivamente. A faixa mais jovem é a
que usa menos SN na posição de tópico nesse período. Isso mostra um aumento de SN
acompanhando o aumento da faixa etária. O uso de pronome é mais frequente na faixa 3
(43%) e a faixa 1 é a que menos faz uso dessa estrutura. Em 2000, SN foi mais frequente nas
80
faixas 3 e 4. A faixa 2 é a que fez menos uso dessa estrutura. Em relação aos pronomes, as
faixas 4 e 1, respectivamente, são as que apresentam o uso mais alto no segundo período
analisado.
No gráfico de linha abaixo, podemos ver, de forma mais clara, a distribuição de SN
por faixa etária nos dois períodos investigados.
Gráfico 3.1: Ocorrência de SNs em posição de tópico (vs pronome) segundo a faixa etária
Observamos que, com exceção da faixa etária 2 (15 a 25 anos), que tem a
frequência de SNs reduzida, o uso de SNs é mais alto do que o pronome em todas as faixas
na segunda sincronia. Destaca-se o comportamento da faixa mais jovem, que apresenta o
índice mais baixo de SNs nos anos 80 enquanto em 2000 apresenta um uso um pouco mais
elevado: 20%. Do mesmo modo, a faixa 3 (26 a 49 anos) apresenta comportamento diferente
com 25% em 1980 e 38% em 2000. A faixa 4 não apresenta diferenças percentuais
significativas e mostra estabilidade na comparação dos dois períodos.
O gráfico que tem como base a faixa etária dos informantes nos permite fazer duas
reflexões: (i) DE sujeito com tópico SN não é uma forma inovadora que está ganhando
espaço no sistema, já que é uma forma mais produtiva entre os mais velhos, quando
comparado com os mais novos e (ii) considerando a contraparte dos SNs, vemos que o
pronome em posição de tópico já era produtivo na faixa 1 nos anos 80, o que significa que o
paradigma com pronomes fortes e fracos já estava implementado. Além disso, podemos
81
concluir que falantes com mais tempo de frequência escolar preferem DE com um SN em
posição de tópico. Vejamos como esse fator interage com o nível de escolaridade:
A tabela abaixo nos mostra que, nos anos 80, o grupo com escolaridade de + de 11
anos é o que menos faz uso de SN na posição de tópico (27%). Esse comportamento não é o
mesmo em 2000, período em que o grupo com 9-11 anos de escolaridade apresenta os
menores valores para SNs. O grupo com 9-11 anos de escolaridade apresenta um
comportamento bem diferente nos dois períodos quando tratamos de pronome na posição de
tópico, ele é quem mais usa essa estrutura nos anos 80 e quem menos usa em 2000.
Anos 80
Anos de Escolaridade
5-8 anos
9-11 anos
+ de 11 anos
Total
SN
Nº OCO
33
30
24
87
%
38
35
27
100
PRONOME
Nº OCO
38
52
32
122
%
31
43
26
100
Tabela 3.15: A natureza gramatical do tópico por escolaridade – Anos 80
Ano 2000
Anos de Escolaridade
5-8 anos
9-11 anos
+ de 11 anos
Total
SN
Nº OCO
41
14
32
87
%
47
16
37
100
PRONOME
Nº OCO
32
9
15
56
%
57
16
27
100
Tabela 3.16: A natureza gramatical do tópico por escolaridade – Ano 2000
Vejamos o gráfico a seguir com a representação dos valores percentuais para os
SNs vs escolaridade:
82
Gráfico 3.2: ocorrência de SNs em posição de tópico (vs pronome) por anos de
escolaridade
A mudança em relação à natureza gramatical do tópico não parece correlacionar-se
ao grau de escolaridade dos indivíduos. A figura 3.2 mostra que o grupo mais escolarizado é
responsável por um uso elevado de SNs na posição de tópico no segundo período, porém são
os menos escolarizados que lideram a hierarquia em ambas as sincronias. A escolaridade
tem se mostrado muito relevante no estudo de fenômenos variáveis no PB. A observação da
fala culta revela índices bem expressivos de construções de DE, em geral com SNs em
posição de tópico. Orsini (2003) encontra para a fala culta carioca 71% de SNs nos anos 70
e 56% nos anos 90. Embora tenha havido uma diminuição, a preferência na fala culta
sempre recai sobre os SNs.
O último fator social controlado nessa análise foi o gênero dos informantes. A
hipótese era que não existiria um grupo que favorecesse DE sujeito. Esperávamos encontrar
resultados equilibrados já que tratamos de um fenômeno sintático que não parece estar
ligado a estilo, nem sujeito à avaliação negativa por parte dos indivíduos.
Anos 80
SN
PRONOME
Nº OCO
%
Nº OCO
%
Masculino
44
50
52
42
Feminino
43
50
70
58
Total
87
100
122
100
Tabela 3.17: A natureza gramatical do tópico por gênero – Anos 80
Gênero
83
Ano 2000
PRONOME
Nº OCO
%
Nº OCO
%
Masculino
46
53
24
43
47
57
Feminino
41
32
Total
87
100
56
100
Tabela 3.18: A natureza gramatical do tópico por gênero – Ano 2000
Gênero
SN
Em relação tanto aos SNs quanto aos pronomes, tivemos nos dois períodos uma
distribuição extremamente equilibrada quando observamos homens e mulheres, o que
confirma a hipótese levantada de não encontrarmos diferenças em relação ao gênero.
O gráfico abaixo mostra o equilíbrio encontrado na distribuição dos dados por
gênero nos dois períodos, focalizando o uso total de SN, frequências que se apresentam
iguais na primeira sincronia se diferenciam ligeiramente na segunda sincronia:
Gráfico 3.3: ocorrências de SNs em posição de tópico (vs pronome) por gênero
Em relação aos fatores sociais, observamos que, de um modo geral, o tópico
SN é a estratégia mais frequente no segundo período analisado, apenas a faixa etária 2 e
o grupo com nível intermediário de escolaridade não acompanhou essa tendência.
Passaremos agora para a seção dedicada ao Estudo de Painel.
84
3.2 – O Estudo de Painel
Na análise dos indivíduos, procuramos observar o comportamento de cada um,
num total de 16, nos dois momentos, anos 80 e 200029. Tendo em vista que o programa
Goldvarb 2001 só aceita trinta grupos de fatores, foi necessário dividir os informantes
em dois grupos distintos. Desta forma, seguindo a metodologia adotada em Paiva &
Duarte (2003), fizemos duas rodadas: uma com os informantes que apresentaram
mudança no grau de escolaridade de um período para o outro e outra com aqueles que
não apresentaram alteração no grau de escolaridade. Devemos observar que, em relação
aos falantes que mudaram o grau de escolarização, todos eles pertencem a faixas etárias
mais jovens na época da primeira entrevista, o informante mais velho desse grupo era
Leo38 que tinha 18 anos nos anos 80.
A interpretação dos dados em números absolutos pode ser comprometida pelo
fato de as entrevistas mais recentes serem mais curtas que as gravadas nos anos 80. Essa
diferença na duração das gravações interfere na quantidade de ocorrências produzidas
por informante. Assim, tal como foi feito para o Estudo de Tendência, nossa atenção
recai sobre os percentuais, focalizando tanto a natureza do elemento que ocupa a
posição de tópico quanto a natureza do correferente.
As tabelas abaixo reúnem o percentual de sintagma nominal 30 na posição de
tópico em relação ao total de ocorrências de DE sujeito por informante em cada período
analisado.
Anos 80
Ano 2000
Idade
Nº OCO
%
Idade
Nº OCO
%
Eri 59
9
2/11
18
25
5/6
83
Adrl 57
10
1/8
12
26
4/10
40
Adr 63
12
5/10
50
28
11/17
64
Fat 23
15
6/7
85
33
1/4
25
San 39
15
3/13
23
33
18/25
72
Leo 38
18
3/6
50
36
4/5
80
Tabela 3.19: Uso de SN em oposição a pronome na posição de tópico – Indivíduos com
mudança no nível de escolaridade
29
30
Aqui a amostra referida como 2000 é a amostra recontato.
Juntamos aqui as ocorrências de SN simples e complexo, já que as últimas apresentam índices muito
baixos por indivíduo.
85
Anos 80
Ano 2000
Idade
Nº OCO
%
Idade
Nº OCO
%
Jup 06
18
5/9
55
35
5/6
83
Lei 04
25
6/8
75
43
Dav 42
31
5/9
55
48
3/8
37
Jos 26
32
7/18
38
48
4/5
80
Eve 43
42
5/15
33
59
12/16
75
Mgl 48
52
7/11
63
70
12/14
85
Jan 03
56
10/17
58
74
3/6
50
Nad 36
57
3/12
25
74
9/9
100
Joss 35
59
7/10
70
75
1/6
16
Ago 33
60
2/6
33
77
4/7
57
Tabela 3.20: Uso de SN em oposição a pronome na posição de tópico – Indivíduos sem
mudança no nível de escolaridade
A tabela 3.19 nos mostra que no grupo em que houve mudança no nível de
escolaridade, 5 dos 6 informantes apresentam mais SNs do que pronome na posição de
tópico na segunda sincronia. São eles: Eri59; Adrl57; Adr63; San39 e Leo38. Para o
grupo sem mudança no nível de escolaridade (tabela 3.20), 6 dos 10 informantes
modificam o comportamento e apresentam mais SN na posição de tópico no segundo
período: Jup06; Jos26; Eve43; Mgl48; Nad36 e Ago33.
O estudo revela que, independentemente de haver ou não mudança de grau de
escolaridade, a maior parte dos indivíduos (11 entre os 16) apresentou mais DE sujeito
com SN na posição de tópico no segundo período. A análise comparativa dos resultados
obtidos para o Estudo de Tendência e o Estudo de Painel mostra que as construções de
DE sujeito com SN têm se revelado mais frequentes no sistema do PB, apesar de não
haver um comportamento regular nem na comunidade nem no indivíduo. Verificamos,
portanto, aumento no número de ocorrências do tipo (31 a), enquanto as do tipo (31 b)
reduzem.
(31)
a) [A minha irmã]i também, elai tinha um umbigo enorme. [Jup, 1, 80]
b) [Eu]i, logicamente, isso eui não posso dizer para você. [Dav, 2, 80]
A diferença mais expressiva de uso de SN foi a da informante Eri59, que
apresentou 18% nos anos 80 e 83% em 2000. Os indivíduos que não utilizaram SN mais
recorrentemente em 2000 apresentaram um comportamento relativamente estável, ou
86
seja, não tiveram alterações significativas no seu uso de um período para o outro.
(Fat23; Lei04; Dav42; Jan03 e Joss35), como se pode observar na tabela acima.
3.2.1 – Natureza gramatical do correferente
Podemos observar a distribuição dos dados referentes à estratégia de retomada
nas tabelas abaixo. O pronome nominativo é a estratégia preferida por todos os
informantes nos dois períodos de tempo analisados, sempre se mantendo acima dos
50%. Entretanto, observamos algumas particularidades. As tabelas mostram a escolha
pelo nominativo em oposição ao SN como correferente:
Anos 80
Ano 2000
Idade
Nº oco
%
Idade Nº oco
%
Eri 59
9
11/11
100
25
4/6
67
Adrl 57
10
7/8
87,5
26
6/10
60
Adr 63
12
6/10
60
28
16/17
94
Fat 23
15
7/7
100
33
3/4
75
San 39
15
13/13
100
33
24/25
96
Leo 38
18
5/6
83
36
4/5
80
Tabela 3.21: Uso do pronome nominativo como correferente –
Indivíduos com mudança no nível de escolaridade
Anos 80
Anos 2000
Idade
Nº oco
%
Idade
Nº oco
%
Jup 06
18
7/9
78
35
5/6
83
Lei 04
25
7/8
87,5
43
Dav 42
31
7/9
78
48
8/8
100
Jos 26
32
17/18
94,5
48
5/5
100
Eve 43
42
13/15
87
59
16/16
100
Mgl 48
52
10/11
91
70
14/14
100
Jan 03
56
14/17
82,5
74
6/6
100
Nad 36
57
8/12
67
74
9/9
100
Joss 35
59
9/10
90
75
6/6
100
Ago 33
60
4/6
67
77
6/7
86
Tabela 3.22: Uso do pronome nominativo como correferente –
Indivíduos sem mudança no nível de escolaridade
Em relação à natureza gramatical do correferente, foi possível observar um
comportamento diferente entre os indivíduos que mudaram e os que não mudaram de
nível de escolaridade. Entre os informantes com mudança no grau de escolaridade, três
87
apresentam taxa de 100% no uso do pronome como retomada na década de 1980, o que
corresponde à metade do grupo. São eles: Eri59; Fat23 e San39. Em 2000, esse
comportamento muda e o SN aparece como uma estratégia que compete com o pronome
como correferente, visto que não temos o uso categórico daquele.
Entre os que mantiveram o mesmo nível de escolaridade, todos os falantes
preferem a retomada pronominal, havendo sete casos de uso categórico do pronome na
posição de sujeito.
Assim como foi feito no Estudo de Tendência, cruzamos os grupos natureza do
tópico e natureza do correferente. No caso daquele estudo, somente SNs favoreciam
retomadas por SNs e pronomes favoreciam retomadas por pronomes.
As tabelas 3.23 e 3.24 mostram a distribuição dos padrões encontrados para o
cruzamento de natureza do tópico e natureza do correferente. Neste cruzamento, não
foram incluídos os casos de tópico preenchido por demonstrativos, sintagmas
oracionais, ou aqueles retomados por elementos diferentes de SNs e pronomes
nominativos. As retomadas com pronome demonstrativo, assim como no Estudo de
Tendência, não foram frequentes nos indivíduos. Tivemos apenas 2 casos nos anos 80 e
um no período mais recente. Um dos dados, reproduzido em (32 a), foi produzido por
um integrante do grupo sem mudança de escolaridade. Os outros dois casos são de
informantes com mudança de escolaridade, como se vê em (32 b, c)
(32)
a) [esse daí]i essei gosta de peixinho. [Nad, 4, 80]
b) [Ele]i aquele lái só sabe beber. [Adr, 2, 80]
c) [O que poderia ser estimulante pra uma vida de um casal] i, aquilo alii virou
uma coisa banal. [Eri, 2, 2000]
88
Anos 80
Ano 2000
SN/
SN/
PRO/
PRO/
SN/
SN/
PRO/
PRO/
SN
PRO
PRO
SN
SN
PRO
PRO
SN
Eri 59
2/18%
9/82%
4/100%
Adrl 57
1/12%
6/76%
1/12%
3/30%
1/10%
5/50%
1/10%
Adr63
3/33%
2/22%
4/45%
1/5%
10/60% 6/35%
Fat 23
6/85%
1/15%
1/25%
2/50%
1/25%
San 39
3/23% 10/77%
1/4%
17/68% 7/28%
Leo 38
1/17%
2/33%
3/50%
1/20%
3/60%
1/20%
Tabela 3.23: Cruzamento do grupo natureza do tópico com o grupo natureza do
correferente - Indivíduos com mudança no nível de escolaridade
Anos 80
Ano 2000
SN/
SN/
PRO/
PRO/
SN/
SN/
PRO/
PRO/
SN
PRO
PRO
SN
SN
PRO
PRO
SN
Jup 06
1/11%
4/44%
3/34%
1/11%
1/16%
4/68%
1/16%
Lei 04
1/12%
5/63%
2/25%
Dav42
2/23%
3/33%
4/44%
3/37%
5/63%
Jos 26
1/6%
6/33% 11/61%
4/80%
1/20%
Eve43
1/8%
4/28%
9/64%
12/75% 4/25%
Mgl 48
1/9%
6/55%
4/36%
12/85% 2/15%
Jan 03
3/19%
7/43%
6/38%
3/50%
3/50%
Nad36
2/23%
1/11%
6/66%
9/100%
Joss35
1/11%
6/66%
2/23%
1/16%
5/84%
Ago33
1/16%
1/16%
3/52%
1/16%
1/14%
3/43%
3/43%
Tabela 3.24: Cruzamento do grupo natureza do tópico com o grupo natureza do
correferente - Indivíduos sem mudança no nível de escolaridade
No grupo dos informantes com mudança de escolaridade, aparecem 5
retomadas por SN nos anos 80 e 8, em 2000, apenas 2 casos (40%) apresentam um
tópico pronominal sendo retomado por SN, produzidos pelas informantes Adr57 e Fat23
em 2000. De modo geral, as estruturas se concentram em SN retomado por pronome e
pronome retomado por pronome, nos dois momentos, para os dois grupos. O padrão SN
+ SN é atestado nos anos 80, particularmente entre os que mudaram de escolaridade; no
ano 2000, SN + SN, exemplificado em (33), está quase ausente.
(33)
Sendo que [a Imperatriz]i, por exemplo, a Imperatrizi apresenta um carnaval
bom. [Dav, 2, 80]
89
Menos frequente ainda é o padrão pronome retomado por SN, que, como
dissemos, tem características de aposto. A estrutura, ilustrada em (34), não aparece na fala
dos que mudaram de escolaridade em 2000:
(34)
a) Mas [ela]i, a mangueirai é mais pra broco31. [Adr, 2, 2000]
b) [Eles]i- meus filhoi não são contrário a geração de hoje. [Ago, 4, 80]
c) Porque [ele]i meu paii não gosta de briga. [Jup, 1, 80]
Observando os resultados para SN + PRO (SN retomado por pronome) e PRO
+ PRO (pronome retomado por pronome), podemos ver que, entre os que mudaram o
nível de escolaridade, a preferência é por PRO + PRO em 80 e por SN + PRO em 2000,
tal como revelou o Estudo de Tendência. Entre os que não mudaram, já se observa uma
diferença de comportamento linguístico: metade dos falantes se distribui entre os dois
padrões nos anos 80, mas em 2000, a maioria prefere SN + PRO ou se mantém neutra.
É justamente este último padrão que nos permite observar a presença de SNs sem
restrição quanto ao traço semântico e à especificidade, aqui exemplificados mais uma
vez:
(35)
a) [o Marcelo]i elei está ficando muito malcriado, sabe? [Fat, 2, 80]
b) [o carioca]i elei tem possibilidade [de]... de pegar outros dialetos melhores.
[Eri, 2, 2000]
c) [a empresa que... na qual eu trabalho] i, elai só lida nesse caso com empresa.
[Adr, 3, 2000]
Os exemplos em (35) nos mostram a ocorrência de tópicos [+ humanos +
específicos]; [+ humanos – específicos] e [- animados + específicos]. O padrão PRO
+ PRO, mais frequente nos anos 80, está ilustrado abaixo:
31
Os exemplos em (34) não são casos de DE prototípicos, eles se assemelham a um aposto.
90
(36)
[eu]i o que eui acho interessante nele é que ele sempre fala que a forma tal
pode sê usada. [San, 3,2000]
Embora tenhamos trabalhado com um número pequeno de dados, temos no
comportamento do indivíduo uma semelhança com o da comunidade.
3.3 – O que dizem os resultados?
Embora o presente estudo não trate de um fenômeno variável, achamos
interessante confrontar as duas sincronias, utilizando a conjugação dos Estudos de
Tendência e de Painel, que permitem estabelecer correlações sobre o comportamento do
indivíduo e da comunidade e fazer considerações sobre possíveis processos de mudança
em progresso. Segundo Labov (1994, p.83), quatro padrões podem ser vislumbrados a
partir dos dois estudos:
Indivíduo
Comunidade
Estabilidade
Estável
Estável
Gradação etária
Instável
Estável
Mudança geracional
Estável
Instável
Mudança comunitária
Instável
Instável
Tabela 3.25: Padrões de mudança no indivíduo e na comunidade, segundo Labov (1994)
Quando há estabilidade num processo, tanto o indivíduo quanto a comunidade
permanecem estáveis no lapso de tempo decorrido entre a obtenção das duas amostras.
O segundo padrão, que representa a gradação etária, é o que se observa quando somente
o indivíduo muda seu comportamento linguístico, mas a comunidade permanece
estável. No caso do terceiro padrão, o olhar deve ser mais refinado para que a
interpretação seja correta: o indivíduo apresenta uma frequência de uma variante
característica e a mantém ao longo da vida, porém a comunidade, analisada em seu
conjunto, revela instabilidade, vista no aumento regular dessa frequência individual ao
longo de várias gerações, o que pode resultar em uma mudança. O último nos mostra
um padrão referente à mudança no comportamento do indivíduo e da comunidade, ou
seja, um processo de mudança que se completa.
91
Em relação às construções de DE aqui analisadas, podemos dizer que, no
conjunto, sua frequência global não se altera, ou seja, DE se apresenta estável nos dois
períodos. Em relação ao uso de SN na posição de tópico, encontramos variação tanto no
comportamento dos indivíduos quanto no comportamento da comunidade, ou seja,
nenhum dos dois estudos mostrou um perfil de estabilidade configurado. Há mais
estruturas com tópico SN na segunda sincronia tanto na comunidade como no indivíduo.
Esse aumento pode estar em consonância com a falta de restrições aos SNs com traço [animado] e [-específico], como vimos na seção 3.1.5. O fato de termos encontrado SNs
com diversos traços nos mostra que o sistema não impõe restrições para a natureza
semântica do elemento na posição de tópico. A análise dos traços semânticos mostrou
que o PB tem grande liberdade quanto ao elemento que ocupa a posição à esquerda e o
fato de encontrarmos SNs com traço [- específico] nos dois períodos corrobora essa
conclusão.
Em relação ao uso de pronomes na posição de tópico, a análise nos permite
dizer que o menor uso na segunda sincronia é um resultado esperado – os SNs
introduzem novos referentes, e, se as restrições aos SNs diminuem, é natural esperar que
eles aumentem. Mas o importante é dizer que, em relação ao pronome, a frequência de
uso foi reduzida tanto no indivíduo quanto na comunidade, as tabelas 3.1 e 3.2 mostram
isso. Esse estudo, longe de tratar de um processo de mudança em progresso, vem apenas
confirmar a presença expressiva das construções de DE sujeito no português brasileiro,
afastando-o do português europeu, do espanhol e do italiano e aproximando-o do
francês. Sua ocorrência nas duas sincronias sugere que a estrutura se instalou no sistema
há mais tempo, conforme atestam estudos diacrônicos como o de Decat (1989). E, se
considerarmos que a mudança na marcação do valor do Parâmetro do Sujeito Nulo, em
relação aos sujeitos referenciais, parece ter se consolidado nos anos 30 (cf. Duarte
1993), é natural esperar que as construções de DE sujeito, decorrentes da mudança, já
estivessem implementadas na amostra de 1980. Na seção 3.4, faremos uma breve
comparação do PB com outras línguas românicas como o francês e o PE, no que diz
respeito a essas construções.
92
3.4 – O PB e outras línguas românicas
Os resultados encontrados nesta dissertação possibilitam estabelecer uma
comparação entre o comportamento das estruturas de DE sujeito no PB e em outras
línguas românicas. O italiano e o espanhol, por exemplo, não apresentam casos de DE
sujeito, por serem línguas de sujeito nulo. Nessas línguas, só temos DE sujeito quando
ele merece destaque (ênfase ou contraste) e, nesse caso, o que aparece é o pronome
fraco, como vimos na seção 1.1.
No PE, assim como nas outras línguas de sujeito nulo, as construções de DE
sujeito também não são frequentes. Segundo Brito, Duarte e Matos (2003), outros tipos
de DE só ocorrem em contexto de frase raiz, ou seja, “deslocamento à esquerda de
tópico pendente” não ocorre em contextos encaixados como mostra o exemplo abaixo, que é interpretado como uma construção agramatical pelos portugueses:
(37)
*/? Toda gente me disse [que o João... não lhe pagaram o ordenado desse
mês]. (Mateus et alii, 2003, p.494)
Diferente dos resultados para o PE, encontramos na subseção 3.1.6 14% de DE
sujeito em sentenças encaixadas (exemplo 38 a) nos anos 80 e 11% em 2000, o que nos
mostra que o sistema do PB licencia construções de DE sujeito em qualquer contexto
sintático, ainda que em valores reduzidos, sendo gramaticais, por exemplo, estruturas
como (38 b) que mostra um contexto sem adjacência sintática entre tópico e sujeito:
(38)
a) É que eu acho que [a mocinha que começa muito cedo] i elai tá sendo
usada. [Mgl, 4, 2000]
b) [O carioca]i eu acho [que elei fala muito errado]. [Mar, 4, 2000]
Vasco (1999 e 2006) discute a questão de DE sujeito no sistema do PE e afirma
que essas construções não encontram lá ambiente tão favorável quanto o encontrado no
PB. Do total de DEs analisadas pelo autor 83% são referentes ao sujeito no PB,
enquanto apenas 32% são DE sujeito no PE. As estruturas em questão no PE são mais
93
frequentes com SN retomando outro SN, como no exemplo (39). O autor encontra
poucos casos de DE sujeito com retomada pronominal.
(39)
Sabe, [a mãe]i — ora ca esta — a mãei e que deve educar os filhos da mesma
maneira... (PE) (Vasco 2006, p. 153)
O autor afirma que, diante de uma sentença como (39), é mais comum que os
portugueses atribuam o status de hesitação do que o status de um caso de DE sujeito.
Portanto, as construções de DE sujeito, evidência da preferência do PB em preencher
sujeito, quando aparecem no PE, não apresentam a mesma liberdade de contextos
sintáticos evidenciada nos nossos resultados.
Quanto ao francês, sistema que apresenta muitos casos de DE sujeito, sabemos
que a construção com pronome moi de 1ª pessoa é muito frequente (cf. Barnes, 1986).
Nossos dados mostram que, no PB, esse tipo de estrutura foi muito recorrente nos anos
80, porém apareceu menos na amostra de 2000, o que pode se dever a características da
entrevista.
No que diz respeito às retomadas, no PB, observamos que o pronome
nominativo é a estratégia mais produtiva, independente dos traços semânticos do tópico,
como vimos em 3.1.5. A retomada com demonstrativo, muito produtiva no francês, não
apresentou frequências relevantes na nossa amostra em nenhum dos dois períodos.
Contudo, é importante destacar que a restrição do francês, apresentada por Barnes
(1986), de não licenciar tópicos [- animados] retomados por nominativos parece não
existir mais, como comentamos no capítulo 1. Reproduzimos aqui o exemplo do francês
falado, que mostra um SN [- animado] sendo retomado por um nominativo assim como
acontece no PB:
(40)
[La croissance]i, ellei dépend de la confiance.
O crescimento, ele depende da confiança.
O que parece acontecer no francês é uma restrição quanto ao traço de
especificidade do SN na posição de tópico. Os exemplos encontrados em Avanzi,
Mathieu (2011), apesar de apresentarem SN [- animado], não mostram tópicos [específicos].
94
Quanto aos outros tipos de restrição, o PB se aproxima do francês, já que
nossos tópicos podem introduzir informação nova no discurso sem função contrastiva
ou entoação específica e as sentenças podem ocorrer em qualquer contexto sintático.
Assim como no francês, as sentenças de DE sujeito aparecem majoritariamente em
contexto matriz, porém elas também aparecem em contexto encaixado, ainda que em
menor quantidade. Esse resultado obtido na subseção 3.1.6 aproxima o PB do francês.
Apresentamos, nesse capítulo, os resultados referentes à análise do corpus
dessa pesquisa, detalhando as características de todos os elementos que aparecem
ocupando a posição de tópico. Apresentamos também as possíveis estratégias de
retomada e como elas se combinam com o tópico, mostrando que tópicos SNs
favorecem retomadas SNs e tópicos pronominais favorecem retomadas pronominais. O
tipo de retomada mais frequente foi o pronome nominativo mesmo com SNs na posição
de tópico em ambas as sincronias.
Os resultados encontrados para o estudo da comunidade, expostos na seção 3.1
(e subseções), foram relacionados aos resultados referentes ao estudo do indivíduo
(seção 3.2), como sugere Labov (1994). O confronto dos resultados nos fez perceber
que um perfil de não estabilidade acontece tanto no indivíduo quanto na comunidade
quando focalizamos o tipo de elemento que ocupa a posição de tópico nas sentenças de
DE sujeito. Mostramos, portanto, que ambos, Estudo de Painel e Tendência, confirmam
um aumento de SN como tópico, o que pode não ser, portanto, uma simples questão de
distribuição dos dados, e sim uma questão de ausência de restrições impostas pelo
sistema.
A preferência por SNs na posição de tópico, associada à ausência de restrição e
às mudanças morfossintáticas sofridas reforçam a aproximação do PB com as línguas
mistas; línguas de tópico e sujeito na tipologia aqui utilizada (Li e Thompson, 1976).
Nosso sistema se distancia, portanto, das línguas orientadas exclusivamente para o
sujeito e os resultados aqui encontrados podem ser tratados como evidência desse
distanciamento.
95
CONCLUSÃO
A proposta do presente trabalho foi a de refinar a análise, do ponto de vista
estrutural, das construções de deslocamento à esquerda (DE) de sujeito no português
brasileiro, tomando como base a fala carioca. O objetivo geral era verificar se o sistema
do PB apresentaria algum tipo de restrição formal ou contextual específica para essas
construções. Para tal análise, utilizamos entrevistas que compõem o acervo do projeto
PEUL-UFRJ realizadas na década de 1980 e, cerca de 19 anos depois, (entre 1999 e
2000), a fim de realizar um Estudo da Mudança em Tempo Real de Curta Duração, nos
moldes de Labov (1994).
Com base na associação dos princípios da Teoria Gerativa com a
Sociolinguística, levantamos algumas hipóteses que guiaram nosso trabalho e reunimos
grupos de fatores linguísticos e extralinguísticos com o objetivo de responder a algumas
perguntas. Tomando como referência o princípio do encaixamento da mudança (W, L e
H, 1968), nossa questão central era saber se, pelo fato de ter passado por um processo
de mudança na marcação do valor do PSN, o PB, durante esse intervalo de tempo
apresentaria menos restrições à estrutura de DE sujeito. O enfoque recaiu sobre o traço
semântico e à especificidade do SN que ocupa a posição deslocada e seu correferente.
Os resultados encontrados mostraram que os elementos que ocupam a posição
de tópico são de natureza gramatical diversa: pronomes demonstrativos, pronomes
pessoais e SNs, os dois últimos os mais característicos dessas construções. Entre os
pronomes, encontramos os de 1ª e 3ª pessoa (a ausência de pronomes de segunda é
própria do modelo de entrevista, em que as ocorrências de segunda pessoa predominam
na fala do entrevistador); bem como pronomes de referência arbitrária, como você e a
gente. Observamos que, entre os pronomes pessoais, tanto na primeira sincronia quanto
na segunda, a preferência recai sobre os de 1ª pessoa. O tópico SN é o mais frequente
quando observamos a hierarquia da segunda sincronia, diferente da primeira em que o
tópico mais recorrente é do tipo pronominal. Quanto à configuração deste SN,
analisamos os elementos que se situam à margem esquerda (especificadores) e à
margem direita (modificadores e complementos simples e oracionais). No caso de
elementos à esquerda, foi possível observar que as construções de DE não rejeitam SNs
96
indefinidos, havendo a presença de artigos e pronomes indefinidos à esquerda, ou SNs
nus.
O cruzamento do elemento em posição de tópico com seu correferente (ou
cópia na posição de sujeito) nos mostrou que essa posição também não sofre restrições.
As retomadas são, em ambos os períodos, feitas majoritariamente por pronomes, mas
encontramos igualmente alguns SNs nessa posição. Essa retomada feita através de um
SN só é favorecida quando temos outro SN na posição externa à sentença. A retomada
por pronome nominativo acontece independentemente da natureza do tópico.
A análise do traço semântico e da especificidade do tópico revela que não
existem restrições quanto à combinação do feixe de traços do elemento que ocupa a
posição de tópico, podendo este ser [+ / - humano]; [+ / - animado] ou [+ / - específico].
Esses resultados foram associados à hierarquia de referencialidade proposta para o
preenchimento do sujeito. Eles nos permitiram observar que, além de as construções de
deslocamento à esquerda de sujeito constituírem um “efeito colateral” da mudança na marcação do valor do PSN, sua implementação segue a mesma hierarquia seguida pela
implementação dos pronomes sujeito – começam pelos que têm o traço inerentemente
[+ humano +específico] - e, mais lentamente chegam aos tópicos com traço [- animado
– específico], que são menos recorrentes. Isso certamente se deve ao fato de os sujeitos
com esse traço serem os mais resistentes na mudança em direção ao sujeito pronominal
preenchido.
Ainda que o traço [+ humano] favoreça a ocorrência de DE sujeito,
acompanhando a hierarquia de referencialidade, as outras combinações não são
bloqueadas pelo sistema. Verificam-se, assim, contextos de maior resistência, mas não
de impedimento. Esse fato decorre da constatação de que o PB não apresenta restrições
semânticas quando tratamos das construções de DE sujeito, confirmando nossa
hipótese. Esta característica é compartilhada com as línguas de tópico, segundo a
tipologia de Li & Thompson (1976), já que estas são línguas que não apresentam
restrições quanto ao elemento que ocupa a posição de tópico. Embora haja essa
semelhança, os resultados aqui apresentados permitem apenas mostrar que o PB é
língua mista, pois não apresenta restrições quanto à natureza do SN por exemplo.
A análise dos outros grupos, como presença vs ausência de material
interveniente e configuração sintática da estrutura em que ocorrem tópico e
correferente confirmou a não existência de restrições para DE sujeito. Encontramos leve
97
preferência pela estrutura de DE sujeito em presença de elementos intervenientes, mas
são expressivos percentualmente os dados de DE sem qualquer material interveniente,
fato que sugere que a distância entre tópico e sujeito não é determinante para a
ocorrência de DE. No que diz respeito à configuração sintática, DE sujeito não se
mostrou bloqueada por nenhum contexto, ocorrendo inclusive em subordinadas e com
tópico e retomada em contexto não adjacentes, sem que a construção apresente qualquer
valor contrastivo ou receba acento de ênfase.
Nosso Estudo em Tempo Real revela que as construções de DE sujeito já
estavam implementadas na primeira sincronia. A diferença entre os dois períodos reside
no fato de nos anos 80 encontrarmos mais pronomes na posição de tópico e em 2000,
essa preferência passar a ser por SNs.
Quanto ao indivíduo, tal como observado nos estudos em Paiva e Duarte
(2003), não há um comportamento uniforme; no entanto, de um modo geral, a
preferência por tópico SN entre os indivíduos cresce de um período para outro, assim
como acontece na comunidade.
Nossos resultados corroboram os encontrados por autores como Duarte (1995),
Orsini (2003), Vasco (2006), Vasco e Orsini (2007), que, a partir do trabalho de Pontes
(1987), fizeram ampla descrição do conjunto das construções de tópico marcado no PB,
o que lhes permitiu advogar em favor da inclusão do PB entre as línguas com
proeminência de tópico e de sujeito. Nesta perspectiva, acreditamos que o presente
trabalho, ao focalizar as construções de DE sujeito, fornece informações mais
detalhadas acerca das características estruturais e contextuais dessas construções,
contribuindo para a investigação do percurso da mudança paramétrica referente ao
sujeito e seus reflexos no sistema gramatical do PB além de suscitar outras
investigações sobre o estatuto do sujeito e do tópico nas línguas com orientação parcial
para o discurso.
98
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Amostra utilizada: www.letras.ufrj.br/peul. Último acesso em janeiro de 2012.
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