O Servidor Celetista e a Estabilidade

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O Servidor Celetista e a Estabilidade
Resumo
Objetiva o presente ensaio estimular a apreciação da questão da estabilidade
do servidor público vinculado ao regime da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT,
em vista da alteração promovida pela Emenda Constitucional n.º 19/98 no texto da
Constituição da República promulgada em 1988.
A indagação que persiste sobre o tema, é se o servidor público efetivo,
admitido mediante concurso público, sob o regime da Consolidação das Leis do
Trabalho – CLT, está sujeito ao estágio probatório e à estabilidade prevista no art. 41
da Constituição Federal, ou se tal dispositivo constitucional visa apenas ao servidor
estatutário.
Introdução
A matéria em comento, após suscitar controvérsias no mundo jurídico, estava
pacificada no posicionamento adotado pelo Tribunal Superior do Trabalho e do
Supremo Tribunal Federal, no sentido de que a estabilidade independe do regime
jurídico ao qual está sujeito o servidor, visto que o texto original do dispositivo
constitucional não fazia distinção quanto a esse aspecto.
Cumpre destacar, entretanto, que a matéria exige nova reflexão, posto que, ao
abolir a exigência de regime jurídico único, a Emenda Constitucional n.º 19/98 voltou a
permitir a coexistência do regime celetista com o estatutário no serviço público, sendo
expressa em alterar a redação do art. 41 da Constituição.
A adoção do regime celetista, portanto, a despeito de não afastar a
possibilidade de instituição de carreiras, impede a estabilidade do servidor no serviço
público, forte do disposto na nova redação do art. 41 do texto constitucional.
Assim, não há que se falar em estabilidade, estágio probatório, perda do cargo,
disponibilidade, etc., institutos próprios do regime jurídico dos cargos públicos.
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Posição Original da Constituição de 1988
Vale ressaltar, por primeiro, quanto à estabilidade no serviço público (e, por
conseguinte, ao estágio probatório), que ainda ecoam vozes isoladas sustentando sua
aplicação aos servidores admitidos sob o regime da Consolidação das Leis do
Trabalho.
Insistem no fato de que o E. Tribunal Superior do Trabalho consolidou as
Orientações Jurisprudenciais n.º 265 (Subseção I) e n.º 22 (Subseção II), assegurando
ao servidor celetista da administração direta, autárquica e fundacional, o benefício da
estabilidade do art. 41 da Constituição.
No mesmo sentido, a decisão proferida pelo E. Supremo Tribunal Federal no
RE 187.229/PA1 indica posicionamento jurisprudencial no sentido de garantir
estabilidade ao servidor público admitido sob o regime da CLT.
Tais entendimentos, no entanto, firmaram-se antes do advento da Emenda
Constitucional n.º 19/98, que alterou substancialmente a redação do art. 41 do texto
magno.
Com efeito, no voto proferido no RE 187.229/PA o eminente relator, Ministro
Marco Aurélio, assim limitou a questão:
“Resta, então, indagar: estariam eles alcançados pela norma do
artigo 41 da Constituição Federal então em vigor? A resposta é
desenganadamente positiva. O preceito em comento revela, sem
distinguir o regime jurídico, serem estáveis após dois anos de efetivo
exercício os servidores nomeados em virtude de concurso público.
Descabe introduzir no preceito limitação que nele não se contém. O
fato de a União ou mesmo o Estado federado ou, ainda, Município
adotarem como regime jurídico o trabalhista não informa a
possibilidade de despedimento à livre discrição.” (grifos nossos)
1
Ementa: ESTABILIDADE – SERVIDOR PÚBLICO. A estabilidade prevista no artigo 41 da Constituição
Federal independe da natureza do regime jurídico adotado. Servidores concursados e submetidos ao
regime jurídico trabalhista têm jus à estabilidade, pouco importando a opção pelo sistema do Fundo de
Garantia por Tempo de Serviço. (DJ 14.05.99)
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Verifica-se, daí, que a decisão apreciou a matéria sob o enfoque da redação
original da Constituição de 1988, não fazendo qualquer menção à alteração
introduzida pela EC 19/98.
É certo que na égide da redação original a discussão residia na utilização, pelo
constituinte, da expressão “nomeados”, que ao ver de grande parte da doutrina não se
aplicava aos empregados públicos, que verdadeiramente são “contratados”.
A Suprema Corte, no entanto, liquidou a polêmica, à época, entendendo que o
texto constitucional não fazia distinção do regime jurídico a que estava vinculado o
servidor, assegurando estabilidade a todos os concursados.
A Alteração procedida pela Emenda 19/98
A questão, no entanto, não mais subsiste nestes termos após o advento da
Emenda n.º 19/98. E a doutrina logo tratou de esclarecer isso:
“Assim, afigura-se plenamente compatível com o texto constitucional
em vigor a adoção do regime contratual de caráter trabalhista no
âmbito da administração pública federal, estadual e municipal. É
certo que a admissão de servidores sob esse regime há de observar
rigorosamente o princípio do concurso público. Não há dúvida,
porém, de que os servidores regidos por esse sistema não estarão
submetidos ao modelo de estabilidade previsto no art. 41 da Carta. É
que, nesse artigo, consagra-se que “são estáveis após três anos de
efetivo exercício os servidores nomeados para cargo de provimento
efetivo em virtude de concurso público”. Ainda que se devam tomar
todas as cautelas na dispensa de servidores contratados mediante
concurso público, é certo que a rescisão do vínculo não terá a
mesma solenidade o desfazimento da relação administrativa no plano
estatutário.”2 (grifos nossos)
No mesmo sentido está o ensino de Maria Sylvia Zanella di Pietro3:
“c) tornou expresso, no caput do artigo 41, que a estabilidade só
beneficia os servidores nomeados para cargo de provimento efetivo,
pondo fim ao entendimento defendido por alguns doutrinadores de
2
Ives Gandra da Silva Martins e Gilmar Ferreira Mendes. A Superação do Regime Único: Legitimidade da
Admissão de Servidores Públicos sob o Império da Consolidação das Leis do Trabalho. Revista Jurídica
Virtual, n. 01, maio/99.
3
Direito Administrativo.16.ª ed., São Paulo, Atlas, 2003, p. 480.
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que os servidores celetistas, sendo contratados mediante concurso
público, também faziam jus ao benefício;”
Está afastada, pois, de uma vez por todas, a controvérsia acerca da não
aplicação da estabilidade prevista no art. 41 da Lei Maior aos servidores regidos pela
Consolidação das Leis do Trabalho, ainda que admitidos mediante concurso público.
Nesse sentido, a própria jurisprudência do TST evoluiu, como demonstra a
seguinte decisão daquela Corte:
ADMINISTRAÇÃO
PÚBLICA
REINTEGRAÇÃO
–
–
SERVIDOR
ESTABILIDADE
DO
CELETISTA
ART.
41
–
DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL – EMENDA CONSTITUCIONAL N.º 19/98
– REGRA DE TRANSIÇÃO.
Necessário estabelecer os critérios definidores da incidência e
aplicação do art. 41 da Constituição da República, considerados os
períodos anterior e posterior à Emenda Constitucional n.º 19,
publicada no Diário Oficial da União de 5.6.1998.
1. Até 5.6.98, os ocupantes de cargos ou empregos públicos na
administração pública direta, autárquica e fundacional, aprovados em
concurso público, eram titulares do direito à estabilidade funcional
após 2 (dois) anos de efetivo exercício.
2. A partir de 5.6.98, a Emenda Constitucional n.º 19/98 restringiu a
estabilidade aos concursados investidos em cargo público após 3
(três) anos de efetivo exercício.
3. Norma transitória constante no art. 28 da Emenda Constitucional n.º
19/98 assegurou aos servidores não estáveis admitidos antes da
Emenda, a permanência do prazo de 2 (dois) anos de efetivo exercício
para aquisição do direito à estabilidade.
4. A disciplina constitucional preserva a garantia aos servidores
regidos pela CLT que ingressaram no serviço público antes da
promulgação da Emenda Constitucional n.º 19/98.
5. No caso concreto, a Reclamante-Recorrente foi admitida em
período anterior a 5.6.98 e implementou tempo de serviço superior a 2
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(dois) anos, sendo o caso de reconhecer em seu favor o direito
subjetivo reivindicado.
6. A Orientação Jurisprudencial n.º 265 da SBDI-1/TST só se aplica às
situações que envolvam admissão de servidor público antes da data
da promulgação da Emenda Constitucional n.º 19/98.
Recurso de Revista parcialmente conhecido e provido.”
(TST, 3.ª Turma, RR 59343-2002-900-03-00, j. 17.12.2003, DJ
27.02.2004, rel. Min. Maria Cristina Irigoyen Peduzi)
Não
subsiste,
pois,
para
os
servidores
celetistas
contratados
pela
Administração Pública, o instituto do estágio probatório, que é o “período inicial
constitucionalmente definido para ser cumprido aos nomeados para cargo de
provimento efetivo”4.
Com efeito, não havendo estabilidade no serviço público, nos termos do art. 41
da Constituição, não há razão para o período probatório que tem como objetivo
assegurar a estabilidade ao servidor concursado.
É certo, ainda, que a Administração Pública pode promover avaliações de
desempenho através de uma Comissão especialmente designada para tal fim.
Tais avaliações, contudo –– e apesar de relevantes em face do princípio da
eficiência, consagrado no art. 37 da Constituição, e da necessária avaliação
institucional da autarquia enquanto Instituição de Ensino Superior ––, não têm o
condão de assegurar a estabilidade constitucional aos servidores celetistas.
Conclui-se, sem a pretensão de esgotar o tema mas apenas de contribuir com
o seu debate, que o servidor celetista admitido após a data de vigência da Emenda
Constitucional n.º 19/98 não possui direito à estabilidade e, portanto, não se sujeita ao
estágio probatório.
A estabilidade, entretanto, é assegurada aqueles servidores celetistas que
foram admitidos, mediante concurso público, antes da vigência da Emenda
Constitucional n.º 19/98, aplicando-se, a estes, em caso de demissão, o disposto na
redação original da Constituição da República.
4
Cármen Lúcia Antunes Rocha. Princípios Constitucionais dos Servidores Públicos. São Paulo, Saraiva,
1999, p. 236.
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Referências Bibliográficas
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL, 1988.
EMENDA CONSTITUCIONAL N.º 19, de 05.06.1998.
ROCHA, Carmen Lúcia Antunes. Princípios Constitucionais dos Servidores Públicos.
São Paulo, Saraiva, 1999.
MARTINS, Ives Gandra da Silva Martins e MENDES, Gilmar Ferreira. A Superação do
Regime Único: Legitimidade da Admissão de Servidores Públicos sob o Império da
Consolidação das Leis do Trabalho. Revista Jurídica Virtual, n. 01, maio/99.
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo.16.ª ed., São Paulo, Atlas,
2003.
Cleuton de Oliveira Sanches, Advogado, Especialista em Direito Tributário pela
PUCCAMP e em Direito Constitucional pela Universidade São Francisco.
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