doença bipolar

Propaganda
DOENÇA BIPOLAR
Do Diagnóstico ao Tratamento
Evidência Científica/Aspectos Actuais
MÓDULO 4 – DEPRESSÃO BIPOLAR, Aspectos Actuais da Terapêutica
Formador: Drª Manuela Abreu
Assistente Hospitalar do Serviço de Psiquiatria do Hospital de Santa Maria
Mestre em Psiquiatria pela Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa
Profª Doutora Maria Luísa Figueira
Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa
TEXTOS DE APOIO
ÍNDICE
1.
Introdução.................................................................................................. 2
2.
Terapêutica Antidepressiva ..................................................................... 2
3.
Lítio e Terapêutica Anticonvulsivante..................................................... 6
3.1.
Lítio ...................................................................................................... 6
3.2.
Valproato.............................................................................................. 7
3.3.
Carbamazepina.................................................................................... 7
3.4.
Lamotrigina .......................................................................................... 8
3.5.
Novos anticonvulsivantes..................................................................... 8
4.
Terapêutica Antipsicótica......................................................................... 9
5.
Electroconvulsivoterapia (ECT) ............................................................. 10
6.
Conclusões.............................................................................................. 11
7.
Bibliografia .............................................................................................. 12
Manuela Abreu
2
1. Introdução
O tratamento da depressão bipolar permanece bastante controverso, já
que o seu racional implicaria, naturalmente, o uso de antidepressivos e a
evidência clínica apresenta-se, na sua maioria, contraditória.
A terapêutica mais frequente da depressão bipolar inclui antidepressivos,
lítio
e
estabilizadores
do
humor,
como
a
lamotrigina,
valproato
e
carbamazepina. Mais recentemente, realizaram-se estudos clínicos com
antipsicóticos atípicos, designadamente, olanzapina e quetiapina, com
resultados promissores.
O objectivo deste módulo é rever os estudos mais importantes, dentro de
cada classe de fármacos mais usados nesta patologia, no sentido de se
perceber a dimensão da complexidade da decisão terapêutica, ou seja, porque
razão nalguns casos se justifica a prescrição de dois estabilizadores do humor
ou de um anticonvulsivante associado a um antidepressivo, ou o ainda, outra
estratégia terapêutica.
2. Terapêutica Antidepressiva
Tratar a depressão bipolar com antidepressivos, ou não tratar, continua
a suscitar diferendos entre os especialistas nesta área. Se a maioria dos
autores estão de acordo em relação ao facto de não existirem estudos
suficientes que demonstrem a superioridade de um antidepressivo em relação
aos demais quanto à eficácia, o mesmo já não acontece face ao risco de
indução de um episódio maníaco (Wehr 1987).
Os principais problemas da medicação antidepressiva, nestes doentes,
são: risco de indução de mania, ciclação rápida e subsequente resistência ao
tratamento, recaída frequente após a sua descontinuação e agravamento de
um estado misto de hipomania disfórica, presente em muitos episódios
depressivos (Dubovsky 2005).
© 2006 Vale & Vale Eds, Lda.
Doença Bipolar
Manuela Abreu
3
Uma determinada escola sustenta que os antidepressivos tradicionais
facilitam a indução de mania ou ciclação rápida e não conferem benefício
profiláctico, a longo prazo, na depressão bipolar (Ghaemi 2001). Esta
perspectiva, adoptada por muitas US practice guidelines, aconselha cautela no
uso de antidepressivos, devendo estes ser usados em associação a
estabilizadores do humor e por períodos breves (Hirschfeld 2002; Keck 2004 e
Suppes 2005). Outra ideia comum é que a suspensão prematura dos
antidepressivos, após sucesso terapêutico do episódio agudo de depressão
bipolar, pode aumentar o risco de recaída, constituindo este último um
problema mais importante que a potencial ciclação rápida causada pelos
antidepressivos. (Altshuler 2003).
O debate acerca da terapêutica antidepressiva na depressão bipolar é
ainda controverso, pelo que se torna importante mostrar resultados de estudos
efectuados até ao corrente ano. Numa breve revisão cronológica das opções
terapêuticas na depressão bipolar, baseadas em estudos controlados com
antidepressivos, constatamos que na década de 70 foi dada particular atenção,
ao inibidor irreversível da monoaminooxidase (IMAO), tranilcipromina, cuja
eficácia foi demonstrada em dois estudos controlados com placebo
(Himmelhoch 1982; Himmelhoch 1991). Este fármaco não foi comercializado
em Portugal.
Também
relativamente
à
eficácia,
diversos
estudos
mostraram
equivalência entre os IMAOs e tricíclicos, em particular, a imipramina
(Baumhackl 1989; Cohn 1989; Thase 1992 e Nemeroff 2001). Noutros, foi
sugerida a sua superioridade, especialmente quando o quadro depressivo
bipolar apresentava características de atipicidade, como sejam a anergia,
hipersónia ou hiperfagia (Himmelhoch 1991).
Entre os antidepressivos tricíclicos, o mais estudado foi a imipramina,
que mostrou ser mais eficaz do que o placebo. Foi ainda comparada a eficácia
da imipramina com a fluoxetina (Cohn 1989), moclobemide (Baumhackl 1989),
maprotilina (Kessell 1975) e tranilcipromina (Himmelhoch 1991). Como
resultados, obtiveram-se taxas de resposta semelhantes às da imipramina, à
excepção do tranilcipromina, que se mostrou inequivocamente superior, como
já referido. Também a maior eficácia da fluoxetina foi pouco clara, dada a
medicação concomitante de lítio nesse braço do estudo, face aos restantes.
© 2006 Vale & Vale Eds, Lda.
Doença Bipolar
Manuela Abreu
4
Posteriormente foram realizados estudos controlados com SSRIs: o já
referido, comparação da fluoxetina com imipramina (Cohn 1989) e dois mais
recentes que avaliaram a eficácia da paroxetina associada ao lítio e ao
valproato, respectivamente (Young 2000 e Nemeroff 2001).
A
questão
fundamental
e
controversa
da
associação
de
um
antidepressivo a um estabilizador do humor, ser ou não eficaz, permanece,
contudo, por responder. Apenas um estudo abordou este aspecto e mostrou
que a adição de um SSRI ou de um tricíclico era tão eficaz quanto o uso de lítio
por si só, em níveis terapêuticos (Nemeroff 2001). Doentes com litemias >0.8
mEq/L não beneficiaram de terapêutica antidepressiva coadjuvante, enquanto
que para níveis <0.8 mEq/L houve vantagem na combinação com paroxetina.
O segundo estudo, encontrou respostas sobreponíveis na associação de lítio
com divalproato e na terapêutica conjunta de cada um destes fármacos com
paroxetina (Young 2000).
A maioria dos novos antidepressivos usados na depressão bipolar,
paroxetina, venlafaxina, fluoxetina, citalopram e nefazodone tem sido
investigada, em estudos abertos, em adição a um estabilizador do humor, com
aparente eficácia (Silverstone 2004).
Face à questão da indução de mania, é de salientar que estudos
realizados com bupropion, de acção predominantemente dopaminérgica,
apontam para um menor risco de viragem com este antidepressivo (Sachs
1994).
Na metanálise de Peet (1994), é sugerido que o risco de viragem com os
SSRI é muito inferior ao dos tricíclicos e não significativamente superior ao
placebo. Esta análise foi criticada por estar baseada em dados de estudos
clínicos desenhados para a fase aguda da depressão e não para detectar
possíveis viragens maníacas (Sachs 1996).
Poucos foram ainda os estudos que avaliaram o resultado, a longo
prazo, dos novos antidepressivos. Uma excepção é o estudo padronizado de
10 semanas de terapêutica na fase aguda e manutenção durante um ano, que
compara bupropion, sertralina e venlafaxina, associados a estabilizadores do
humor (Post 2003 e Leverich 2006). Os resultados mostraram um aumento de
risco, três vezes superior, de indução de mania com venlafaxina relativamente
ao bupropion (Leverich 2004).
© 2006 Vale & Vale Eds, Lda.
Doença Bipolar
Manuela Abreu
5
Em relação a estudos controlados com antidepressivos, uma metanálise
recente de 12 estudos padronizados concluíu que a terapêutica antidepressiva,
por curtos períodos, é eficaz na depressão bipolar e que a taxa global de
viragem para mania ou hipomania, parece ser semelhante com os
antidepressivos (3.8%) ou com placebo (4.7%), (Gijsman 2004). O problema
que se coloca é o facto de serem resultados de uma metanálise, ou seja, de
um
estudo
observacional
de
diversos
trabalhos
com
metodologias
heterogéneas. Embora este aspecto não invalide os resultados, obriga
naturalmente, a uma análise bastante crítica dos mesmos.
Ao ser abordado o aspecto da descontinuação dos antidepressivos
encontramos dois estudos observacionais, com um longo follow-up, que
mostram
uma
taxa
de
recaída
menor,
após
resposta
positiva
aos
antidepressivos (em especial, SSRIs), nos doentes que mantinham essa
terapêutica durante 6 meses, em relação aos que a suspendiam (Altshuler
2003 e Joffe 2005).
Em oposição, o estudo padronizado, a longo prazo, inserido no NIMH
Systematic Enhancement Program for Bipolar Disorder (STEP-BD) study,
avaliou nos últimos cinco anos, a descontinuação de antidepressivos após
resposta inicial. A análise interina sugere que os antidepressivos foram,
aparentemente, ineficazes na diminuição da morbilidade do humor, ao fim de
um ano de follow-up após a recuperação do episódio depressivo agudo
(Ghaemi 2005). Nos com ciclação rápida, a persistência de antidepressivos,
após a fase aguda, parece associar-se ao agravamento da situação
depressiva. De notar que estas observações são ainda preliminares e que os
resultados definitivos apenas serão obtidos no final deste ano.
Perante o elevado risco de suicídio da depressão bipolar impõe-se,
ainda, ser pesada a necessidade do uso destes fármacos versus as
respectivas complicações. Goldberg, com base num grande projecto
naturalístico, refere que a adição de antidepressivos a estabilizadores do
humor não pareceu associada à diminuição da incidência de ideação suicida
(Goldberg 2003). Os antidepressivos podem agravar estados mistos de
hipomania disfórica em doentes deprimidos, aumentando o risco de suicídio
pela impulsividade, agitação e agressividade que acarretam.
© 2006 Vale & Vale Eds, Lda.
Doença Bipolar
Manuela Abreu
6
Em resumo, antes de se tomar a decisão de prescrever, ou não, um
antidepressivo a doentes bipolares deve ser tido em conta que o risco de
viragem é maior em doentes com: Perturbação bipolar tipo I e história prévia de
indução de mania com estes fármacos; ciclação rápida no ano anterior e;
episódio actual de depressão, após fase maníaca nos últimos dois meses. Um
segundo aspecto a considerar é o facto da sintomatologia configurar um
episódio depressivo major ou tratar-se apenas de sintomas depressivos
subsindromáticos, para os quais não existem dados sobre a eficácia e
segurança da terapêutica antidepressiva (Goldberg 2005).
3. Lítio e Terapêutica Anticonvulsivante
3.1. Lítio
Vários estudos, alguns levados a cabo na década de 70, demonstraram a
superioridade do lítio, em relação ao placebo, no tratamento da depressão
bipolar. Esta vantagem, no entanto, não se verificava quando comparado com
os antidepressivos (Price 1986; Silverstone 2004 e Dubovsky 2005).
A combinação de lítio com carbamazepina, no tratamento de depressão
bipolar refractária, demonstrou eficácia em cerca de 50% dos doentes, num
estudo de Kramlinger (1989).
Num trabalho de Baldessarini (2001), observou-se redução do risco de
suicídio em doentes bipolares medicados com lítio vs não medicados com lítio.
Estes e outros trabalhos publicados permitem concluir que o lítio é um
fármaco útil no tratamento da depressão bipolar. No entanto, será mais
indicado como agente potenciador de antidepressivos, antipsicóticos ou
anticonvulsivantes que em monoterapia. A sua eficácia parece ser maior na
prevenção de episódios depressivos que no tratamento agudo dos mesmos e
maior na prevenção de episódios maníacos que de episódios depressivos
(Dubovsky 2005). Tendo em conta os seus efeitos acessórios e janela
terapêutica reduzida, deverá ser utilizado na menor dose eficaz, com vários
doentes a permanecerem sem sintomas com apenas uma toma diária à noite
(Neuroscience Education Institute – www.neiglobal.com).
© 2006 Vale & Vale Eds, Lda.
Doença Bipolar
Manuela Abreu
7
3.2. Valproato
Em estudos não randomizados e de pequenas dimensões, o valproato,
em combinação com antidepressivos ou fármacos antimania, demonstrou
eficácia de 30 a 50% em doentes bipolares com episódio depressivo
(Calabrese 1990 e McElroy 1993).
Segundo Dubovsky (2005), na prática clínica, o valproato não parece ser
particularmente eficaz enquanto “antidepresssivo”, pelo que a sua utilização na
depressão bipolar dever-se-á limitar à potenciação de antipsicóticos,
antidepressivos ou outros anticonvulsivantes, tendo sempre presente o seu
potencial teratogénico (defeitos do tubo neural), (Neuroscience Education
Institute – www.neiglobal.com).
3.3. Carbamazepina
A carbamazepina demonstrou eficácia em 50 a 60% de doentes bipolares
deprimidos, nalguns estudos de pequenas dimensões (Post 1986 e Brambilla
2001).
Num trabalho de Shire, em comparação com placebo, os sintomas
depressivos observados em doentes com episódio misto melhoraram,
significativamente, com carbamazepina (Neuroscience Education Institute –
www.neiglobal.com).
A experiência clínica parece indicar que a carbamazepina é útil no
tratamento agudo da depressão bipolar, sendo este efeito potenciado pelo lítio
ou valproato (Dubovsky 2005). O intervalo terapêutico situa-se entre 400 e
1200 mg/dia, devendo iniciar-se o tratamento com 400 mg/dia. Esta dose
poder-se-á aumentar, 200 mg/dia em cada semana. A titulação lenta do
fármaco e as formulações de libertação prolongada permitem uma maior
tolerabilidade aos efeitos acessórios, nomeadamente a sedação. Dado a
carbamazepina ser indutor enzimático, poderá ser necessário realizar ajustes
periódicos da dose (Neuroscience Education Institute – www.neiglobal.com).
© 2006 Vale & Vale Eds, Lda.
Doença Bipolar
Manuela Abreu
8
3.4. Lamotrigina
Um estudo, multicêntrico e duplamente cego, demonstrou que a
lamotrigina, em monoterapia, dosagem de 50 e 200 mg/dia, era eficaz, e
significativamente superior ao placebo, na redução da pontuação da MADRS
(Montgomery-Asberg Depression Rating Scale) em doentes com depressão
bipolar; a redução alcançada era semelhante para as duas dosagens
(Calabrese 1999). Noutros dois estudos (Bowden 2003 e Calabrese 2003), a
lamotrigina demonstrou ser eficaz no prolongamento do tempo até novo
episódio depressivo, sendo que num destes estudos (Calabrese 2003), o
prolongamento do tempo observou-se tanto para o episódio depressivo como
para o episódio maníaco.
Apesar da escassez de dados, a lamotrigina parece ser claramente eficaz,
em monoterapia, no tratamento agudo da depressão bipolar (Calabrese 1999),
obrigando, no entanto, a uma lenta titulação até se alcançar a dose desejada
(100-200mg/dia), de modo a evitar efeitos acessórios, como rash cutâneo
(Neuroscience Education Institute – www.neiglobal.com).
Está igualmente indicada como terapêutica de manutenção, impedindo
recorrências quer depressivas, quer maníacas (Dubovsky 2005).
3.5. Novos anticonvulsivantes
A gabapentina foi avaliada em vários estudos com doentes bipolares, não
tendo sido demonstrada eficácia enquanto estabilizador de humor ou utilidade
enquanto terapêutica para depressão bipolar. O topiramato também não
apresenta evidência de eficácia enquanto estabilizador de humor. A
oxcarbazepina, a zonisamida, o levetiracetam, a tiagabina e a vigabactrina, não
têm estudos controlados, pelo que, de momento a sua utilização na doença
bipolar não está recomendada (Dubovsky 2005; Neuroscience Education
Institute – www.neiglobal.com).
© 2006 Vale & Vale Eds, Lda.
Doença Bipolar
Manuela Abreu
9
4. Terapêutica Antipsicótica
O interesse nos antipsicóticos atípicos no tratamento da depressão
bipolar foi proveniente de estudos de episódios de mania. Doentes com
quadros de mania mista mostraram benefício relativamente aos sintomas
depressivos e de mania. A medicação antipsicótica pode ser útil em suprimir a
hipomania disfórica mista em doentes com depressão bipolar, sendo
recomendados os atípicos em vez dos neurolépticos, já que estes últimos
foram associados a agravamento da depressão (Keck 2004).
Gao K e colaboradores, autores da revisão sistemática de antipsicóticos
na depressão bipolar (2005), descrevem dois estudos padronizados, em dupla
ocultação controlados com placebo, desenhados para a depressão bipolar.
Um primeiro (Tohen 2003), onde foi comparada a eficácia da olanzapina
face à associação de olanzapina-fluoxetina (OFA) e ao placebo, numa
população de 833 doentes de ambulatório com o diagnóstico de depressão
bipolar tipo I, durante 8 semanas. A análise dos resultados mostrou que os
doentes medicados com olanzapina em monoterapia e com a associação à
fluoxetina (OFA) melhoraram, significativamente, em relação à sintomatologia
depressiva, comparativamente ao placebo. O effect size da olanzapina em
monoterapia foi pequeno (0.32), mas o da OFA foi moderado (0.68).
O effect size é a medida da magnitude de tratamento de um fármaco
relativamente ao placebo. Avalia-se como o “ganho terapêutico” além do
placebo, (magnitude do tratamento, acima do placebo a dividir pelo desvio
padrão). O effect size é considerado pequeno: <0.4; médio: 0.4 a 0.79 e
grande:> 0.79.
A análise mostrou ainda, que ambas as formas de medicação com
olanzapina melhoraram os sintomas vegetativos, como sejam, a redução do
sono e do apetite, mas apenas a combinação de olanzapina-fluoxetina
melhorou o core do humor, ou seja, a tristeza, a lentidão, a anedonia e os
pensamentos pessimistas. Outro aspecto importante é que a taxa de indução
de mania foi equivalente nos três grupos.
A olanzapina tem-se mostrado, igualmente eficaz na prevenção de recaídas, de
depressão ou mania (Tohen 2003 e 2004).
© 2006 Vale & Vale Eds, Lda.
Doença Bipolar
Manuela Abreu
10
Recentemente, Calabrese e colaboradores (2005), publicaram um
estudo sobre o tratamento agudo da depressão bipolar com quetiapina em
monoterapia. Estudo BOLDER (BipOLarDEpRession). A investigação incidiu
sobre um total de 542 doentes de ambulatório, com Perturbação bipolar tipo I e
tipo II, com sintomatologia configurando um episódio depressivo major. Os
doentes, distribuídos ao acaso por três grupos, foram medicados, durante 8
semanas, com quetiapina (300 mg ou 600 mg) ou placebo. Desde a primeira
semana que se observou uma melhoria em todas as medidas de eficácia
(MADRS e HAM-D), quando comparadas com placebo.
O effect size dos grupos de 600 mg e 300 mg de quetiapina, foi,
respectivamente, 0.81 e 0.67. A taxa de resposta favorável no final do estudo
foi equivalente em ambos os grupos de quetiapina e superior ao placebo.
Ambas as doses de quetiapina melhoraram, igualmente, os sintomas
depressivos nos doentes com ciclação rápida. A incidência de mania, induzida
pelo tratamento, foi comparável ao placebo.
Como conclusão da análise de eficácia, segurança e tolerabilidade, a
quetiapina mostrou ser eficaz nos doentes com depressão bipolar, actuando
nos sintomas depressivos, incluindo a ideação suicida.
Não existem estudos controlados, em grande escala, com dupla
ocultação relativamente à eficácia de outros antipsicóticos atípicos na
depressão bipolar, no entanto, existe alguma evidência de que a risperidona
pode melhorar os sintomas depressivos em doentes com Perturbação bipolar
(Vieta 2002 e Shelton 2004).
5. Electroconvulsivoterapia (ECT)
A electroconvulsivoterapia permanece um dos tratamentos mais eficazes
na depressão bipolar, sendo a sua eficácia superior à dos antidepressivos
(Grunhaus 2002). Aparentemente tem uma resposta mais rápida na depressão
bipolar que na unipolar e com menor intensidade de estímulo eléctrico.
É considerada tratamento de eleição na depressão grave psicótica, em
especial com elevado risco de suicídio; Depressão bipolar refractária ao
© 2006 Vale & Vale Eds, Lda.
Doença Bipolar
Manuela Abreu
11
tratamento farmacológico; Depressão bipolar com lentificação psicomotora
grave e intolerância à medicação farmacológica (Grunze 2005).
6. Conclusões
Apesar da elevada “carga” associada à depressão bipolar, quer pela
incapacidade funcional que acarreta, quer pelo risco de suicídio associado, não
existe ainda uma orientação clara, consubstanciada por um vasto leque de
estudos, relativa ao tratamento desta patologia. (Grunze 2005).
É muito usada, na prática clínica, a associação de um antidepressivo a
um estabilizador do humor no sentido de optimizar a resposta. Contudo,
sempre que é prescrita medicação antidepressiva em doentes bipolares, existe
a possibilidade de uma eventual “viragem” para um estado de mania ou
ciclação rápida. Por este motivo aconselha-se minimizar a exposição dos
doentes a estes fármacos (American Psychiatry Association, APA 2002;
Grunze 2002 e Goodwin 2003).
Os especialistas estão, na sua maioria, de acordo quanto ao facto da
monoterapia antidepressiva ser inadequada na depressão bipolar. (APA 2002;
Grunze 2002 e Goodwin 2003). No entanto, esta não é a prática corrente, em
particular, no âmbito dos cuidados primários (Blanco 2002).
Estão ainda em discussão as questões relativas ao início da terapêutica
antidepressiva e durante quanto tempo a sua manutenção, tornando-se
necessária a criação de directrizes claras da estratégia terapêutica mais
adequada na depressão bipolar (Moller 2000).
As orientações terapêuticas da APA e do 2004 Expert Consensus
Guideline Series (Keck 2004) para a depressão bipolar recomendam lítio ou
lamotrigina como tratamento de 1ª linha em monoterapia. Em relação ao lítio
existe uma maior confiança clínica, havendo com a lamotrigina uma confiança
moderada.
Algumas guias de orientação sugerem que os antidepressivos podem
estar indicados como tratamento unimodal de primeira linha nalguns subgrupos
© 2006 Vale & Vale Eds, Lda.
Doença Bipolar
Manuela Abreu
12
de doentes (Goodwin 2003) mas como já referido, a grande maioria preconiza
o uso concomitante de um estabilizador do humor (APA 2002; Grunze 2002 e
Goodwin 2003).
7. Bibliografia
1. Altshuler L, Suppes T, Black D et al. Impact of antidepressant discontinuation after acute
bipolar depression remission on rates of depressive relapse at 1-year follow-up. Am J
Psychiatry 2003; 160: 1252-62.
2. American Psychiatric Association. Practice Guideline for the Treatment of Patients with
Bipolar Disorder [Revision]. Am J Psychiatry 2002; 159 (suppl 4):1-50.
3. Baldessarini RJ, Tondo L Hennen J. Treating the suicidal patient with bipolar disorder.
Reducing risk with lithium. Ann. N.Y. Acad. Sci. 2001; 932: 24-38.
4. Blanco C, Lage G, Olfson M, et al. Trends in the treatment of bipolar disorder by outpatient
psychiatrists. Am J Psychiatry 2002; 250: 57-68.
5. Baumhackl U, Biziere K, Fischbach R, et al. Efficacy and tolerability of moclobemide
compared with imipramina in depressive disorder (DSM-III): An Austrian double-blind,
multicentre study. Br J Psychiatry 1989; (Suppl.6): 78-83.
6. Bowden C, Calabrese JR, Sachs G et al. A placebo-controlled 18-month trial of lamotrigine
and lithium maintenance treatment in recently manic or hypomanic patients with bipolar I
disorder. Arch Gen Psychiatry 2003; 60: 392-400
7. Brambilla P, Barale F, Soares JC et al. Perspectives on the use of anticonvulsants in the
treatment of bipolar disorders. Int J Neuropsychopharmacol 2001; 4: 421-46
8. Calabrese JR, Delucchi GA. Spectrum of efficacy of valproate in 55 patients with rapid
cycling bipolar disorder. Am J Psychiatry 1990; 147: 431-34
9. Calabrese JR, Bowden C, Sachs G et al. A double-blind placebo-controlled study of
lamotrigine monotherapy in outpatients with bipolar I depression. Lamictal 602 Study Group.
J Clin Psychiatry 1999; 60: 79-88
10. Calabrese JR, Bowden C, Sachs G et al. A placebo-controlled 18-month trial of lamotrigine
and lithium maintenance treatment in recently manic or hypomanic patients with bipolar I
disorder. J Clin Psychiatry 2003; 64: 1013-24
11. Calabrese J, Keck P, Macfadden W, et al. A Randomized, Double-Blind, PlaceboControlled Trial of Quetiapine in the Treatment of Bipolar I or II Depression. Am J Psychiatry
2005 ; 162 :7 : 1351-60.
12. Cohn JB, Collins G, Ashbrook E. A comparison of fluoxetine imipramine and placebo in
patients with bipolar depressive disorder. Int Clin Psychopharmacol 1989; 4: 313-22.
13. Dubovsky ST. Treatment of Bipolar Depression. Psychiatr Clin N Am 2005; 28: 349-70.
14. Gao K, Gajwani P, Elhaj O, Calabrese JR. Typical and atypical antipsychotics in bipolar
depression. J Clin Psychiatry 2005; 66(11): 1376-85.
15. Ghaemi SN, Lenox MS, Baldessarini RJ. Effectiveness and safety of long-term
antidepressant treatment in bipolar disorder. J Clin Psychiatry 2001; 62: 565-69.
16. Ghaemi SN, El-Mallakh RS, Baldassano CF et al. A randomized clinical trial of efficacy and
safety of long-term antidepressant use in bipolar disorder (abstract). Bipolar Disord 2005;
7(Suppl. 2): 59.
17. Gijsman HJ, Geddes JR, Rendell JM, Nolen WA, Goodwin GM. Antidepressants for bipolar
depression: a systematic review of randomized, controlled trials. Am J Psychiatry 2004;
161:1573-74.
© 2006 Vale & Vale Eds, Lda.
Doença Bipolar
Manuela Abreu
13
18. Goldberg JF e Ghaemi SN. Benefits and limitations of antidepressants and traditional
mood stabilizers for treatment of bipolar depression. Bipolar Disord 2005; 7(suppl. 5): 3-12.
19. Goldberg J. When do antidepressants worsen the course of bipolar disorder? J Psychiatr
Pract 2003; 9: 181-94.
20. Goodwin GM, for the Consensus Group of the British Association for Psychopharmacology.
Evidence-based guidelines for treating bipolar disorder: recommendations from the British
Association for Psychopharmacology. J Psychopharmacol 2003; 17:149-73.
21. Grunhaus L, Schreiber S, Dolberg OT, et al. Response to ECT in major depression: are
there differences between unipolar and bipolar depression? Bipolar Disord 2002; 4 Suppl
1:91-3.
22. Grunze H, Kasper S, Goodwin G, et al. World Federation of Societies of Biological
Psychiatry (WFSBP) guidelines for biological treatment of bipolar disorders, pt 1: treatment
of bipolar depression. World J Biol Psychiatry 2002; 3: 115-24.
23. Grunze H. Reevaluating therapies for bipolar depression. J Clin Psychiatry. 2005; 66 Suppl
5:17-25.
24. Himmelhoch JM, Fuchs CZ, Symons BJ. A double-blind study of tranylcypromine
treatment of major anergic depression. J Nerv Ment Dis. 1982 Oct; 170(10):628-34.
25. Himmelhoch JM, Thase ME, Mallinger AG. Tranylcypromine versus imipramine in anergic
bipolar depression. Am J Psychiatry 1991; 148: 910-16.
26. Hirschfeld RM, Bowden CL, Gitlin MJ et al. Practice guideline for the treatment of patients
with bipolar disorder. Am J Psychiatry 2002; 159 (Suppl.): 1-50.
27. Joffe RT, MacQueen GM, Mariott M, Young LT. One year outcome with antidepressant
treatment of bipolar depression. Acta Psychiatr Scand 2005; 112: 105-09.
28. Keck PE, Perlis RH, Otto MW, Carpenter D, Ross R, Docherty JP. The Expert Consensus
Guideline Series: Treatment of bipolar disorder 2004. Postgrad Med (Spec Report) 2004;
Dec: 1-20.
29. Kessell A, Holt NF. A controlled study of a tetracyclic antidepressant – maprotiline. Med J
Aust 1975; 1: 773-76.
30. Kramlinger KG, Post RM. The addition of lithium to carbamazepine: antidepressant
efficacy in treatment-resistant depression. Arch Gen Psychiatry 1989; 46: 794-800
31. Leverich GS, Altshuler LL, Frye MA et al. The range of hypo/manic severities on
antidepressants: a randomized, double blind comparison of bupropion, sertraline, and
venlafaxine using daily NIMH-LCM ratings [abstract]. Acta Psychiatr Scand Suppl 2004;
110: 39.
32. Leverich GS, Altshuler LL, Frye MA et al. Risk of switch in mood polarity to hypomania or
mania in patients with bipolar depression during acute and continuation trials of venlafaxine,
sertraline, and bupropion as adjuncts to mood stabilizers. Am J Psychiatry, 2006; 163(2):
232-9.
33. McElroy SL, KecK PE. Treatment guidelines for valproate in bipolar and schizoaffective
disorders. Can J Psychiatry 1993; 38 (2): S31-S38
34. Moller HJ, Grunze H. Have some guidelines for the treatment of acute bipolar depression
gone too far in restriction of antidepressants? Eur Arch Psychiatry Clin Neurosci 2000;
250:57-68.
35. Nemeroff CB, Evans DL, Gyulai L. Double-blind, placebo controlled comparison of
imipramine and paroxetine in the treatment of bipolar depression. Am J Psych 2001; 158:
906-12.
36. Peet M. Induction of mania with selective serotonin re-uptake inhibitors and tricyclic
antidepressants. Br J Psychiatry 1994; 164(4): 549-50.
37. Post RM, Uhde TW, Roy-Byrne PP et al. Antidepressant effects of carbamazepine. Am J
Psychiatry 1986; 143: 29-34
38. Post RM, Leverich GS, Altshuler LL, et al. An overview of recent findings of the Stanley
Foundation Bipolar Network (Part I). Bipolar Disord. 2003; 5(5):310-9.
39. Post RM. The impact of bipolar depression. J Clin Psychiatry 2005; 66 Suppl 5:5-10.
© 2006 Vale & Vale Eds, Lda.
Doença Bipolar
Manuela Abreu
14
40. Price LH, Charney DS, Heninger GR et al. Variability of response to lithium augmentation in
refractory depression. Am J Psychiatry 1986; 143: 1387-92
41. Rothchild AJ, Bates KS, Boehringer Kl, et al. Olanzapine in psychotic depression. J Clin
Psychiatry 1999; 6: 116-18.
42. Sachs GS, Lafer B, Stoll AL, et al. A double-blind trial of bupropion versus desipramine for
bipolar depression. J Clin Psychiatry 1994 Sep; 55(9): 391-3.
43. Shelton RC, Stahl SM. Risperidone and paroxetine given singly and in combination for
bipolar depression. J Clin Psychiatry 2004; 65: 1715-19.
44. Silverstone PH, Silverstone T. A review of acute treatments for bipolar depression. Int Clin
Psychopharmacol 2004; 19: 113-24.
45. Suppes T, Dennehy EB, Hirschfeld RM et al. The Texas implementation of medication
algorithms: update to the algorithms for treatment of bipolar disorder. J Clin Psychiatry
2005; 66: 870-86.
46. Sachs GS, Lafer B, Stoll AL, et al. A double-blind trial of bupropion versus desipramine for
bipolar depression. J Clin Psychiatry 1994; 55(9):391-3.
47. Sachs GS. Treatment-resistant bipolar depression. Psychiatr Clin North Am 1996;
19(2):215-36.
48. Sachs GS. Decision tree for the treatment of bipolar disorder. J Clin Psychiatry 2003; 64
Suppl 8:35-40.
49. Thase ME, Mallinger AG, Mcknight D, et al. Treatment of imipramine-resistent recurrent
depression: a double-blind crossover study of tranylcipromine for anergic bipolar
depression. Am J Psychiatry 1992; 149, 195-98.
50. Tohen M, Ketter TA, Zarate CA, et al. Olanzapine versus divalproex sodium for the
treatment of acute mania and maintenance of remission: a 47-week study. Am J Psychiatry
2003; 160 :1263-71.
51. Tohen M, Chengappa KN, Suppes T, et al. Relapse prevention in bipolar I disorder : 18month comparison of olanzapine plus mood stabiliser v mood stabiliser alone. Br J
Psychiatry 2004; 184 : 337-45.
52. Wehr TA, Goodwin FK. Can antidepressants cause mania and worsen the course of
affective illness? Am J Psychiatry 1987; 144: 1403-11.
53. Vieta E, Goikolea JM, Corbella B, et al, for the Group for the Study of Risperidone in
Affective Disorders (GSRAD). Risperidone safety and efficacy in the treatment of bipolar
and schizoaffective disorders results from a 6-month, multicenter, open study. J Clin
Psychiatry 2002; 63:79.
54. Young LT, Joffe RT, Robb JC et al. Double-blind comparison of addition of a second mood
stabilizer versus an antidepressant to an initial mood stabilizer for treatment of patients with
bipolar depression. Am J Psychiatry 2000; 157: 124-26.
55. Neuroscience Education Institute – www.neiglobal.com
© 2006 Vale & Vale Eds, Lda.
Doença Bipolar
Download