CENTRO UNIVERSITÁRIO DE MARINGÁ NÚCLEO DE

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CENTRO UNIVERSITÁRIO DE MARINGÁ
NÚCLEO DE EDUCAÇÃO CONTINUADA DO PARANÁ
MERCES MARIA TOMAEL
PSICODIAGNÓSTICO INTERVENTIVO PSICANALÍTICO:
revisão de literatura
MARINGÁ
2011
MERCES MARIA TOMAEL
PSICODIAGNÓSTICO INTERVENTIVO PSICANALÍTICO:
Revisão de literatura
Artigo científico apresentado ao
Centro Universitário de Maringá/
Núcleo de Educação Continuada do
Paraná, como requisito parcial à
obtenção do título de Especialista em
Psicanálise: Teoria e Clínica.
Orientador: Profa Dra Rute Grossi
Milani
MARINGÁ
2011
AGRADECIMENTOS
Um trabalho sempre depende do esforço individual e da colaboração de muitos.
Agradeço a todos que, direta ou indiretamente, contribuíram para este estudo e, em
especial:
À Deus, dono de nossas vidas.
Um agradecimento muito especial à minha professora orientadora Rute Grossi
Milani, pela competência, dedicação, compreensão de meus problemas e
dificuldades, aporte de literatura valiosa, cuidadosa análise de meus textos e
cobrança permanente, sem a qual eu não teria chegado ao final desse trajeto.
À minha mãe e minha irmã, minha família, pelo apoio e força para continuar.
Aos professores do Curso de Especialização em Psicanálise, que contribuíram com
conhecimentos que, certamente, foram amplamente empregados neste trabalho.
À professora Gilcinéia Rose da Silva Santos, por, tão prontamente, ter concordado
em ler este trabalho e contribuir com valiosas sugestões.
Às minhas queridas amigas e companheiras nesse trajeto, Mariângela e Milena,
que compartilharam este momento comigo.
A todos aqueles que, de forma direta ou indireta, contribuíram para o sucesso deste
trabalho, sem os quais não seria possível sua conclusão.
Ao interpretar, acredito que o faço
principalmente no intuito de deixar
o paciente conhecer os limites de
minha compreensão. Trata-se de
partir do princípio de que é o
paciente, e apenas ele, que tem as
respostas. Podemos ou não torná-lo
apto a abranger o que é conhecido,
ou disso tornar-se ciente, com
aceitação.
Winnicott, O brincar e a realidade
(1971)
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PSICODIAGNÓSTICO INTERVENTIVO PSICANALÍTICO:
revisão da literatura
Sugestão de Título Abreviado: Psicodiagnóstico Interventivo Psicanalítico
INTERVENTIVE PSYCHODIAGNOSTIC PSYCHOANALYTIC:
review of the literature
Mercês Maria Tomael
Psicóloga clínica, especialista em psicoterapia psicanalítica e especialista em
psicopedagogia.
Rute Grossi Milani
Professora do Centro Universitário de Maringá, psicóloga, doutora em Saúde
Mental pela Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto - USP.
Endereço para correspondência com a comissão Editorial:
Mercês Maria Tomael
Rua Espírito Santo, 1163, sala 504, centro
CEP: 86020-420 Londrina-Pr.
Fone: (43) 3329-5153 Celular: (43) 9604-8754
e-mail: [email protected]
Endereço para correspondência com o leitor:
Mercês Maria Tomael
Rua Espírito Santo, 1163, sala 504, centro
CEP: 86020-420 Londrina-Pr.
Fone: (43) 3329-5153 Celular: (43) 9604-8754
e-mail: [email protected]
Artigo apresentado como trabalho de conclusão de Curso de Especialização da
primeira autora.
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PSICODIAGNÓSTICO INTERVENTIVO PSICANALÍTICO:
revisão da literatura
Sugestão de Título Abreviado: Psicodiagnóstico Interventivo Psicanalítico
INTERVENTIVE PSYCHODIAGNOSTIC PSYCHOANALYTIC:
review of the literature
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PSICODIAGNÓSTICO INTERVENTIVO PSICANALÍTICO:
revisão da literatura
Resumo:
O psicodiagnóstico interventivo inclui na prática clínica os processos de avaliação
e de psicoterapia simultaneamente. O profissional realiza intervenções durante o
processo de avaliação, no momento da entrevista inicial e aplicação de testes. O
objetivo deste estudo é, a partir da revisão da literatura com referencial
psicanalítico, descrever os resultados obtidos em pacientes submetidos ao
psicodiagnóstico interventivo, em estudos empíricos publicados na última década.
A única exceção são os trabalhos de Donald W. Winnicott (1896-1971),
considerada a base dos estudos sobre o psicodiagnóstico interventivo. Os estudos
descritos mostraram resultados positivos, em que os pacientes atendidos puderam
se beneficiar com o psicodiagnóstico interventivo, portanto, trata-se de um método
que possibilita uma avaliação mais fidedigna e globalizada.
Palavras Chaves: psicodiagnóstico, psicodiagnóstico interventivo; psicanálise.
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INTERVENTIVE PSYCHODIAGNOSTIC PSYCHOANALYTIC:
review of the literature
Abstrat:
Interventive psychodiagnostic clinical practice includes the processes of
assessment
and
psychotherapy
simultaneously.
The
provider
performs
interventions during the evaluation process at the time of initial interview and test
application. The objective of this study is from the literature review with
psychoanalysis, describe the results obtained in patients undergoing interventive
psychodiagnostic in empirical studies published in the last decade. The only
exception is the work of Donald W. Winnicott (1896-1971), considered the basis
of studies on the interventive psychodiagnostic. The studies described have shown
positive results in the patients treated were able to benefit from interventive
psychodiagnostic therefore it is a method that enables a more reliable evaluation
and globalized.
Key Words: psycho, psycho interventionist, psychoanalysis.
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PSICODIAGNÓSTICO INTERVENTIVO PSICANALÍTICO:
revisão da literatura
INTRODUÇÃO
A aplicação do psicodiagnóstico interventivo vem sendo utilizada, desde
a década de 90, por alguns profissionais da área de psicologia. Em alguns
atendimentos foram constatadas mudanças nos pacientes após serem submetidos
ao
processo
psicodiagnóstico
sem
a
intenção
de
interferência.
Esses
acontecimentos levaram os profissionais a questionar, se simplesmente o fato do
contato paciente-terapeuta, já não provocaria situações que propiciariam a
reorganização mental do paciente.
Desde então, alguns psicólogos se interessaram pelo assunto e, nas
últimas décadas, começaram a surgir estudos a respeito desse tipo de
psicodiagnóstico. Winnicott, em 1971, escreveu sobre resultados positivos obtidos
com a interpretação da fala dos pacientes nas primeiras consultas. Walter Trinca
(1998) escreveu sobre o psicodiagnóstico compreensivo, técnica em que o
terapeuta interage com os pacientes de forma empática e obtém um conhecimento
profundo sobre o funcionamento mental deles. Nos últimos anos, cada vez mais, os
profissionais da psicanálise se aproximam de seus pacientes tentando abstrair
aspectos de suas personalidades, com a finalidade de um trabalho de melhor
qualidade.
É bastante controverso o fato de fazer ou não assinalamentos e
interpretações
nas
entrevistas
durante
o
psicodiagnóstico.
Encontramos
profissionais que são contra essa prática e que consideram que nessa fase, o
psicólogo deve ater-se a fazer uma investigação. Outros consideram que o
profissional deve intervir apenas para alcançar o objetivo da entrevista, dando
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ênfase ao vínculo do paciente com o psicólogo. E outros, ainda, aceitam realizar
um trabalho conjunto com o paciente, e reconhecem a necessidade de utilizar
apontamentos e devoluções durante o processo psicodiagnóstico (Santiago, 1998).
Na entrevista inicial o paciente mostra-se mais disposto, momento em que
traz uma maior quantidade de material, comparado com as sessões posteriores,
quando já terá uma melhor percepção do terapeuta. Esta é a hora em que há um
espaço maior para a intervenção, pois o paciente está menos rígido e não
defendido e colabora fornecendo elementos para a interpretação. Quando o
terapeuta escuta e acolhe adequadamente, o paciente mobiliza-se internamente,
mesmo que seja por um curto espaço de tempo. No psicodiagnóstico é importante
o fechamento do diagnóstico, mas também é fundamental o modo como o
psicólogo acolhe e se relaciona com o paciente. É imprescindível a continência e a
empatia ao relacionar-se com o mesmo, enquanto mostra-se disposto a ouvi-lo e
manter com ele um diálogo verdadeiro. Desse modo, o paciente é incluído no
processo de um jeito diverso do que geralmente acontece na forma tradicional, e é
estimulado a participar (Santiago, 1998; Lazzari e Schmidt, 2008). O
psicodiagnóstico interventivo não se configura apenas como um processo de
investigação diagnóstica, mas também, como um lugar em que poderá haver
intervenções que podem trazer mudanças e bem estar para o paciente da mesma
forma que a psicoterapia trará. O psicodiagnóstico interventivo não tomará o lugar
da psicoterapia, mas é importante utilizar as oportunidades que surgem naquele
momento e que poderão demorar muito a retornar e assim fazer daquele instante
um encontro significativo para terapeuta e paciente (Lazzari e Schmidt, 2008).
No psicodiagnóstico interventivo não há uma organização sequencial,
com passos a serem seguidos, e o número de sessões não é predeterminado. Além
7
disso, o profissional psicanalítico, como ‘objeto subjetivo’ deve proporcionar ao
paciente a possibilidade, através da vivência emocional, de retomar seu
desenvolvimento. É de extrema importância esse profissional ser visto e sentido
como aquele que pode ajudar (Barbieri, 2008 e 2010).
O psicodiagnóstico é visto pelos profissionais da psicologia como uma
segurança para o desenvolvimento de um trabalho adequado às condições
emocionais do paciente. O psicodiagnóstico interventivo inova o modelo
tradicional e permite ao profissional construir uma visão compreensiva do
paciente, ao mesmo tempo em que poderá ser um processo gerador de mudanças
para esse paciente. Estudos recentes, sobre a influência do psicodiagnóstico
interventivo na organização mental do paciente, parecem apresentar subsídios que
reforçam a utilização desse modelo de avaliação. Portanto, o objetivo deste estudo
é, a partir da revisão da literatura com referencial psicanalítico, descrever os
resultados obtidos no estudo de pacientes submetidos ao psicodiagnóstico
interventivo, em pesquisas empíricas, publicadas na última década, para tanto, se
fará um retrospecto histórico desse tipo de psicodiagnóstico. Este traballho é uma
oportunidade de demonstrar as aplicações e apropriações do psicodiagnóstico
interventivo, visto que, além de apresentar as ideias de alguns psicólogos que
trabalham com esse tipo de psicodiagnóstico, também se justifica pelo fato de
auxiliar outros profissionais da área psicológica a ter contato com diversos
trabalhos, com essa abordagem.
Este estudo salienta a importância da teoria de Donald W. Winnicott
(1896-1971), especialmente sobre as consultas terapêuticas, considerada como um
importante embasamento dos estudos sobre o Psicodiagnóstico Interventivo com
abordagem psicanalítica. De início será realizada uma breve introdução sobre os
8
aspectos
históricos,
psicodiagnóstico
destacando
interventivo,
os
que
pesquisadores
inicialmente
foi
que
introduziram
desenvolvido
o
pelos
profissionais da abordagem fenomenológico-existencial, que serão tratados aqui,
como os precursores dessa idéia no Brasil. Enfocando os objetivos propostos para
esse estudo, num segundo tópico, serão descritos os artigos que tratam dos
resultados
empíricos
encontrados
com
a
proposta de atendimento
do
psicodiagnóstico interventivo psicanalítico, com destaque para a teoria
Winnicottiana, da qual este evoluiu.
PRECURSORES DO PSICODIAGNÓSTICO INTERVENTIVO
Alguns profissionais (Arzeno, 1995; Ancona-Lopez, 1998; Ocampo,
Arzeno e Piccolo, 1999) percebiam que, independentemente da vontade do
terapeuta, os pacientes mostravam melhoras durante o processo psicodiagnóstico,
começaram, então, a investigar esses acontecimentos. O processo psicodiagnóstico
tradicional era visto, até então, apenas como uma situação em que o profissional
aplicava alguns testes e o paciente colaborava dando respostas às situações. No
entanto, com o passar do tempo, muitos psicólogos começaram a sentir o desejo e
a necessidade de aproximar-se empaticamente do paciente, e para isso, precisaram
abandonar sua prática antiga e enfrentar as angústias de um modo novo e mais
íntimo de contato com seu paciente. Assim, a teoria e técnica psicanalítica foram
de grande ajuda para o psicólogo poder entender o que acontecia no seu
relacionamento com o paciente. O profissional pode interferir durante as sessões
diagnósticas no momento em que a fala do paciente não for esclarecedora ou se ele
negar os conteúdos. O propósito dessas intervenções seria unicamente para
alcançar os objetivos da entrevista (Ocampo, Arzeno e Piccolo, 2009).
9
De acordo com Lazzari e Schmidt (2008), a avaliação psicológica é um
procedimento que procura informações sobre o funcionamento psicológico, que
analisado de acordo com os conhecimentos da psicologia tenta compreender o
funcionamento psíquico e a relação com a queixa do paciente, o que possibilita o
planejamento de intervenções, com a finalidade de “promover a saúde e o
desenvolvimento psíquico dos indivíduos”. Ocampo e Arzeno (2009) falam desse
processo como “uma situação com papéis bem definidos”, em que alguém pede
ajuda e outro alguém faz tudo para ajudar dentro de suas possibilidades. Esta é
uma situação em que o tempo é limitado e que requer o uso de técnicas para se
alcançar os propósitos iniciais (compreender a personalidade do paciente para
entender o seu funcionamento).
Assim sendo, a relação de transferência-contratransferência é considerada
por Arzeno (1995) um elemento de grande importância que nos é fornecido pelo
psicodiagnóstico, esse dado nos ajuda a prever situações da futura terapia, que
facilitarão o relacionamento paciente-terapeuta. Na opinião de Arzeno (1995), o
modelo do psicodiagnóstico não deve ser rígido, mas adequado à “experiência
clínica e ao nível de análise do profissional”. Para a autora, se os profissionais da
psicologia são procurados significa que alguém está em sofrimento emocional,
portanto é preciso que se questionem os motivos desse sofrimento.
Com o passar dos anos, o processo psicodiagnóstico, sofreu modificações
e influências de diferentes modelos teóricos. Na atualidade não se pode conceber
um processo psicodiagnóstico que não seja com base na relação entre paciente e
psicólogo, de forma a usar a ação interventiva para uma melhor compreensão dos
atos psíquicos para possibilitar mudanças, ou seja, apresentar ao paciente a
10
situação que ele traz, de um jeito novo (Lazzari e Schmidt, 2008; Advíncula e
Gomes, 1999).
O psicodiagnóstico tem de se prestar principalmente ao bem estar do
paciente, situação em que provoca condições de transformações; e não ao
contrário, servir apenas para as necessidades de compreensão do profissional, para
que ele possa definir o problema e indicar as medidas terapêuticas adequadas. Com
a evolução do psicodiagnóstico, na atualidade, os profissionais de psicologia
atuam cada vez mais, no momento da avaliação, embasados na relação psicólogopaciente. Assim o paciente sente-se incluído no procedimento e como participante
ativo, tem de volta tudo que informou, associados a situações que possibilitam a
ele repensar e dar novo significado ao seu mundo (Cupertino, 1998).
Na atualidade, o processo psicodiagnóstico pode tornar-se um espaço para
o conhecimento profundo do paciente, resultado da relação terapeuta-paciente.
Nesse espaço, um psicodiagnóstico bem elaborado, pode ser tão eficaz para o
paciente quanto a psicoterapia. O psicólogo se manterá atento às possibilidades de
intervenção e deve usá-las considerando as impressões que tem com o seu paciente
durante esse processo. A relação paciente-terapeuta se tornou um instrumento de
trabalho com o surgimento de técnicas para uma abordagem compreensiva
(Lazzari e Schmidt, 2008).
É necessário repensar se a utilidade do psicodiagnóstico serve apenas para
encaminhamentos psicoterápicos. É preciso modificar a postura de que o
psicodiagnóstico não faz parte da prática terapêutica e investir no esforço em
transformá-lo num processo terapêutico (Santiago, 1998). Chegou o momento em
que o psicodiagnóstico tradicional deve dar espaço para novas formas de
avaliação, em que o paciente possa se beneficiar das intervenções terapêuticas,
11
momento de integração entre sujeito e objeto. No psicodiagnóstico interventivo
terapeuta e paciente se relacionam, “a partir de pontos de vista diferentes, mas
igualmente importante”, com a finalidade de amenizar as dificuldades desse
paciente (Advíncula e Gomes 1999).
O psicodiagnóstico interventivo, no modelo fenomenológico, mantém a
relação do terapeuta com o paciente através da neutralidade. As interferências
durante o processo são verbais. O significado do sintoma é visto como de ordem
consciente e o profissional valoriza a capacidade intelectual do paciente. Já no
modelo psicanalítico, método “firmemente enraizado nas “Consultas Terapêuticas”
de Winnicott [...] também descendente direto do Psicodiagnóstico Compreensivo,
definido por Walter Trinca [...]” (p.580), o terapeuta se oferece como “objeto
subjetivo”, proporcionando experiências emocionais importantes e necessárias ao
desenvolvimento do paciente, o terapeuta é aquele que oferece ajuda. O processo
psicanalítico é de natureza inconsciente, sendo possível se conseguir resultados
positivos mesmo sem a ocorrência de insight (Barbieri, 2008).
Foi somente a partir do ano 2000, que o psicodiagnóstico interventivo de
orientação psicanalítica começou a ser mais bem delineado no Brasil. Ele vem
sendo divulgado como tal, com importantes contribuições (Barbieri, 2010).
PSICODIAGNÓSTICO
INTERVENTIVO
COM
REFERENCIAL
PSICANALÍTICO
De um modo geral o conjunto de artigos relatados evidenciou o interesse
pelo psicodiagnóstico na infância. Dos nove artigos relatados nesse estudo, cinco
tiveram como sujeitos crianças. Dois foram realizados com adultos e dois
analisaram o desempenho de estudantes no atendimento clínico, demonstrando a
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experiência de ensino do psicodiagnóstico interventivo psicanalítico, na prática de
estágio, com estudantes de psicologia. No relato de cada trabalho fica evidente o
suporte teórico da teoria Winnicottiana.
Ainda se tem poucas publicações acerca do psicodiagnóstico interventivo
psicanalítico. É pequeno o número de estudiosos que se dedicam a esse assunto,
porém, encontra-se publicados, trabalhos de grande relevância, de pesquisadores
que mostram as vantagens do uso desse método já nas primeiras entrevistas. É o
caso de Paulo (2006), Tardivo (2007) e Barbieri (2008), que fazem parte desse
grupo de pesquisadores que consideram a intervenção durante o psicodiganóstico
como uma nova perspectiva diagnóstica.
Hoje ainda é comum o uso do psicodiagnóstico em que o profissional se
limita a obter informações sobre a queixa do paciente com uso de testes e procura
manter-se o mais neutro possível na relação. Nessa situação a psicanálise tem
muito a contribuir quando se pensa no psicodiagnóstico como um modelo de
avaliação em que o psicólogo se aproxime mais do paciente com um resultado
mais rico (Ocampo, Arzeno e Piccolo, 2009).
É comum se ouvir relatos de melhora de pacientes que foram submetidos
ao processo psicodiagnóstico tradicional, isso demonstra que mesmo com a
intenção de que não haja vínculo na relação, existem efeitos terapêuticos além
daqueles que são da intenção do terapeuta. Geralmente isso acontece quando nesse
processo existe a aplicação de técnicas projetivas, já que essa situação leva o
paciente a acionar mecanismos psíquicos que expressam sua personalidade e
permite a possibilidade de reorganização mental. Os resultados benéficos advindos
do processo diagnóstico são provavelmente devido a vários mecanismos, dentre
13
eles, a projeção e a regressão têm papel fundamental (Barbieri, Jacquemin e Alves,
2007).
Donald W. Winnicott (1984) foi o precursor desse tipo de avaliação,
denominada por ele de “Consultas Terapêuticas”, momento em que fazia o
tratamento com poucas entrevistas, na maioria dos casos em apenas uma,
utilizando-se de interpretações no momento em que sentia o paciente receptivo
para isso. Usava o Jogo dos Rabiscos como meio para entrar em contato com a
criança e com isso levar a efeito a consulta terapêutica. Segundo ele, a criança
coloca o terapeuta no papel de objeto subjetivo, papel este que sobrevive apenas às
primeiras entrevistas, portanto este é o momento em que o profissional tem uma
chance maior ‘de estar em contato com a criança’.
Com base nos estudos de Winnicott, Walter Trinca (1984), desenvolveu o
psicodiagnóstico compreensivo. Nesse tipo de Psicodiagnóstico, o profissional usa
as informações para ajudar o paciente, e seleciona o que é importante na sua
personalidade, sendo possível ter um contato de empatia e conhecimento profundo
da vida emocional dessa pessoa. Para tanto, exige do profissional o conhecimento
do processo psicanalítico, pois é necessário que o profissional se atente mais aos
“fenômenos da transferência e da contratransferência” que acontece durante esse
processo, podendo, desse modo, lidar com eles de forma mais segura.
Na opinião de Roncolato (2011), o profissional que utiliza o
psicodiagnóstico compreensivo (Trinca, 1984), se inteira de todos os dados
referentes à vida do paciente (social e familiar) e da sua personalidade, para poder
relacionar esses resultados e compreender o motivo real da procura do tratamento
psicológico, por parte do paciente.
14
Barbieri, Jacquemin e Alves (2004, 2007) comentam os estudos de
Winnicott (1984) e afirmam que para ele é plenamente possível fazer “um pequeno
tratamento” nas entrevistas iniciais e que é nesse momento que aparecem
informações que só poderiam reaparecer meses ou anos mais tarde em uma
psicoterapia.
A prática de juntar avaliação e intervenção existe há muito tempo, afirma
Barbieri (2009 e 2010), e comenta que foi na década de 1990, que essa ideia
ganhou impulso na literatura e passou a ser mais bem organizada. No começo do
ano 2000, o psicodiagnóstico interventivo, descendente do psicodiagnóstico
compreensivo (Trinca, 1984), foi mais bem delineado por novos estudos, que
deram origem a novas contribuições de autores como Ocampo, Arzeno e Piccolo
(2009).
Para Winnicott, nas consultas terapêuticas, o relacionamento entre
terapeuta e paciente, deve assegurar um clima de confiança para suprir a
expectativa do paciente. Com isso se estabelece uma identificação mútua, entre
terapeuta e paciente, parecida àquela da relação mãe/bebê, no início do
desenvolvimento. Para ele o essencial é o modo de ser da mãe, a identificação com
o seu bebê e sua devoção ao cuidar dele (Lescovar, 2004).
Estudos foram publicados nessa temática, entre eles os de Barbieri,
Jackemin e Alves (2004 e 2007), em que observaram os resultados da aplicação do
psicodiagnóstico interventivo em crianças com queixa anti-social e personalidade
materna. Barbieri(2009) analisou a personalidade paterna. Paulo (2009) também
analisou o atendimento infantil em seu estudo.
Num trabalho com crianças, com queixa de comportamentos anti-sociais,
Barbieri, Jacquemin e Alves (2004) investigaram se o psicodiagnóstico
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interventivo poderia contribuir para o tratamento da tendência anti-social. Foram
analisadas oito crianças, entre cinco e dez anos de idade. Nesse trabalho
utilizaram-se entrevistas de anamnese, a Técnica de Rorschach, duas sessões
lúdicas, entrevista familiar diagnóstica, Bateria Gráfica de Hummer, Teste de
Apercepção Infantil (CAT-A), entrevistas devolutivas e follow-up com os pais.
Durante o processo de avaliação foram incluídos assinalamentos e interpretações
por parte do examinador. Foi realizado o follow-up por meio de entrevistas
pessoalmente ou por telefone, no período de três a oito meses. Dos oito casos
atendidos, sete foram concluídos. Dos sete concluídos cinco obtiveram sucesso
terapêutico, todos eles com estrutura de personalidade neurótica e dois obtiveram
fracasso terapêutico, com estrutura de personalidade psicótica. Os autores,
embasados na análise dos dados do psicograma da Técnica de Rorschach,
concluíram que as crianças com estrutura de personalidade neurótica puderam se
beneficiar com o psicodiagnóstico interventivo, portanto, das sete crianças
avaliadas, cinco se beneficiaram.
Com a incidência de melhora em pacientes, profissionais e pesquisadores
se
interessaram
pelos
resultados
terapêuticos
contidos
no
processo
psicodiagnóstico. Assim, “[...] o Psicodiagnóstico Interventivo (ou Avaliação
Terapêutica), cuja principal característica é a realização de intervenções
(assinalamentos, interpretações, holding)” foi criado no decorrer das entrevistas e
das aplicações de técnicas projetivas (Barbieri, 2010).
Barbieri, Jacquemin e Alves (2007) fizeram um estudo sobre o
psicodiagnóstico interventivo no tratamento infantil, enfocando os fundamentos
teóricos e a prática clínica. Para isso aplicaram o método diagnóstico/terapêutico
em uma menina de dez anos (Beatriz). O objetivo deste trabalho foi averiguar os
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resultados práticos desse tipo de intervenção. Para tanto se utilizou entrevista de
anamnese, o Teste de Rorschach, duas sessões lúdicas, Entrevista Familiar
Diagnóstica, Bateria Gráfica de Hammer, Teste de Apercepção Temática Infantil
(CAT-A) e a entrevista devolutiva. A paciente foi encaminhada para atendimento
por ter furtado dinheiro dos familiares em três ocasiões. Também foi salientada a
obesidade da menina (52 kg), embora a queixa principal fossem os furtos. Beatriz
vivia com o pai e a madrasta, foi descrita como sendo dócil e carinhosa, mas
demonstrando dificuldade em ser contrariada, embora aceitasse bem os castigos
infligidos pelos pais. Todo o psicodiagnóstico da paciente foi realizado de forma
interventiva. Durante os seis meses seguintes ao tratamento, foram realizados três
encontros com os pais, um a cada dois meses para se fazer o follow-up. Pode-se
constatar que nesse período Beatriz não voltou a furtar. Com a utilização do
psicodiagnóstico interventivo observou-se que após o contato com a psicóloga,
Beatriz pode perceber mais claramente o que precisava, podendo, agora, buscar
suas necessidades de modo simbólico e socialmente aceito. A conclusão dos
autores foi a de que o psicodiagnóstico interventivo possibilitou uma avaliação
mais fidedigna e fortaleceu o desenvolvimento tanto da menina, quanto da família
em direção à cura. Portanto acreditam se tratar “[...] de um método promissor, que
atribui ao paciente o papel de sujeito ativo ao alcance da própria saúde mental [...]”
(p.181).
Para Barbieri (2009, p.2), o psicodiagnóstico interventivo é “um
procedimento clínico que consiste em efetuar intervenções já no momento de
realização de entrevistas e aplicação de testes, oferecendo ao paciente, devoluções
durante todo o processo avaliativo e não somente ao seu final”. Os testes são
instrumentos que facilitam o contato do psicólogo com o paciente e auxiliam nas
17
intervenções durante o processo psicodiagnóstico como consequência daquilo que
o paciente apresenta, de forma a provocar mudanças (Paulo, 2009).
No atendimento infantil, o brincar para a criança é a forma que ela
encontra de expressar naturalmente seus sentimentos e desejos. Desta forma a
atividade lúdica é para criança o que a fala, na associação livre, é para o adulto, é
nela que a criança projeta seus medos, suas angústias e fantasias. Quando o
psicólogo interpreta o significado da brincadeira, mostra a situação em que se
encontra a criança (Paulo, 2009). Na hora do jogo a criança usa sua personalidade
integralmente, pois no brincar surge a comunicação verdadeira (Silva, 2010).
Paulo (2009) realizou um estudo que teve como objetivo abordar o
psicodiagnóstico interventivo com a técnica da hora do jogo para conhecer a
realidade da criança, a técnica de investigação e a possibilidade de intervenção. A
autora ilustrou seu trabalho com dois casos de atendimentos infantis, em que
utilizou testes e a hora do jogo diagnóstica de forma interventiva. Utilizou também
a entrevista compartilhada com pais e a criança. O primeiro caso foi de um
menino, de dois anos e seis meses, com queixa de hiperatividade e agressividade.
O psicodiagnóstico foi realizado durante três encontros com a mãe e a criança
juntas, nas quais foram feitas intervenções durante o processo. O segundo caso foi
o de um menino de três anos, em que a queixa foi de fobia escolar. Realizou-se
uma primeira entrevista somente com os pais e outra com os pais e a criança
conjuntamente. Também foram feitas intervenções durante todo o processo. A
autora concluiu que os resultados encontrados na prática clínica, têm revelado que
a utilização da hora de jogo em entrevistas compartilhadas com pais e filhos, em
‘triagem interventiva’, ‘plantão psicológico’ e ‘psicodiagnóstico interventivo’, tem
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apresentado êxito, de forma que contribui para abreviar o psicodiagnóstico e diluir
a barreira entre diagnóstico e terapia.
Na visão de Paulo (2006), já está se fazendo o psicodiagnóstico
interventivo no momento em que a postura do psicólogo e a utilização dos
instrumentos, durante o processo psicodiagnóstico, interferem na reação emocional
do paciente, pois a simples introdução de um teste projetivo interfere nas
experiências de vida e nas expectativas do paciente em relação àquele processo em
andamento. O psicodignóstico interventivo não tem como objetivo extinguir os
sintomas, porém possibilita uma avaliação mais completa, em que o paciente é
fortalecido e preparado para uma psicoterapia, se for necessária (Tardivo, 2007).
Segundo Winnicott (1941/2000), a mãe, intuitivamente, permite que o seu
bebê exercite suas experiências livremente, até que ele esteja crescido o suficiente
para compreender ‘o ponto de vista da mãe’. De maneira semelhante, o analista
permite ao paciente dar o seu próprio ritmo á sessão de atendimento.
Barbieri, Jacquemin e Alves (2005) realizaram um estudo, em que a
proposta foi verificar se as características de personalidade das mães de crianças,
submetidas ao psicodiagnóstico interventivo, poderiam interferir nos resultados
terapêuticos de seus filhos. Além disso, procurou-se determinar os prós e os
contras desse novo método de avaliação, levando-se em consideração a
personalidade materna. Participaram do estudo seis mães de sete crianças (de cinco
a dez anos) que foram submetidas ao psicodiagnóstico interventivo em virtude de
comportamentos anti-sociais. Todas as mulheres eram casadas, com idade entre 27
e 48 anos. Utilizou-se para a avaliação das mães o Teste de Rorschach, cujos
resultados foram comparados com os das crianças que foram avaliadas com as
entrevistas de follow-up. Foram considerados bem sucedidos os tratamentos em
19
que, no follow-up os pais relataram melhora dos sintomas dos filhos. Os resultados
do estudo com as mães mostraram que “a mãe deprimida também poderia ser
considerada como ‘suficientemente boa’. E que uma mãe que tenha capacidade de
identificação com o filho, mesmo que sua organização de personalidade seja pouco
evoluída, pode ajudar melhor numa intervenção terapêutica, que uma mãe com
personalidade neurótica, mas que é incapaz de estabelecer vínculos.
Assim como a criança necessita de uma mãe suficientemente boa,
também necessita de um pai suficientemente bom. E da sorte de ter essa
maternagem e essa paternagem, vai depender sua condição edípica e o sentimento
de realidade que terá no futuro. Quando o pai dá apoio à mãe e mantém-se íntegro
e se permite desfrutar essa relação com a mãe, proporciona um ambiente
suficientemente bom (Outeiral, 1997).
Barbieri (2009) realizou um estudo com o objetivo de verificar as
características de personalidade dos pais (masculinos) de meninos e meninas com
comportamentos
anti-sociais,
que
foram
avaliadas
com
o
método
do
psicodiagnóstico interventivo, momento em que foram realizados apontamentos e
interpretações. Participaram seis pais de sete crianças com idade entre cinco e dez
anos, com faixa etária entre 26 e 56 anos. Utilizou-se o Teste de Rorschach para a
avaliação desses pais, que foi aplicado individualmente após a entrevista de
anamnese. Com a análise dos resultados percebeu-se que para o pai ajudar o filho,
durante o psicodiagnóstico interventivo, teria que ser capaz de utilizar os
conteúdos adquiridos com seu envolvimento com a realidade externa e assim
“coibir, graduar e organizar as próprias pulsões e as angústias delas decorrentes”
(p.185). Portanto, a figura paterna, dessas crianças com comportamento antisocial, não se destacou com qualidade suficiente para ajudá-los no tratamento,
20
pois, os pais teriam muita dificuldade em dar-lhes forma e limites, já que só
conseguiriam se identificar narcisicamente com a angústia deles próprios.
Outeiral (1997) assevera que o pai é aquele que é indestrutível, é o que
faz com que a criança se sinta segura, e mantenha seus ‘impulsos livres e
agressivos’, e assim possa desfrutar deles à medida que tem um pai com
capacidade de dizer ‘não’.
Alguns profissionais (Paulo, 2006; Mishima e Barbieri, 2009), estudaram
a aplicação e os resultados do psicodiagnóstico interventivo no atendimento de
adultos.
A pesquisa desenvolvida por Paulo (2006) teve como objetivo verificar a
possibilidade de se usar o modelo do psicodiagnóstico interventivo com pacientes
adultos depressivos. Este estudo foi realizado com quatro pacientes, dois homens e
duas mulheres, com idade entre 31 e 57 anos, com diagnóstico de depressão. Para
este trabalho, que teve duração de três meses, foram utilizadas técnicas projetivas
como facilitadores do contato entre terapeuta e paciente. As intervenções foram
realizadas durante o processo, o mais precocemente possível. Os resultados
encontrados foram satisfatórios, com uma melhora dos sintomas de depressão nos
pacientes, em comparação com o início do tratamento. A conclusão da autora foi a
de que o psicodiagnóstico interventivo, com a utilização de testes projetivos,
trouxe maior facilidade de ocorrência de associações livres, dando mais espaço
para o trabalho interpretativo.
As intervenções podem ser feitas já no início do psicodiagnóstico, é
preciso que o psicólogo se mantenha atento para apreender o material significativo
que emerge durante a sessão terapêutica. Com as técnicas projetivas como
21
ferramenta, o psicólogo usando seu raciocínio clínico fará as intervenções, de
forma a dar significado à vivência do paciente (Paulo, 2006).
Segundo Mishima e Barbieri (2009) e Barbieri (2008 e 2009), no
psicodiagnóstico interventivo, os instrumentos de avaliação são subordinados a
métodos que não são estruturados, como, por exemplo, as técnicas projetivas, que
são usadas como estratégias para a comunicação entre o psicólogo e o paciente.
Essa pouca estruturação, somada às atitudes do profissional e acrescidas de sua
maleabilidade psíquica, proporcionam a percepção e organização de dados
importantes e significativos. Portanto, as técnicas projetivas proporcionam um
resultado diagnóstico mais seguro e fidedigno, possibilitando se verificar as
mudanças que o psicodiagnóstico interventivo provoca na personalidade e quais
pacientes possuem as características que proporcionariam benefícios com o uso do
mesmo.
Ody (1993), diz que a consulta terapêutica tem seus limites e tem dupla
função: evitar as indicações de análise prematuramente, e/ou preparar o paciente
para o processo terapêutico, pois o paciente precisa estar suficientemente
preparado, para se confrontar com o seu universo pessoal e com sua sexualidade.
Mishima e Barbieri (2009) descreveram os resultados de um estudo em
que os testes projetivos foram utilizados para o desenvolvimento do
psicodiagnóstico interventivo. O estudo teve como objetivo propiciar um
tratamento psicoterápico para mulheres obesas, por meio do psicodiagnóstico
interventivo, para verificar se uma abordagem de terapia breve provocaria
mudanças no comportamento alimentar e seguimento de uma dieta. O estudo foi
realizado com uma paciente (Ana), com obesidade grau I (IMC = 32 kg/m2), com
32 anos, com experiência em dietas de emagrecimento e exercícios físicos. Foram
22
realizadas seis sessões de avaliação, nas quais se utilizou entrevista clínica semiestruturada e testes projetivos com enfoque interventivo. A análise e interpretação
dos dados foram feitas de acordo com o enfoque psicanalítico no momento da
aplicação da entrevista e dos testes projetivos. Na análise dos resultados,
considerou-se que a paciente apresentou uma estrutura de personalidade
borderline. As autoras concluíram que após o atendimento com o psicodiagnóstico
interventivo, Ana perdeu peso, chegando ao Índice de Massa Corporal (IMC)
saudável. Elas justificam esse resultado como sendo devido ao atendimento em
que foi oferecido um holding e um ambiente suficientemente bom, que possibilitou
a recuperação da capacidade criativa da paciente.
É importante, no psicodiagnóstivo interventivo, “a adaptação ativa do
analista às necessidades e expectativas do paciente [...] e se necessária a
comunicação verbal desse entendimento no momento adequado” (Lescovar, 2004,
p.4), através do “[...] uso de assinalamentos, holding, handling e interpretações”
(Barbieri, 2008, p.580). Ao se possibilitar um holding a um ser humano desde o
nascimento, possibilita-se que ele gradualmente adquira um senso de identidade
pessoal (Silva, 2010).
O aprendizado dessas intervenções fundamentais à atitude clínica do
psicólogo deve ser iniciado na graduação, com o uso de novas ferramentas, como é
o caso do psicodiagnóstico interventivo, que vem sendo utilizado por professores e
alunos em estudos práticos.
Em um estudo realizado por Becker (2002) com o objetivo de avaliar o
processo que dá ao estagiário de psicologia, em seu primeiro atendimento, a
possibilidade de acolhimento do paciente de forma eficaz, a autora considerou a
teoria Winnicottiana como parte importante do processo, já que, segundo ela, o
23
psicodiagnóstico interventivo é um processo de maternagem e que foi colocado em
prática nos atendimentos realizados por seus estagiários. Realizaram-se entrevistas
de “follow-up” para se verificar a eficácia do psicodiagnóstico interventivo. As
devolutivas foram feitas em forma de histórias, o que mostrou a compreensão
compartilhada entre estagiário e paciente, portanto, relevando a importância desse
tipo de psicodiagnóstico no “espaço potencial”.
Winnicott (1984), afirma que existe no momento das primeiras entrevistas
um “intercâmbio muito mais livre” entre o profissional e seu paciente do que na
psicoterapia propriamente dita e fica muito difícil para o terapeuta, que avalia o
caminho emocional do paciente, passar um longo tempo sem interpretar para só
depois usar esse material. Segundo as palavras do referido autor “[...] não há nada
mais difícil do que avaliar o caminho em que alguém se encontra sem fazer
interpretação alguma [...] e depois, a certa altura, usar o material para interpretação
do inconsciente” (p.17).
Tardivo (2007) mostrou em seu trabalho realizado com estudantes de
psicologia que o psicodiagnóstico interventivo é uma proposta que traz benefícios
para o paciente. O objetivo do estudo foi verificar “se estudantes de graduação
podem aprender a trabalhar segundo o modelo do psicodiagnóstico interventivo e
atuar profissionalmente com base nas reflexões que podem e devem ser feitas o
tempo todo” (p.131). Um dos casos atendidos pelos estudantes e citado nesse
estudo foi o de um menino, Leandro, 12 anos, órfão de mãe. A mãe foi assassinada
pelo pai, que tentou suicídio. O pai foi aposentado, por problemas de saúde devido
ao atentado. O paciente morava com o avô paterno e chegou à clínica com queixas
de problemas de comportamento na escola. Em entrevistas, as tias maternas
relataram mudanças de comportamento após a morte da mãe (medo de ficar
24
sozinho). Durante os atendimentos Leandro demonstrou gostar da estagiária. Nas
sessões foram realizadas intervenções que levaram a modificações importantes no
comportamento do paciente, caracterizando-se o psicodiagnóstico interventivo. A
estagiária, que foi supervisionada pela autora do artigo, pode observar, com o
psicodiagnóstico interventivo, a ocorrência de mudanças internas em Leandro com
a mudança de atitudes ao longo dos atendimentos; e também mudanças externas,
em que precisou ter suas necessidades atendidas para poder crescer e se
desenvolver. A supervisora (autora) chegou à conclusão de que esse tipo de
psicodiagnóstico “é uma forma de atuação prática fundamentada que pode ser
desenvolvida junto a estudantes de psicologia” (p.134).
De acordo com Barbieri (2009), a teoria que melhor fundamenta o
psicodiagnóstico interventivo é a teoria psicanalítica, que entende a estrutura da
personalidade como inseparável das fantasias do indivíduo. Se levarmos em
consideração os pontos comuns entre a psicanálise e o psicodiagnóstico
interventivo, sobressai-se a dificuldade em separar a investigação da intervenção.
A integração entre essas duas vertentes possibilita ao paciente se apropriar do que
nele existe de mais criativo. Assim “[...] a investigação psicanalítica pode ser
transposta para qualquer situação em que exista um processo de associação livre”
(p.7). Ela ainda afirma que o psicanalista deve procurar muitas explicações para
“eventos únicos” e, depois de integrá-las, organizá-las e então usá-las nas
intervenções direcionadas ao paciente. No psicodiagnóstico interventivo o objetivo
é compreender profundamente o paciente, e estabelecer relações que façam o
indivíduo repensar. No entanto, o terapeuta tem que ter o cuidado em usar os
manejos adequados para que uma comunicação significativa se torne possível. É
interessante que o profissional saiba ouvir o paciente, respeitando o seu ritmo e
25
suas características, levando em conta a situação de contato em que terapeuta e
paciente se encontram durante o psicodiagnóstico terapêutico. (Lescovar, 2004).
Segundo Winnicott (1984, p.13), o trabalho realizado numa primeira
entrevista pode servir como uma preparação para um tratamento mais demorado e
intenso. Outras vezes, o resultado será oferecer à criança a possibilidade de ser
compreendida e ajudada. No entanto “[...] se uma criança sai da consulta
terapêutica e retorna para uma situação familiar anormal ou social anormal,
então não há provisão ambiental alguma da espécie necessária [...]”. Barbieri
(2008), citando Winnicott, alerta para o fato de que, se nas primeiras entrevistas
não são feitas intervenções, os objetivos diagnósticos, além de não serem
alcançados, impossibilitarão o contato terapêutico entre paciente e psicólogo.
De acordo com Barbieri (2010), o psicólogo representa o elemento mais
importante dos processos de avaliação e de intervenção. Ao invés dele fazer um
trabalho solitário, pode contar com a participação do paciente nesse processo de
intervenção, de modo a tornar esse trabalho confiável, além de obter ajuda para a
seleção do material clínico. Assim, se faz possível a expansão das ações e o
estímulo para transformações internas. Conforme nos alerta Tardivo (2007) o
psicodiagnóstico interventivo vem se consolidando, gradativamente, como uma
nova vertente, em que cada vez mais se valoriza ‘a relação entre sujeitos’.
CONCLUSÃO
O psicodiagnóstico interventivo de orientação psicanalítica é uma prática
que une compreensão e intervenção e possibilita ao paciente pensar e decidir seu
trajeto enquanto sujeito de sua história. A finalidade deste método não é a cura,
mas sim possibilitar ao paciente se preparar para um processo psicoterápico e
26
ajudá-lo a trilhar o caminho em direção à promoção da sua saúde mental e em
alguns casos bem sucedidos, substituir uma longa psicoterapia.
O psicodiagnóstico interventivo psicanalítico vem sendo cada vez mais
utilizado por profissionais de psicologia clínica. Sua eficácia é descrita por vários
pesquisadores da área que demonstram os resultados positivos alcançados por
pacientes que são submetidos a esse tipo de trabalho. Os estudos analisados
mostraram que é possível, durante o processo avaliativo, favorecer a possibilidade
de associações livres, com apontamentos e interpretações que promovam a
melhora dos sintomas apresentados pelos pacientes. As técnicas projetivas, que
foram usadas em alguns dos estudos, foram ferramentas que também auxiliaram na
ocorrência de associações livres e oferecem espaço para o trabalho interpretativo,
essas técnicas levam o paciente a se defrontar com suas fantasias e ter a
possibilidade de, intuitivamente, ter uma melhor compreensão de si mesmo.
A literatura também apresenta trabalhos realizados com alunos e
estagiários do curso de psicologia, que evidenciaram que o psicodiagnóstico
interventivo psicanalítico pode ser uma nova ferramenta para esses futuros
profissionais, visto que os resultados desses estudos foram promissores.
Enfim, a análise dos trabalhos empíricos apresentou resultados positivos,
em que os pacientes atendidos puderam se beneficiar com esse tipo de
psicodiagnóstico, portanto, os pesquisadores acreditam ser ele um método que
possibilita uma avaliação mais fidedigna e globalizada.
Pode-se afirmar que esse método promove no paciente a possibilidade de
ser sujeito ativo de seu próprio caminho em direção à sua saúde mental. E é
confiando no potencial do ser humano e na existência de um inconsciente, que o
27
profissional se permite ocupar o lugar de ‘objeto-subjetivo’ de seu paciente e
assim poder estar em íntimo contato com ele.
Além
de
somar
qualidade
ao
psicodianóstico
tradicional,
o
psicodiagnóstico interventivo psicanalítico é um método que pode promover
benefícios terapêuticos por meio da compreensão intuitiva do inconsciente, em que
o paciente tem a possibilidade, através de um holding bem estabelecido, num
ambiente suficientemente bom, diminuir seu sofrimento mental e se reorganizar.
Uma das limitações, para este estudo, foi a escassez de publicações sobre
o psicodiagnóstico interventivo com abordagem psicanalítica. Portanto, seria
importante dimensionar os efeitos desse tipo de técnica em trabalhos
desenvolvidos com crianças e adolescentes, adultos e idosos, enfocando os
diferentes tipos de transtornos e as intervenções mais pertinentes com a queixa
apresentada. Os resultados favoráveis mostrados pelos estudos relatados reiteram a
importância do aprofundamento das pesquisas sobre o tema, que é um terreno fértil
para futuras investigações, já que o psicodiagnóstico interventivo psicanalítico
deve estar em constante processo de evolução.
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