MASCULINIDADES EM DEBATE: ANALISANDO TEORIAS E ENLAÇANDO A SOCIEDADE PAULOAFONSINA. Cláudio Gomes de Sá Júnior1 Resumo As “novas” identidades sexuais do sexo masculino desconstroem as velhas práticas culturais socialmente ditadas. Nas ultimas décadas os estudos de gêneros e sexualidades estão cada vez mais presentes no universo acadêmico, certamente, ocasionada por sua diversidade, sobretudo entre os homens, possuidores de diferentes “masculinidades”. As identidades sexuais do sexo masculino contrapõem-se aos princípios socioculturais de uma sociedade patriarcal, tal como a cidade de Paulo Afonso-BA, que em sua maioria, alimenta uma “heteronormatividade” e em uma “masculinidade hegemônica”, o que não interfere nas constantes lutas dos “novos homens” pelos seus direitos e por seus espaços na sociedade, provocando então, uma crise na “heteronormatividade” que ultrapassa a fronteiras reais e virtuais. O propósito desse artigo de revisão bibliográfica é refletir sobre os conceitos abordados nas obras revisadas e problematiza-los com as práticas socioculturais existentes na comunidade pauloafonsina. Abstract The "new" sexual identities male deconstruct the old cultural practices socially dictated. In recent decades the study of gender and sexualities are increasingly present in academia certainly caused by its diversity, particularly among men, possessed of different "masculinities". The male sexual identities are counterbalanced by the sociocultural principles of a prejudiced society, such as the city of Paulo Afonso, who mostly believe in a " heteronormativity " and a " hegemonic masculinity ", which does not affect the constant struggles of "new men" for their rights and for their spaces in society, then causing a crisis in “heteronormativity" that exceeds the real and virtual boundaries. The purpose of this literature review paper is to discuss the concepts covered in the revised works and discusses them with the existing sociocultural practices in pauloafonsina community. 1 Acadêmico do 8º período de História pela Universidade Federal de Alagoas (UFAL) Campus do Sertão/Delmiro Gouveia –AL. Pesquisador do Projeto Ser/Tão Alagoana, orientado pela Prof.ª Drª Vanuza Souza silva e vinculado ao Núcleo de Estudos sobre a Educação e a Diversidade no Sertão Alagoano (NUDES). E-mail: [email protected] Palavras-chave Masculinidades – teorias – Práticas Socioculturais – Paulo Afonso. Keywords Masculinities - theories - Sociocultural Practices - Paulo Afonso. Este é um artigo de revisão bibliográfica, dos respectivos textos e autores, “A crise da Masculinidade: Uma Crítica à Identidade de Gênero e à Literatura Masculinista” de Sergio Gomes da Silva (2006), “Uma Crítica ao Conceito de Masculinidade Hegemônica” de Fabricio Mendes Fialho (2006), “Sexualidade, gênero e masculinidade no mundo dos t-lovers” de Larissa Pelúcio (2005) e por fim o texto, “TEORIA QUEER” de Leandro Colling (2002), tendo como principais objetivos, refletir sobre os discursos abordados nas obras acima citadas e problematizá-las com a realidade pauloafonsina. Os estudos de gêneros e sexualidades sempre estiveram presentes no meio acadêmico das Ciências Humanas, mas é na metade do século XX até o início do século XXI que os estudos sobre as diversidades sexuais dos gêneros ganham destaque. Sobretudo o sexo masculino, que segundo as pesquisas de Sergio Gomes da Silva, anda em crise. De acordo com os autores, (Badinter, 1993; Nolasco,1995a, 1995b; Almeida, 1996; Dorais, 1994a, 1994b; Almeida, 1995 e Ceccarelli, 1997) abordados por Silva, a crise da masculinidade contemporânea é simplesmente um reflexo dos movimentos feministas que marcaram o final da década de 60. Desde então, surgiram os primeiro sintomas, tais como as clínicas de recuperação da masculinidade e a “feminilização do masculino”, com a maior aparição dos homossexuais conflitando-se com o conceito cultural do ser “homem”, visto nessa citação. “Fala-se, e muito, do verdadeiro significado do que é ser homem na contemporaneidade, talvez como resultado de sua inserção na cultura à qual pertence, onde, por conseguinte, precisa moldar-sesustentando ou criticando, aderindo ou rejeitando, integrando-se ou afastando-se, obedecendo ou resistindo às regras impostas pela cultura e definidas como normas, conformando características, comportamentos e papéis que não necessariamente sejam aqueles que condizem com aquilo que ele almeja para si enquanto traços identificatórios”. (SILVA, 2006, p.120). Os preconceitos socioculturais contemporâneos aprisionam os sujeitos homossexuais, que em sua maioria, principalmente na adolescência,são arbitrariamente obrigados, a revestirem-se de mascaras,seguindo a risca, as normas de como ser um “homem”. No entanto, só é “homem” aquele de corpo viril, de atitudes rusticas e agressivas, sem sentimentalismo, necessariamente católico, heterossexual, de pele clara, de classe média, soberano sobre tudo e sobre todas? Certamente não, o significado de ser homem sobressai a esses simples estereótipos culturalmente construídos, particularmente, ser um homem é estar, ao longo de sua vida, em constantes transformações intelectuais e sociais, é ser humilde em assumir e corrigir seus erros, é encarar de maneira positiva suas responsabilidades, é ser, sobretudo, corajoso. E coragem, é o que eu não falta para os gays, que com muito paetê colorido, conhecimento e alegria, batalham contra as ideologias cristãs, machistas, ignorantes e preconceituosas que rodeiam uma grande parcela da humanidade. Em todas as cidades brasileiras, independente da região e da econômica, essa corrente preconceituosa é nitidamente percebida, visto a quantidade de agressões e mortes em todo o território nacional, segundo o Grupo Gay da Bahia (GGB), pelo menos 312 homossexuais foram mortos em todo Brasil em 2013, média de uma morte a cada 28 horas. Como exemplo, esse artigo problematizará os conceitos abordados por alguns autores sobre a temática da homossexualidade, observando as práticas socioculturais existentes na cidade de Paulo Afonso (um município localizada no alto sertão baiano, hoje, segundo o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) (2010) possui um pouco mais de 100 mil habitantes, desenvolveu-se após a instalação das usinas hidroelétricas, as quais dão a ela o título de “capital da energia”). Para a capital da energia, o “homem” de verdade, deve seguir os estereótipos acima citados, desrespeitando a existência de uma pluralidade sexual e cultuando a existência de uma “masculinidade hegemônica”. Sobre esse termo, que posteriormente será amplamente analisado, ainda neste artigo, Sergio Gomes diz o seguinte: “Dito de outro modo, o conceito de masculinidade hegemônica está calcado nos modelos tradicionais e dos predicativos da personalidade do homem, qual seja, “machista, viril e heterossexual”, do mesmo modo em que este deve apresentar distanciamento emocional, agressividade e comportamento de risco no seu dia a dia, ou seja, um homem bem mais próximo dos modelos do cavaleiro medieval, do guerreiro oitocentista e dos grandes soldados, ao passo que os novos modelos de masculinidade têm colocado em evidência uma preocupação quanto à redefinição do papel de pai, marido, amante, trabalhador e cidadão. Nesse sentido, as instituições nacionais e internacionais têm-se preocupado com essa pluralidade de modelos masculinos e colocado em sua agenda propostas de uma implementação de pesquisas e políticas públicas que venham minimizar os riscos que o “novo homem” pode vir a sofrer. (SILVA, 2006, p. 121). Esses “novos homens” esboçados na citação acima, são os gays, os bissexuais, os travestis e transexuais, enfim, humanos, que por vezes possuem uma identidade sexual, diferente da grande maioria. Mas, como são formadas essas identidades sexuais? Segundo Costa (1989): “a identidade é formulada por sistemas de representações diversas, e corresponde ao modo como o sujeito se atrela ao seu universo sociocultural. O conflito identitário se dá quando o processo ou desempenho identificatórios são atravancados por contradições internas a um sistema ou por incompatibilidade entre sistemas diversos, não conseguindo realizar as exigências da norma identificatória e vindo o sujeito a sofrer psicologicamente, sendo sua identidade interpretada como desvio da normalidade”. (p. 22). Se existe uma “heteronormatividade”, então ser homossexual é ser um humano anormal? Seguramente, não. Ser homossexual é ser feliz, amando e desfrutando prazerosamente de um corpo biologicamente idêntico. Ser homossexual é estar sempre colorindo o mundo e a vida, mesmo em lugares húmidos e obscuros, aos quais, por vezes, são “obrigados” a frequentar. Contudo, ao passar dos anos, os homossexuais voltaram a assumir papéis sociais extremamente respeitados, é o caso do prefeito de Lins (SP) Edgar de Souza e o deputado federal do Rio de Janeiro Jean Wyllys. Aqueles e aquelas que, por algum motivo, não assumem a sua identidade sexual, por opção ou como de praxe, por causa da família, que possivelmente pode não aceitar sua condição sexual, ou pela religião e até pelo medo de enfrentar a sociedade, (como é o caso de Paulo Afonso, uma cidade construída sobre alicerces tradicionalmente machista e cristã) corre o risco de pagar um alto preço em seu sofrimento psicológico, sendo o suicídio um dos caminhos mais curtos para estas pessoas. Foi o que aconteceu com a jovem Daniela Paula Oliveira lima de18 anos, residente na Rua Nova Glória, BTN três em Paulo Afonso Bahia, que segundo o site Chico Sabe Tudo, cometeu suicídio no dia 19 de setembro de 2013, sendo seu corpo encontrado pelo padrasto no banheiro de sua casa com uma corda no pescoço feita de lençol, o motivo do suicídio, segundo os mais próximos da garota, foi a falta de aceitação de seus familiares pelo fato dela ser uma homossexual. Além de sofrerem por angustias internas, os homossexuais sofrem com a ignorância e com o preconceito de pessoas que não respeitam a diversidade sexual, muito menos sua integridade física e moral. Partindo desse pressuposto Silva mostra o seguinte: “O “narcisismo das pequenas diferenças” foium termo criado por Freud n’O Mal-Estar na Civilização (1929[1930]), e refere-se às pulsões de agressividade dirigidas às minorias. Ele designa uma idéia de pertencimento e exclusão a um determinado grupo ou comunidade, onde o grupo tende a afirmar uma unidade em confronto e oposição a outros grupos, criando-se um mito de superioridade, um fechamento identitáriodo “nós” diante dos “outros”. Aliado a isso, temos a intolerância e a crueldade contra indivíduos, concebidos como estranhos, diferentes, que não se adequam às normas estabelecidas por uma “pretensa maioria”. Assim, passamos a discriminar indivíduos a partir de uma particularidade física, genética, identitária, sexual, social, entre tantas outras. Veja-se, por exemplo, o preconceito formado contra minorias tais como os negros, os psicóticos, os judeus, as mulheres, os homossexuais, os pobres, os mendigos, os “sem-teto”, os “sem-terra”, e tantos outros personagens reais tidos como excluídos”. (SILVA, 2006, p. 128-129) Pontuar uma identidade sexual como superior ou inferior é um erro, extremamente, grosseiro e de vínculo preconceituoso. A homofobia ainda é um dos principais motivos que leva a morte de homossexuais no mundo todo, no entanto, como afirma Sergio Gomes, “[...] todo e qualquer papel social muda de acordo com a contingência histórica, e o que é hoje desclassificado pode muito bem vim a ser recomendado amanhã” (2006, p. 129). Só em imaginar que os "herdeiros do futuro" não passarão pelas mesmas crueldades físicas ou psicológicas, executadas pela sociedade e até mesmo pelas próprias famílias aos gays, travestis, transexuais, bissexuais, lésbicas, entre outras identidades sexuais do século atual, certamente apazigua a alma desses sujeitos que vivem em constantes “guerras” reivindicando, com propriedade, seus direitos e seu espaço na sociedade contemporânea. Há realmente uma “masculinidade hegemônica”? O conceito de “masculinidade hegemônica” surge com os estudos do pesquisador R. W Connell tornando-se um referencial teórico para os estudos sobre masculinidades. Tal conceito refere-se a um grupo majoritário de sujeitos possuidores de práticas, culturalmente criadas, que os identificam como “Homens hegemônicos” de uma masculinidade hegemônica e singular, negligenciando a “pluralidade” sexual do sexo masculino. Portanto, no que se refere ao sexo masculino, não se pode, de maneira alguma, tratar-se como uma única “masculinidade” e sim, em “masculinidades”. Referente à problematização da hegemonia masculina, Robert Connell afirma o seguinte: “Dentre as diversas masculinidades, existiria uma que se apresentaria como sua forma “hegemônica”, aquela que corresponderia a um ideal cultural de masculinidade. Além desta forma de masculinidade, existiriam outras que manteriam relações de subordinação, cumplicidade ou de marginalização em relação à hegemônica” (CONNELL, 1997, p. 39-43; 1987; 2000). De certa forma, os discursos sociais, acabam por alimentar um sentimento de desprezo para com as diferentes masculinidades. E tratando-se da cidade de Paulo Afonso, essa cultura pode ser definida como uma cultura “tradicionalista” que faz uma apologia ou cristianismo, a pele branca, a classe média, a mulher submissa e “dona de casa” e certamente ao um homem viril heterossexual ou como popularmente é conhecido, “um cabra macho”. Todavia, não se pode negar a posição privilegiada, que os homens heterossexuais possuem sobre os gêneros e as identidades sexuais opostas e, sobretudo, para com os homossexuais, estes, banidos de vivenciarem sua sexualidade em público, cabendo aos mesmos, formarem em grupos. Na capital da energia, os grupos são diversos e mistos, geralmente compostos por gays, lésbicas, bissexuais e heterossexuais simpatizantes, que se juntam em guetos, tais como o “Dique” (uma pequena área que fica localizada em uma das extremidades da usina hidrelétrica de Paulo Afonso IV, um lugar de pouca claridade, longe das residências e de certa forma seguro, pois próximo ao local fica uma das guaritas dos guardas que impedem a entrada na usina de pessoas não autorizadas) outro gueto frequentados por estes grupos é a praça dos aposentados (uma praça localizada no centro da cidade, de pouca claridade e próxima de prédios abandonados) ou como é conhecida entre os homossexuais a “praça da diversidade” por ser frequentada pelos mais diversos grupos marginalizados, o “Grande Hotel” como é popularmente conhecido é um prédio localizado em um dos extremos da cidade de Paulo Afonso e que já se encontra abandonado há décadas, portanto, com pouca ou nenhuma iluminação. Além desses três guetos bastante conhecidos pelos grupos LGBTS (Lésbica, Gay, Bissexual, Travesti e Simpatizante) pauloafonciso, tem-se também as boates voltadas para esta clientela. Continuando o debate sobre uma “masculinidade hegemônica”, Fialho faz a seguinte provocação: “Se é verdadeiro que ainda constatamos a existência de uma forma hegemônica de masculinidade – que no caso da sociedade brasileira poderíamos identificar como sendo homens brancos, heterossexuais, de classe média, etc. –, cabe indagar, entretanto, se as demais formas de masculinidade (gays, homossexuais, bissexuais, “barbies”, “cybermanos”, metrossexuais, negros, pobres, etc.), ao se contraporem à forma predominante, buscam ocupar tal posição hegemônica. Tais masculinidades não-hegemônicas querem simplesmente inverter suas posições com o grupo hegemônico? Ou será que o que pretendem é serem reconhecidas como formas também legítimas e possíveis de se experienciar a masculinidade?” (FIALHO, 2006, p. 07). Seguramente, as outras formas de masculinidades não possuem a pretensão de serem grupos hegemônicos ao heterossexual, uma vez que os mesmos não comungam desse conceito de superioridade ou inferioridade entre os sexos e suas identidades. Mas, certamente almejam serem reconhecidos como sujeitos dignos de vivenciar sua sexualidade, na condição ao qual nascerão ou cultivaram, sem interferências socioculturais. De uma maneira que todos possam gozar, independente de gênero e sexualidade, dos mesmos direitos. T-Lovers: um universo de prazer e respeito “online” e “offline”. Nascido dos movimentos identitários, que ganharam destaque na década de 80, o termo t-lover chegou ao Brasil via rede mundial de computadores, segundo Alex Jungle, um carioca pioneiro do universo dos t-lovers, o termo é derivado do t-girl, usado por ONGs estadunidenses para definir os transexuais, consequentemente, os t-lovers estão estreitamente ligados ao universo homossexual, porém, não se tornou regra em outros países, como é o caso do Brasil. “Diferentemente do que vem ocorrendo no Brasil, onde os t-lovers estão fortemente identificados com a heteronormatividade, trabalham e reforçam a masculinidade enquanto valor simbólico, associando-a sempre à “normalidade”, em oposição à homossexualidade, tida como “desvio” (PELÚCIO, 2005, p. 02). Mesmo vindo de fora, a cultura machista “heteronormativa” brasileira, sobressai novamente, reforçando nos t-lovers brasileiros o uso continuo de uma máscara hipócrita. Mascaras que se diluem com muita facilidade no universo “online” dos ciberespaços, por traz dos “Nicks” encontra-se sujeitos sedentos de curiosidade, prazer e desejo, para com os homossexuais, sobretudo, os travestis. “Navegando na Internet, sobretudo em ambientes voltados para encontros sexuais a partir da rede internacional de computadores, o usuário do sistema irá se deparar com alguns termos e abreviações próprios da linguagem do ciberespaço. Entre estes encontrará muitas vezes as abreviações “tv”, “tg” referindo-se a travestis. Logo o usuário concluirá que no ambiente sexual do ciberespaço a letra “T” precedendo outras consoantes indica na maioria das vezes afinidades ou identidade com o universo travesti”. (PELÚCIO, 2005, p. 05). Esse mais novo artificio tecnológico, propíciopara existência de contatos “online” (virtual) e “off-line” (real), não se encontra longe da realidade pauloafonsina, visto a quantidade de homens t-lovers e até homens que se identificam como heterossexuais em salas de “bate-papo Uol” e em redes sociais, buscando alguma forma de contato, acima de tudo, um contato físico sexual, para com os homossexuais de Paulo Afonso e região. Enfim, uma hora o desejo falará mais alto que a cultura. Por que os travestis, transexuais e crossdregss são os mais cobiçados pelos tlovers? “Como já mencionado, algumas travestis, transexuais e algumas CD (crossdress)15 também participam do aj-sp. Essas pessoas são tratadas ali como mulheres, e procuram se comportar dentro dos modelos aceitos e referendados pelo discurso heteronormatizador do que é próprio e legítimo como expressão do feminino.” (PELÚCIO, 2005, p.08). Com essa citação é perceptível o quanto os t-lovers não se aceitam como sujeitos intersexuais, que possuem prazer em ter relações com outro sujeito do mesmo sexo biológico, tentando, de certa forma, mascara o seu próprio preconceito, colocando os travestis e transexuais no papel de sexo feminino, o que elas certamente não são. Por serem colocados nessa posição “inversa” os homens t-lovers, devido às regras criadas por eles, respeitão e tratam muito bem das travestis e transexuais, chegando ao ponto de ser criando um dia especial para “elas” o dia “T” (um dia em que os t-lovers saem do universo virtual e se juntam nesse mundo real, principalmente em bares, onde as “tgatas” nome dado às travestis e transexuais são muito bem tratadas). A perseverança dos t-lovers em reforçarem que ainda são “homens” viris, ativos e heterossexuais, (devido os discursos culturais machistas da “heteronormatividade”) é reforçada pelas opiniões de muitos travestis e transexuais, observado nessa citação da obra de Larissa Pelúcio, “Na visão das travestis, bem como do discurso hegemônico sobre sexualidade, esses homens não seriam menos homens apenas por procurarem sexo com travestis, mas, sobretudo, por buscarem um determinado tipo de sexo.” (2005, p.23). Realmente, ninguém se torna mais homem ou menos homem, por nada, todavia, essa sustentação por parte dos travestis e transexuais, de certa forma, reforça o conceito da “heteronormatividade”, um conceito preconceituoso e ignorante que atinge boa parte das diferentes masculinidades. Esse discurso errôneo de “heteronormatividade” acaba por criar, de alguma forma, conflitos entre as identidades sexuais, tais como a distinção cultural do “ativo” (homem normal) e “passivo” (homem desviado, anormal, afeminado) esta definição talvez seja um dos piores erros que alguém poça cometer, ao se tratar de masculinidades. Não importa a posição em que o sujeito esteja na hora da relação sexual, mas, com quem ele esta fazendo! Aprofundando os conflitos entre as identidades do gênero masculino minoritárias, sobretudo, entre gays e travestis, Larissa Pelúcio (2005) esboça a seguinte afirmação: “Tanto t-lovers quanto travestis consideram o “ser gay” ou “viado” como elemento depreciativo que opera no sentido de deslocá-los dos pólos de gênero ao qual se julgam pertencentes. Ainda que na maioria das manifestações depreciativas o “gay” e o “viado” apareçam como chacota ou brincadeira, é justamente nas manifestações menos conscientes que o valor depreciativo se evidencia”. (PELÚCIO, 2005, p. 27). Se a teimosia do t-lovers em quererem ser reconhecidos como homens heterossexuais em seus universos (real e virtual) já não soa tão bem aos ouvidos das militâncias LGBTT (Lésbica, Gay, Bissexual, Travesti e Transexual) e dos pesquisadores de gênero e sexualidade, muito menos soará os conflitos entre homens pertencentes às masculinidades minoritárias, vítimas da cultura “heteronormativa”. No entanto, para acabar com os conflitos entre as masculinidades, surge a teoria “queer”. TEORIA QUEER: críticas a “heteronormatividade”. Sem uma tradução definida para a Língua Portuguesa, a teoria queer, foi criada da década de 80, nos Estados Unidos, uma de suas principais representantes é a pesquisadora Butle. Segundo ela a teoria quer pode ser entendida como “uma prática de vida que luta que se coloca contra as normas socialmente aceitas”. Para Lopes. “Os estudos queer atacam uma repronarratividade e uma reproideologia, bases de uma heteronormatividade homofóbica, ao naturalizar a associação entre heterossexualidade e reprodução” (2002, p. 24). Assim como em outras cidades brasileiras, em Paulo Afonso, a teoria queer, mesmo que praticada involuntariamente, ainda é muito pouca conhecida teoricamente. Porém, espera-se que seja cada vez mais disseminada entre as cidades brasileiras, uma vez que, a luta contra “heteronormatividade” é um dos primeiros passos para aqueles que buscam a igualdade entre as sexualidades. Considerações Finais Com base nas leituras, pode-se perceber que a realidade, “micro”, das práticas socioculturais preconceituosas da sociedade pauloafonsina, sustentadas pelos princípios cristãos e ignorantes da “heteronormatividade” e da “masculinidade hegemônica” não foge da realidade, “macro”, de muitas outras cidades brasileiras, as quais desconsideram todos e quaisquer direitos humanos relativos aos homens das mais diversas identidades sexuais, que necessariamente, estão revestidos de muito brilho, alegria e conhecimento para vencer a árdua batalha contra as regras socialmente ditadas. Referencias Bibliográfica. COLLING, Leandro. TEORIA QUEER. In. Mais definições em campo. FIALHO, Fabrício Mendes. Uma crítica ao conceito de masculinidade hegemônica. In. INSTITUTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS – UNIVERSIDADE DE LISBOA. Lisboa, 2006. PELÚCIO, Larissa. Sexualidade, gênero e masculinidade no mundo dos t-lovers: a construção da identidade de um grupo de homens que se relacionam com travestis. In. SBS – XII CONGRESSO BRASILEIRO DE SOCIOLOGIA/ GT17 - Sexualidade, Corporalidades e Transgressões. São Paulo, 2005. SILVA, Sergio Gomes. A Crise da Masculinidade: Uma Crítica a Identidade de Gênero e à Literatura Masculinista. In. Instituto de Medicina Social – Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2006 p. 118 a 131.