ÉTICA E LIBERDADE NO PENSAMENTO DE KANT Uma análise da Obra Fundamentação da Metafísica dos costumes Osmar Mackeivicz Na primeira parte da sua obra “Fundamentação da Metafísica dos Costumes”, Kant analisa dois conceitos fundamentais da sua teoria moral, a saber: o conceito de vontade boa e o imperativo categórico. A partir desses dois conceitos surge a ética kantiana. Os conceitos de vontade boa e de imperativo categóricos empregam duas condições de dever: o seu aspecto objetivo regulado pela lei moral; e o seu aspecto subjetivo, produzido pelo cumprimento da lei pela subjetividade livre, formando uma condição necessária do agir. O aspecto objetivo abarca um critério de correção moral e o aspecto subjetivo a condição do valor moral da ação. Sendo assim, o conceito de dever é fundamental na ética kantiana. O conceito de dever, portanto, contém dois aspectos fundamentais da filosofia moral de Kant, ou seja, o conceito de vontade boa e o conceito de lei moral. Acerca da vontade boa, KANT (1974, p. 204) menciona: “A vontade não é boa por aquilo que promove ou realiza,… mas tão somente pelo querer, isto é, em si mesma”. A teoria kantiana do agir moral afirma ALMEIDA (1992, p. 94), está baseada em duas teses básicas: “Que agir moralmente consiste em agir com base em regras universalizáveis, que qualquer outro ser racional possa adotar como suas; que devemos agir com base em regras universalizáveis pela simples razão que somos racionais”. O conceito de vontade boa é condição para a formação de uma consciência de dever e consiste no respeito à lei moral, sendo sua motivação principal o agir em conformidade com a lei. O termo motivação serve para diferenciar daquilo que é empírico e ligado a fins contingentes. A ética kantiana não se baseia em princípios empíricos, pois esses princípios não possuem um valor universal e válido. Na “Fundamentação da Metafísica dos Costumes”a questão da felicidade é abordada não como causa da moralidade, mas como consequência do agir moral, ou seja, é alcançada à medida em que o homem cumpre a lei, e cumprindo a lei alcança a felicidade. DUTRA (2002, p. 33) afirma que: “A pessoa deve pautar a sua ação tendo como única motivação a lei moral e, só então, poder esperar que a felicidade possa ser-lhe atribuída, ou seja, a vontade boa é colocada como condição da felicidade”. Logo, a lei moral kantiana tem necessidade de ser absoluta, pois todo agir tem que valer como condição universal para todos os seres racionais. Nesse sentido a moralidade não pode vir da antropologia, nem da abstração de dados empíricos, mas deve-se deduzi-la de um ente racional. Somente na aplicação da lei moral é que se pode abordar questões antropológicas, e, também, o conceito de felicidade. Quando se trata da eficácia da lei para um ser racional finito, aparece novamente o conceito de felicidade. A felicidade, que é um fim perseguido por todos, é uma necessidade natural, fato que remonta a seu status de a priori, visto que a felicidade natural está presente em todos os seres racionais. Para Kant, o conceito de vontade boa contém em si o conceito de dever. O dever é uma ação da vontade boa que não pode ser constatado empiricamente. O valor moral de uma ação consiste em executá-la por dever e não por inclinação ou interesses particulares. Fazer o bem por inclinação ou por interesse não possui nenhum valor moral, mas apenas valor contingente, mas, ao contrário, se a prática do bem é por dever a ação é valorativa. DUTRA (2002, p. 35) afirma que: “A vontade boa pode ser considerada uma condição formal do valor moral da ação, e pode ser estabelecida a priori”. KANT (1974, p. 208) menciona: Uma ação praticada por dever tem seu valor moral, não no propósito que com ela se quer atingir, mas na máxima que a determina: não depende, portanto da realidade do objeto da ação, mas somente do princípio do querer segundo o qual a ação, abstraindo de todos os objetos da faculdade de desejar, foi praticada […] dever é a necessidade de uma ação por respeito à lei […] ora, se uma ação realizada por dever deve eliminar totalmente a influência dainclinação e com ela todo o objeto da vontade nada mais resta à vontade do que a possa determinar do que a lei objetivamente e subjetivamente. O valor moral de uma ação não está no efeito que dela decorre, mas no querer e no agir conforme a lei e não por inclinação. O princípio do agir moral é que possa querer que a máxima da ação seja universal. E para saber se a ação praticada tem valor moral válido basta questionar-se se essa é possível de tornar-se universalizável. DUTRA (2002, p. 35) expressa que: “A vontade boa é um conceito que diz respeito ao acatamento subjetivo da lei moral”. Logo, esse acatamento é que implica a moralidade da ação, onde uma ação praticada por interesse possui valor contingente e não moral. O valor moral da ação é definido pela motivação da lei e não pelo interesse empírico. Evidencia-se assim que a vontade boa é um dos elementos fundamentais do dever e que pode ser estabelecida a priori. A vontade boa é considerada o primeiro aspecto do dever. Em sua obra “Fundamentação da Metafísica dos Costumes”,(1974, p. 35), Kant ressalta que o dever possui um segundo aspecto, a lei moral: “[…] todos os conceitos morais têm sua sede e origem completamente a priori na razão; […] que não podem ser abstraídos de nenhum conhecimento empírico e por conseguinte puramente contingente; que exatamente nessa pureza da sua origem reside a sua dignidade para nos servirem de princípios práticos supremos”. As leis morais devem valer para todos os seres racionais, e, é também, desses seres racionais universais que deve-se deduzi-las. Trata-se então de descrever a faculdade prática da razão, partindo das regras universais até o conceito de dever. KANT (1974, p. 217) então afirma: Cada coisa da natureza age segundo leis. Só um ser racional tem capacidade de agir segundo a representação das leis, isto é, segundo princípios, ou: só eletem uma vontade. Como para as ações das leis é necessária à razão, a vontade não é outra coisa senão a razão prática. Se a razão determina infalivelmente à vontade, as ações de um tal ser, que são conhecidas como objetivamente necessárias, são também subjetivamente necessárias, isto é, a vontade é a faculdade de escolher só aquilo que a razão, independentemente da inclinação, reconhece como praticamente necessária, quer dizer como bom. Logo, se a razão não determina por si a vontade, mas está sujeita a condições empíricas e se a vontade não é conforme a razão, suas ações são totalmente contingentes. OS IMPERATIVOS DA RAZÃO Os imperativos da razão podem ser hipotéticos ou categóricos. Os imperativos se exprimem pelo verbo dever (sollen), e mostram assim a relação de uma lei objetiva da razão para uma vontade. Os imperativos afirmam se seria bom ou não deixar de praticar qualquer coisa. Os imperativos hipotéticos e categóricos são distintos. KANT (1974, p. 218) menciona em que consiste o imperativo hipotético e categórico: “Os imperativos hipotéticos representam a necessidade de uma ação possível como meio de alcançar outra coisa que se quer. O imperativo categórico seria aquele que nos representa uma ação como objetivamente necessária, por si mesma, sem relação com qualquer finalidade”. Os imperativos são fórmulas da determinação da ação que é necessária segundo um princípio de uma vontade boa. Se a ação é boa apenas como meio para outra coisa, então o imperativo é hipotético. Porém se ação é boa em si, e é uma vontade conforme a razão, então o imperativo é categórico. O imperativo mostra que a ação é boa em vista de qualquer intenção sendo ela possível ou real. O imperativo categórico independe de qualquer intenção, mas a ação é necessária em si, e por isso também que é válido como princípio prático. O imperativo categórico pode também ser chamado de imperativo da moralidade, porque esse não se relaciona com a matéria da ação, mas com a forma, e também porque a ação é boa em si, na sua disposição. Para que a moralidade não seja vã, é preciso demonstrar que é necessário o imperativo categórico e a autonomia da vontade. KANT (1974, p. 223) afirma que há apenas um imperativo categórico: “Age apenas segundo uma máxima tal que possas ao mesmo tempo querer que ela se torne lei universal”. É desse imperativo que provêm os imperativos de dever, e também a lei moral. Em todas as ações praticadas pelo homem tal imperativo deve estar presente, para assim estabelecer critérios. Se a ação praticada é possível que seja tomada como universal. Há ações praticadas pelo homem que são contrárias as leis da razão e por isso não podem ser universalizáveis, e essas ações só são possíveis porque o homem age pela liberdade. Evidencia-se assim que o conceito de dever é um conceito que possui um significado, e contêm uma legislação para as ações do homem, exprimindo-se no imperativo categórico. Então se questiona: é possível esse imperativo categórico? A POSSIBILIDADE DO IMPERATIVO CATEGÓRICO A justificação do imperativo categórico está ligada à distinção de dois mundos, que são propostos por Kant. O mundo sensível, que são os fenômenos, e o mundo inteligível, que é o noumenon. KANT (1974, p. 248) ressalta: “O ser racional, como inteligência, conta-se como pertencente ao mundo inteligível, e só chama vontade sua causalidade como causa eficiente que pertence ao mundo inteligível. Por outro lado tem consciência de si mesmo como parte do mundo sensível, no qual suas ações se encontram como meros fenômenos daquela causalidade”. Logo, pode-se somente conhecer as coisas na medida em que aparecem no âmbito do espaço e tempo, ou seja, como fenômenos, e não como noumenos. A questão que se levanta com esse fato é se é possível conhecer a coisa-em-si, ou seja, o noumenon. Não se pode conhecer a coisa-em-si, mas ela é possível de ser pensada, pois o noumenon é o fundamento dos fenômenos. KANT (1974, p. 249) menciona: … Porque o mundo inteligível contém o fundamento do mundo sensível, e, portanto das suas leis, sendo assim, com respeito a minha vontade, (que pertence ao mundo inteligível), imediatamente legislador e devendo também ser pensado como tal, resulta daqui que, posto por um lado me conheça como ser pertencente ao mundo sensível, terei, como inteligência, de reconhecer-me à lei do mundo inteligível, isto é, a razão, que na ideia de liberdade contém a lei desse mundo, e, portanto a autonomia da vontade; por conseguinte terei de considerar as leis do mundo inteligível como imperativos para mim e as ações conforme este princípio como deveres. Somente assim são possíveis os imperativos categóricos, porque a ideia de liberdade faz com que o homem seja membro do mundo inteligível. Se não houvesse distinção entre fenômenos e noumenos, não se poderia dizer que, enquanto age-se sob as leis da natureza não se é livre, e ao mesmo tempo se a ação praticada pela lei é livre. Sendo assim, é possível pensar a liberdade como condição da moralidade dos atos. A vontade tida como fenômeno, é submetida às leis da natureza e não é livre, mas a vontade pensada como coisa-em-si, ou seja, como vontade autônoma, é livre. Então se percebe que a liberdade como ideia da razão ainda que não seja conhecida é possível ser pensada. Enquanto o homem dá-se a si mesmo a lei moral, enquanto o homem está submetido à lei que ele mesmo criou, enquanto participante do mundo inteligível, ele é livre. Isso é autonomia da vontade. E só assim é possível o imperativo categórico. Kant mostra que a liberdade é plausível de ser pensada mesmo que não seja conhecida. A AUTONOMIA DA VONTADE COMO PRINCÍPIO DA MORALIDADE A autonomia da vontade é a capacidade dela ser lei para si mesma. O princípio que norteia a autonomia da vontade é o de não escolher senão máximas que possam ser consideradas como leis universais. Portanto, esse princípio é um imperativo categórico. O conceito de autonomia é o princípio da moral. KANT (1974, p. 243) afirma: “A vontade é uma espécie de causalidade dos seres vivos, enquanto racionais, e liberdade seria a propriedade desta causalidade, pela qual ela pode ser eficiente, independente de causas estranhas que a determinem”. Conceber o conceito de liberdade como causalidade na filosofia de Kant é importante porque não é possível o conceito de causalidade desprovido de lei. Esse conceito de liberdade que Kant propõe é negativa, mas é desse conceito que decorre o conceito positivo de liberdade. A liberdade é um tipo de causalidade, a qual se define positivamente, como capacidade de ser lei para si mesma, logo ela não pode agir senão por máximas universalizáveis, ou seja, leis. Se essa agisse por leis empíricas, não seria lei para si mesma. KANT (1974, p. 243), afirma: … O conceito de uma causalidade traz consigo o de leis segundo as quais, por meio de uma coisa que chamamos causa, tem de ser colocada outra causa que se chama efeito, assim a liberdade, […] não é desprovida de lei, mas têm de ser causalidade segundo leis imutáveis, […], pois de outro modo uma vontade livre seria absurdo. Ou ainda- a vontade é em todas as ações uma lei para si mesma. Logo, isso caracteriza o princípio de não agir por máximas que não possam ser tomadas como leis universais. Isso é o imperativo categórico e o princípio da moralidade. Assim não é plausível atribuir a liberdade à vontade do homem, se não for possível de atribuí-la a todos os seres racionais. Pois, a moralidade serve de lei, somente para os seres racionais, então a liberdade tem de valer para todos os seres racionais. Pois a liberdade é demonstrada como propriedade dos seres racionais dotados de vontade. KANT (1974, p. 244) ressalta: Todo ser que não pode agir senão sob a ideia da liberdade, é por si mesmo, em sentido prático, verdadeiramente livre, quer dizer para ele valem todas as leis que estão inseparavelmente ligadas a liberdade exatamente como se a sua vontade fosse definida como livre em si mesma. […] a todo ser racional que têm uma vontade temos que atribuir-lhe necessariamente também a ideia de liberdade sob a qual ele unicamente pode agir. A vontade dos seres racionais tem que ser considerada livre em si mesma, pois não é possível que ela como autor dos seus princípios deixe-se influenciar por módulos estranhos, e a vontade desse ser racional só pode ser vontade própria sob a ideia de liberdade. Portanto, a ideia de liberdade está ligada inseparavelmente ao conceito de autonomia, e esse é o princípio da moralidade o qual está na base das ações dos seres racionais. Logo, não se pode pensar a lei moral sem a ideia da liberdade e vice-versa. LIBERDADE E MORAL A busca incondicionada no uso do entendimento é uma determinação natural da razão, e, também encontra-se na base do conceito transcendental de liberdade. A liberdade transcendental quando analisada sob sentido cosmológico significa independência de causas naturais. Então, faz-se necessário distinguir uma espontaneidade no sentido de busca da completude e uma espontaneidade no sentido da própria concepção das faculdades da mente, entendimento e razão. Trata-se, portanto, da espontaneidade do entendimento que se manifesta nas ideias da razão. Na espontaneidade é necessária a ideia de liberdade para que a atividade do entendimento e da razão possam dar regras à natureza e não a natureza dar as regras. Ao estabelecer-se a lei moral,a razão torna-se a legisladora e determina a vontade. DUTRA (2002, p. 66) ressalta: “Essa lei, assim estabelecida pela razão, é expressão da própria essência da vontade de um ser racional, a saber, a liberdade, que não é nada mais do que autonomia. Sendo assim, a lei moral, nada mais exprime do que a autonomia da vontade é o único princípio a priori da razão prática pura”. Na concepção kantiana, liberdade e lei moral são conceitos transmutáveis, onde não há lei moral sem liberdade. A liberdade não é o direito de fazer aquilo que se quer, e também não é fazer o que é imposto, mas a liberdade é o direito de fazer o que se deve. Quando o homem age por dever, então ele é livre. É o dever que implica a moralidade da ação. A liberdade, portanto, não é fazer qualquer coisa que se queira. A liberdade é, pois um poder moral, onde o dever está de forma intrínseca relacionada com uma finalidade. A liberdade não significa independência de leis. SHEEN (1947, p. 37) afirma: “[…] a liberdade está condicionada à obediência da lei. Liberdade fora da lei não existe, só existe liberdade dentro da lei, seja ela científica natural, humana ou divina”. Pode-se citar o aviador, que só têm liberdade de voar e submeter-se a lei da gravitação, isto é, deve agir dentro da lei. SHEEN (1947, p. 38) também menciona: “Somos verdadeiramente livres quando obedecemos a finalidade ou a lei que fomos criados, […] alcance-se a real liberdade, não agindo fora da lei, mas dentro dela”. A LIBERDADE E A RESPONSABILIDADE MORAL A relação que existe entre liberdade e responsabilidade moral é uma relação de complementaridade, em que estão ligados entre si. Sendo assim, pode-se questionar sobre os atos humanos, acerca de sua moralidade e sobre a responsabilidade do homem por seus atos. LECLERQ (1967, p. 376) afirma que: “[…] os atos só têm caráter moral na medida em que nele intervém a liberdade; e seu caráter moral diminui na proporção que diminui a intervenção do livre-arbítrio”. Logo, a moralidade dos atos consiste em fazer o uso da liberdade. Quando a liberdade é privada, não há responsabilidade moral. Portanto, o homem é responsável pelos atos que pratica com liberdade. VASQUEZ (1996, p. 91) complementa: … Atos propriamente morais são aqueles nos quais podemos atribuir ao agente uma responsabilidade não só pelo que se propôs a fazer, mas também pelos resultados ou consequências da sua ação. Mas o problema da responsabilidade moral está estreitamente relacionado, por sua vez com o de necessidade e liberdade humanas, pois somente admitindo que o agente tenha certa liberdade de opção e decisão é que se pode responsabilizá-lo pelos seus atos. Assim sendo, não se deve julgar determinado ato segundo uma regra sem antes analisar as condições que propiciaram certa ação. Se houve para o indivíduo possibilidade de opção, torna-se possível atribuir-lhe uma responsabilidade moral. Logo, pode-se levantar a seguinte indagação: quais as condições necessárias e suficientes para poder atribuir ao indivíduo uma responsabilidade moral pelos seus atos? VASQUEZ (1996, p. 92) evidencia duas condições fundamentais: “Que o sujeito não ignore nem as circunstâncias nem as consequências da sua ação, ou seja, que seu comportamento possua um caráter consciente. E que a causa de seus atos esteja nele próprio e não em outro agente que o force a agir de certa maneira, […], ou seja, que sua conduta seja livre”. Assim o conhecimento e a liberdade é que permitem legitimar a responsabilidade moral, caso contrário, se há falta de liberdade e conhecimento, o indivíduo não possui responsabilidade moral. Pois, quem não possui consciência para agir, não pode ser responsável pelos seus atos. É fundamental para que o indivíduo seja responsável por seus atos que ele não sofra nenhuma coação externa, isto é, que a ação praticada provenha de dentro da própria pessoa e não de fora. Pois quando o indivíduo encontra-se sob coação ou pressão, perde o controle de seus atos. O individuo é isento de responsabilidade moral quando não teve possibilidade de agir de outra maneira. A reflexão acerca da liberdade encontra-se inclusa no Projeto da Modernidade, onde os termos autonomia, emancipação e liberdade estão relacionados entre si, e também são bases de tais reflexões. Pensar a liberdade não é possível sem fazer alusão a esse Projeto, no qual os três termos distintos determinam o mesmo sentido, a maioridade do homem. A liberdade é um pressuposto básico para que o homem seja responsável por seus atos e suas escolhas. É dentro da Modernidade que o homem busca emancipar-se, ser autônomo e livre. O período moderno é chamado também de período antropocêntrico, onde o homem é capaz de fazer suas escolhas e praticar suas ações, e é dentro da Modernidade que lhe é oferecido a possibilidade de emancipar-se e ser autônomo, enfim, conquistar sua liberdade. CONCLUSÃO Portanto, evidencia-se que é livre aquele que é capaz de agir conforme as leis da razão, visto que o conhecimento se fundamenta no entendimento e na sensibilidade. A razão oferece princípios para a ação. A condição necessária para a liberdade é que as ações do homem sejam fenômenos, pois assim são consideradas efeitos da liberdade. A liberdade teórica é concebida como espontaneidade e a liberdade prática é compreendida como autonomia, que é o poder da vontade de ser lei para si mesma. O conceito prático da liberdade está ligado de forma intrínseca ao conceito de vontade. E a liberdade prática só existe na relação com a razão. A liberdade compreendida como autonomia da vontade mostra que todo ser racional tem que dar a si mesmo a própria lei, e obedecer a essa lei criada por ele mesmo. Por isso, não há liberdade de agir contra a lei, mas de agir conforme a lei criada pelos seres racionais. O agir é a faculdade existente nos entes racionais, pois esses são capazes de agir segundo leis e princípios, ao contrário do simples atuar das coisas. Na teoria kantiana, o agir moral baseia-se em dois princípios: “Que agir moralmente consiste em agir com base em regras universalizáveis, que qualquer outro ser racional possa adotar como suas; que devemos agir com base em regras universalizáveis pela simples razão de sermos racionais” (ALMEIDA, 1992, p. 94). A ação moral é válida quando é praticada com base no imperativo categórico: “Age de tal modo que a máxima da tua vontade possa valer sempre ao mesmo tempo como princípio de uma legislação universal” (KANT, 1997, p. 42). O agir moral consiste em cumprir a lei pela razão, pois a ação praticada por interesse ou por inclinação possui valor contingente e não moral. As leis morais devem valer para todos os seres racionais e é deles que deve-se deduzi-las. A ideia de liberdade está ligada inseparavelmente ao conceito de autonomia, e esse é o princípio da moralidade. A lei moral não existiria se não houvesse a liberdade. Logo é impossível pensar a lei moral separada da liberdade. Ser livre é ser capaz de obedecer a lei moral. A liberdade não é o direto de fazer o que se quer, mas é o direito de fazer o que se deve; agir por dever é ser livre. Então a liberdade não é a ausência de leis, mas é o agir conforme a lei. A moralidade dos atos humanos está em fazer o uso da liberdade. Quando não há liberdade para escolher e agir, não se pode atribuir valor moral à ação. Para que o ato possua valor moral o indivíduo não pode ser coagido, ou impulsionado a agir de determinada maneira, que não seja próprio dele. Portanto, agir racionalmente por dever e obedecer as leis é garantir a liberdade Referências bibliográficas ALMEIDA, G. Moralidade e racionalidade na teoria moral kantiana. Porto Alegre: UFRGS/ Goethe/ CBA, 1992, p. 94. DUTRA, D.V. Kant e Habermas: A reformulação discursiva da moral Kantiana. Porto Alegre: Edipurs, 2002, p. 11-107. KANT, I. Fundamentação da metafísica dos costumes. São Paulo. Abril Cultural, 1974. LECLERQ, J. As grandes linhas da filosofia moral. São Paulo: Herder. 1967, p. 370-380. SHENN, J. F. O problema da liberdade. Trad. Augusto de Melo Saraiva. 2. ed. Rio de Janeiro: Agir, 1947, p. 35- 38. VÁZQUEZ, A, S. Ética. 16. ed. Trad. João Dell’ Anna. Rio de janeiro: Civilização brasileira, 1996. p. 90-03.