o que é a vigilância sanitária de medicamentos

Propaganda
UFF/ INSTITUTO DE SAÚDE DA COMUNIDADE
DEPARTAMENTO DE SAÚDE E SOCIEDADE
O QUE É A VIGILÂNCIA SANITÁRIA DE MEDICAMENTOS
Jussara Calmon Reis de Souza Soares
Prof. Adjunta do MSS/MSC/CCM/UFF
Niterói, 2002
APRESENTAÇÃO
O campo da Vigilância Sanitária é ainda hoje pouco reconhecido no Brasil, não havendo
consenso ou clareza quanto ao seu conceito ou abrangência, embora desde 1999 tenha sido criada a
Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA – , trazendo importantes mudanças. A produção
acadêmica sobre a Vigilância Sanitária também deixa a desejar, quer seja em termos de estudos
teórico-conceituais, quer de estudos de avaliação da organização e resolutividade dos serviços,
restando uma grande lacuna para profissionais envolvidos com a formação de recursos humanos nessa
área.
Entre os obstáculos a uma ação eficaz e eficiente da Vigilância Sanitária, destaca-se a
deficiência na formação dos recursos humanos, principalmente à medida que a consolidação do SUS
avança na direção da descentralização e da municipalização das ações, aumentando a necessidade de
capacitação de pessoal para dar conta das demandas locais. Assim, faz-se urgente a elaboração de
textos didáticos para essa área.
Esta apostila foi inicialmente elaborada como texto de apoio ao módulo “Introdução à Vigilância
Sanitária”, do Curso Básico em Saneamento, Vigilâncias e Saúde Ambiental, realizado pelo
DFPSS/EPSJV em 1995 e vem sendo revista e atualizada desde então, a partir da sua utilização em
diversos cursos.
Trata apenas da Vigilância Sanitária de Medicamentos, que é uma das categorias de produtos
sob regime de controle sanitário; a área de vigilância de produtos é, por sua vez, uma das quatro
grandes áreas de abrangência da vigilância sanitária. As demais são a vigilância sanitária de serviços de
interesse à saúde, do meio ambiente e de processos de trabalho. Porém, esse é um tema de grande
relevância e interesse, devido ao uso extenso de medicamentos no país e no mundo e pela gravidade das
conseqüências que a ausência da ação da vigilância sobre eles pode acarretar.
Por favor, envie suas sugestões, comentários e críticas para que este material possa ser cada
vez mais aperfeiçoado. Obrigada!
Jussara Calmon Soares
e-mail: [email protected]
Nota: A Revista RADIS de abril/maio de 2002, Tema Vigilância Sanitária, complementa esta apostila,
oferecendo o contexto histórico, um panorama geral da área de Vigilância Sanitária como um todo e de
suas principais questões técnicas, administrativas, sociais, econômicas e políticas.
*****
2
INTRODUÇÃO
A Lei Orgânica de Saúde - que é na realidade o conjunto formado pelas Leis nº 8.080/90 e
nº 8.142/90 - regula, em todo o país, as ações e serviços de saúde. O Sistema Único de Saúde (SUS) é
definido como "o conjunto de ações e serviços de saúde, prestados por órgãos e instituições públicas
federais, estaduais e municipais, da administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo
Poder Público " (Lei nº 8.080/90, Art.4°).
É essa mesma Lei que define Vigilância Sanitária:
"um conjunto de ações capaz de eliminar, diminuir ou prevenir riscos à saúde e de
intervir nos problemas sanitários decorrentes do meio ambiente, da produção e
circulação de bens e da prestação de serviços de interesse da saúde, abrangendo:
I - o controle de bens de consumo que, direta ou indiretamente, se relacionem com a
saúde, compreendidas todas as etapas e processos, da produção ao consumo; e
II - o controle da prestação de serviços que se relacionam direta ou indiretamente
com a saúde. " (Art.6°, § 1°; grifo nosso)
Portanto, dentro do SUS, cabe à Vigilância Sanitária principalmente as funções de regulação e
controle, que são de responsabilidade exclusiva do Estado. O Código de Defesa do Consumidor (Lei nº
8.078/90) também traz importante suporte jurídico à atuação da vigilância sanitária.
Depois de quase uma década de SUS, em 1999 foi promulgada a Lei nº 9.782/99, em que se
definiu o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária e se criou a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, a
ANVISA.
O Sistema Nacional de Vigilância Sanitária compreende, então, o conjunto de ações definido pelo
§ 1º do art. 6º (citado acima) e pelos arts. 15 a 18 da Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990, executado
por instituições da Administração Pública direta e indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal e
dos Municípios, que exerçam atividades de regulação, normatização, controle e fiscalização na área de
vigilância sanitária.
No Art. 2º da Lei nº 9.782/99 são definidas as competências da União no âmbito do Sistema
Nacional de Vigilância Sanitária:
“I - definir a política nacional de vigilância sanitária;
II - definir o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária;
III - normatizar, controlar e fiscalizar produtos, substâncias e serviços de interesse para a saúde;
IV - exercer a vigilância sanitária de portos, aeroportos e fronteiras, podendo essa atribuição ser
supletivamente exercida pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios;
V - acompanhar e coordenar as ações estaduais, distrital e municipais de vigilância sanitária;
VI - prestar cooperação técnica e financeira aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios;
VII - atuar em circunstâncias especiais de risco à saúde; e
VIII - manter sistema de informações em vigilância sanitária, em cooperação com os Estados, o Distrito
Federal e os Municípios.”
O Capítulo II trata da criação e da competência da Agência Nacional de Vigilância Sanitária, uma
autarquia sob regime especial, vinculada ao Ministério da Saúde, com sede e foro no Distrito Federal,
prazo de duração indeterminado e atuação em todo território nacional, caracterizada pela independência
administrativa, estabilidade de seus dirigentes e autonomia financeira.
3
No Art. 6º define-se a sua finalidade institucional: “promover a proteção da saúde da população,
por intermédio do controle sanitário da produção e da comercialização de produtos e serviços submetidos
à vigilância sanitária, inclusive dos ambientes, dos processos, dos insumos e das tecnologias a eles
relacionados, bem como o controle de portos, aeroportos e de fronteiras.”
Para cumpri-la, a ANVISA deverá: coordenar o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária;
fomentar e realizar estudos e pesquisas no âmbito de suas atribuições; estabelecer normas, propor,
acompanhar e executar as políticas, as diretrizes e as ações de vigilância sanitária; estabelecer normas e
padrões sobre limites de contaminantes, resíduos tóxicos, desinfetantes, metais pesados e outros que
envolvam risco à saúde; autorizar o funcionamento de empresas de fabricação, distribuição e importação
dos produtos sob sua responsabilidade; conceder registros de produtos, conceder e cancelar o
certificado de cumprimento de boas práticas de fabricação; entre tantas outras atribuições.
Além disso, a Agência poderá delegar aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a
execução de algumas atribuições que lhe são próprias.
As atividades de vigilância epidemiológica e de controle de vetores relativas a portos, aeroportos
e fronteiras serão executadas pela Agência, sob orientação técnica e normativa do Ministério da Saúde.
Incumbe, ainda, à Agência, respeitada a legislação em vigor, regulamentar, controlar e fiscalizar
os produtos e serviços que envolvam risco à saúde pública:
I - medicamentos de uso humano, suas substâncias ativas e demais insumos, processos e tecnologias;
II - alimentos, inclusive bebidas, águas envasadas, seus insumos, suas embalagens, aditivos alimentares,
limites de contaminantes orgânicos, resíduos de agrotóxicos e de medicamentos veterinários;
III - cosméticos, produtos de higiene pessoal e perfumes;
IV - saneantes destinados à higienização, desinfecção ou desinfestação em ambientes domiciliares,
hospitalares e coletivos;
V - conjuntos, reagentes e insumos destinados a diagnóstico;
VI - equipamentos e materiais médico-hospitalares, odontológicos e hemoterápicos e de diagnóstico
laboratorial e por imagem;
VII - imunobiológicos e suas substâncias ativas, sangue e hemoderivados;
VIII - órgãos, tecidos humanos e veterinários para uso em transplantes ou reconstituições;
IX - radioisótopos para uso diagnóstico in vivo e radiofármacos e produtos radioativos utilizados em
diagnóstico e terapia;
X - cigarros, cigarrilhas, charutos e qualquer outro produto fumígero, derivado ou não do tabaco;
XI - quaisquer produtos que envolvam a possibilidade de risco à saúde, obtidos por engenharia genética,
por outro procedimento ou ainda submetidos a fontes de radiação.
Os serviços submetidos ao controle e fiscalização sanitária pela Agência são aqueles voltados
para a atenção ambulatorial, seja de rotina ou de emergência, os realizados em regime de internação, os
serviços de apoio diagnóstico e terapêutico, bem como aqueles que impliquem a incorporação de novas
tecnologias.
Mas há diversos conflitos relativos à concepção e operacionalização do Sistema Nacional de
Vigilância Sanitária, como mostra o Relatório Final da I Conferência Nacional de Vigilância Sanitária,
realizada em Brasília, de 26 a 30 de novembro de 2001. Estes, entretanto, não serão objeto de análise
aqui.
Portanto, como dito na Apresentação, a Vigilância Sanitária de Medicamentos - tema dessa
apostila - é apenas uma das categorias de produtos sob regime de controle sanitário; a área de
vigilância de produtos é, por sua vez, apenas uma das quatro grandes áreas de abrangência da vigilância
sanitária. Mas os medicamentos formam uma categoria muito importante, merecendo toda a nossa
atenção e interesse. É fundamental tornarmo-nos críticos e ativos em relação ao uso dos medicamentos
não apenas como profissionais do setor saúde mas, também, como consumidores e, principalmente,
cidadãos.
No site da ANVISA - www.anvisa.gov.br - pode-se acompanhar o que vem sendo proposto e
implementado pela Agência em todas as suas áreas de atuação. No site encontra-se também o Sistema
4
de Legislação em Vigilância Sanitária – Anvisalegis – com acesso rápido, atualizado e interativo às leis
que regulamentam essa área.
O QUE É O MEDICAMENTO
A Lei 5991/73, que dispõe sobre o controle sanitário do comércio de drogas, medicamentos,
insumos farmacêuticos e correlatos, em seu Art. 4° define medicamento como: produto farmacêutico,
tecnicamente obtido ou elaborado, com finalidade profilática, curativa, paliativa ou para fins de
diagnóstico.
Mas o medicamento é muito mais que um produto farmacêutico; ele deve ser compreendido
dentro do contexto histórico, socio-econômico e cultural no qual está inserido e que condiciona a sua
utilização.
Assim, nas economias de mercado - como é a nossa - o medicamento é também mercadoria, o
que traz uma série de implicações ao seu uso. Dentro do modelo de assistência à saúde excessivamente
medicalizado e mercantilizado que se desenvolveu no mundo ocidental moderno, os medicamentos
passaram a ocupar um espaço importante no processo saúde/doença, sendo praticamente impossível
pensar a prática médica ou a relação médico/paciente hoje, sem a presença desses produtos.
O uso “irracional” dos medicamentos no mundo, agravado nos países sub-desenvolvidos pelas
condições sócio-econômicas, pode ser mais bem compreendido pela análise da dimensão simbólica e
ideológica do medicamento. São as funções simbólicas, sociais e culturais atribuídas aos medicamentos
– talvez mais que suas funções farmacológicas - que os tornam tão populares, tanto entre leigos como
entre profissionais da saúde.
Por serem tão largamente consumidos, e considerando-se que o seu uso inadequado ou
incorreto pode acarretar até mesmo a morte - uma vez que estes produtos têm atividade
farmacológica, toxicidade e efeitos colaterais - é fundamental garantir a sua qualidade, eficácia e
segurança, dentro do contexto em que se inserem e na sua dimensão enquanto mercadoria simbólica.
Assim, do ponto de vista social e sanitário, a divulgação de informações sobre os medicamentos
- não apenas sobre conhecimentos farmacológicos mas, também, visando à desmistificação de suas
representações - tanto para os profissionais quanto para a população em geral, consumidora em
potencial, é tão importante quanto a garantia de sua segurança e eficácia, na oferta de produtos de
qualidade.
Do ponto de vista da vigilância epidemiológica, o medicamento é um ótimo indicador da situação
de saúde de uma população. Esta questão será detalhada no item sobre a Farmacovigilância, mais
adiante.
A CADEIA DE VIDA DOS MEDICAMENTOS
Além de trabalhar com uma conceito mais ampliado de medicamento, a Vigilância Sanitária de
Medicamentos deve exercer suas atividades de forma mais integradora, considerando todos os
aspectos qualitativos e quantitativos relacionados à oferta e ao consumo de medicamentos. Assim,
pode-se pensar no medicamento dentro de uma cadeia composta por diversos elos que se articulam e se
influenciam:
1
PESQUISA & DESENVOLVIMENTO (P&D)
2
PRÉ-REGISTRO
5
1
3
REGISTRO
4
FABRICAÇÃO
5
TRANSPORTE, ARMAZENAMENTO E DISTRIBUIÇÃO
6
PRESCRIÇÃO
7
DISPENSAÇÃO E COMERCIALIZAÇÃO
8
USO
P & D
O processo de desenvolvimento de um novo medicamento é muito longo - em média, 10 anos -,
complexo e caro. Em geral, entre milhares de moléculas estudadas, apenas uma apresenta potencial para
tornar-se um medicamento. Atualmente a engenharia genética e as possibilidades de modelagem por
computador estão trazendo grandes modificações a esse processo.
As patentes são uma forma de compensar os investimentos gastos com esta fase, sem qualquer
retorno financeiro até que o produto entre no mercado. Para isso são pagos os royalties aos fabricantes
que desenvolveram o produto original.
2
PRÉ-REGISTRO
Ao chegar à chamada Fase III dos experimentos científicos, em que são realizados os Ensaios
Clínicos Controlados (ECC) em seres humanos selecionados, o fabricante deve submeter o protocolo de
investigação à autoridade sanitária para análise e autorização da pesquisa clínica; os responsáveis pela
autorização são os técnicos da ANVISA. Portanto, a atuação da vigilância sanitária começa antes mesmo
de o medicamento existir como especialidade farmacêutica no mercado.
3
REGISTRO
A atividade do registro é a que fundamentalmente determina a oferta de medicamentos em um
país, uma vez que para serem comercializados, os produtos necessitam de registro dado pela agência
reguladora que, no Brasil é, desde 1999, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária, como visto acima.
Mesmo com o processo de descentralização das atividades de vigilância sanitária em curso, o
registro de medicamentos continua centralizado em Brasília, onde são feitas as análises dos processos,
autorizando sua produção e comercialização e, eventualmente, retirando-os do mercado.
A análise para a concessão, ou não, do registro de medicamentos deve ser feita por
profissionais especializados em farmacologia clínica, farmacodinâmica, tecnologia farmacêutica, etc.
Os profissionais da vigilância sanitária que atuam neste nível devem considerar, em primeiro
lugar, a relação benefício/risco: "um meio para expressar um julgamento referente ao papel de um
fármaco na prática médica, baseado em dados sobre a eficácia e a segurança, junto a considerações
sobre a doença na qual ele é empregado. Este conceito pode ser aplicado a um só fármaco ou na
comparação entre dois ou mais fármacos utilizados para a mesma indicação" (OMS, 1977).
Ou, em outras palavras, devemos considerar que todos os medicamentos podem trazer
benefícios , mas também trazem riscos à saúde. Seu uso só é aceitável se os benefícios forem maiores
que os riscos. Dependendo da situação, pode-se aceitar um maior risco; um exemplo é o uso de drogas
contra a dor para pacientes terminais; ou, ainda, medicamentos para uso em doenças fatais e incuráveis
como é o caso da AIDS.
6
Além disso, também são considerados critérios importantes para a concessão do registro de
um medicamento, em diversos países, o custo e a necessidade.
Vejamos cada um dos critérios:
1. eficácia - é a capacidade de um fármaco produzir os efeitos para os quais foi indicado, num
determinado número de pessoas. Está relacionada ao benefício que um medicamento pode trazer, porém
deve ser sempre relativizada pelos riscos que seu uso pode acarretar.
A avaliação da eficácia é feita através de estudos em seres humanos, nos chamados ensaios
clínicos controlados (ECC) ou estudos de fase III, que devem apresentar definição clara da população
estudada, ter grupo controle, ser "randomizados"1 e apresentar protocolo completo do ECC, com todos
os dados relevantes.
2. segurança - Está relacionada aos riscos que um medicamento tem potencialmente, uma vez
que não existe fármaco sem efeitos colaterais. Até mesmo os excipientes 2 e aditivos3 utilizados na
fabricação de medicamentos apresentam efeitos colaterais. O que é fundamental, aqui também, é
considerar a relação entre os benefícios e os riscos que um determinado produto apresenta.
Para a garantia da segurança, em termos sanitários, é fundamental que se faça uma atividade ainda praticamente inexistente no Brasil - a farmacovigilância pós-comercialização ou pós-registro4
que, como o nome diz, acompanha a história do medicamento após a sua entrada no mercado. É a Fase
IV dos estudos de medicamentos . É somente após o uso "normal" do medicamento, por populações
inteiras, que vão sendo conhecidos os efeitos colaterais de um determinado produto, uma vez que os
ensaios clínicos, por suas limitações, não podem detectar efeitos colaterais que ocorrem com uma baixa
frequência. Porém, em termos sanitários, um efeito colateral que ocorre, por exemplo, em 1 de cada 100
mil pessoas, é muito importante. Por isto é que pode-se esperar que os medicamentos que estão sendo
comercializados há mais tempo apresentem, de um modo geral, uma lista maior de efeitos colaterais e
reações adversas.
Um outro fator importante em relação à avaliação da segurança é o de se ter dados produzidos
no próprio país em que se quer registrar um medicamento, pois dados de outro país não são totalmente
aplicáveis ao nosso, por serem as condições sociais, econômicas, culturais e ambientais muito diversas,
afetando os resultados.
3. custo - este critério já vem sendo utilizado em diversos países, mas no Brasil, apesar de ser
um aspecto importante , não é considerado quando da concessão do registro. O custo não é só um
problema econômico, mas também sanitário, porque os recursos são limitados e são utilizados nas
prioridades estabelecidas. Assim, o custo de um tratamento medicamentoso deve ser avaliado em
relação aos benefícios que serão alcançados, e não de forma isolada: só se pode admitir um custo alto
Ensaio clínico randomizado ou aleatório: experimento em que pessoas são alocadas ao acaso para um grupo que
recebe um tratamento ou intervenção ou , alternativamente, para um grupo controle.
1
2
excipiente ou veículo: substância sólida ou líquida, inerte, que se junta aos medicamentos para dar consistência ou
dissolver. Exemplos: água, glicerina, álcool, etc
3
aditivos. Juntamente com os fármacos (princípios ativos) vão ser a especialidade farmacêutica. Os aditivos podem
ser , de acordo com a sua função, adjuvantes, aglutinantes, tampões, corantes, aromatizantes, lubrificantes,
conservantes, etc.
4
A Farmacovigilância busca informações mais precisas sobre as características terapêuticas ou toxicológicas de um
determinado medicamento, em todas as condições em que é usado. Um Sistema de Farmacovigilância tem como
objetivo detectar precocemente reações adversas (R.A.), medir os riscos e identificar os grupos populacionais mais
suscetíveis às R.A. A partir de 1970 a OMS vem estimulando a implantação de Programas de Notificação Espontânea
de R.A. integrados ao Sistema Internacional de Farmacovigilância.
7
para um medicamento que tenha eficácia e segurança que realmente o compensem (relação
benefício/custo positiva). Desperdícios de recursos com produtos de alto custo e baixo benefício vão
certamente afetar o quadro sanitário.
4. necessidade - se o objetivo é alcançar o uso correto e racional de medicamentos, além de
exigir a comprovação da sua eficácia, com uma segurança aceitável e a um custo razoável, deve-se
pensar em limitar o registro aos produtos que sejam necessários para o atendimento das demandas de
saúde da população num dado momento. Dados sobre morbidade são, portanto, fundamentais para a
avaliação da necessidade.
Este é um critério já utilizado pelos países nórdicos, que têm um ótimo sistema de vigilância
sanitária de medicamentos e de farmacovigilância. No Brasil, porém, onde a falta de recursos
financeiros, materiais e humanos é bem mais grave, não há até o momento qualquer preocupação com a
necessidade, quando da concessão do registro de um medicamento.
Além da limitação da oferta pelos critérios adotados para o registro, essa pode ter outras
normas legais de limitação como, por exemplo, a limitação de prescrição pela classificação dos
medicamentos em venda livre, venda sob prescrição, venda com retenção de receita, etc.
Também podem ser feitas normas de limitação de dispensação e uso, como a restrição de
medicamentos ao uso hospitalar, entre outras.
Quanto maior a oferta de medicamentos, mais difícil é o seu controle e o seu uso correto: um
grande número de medicamentos registrados piora a cadeia terapêutica e o nível sanitário de um país,
pois aumenta a confusão no registro, dificulta o controle da fabricação, da distribuição, da prescrição,
dispensação e uso, inviabiliza o conhecimento adequado sobre os produtos, dificulta o estabelecimento
de prioridades de trabalho, etc.
Por isto é importante haver uma oferta racional. O momento do registro é o primeiro momento
para esta seleção da oferta. Quando há excesso de produtos registrados e/ou de qualidade duvidosa,
como no caso do Brasil, o saneamento do mercado farmacêutico deveria ser uma prioridade dentro de
uma política de assistência farmacêutica e de medicamentos para o país.
4
FABRICAÇÃO
A Vigilância Sanitária também tem atuação no processo de fabricação de medicamentos. Em
primeiro lugar, é a ANVISA quem dá a necessária autorização para o funcionamento das empresas do
setor, sejam elas produtoras, distribuidoras, importadoras, exportadoras e/ou transportadoras de
medicamentos.
É o nível estadual ou municipal que deve fazer a inspeção farmacêutica para avaliar se a
empresa tem condições de se instalar para as atividades a que se propõe. A autoridade estadual dá a
licença e a ANVISA homologa a decisão local, concedendo a autorização de funcionamento.
Estima-se a existência de cerca de 600 laboratórios produtores de medicamentos autorizados
no país, sendo menos de 20 os laboratórios oficiais, estatais.
Uma vez dada a autorização pela Agência, a empresa pode começar a fabricar seus produtos,
que já devem estar previamente registrados, como vimos.
A partir daí, a inspeção farmacêutica deveria ocorrer de tempos em tempos, de forma
rotineira, para verificar se as boas práticas de fabricação ("GMP", do inglês, Good Manufacturing
Practices) estão sendo seguidas, se o controle de qualidade está sendo feito adequadamente.
8
"Controle Farmacêutico de Qualidade - conjunto de medidas destinadas a garantir, a qualquer
momento, durante o processo de fabricação, a produção de lotes de medicamentos, tendo em vista o
atendimento das normas sobre atividade, pureza, teor, eficácia e inocuidade."
A preocupação com o controle da qualidade (CQ) dos produtos começou nas próprias indústrias
fabricantes, para evitar ou diminuir as perdas que traziam enormes prejuízos econômicos. O conceito foi
evoluindo com as mudanças nas necessidades e demandas dos consumidores para a exigência de sistemas
de qualidade voltados para a garantia da saúde do consumidor.
Do ponto de vista da VISA, o CQ é o controle mínimo necessário para garantir a qualidade e a
segurança de um produto. O CQ deve atender aos limites de aceitação estabelecidos para se considerar
um determinado produto com qualidade satisfatória.
Os fabricantes dos produtos são legalmente responsáveis pela garantia da qualidade dos mesmos.
Cabe à ANVISA verificar se os produtores estão fazendo o CQ adequadamente.
Entre as estratégias de avaliação inclui-se a inspeção sanitária. Além de se estabelecer um
programa rotineiro de inspeções farmacêuticas, deve-se considerar a necessidade de eventuais inspeções
a partir da apuração de alguma denúncia contra um determinado produto de uma empresa, da constatação
de fraudes ou de qualquer outro problema que possa ter se originado durante o processo de fabricação.
Para esta intervenção nas empresas, os profissionais de vigilância sanitária devem conhecer
tanto de tecnologia farmacêutica, como de legislação sanitária: basicamente a Lei nº 6.360/76 e o
Decreto nº 79.094/77 (que a regulamenta), a Lei nº 6.437/77, além das normas de GMP. Também é
importante conhecer o Código de Defesa do Consumidor, além de Portarias e demais atos relacionados à
questão.
Para atividades de inspeção farmacêutica seria fundamental, ainda, contar com o apoio de um
laboratório oficial de controle de qualidade para proceder às análises laboratoriais necessárias. O
INCQS/FIOCRUZ é o laboratório de referência nacional do Ministério da Saúde e está capacitado para
fazer o CQ de todos os produtos sob vigilância sanitária; o que se tem defendido é o estabelecimento
de uma rede de laboratórios com os LACENs (Laboratório Central de Saúde Pública). O laboratório
oficial de referência da rede pública no Estado do Rio de Janeiro é o Laboratório Noel Nutels.
5
TRANSPORTE, ARMAZENAMENTO E DISTRIBUIÇÃO
No momento do registro, a ANVISA já influencia na distribuição futura dos medicamentos,
uma vez que é o MS quem decide, em última análise, se os produtos poderão ser distribuídos livremente
ou a quais tipos de restrição estarão sujeitos, como por exemplo, o caso de medicamentos restritos ao
uso hospitalar.
A classificação dos medicamentos quanto à venda e prescrição, em venda livre, venda sob
prescrição médica (tarja vermelha), tarja vermelha com retenção de receita e tarja preta, para os
medicamentos controlados por causarem dependência física ou psíquica também tem influência na
distribuição dos produtos e deve estar sendo avaliada.
Além disso, a distribuição de amostra grátis e a divulgação de outras formas de propaganda de
medicamentos são regulamentadas pela vigilância sanitária. A Resoluação da Diretoria Colegiada da
ANVISA - RDC nº 102 de 2000, republicada no DOU de 01/06/2001 – é a mais nova legislação em vigor.
Aprova o regulamento sobre propagandas, mensagens publicitárias e promocionais, além de outras
práticas cujo objeto seja a divulgação, promoção ou comercialização de medicamentos de produção
nacional ou importados, quaisquer que sejam as formas e meios de sua veiculação. Todas essas normas
são necessárias para garantir o acesso dos usuários a medicamentos e a informações de qualidade.
9
Cabe, então, aos fiscais da vigilância verificar o cumprimento da legislação sanitária e, quando
for o caso, aplicar as penalidades previstas em lei. Essas atividades ocorrem basicamente através da
inspeção de farmácias e serviços de saúde, quando se busca avaliar se os medicamentos estão sendo
corretamente distribuídos, em que condições estão sendo transportados e armazenados, etc. Já a
vigilância em relação à publicidade deve ser feita também nos meios de comunicação de massa.
Além da legislação sanitária já citada, incluindo as Portarias que normatizam as restrições de
distribuição e venda (Port. de medicamentos de venda livre, Portaria SVS-MS 344/98 que regulamenta
substâncias e medicamentos sujeitos a controle especial, reeditada em fevereiro de 1999, entre
outras), a Lei nº 5.991/73 é suporte essencial para as ações sobre a prática de comercialização,
juntamente com as demais regulamentações que vêm se seguindo.
6
PRESCRIÇÃO
Legalmente, as questões éticas relacionadas à prescrição são regulamentadas pelo Conselho
Federal de Medicina e respectivos Conselhos Regionais. Mas a vigilância sanitária também tem
responsabilidade no controle da prescrição, uma vez que esta afeta o consumo dos medicamentos.
Assim, é a ANVISA que normatiza, por exemplo, as condições de venda (venda livre, venda sob
prescrição médica,etc.), o preenchimento da prescrição (recentemente a Lei dos Genéricos introduziu
novas exigências neste sentido); mas, na verdade, apesar do reconhecimento da importância da
qualidade da prescrição para o uso racional de medicamentos, não tem havido qualquer atividade de
maior impacto neste elo da cadeia.
7
DISPENSAÇÃO E COMERCIALIZAÇÃO
A dispensação é a atividade de fornecimento e orientação quanto ao uso adequado de
medicamentos, correlatos e insumos. Deve ser realizada por farmacêuticos, segundo a legislação
vigente, podendo ser feita por outros profissionais apenas em casos excepcionais. Mas, na realidade, a
dispensação vem sendo feita no Brasil sem qualquer qualidade e controle. É fato bastante conhecido que
os farmacêuticos não estão nas farmácias e hospitais privados, que estão ausentes em muitos serviços
públicos de saúde, ficando a dispensação nas mãos de funcionários totalmente despreparados para tal
função, que é fundamental para o uso correto dos medicamentos.
O que se vê, fundamentalmente, é a chamada "empurroterapia", uma vez que o medicamento foi
reduzido à categoria de uma mercadoria como outra qualquer.
A vigilância sanitária, junto com os conselhos de classe - Conselhos Regionais de Farmácia
(CRFs) - tem um enorme campo de atuação aqui, que hoje está muito aquém do que deveria ser.
Minimamente, no momento da dispensação devem ser avaliados o estado de conservação dos
medicamentos, as embalagens, adequação da rotulagem, qualidade da informação veiculada. Em outras
palavras, é necessário verificar se o produto está devidamente registrado, se constam os nomes do
fabricante e do técnico responsável, se está dentro do prazo de validade, se apresenta algum sinal de
deterioração ou adulteração, se está armazenado em embalagens e em condições de luz, temperatura e
umidade adequadas, etc.
8
USO
Este é o último elo da cadeia, mas não o menos importante. Ao contrário, toda a cadeia
terapêutica é realizada com o objetivo final do consumo do medicamento pelo usuário, seja para o
fabricante - que visa à venda e ao lucro - seja para os profissionais de saúde que, na busca da garantia
10
da saúde da população, podem eventualmente necessitar desta ferramenta (o medicamento), seja, ainda,
para o usuário que tem o direito ao acesso ao medicamento, quando este for necessário para a
prevenção, recuperação, ou cura de uma doença, ou mesmo no alívio de sintomas.
É bom lembrar, principalmente em sociedades medicalizadas e mercantilizadas como a nossa,
que o uso do medicamento nem sempre é o tratamento mais adequado; em diversas situações, há várias
alternativas terapêuticas não medicamentosas, como exercícios, relaxamento, fisioterapia, acupuntura,
alimentação, etc, que são muitas vezes menosprezadas em função da imagem hipervalorizada que é
vendida sobre o medicamento, a de que pode curar todos os males, inclusive os devidos às péssimas
condições de vida decorrentes do modelo de desenvolvimento dominante.
Dentro de uma política de saúde que privilegie a promoção da saúde, a prevenção de doenças e
a vigilância em saúde, poderíamos esperar um consumo bem menor de medicamentos, à exceção talvez
de vacinas e outros produtos de uso preventivo.
Atividades importantes de vigilância sanitária que podem influenciar o uso de medicamentos,
além de todas as que interferem nos elos anteriores, são aquelas ligadas principalmente à educação, à
orientação dos consumidores e profissionais, à divulgação de informações sobre todas as alternativas
terapêuticas, além do controle das informações divulgadas, quer sejam explicitamente através de
propaganda, quer sejam de forma mais sutil através de bulas, de profissionais de saúde mal informados
ou não capacitados, etc.
Aqui também há um campo extenso de ação para profissionais de vigilância sanitária, ainda
incipiente no Brasil, que é o da farmacoepidemiologia ou Estudos de Utilização de Medicamentos (EUM).
Na verdade, sabe-se muito pouco sobre o uso de medicamentos no Brasil, quase não há dados acerca
desta questão. A indústria farmacêutica tem tido uma preocupação muito maior com o consumo, por
seus interesses mercadológicos, do que o Estado. Apenas recentemente, em 1998, foi aprovada uma
política de medicamentos para o país, através da Portaria nº 3.916/98 (ver Soares, 2002).
Para os estudos de utilização de medicamentos é essencial a atuação integrada com a
epidemiologia, com os métodos epidemiológicos, tanto para o conhecimento dos dados de morbidade,
das causas de mortalidade e de outros indicadores do nível sanitário de uma população, quanto para os
dados especificamente relacionados ao uso de medicamentos.
A FISCALIZAÇÃO SANITÁRIA DE MEDICAMENTOS
A fiscalização é considerada por muitos a atividade principal e mais importante de Vigilância
Sanitária, por ser a base da relação entre o produtor e o consumidor, sendo o Poder Público o
intermediário na aferição da qualidade dos produtos e serviços prestados. O Poder Público - a União, o
Distrito Federal, os Estados e Municípios - tem obrigação legal de, em nome do cidadão, não apenas
regulamentar a oferta de produtos mas, também, de exercer a fiscalização e rejeitar produtos que
possam trazer danos à sua saúde.
Porém, a fiscalização assume um peso maior nestas ações de Vigilância Sanitária em países
como o Brasil, fundamentalmente porque a consciência dos direitos de cidadania é ainda incipiente entre
nós, permitindo que distorções absurdas venham ocorrendo impunemente.
O profissional de vigilância sanitária tem poder de polícia administrativa para atuar na
fiscalização e, para exercê-lo, conta com a legislação sanitária. A Lei nº 6.437/77 configura as
infrações à legislação sanitária federal e estabelece as sanções que devem ser aplicadas pela
autoridade sanitária.
“Infração sanitária - ação ou omissão que resulte da inobservância dos preceitos da legislação
em vigor.”
11
As infrações classificam-se em leves, graves e gravíssimas, e podem ser punidas com as
penalidades de: advertência, multa, apreensão de produto, inutilização de produto, interdição de
produto, suspensão de vendas e/ou fabricação de produto, cancelamento de registro de produto,
interdição parcial ou total do estabelecimento, proibição de propaganda, cancelamento de autorização
para funcionamento de empresa e cancelamento do alvará de licenciamento do estabelecimento (Art.
2º).
Quando uma irregularidade é constatada pela autoridade sanitária, esta deve lavrar o auto de
infração sanitária (A.I.S.), que é a peça inicial do processo administrativo instaurado para apurar as
infrações. O AIS pode ser lavrado no local da infração, ou na sede da repartição competente, pela
autoridade sanitária que a houver constatado.
Caso haja diligência (exigência) a ser cumprida, o prazo é de 30 dias após a notificação, que
pode ser alterado por motivos de interesse público, através de despacho fundamentado.
Quando houver suspeita de alteração ou fraude, o fiscal sanitário deve interditar o estoque do
produto existente no local e lavrar o Auto de Interdição (A.I.), que é assinado pela autoridade, o
representante legal da empresa e o detentor do produto, ou seu substituto legal. Na ausência destes,
duas testemunhas devem assinar.
A interdição do produto e do estabelecimento como medida cautelar terá a duração necessária
para a realização dos testes e análises, não podendo exceder o prazo de 90 dias, findo o qual se dará a
liberação automática do produto ou estabelecimento.
O infrator tem direito à defesa. Em caso de discordância com o resultado da análise fiscal
condenatória, o infrator pode requerer perícia de contraprova.
perícia de contraprova - é cabível quando a empresa responsável pelo produto condenado
discordar do laudo da análise fiscal.
A perícia deve ser realizada no laboratório oficial que expedir o laudo condenatório, com a
presença de 3 peritos: aquele que efetuou a análise fiscal, o indicado pela empresa e o indicado pelo
órgão fiscalizador.
Não havendo contestação do laudo e nos casos de adulteração ou deterioração flagrantes, o
produto deve ser imediatamente inutilizado.
No caso de análise de controle, um laudo condenatório implica no cancelamento do registro do
produto e na sua apreensão e inutilização em todo o território nacional; estas medidas são de
responsabilidade do MS e somente podem ser efetivadas após a publicação da decisão condenatória
irreversível no D.O.U.
É dever do fabricante, garantir a oferta de produtos com qualidade comprovada. É dever do
Estado controlar e fiscalizar esta oferta. Assim, é função do trabalhador de vigilância sanitária
desenvolver também atividades educativas que visem fortalecer esta consciência da população dos seus
direitos e deveres enquanto cidadãos e consumidores em relação à garantia da sua saúde, para que
estes possam também atuar na fiscalização e na cobrança do papel do Estado, dos fabricantes e dos
próprios consumidores. No Brasil, são os movimentos de defesa do consumidor que vêm assumindo com
destaque, nos últimos anos, este papel. O ideal é ter toda a população vigilante. O Código de Defesa do
Consumidor (Lei nº 8.078/90) é uma arma fundamental para essa atuação.
EPIDEMIOLOGIA DOS MEDICAMENTOS E FARMACOVIGILÂNCIA
A Farmacoepidemiologia é, como o nome indica, uma aplicação da Epidemiologia ao estudo dos
medicamentos. Estuda os determinantes e as conseqüências do consumo de medicamentos, através dos
12
procedimentos normais de Epidemiologia. Este termo surgiu há menos de 20 anos; anteriormente eram
chamados de estudos de utilização de medicamentos (EUM).
Alguns autores vêem a Farmacoepidemiologia e a Farmacovigilância como duas faces
complementares de uma atividade geral, a da vigilância da vida de um medicamento numa comunidade,
que é descrita através de técnicas adequadas, padronizadas e comparáveis.
Como exemplos de estudos farmacoepidemiológicos, podem ser citados:
1)
Estudos sobre a oferta de medicamentos;
2)
Estudos Quantitativos de Consumo;
3)
Estudos sobre a Qualidade do Consumo;
4)
Estudos de hábitos de prescrição médica;
5)
Estudos de cumprimento da prescrição;
6)
Vigilância orientada para problemas.
Já a Farmacovigilância busca identificar e avaliar os efeitos do uso, agudo e crônico, dos
tratamentos farmacológicos no conjunto da população ou em subgrupos de pacientes expostos a
tratamentos específicos (Tognoni & Laporte,1989). Originalmente era um conjunto de atividades que
pretendia estudar tanto os efeitos indesejáveis dos medicamentos, quanto os desejáveis. Mas como os
ECC dão uma idéia bem clara da eficácia de um novo produto em indicações precisas, os estudos de
farmacovigilância (ou estudos de fase IV) tendem mais a centrar seus objetivos nos efeitos
indesejáveis dos medicamentos.
Assim, a Farmacovigilância pós-comercialização passou a ser definida como: “Procedimento
posto em andamento após a autorização do registro de um novo medicamento, desenhado para procurar
informações sobre o uso real do medicamento para uma determinada indicação, assim como sobre o
aparecimento de efeitos indesejáveis. Método para o estudo epidemiológico das reações adversas aos
medicamentos” (Last, 1989)
A iatrogenia é fenômeno conhecido e considerado há muito tempo. Diz-se que as R.A.5
produzidas por medicamentos são tão antigas quanto a sua própria história. Qualquer produto com
atividade farmacológica pode potencialmente atuar como remédio ou como veneno. A rápida introdução
de fármacos potentes na quimioterapia moderna a partir dos anos 40, que indubitavelmente trouxe
muitos benefícios, trouxe também um número crescente de reações adversas aos medicamentos. Mas
foi apenas após quase 50 anos de uso que se descobriu que a dipirona podia causar agranulocitose;
somente quase 40 anos depois da introdução do AAS se descobriu que podia causar hemorragia
gastrintestinal... Foram tragédias como as do dietilenoglicol nos EUA, nos anos 30 e a da talidomida na
Europa, em 1961, que fizeram com que os países mudassem suas regulamentações acerca dos
medicamentos passando a exigir a comprovação da segurança e da eficácia, com maior rigor.
Nas resoluções adotadas pela Assembléia Mundial da Saúde em 1962 e 1963 também foi
apontada a necessidade de um programa para a promoção da segurança e da eficácia dos medicamentos.
Após uma série de reuniões e recomendações aos países-membros para estabelecimento de programas
de R.A., um grupo de 10 países começou em 1968 um programa-piloto de intercâmbio da informação
obtida nos seus sistemas nacionais de farmacovigilância. A partir de 70, o Sistema Internacional de
Farmacovigilância da OMS vem impulsionando o estabelecimento de Programas de Notificação
Espontânea de R.A. em diversos países, integrados ao Sistema Internacional de Farmacovigilância.
5
Reação adversa (R.A.) é “qualquer efeito prejudicial ou indesejável que se apresente após a administração das doses
normalmente utilizadas no homem para a profilaxia, o diagnóstico e o tratamento de uma enfermidade” (OMS Technical Report Series # 498, Genebra, 1972). R.A., efeito indesejável e doença iatrogênica são equivalentes.
13
Um Sistema de Farmacovigilância tem como objetivos detectar precocemente reações
adversas (R.A.), medir os riscos e identificar os grupos populacionais mais suscetíveis às R.A.
Como exemplos de estratégias e métodos utilizados em Farmacovigilância podemos citar:
a)
Estudos para avaliar e quantificar a eficácia de um tratamento sobre a cura ou prevenção de uma
doença;
b)
Análises das estatísticas vitais para avaliação de efeitos indesejáveis agudos e subagudos
relacionados com administração de um medicamento;
c)
Monitorização intensiva de pacientes hospitalizados;
d)
Notificação voluntária de R.A.
*****
BIBLIOGRAFIA:
ARNAU, J.M. & LAPORTE, J.R. Promoção do Uso Racional de Medicamentos e Preparação de Guias
Farmacológicos. In: LAPORTE, J.R. et al. Epidemiologia do Medicamento: princípios gerais. São
Paulo-Rio de Janeiro: HUCITEC-ABRASCO, 1989. p. 57-74.
BIRIELL, C. & OLSSON, S. O Programa de Farmacovigilância da OMS. In: LAPORTE, J.R. et al.
Epidemiologia do Medicamento: princípios gerais.São Paulo-Rio de Janeiro: HUCITEC-ABRASCO,
1989. p. 153-176.
BRASIL. Lei nº 5.991 de 17 de dezembro de 1973 e Decreto 74.170 de 10 de junho de 1974, com a
redação dada pelo Decreto 793 de 05 de abril de 1993. Dispõe sobre o controle sanitário do comércio
de medicamentos, insumos farmacêuticos e correlatos, e dá outras providências.
BRASIL. Lei nº 6.360 de 23 de setembro de 1976 e Decreto 79.094 de 05 de janeiro de 1977, com a
redação dada pelo Decreto 793 de 05 de abril de 1993. Dispõe sobre a vigilância sanitária a que ficam
sujeitos os medicamentos, as drogas, os insumos farmacêuticos e correlatos, cosméticos, saneantes e
outros produtos, e dá outras providências.
BRASIL. Lei nº 8.080/90 - Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde,
a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências.
BRASIL. Lei nº 8.142/90 - Dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do SUS e sobre as
transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área da saúde e dá outras
providências.
BRASIL - Lei nº 8.666/93 – Regulamenta o art. 37,XXI, da Constituição Federal, institui normas para
licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências.
BRASIL - Lei nº 9.787/99. “Lei dos Genéricos.”
BRASIL - Lei nº 9.782/99. Define o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária, cria a Agência Nacional de
Vigilância Sanitária, e dá outras providências.
BRASIL/ MS/ SNAS. ABC do SUS: doutrinas e princípios. Brasília, 1990
BRASIL. ANVISA. RDC nº 102, de 30 de novembro de 2000, republicada no DOU de 01/06/2001. Aprova
o Regulamento sobre propagandas, mensagens publicitárias e promocionais e outras práticas cujo
objeto seja a divulgação, promoção ou comercialização de medicamentos de produção nacional ou
importados...
14
CARVALHO,G.I. & SANTOS,L. SUS. Comentários à Lei Orgânica da Saúde (Lei 8080/90 e Lei 8142/90).
São Paulo: HUCITEC, 1992.
CONFERÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA. Relatório Final da I Conferência. Brasília:
ANVISA, 2001.
DIAS, H.P. A responsabilidade pela saúde: aspectos jurídicos. Rio de Janeiro: FIOCRUZ, 1995.
FOLLADOR, W. Farmacoepidemiologia: uma ciência aplicada. Infarma 1(3) : 5, 1992.
LAPORTE, J.R. et al. Epidemiologia do Medicamento: princípios gerais. São Paulo-Rio de Janeiro:
HUCITEC-ABRASCO, 1989.
MELLO, A.L. et al. Vigilância Sanitária de Medicamentos e Correlatos. Rio de Janeiro: Qualitymark
Editora, 1994.
MS/SNVS/DIMED Boas práticas de fabricação de produtos farmacêuticos. Centro de Documentação
do Ministério da Saúde, Brasília, 1983.
OMS - Selección de medicamentos esenciales. Serie de Informes Técnicos # 615, Genebra, 1977.
OMS - Pautas para establecer políticas farmacéuticas nacionales. Genebra, 1988.
OMS - Uso racional: una prioridad general. Boletín de Medicamentos Esenciales 7, 1988.
Portaria nº 344 traz novas regras para psicotrópicos e entorpecentes. Pharmacia Brasileira 12: 12-15,
jan.-fev. 1999
SIMÕES, M.J.S. - A importância dos sistemas de farmacovigilância. Infarma 2(5): 14, 1993.
SOARES, J.C.R.S. As políticas de medicamentos e de assistência farmacêutica para o SUS. UFF,
Niterói, 2002. (Mimeo)
Vigilância Sanitária - Coletânea de Atos em Vigor Pertinentes à Atual Legislação Sanitária. Volumes I a
VIII. São Paulo: Andrei Editora, 1980.
Vigilância Sanitária. RADIS Tema, nº 23, abr/mai 2002.
www.anvisa.gov.br
www.saude.gov.br
www.sobravime.org.br
15
Download