FAJARDO, Maíra Costa Val. Controle dos atos administrativos

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Controle dos Atos Administrativos Discricionários
Autor:Maíra Costa Val Fajardo
Texto extraído do Boletim Jurídico - ISSN 1807-9008
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RESUMO
A atuação da Administração Pública está adstrita à fiel execução das leis.
Ocorre que existem atos administrativos completamente vinculados ao texto
legal e atos discricionários, para a prática dos quais a Administração possui
uma margem de liberdade, diante das peculiaridades de cada caso concreto.
Nestes casos, cabe ao administrador um juízo de valor, devendo analisar
critérios de conveniência e oportunidade. Tratando-se de atos administrativos
discricionários que o risco de lesões a direitos e garantias individuais aumenta,
de que o administrador ultrapasse os limites da liberdade que a lei lhe confere,
praticando atos arbitrários e ilegais. Conclui-se que a motivação, isto é, a
exposição dos motivos determinantes do ato, é indispensável, seja nos atos
vinculados ou nos discricionários, como forma de prestação de contas do
agente público ao povo, titular do poder, permitindo que este fiscalize a
atuação de seu representante. A motivação permite à sociedade exercer
fiscalização e ainda possibilita o controle jurisdicional. Não se defende ao
Judiciário um controle ilimitado, usurpatório. Não cabe ao Poder Judiciário
substituir o administrador, mas verificar se este atuou em conformidade com o
ordenamento jurídico.
PALAVRAS-CHAVE
Ato administrativo, discricionariedade, controle.
INTRODUÇÃO
O poder estatal, embora uno, indivisível e indelegável, se desmembra em três
funções, quais sejam, a legislativa, a judiciária e a administrativa.
À Administração Pública cumpre precipuamente administrar, aplicando a lei
de ofício para realizar as finalidades públicas. Para tanto, é necessária a
prática constante de atos administrativos, que são manifestações unilaterais
de vontade da Administração ou de quem a represente que tenha por fim
adquirir, transferir, modificar ou extinguir direitos e obrigações.
Na realização de suas funções, a Administração Pública possuiu
prerrogativas, poderes, que, em nome do interesse público, a colocam em
posição de superioridade em relação aos particulares.
Em virtude das prerrogativas da Administração Pública, seus atos possuem
atributos como a presunção de legitimidade, a imperatividade e a
auto-executoriedade, tudo a possibilitar sua validade, obrigatoriedade e
execução de forma célere, não se fazendo necessário acionar o Poder
Judiciário anteriormente à sua aplicação.
Embora a atuação da Administração Pública esteja adstrita à fiel execução
das leis, em obediência ao princípio da legalidade, é necessário ressaltar que
existem atos administrativos completamente vinculados ao texto legal e, por
outro lado, atos discricionários, para a prática dos quais a Administração
possui uma margem de liberdade.
Ante a impossibilidade de a lei prever, exaustivamente, todas as situações
vivenciadas na prática administrativa, alguns comandos normativos conferem
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ao agente público uma certa margem de liberdade para a prática do ato,
diante das peculiaridades de cada caso concreto. Nestes casos, cabe ao
administrador um juízo de valor, devendo analisar critérios de conveniência e
oportunidade, possuindo, assim, maior subjetividade.
Maria Sylvia Zanella Di Pietro assim conceitua a discricionariedade:
“pode-se, portanto, definir a discricionariedade administrativa
como a faculdade que a lei confere à Administração para
apreciar no caso concreto, segundo critérios de oportunidade e
conveniência, e escolher uma dentre duas ou mais soluções,
todas válidas perante o direito.”[1]
Diante de atos administrativos discricionários o risco de lesões a direitos e
garantias individuais aumenta, eis que há uma margem maior de
possibilidades de atuação O ato praticado sem respeito a limites é arbitrário e
ilegal.
Ressalta-se que a Administração Pública ao desempenhar suas funções,
exerce atividade em nome de terceiros, representando os interesses da
coletividade. Por isso, a sua atuação é limitada por lei e por princípios e deve
ser externada de forma a permitir fiscalização, seja pela sociedade ou pelo
Poder Judiciário.
No Direito Administrativo, por tratar-se de ramo não codificado, os princípios
desempenham relevante papel. Nesse contexto, cabe destacar alguns
princípios limitadores da atuação da Administração.
O princípio da legalidade determina a submissão administrativa às exigências
normativas, de maneira que o Poder Público possa agir somente nos casos em
que a lei permite e de modo a cumprir o que nele encontra-se estabelecido.
Ademais, pelo princípio da supremacia do interesse público, a finalidade a ser
alcançada pela Administração Pública encontra-se delimitada não somente
pela lei, mas também pela necessidade de se obter a satisfação dos interesses
da coletividade. Assim, toda a sua atuação deve pautar-se pela busca do
atendimento às necessidades coletivas.
Por outro lado, conforme consignado no parágrafo único do art. 1º da
Constituição Federal, “todo poder emana do povo”, razão pela qual influi-se
que o poder-dever outorgado a seus representantes nada mais é do que um
instrumento entregue à Administração para que esta atue em função do
administrado. Como consequência lógica, surge a obrigatoriedade de
prestação de contas permanente pelo administrador de seus atos ao titular do
poder.
Assim, depreende-se que a motivação, isto é, a exposição dos motivos
determinantes do ato, é indispensável, seja nos atos vinculados ou nos
discricionários, como forma de prestação de contas do agente público ao
povo, titular do poder, permitindo que este fiscalize a atuação de seu
representante. Dessa forma, torna-se possível aferir a legalidade dos atos
administrativos, bem como controlar sua legitimidade, a partir da análise da
congruência do suporte fático e jurídico com a finalidade da norma.
A motivação permite à sociedade exercer fiscalização e possibilita também o
controle jurisdicional.
Quanto ao controle jurisdicional, com relação aos atos vinculados há
consenso na doutrina de que, sendo todos os seus elementos e requisitos
previamente definidos na legislação, cabe ao Poder Judiciário examiná-los a
fim de verificar a sua convergência com a lei, não havendo restrições ao
controle judicial.
Lado outro, para os atos discricionários, embora não haja consenso, a
doutrina majoritária entende que o controle jurisdicional é perfeitamente
cabível para aferir a legalidade e verificar se a Administração Pública não
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ultrapassou os limites da discricionariedade permitida em lei.
Não se defende ao Judiciário um controle ilimitado, usurpatório. Não cabe ao
Poder Judiciário substituir o administrador, mas verificar se este atuou em
conformidade com o ordenamento jurídico.
Permanece, para os atos administrativos discricionários, um campo intocável
pelo Poder Judiciário, que se traduz no mérito administrativo. A análise
judicial deve se deter aos aspectos de legalidade e juridicidade, ou seja, se os
atos estão de acordo com a lei e com os princípios que regem o Direito
Administrativo.
O controle de juridicidade, portanto, vai além do exame da legalidade,
consistindo no exame da congruência da valoração dos motivos e da definição
do conteúdo do ato administrativo predominantemente discricionário com os
princípios jurídicos, como, por exemplo, com o princípio da razoabilidade, da
proporcionalidade, da impossibilidade, da moralidade administrativa, da
eficiência, da transparência, entre outros.
Ressalva-se, mais uma vez, que não cabe ao Poder Judiciário reexaminar o
mérito do ato administrativo, ou seja, não poderá o Poder Judiciário dizer qual
a melhor opção, em substituição à opção da Administração, quando a
legislação efetivamente lhe conferir faculdade de escolha.
Trata-se de um equilíbrio entre as prerrogativas da Administração Pública,
que, em virtude de buscar a finalidade de atender o interesse público, está em
posição de superioridade com relação aos particulares, e de sua submissão à
lei e aos princípios jurídicos. Tal equilíbrio encerra-se no sistema de freios e
contrapesos, pelo qual devem se relacionar as funções estatais.
Como bem definiu Maria Sylvia Zanella Di Pietro:
“Assim, tem-se de um lado, a Administração Pública que
personifica o poder, dotada de prerrogativas de autoridade e,
de outro lado, a Administração Pública que personifica um
sujeito de direitos subordinado à lei e ao controle judicial.
Ora, sendo a Administração Pública, em seus vários aspectos,
objeto central do direito administrativo, este se caracteriza
essencialmente pela busca de um equilíbrio entre as
prerrogativas de autoridade e os direitos individuais”[2]
Frisa-se que a atividade da Administração Pública é limitada pela lei e por
princípios integrantes do ordenamento jurídico, de modo a resguardar os
direitos dos administrados.
Lado outro, o controle exercido pelo Poder Judiciário não é ilimitado e deve
respeitar o mérito dos atos administrativos discricionários, não cabendo ao
Poder Judiciário substituir o administrador em sua margem de liberdade, que
lhe foi legalmente conferida.
Deve haver, portanto, um controle não meramente legalista, mas de caráter
principiológico e teleológico.
ATRIBUTOS DOS ATOS ADMINISTRATIVOS
O ato administrativo está sempre atrelado a uma função, a uma finalidade,
consubstanciada no interesse público. Para atingir essa finalidade, o ato
administrativo possui atributos inexistentes nos atos de direito privado.
A justificação desses atributos reside na relevância dos interesses que
incumbem à Administração prover. Por um bem maior, o da coletividade,
arma-se a Administração Pública de prerrogativas, na medida em que se
façam necessárias para a satisfação do interesse público, dotando os atos por
ela editados de atributos que a colocam em posição de supremacia em relação
ais administrados. São eles: presunção de legitimidade, imperatividade e
autoexecutoriedade.
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Assim, há uma presunção de que os atos administrativos foram praticados em
conformidade com a lei, com o ordenamento jurídico vigente. Maria Sylvia
Zanella Di Pietro, explica trata-se de presunção de legitimidade e veracidade,
lecionando que:
“A presunção de legitimidade diz respeito à conformidade do
ato com a lei; em decorrência desse atributo, presumem-se, até
prova em contrário, que os atos administrativos foram
emitidos com observância da lei. A presunção de veracidade
diz respeito aos fatos; em decorrência desse atributo,
presumem-se
verdadeiros
os
fatos
alegados
pela
Administração. Assim ocorre com as certidões, atestados,
declarações, informações por ela fornecidos, todos dotados de
fé pública.”[3]
Lado outro, a imperatividade é o atributo que confere aos atos administrativos
a característica de impor-se a terceiros, independente de sua anuência. Ou
seja, embora os atos administrativos sejam manifestações unilaterais da
Administração, obrigam os particulares.
Por fim, a autoexecutoriedade assegura que o ato administrativo possa ser
executado imediatamente pela Administração Pública, não se fazendo
necessária intervenção anterior do Poder Judiciário.
Verifica-se, portanto, que os atributos dos atos administrativos possibilitam
sua validade, obrigatoriedade e execução de maneira célere e unilateral,
colocando a Administração em posição de supremacia em relação aos
particulares.
Tal supremacia acentua-se quando trata-se de ato discricionário, em que o
administrador possui certa margem de liberdade na sua atuação.
Destarte, imprescindível a análise da discricionariedade administrativa, bem
como de seus limites e formas de controle.
VINCULAÇÃO
O exercício da competência administrativa pode aparecer contida dentro de
limites de extrema objetividade, em que o conjunto normativo delimita a
forma e a providência que o agente público deve adotar, diante das
circunstâncias concretas, para alcançar a finalidade legalmente estabelecida.
Nesses casos, fala-se em atuação vinculada do Poder Público, pois ao
administrador não é conferida qualquer possibilidade de avaliação subjetiva,
devendo ele se ater aos termos da prescrição legal. A atuação vinculada
caracteriza pela existência de uma única solução possível diante de
determinada situação de fato. A lei fixa todos os requisitos, os quais a
Administração deve tão somente constatar, aplicando o comando normativo,
sem qualquer margem de apreciação.[4]
Isto é, trata-se de mero silogismo, decorrendo o ato administrativo da
observância dos preceitos legais que minuciosamente regulam todo o processo
de declaração da vontade, inadmitindo-se liberdade ou juízo apreciativo do
administrador. A previsão normativa é exaustiva e à Administração Pública
cabe unicamente reproduzir materialmente o conteúdo da norma legislativa,
não lhe sendo possível questionar acerca de oportunidade, conveniência ou
conteúdo do ato. O administrador atua somente a constatar a hipótese da
norma e aplicar no caso concreto as consequências nela previstas.[5]
Celso Antônio Bandeira de Mello assim define os atos vinculados:
“atos vinculados são aqueles que a Administração pratica sob
a égide de disposição legal que predetermina antecipadamente
e de modo completo o comportamento único a ser
obrigatoriamente adotado perante situação descrita em termos
de objetividade absoluta. Destarte, o administrador não dispõe
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de margem de liberdade alguma para interferir com qualquer
espécie de subjetivismo quando da prática do ato”.[6]
Ou nos dizeres de Maria Sylvia Zanella Di Pietro:
“esse regramento pode atingir os vários aspectos de uma
atividade determinada; neste caso se diz que o poder da
Administração é vinculado, porque a lei não deixou opções; ela
estabelece que, diante de determinados requisitos, a
Administração deve agir de tal ou qual forma.”[7]
CONTROLE DOS ATOS ADMINISTRATIVOS VINCULADOS
Diante da exigência legal da prática do ato, na ocorrência dos pressupostos
estabelecidos normativamente, a Administração Pública tem o dever de agir
executando os ditames legais, não sendo permitido qualquer outro
comportamento que não aquele previsto em lei.
A ausência de prática do ato, ou seu exercício de modo diverso do que foi
estabelecido, gera para os prejudicados o direito subjetivo de se ter o ato
corrigido, pela própria Administração Pública ou pelo Poder Judiciário.
As súmulas nº 346 e 437 do Supremo Tribunal Federal explicitam a
possibilidade de ser realizado o autocontrole (controle pela própria
Administração). Senão, vejamos:
STF Súmula nº 346 – “A administração pública pode declarar
a nulidade dos seus próprios atos.”
STF Súmula nº 473 – “A administração pode anular seus
próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais,
porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por
motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os
direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a
apreciação judicial.”
Lado outro, o art. 5º, XXXV da Constituição Federal erige o Poder Judiciário
como instância encarregada por excelência de apreciar e solucionar os litígios
acasos existentes. Assim, o administrado prejudicado por ato vinculado
manifestamente ilegal pode também recorrer às vias judiciárias buscando a
anulação do ato.
Uma vez que os elementos do ato estão todos pré-definidos em lei, qualquer
desobediência a um destes determina sua ilegalidade, ensejando a correção.
O controle pelo Judiciário nos casos dos atos vinculados é amplo e irrestrito,
porquanto será analisada a congruência dos seus elementos com os aspectos
definidos em lei, declarando a sua nulidade quando constatada qualquer
desconformidade.
DISCRICIONARIEDADE
A Administração Pública, para o desempenho de suas funções, dispõe de uma
série de prerrogativas que, com maior ou menor grau de liberdade, são
manejadas para a consecução de seus fins.
Apesar de em um Estado Democrático de Direito a atuação do Poder Público
ser limitada por lei e princípios, a dinâmica social impede a previsão exaustiva
de todas as situações de possível ocorrência. Resta claro que não é possível
ao legislador pontuar minuciosamente cada passo do agente público, dada a
riqueza dos fatos sociais que ensejam a atuação administrativa.
Com efeito, o Poder Legislativo não consegue acompanhar a mutabilidade
social, devendo ser concedidos legalmente à Administração Pública os meios
necessários para garantir-lhe uma flexibilidade adequada que lhe permita agir
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diante de novas realidades.
Por isso, paralela à vinculação, que limita e cerceia a atividade administrativa
ao juízo de constatação da hipótese legal, existe a discricionariedade,
consubstanciada na prerrogativa do administrador de eleger a melhor solução
para a consecução da finalidade pública, nos casos em que a lei lhe confere
uma margem de liberdade.
Os particularismos e nuances da realidade não podem ficar contidos em juízos
hipotéticos de verificação, pois caso o legislador previsse normativamente
todas as situações, estaria o Poder Executivo cerceado pelo Poder
Legislativo.
Assim, verificando o legislador que é necessário dar margem para uma análise
casuística ao administrador, não se prefixa o conteúdo de todos os atos, dando
ao agente público a possibilidade de decidir, mediante critérios de
oportunidade e conveniência, qual a melhor solução para a consecução da
finalidade pública.
A discricionariedade é, desta maneira, o instrumento conferido à
administração Pública para adequar sua atuação em face das novas
necessidades coletivas e mudanças ocorridas no âmbito social. A
discricionariedade é justificada pela necessidade de se obter uma
Administração efetiva, sem que seu exercício seja engessado pela função
legislativa.
O conceito de discricionariedade é apresentado por Celso Antônio Bandeira
de Mello nos seguintes termos:
“discricionariedade, portanto, é a margem de liberdade que
remanesça ao administrador para eleger, segundo critérios
consistentes de razoabilidade, um, dentre pelo menos dois
comportamentos cabíveis, perante cada caso concreto, a fim de
cumprir o dever de adotar a solução adequada à satisfação da
finalidade legal, quando, por força da fluidez das expressões
da lei ou da liberdade conferida no mandamento, dela não se
possa extrair objetivamente, uma solução unívoca para a
situação vertente.”[8]
A definição formulada por Di Pietro é mais usual entre os administrativistas,
por conter o elemento “faculdade de escolha”, bem como os critérios de
“conveniência e oportunidade” que orientarão tal escolha. In verbis:
“a atuação é discricionária quando a Administração, diante do
caso concreto, tem a possibilidade de apreciá-lo segundo
critérios de oportunidade e conveniência e escolher uma
dentre duas ou mais soluções, todas válidas perante o
direito.”[9]
Queiró, por fim, conceitua o ato discricionário relacionando-o com a
existência de conceitos imprecisos no texto legal:
“trata-se de uma faculdade de escolher uma entre várias
significações contidas num conceito normativo prático,
relativo às condições-de-fato do agir administrativo – escolha
feita sempre dentro dos limites da lei. Esta escolha é feita
livremente pela Administração, entendendo-se aqui por
liberdade aquilo que vimos de expor.”[10]
Dos conceitos de discricionariedade abordados, depreende-se ao menos um
elemento comum: a liberdade de escolha, sempre limitada, por critérios que
são variáveis conforme a concepção de cada autor. É na liberdade de escolha
que se manifesta a subjetividade do administrador.
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CONTROLE DOS ATOS ADMINISTRATIVOS DISCRICIONÁRIOS
A discricionariedade administrativa, em decorrência da margem de liberdade
conferida à Administração Pública para a edição de seus atos, pode ensejar
abusos e desvios.
Todavia, é inaceitável a antiga idéia de que os atos administrativos
discricionários são insuscetíveis de controle e revisão pelo Poder Judiciário. O
controle, inclusive jurisdicional, se estende a esta categoria de atos, visando
evitar e coibir os abusos praticados em nome da livre apreciação e da
conveniência e oportunidade do administrador, como forma de garantia do
administrado em face da atuação unilateral do Poder Público e em respeito ao
Estado Democrático de Direito.
DESVIO DE PODER – CONTROLE PELA FINALIDADE LEGAL
A atuação do Poder Público está submetida à determinação legal, de tal modo
que a atividade administrativa é considerada lícita apenas nos casos em que a
lei permite, da maneira que indica, visando sempre à consecução dos fins nela
pré-determinados. É assim, atividade funcional serviente da concreção da
finalidade legal para satisfação dos interesses da coletividade:
“O fim, - e não a vontade, - domina todas as formas de
administração.
Supõe, destarte, a atividade administrativa a preexistência de
uma regra jurídica, reconhecendo-lhe uma finalidade própria.
Jaz, conseqüentemente, a administração pública debaixo da
legislação, que deve enunciar e determinar a regra de
direito.”[11]
A finalidade legal limita o poder discricionário da Administração Pública. O
plexo de poderes que é conferido ao agente público será disponibilizado e
mobilizado somente diante de circunstâncias específicas, visando à realização
de determinados fins, através de certas formas. Caso tais poderes sejam
manejados fora daquelas circunstâncias, em desacordo com a finalidade legal
ou através de formas diferentes daquelas legalmente estabelecidas, esta
atuação será fora da competência do agente público. Configura-se, assim, o
que se denomina de desvio de poder.
O desvio de poder configura o descompasso da atividade administrativa com
a finalidade legal estabelecida, seja finalidade em sentido amplo, consistente
no interesse público a ser atingido por qualquer medida administrativa, ou em
sentido estrito, considerada como aquela específica para cada ato
administrativo. A não observância de qualquer uma delas vicia o ato.
Assim, quando ocorre o desvio de poder, a atividade administrativa transgride
a lei por não ter atendido a finalidade nela prevista. É, portanto, um vício de
legalidade, que enseja a correção jurisdicional.
Ressalta-se que o desvio de poder não ocorre nos casos que o agente público
era incompetente para a prática do ato. Nesta situação, verifica-se um vício
de ordem formal, que macula o ato em sua própria formação. Já na hipótese
de desvio de poder, o agente é competente, porém atua em desacordo com a
finalidade legal.
Verifica-se este tipo de vício em duas situações específicas: quando pratica-se
um ato administrativo visando a atingir finalidade diversa daquela
estabelecida em lei; e também quando o agente atinge fim público, porém em
desacordo com aquele pré-determinado pela regra jurídica. A primeira
hipótese caracteriza as situações em que o ato é praticado pelo agente
administrativo tendo em vista um fim pessoal. É típico de atos emanados por
favoritismos ou perseguições, onde se evidencia não somente o desvio de
poder, mas também o desvio de intenção do próprio agente. Os interesses da
coletividade são relegados a segundo plano, prevalecendo o interesse
particular do agente público.
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O desvio de poder, desta forma, viola também o princípio da impessoalidade
estabelecido na ordem jurídica nacional, que veda a concessão de benefícios
ou perseguições a terceiros, em detrimento do interesse público
“Contudo, a Administração Pública tem como norma básica a
proteção de interesses coletivos, ainda que peculiares a grupos
definidos em lei e, por esta forma, submetidos a tratamento
especial.
O princípio da impessoalidade repele atos discriminatórios que
importem favorecimento ou desapreço a membros da sociedade
em detrimento da finalidade objetiva da norma de direito a ser
aplicada.
Não é indiferente, porém, a Administração Pública a
personalidade do administrado. O que se veda é a
personificação de seus atos na medida em que abandonem o
interesse público para conceder favores ou lesar pessoas ou
instituições.
Em síntese, a atividade administrativa pode, em certos casos
deve, distinguir entre pessoas, em função de peculiaridades que
a lei manda observar. Não poderá jamais discriminar entre
elas, sobrepondo o juízo personalista à objetividade legal de
tratamento.”[12]
Já nos casos em que a atuação administrativa atinge um fim público em
desacordo com aquele preestabelecido configura-se também o desvio de
poder. Tem o administrado a segurança de que determinado plexo de poderes
será direcionado para a consecução não de qualquer fim público, mas daquele
exigido para determinada circunstância, que foi assim considerado adequado
e satisfatório para uma dada situação. A competência é deferida ao agente
não para atingir qualquer finalidade pública, mas aquela especificamente
considerada em lei para aquele ato.
Por constituir-se o desvio de poder em um vício objetivo, de legalidade, o
controle pelo Poder Judiciário do ato emanado em desvio de poder não
invade a esfera do mérito, sendo, portanto, um controle de legalidade que não
agride a chamada liberdade administrativa.
Teoria dos motivos determinantes – Controle pela motivação e motivos do
ato discricionário
O motivo, elemento facultativamente discricionário do ato administrativo, se
refere à situação de fato ou de direito que autoriza a expedição daquele ato.
Ocorrendo o pressuposto fático, a Administração Pública encontra-se
autorizada a adotar a medida cabível àquela circunstância.
Quando a lei é omissa na expressão dos motivos, cabe ao agente público, no
exercício de competência discricionária, escolher ou indicar os motivos que
embasam a expedição do ato. É o que se denomina de motivação, que
corresponde, assim, à exposição da situação fática ou jurídica que autorizou a
atuação do Poder Público em face do caso concreto. A validade do ato fica
condicionada à existência da situação que foi exposta.
O cerne da questão gira em torno da necessidade ou não de se motivar o ato
administrativo.
Em décadas anteriores, era forte o entendimento doutrinário de que a
motivação não é obrigatória nos atos administrativos discricionários. Contudo,
atualmente, esse entendimento já não possui o mesmo respaldo. O Estado
Democrático de Direito (art. 1º da Constituição Federal), o princípio da
publicidade (art. 37 da Constituição Federal) e a garantia do contraditório
(art. 5º da Constituição Federal) impedem que qualquer ato administrativo
possa ser editado sem motivação.
Florivaldo Dutra de Araújo encerra a necessidade de fundamentação da
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atuação dos agentes públicos essencialmente no princípio democrático.
Vejamos:
“Prestar contas dos fundamentos tácitos e jurídicos, sobre os
quais se assenta o desenvolvimento dessas funções, em cada
manifestação de vontade, pelos agentes públicos, é, no Estado
que se pretenda democrático, imperativo inarredável, seja para
o legislador, para o juiz ou para o administrador .”[13]
Ademais, a Lei nº 9.784/99, que regula o procedimento administrativo, em
seu art. 50, explicita a necessidade de motivação dos atos administrativos, não
diferenciando entre vinculados ou discricionários.
Frise-se, ainda, que o art. 93, X, também da Constituição Federal, obriga que
o Poder Judiciário, no exercício de função atípica, motive suas decisões
administrativas. Com mais razão, portanto, a Administração Pública (Poder
Executivo, principalmente), no exercício de sua função típica, deverá,
obrigatoriamente, motivar todos os atos administrativos que editar.
A motivação é, portanto, exigida para qualquer ato e possui fundamental
importância para o controle dos atos discricionários, tendo o Supremo
Tribunal Federal já manifestado sobre o tema: “O ato administrativo
discricionário torna-se arbitrário e nulo por falta de motivação legal.”[14]
Assim, a motivação do ato viabiliza o controle pelo Poder Judiciário, ficando
sua validade condicionada a existência efetiva dos motivos indicados. É o que
se denomina de “teoria dos motivos determinantes”.
A indicação de motivos falsos, inexistentes ou incoerentes vicia o ato,
ensejando a sua invalidação, podendo o ato ser apreciado pelo Poder
Judiciário, que anulará a medida administrativa. É vício não passível de
convalidação pelo Poder Público, uma vez que a lisura de sua atividade
estava diretamente atrelada à situação explicitada.
O controle pelo Poder judiciário será feito averiguando materialmente a
existência do motivo, bem como a sua correspondência com a providência
adotada. Através da motivação, é possível verificar a existência e a
veracidade dos motivos indicados, bem como analisar a adequação entre tais
motivos e o resultado obtido. Ou nos dizeres de Maria Sylvia Zanella Di
Pietro:
“a motivação é, em regra, necessária, seja para os atos
vinculados, seja para os atos discricionários, pois constitui
garantia de legalidade, que tanto diz respeito ao interessado
como à própria Administração Pública; a motivação é que
permite a verificação, a qualquer momento, da legalidade do
ato, até mesmo pelos demais Poderes do Estado. (...)”[15]
Assim, pela motivação, o agente justifica a sua atividade administrativa
indicando os pressupostos fáticos e de direito que determinaram sua atuação.
Dessa maneira, ela representa o meio pelo qual se demonstra que a escolha
feita restringiu-se aos limites legais, sendo o instrumento de verificação dos
limites estabelecidos à discricionariedade.
PRINCÍPIOS - LIMITAÇÕES À DISCRICIONARIEDADE
A discricionariedade implica em liberdade de apreciação pela Administração
Pública em relação à oportunidade e conveniência para tomar determinada
medida. É um regime de liberdade vigiada, limitada pela lei.
Contudo, não apenas a lei limita a atividade do Poder Público, mas os
princípios que informam todo o Estado Democrático, decorrentes implícita ou
explicitamente da ordem constitucional brasileira. A escolha pela
Administração Pública não se atém somente aos ditames legais, mas a todo
um conjunto principiológico que informa e sobre o qual encontra-se assentado
todo o ordenamento jurídico nacional, e ao qual se submete o Poder Público.
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Não somente o ato discricionário praticado em desconformidade legal será
eivado de nulidade, mas também toda atividade discricionária que desobedeça
a qualquer um dos princípios integrantes do ordenamento jurídico, estejam
eles expressos ou não.
Ao deliberar sobre as medidas a serem adotadas, principalmente quando se
fala de ato discricionário, o agente público deve pautar sua escolha não
somente por critérios de conveniência e oportunidade, mas também por
valores de probidade e moralidade que regem sua atuação.
Lado outro, é igualmente fundamental verificar a razoabilidade, que informa a
adequação entre os meios e fins, considerando os fatos que ensejaram a
decisão administrativa. No conteúdo do ato administrativo, deve haver
adequação lógica e proporção entre meios e fins.
Para a validade e eficácia de um ato administrativo, é necessária a adequação
entre a medida adotada e os motivos que ensejaram, fundamentaram a
atuação da Administração Pública. A moralidade está relacionada com a
conduta do agente em valorar e declarar os motivos reais que ensejaram sua
atuação, enquanto que a razoabilidade indica adequação lógica entre eles e o
conteúdo do ato
EVOLUÇÃO DO ENTENDIMENTO DOUTRINÁRIO SOBRE O
CONTROLE JURISDICIONAL DOS ATOS ADMINISTRATIVOS
O entendimento doutrinário predominante há décadas atrás entendia que a
Administração Pública apenas tinha o dever de motivar a edição de atos
administrativos vinculados ou sob expressa exigência legal. Mas não havia
qualquer controle sobre os atos discricionários. Durante muito tempo vigorou
no Direito Administrativo a regra da não obrigatoriedade de enunciar os
motivos que ensejaram a edição de atos administrativos discricionários, se
assim a lei não impusesse.
Posteriormente, embora permanecesse majoritário o entendimento de que não
era obrigatória a motivação dos atos administrativos discricionários,
considerava-se que os motivos eventualmente apresentados condicionavam a
validade do ato e ensejavam o exame do mesmo pelo Poder Judiciário. Foi
nesta época que surgiu e começou a se firmar a “teoria dos motivos
determinantes.”
A doutrina evoluía no sentido de exigir a motivação, mormente nos casos que
o ato restringia exercício de direitos, aplicava sanções e anulava e revogava
sanções.
Segundo a teoria dos motivos determinantes, os motivos apresentados pelo
agente público como razões de sua atividade condicionavam a validade o ato
e vinculavam o próprio agente. Assim sendo, mesmo considerada a não
obrigatoriedade de motivar o ato, se o agente o fizesse, a inexistência dos
fatos, a falsa subsunção destes ao preceito legal, ou mesmo a inexistência da
previsão legal, prejudicariam a validade do ato, eivando-o de vícios.
Os motivos determinantes estariam consubstanciados em determinadas
situações de fato ou de direito que recomendariam a edição de determinado
ato administrativo. Esses integrariam a validade do ato. Assim, a invocação de
motivos fáticos inexistentes, falsos ou incorretamente qualificados viciaria o
ato, mesmo quando a lei não houvesse estabelecido, antecipadamente, os
motivos que ensejariam a prática do ato. Com o passar do tempo, a teoria dos
motivos determinantes ganhou adeptos e se fortaleceu.
Frise-se que com a modificação do próprio modo que passou a ser enxergado
o Estado e as relações de poder (“teoria da representação”, o povo como
titular do poder) ensejou mudança na forma de se pensar o controle dos atos
administrativos.
A partir de então, era entendida como regra geral o dever de motivar o ato
discricionário, admitindo-se, contudo, algumas exceções. Passou a
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considerar-se que os motivos invocados integram a validade do ato,
sujeitando-os ao controle judicial, tendo como fundamento a teoria dos
motivos determinantes.
Nessa linha de raciocínio, Hely Lopes Meirelles defende que, em virtude da
ampliação do princípio do acesso judiciário (CF, art. 5º, XXXV), conjugado
com o da moralidade administrativa (CF, art. 37, caput), a motivação é, em
regra, obrigatória. Para o autor, apenas quando a lei dispensar ou quando a
natureza do ato for com ela incompatível, a motivação não seria necessária. O
agente público está obrigado, então, na atuação vinculada ou na
discricionária, a demonstrar a existência do motivo, caso contrário o ato será
inválido ou, pelo menos, anulável, por ausência de motivação.
No que se refere à evolução do entendimento sobre o controle dos atos
administrativos, na fase seguinte, predominante até a atualidade, passou-se a
entender que há o dever de motivar todos os atos administrativos, que estão
sujeitos a controle exercido pelo Poder Judiciário.
No entendimento do Supremo Tribunal Federal, motivação é necessária em
qualquer ato administrativo. Ressalta-se, mais uma vez, que a própria
Constituição Federal exige que até as decisões administrativas dos Tribunais
sejam motivadas (art. 93, X, CF/88). Se o Poder Judiciário é obrigatório
motivar, no exercício de função atípica, não há como conceber esteja o
administrador desobrigado de motivar os atos administrativos emitidos no
exercício de sua função típica.
Portanto, é entendimento dominante que, independente da existência de
aspectos vinculados ou discricionários do ato, a motivação é indispensável à
sua legitimidade.
É de fundamental importância reconhecer a obrigatoriedade de motivação dos
atos administrativos, sejam discricionários, sejam vinculados, pois que a
motivação que permite analisar da pertinência da medida, principalmente nos
casos de atos administrativos discricionários. De igual forma, a motivação
permite analisar se o ato foi legítimo, legal, proporcional, em suma, se
cumpriu a finalidade pública geral e especifica embasada pelo ordenamento.
Observa Diógenes Gasparini que a discussão sobre o dever de motivar
qualquer ato administrativo
“parece resolvida com o advento da Lei federal n. 9784/99, que
regula o processo administrativo no âmbito federal. Pelo art.
50 dessa lei todos os atos administrativos, sem qualquer
distinção, deverão ser motivados, com a indicação dos fatos e
dos fundamentos jurídicos.
Assim, tanto os atos administrativos vinculados como os
discricionários devem ser motivados. O fato desse artigo
elencar as situações em que os atos administrativos devem ser
motivados não elide esse entendimento, pois o rol apresentado
engloba atos discricionários e vinculados”[16]
Quanto ao controle, o Poder Judiciário pode examinar os atos da
administração de qualquer natureza, sejam gerais ou individuais, unilaterais
ou bilaterais, vinculados ou discricionários, sempre sob o aspecto da
legalidade e por parâmetros principiológicos e teleológicos.
Nos ditos atos vinculados, não existe restrição ao controle jurisdicional sendo seus elementos e requisitos definidos previamente na legislação, cabe
ao Judiciário examiná-los para verificar se convergem com a lei, ou para que
decrete a nulidade do ato, caso contrário.
Acerca dos atos possuidores de aspectos discricionários, o controle judicial é
perfeitamente cabível para aferir a legalidade e verificar se a administração
não ultrapassou os limites da discricionariedade. Não se defende ao judiciário
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um controle ilimitado, usurpatório. Não cabe ao judiciário substituir ao
administrador, mas verificar se esse atuou em conformidade com os princípios
e normas do ordenamento jurídico.
Há de se ressaltar que a evolução na doutrina e jurisprudência no tocante a
discricionariedade e controle jurisdicional não autorizou o juiz a perscrutar, de
modo irrestrito, a atuação do administrador. Permanece, quando da
discricionariedade, um campo intocável pelo Poder Judiciário, traduzido pelo
mérito administrativo – a análise do juiz se deterá sob o aspecto da legalidade
e da juridicidade – no âmbito legal e principiológico.
O que antes estava restrito ao controle de legalidade estrita, evoluiu para
amparar um conceito muito mais amplo, o de juridicidade. Não basta que a
atuação do administrador esteja em conformidade com a legislação – é
necessário também que esteja em conformidade com os princípios
constitucionais – valores máximos do nosso Estado Democrático de Direito.
Em última análise, o controle de legalidade dos atos administrativos deu lugar
ao controle constitucional, e a legalidade é agora apenas um dos princípios a
serem respeitados pela atuação administrativa.
O controle de juridicidade vai além do exame de legalidade, consiste no
exame da congruência da valoração dos motivos e da definição do conteúdo
do ato administrativo predominantemente discricionário com os princípios
jurídicos, como, por exemplo, com o princípio da proporcionalidade, da
impessoalidade, moralidade e probidade administrativa, princípio da máxima
transparência, da confiança e boa-fé, da segurança jurídica, princípio da
eficiência, etc.
Ressalve-se, mais uma vez, que remanesce a impossibilidade do controle
jurisdicional de mérito. Não cabe ao Poder Judiciário reexaminar o mérito do
ato administrativo, vale dizer, não poderá o Poder Judiciário dizer qual a
melhor opção, em substituição à opção da Administração, quando
efetivamente a norma lhe conferir uma faculdade de livre escolha.
Juarez Freitas sintetiza de forma brilhante o equilíbrio entre a amplitude e
limites do controle jurisdicional. A saber:
“No encalço de reforçar tal relação mutuamente vitalizante
dos princípios e das normas administrativas, jamais se deve
colhera impressão de que se esteja a preconizar um controle
destemperado, absoluto ou usurpatório, tampouco o abandono
de precauções e cautelas quanto às regras formais. Bem ao
revés.
A compreensão do papel do controlador sistemático dos atos
administrativos, com ênfase para os princípios, nada mais
representa do que a adequada ciência do sistema jurídico,, que
somente existe se tal ênfase for respeitada. Pressupõe-se o
saber de que,subjacente às exigências formais, oculta-se
invariavelmente uma teleologia que requer, para ser
desvendada, a inteligência ponderada para bem operar a
junção dos princípios e das normas. Desta maneira, todos os
cuidados são imprescindíveis, no lidar com os atos
administrativos, para bem cumprir o desiderato de,
rigorosamente, compatibilizá-los com a totalidade dinâmica e
axiológica, regente das relações de administração ”[17]
A par deste entendimento, atualmente majoritário, há um posicionamento
divergente, minoritário, segundo o qual além do dever de motivar todos os
atos administrativos, não há limites para o controle judicial – exclui a
discricionariedade ao afirmar que sempre exige um único comportamento
ótimo para a Administração.
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O princípio da moralidade, elevado a categoria de princípio constitucional,
segundo o referido entendimento, teria rompido com os limites ao controle
jurisdicional do ato administrativo. A moralidade exigida do administrador
seria incompatível com a discricionariedade.
Tal posicionamento não encontra guarida na maior parte da doutrina, ao
argumento de que haveria aí patente inconstitucionalidade ao se colocar o juiz
como substituto do administrador público, invadindo função precípua
constitucionalmente definida.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A discricionariedade não comporta mais os antigos entendimentos de que era
absoluta e estava isenta de qualquer apreciação pelo Poder Judiciário. Os
órgãos judicantes não podem se eximir de apreciar questões sob a mera
alegação de que se tratam-se de atos discricionários.
A própria atividade administrativa não pode ser pensada em termos de poder,
mas sim de dever de consecução da finalidade legal para satisfação do
interesse público. É atividade desempenhada sempre no intuito de outrem,
ainda que seja deferida, pela norma, uma margem de liberdade ao agente
público.
Tem o particular a garantia de que seus direitos e interesses serão respeitados
em face da atuação unilateral do Estado. Assim, o ato administrativo lesivo,
vinculado ou discricionário, será apreciado pelo Poder Judiciário.
Tratando-se de ato vinculado, o exame pelo Poder Judiciário pautará sobre a
verificação da conformidade da medida administrativa com o que foi prescrito
pela norma.
Reconhecido que o ato é discricionário, o Poder Judiciário terá então que
verificar, não obstante a liberdade conferida à Administração Pública, se a
atividade administrativa ateve-se aos limites estabelecidos, considerando as
formas de controle anteriormente expostas.
Pela motivação, o Poder Judiciário examina a conformidade do conteúdo do
ato com as alegações expendidas pela Administração Pública. A
desproporção, inadequação ou inexistência dos motivos expostos com a
medida praticada viciam e tornam o ato nulo.
E ainda, todo o conjunto de princípios que informa o ordenamento jurídico
nacional pode ser levantada para questionar a validade dos atos
discricionários.
A discricionariedade, abrangendo as situações de liberdade de escolha e de
intelecção dos conceitos imprecisos, fica assim bastante restrita, e o controle
dos atos discricionários torna-se assim um controle amplo, mas que deve
também ser exercido com cautela, sob o risco de não se ter uma “ditadura
judicial”. A última palavra caberia ao judiciário para determinar até que ponto
iria a discricionariedade da administração pública e daí a própria possibilidade
da medida ser controlada.
O critério da razoabilidade serve como parâmetro para verificação dos limites
da discricionariedade.
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[1] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Discricionariedade Administrativa na
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[2] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Discricionariedade Administrativa na
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[3] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22ª ed. 2008,
p. 197-198.
[4] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22ª ed. 2008,
p. 212.
[5] GARCÍA DE ENTERRÍA, Eduardo Fernandez Tomás-Ramón. Curso de
Direito Administrativo. 1991, p. 389.
[6] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo.
2001. P.339.
[7] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22ª ed. 2008,
p. 212.
[8] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Discricionariedade e Controle
Jurisdicional. 2000, p.48.
[9] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22ª ed. 2008,
p. 212.
[10] Queiró, Afonso Rodriguez. A teoria do “Desvio de Poder” em Direito
Administrativo. 1942, p. 77-78.
[11] CIRNE LIMA, Ruy. Princípios de direito administrativo brasileiro.
1982, p.22.
[12] TÁCITO, Caio. Vinculação e Discricionariedade. Revista de direito
administrativo, São Paulo, v. 205, n. 95, p. 125-130, jul./set. 1996 (p. 129).
[13] ARAÚJO, Florivaldo Dutra de. Motivação e Controle do Ato
Administrativo. 1992, p. 20.
[14] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário n. 69.486.
Relator: Thompson Flores. Acórdão de 18 de Nov. de 1970. Revista de
direito administrativo, Rio de Janeiro, v. 108, p.276-302. Abr./jun. 1972.
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[15] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 22ª ed. 2008,
p. 211
[16] GASPARINI, Diógenes. Direito Administrativo. 5ª ed. 2000, p. 60.
[17] FREITAS, Juarez.. O Controle dos Atos Administrativo e os Princípios
Fundamentais. 2ª ed. 1999, p.20.
Elaborado em março/2015
Maíra Costa Val Fajardo
Graduada em Direto – Universidade Federal de Minas Gerais;
Pós-graduada em Ciências Penais – PUC (Pontifícia Universidade Católica) – MG;
Pós-graduada em Direito Administrativo - Faculdades Integradas de Jacarepaguá - FIJ / Instituto de Gestão
Educacional Signorelli – IGES;
Analista (Direito) do Ministério Público do Estado de Minas Gerais.
Inserido em 12/03/2015
Parte integrante da Ediçao no 1239
Forma de citação
FAJARDO, Maíra Costa Val. Controle dos Atos Administrativos Discricionários. Boletim Jurídico,
Uberaba/MG, a. 5, no 1239. Disponível em: <http://www.boletimjuridico.com.br/
doutrina/texto.asp?id=4054> Acesso em: 18 mai. 2015.
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