1 superávit primário e gastos em educação

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SUPERÁVIT PRIMÁRIO E GASTOS EM EDUCAÇÃO
José Lúcio Alves Silveira1
Resumo: O trabalho demonstra a possibilidade do setor público
reduzir os atuais superávits primários, o que liberaria mais recursos
para a educação, sem comprometer a estabilidade da dívida pública.
Palavras-chave: Superávit primário, dívida pública, gastos em
educação.
PRIMARY SURPLUS AND EXPENDITURES ON EDUCATION
Abstract: The work demonstrates the possibility of reducing the
current public sector primary surpluses, which would release more
resources for education, without compromising the stability of public
debt.
Key words: Primary surplus, public debt, expenditures in education.
1
Professor. Universidade Federal do Maranhão. E-mail: [email protected]
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1. Entendido como: Governo Federal + Banco Central + Estados e Municípios+ Empresas Estatais.
1
1. INTRODUÇÃO
O crescimento da dívida pública e as elevadas taxas de juros reais representavam
graves problemas para a economia brasileira no final da década de 1990. Além disso,
devido a permanência de uma taxa de câmbio sobrevalorizada após o Plano Real,
implantado em julho de 1994, o País começa a apresentar saldos negativos em sua balança
comercial, fato que contribuiu para um déficit acumulado na balança de transações
correntes do balanço de pagamentos da ordem de US$ 72,2 bilhões no período 1995/1997.
E como agravante dessa situação, em 1998, após a Rússia desvalorizar o rublo e decretar a
moratória da sua dívida, as fontes externas de crédito diminuíram abruptamente e
acentuaram a redução das reservas internacionais do Brasil.
Nesse cenário adverso, o governo brasileiro recorre no final de 1998, sob à
coordenação do Fundo Monetário Internacional (FMI), à comunidade financeira internacional
e obtém um empréstimo no valor de US$ 42,0 bilhões. Por outro lado, no âmbito dos
acordos com o FMI, fundamental para a obtenção desses recursos externos, o setor público1
se comprometeria a realizar um ajuste fiscal, cujo ponto central residia na obtenção de
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1. Entendido como: Governo Federal + Banco Central + Estados e Municípios+ Empresas Estatais.
2
2
superávits primários (gastos não financeiros – receitas não financeiras), com o objetivo de
reduzir sua dívida líquida ao longo do tempo.
Os elevados e recorrentes superávits primários, cuja média de 4,00% do Produto
Interno Bruto (PIB) no período 2002/2008, contribuiu para o setor público reduzir sua dívida
líquida, que passou de 44,8 para 30,9% do PIB no mesmo período. Porém, a condução
dessa política fiscal tem implicado em um elevado custo de oportunidade para o País, na
forma de redução nas despesas em educação pelo governo federal. Assim, o objetivo do
presente trabalho é demonstrar que é possível mudar o atual regime fiscal através de uma
redução dos superávits primários, o que liberaria mais recursos para aplicar em educação,
sem provocar o crescimento da dívida pública.
O trabalho está dividido em duas seções, além da introdução. Na segunda seção,
apresenta-se a equação que possibilita calcular o superávit primário necessário para
estabilizar a dívida pública ao longo do tempo, em função das seguintes variáveis: taxa de
crescimento da economia, taxa de juros real e senhoriagem. Em seguida, por meio de
simulações, são analisadas as possibilidades apresentadas pelo País para reduzir os
superávits primários sem comprometer a estabilidade de sua dívida pública. Na terceira
seção, são feitas as consideração finais.
2. SUPERÁVIT PRIMÁRIO E A EVOLUÇÃO DA DÍVIDA PÚBLICA
Esta seção discute a relação entre o superávit primário e a estabilidade da dívida
pública ao longo do tempo. Inicialmente é apresentado, em forma de equação, o superávit
primário necessário para estabilizar a dívida pública em termos intertemporal. Em seguida
mostra-se os vários cenários que permitem reduzir os atuais superávits primários sem
provocar crescimento da dívida pública.
2.1 O superávit primário e a dívida pública
O superávit primário que permite estabilizar a relação dívida pública/PIB é dado pela
seguinte equação2:
sp = d.[(r - y)/(1 + y)] –b
Onde:
sp= superávit primário como proporção do PIB;
d= relação dívida/PIB
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2. Esta fórmula está presente também em Giambiagi & Além (2000).
(Equação 1)
3
r = taxa de juros real;
y = taxa de variação real do PIB;
b = receita de senhoriagem/PIB.
Esta equação afirma que o superávit primário como proporção do PIB requerido
para estabilizar a relação dívida/PIB ao longo do tempo é uma função crescente da
própria relação dívida/PIB e da taxa de juros real, e uma função decrescente da taxa
de variação do PIB e da receita de senhoriagem. Assim, quanto mais elevado o
estoque da dívida e/ou a taxa de juros real, maior é o esforço feito pelo setor público na
forma de superávits primários para se manter estável a relação dívida/PIB. Por outro
lado, um declínio na taxa de juros real, aumento na taxa de crescimento da economia
e/ou na receita de senhoriagem reduzem o superávit primário requerido para estabilizar a
dívida pública como proporção do PIB. Além disso, níveis de superávits primários superiores
(inferiores) aos definidos pela equação acima, mantida as demais variáveis constantes,
levam a uma queda (aumento) da relação dívida pública/PIB ao longo do tempo. Portanto, a
condução de uma política econômica que apresenta elevadas taxas de juros real, que
diminuem o consumo e a formação bruta de capital fixo (investimento) da economia, com
repercussões negativas no crescimento econômico, contribui sobremaneira para tornar o
ajuste fiscal mais profundo, mediante o aumento do superávit primário.
2.2 Os cenários para a estabilização da dívida pública
A equação analisada acima permite simular os superávits primários que permitem
estabilizar a dívida pública ao longo do tempo. A Tabela 1 reproduz esses resultados a partir
dos seguintes dados3: dívida líquida do setor público de 30,9% do PIB; senhoriagem de
0,1% do PIB. Conforme discutido anteriormente, o superávit primário necessário para a
estabilidade da dívida cresce com a taxa de juros real e diminui com o crescimento
econômico. Para uma taxa de juros de 7% e sem crescimento real do PIB, a estabilização
da dívida pública requer um superávit primário de 2,06% do PIB. Por outro lado, com uma
taxa de juros de 1% e crescimento real do PIB de 6%, o setor público pode até apresentar
um déficit primário de 1,55% do PIB, sem provocar aumento da relação dívida/PIB.
Na atual conjuntura, com decréscimo da atividade econômica a nível mundial, um
cenário razoável consiste em crescimento da economia brasileira de 0 a 1% ao ano e uma
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3. Os dados utilizados como referência nas simulações da Tabela 1 foram obtidos no Boletim do Banco Central,
vários números, com as seguintes observações:
a) a dívida líquida do setor público, de 30,9% do PIB, refere-se a dezembro de 2008;
b) a taxa média de juros real Selic, deflacionada pelo Índice Geral de Preços da Fundação Getúlio Vargas, no
biênio 2007/2008 foi de 6,60%.
4
taxa de juros real de 5% a 6%. Nesse quadro, teríamos um superávit primário situado entre
1,12 e 1,75% do PIB. E assumindo o cenário mais conservador, ou seja, um superávit
primário de 1,75% do PIB, o setor público teria uma folga de 2,25% do PIB para aplicar na
economia4. Portanto, é possível ao governo federal aumentar a despesa em educação de
0,75% do PIB, média verificada no período 2004/2008, para 1% do PIB, sem comprometer a
estabilidade da dívida pública. Esse adicional de 0,25% do PIB representaria um incremento
de R$ 7,2 bilhões5, valor que corresponde a 33,3% do total alocado em educação em 2008
pelo governo federal.
Além disso, cabe destacar que a necessidade desse incremento resulta de dois
fatores: primeiro, o gasto médio em educação de 0,75% do PIB, ocorrido no período
2004/2008, representa o valor mais baixo dos últimos dez anos6; segundo, aplicação de
recursos em educação é fator fundamental para a formação de uma mão-de-obra
qualificada, portanto, necessária para elevar a produtividade e o crescimento econômico do
País.
Tabela 1 - Superávit primário em % do PIB, necessário para estabilizar a relação dívida/PIB,
1
como função da taxa de crescimento econômico e da taxa de juros real
Taxa de crescimento do PIB (%)
_________________________________________________________
0,0
1,0
2,0
3,0
4,0
5,0
6,0
________________________________________________________
Taxa de juros real
1,0
2,0
3,0
4,0
5,0
6,0
7,0
0,21
0,51
0,82
1,13
1,44
1,75
2,06
-0,10
0,20
0,51
0,81
1,12
1,42
1,73
-0,40
-0,10
0,21
0,50
0,80
1,11
1,41
-0,69
-0,39
-0,10
0,19
0,49
0,79
1,09
-0,99
-0,69
-0,39
-0,10
0,19
0,49
0,79
-1,27
-0,98
-0,68
-0,39
-0,10
0,19
0,48
-1,55
-1,26
-0,97
-0,68
-0,39
-0,10
0,19
Fonte: Elaboração do autor. Valores negativos (-) significam a ocorrência de défict primário.
Nota: 1. Para uma dívida do setor público, que exclui a base monetária, de 30,9% do PIB e
senhoriagem de 0,1% do PIB.
_________________________
4. A folga de 2,25% do PIB que o setor público teria para aplicar na economia em educação, saúde, transporte,
segurança pública, resulta da diferença entre o superávit primário médio de 4,0% do PIB, verificado no período
1999/2008, e o valor de 1,75% do PIB obtido na simulação da Tabela 1.
5. Considerando o PIB a preços de mercado de 2008, cujo valor foi de R$ 2,9 trilhões.
6. Segundo o Ministério da Fazenda, a despesa em educação pelo governo federal brasileiro apresentou um
acentuado decréscimo a partir de 1999, quando nesse ano foi alocado 1,6% do PIB. Já no biênio 2000/2001
registra-se uma queda e seu valor passa para 1,0% do PIB. E como agravante dessa situação, no período
2003/2008, o gasto médio declina novamente e atinge o valor de apenas 0,75% do PIB.
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3.CONCLUSÃO
A estabilização da dívida pública se constitui em um indicador positivo na condução
da política econômica. Nesse ponto, o País mediante os elevados e recorrentes superávits
primários obteve sucesso em reduzir sua dívida líquida, que passou de 44,8 para 30,9% do
PIB entre 1999 e 2008. Por outro lado, quando se examina a despesa do governo federal
em educação no mesmo período, consta-se que esta sofreu uma severo decréscimo. Assim,
em virtude desse quadro adverso na alocação dos recursos públicos, este trabalho realizou
vários cenários de superávits primários, capazes de estabilizar a dívida pública ao longo do
tempo, e constatou que é possível atualmente o governo federal elevar seus gastos em
educação em 0,25% do PIB sem elevar sua dívida líquida. E essa quantia propiciaria um
incremento de R$ 7,2 bilhões ou 33,3% do valor alocado em educação em 2008 pelo
governo federal.
REFERÊNCIAS
BANCO CENTRAL DO BRASIL. Boletim do Banco Central. Brasília, vários números.
GIAMBIAGI, Fábio; ALÉM, Ana Cláudia. Finanças Públicas: teoria e prática no Brasil. 2.
ed. Rio de Janeiro: Campus, 2000.
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