Coordenação de Políticas Macroeconômicas: Implicações Para o Caso Brasileiro Tema: Ajuste Fiscal e Dívida Pública Sumário Resumo 5 Introdução 6 1. O Referencial Teórico 10 1.1. A Gênese da Análise de Instrumentos e Metas da Política Econômica 10 1.2. Mundell e a Classificação Efetiva de Mercado 13 1.3. A Incerteza Sobre a Política Econômica 16 1.4. Escolha Ótima dos Instrumentos da Política Monetária em um Modelo Estocástico 21 Apêndice 27 1.A.1. Determinação dos Instrumentos Condicionados às Metas Desejadas 27 1.A.2. Ausência de Independência Linear dos Instrumentos de Política Econômica (Caso Curva de Phillips) 28 1.A.3. O Valor Ótimo de ∆M* 29 1.A.4. Condições para a Política Ótima 29 1.A.5. Razão ∆G/(∆G + ∆M) 30 1.A.6. Elasticidade-Juro da Demanda por Moeda 31 2. A Coordenação de Políticas: O Modelo de Nordhaus 32 2.1. Coordenação e Independência das Políticas Monetária e Fiscal 32 2.2. Equilíbrio Não-Cooperativo 36 2.3. Uma Regra Monetária 38 2.4. Dinâmica e Efeitos das Estratégias de Redução do Déficit 39 2.5. Autoridades Políticas Independentes 41 2.6. Introduzindo Assimetrias 43 Apêndice 47 2.A.1. As Funções de Reação 3. Conseqüências da Coordenação Monetária-Fiscal Para o Brasil 47 50 3.1. Um Modelo de Coordenação para a Estabilidade de Preços 50 3.2. A Determinação da Taxa de Juros 58 3.3. Uma Aplicação da RTM Para o Caso Brasileiro 60 Apêndice 67 3.A.1. Mecanismos de Transmissão Monetária 67 3.A.2. Tabela 3.A.1 77 Conclusões 78 Bibliografia 81 Índice de gráficos, tabelas e esquemas Gráficos 1 - Gráfico 1.1: Curvas de Indiferença 15 2 - Gráfico 2.1: Estrutura do Jogo Monetário-Fiscal 35 3 - Gráfico 2.2: Funções de Reação e Equilíbrio Não-Cooperativo 37 4 - Gráfico 2.3: Dinâmica da Redução do Déficit 40 5 - Gráfico 2.4: Independência Monetária Qual é o Custo? 42 6 - Gráfico 2.5: Equilíbrio Com Política Fiscal Avessa à Impostos 44 7 - Gráfico 3.1: Evolução da over/Selic e da RTM 62 8 - Gráfico 3.2: Evolução da Dívida Interna Pública (% PIB) 64 9 - Gráfico 3.3: PIB, Over/Selic e RTM (%) 65 Tabelas 1 – Tabela 3.A.1: 77 Esquemas 1 – Esquema 3.A.1: Determinação da Taxa de Juros na Economia 67 2 – Esquema 3.A.2: Principais Mecanismos de Transmissão da Política Monetária 75 Resumo Coordenação de Políticas Macroeconômicas: Implicações Para o Caso Brasileiro Tema: Ajuste Fiscal e Dívida Pública O presente trabalho tem por objetivo analisar se os resultados oriundos da coordenação de políticas (monetária e fiscal em particular) são superiores ao caso em que autoridades políticas atuam de forma independente. Ademais, é apresentada uma proposta para a condução da política monetária brasileira de forma que possa ser mantido o atual regime de metas para a inflação e ser assegurada a estabilidade na relação dívida/PIB. As principais contribuições deste trabalho podem ser sumariadas da seguinte forma: i) revisão da literatura teórica sobre coordenação de políticas econômicas como alternativa para a busca de um mecanismo de estabilização mais eficiente; ii) elaboração de um modelo matemático simples, cujo resultado indica que a taxa de juros é o principal instrumento à disposição do BC para minimizar flutuações nos preços e no produto, e por conseguinte, o principal elo de ligação entre a política monetária e a fiscal; e iii) aplicação de uma regra de reação do tipo Taylor para a condução da política monetária no Brasil como uma alternativa factível para a estratégia de metas para a inflação e estabilidade para a razão dívida/PIB. 5 “Macroeconomic success depend on coordination of the monetary and fiscal instruments. It was the two working together. Curiously enough, economic policy making in United States - and in many other countries - is designed to inhibit this coordination and cooperation. We have created independent central banks, who way, and indeed are instructed to, pursue policies independently of the wishes of the elected officials.” (Stiglitz, 1999) Introdução A relação mútua entre as políticas fiscal e monetária é um importante elemento na explicação do aumento da dívida líquida do setor público ao longo da década de 90 no Brasil. A principal conexão entre os lados monetário e fiscal ocorre por meio da taxa de juros, uma vez que sua variação implica alterações na capacidade de solvência da dívida pública. Dado que o precípuo de um responsável pela política consiste na maximização do bem-estar social, é preciso que sejam desenvolvidos mecanismos capazes de estabelecer uma relação ótima entre os objetivos monetários e fiscais. Em particular, é necessário que a condução da política monetária não estabeleça um nível para a taxa de juros básica da economia acima da taxa de crescimento do PIB, pois, dessa forma, a economia pode entrar em uma rota explosiva para a relação dívida/PIB, tendo, por conseqüência, o descontrole fiscal e monetário.1 A discussão contemporânea sobre coordenação macroeconômica procura avaliar quais os benefícios potenciais para a economia decorrentes, sobretudo, de uma maior interação entre o governo e a autoridade monetária. Partindo-se de uma estrutura em que há autoridades políticas distintas com instrumentos que podem afetar o mesmo objetivo, passa a ser necessário analisar qual o melhor arranjo entre o governo e o banco central 1 Para uma análise teórica deste argumento, ver Cagan (1956). 6 (BC) capaz de alcançar a meta desejada e ao mesmo tempo minimizar os possíveis custos de coordenação envolvidos nesse tipo de estrutura. A análise seminal sobre coordenação de políticas macroeconômicas teve origem com Jan Tinbergen no início da década de 50. A estrutura desenvolvida por esse autor tinha por base a interação entre instrumentos e metas da política econômica. Nos anos 60 a análise foi desenvolvida por Mundell (1960) com o objetivo de mostrar qual o melhor arranjo de política no caso em que há instrumentos que estão sob o controle de diferentes autoridades políticas. Brainard (1967) incorporou à discussão a existência da incerteza em relação aos parâmetros da política econômica. Poole (1970) fazendo uso do modelo IS-LM desenvolveu uma estrutura capaz de solucionar o problema de Mundell às avessas, ou seja, como obter a meta desejada no caso em que o responsável pela política possui mais de um instrumento à sua disposição, mas não pode utilizá-los de forma simultânea. No período recente o debate sobre coordenação macroeconômica tem aparecido de forma implícita nas discussões que envolvem as propostas de independência do banco central e metas para a inflação. O presente trabalho tem por objetivo analisar se os resultados oriundos da coordenação de políticas (monetária e fiscal em particular) são superiores ao caso em que autoridades políticas atuam de forma independente. Ademais, é apresentada uma proposta para a condução da política monetária brasileira de forma que possa ser mantido o atual regime de metas para a inflação e ser assegurada a estabilidade na relação dívida/PIB. 7 As principais contribuições deste trabalho podem ser sumariadas da seguinte forma: i) revisão da literatura teórica sobre coordenação de políticas econômicas como alternativa para a busca de um mecanismo de estabilização mais eficiente; ii) a elaboração de um modelo matemático simples, cujo resultado indica que a taxa de juros é o principal instrumento à disposição do BC para minimizar flutuações nos preços e no produto, e por conseguinte, o principal elo de ligação entre a política monetária e a fiscal; e iii) a aplicação de uma regra do tipo Taylor para a condução da política monetária no Brasil como uma alternativa factível para a estratégia de metas para a inflação e estabilidade para a razão dívida/PIB. O estudo apresenta-se composto por cinco partes, incluindo esta introdução. O primeiro capítulo aduz de forma simplificada os quatro modelos básicos sobre a análise de coordenação de políticas. Para tanto, expõe-se a origem sobre a coordenação de políticas econômicas com base em Tinbergen (1962); os avanços feitos por Mundell (1960); a análise sobre incerteza desenvolvida por Brainard (1967); e a abordagem de Poole (1970) para o caso em que a autoridade política tem mais de uma opção para o uso de instrumentos na busca de seu objetivo, mas encontra-se limitada ao uso de um único instrumento. O capítulo 2 faz uma análise detalhada do modelo desenvolvido por Nordhaus (1994). A justificativa para este capítulo advém do fato de que o autor supracitado desenvolveu um aparato teórico de grande utilidade para verificar as vantagens e desvantagens oriundas do uso de políticas coordenadas ou não. O cerne deste capítulo 8 concentra-se na análise do comportamento da política macroeconômica por meio de um jogo monetário-fiscal em que são estudados a obtenção de um equilíbrio não-cooperativo; o uso de uma regra monetária; a dinâmica das estratégias de redução do déficit; a existência de autoridades políticas independentes; e a presença de assimetrias. O capítulo 3 mostra, por meio de um modelo matemático simples, que a taxa de juros consiste em um instrumento que deve ser utilizado pela autoridade monetária para a busca da estabilidade de preços e evitar flutuações significativas do produto. Além disso, é verificado se a utilização de uma regra do tipo Taylor para a condução da política monetária e seus impactos sobre a razão dívida/PIB representa uma estratégia mais eficiente para a economia brasileira no período posterior à introdução do Plano Real. Por último, as conclusões sumariam as principais ilações dos pontos discutidos ao longo do trabalho. 9 1. O Referencial Teórico 1.1. A Gênese da Análise de Instrumentos e Metas da Política Econômica Tinbergen (1952) deu origem à literatura sobre a discussão que envolve instrumentos e metas da política econômica por meio de uma estrutura formal que tinha por objetivo maximizar as metas do responsável pela política sujeito a uma função de bem-estar social. Para tanto, foram considerados três elementos básicos: i) selecionar os objetivos pretendidos; ii) verificar quais os instrumentos que estão à disposição da autoridade política para atingir as metas; e iii) a formulação de um modelo econômico capaz de relacionar instrumentos e metas de forma que seja possível a escolha dos instrumentos políticos adequados. Partindo-se da hipótese de que os objetivos primordiais para a maximização de bem-estar social consiste na busca de pleno emprego (Y=Y*) e inflação zero (π=0), e que os instrumentos normalmente utilizados para esses fins são a política monetária (M) e a política fiscal (G),2 pode-se recuperar a análise de Tinbergen por meio de um modelo linear capaz de relacionar metas (T) e instrumentos (I). Nesse sentido, as metas podem ser expressas como: (1.A) T1 = α1I1 + α2I2 2 É importante lembrar que tais instrumentos estão condicionados ao ambiente institucional. No caso da política monetária, a utilização de um regime de câmbio fixo torna a política monetária endógena, o que elimina a capacidade deste instrumento ser utilizado como variável de política. Deve-se ressaltar que os problemas quanto à falta de capacidade do uso dos instrumentos, não podem ser atribuídos exclusivamente à política monetária, a política fiscal também pode deixar de ser uma variável de instrumento, um exemplo é o caso em que o Congresso possui um controle sobre o orçamento maior que o Tesouro. 10 (1.B) T2 = β1I1 + β2I2.3 Reescrevendo as equações (1.A) e (1.B) em termos das metas desejadas (T*) obtém-se: (1.A.1) T*1 = α1I1 + α2I2 (1.B.1) T*2 = β1I1 + β2I2. Por meio das equações acima é possível encontrar os valores de I1 e I2 capazes de determinar as metas desejadas, via escolha adequada dos valores dos instrumentos, ou seja,4 (2.A) I1 = (β2T*1 - α2T*2)/(α1β2 - β1α2) onde α1β2 - β1α2 > 0 (2.B) I2 = (α1T*2 - β1T*1)/(α1β2 - β1α2). Exprimindo as equações (1.A.1) e (1.B.1) em termos dos objetivos do responsável pela política (emprego e inflação), encontra-se: (3.A) ∆Y = α1∆G + α2∆M (3.B) ∆π = β1∆G + β2∆M. Ademais, considerando-se uma economia que se encontra no nível de pleno emprego (Y=Y*), mas existe uma taxa de inflação positiva (δ>0), o objetivo da autoridade política consiste em reduzir a taxa de inflação para zero sem causar efeito negativo sobre o produto da economia. Destarte, as equações (3.A) e (3.B) equivalem à: (4.A) 0 = α1∆G + α2∆M; (4.B) -δ = β1∆G + β2∆M; tendo como solução para o sistema (5.A) ∆G = δα2/(α1β2 - α2β1); e 3 Nas equações (1.A) e (1.B) está sendo admitido que os efeitos dos instrumentos são linearmente independentes (a1/b1 ≠ a2/b2), uma vez que no caso dos efeitos dos instrumentos serem iguais havia a possibilidade de ser obtida apenas uma das metas. 4 Os cálculos referentes à determinação dos instrumentos de política econômica encontram-se no apêndice (1.A.1). 11 (5.B) ∆M = -δα1/(α1β2 - α2β1). O que implica a possibilidade de estabilização de preços, sem que haja perda para o produto. De forma alternativa, considere que a taxa de inflação da economia está condicionada por uma Curva de Phillips. Neste caso, a política monetária e a política fiscal são capazes de afetar o nível de produção da economia, o que por conseguinte não garante a independência linear5 dos instrumentos que é condição básica para que as duas metas sejam obtidas. Além disso, deve-se ressaltar que nesta estrutura uma variação no produto acarreta uma flutuação na taxa de inflação. Sendo assim, a relação entre metas e instrumentos pode ser expressa como (6.A) Y = α1G + α2M (6.B) π = βY onde b corresponde ao coeficiente da Curva de Phillips no curto prazo. É importante salientar que a existência de independência linear para os instrumentos de política econômica apesar de ser condição necessária não é suficiente para o alcance simultâneo das duas metas. Pelas equações (5.A) e (5.B), observa-se que quando α1/β1 e α2/β2 apresentam valores semelhantes é possível atingir as metas desejadas, entretanto, as variações da política monetária e da política fiscal tendem a infinito, o que por sua vez cria problemas de ordem operacional. Portanto, sob a análise de Tinbergen, os instrumentos devem ser eficazes e independentes de forma que eles sejam consistentes com as metas desejadas. 5 A demonstração da ausência de independência linear é feita no apêndice (1.A.2). 12 1.2. Mundell e a Classificação Efetiva de Mercado De forma diferente da análise de Tinbergen, Mundell (1960) analisou o caso em que os diversos instrumentos de política econômica encontram-se sob o controle de autoridades políticas diferentes. O principal ponto a ser analisado é que mesmo as autoridades não coordenando políticas, existe uma combinação ideal de políticas descentralizadas para o caso em que as metas estão relacionadas de forma adequada aos instrumentos. Ou seja, para que seja obtida a combinação ideal é necessário a validade do “'principle of effective market classification': instruments (i.e., variables) should be directed at those targets (i.e., markets) on which they have the most influence.” (Mundell, 1960, p. 254) Adotando-se uma estrutura similar a da seção anterior, e assumindo-se que a política monetária tem impacto mais forte sobre a inflação do que a política fiscal, devido aos efeitos de M e G sobre a taxa de câmbio, isto implica que (β2/α2)>(β1/α1). Ademais, considere a impossibilidade do uso da política fiscal como instrumento de política econômica (∆G=0). Neste cenário apenas a política monetária é capaz de afetar simultaneamente o nível de produto e a taxa de inflação da economia. Portanto, as equações (3.A) e (3.B) podem ser reescritas como (7.A) ∆Y = α2∆M (7.B) ∆π = β2∆M (8) ⇒ ∆π = (β2/α2)∆Y. A equação acima revela a idéia presente na Curva de Phillips. Isto é, se o governo fizer uso de uma política monetária contracionista para combater a inflação, o efeito colateral será uma queda no produto da economia. Como não há a possibilidade do 13 governo utilizar uma expansão fiscal para neutralizar a taxa de sacrifício resultante de uma contração monetária, a equação (8) representa uma restrição política. Devido à impossibilidade da obtenção das metas pretendidas (inflação e produto) pelo uso de um único instrumento (política monetária), a solução para o problema consiste em encontrar qual a melhor combinação de inflação e produto que é compatível à restrição do responsável pela política. Para tanto, considere uma função de perda social que corresponde ao desvio quadrado do produto e da inflação às metas pretendidas, (9) L = (∆Y - ∆Y*)2 + (∆π - ∆π*)2. Tal como na seção anterior, as metas consistem em reduzir a taxa de inflação sem afetar o produto (∆π*=-δ e ∆Y*=0). Portanto, a equação (9) pode ser reescrita como (9.1) L = (∆Y)2 + (∆π + δ)2. Como a equação (9.1) consiste em uma equação da circunferência com centro no ponto (0, -δ) e raio (L). Isto é, (9.2) L20= (∆Y)2 + (∆π + δ)2; é possível expressar a função de perda em termos de curvas de indiferença.6 A interpretação econômica é que neste ponto a função de perda corresponde ao menor valor possível. Entretanto, devido à restrição política imposta (equação 8), deve-se encontrar a circunferência com menor raio (que implica menor perda). A solução para este 6 As curvas de preferência são úteis porque por meio delas é possível fazer uma classificação das preferências responsável pela política. 14 problema é facilmente compreendida fazendo-se uso do gráfico a seguir.7 A restrição dada pela equação (8) é uma reta (H) que passa pelo centro (0,0) e tem inclinação (β2/α2). Sendo assim, o equilíbrio ótimo a ser encontrado é a curva de indiferença (L2i) mais próxima do ponto (0, -δ) e que seja tangente à reta (H).8 Gráfico 1.1 – Curvas de Indiferença ∆π H ∆π = (β2/α2)∆Y ∆Y F • L23 L21 0, -δ • L22 L20 A solução corresponde ao ponto (F) pertencente à curva L21, o que implica que o equilíbrio ótimo apresenta uma taxa de inflação positiva e uma queda no produto. A justificativa para este resultado advém do fato de que para a inflação ser totalmente eliminada, a taxa de sacrifício sobre a economia representaria custos sociais tão elevados que não compensariam uma taxa de inflação zero. 7 Essa solução bastante engenhosa é derivada da presente em Sachs-Larrain (1995) que por sua vez basearam-se na estrutura analítica presente em Brainard (1967). 8 No caso em consideração é fácil observar que há uma ordem de preferência que pode ser expressa por L20 f L21 f L22 f L23. 15 1.3. A Incerteza Sobre a Política Econômica Os modelos apresentados nas seções anteriores revelam que as autoridades políticas não sabem com precisão os valores de α e β. Além disso, a incerteza pode existir estando associada não só aos coeficientes dos instrumentos, mas também ao tempo para o impacto das políticas sobre as metas planejadas e aos choques. Brainard (1967) elaborou uma análise para o caso em que o responsável pela política deseja maximizar a função utilidade sendo dependente dos valores das metas planejadas em um contexto onde ocorre mudanças estruturais. De acordo com este autor, “One of the implications of the ‘theory of policy’ in a world of certainty or ‘certainty equivalence’ is that structural changes which simply alter the magnitude of the response to policy do not alter the attainable utility level. (...) Another feature of the theory of policy in a world of certainty is that a policy-maker with more instruments than targets is free to discard the excess instruments, and it makes no difference to his performance which ones he discards. These results are crucially dependent on the assumption that the response of target variables to policy instruments is known for certain.” (Brainard, 1967, p. 412) Para que se possa compreender de forma mais fácil o problema da existência de incerteza sobre a utilização ótima de instrumentos quando há muitos instrumentos e metas, Brainard dá início em sua análise considerando a existência de um instrumento e uma meta. Partindo-se da premissa que a economia encontra-se em recessão, que o único instrumento à disposição da autoridade é a política monetária e admitindo-se a existência de impactos advindos de variáveis exógenas (u), o modelo básico da economia pode ser entendido por (10) ∆Y = α∆M + u s.a. ∆Y*>0. Nesta situação há dois tipos de incerteza: 16 i) a incerteza oriunda do impacto das variáveis exógenas (u) que afetam (Y); e ii) a incerteza da resposta de Y para alguma ação política, sendo necessário a utilização de uma estimativa de α. Portanto, a função de perda neste caso pode ser expressa por (11) L = (∆Y - ∆Y*)2. A relação precisa entre as ações políticas e a variância de Y não é óbvia. Este é o caso quando α é uma variável randômica que é dependente de variáveis não observadas e é correlacionada com u. Destarte, Y é uma variável aleatória com variância dada por: (12) σ2Y = σ2α∆M2 + σ2u + 2ρσασu∆M onde, σ2u e σ2α = variância de u e α, respectivamente; ρ = coeficiente de correlação entre u e α. Por outro lado, deve-se admitir a possibilidade da incerteza de Y como conseqüência do erro de estimativa. Assumindo que os u’s são independentes ao longo do tempo, α não será correlacionado com u para o período de previsão e a equação (12) pode ser reescrita como (13) ~ σ2Y = σ2α(∆M - ∆M )2 + σ2u onde, ~ ∆M = é a média de ∆M para o período de amostra no qual a estimativa de α é baseada. Considerando-se ainda que o coeficiente de resposta é uma variável randômica, a função de perda esperada é obtida pela substituição da equação (10) em (11), ou seja, (14) E(L) = [(∆Y - ∆Y*)2 + σ2Y] = ( a~ ∆M + ~ u – Y*)2 + σ2α∆M2 + σ2u + 2ρσασu∆M onde, a~ e ~ u = são os valores esperados de Y e u, respectivamente. Diferenciando a equação (14) em relação à ∆M e igualando-se a zero, o valor ótimo 17 de ∆M é9 (15) ∆M* = [ a~ (Y* - ~ u ) - ρσασu]/( a~ 2 + σ2α). Se (α) e (u) são independentes, a equação (15) pode ser reescrita de forma a expressar o tempo de resposta entre ~ u e Y* oriundo da ação política sendo dependente apenas da variação de α, ou seja, (15.1) ∆M* = g/(1 + V2) onde, g = o tempo esperado, (Y* - ~ u )/ a~ ; e V = coeficiente de variação de α, σα/ a~ . Brainard (1967) salienta que o hiato existente não deve ser interpretado como a diferença entre a política executada no último período e qual deveria ser feita de forma que o valor esperado de Y seja igual a Y*. No caso do valor esperado de (α) e (u), assim como o desvio padrão de (α), permanecerem constantes por diversos períodos, a política ótima também deveria permanecer sem alterações. Por outro lado, no caso de erros de previsão, o hiato consiste na diferença entre o valor médio da política contida na amostra para estimar (α) e o ∆M que torna Y igual a Y*. Neste caso, se o parâmetro (α) for reestimado para cada período e o valor esperado de (u) permanecer o mesmo, a política deveria ser continuamente revista, de forma que o o valor de Y se aproxime de Y*. Quando (α) e (u) não são independentes, o responsável pela política deve levar em consideração a covariância entre o impacto da ação política e as variáveis exógenas. Se houver uma correlação positiva o valor de Y deve ser mais baixo que a média, ao passo que uma correlação negativa implica um valor mais elevado.10 9 Os cálculos para a obtenção do resultado encontram-se no apêndice (1.A.3). Deve-se destacar que “(...) if α and u have sufficiently large positive correlation and there is a negative gap, it may actually pay for the policy-maker to go the ‘wrong’ way!” (Brainard, 1967, p. 416) 10 18 Além do tratamento do caso de incerteza para um instrumento e uma meta, Brainard (1967) desenvolveu uma análise com o objetivo de mostrar que todos os instrumentos à disposição da autoridade política deveriam ser utilizados para alcançar uma determinada meta. A estrutura apresentada a seguir é uma alternativa às estruturas apresentadas por Tinbergen (1952) e Mundell (1960), em que para a consecução de (n) metas são necessários (n) instrumentos e que no caso de haver excedente de instrumentos é válido o princípio da classificação efetiva de mercado. A equação a seguir mostra a relação entre os instrumentos disponíveis e a meta pretendida pela autoridade política (16) ∆Y = α1∆G + α2∆M + u sujeita à restrição dada por (11). Fazendo-se a diferenciação do valor esperado para a função de perda (equação 14) em relação à ∆G e ∆M, as condições para a política ótima passam a ser11 (17.A) (∆G + ∆M + u - Y*) + σα12∆G + ρ12σα1σα2∆M = 0 (17.B) (∆G + ∆M + u - Y*) + σα22∆M + ρ12σα1σα2∆G = 0 onde ρ12 = correlação entre α1 e α2. A partir da razão12 (18) ∆G/(∆G + ∆M) = (σ2α2 -ρ12σα1σα2)/(σα12 - 2ρ12σα1σα2 + σα22), obtém-se a proporção no qual o responsável pela política deveria utilizar os dois instrumentos, uma vez que tal combinação minimiza o coeficiente de variação do impacto combinado. 11 12 As derivações para as condições da política ótima encontram-se no apêndice (1.A.4). Os cálculos necessários para o resultado obtido encontram-se no apêndice (1.A.5). 19 De acordo com Brainard (1967, p. 422) “the evaluation of the impact of any particular change on the effectiveness of policy is extremely difficult”. Como forma de contornar esta dificuldade Brainard fez uso da teoria do portfolio. “The policy-maker is the portfolio manager, and the instruments are the assets. But the objectives of the policy-maker are more complex than those of a wealth-owner. The wealth-owner is trying to maximize expected return for a given amount of risk and then to choose her most desirable efficient combination of return and risk. The policy-maker has a number of incommensurable policy-maker variables, not just one, and has to weigh the expected values and risks of all of them” (Tobin, 1996, p. 404-405). Na análise em consideração, admita uma mudança estrutural devido à alteração na distribuição dos parâmetros αi e u. No caso de um único instrumento13 o efeito de uma mudança estrutural sobre a função de perda, pode ser encontrado pela substituição do valor da política ótima (expresso em termos de α, σα, ρ, u etc.) na equação (14). De forma alternativa, as conseqüências de uma mudança estrutural podem ser observadas pela substituição de ∆M por (Y-u)/α na equação (12) donde se obtém (19) σ2Y = (σ2α/a2)(Y - u) + 2(ρσασu/α)(Y - u) + σ2u. Logo, uma mudança estrutural não afeta o coeficiente de variação de α não alterando, por conseguinte, a perda esperada resultante da política ótima. Além disso, observa-se que um aumento do coeficiente de variação (considerando ρ=0) resulta em um locus de oportunidade com uma variância maior para cada valor de Y. Portanto, o aumento do coeficiente de variação indica uma redução na eficácia da política.14 13 Está sendo assumido que as mudanças estruturais afetam apenas o efeito das ações políticas, não tendo efeito sobre o valor esperado ou dispersão do termo de distúrbio, e que as correlações entre os coeficientes de impacto político e de distúrbio permanecem constantes. 14 Brainard dá como exemplo para este resultado, o argumento de que o aumento na reserva exigida pelos bancos reduz a expectativa de resposta para uma dada mudança na reserva, tendo por conseqüência um aumento no controle monetário. 20 Se for levado em consideração a possibilidade do impacto do instrumento político e de (u) ser diferente de zero, o resultado obtido anteriormente não sofre alterações significativas. Por meio da equação (19) verifica-se que um aumento de σα altera o locus de oportunidade. É importante salientar a possibilidade de haver um resultado paradoxal no caso de uma maior dispersão na resposta tornar a política mais efetiva para algum conjunto de valores de u e σu. Este resultado é conseqüência de que é possível reduzir a variância de Y abaixo de σu quando (u) e (α) estão correlacionados. Considere o caso onde (α) e (u) apresentam correlação positiva e u<Y*. “In this case a reduction in risk can be obtained (...) by setting Y even further from Y* than u. Suppose that the optimal policy initially involves going in the counterintuitive direction in order to take advantage of such risk reduction. With a larger σα the same reduction in risk can be obtained without pushing Y as far away from Y*; hence it will result in a higher expected utility [lower expected loss].” (Brainard, 1967, p. 424) As conseqüências de mudança estrutural para o caso de múltiplos instrumentos é muito próxima ao de um único instrumento. Se a mudança estrutural não afetar o coeficiente de variação para os instrumentos, ou a distribuição dos distúrbios, o locus de oportunidade não sofre alteração. Por outro lado, se o coeficiente de variação de um instrumento aumentar, admitindo-se que a correlação entre αi e u é igual a zero, o coeficiente de variação da política ótima pode ser encontrado, o que permite a análise da mesma forma como no caso de um único instrumento. 1.4. Escolha Ótima dos Instrumentos da Política Monetária em um Modelo Estocástico William Poole (1970), em um clássico artigo, demonstrou que apesar do valor esperado do produto real, em princípio, possa ser obtido pela manipulação do estoque de 21 moeda ou da taxa de juros, a acurácia para a consecução da meta depende do instrumento utilizado. “In the Poole model, the policy rule in question is the central bank’s supply of money in response to a short-term interest rate. The central bank does not know whether an observed increase in the interest rate is the result of strength in the goods market (upward IS shift) or of an increased demand for money (inward LM shift). Accommodation is desirable in the latter case but not in the former. The coefficient of the interest rate in the central bank’s supply curve can be chosen so as to minimize the variance of national output.” (Tobin, 1996, p. 409) Poole (1970) inicia sua análise com uma versão do modelo IS-LM tendo as seguintes equações expressas em termos reais (20) Y = a0 + a1r, a1 < 0 (IS) (21) M = b0 + b1Y + b2r, b1 > 0, b2 < 0 (LM). A política monetária pode fazer uso de (M) ou (r) como instrumento político de forma que se tenha duas variáveis endógenas e uma variável exógena (o instrumento político). Em outras palavras, a autoridade monetária pode fazer a opção entre a taxa de juros ou o estoque de moeda como instrumento de política, mas não pode utilizar ambos. Fazendo-se a substituição das equações: (20) em (21), (21) expressa para (r) em (20), e de (20) em (21) expressa para (r); encontra-se respectivamente (22) M = b0 + a0b1 + (a1b1 + b2)r (23) Y = (a1b1 + b2)-1 [a0b2 + a1(M – b0)] (24) r = (a1b1 + b2)-1 [M – b0 – a0b1)]. Considerando-se Y* como a renda real desejada, a partir da equação (20) e (21) pode-se obter os valores ótimos para os instrumentos, ou seja, (25) r* = a-1 (Y* -a0) 22 (26) M* = a1-1[Y*(a1b1 + b2) – a0b2 + a1b0]. Adicionando-se um termo estocástico às equações (20) e (21), para que se possa considerar a possibilidade de choques aleatórios na demanda agregada (IS) ou na demanda por moeda (LM), encontra-se (27) Y = a0 + a1r + u (28) M = b0 + b1Y + b2r + v onde, (u) e (v) = termos sem correlação serial com média tendendo a zero. E(u) = E (v) = 0 E(u2) = σu2; E(v2) = σv2 E(uv) = σuv = ρuvσuσv. Admitindo-se que o objetivo da autoridade consiste em encontrar uma política que estabilize a produção da melhor forma possível, pode-se expressar este objetivo em termos formais fazendo-se uso de uma função de perda quadrática para minimizar o desvio do produto em relação à meta desejada, ou seja, (29) L = E[(Y – Y*)2]. Pode-se observar que se a taxa de juros for o instrumento, o resultado ótimo é obtido quando r=r* (equação 25). Por outro lado, se o estoque de moeda é o instrumento, o mínimo da função de perda é obtido quando M=M* (equação 26). O ponto a ser destacado é que uma vez selecionado o instrumento, a política ótima no modelo estocástico é idêntica ao caso determinista. Deve-se salientar que no caso estocástico as formas reduzidas (equações 30 e 31), para a taxa de juros e estoque de moeda, considerando-se que os termos aleatórios dependem de qual instrumento é selecionado, implica que as políticas não são equivalentes como no caso determinista. (30) Y = a0 + a1r + u 23 = Y* + u quando r = r* Y = (a1b1 + b2)-1 [a0b2 + a1(M – b0) + b2u – a1v] (31) = Y*+ (a1b1 + b2)-1(b2u – a1v) quando M = M*. Fazendo-se a substituição das equações (30) e (31) na função de perda, obtém-se o mínimo esperado de perda para uma política de taxa de juros e para uma política de estoque de moeda, isto é, (32) Lr = σu2 (33) LM = (a1b1 + b2)-2(a12σv2 - 2ρuva1b2σuσv + b22σu2) e onde b2 = elasticidade-juro da demanda por moeda. ∂LM/∂b2 = 2a1(a1b1+b2)-3σuσv[b2(b1σu/σv + ρuv) – a1(σv/σu + b1ρuv)].15 (34) se (b1σu/σv + ρuv) < 0, então ∂LM/∂b2 > 0 quando b2 < 0. A equação (34) implica que quanto mais alta for a elasticidade-juros da demanda por moeda (menor b2) menor é a expectativa de perda resultante de uma política de estoque de moeda. Este resultado implica que quando (ρuv<0) há uma tendência à distúrbios nos dois setores para serem simultaneamente expansionistas ou contracionistas. Além disso, há uma propensão à σv ser maior que b1σu. Sob estas condições, verifica-se que o efeito sobre a renda oriundo de grandes distúrbios no setor monetário é menor levando a uma maior elasticidade-juros da demanda por moeda. Outro ponto salientado por Poole (1970), no que se refere à elasticidade-juros, é que em geral, o valor mínimo de LM não é zero e que b2 deve ser negativo. A 15 Os cálculos para a elasticidade-juro da demanda por moeda encontram-se no apêndice deste capítulo (1.A.6). 24 conseqüência desta observação é que em alguns casos uma pequena elasticidade-juros da demanda é melhor que nenhuma. Obtendo-se a razão para as perdas esperadas da política de estoque de moeda e da taxa de juros encontra-se, (35) LM/Lr = (a1b1 + b2)-2(a12σv2/σu2- 2ρuva1b2σv/σu + b22) = (a1b1 + b2)-2[(a1σv/σu + b2)2 – 2a1b2σv/σu(1+ ρuv)] ≤ (a1b1 + b2)-2[(a1σv/σu + b2)2. A partir da equação (35) pode-se verificar que no caso de (σv/σu < b1) a razão LM/Lr será menor que um, o que permite dizer que uma política de controle do estoque de moeda é superior a uma política de juros. “Whether or not this view on the superiority of a money stock policy is correct, the point remains that in a stochastic world one policy may be superior to the other depending on the values of the structural parameters and of the variances of the disturbances.” (Poole, 1970, p. 207) Vale lembrar que no modelo estocástico há equivalência da certeza no sentido de decisão, mas não no sentido de utilidade. Qualquer que seja o instrumento selecionado, a decisão ótima é a mesma tanto no modelo estocástico quanto no de certeza. Entretanto, o modelo estocástico apresenta resultado diferente no caso do nível de desutilidade ser zero no modelo de certeza, mas diferente de zero e dependente da escolha dos intrumentos no modelo estocástico. No caso da política monetária é razoável que se considere o tempo de resposta das decisões adotadas quanto às variações do estoque de moeda ou da taxa de juros 25 sobre o produto.16 Nesse sentido, é importante especificar a natureza das defasagens. Se as decisões de produção, consumo e demanda por moeda são feitas em um único período, o resultado é equivalente ao das equações (27) e (28) (36) Yt+1 = a0 + a1rt + ut+1 (37) Mt = b0 + b1Yt+1 + b2rt + vt+1. A análise aqui realizada apresenta como principais resultados o fato de que se as autoridades fixarem a oferta de moeda, a função LM irá flutuar em resposta aos choques de demanda por moeda, tendo por resultado variações no produto. Por outro lado, se a taxa de juros estiver fixa, a oferta de moeda compensará de forma automática a variação da demanda por moeda. Nesse sentido, se a economia estiver sujeita a choques LM a taxa de juros se constitui um melhor instrumento de política. Foi contemplado no modelo a possibilidade de tanto a LM quanto a IS variarem de forma inesperada, o que implica a necessidade de se levar em consideração qual a proporção de incerteza que pode ser atribuída aos deslocamentos da IS e qual a proporção da LM. O resultado encontrado implica que quando a variação de IS é dominante a política de estoque de moeda é superior ao da taxa de juros. Em contrapartida, quando a variação da LM é dominante a taxa de juros é a melhor política. 16 Poole em seu artigo acha estranho que a função de demanda por moeda no período atual, seja capaz de determinar o nível de renda do próximo período por meio dos planos de produção feitos previamente. Na verdade, não há motivo de estranheza para este resultado, Keynes no final dos anos trinta explica o porquê deste resultado pelo chamado motivo finanças de demanda da moeda. “[The finance motive] ...was a midway between the demand for active balances, such as the transactionary demand for money, and inactive balances, such as the precautionary and the speculative demands. The finance motive was related to out-of-routine expenditures, such as investments, for which some preparation was deemed necessary by agents.” [Carvalho (1992), p. 94] 26 Apêndice 1.A.1. Determinação dos Instrumentos Condicionados à s Metas Desejadas (1.A.1) T*1 = α1I1 + α2I2 ⇒ α1I1 = T*1 - α2I2 ⇒ I1 = (T*1 - α2I2)/α1 (1.B.1) T*2 = β1I1 + β2I2 ⇒ b1I1 = T*2 - β2I2 ⇒ I1 = (T*2 - β2I2)/β1 ⇒ (T*1 - α2I2)/α1 = (T*2 - β2I2)/β1 β1T*1 - β1α2I2 = α1T*2 - α1β2I2 β1T*1 - α1T*2 - β1α2I2 + α1β2I2 = 0 β1T*1 - α1T*2 + I2 (-β1α2 + α1β2) = 0 I2(-β1α2 + α1β2) = α1T*2 - β1T*1 I2 = (α1T*2 - β1T*1)/(α1β2 - β1α2) I2 = (T*1 - α1I1)/α2 = (T*2 - β1I1)/β2 ⇒ β2T*1 - β2α1I1 = α2T*2 - α2β1I1 β2T*1 - α2T*2 - β2α1I1 + α2β1I1 = 0 β2T*1 - α2T*2 - I1(β2α1 - α2β1) = 0 β2T*1 - α2T*2 = I1(β2α1 - α2β1) I1 = (β2T*1 - α2T*2)/(α1β2 - β1α2) 27 1.A.2. Ausência de Independência Linear dos Instrumentos de Política Econômica (Caso Curva de Phillips) Fazendo-se uso das equações (3.A), (3.B), (6.A) e (6.B) (3.A) Y = α1G + α2M (3.B) π = β1G + β2M (6.A) Y = α1G + β2M (6.B) π = βY β1 = gα1 e admitindo-se que e β2 = gα2 é fácil verificar que tanto α1/β1 quanto α2/β2 são iguais a 1/g, o que por sua vez não satisfaz o requisito da independência linear entre os instrumentos. gY = β1G + β2M Y = (β1G + β2M)/g (β1G + β2M)/g = α1G + α2M β1G + β2M = gα1G + gα2M β1G = gα1G β2M = gα2M β1 = gα1 β2 = gα2 α1/β1 = 1/g α2/β2 = 1/g Portanto, se a única forma pela qual a política monetária e a política fiscal influenciam a determinação da taxa de inflação é por meio da variação no produto, tentar atingir simultaneamente uma meta para o nível de produto e para a taxa de inflação torna-se inviável, uma vez que quando a meta da produção for atingida, a meta da taxa de inflação não pode ser alcançada de forma independente. 28 1.A.3. O Valor Ótimo de ∆M* E(L) = ( a~ ∆M + ~ u – Y*)2 + σ2α∆M2 + σ2u + 2ρσασu∆M = ( a~ 2∆M2 + u2 + Y2 + 2 a~ ∆Mu - 2 a~ ∆MY – 2uY) + σ2α∆M2 + σ2u + 2ρσασu∆M dE(L)/dP = 2∆M a~ 2 + 2 a~ u - 2 a~ Y + 2∆Mσ2α + 2ρσασu = ∆M a~ 2 + a~ u - a~ Y + ∆Mσ2α + ρσασu ∆M a~ 2 - a~ (Y – u) + ∆Mσ2α + ρσασu = 0 ∆M( a~ 2 + σ2α) = a~ (Y – u) - ρσασu ∆M = [ a~ (Y – u) - ρσασu]/( a~ 2 + σ2α) 1.A.4. Condições para a Política Ótima E(L) = [(Y – Y*)2 + σ2Y] = α12∆G2 + α22∆M2 + u2 + Y2 + 2α1α2∆G∆M + 2α1u∆G - 2α1Y*∆G + 2α2u∆M - 2α2Y*∆M – 2uY* + σα12∆G2 + σα22∆M2 + σu 2 + 2ρ12σα1σα2∆G∆M + 2ρ1σα1σu∆G + 2ρ2σα2σu∆M Para efeito de simplificação foi assumido que a correlação entre cada αi e u é igual a zero, o que implica E(L) = α12∆G2 + α22∆M2 + u2 + Y2 + 2α1α2∆G∆M + 2α1u∆G - 2α1Y*∆G + 2α2u∆M - 2α2Y*∆M – 2uY* + σα12∆G2 + σα22∆M2 + σu 2 + 2ρ12σα1σα2∆G∆M dE(L)/d∆G = 2α12∆G + 2α1α2∆M + 2α1u - 2α1Y* + 2σα12∆G + 2ρ12σα1σα2∆M = [α1(α1∆G + α2∆M + u - Y*)] + σα12∆G + ρ12σα1σα2∆M dE(L)/d∆M = 2α22∆M + 2α1α2∆G + 2α2u - 2α2Y* + 2σα22∆M + 2ρ12σα1σα2∆G 29 = [α2(α2∆M + α1∆G + u - Y*)] + σα22∆M + ρ12σα1σα2∆G Assumindo-se por conveniência que os αi associados à cada instrumento político são iguais a 1 ⇒ (∆G + ∆M + u - Y*) + σα12∆G + ρ12σα1σα2∆M = 0 (∆G + ∆M + u - Y*) + σα22∆M + ρ12σα1σα2∆G = 0 1.A.5. Razão ∆G/(∆ ∆G + ∆M) (∆G + ∆M + u - Y*) + σα12∆G + ρ12σα1σα2∆M = 0 (∆G + ∆M + u - Y*) + σα22∆M + ρ12σα1σα2∆G = 0 ∆G = [σα2(ρ12σα1 - σα2) (Y – u)]/[ρ122σα12σα22 + 2ρ12σα1σα2 - σα22(σα12 + 1) - σα12] ∆M = [σα1[ρ12σα2(σα22 + 1) - σα1σα22](Y – u)] / [[ρ122σα12σα22 + 2ρ12σα1σα2 - σα22(σα12 + 1) - σα12]( σα22 + 1)] ∆G/(∆G + ∆M) = [[σα2(ρ12σα1 - σα2) (Y – u)]/[ρ122σα12σα22 + 2ρ12σα1σα2 - σα22(σα12 + 1) - σα12]] / [[σα2(ρ12σα1 - σα2) (Y – u)]/[ρ122σα12σα22 + 2ρ12σα1σα2 - σα22(σα12 + 1) - σα12] + [σα1[ρ12σα2(σα22 + 1) - σα1σα22](Y – u)]/[[ρ122σα12σα22 + 2ρ12σα1σα2 - σα22(σα12 + 1) - σα12]( σα22 + 1)]] = [σα2(ρ12σα1 - σα2)]/(2ρ12σα1σα2 - σα22 - σα12) = (σ2α2 -ρ12σα1σα2)/(σα12 - 2ρ12σα1σα2 + σα22) 30 1.A.6. Elasticidade-Juro da Demanda por Moeda (33) LM = (a1b1 + b2)-2(a12σv2 - 2ρuva1b2σuσv + b22σu2) ∂LM/∂b2 = = -2(a1b1 + b2)-3(a12σv2 - 2ρuva1b2σuσv + b22σu2) + (2b2σu2 - 2ρuva1σuσv)(a 1b1 + b2)-2 = 2(a1b1 + b2)-3[-(a12σv2 - 2ρuva1b2σuσv + b22σu2) + (b2σu2 - ρuva1σuσv)(a 1b1 + b2)] = 2(a1b1+b2)-3(-a12σv2+2ρuva1b2σuσv-b22σu2+a1b1b2σu2 - ρuva12b1σuσv + b22σu2 - ρuva1b2σuσv) = 2a1(a1b1+b2)-3(-a1σv2 + 2ρuvb2σuσv - b1b2σu2 - ρuva1b1σuσv - ρuvb2σuσv) = 2a1(a1b1+b2)-3(-a1σv2 + 2ρuvb2σuσv - ρuva1b1σuσv + b1b2σu2) = 2a1(a1b1+b2)-3σuσv[b2(b1σu/σv + ρuv) – a1(σv/σu + b1ρuv)] 31 2. A Coordenação de Políticas: O Modelo de Nordhaus 2.1. Coordenação e Independência das Políticas Monetária e Fiscal “One of the major implications of separated powers is seen in the mix of monetary and fiscal policies that is found in major countries today. Policymakers and economists in virtually all countries with separated monetary and fiscal policies believe that their countries suffer from fiscal deficits and real interest rates that are too high to promote a health level of private investment and adequate long-term growth of potential output. This syndrome an unfavorable and undesirable monetary-fiscal mix has been a feature of the macroeconomic landscape for more than a decade. (...) I call this syndrome the monetary-fiscal game to reflect the fact that monetary and fiscal policies in many large countries are substantially independent and have conflicting objectives.” (Nordhaus, 1994, p. 139) Do ponto de vista macroeconômico, a política econômica pode ser dividida em dois instrumentos básicos: a política monetária e a fiscal.17 Ao longo das décadas de 80 e 90 a maioria das nações passaram a se concentrar na busca da estabilidade de preços. A principal estrutura utilizada para a consecução deste objetivo tem sido a separação da função monetária de outras instituições fiscais do governo. Assim, a análise sobre o comportamento da política macroeconômica pode ser realizada por meio de um jogo monetário-fiscal.18 As hipóteses inerentes ao modelo são: o jogo é realizado no curto termo em um único período (que corresponde ao eleitoral) com ênfase na diferença de impacto das políticas monetária e fiscal sobre a inflação, o desemprego e a taxa de crescimento do produto potencial. A autoridade monetária é a responsável pela política monetária tendo a 17 Isto não significa que há uma negação aos instrumentos microeconômicos, tais como política comercial, a estrutura de impostos, etc., entretanto, para a análise pretendida, as implicações provindas desses instrumentos podem ser desconsiderados sem prejuízo. 18 Para uma leitura sobre aplicações envolvendo teoria dos jogos, ver Binmore & Dasgupta (1986), Simonsen (1989), Bierman & Fenandez (1993) e Gibbons (1997). 32 taxa de juros (r) como principal instrumento; e cabe à autoridade fiscal a obtenção de um superávit fiscal (S). É assumido que as duas autoridades políticas tem preferências sobre a inflação (p), desemprego (u), e o crescimento do produto potencial (g); e que ambas as autoridades desejam menores níveis de desemprego e inflação que a atual. Ademais, é considerado a tendência da autoridade fiscal incorrer em déficits elevados e que a autoridade monetária não fixa a taxa de juros com o compromisso de assegurar o superávit do governo. Destarte, as preferências das autoridades podem ser expressas como (1) UF = VF(u, p, g, S), (2) UM = VM(u, p, g), onde U = nível de utilidade da autoridade política (F = fiscal; M = monetária); V = função de preferência. A taxa de desemprego é a medida da utilização de recursos (produto potencial atual) sendo função das duas políticas e de variáveis exógenas (estoque de capital, tecnologia e produto estrangeiro). Ou seja, (3) u = u(r, S; ...).19 O modelo assume que a taxa de inflação é uma função do nível de utilização de recursos (a taxa de desemprego) e a taxa esperada da inflação (pe), isto é, (4) p = p(u) + pe (5) pe = wp + (1-w)pB, onde, pB = taxa de inflação passada; e w= parâmetro. Fazendo-se a substituição da equação (5) em (4) obtém-se 19 As reticências na equação indicam que muitas variáveis estão fixas para o período por se tratar de um modelo de curto termo. 33 (6) p = p(u)/(1-w) + pB,20 (6’) u = un, para w=1. para 1 > w ≥ 0; e A taxa de crescimento do produto potencial é uma variável endógena determinada, no curto termo, pela taxa de investimento [taxa de poupança privada adicionada à taxa de poupança do governo (S)].21 Por conseguinte, a terceira meta de política pode ser reduzida à função de poupança do governo, g = g(S). Combinando-se as equações (3) e (6) com as equações (1) e (2), as preferências podem ser reescritas como: (7) UF = VF{u(r, S; ...), p[u(r, S; ...)]/(1-w) + pB, g(S), S} = UF(r, S), (8) UM = VM{u(r, S; ...), p[u(r, S; ...)]/(1-w) + pB, g(S)} = UM(r, S). Levando-se em conta a interpretação novo-clássica, sabe-se que u=un, o que permite reescrever as equações (7) e (8) como (7’) UF = VF[un, p(r, S; ...), g(S), S} = UF(r, S), (8”) UM = VM[un, p(r, S; ...), g(S)] = UM(r, S). O gráfico 2.1 mostra a estrutura básica do modelo. Os eixos são os instrumentos políticos representados pelo superávit fiscal (S) e a taxa real de juros (r). Os círculos representam os pontos ótimos (bliss point) fiscal e monetário dado a restrição imposta às 20 A equação (6) representa a interpretação novo-clássica no qual o produto e o desemprego não são afetados pela política monetária e fiscal. Por conseguinte, a taxa de desemprego que vigora na economia é a natural (un). 21 Para efeito de simplificação, é considerado que a taxa de poupança do setor privado não é afetada pela política monetária ou fiscal, tal que a taxa de investimento é igual a taxa de poupança privada adicionada à S. 34 duas autoridades políticas. Em cada caso, o ponto representa o máximo da função de preferência (equações 7 e 8) sujeita à restrição imposta pelas equações (3 a 6). Os pontos a nordeste representam uma menor demanda agregada. As elipses em torno de cada ponto representam o contorno de indiferença da autoridade política.22 Gráfico 2.1: Estrutura do jogo monetário-fiscal superávi t fiscal M contorno de indiferença da autoridade monetária ótimo monetário taxa de juros S = F curva de contrato contorno de indiferença da autoridade fiscal ótimo fiscal Fonte: Nordhaus (1994), p. 147. As curvas com inclinação negativa M e F representam as políticas utilizadas pelas autoridades para determinar o nível ótimo da demanda agregada. A curva M mostra a combinação de r e S que gera a demanda agregada ótima para a autoridade monetária, enquanto que a curva F permite a obtenção do ótimo para a autoridade fiscal. Conforme pode ser observado pelo gráfico 2.1, os pontos ótimos divergem quanto à interseção da linha de demanda agregada e o nível desejado do superávit fiscal. Observa-se que a autoridade monetária, com o objetivo de conter a inflação, pretende implementar uma contração na demanda agregada maior que a intencionada pela autoridade fiscal no 22 Pontos internos à elipse são preferíveis aos externos. 35 alcance do superávit. Portanto, a autoridade fiscal tem uma tendência a buscar uma solução de maior demanda agregada, o que revela aversão à taxas de desemprego elevadas e propensão a rolar déficits fiscais. Dada a preferência das duas autoridades, o resultado macroeconômico será determinado pela extensão da cooperação ou independência entre elas. A primeira hipótese a ser considerada é a de cooperação (compromisso assumido entre as duas autoridades), onde a linha entre os pontos ótimos no gráfico 2.1 representa a curva de contrato que mostra o locus da taxa de juros e a posição fiscal que determinam em conjunto a implementação das políticas monetária e fiscal. É provável, que a autoridade fiscal (que representa o governo na análise) tenha um peso maior nas discussões que a autoridade monetária. Assim, o resultado deve se localizar próximo ao ponto ótimo fiscal, o que denota a presença de maior inflação e déficits além de indicar uma tendência contra recessões no curto prazo. 2.2. Equilíbrio Não-Cooperativo Em diversos países industrializados, a política monetária e fiscal são separadas, ficando sob responsabilidade da autoridade monetária (na maioria dos casos um banco central independente - BCI) conduzir a política monetária de forma que seja obtida a estabilidade de preços. Esta situação pode ser entendida por meio de um jogo de soma zero com dois agentes. Cada jogador, M e F, decidem sua política levando em conta a política do outro.23 23 É assumido que o jogo é realizado em um único lance. 36 É considerado que cada autoridade política se comporta de forma não-cooperativa e que não há mudança na decisão política tomada, portanto, a solução a ser obtida corresponde a um equilíbrio de Nash.24 O gráfico 2.2 descreve como a autoridade monetária responde à fiscal e vice-versa.25 Ambas as autoridades políticas reagem ao estado da economia (inflação, desemprego e crescimento no produto potencial). A partir das preferências adotadas, verifica-se que a função de reação da autoridade monetária (que coincide com a curva de demanda agregada) não depende das preferências da autoridade fiscal se for seguida uma estratégia de Nash; e que a função de reação fiscal (que passa através do ótimo fiscal) é menos inclinada que a curva de demanda agregada (F). Ademais, observa-se que o ponto N dado pelo intercepto das curvas de reação fiscal e monetária representa o equilíbrio de Nash. Gráfico 2.2: Funções de reação e equilíbrio não-cooperativo M superávi t fiscal ótimo monetári o F regra de equilíbr io S = 0 taxa de juros R curva de indiferença fiscal ótimo fisca l função de reação fiscal N equilíbrio de Nash Fonte: Nordhaus (1994), p. 150. 24 O apêndice (2.A.1) deriva as principais proposições para as funções de reação para o caso de uma função de utilidade quadrática em que são levadas em consideração as preferências presentes nas equações 7 e 8. Os resultados obtidos indicam que cada função de reação tem inclinação negativa; a inclinação da função de reação monetária é mais inclinada que a função de reação fiscal; e as políticas ótimas indicam que a autoridade monetária alcança uma solução ótima melhor que a autoridade fiscal. 25 É importante ressaltar que esta é apenas uma função de reação implícita. 37 As principais características do resultado não-cooperativo podem ser sumariadas em dois pontos: i) déficit maior do que o desejado - este resultado é oriundo do conflito de diferentes objetivos. A tentativa da autoridade fiscal em obter um menor desemprego provoca um aumento do déficit; o que por conseguinte, leva a autoridade monetária aumentar a taxa de juros para combater a inflação; ii) a inflação e temporariamente o desemprego são afetados pela mudança de uma solução cooperativa para uma não-cooperativa – o gráfico 2.1 mostra que a solução cooperativa situa-se na curva de contrato com um resultado para a demanda agregada entre os níveis ótimos da autoridade monetária e fiscal. Entretanto, uma vez que o jogo move-se para um equilíbrio de Nash não-cooperativo, o nível de demanda agregada é determinado pela autoridade monetária, que é mais restritiva e antiinflacionária que a autoridade fiscal.26 2.3. Uma Regra Monetária Considerando um jogo monetário-fiscal que se realiza de forma repetida, e que a autoridade monetária adota uma estratégia transparente (uma meta para o produto equivalente ao ponto M no gráfico 2.2), o gráfico 2.2 pode ser usado para obter uma regra de equilíbrio. Partindo-se do pressuposto de que a regra utilizada pela autoridade monetária é crível, a autoridade fiscal otimiza levando em consideração a regra monetária, e então define o nível de superávit fiscal que lhe proporciona o mais alto nível 26 Este resultado sugere que países que adotam um BCI deveriam possuir menor inflação do que países com bancos centrais dependentes. 38 de utilidade. A solução deste caso resulta no equilíbrio representado pelo ponto R (vide gráfico 2.2). Ou seja, a utilização da regra implica; - uma melhora para as autoridades fiscal e monetária no qual há um aumento do nível de utilidade de ambos; - menor taxa de juros, e portanto, maior investimento do que a solução de equilíbrio nãocooperativo; e - a regra monetária melhora a utilidade, mas não afeta a inflação ou o desemprego porque a função de reação da autoridade monetária corresponde à curva de demanda agregada. 2.4. Dinâmica e Efeitos das Estratégias de Redução do Déficit Partindo-se de uma situação desfavorável para o mix fiscal-monetário e que há a expectativa de que a regra monetária provocaria uma expansão monetária capaz de compensar uma contração fiscal, o principal problema a ser considerado refere-se à defasagem com que os efeitos oriundos da política monetária são percebidos. Se a autoridade fiscal tem por objetivo implementar uma política que leve à redução do déficit, há a necessidade de serem avaliados se os custos (recessão) que está impondo à sociedade serão compensadores. Para que se possa compreender a dinâmica considere o conjunto de equações utilizado anteriormente (1 a 8) com duas hipóteses adicionais: i) as políticas afetam a economia com atraso de um período; e ii) as autoridades fiscal e monetária agem levando em consideração o estado atual da economia ao invés de previsões do estado futuro (results-oriented policy). O jogo dinâmico monetário-fiscal tem o mesmo equilíbrio que o jogo estático já analisado. Partindo de um equilíbrio inicial, se houver mudanças na política fiscal ou monetária, haverá um desvio no curto termo a partir do equilíbrio de longo termo mostrado 39 nos gráfico 2.1 e 2.2. Por exemplo, admitindo-se que a autoridade fiscal decide implementar uma política de redução do déficit no período 0, isto indica uma provável contração na economia para o período 1. Como conseqüência, a economia voltaria ao nível de produção planejado pela autoridade monetária no período 2. Por sua vez, este resultado implica que a autoridade fiscal reage com uma contração adicional fazendo com que o processo se repita. Gráfico 2.3: Dinâmica da redução do déficit superávi t fiscal função de reação monetári função de reação deficit hawks N** N' N'' S = 0 taxa de juros função de reação deficit doves N* Fonte: Nordhaus (1994), p. 158. O gráfico 2.3 mostra os resultados esquemáticos para a dinâmica da redução do déficit. A linha fiscal mais baixa mostra a função de reação associada a uma menor austeridade fiscal (deficit doves) enquanto que a linha mais alta representa uma maior austeridade (deficit hawks). Considerando-se um jogo de política de resultados orientados, sua dinâmica pode ser compreendida da seguinte forma: a economia parte do equilíbrio de Nash original N* e realiza o movimento indicado pelas setas mostradas no 40 gráfico 2.3. De acordo com esta estrutura, a redução do déficit leva a uma queda da demanda agregada deslocando a economia para o ponto N'. Por conseguinte, a autoridade monetária reduz a taxa de juros e move a economia para o ponto N", o que implica um novo deslocamento da economia para o novo equilíbrio de Nash (N**). Deve-se ressaltar que há uma diversidade de estruturas alternativas que a autoridade fiscal poderia seguir quando confrontada com um jogo não-cooperativo. No caso de uma política previdente, o governo deveria implementar uma política de redução do déficit lenta capaz de tornar o desemprego suportável. Ou como mostrado no gráfico 2.2, o governo deve otimizar escolhendo uma estrutura fiscal que maximize a utilidade do governo sujeito à função de reação do BC.27 Outra possibilidade seria a tentativa de reduzir o déficit de forma a maximizar as chances de reeleição. A principal conclusão a ser observada é que para todas as situações acima, a presença de defasagens e resultados orientados para a política monetária, admitindo-se uma estratégia não-cooperativa de redução do déficit, tende a elevar o desemprego no curto prazo induzindo o BC a participar do jogo. 2.5. Autoridades políticas independentes No caso de uma autoridade monetária dependente é assumido que a política monetária é determinada pela autoridade fiscal, com o objetivo conduzir a economia para o ótimo fiscal. Neste cenário, a questão-chave passa a ser como comparar o ótimo fiscal 27 Esta postura deveria indicar maior redução do déficit e maior desemprego que o equilíbrio de Nash mostrado no gráfico 2.3. 41 com o equilíbrio de Nash do ponto de vista da autoridade monetária. O gráfico 2.4 ilustra a questão por meio de um contorno de indiferença da autoridade monetária (chamado contorno de capitulação - capitulation contour) que passa através do ponto fiscal ótimo. O equilíbrio dentro do contorno representa a situação para a qual a autoridade monetária deveria preferir uma situação não-cooperativa; enquanto que os pontos fora do contorno representam a situação onde a autoridade monetária deveria preferir uma sintonia com a autoridade fiscal. Gráfico 2.4: Independência monetária qual é o custo? superávi t fiscal M ótimo monetári o contorno de capitulação S = 0 taxa de juros N ótimo fisca l função de reação fiscal Fonte: Nordhaus (1994), p. 160. O principal elemento a ser observado é que se o equilíbrio de Nash situar-se fora do contorno de capitulação (como no gráfico 2.4), então a capitulação monetária é 42 superior à independência para ambas as partes.28 Nordhaus (1994) salienta que a estratégia de capitulação é atrativa quando a divergência entre as estratégias de cooperação e não-cooperação é maior quando as curvas das funções de reação são relativamente iguais, mas os pontos ótimos estão distantes. Isto ocorre quando a autoridade fiscal tem pouco interesse em aumentar o déficit e quando há diferença entre as duas autoridades no que se refere à inflação ótima ou à taxa de desemprego. 2.6. Introduzindo Assimetrias Nordhaus (1994) salienta sete casos para a situação em que são considerados na análise economias abertas e outros modelos macroeconômicos. caso 1 – uma nova curva surge se há assimetrias no comportamento de autoridades políticas diferentes. Considere uma resposta assimétrica pela autoridade fiscal (tende a fazer declarações, mas reluta em reduzir os gastos ou elevar impostos). No caso extremo – onde o déficit sempre aumenta – a função de reação da autoridade fiscal tem uma linha horizontal que se desloca para a esquerda na presença de déficit ou superávit.29 Neste caso, a autoridade fixa o déficit enquanto a autoridade monetária reage com uma taxa de juros mais elevada para obter a meta de demanda agregada. caso 2 – no caso monetarista a moeda não pode ser entendida como neutra no curto termo, o que a torna um importante elemento para a determinação da demanda agregada, por outro lado, a política fiscal importa apenas para a composição do produto. Sendo 28 É óbvio que neste caso a inflação será maior que no caso de um BCI, mas o ganho em outros objetivos, tais como crescimento econômico, compensará a perda inflacionária. 29 De acordo com o gráfico 2.5, o equilíbrio tende a se mover para baixo da curva de reação da autoridade monetária. 43 assim, se a taxa de inflação ótima da autoridade fiscal é maior que da autoridade monetária, isto implica que as funções de reação mostradas no gráfico 2.1 e 2.2 não se modificam, e os resultados são idênticos ao do mainstream. Gráfico 2.5: Equilíbrio com política fiscal avessa à impostos superávi t fiscal função de reação monetári N S' S = 0 S' ' taxa de juros S' '' função de reação fiscal simétrica S''' ' Fonte: Nordhaus (1994), p. 162. caso 3 – a estrutura acima assume que salários e preços seguem o princípio aceleracionista da curva de Phillips no qual os responsáveis pela política podem reduzir o desemprego abaixo da taxa natural no curto termo. Há dois elementos sobre a autoridade monetária e fiscal que devem ser considerados: i) se a autoridade fiscal busca a reeleição é provável que suas políticas sejam voltadas para a saúde, crescimento e não-inflação no período anterior às eleições; e ii) a diferença entre as metas de inflação das duas autoridades leva a desacordos sobre o nível de demanda agregada mesmo que concordem quanto à meta de superávit fiscal. 44 caso 4 – considere a variante novo-clássica do modelo. Quando políticas antecipadas afetam a inflação, mas não o desemprego, a linha de demanda agregada determina apenas a taxa de inflação. Tal como no caso 1, os resultados são os mesmos que no mainstream. A diferença é que os resultados são idênticos para a inflação, crescimento econômico, e a composição do produto, enquanto que não há efeito das políticas sobre o desemprego. Se as duas autoridades têm a mesma meta inflacionária, a linha de demanda agregada no gráfico 2.2 deve coincidir e o equilíbrio de Nash é eficiente e coincide com o ótimo fiscal. caso 5 – considere o modelo clássico no qual a moeda é exógena e todos os preços e salários são perfeitamente flexíveis. É admitido que os preços são afetados apenas pela política monetária e que as variáveis reais são afetados apenas pela política fiscal. Não há conflitos políticos aqui, as funções de reação são perpendiculares, e o equilíbrio de Nash é eficiente. caso 6 – considere o caso de uma economia aberta. Neste caso há a necessidade de incorporar a interação entre a política monetária e a taxa de câmbio. Uma importante consideração é o efeito da política fiscal sobre a taxa de câmbio e a renda real. No caso de uma economia fechada, supõe-se que um aumento da poupança doméstica resulta em capital doméstico. Em uma grande economia com taxas de câmbio flexíveis, um aumento na poupança leva à depreciação da moeda, que por sua vez provoca uma aumento da poupança externa. Entretanto, o maior crescimento do produto nacional a partir do aumento da riqueza estrangeira não pode ser entendido como maior consumo potencial, pois as perdas nos termos de troca é inerente à depreciação da moeda. 45 caso 7 - a autoridade fiscal torna-se a responsável pela inflação. Nesta situação, a linha de demanda agregada das duas autoridades deveriam coincidir e o resultado deveria ser a demanda agregada e a política fiscal planejada pelo governo. Em termos do diagrama, as duas autoridades partilham da mesma linha de demanda agregada, mas possuem diferentes pontos ótimos. Como é assumido que a autoridade fiscal tem o controle sobre a política fiscal, a economia tende ao ponto ótimo fiscal. É importante ressaltar que neste caso não há um conflito político e a necessidade de coordenação desaparece.30 30 Uma situação similar, mas não crível deveria ocorrer se a autoridade fiscal se limitar em determinar o déficit cabendo à autoridade monetária determinar o produto, desemprego e inflação. 46 Apêndice 2.A.1. As Funções de Reação31 1) caso de preferências quadráticas no caso não-clássico32 As funções de preferência das duas autoridades políticas são dadas por (A1) UF = VF(u, p, g, S), (A2) UM = VM(u, p, g). Admitindo-se g = g(S), as funções podem ser reescritas, na forma quadrática, da seguinte forma: (A3) UF = -(u – u*)2 - β*(p – p*)2 - γ*(S – S*)2, (A4) UM = -(u – u**)2 - β**(p – p**)2 - γ**(S – S**)2, onde βe γ são parâmetros.33 Fazendo-se a linearização para o caso não-clássico, a economia pode ser sumariada por (A5) u = µSS + µrr, (A6) p = -αu + k = -αµSS - αµrr + k. Neste caso, α e k são parâmetros, µS e µr são multiplicadores de u com relação à S e r, e r é a taxa real de juros. Ademais, a partir da equação (A6), α = -p'(u)/(1 - π) > 0, e k = pB + constantes não essenciais; verifica-se que a maximização da utilidade implica as seguintes condições de primeira ordem: (A7) 31 ∂UF/∂S = -2(u – u*)µS + 2β*(p – p*)αµS - 2γ*(S – S*) = 0, A derivação original das funções a seguir encontra-se em Nordhaus (1994). O caso novo-clássico pode ser derivado da seguinte forma: substitua A5 e A6 por p= -µSS - µrr (onde µS e µr são os multiplicadores da inflação em relação à S e r). Devido ao desemprego ser predeterminado, o coeficiente pode ser admitido como zero na função utilidade. Resolvendo as equações A7 e A8 com estas novas condições, a condição máxima para a autoridade monetária é p = p**. Se a taxa de inflação ótima coincide, então S = S*, o que implica a determinação do déficit pela autoridade fiscal e que o resultado é eficiente. 33 As variáveis com um só asterisco referem-se ao ótimo para a autoridade fiscal sem restrição e aquelas com duplo asterisco correspondem ao ótimo sem restrição para a autoridade monetária. 47 32 (A8) ∂UM/∂r = -2(u – u**)µr + 2β**(p – p**)αµr = 0; que por meio das equações (A5) e (A6) permite encontrar (A9) (u – u*) + β*(u – u+)α2 + γ*(S – S*)/µS = 0, (A9) (u – u**) + β**(u – u++)α2 = 0, onde u+ e u++ são as taxas de desemprego que correspondem às taxas de inflação desejada, p* e p**, respectivamente. Resolvendo-se as políticas ótimas para cada autoridade política encontra-se (A11) µSS + µrr = [u* + β*α2u+ - γ*(S – S*)/µS]/(1 + β*α2), (A12) µSS + µrr = [u** + β**α2u++]/(1 + β**α2). Para efeito de simplificação é admitido que µS = 1 e que φ* = 1/[1 + β*α2] e φ** = 1/[1 + β**α2]. Destarte, encontra-se (A13) S = -µrr + φ*[u* + β*α2u+ - γ*(S – S*)], (A14) S = -µrr + φ**[u** + β**α2u++], o que permite obter a função de reação da autoridade fiscal (A15) SF(r) = -[µr/(1 + φ*γ*)]r + φ*(u* + β*α2u+ + γ*S*)/(1 + φ*γ*) e a função de reação da autoridade monetária como uma função implícita da transparência (A16) S = -µrrM(S) + φ**[u** + β**α2u++]. Ou seja, o superávit da autoridade monetária [SF(r)] é uma função da política monetária e de outras variáveis, enquanto que a taxa de juros (que é definida pela autoridade monetária) é função da política fiscal e de outras variáveis. A curva da função de reação (dada pela elasticidade de S por r) pode ser determinada por (A17) ∂SF/∂r = -µr/[1 + γ*φ*], (A18) ∂S/∂rM = -µr. e 48 Como γ* e φ* são constantes positivas, a curva da função de reação da autoridade fiscal na equação (A17) é menor em valor absoluto do que a da autoridade monetária na equação (A18). Diante do que foi apresentado, observa-se que a localização das funções de reação depende de todos os parâmetros. Os pontos desejados por cada autoridade política pode ser localizado pela interseção da linha de demanda agregada ótima com a posição fiscal ótima. Assumindo-se que a autoridade monetária segue uma estratégia de Nash, isto implica que a função de reação coincide com a linha de demanda agregada, isto é, reflete a combinação da taxa de juros e do superávit fiscal que deveria otimizar a demanda agregada. Em outras palavras, a preferência fiscal do BC não afeta a função de reação do BC. Este resultado é fácil de ser observado na função de reação monetária, uma vez que não há parâmetros que refletem a preferência do BC no que diz respeito ao superávit fiscal. 49 3. Conseqüências da Coordenação Monetária-Fiscal Para o Brasil 3.1. Um Modelo de Coordenação para a Estabilidade de Preços Conforme discutido no capítulo anterior, a coordenação entre a política fiscal e a monetária apresenta bons resultados. Assim, partindo-se de uma estrutura em que há autoridades políticas distintas com instrumentos que podem afetar o mesmo objetivo, passa a ser necessário analisar qual o melhor arranjo entre o governo e o BC capaz de alcançar a meta desejada e ao mesmo tempo minimizar os possíveis custos de coordenação envolvidos nesse tipo de estrutura. A presente seção tem por objetivo demonstrar, por meio de um modelo matemático simples, que o principal instrumento que deve ser utilizado pela autoridade monetária para a busca da estabilidade de preços e evitar flutuações significativas do produto e o emprego, é a taxa de juros. Além disso, incorporando-se as idéias presentes em Brainard (1967) verifica-se que a coordenação entre a política monetária e a fiscal, pela mesma autoridade, representa uma solução ótima para uma determinada meta de preços. Partindo-se da hipótese de que o nível de preços é resultado dos efeitos oriundos do estoque de moeda em circulação (Mt), da taxa de câmbio nominal (Et) e dos impostos indiretos na economia (Tit), o nível de preços é representado por (1) Pt = f1( Mt, Et, Tit) + + + onde, (+) = df1/d(.) > 0; que expresso, por conveniência na forma linear, corresponde a (1.1) Pt = αMt + βEt + θTit onde, α = sensibilidade dos preços em relação à moeda; 50 β = sensibilidade dos preços em relação à taxa de câmbio; θ = sensibilidade dos preços em relação aos impostos indiretos. Deve-se salientar que das variáveis listadas na equação (1) aquelas que sofrem influência direta da autoridade monetária são: o montante de moeda e a taxa de câmbio. Outrossim, é assumido que a autoridade fiscal é a responsável pelas flutuações em Tit. A primeira variável da equação (1.1) remete à relação entre moeda e preços preconizada desde o primórdio da Teoria Quantitativa da Moeda.34 Destarte, para que se possa analisar o mecanismo de transmissão sobre os preços é importante incorporar o equilíbrio no mercado monetário (Mst = Mdt) ao modelo, isto é,35 (2) Mt = f2( Yt, it) + - onde, Yt = produto nominal;36 (-) = df2/d(.) < 0. i = taxa de juros nominal; Admitindo-se que a economia em consideração apresenta crescimento desprezível, o produto pode ser entendido como constante, o que permite reescrever a equação (2) de forma que a demanda por moeda dependa apenas da taxa de juros da economia. Ou seja, (2.1) Mt = -ait onde, a = sensibilidade da demanda de moeda em relação à taxa de juros. 34 De acordo com a Teoria Quantitativa da Moeda uma variação na quantidade de moeda na economia seria capaz de causar uma variação no nível de preços na mesma magnitude. 35 Parte-se do pressuposto de que a oferta de moeda é determinada de forma exógena, isto é, controlada pelo BC. 36 Para efeito de simplificação será assumido que as variações no produto nominal são iguais às variações no volume de transações. 51 No âmbito de uma economia aberta, uma variável importante para a determinação dos preços é a taxa de câmbio. Uma depreciação da taxa de câmbio provoca o aumento do preço dos insumos importados, o que por conseguinte, acarreta um efeito inflacionário na economia. Considerando-se a equação da arbitragem de juros (3) it = i*t + (Eet+1 - Et)/Et onde, i*t = taxa de juros estrangeira; Et = taxa de câmbio corrente; Eet+1 = taxa de câmbio futura esperada; e rearranjando os termos de forma a obter a taxa de câmbio corrente encontra-se (4) Et = Eet+1/(1 + it - i*t). Fazendo-se a substituição das equações (4) e (2.1) em (1.1) obtém-se a equação que explica os preços (5) Pt = α(-ait) + β[Eet+1/(1+ it - i*t)] + θTit. A equação (5) permite verificar a capacidade do BC em determinar o nível de preços. Deve-se ressaltar que o controle sobre a expectativa da taxa de câmbio futura não é perfeito, mesmo que seja assumido a presença de expectativas racionais no modelo, a possibilidade de mudanças no cenário internacional tornam o conjunto de informações disponível insuficiente para que seja feita uma previsão acurada da taxa de câmbio futura. No que se refere aos impostos indiretos não há como o BC controlar esta variável, pois este instrumento é de responsabilidade da autoridade fiscal. Portanto, o principal instrumento à disposição da autoridade monetária é a taxa de juros. De acordo com a equação (5), para que a proposição de meta natural da autoridade monetária pela busca da estabilidade de preços, preconizada pelos defensores de um BCI, seja razoável, é necessário que os efeitos oriundos da expectativa da taxa de 52 câmbio futura, da taxa de juros internacional e dos impostos indiretos sejam insignificantes. No caso da taxa de câmbio essa seria a situação em que vigora na economia um regime de câmbio fixo onde o montante de reservas em moeda estrangeira encontra-se em um nível capaz de neutralizar qualquer possibilidade de um ataque especulativo. Assim, a taxa de câmbio seria uma constante, isto é, Et = Eet+1. Considerando-se o cenário em que as variáveis que perturbam o controle dos preços pela autoridade monetária não se manifestam, isto é, admitindo-se Et = 1, Tit = 0 e i*t = 0, a equação (5) é expressa por (6) Pt = α(-ait) + β/(1+ it). Como é fácil de observar, o resultado obtido não é suficiente para afirmar que a adoção de uma meta para preços sob responsabilidade do BC seja a adequada. Houve a necessidade de se inserir um conjunto de hipóteses muito restritivo para que a autoridade monetária tivesse a capacidade de controlar os preços. Portanto, qualquer economia que se encontre fora desse caso especial, implica que o BC não possui controle perfeito sobre a variável preço, o que por conseguinte, levanta dúvidas quanto à sua capacidade em assegurar a estabilidade de preços da economia. Além de analisar qual a capacidade do BC na determinação do nível de preços é necessário verificar quais as possibilidades do BC interferir no produto da economia.37 Partindo-se da identidade básica de determinação da renda em uma economia aberta, (7) 37 Yt = C(Yt, rt) + I(Yt, rt) + Gt + NX(Yt, Y*t, et) + + - + + onde, A literatura sobre metas inflacionárias tem dado atenção especial à análise dos efeitos da política monetária sobre o produto, para uma leitura a respeito, ver Stevens & Debelle (1995), Bernanke & Mishkim (1997) e Cecchetti & Ehrmann (1999). 53 Ct = consumo; Gt = gastos governamentais; rt = taxa real de juros; et = taxa real de câmbio;38 It = investimento; NX = exportações líquidas; Y*t = produto estrangeiro. e admitindo-se que o nível de preço doméstico (P) e o estrangeiro (P*) são dados; a relação entre o preço estrangeiro e o doméstico é constante (P*/P=1), e portanto, a taxa real de câmbio (e=EP*/P) equivale à taxa de câmbio nominal. Outra implicação é a equivalência entre a taxa real de câmbio e a nominal (r = i). Deste modo, a equação (7) pode ser expressa em termos da taxa de juros nominal e da taxa de câmbio nominal. Ou seja, (7.1) Yt = C(Yt, it) + I(Yt, it) + Gt + NX(Yt, Y*t, Et). + + - + + A partir da equação (7.1), considerando-se as variáveis remanescentes, obtém-se (7.2) Yt = f3(it, Gt, Y*t, Et) - + + + (7.2.1)Yt = -Ψit + δGt + γY*t + φEt ou onde, Ψ = sensibilidade do produto em relação à taxa de juros; δ = sensibilidade do produto em relação aos gastos governamentais; γ = sensibilidade do produto em relação ao produto estrangeiro; φ = sensibilidade do produto em relação à taxa de câmbio. Fazendo-se a substituição de (4) em (7.2.1), a equação final para o produto pode ser entendida como (8) Yt = -Ψit + δGt + γY*t + φ[Eet+1/(1 + it - i*t)]. De acordo com a equação (8), para que o BC possua controle perfeito sobre a determinação do produto é necessário que os efeitos advindos da expectativa da taxa de câmbio futura, da taxa de juros internacional, do produto estrangeiro e dos gastos 54 governamentais sejam desprezíveis. Ou seja, Et = 1, i*t = 0, Y*t = 0 e Gt = 0, o que permite reescrever (8) como (9) Yt = -Ψit + φ[1/(1 + it)]. As equações (6) e (9) permitem observar que a capacidade do BC afetar o nível de preço e o produto da economia tem como principal instrumento a taxa de juros. Logo, não há motivos a priori para o BC fazer uma opção entre qual das variáveis deve preterir (P ou Y). Nesse sentido, a questão relevante passa a ser qual o nível da taxa de juros que satisfaz de forma simultânea uma meta para preços e produto na economia.39 Além disso, conforme pode ser observado pelas equações (5) e (8), há variáveis de política que pertencem à autoridades políticas distintas (taxa de juros para a autoridade monetária, e impostos indiretos e gastos governamentais para a autoridade fiscal). Portanto, não pode ser desprezada a possibilidade de conflito de objetivos entre os responsáveis pelas políticas. Essa possibilidade de conflito representa uma fonte de incerteza potencial que pode ser canalizada, em termos das equações utilizadas, para a expectativa da taxa de câmbio. Uma forma de eliminar os possíveis problemas oriundos da incerteza e aumentar a credibilidade das políticas seria a coordenação das políticas monetária e fiscal pelo mesmo responsável pela política. Priorizando-se a análise para o comportamento do nível de preços e fazendo-se uso da estrutura desenvolvida por Brainard (1967) a função de perda do responsável pela política econômica pode ser expressa por meio de 38 Admite-se válida a condição de Marshall-Lerner, isto é, tudo o mais constante, uma depreciação da taxa real de câmbio induz a uma melhora da conta corrente. 39 Este resultado justifica o esforço realizado por autores como Taylor (1993) em encontrar uma meta para a taxa de juros capaz de estabilizar preços e produto de forma simultânea. 55 (10) L = (P - P*)2. A partir da equação (5) verifica-se que os preços são determinados pela ação de um instrumento que pertence à política monetária (i), outro pertencente à política fiscal (Ti) e por meio da expectativa da taxa de câmbio futura (Eet+1). Admitindo-se que as expectativas para o câmbio não estão condicionadas diretamente à condução da política monetária ou fiscal, elas podem ser representadas por uma variável exógena (ε). Portanto, P pode ser entendido como (11) P = λ(i + Ti) + ε = λΛ + ε s.a. P* → 0. onde (i + Ti) = Λ. Dado que λ é uma variável aleatória que depende de variáveis não-observadas e é correlacionada com ε, P é uma variável estocástica com variância igual a (12) σ2P = σ2λΛ2 + σ2ε + 2ρσλ σεΛ onde, σ2ε e σ2λ = variância de ε e λ, respectivamente; ρ = coeficiente de correlação entre λ e ε. Admitindo-se a possibilidade da incerteza de P ser decorrente do erro de estimativa, que os ε são independentes ao longo do tempo, e que não há correlação entre λ e ε para o período de previsão, a variância de P é expressa por (13) ~ σ2P = σ2λ(Λ - Λ )2 + σ2ε onde, ~ Λ = é a média de Λ no qual a estimativa de λ é baseada. Como conseqüência, a função de perda esperada é dada por (14) E(L) = [(P - P*)2 + σ2P] 56 ~ = (λ Λ + ~ ε – P*)2 + σ2λΛ2 + σ2ε + 2ρσλ σεΛ onde, ~ λ e ~ ε = são os valores esperados de P e ε, respectivamente. Exprimindo a equação (5) quanto aos instrumentos disponíveis e à meta pretendida pela autoridade política encontra-se (15) P = λ1i + λ2Ti + ε. Destarte, calculando-se a diferencial da função de perda esperada (14) em relação à i e Ti, a política ótima é obtida por meio de (16) (i + Ti + ε - Y*) + σλ12i + ρ12σλ1σλ2Ti = 0 (17) (i + Ti + ε - Y*) + σλ22Ti + ρ12σλ1σλ2i = 0 onde ρ12 = correlação entre λ1 e λ2. O que permite calcular a proporção entre os instrumentos que deve ser utilizada pelo responsável pela política, ou seja, (18) i/(i + Ti) = (σ2λ2 -ρ12σλ1σλ2)/(σλ12 - 2ρ12σλ1σλ2 + σλ22). A equação (18) permite concluir que o melhor resultado para a busca de uma meta para o nível de preços seria a coordenação das políticas monetária e fiscal pela mesma autoridade política. A justificativa para esta afirmação advém do fato de que por meio da coordenação o nível de incerteza seria reduzido. Sob esta estrutura, a determinação da taxa de juros e dos impostos indiretos caberia ao mesmo responsável pela política, o que por conseguinte, aumentaria a precisão na busca da meta anunciada e conduziria a uma maior credibilidade para a implementação das políticas. Além disso, conforme pôde ser observado pelas equações (6) e (9) o BC deveria utilizar uma meta operacional para a taxa de juros como forma de aumentar a eficiência na busca da estabilidade de preços. 57 3.2. A Determinação da Taxa de Juros Ainda que a maior parte dos economistas considere a incapacidade de o BC afetar variáveis reais (crescimento do produto e emprego) no longo termo, isto não implica que a autoridade monetária não deva estabilizar o emprego no curto termo, ou que os efeitos provenientes da estabilização de preços sejam ignorados. O motivo para esta conduta tem por base a observação de que o BC afeta a inflação por meio de sua influência sobre o emprego e a atividade real. Portanto, é esperado que na tentativa de estabilizar a inflação o emprego apresente maior instabilidade como forma de compensar os efeitos oriundos da inflação. Uma outra observação a ser feita, refere-se à afirmação de que a busca da estabilidade de preços como objetivo prioritário evita a perda da credibilidade pela autoridade monetária decorrente da tentativa de alcançar diversos objetivos.40 Todavia, na prática, é comum a interferência do BC sobre o produto e o emprego, o que revela que a ação da autoridade monetária não se restringe a uma única variável ao longo do tempo. Assim sendo, o problema de inconsistência dinâmica pode emergir devido à manifestação do viés inflacionário. Portanto, o uso de uma regra crível capaz de remover o viés inflacionário e estabilizar de forma simultânea a inflação e o produto é de grande relevância para a economia. Nos últimos anos, a partir da proposição de Taylor (1993) para a determinação 40 Reminiscência da análise de Tinbergen. 58 da taxa de juros, diversos teóricos têm dedicado atenção para avaliar se a aplicação da regra proposta é factível.41 A proposta de Taylor estabelece uma regra simples para a determinação da taxa de juros com base em quatro fatores básicos: “The first factor is the current inflation rate. The second factor is the equilibrium real interest rate. When added together, these two factors provide a benchmark recommendation for the nominal federal funds rate. The third factor is an inflation gap adjustment factor based on the gap between the inflation rate and a given target for inflation. (...) The fourth factor is an output gap adjustment factor based on the gap between real GDP and potential real GDP.” (Kozicki, 1999, p. 6, grifos meus) Os dois primeiros fatores servem de referência para o caso em que a economia está operando ao nível potencial e revela a hipótese implícita do uso de uma taxa real de juros constante.42 O terceiro e o quarto fator da regra de Taylor representam os dois objetivos da política monetária, onde os parâmetros de ajuste referem-se ao trade-off de curto termo entre a inflação e o produto. O terceiro fator implica uma elevação (redução) da taxa de juros quando a inflação encontra-se acima (abaixo) da meta. De forma análoga, o quarto fator indica que no caso de uma diferença positiva (negativa) entre o PIB real e o PIB potencial deve haver um aumento (declínio) na taxa de juros. Ou seja, de acordo com a proposta de Taylor, a taxa básica de juros é obtida por meio de: (1) it = πt + r* + 0,5(πt - π*) + 0,5(yt), onde i = taxa básica de juros nominais; r* = taxa real de juros de equilíbrio; 41 Conforme destacado por Judd & Rudebusch (1998, p. 5-6) “(...) the original Taylor rule fits reasonably well to the actual funds rate during the Greenspan period. The R2 for the period is 87 percent for quarterly levels of the nominal funds rate, and 52 percent for quarterly changes. The arguments in the rule - inflation and the GDP gap - roughly correspond with goals legislated for US monetary policy - stable prices and full employment.” 42 Deve-se ressaltar que a taxa real de juros desempenha papel relevante na formulação da política monetária. Apesar de a taxa de juros nominal ser a variável de ajuste da autoridade monetária é a taxa real de juros que afeta o lado real da economia. 59 π = taxa média da inflação dos últimos quatro trimestres (deflator do PIB); π* = meta da taxa de inflação; e y = hiato do produto (100.(PIB real - PIB potencial)÷PIB potencial).43 Uma importante observação a ser feita diz respeito ao fato de que a regra proposta por Taylor para a determinação da taxa básica de juros não é resultado de estimativas econométricas. Foi assumido que o peso dado pelo Federal Reserve aos desvios da inflação e produto são ambas equivalentes a 0,5; e que a taxa real de juros e a inflação são ambas iguais a 2%. Ou seja, a taxa básica de juros reais será igual a 2% quando a inflação for de 2% e não houver divergência entre o PIB real e o PIB potencial. Também é observado que para cada ponto percentual de inflação ou do PIB acima (abaixo) de 2%, a taxa básica de juros aumenta (diminui) 0,5%.44 3.3. Uma Aplicação da RTM Para o Caso Brasileiro Conforme destacado nas seções anteriores, a determinação da taxa de juros representa o mais importante mecanismo à disposição do BC.45 No caso do Brasil é reconhecido pelos economistas que devido à estrutura implementada com o advento do Plano Real (utilização do regime de câmbio fixo como forma de disciplinar os preços) houve a necessidade da manutenção de elevadas taxas de juros como forma de garantir o equilíbrio de curto prazo do balanço de pagamentos. Destarte, uma importante análise a ser feita é se a utilização de uma regra do tipo Taylor, onde a política monetária responde 43 Taylor (1993) utilizou uma tendência linear do logaritmo do PIB real com base no período compreendido entre 1984 (primeiro trimestre) e 1992 (terceiro trimestre) como proxy para o produto potencial. 44 Um exemplo do funcionamento da regra de Taylor pode ser entendido da seguinte forma: considere que a taxa média da inflação que compreende os três trimestres anteriores e o atual seja equivalente a 6% e que o hiato do produto corresponda a 2%. Destarte, a taxa de juros corresponde a 11% (i=6+2+0,5(62)+0,5(2)=11). 45 O apêndice (3.A.1) apresenta uma análise dos principais mecanismos de transmissão da política monetária para o caso brasileiro. 60 às variações da inflação e do produto, não seria mais eficiente (mesma taxa de inflação e menores taxas de juros) do que o comportamento adotado pelo BCB. Vale ressaltar que a regra para a taxa de juros sugerida por Taylor (1993) é adequada para a situação de uma economia fechada.46 Como o Brasil não representa o caso de uma grande economia,47 e ainda pelo fato de a taxa de juros no período posterior ao Real ter sido fixada com base no desequilíbrio externo e não no nível de atividades; é necessário que se incorpore à regra de Taylor original algum elemento que seja um indicador representativo de modificações da conjuntura internacional. Um importante parâmetro para a definição da taxa de juros pelo Comitê de Política Monetária do Banco Central do Brasil (COPOM),48 capaz de traduzir a preocupação ressaltada, consiste na observação da taxa de juros básica definida pelo FED. Logo, uma versão modificada da regra de Taylor apropriada para a economia brasileira pode ser representada por: (2) it = πt + r* + itEUA + 0,5(πt - π*) + 0,5(yt), onde itEUA = taxa básica de juros (EUA). Por conseguinte, mesmo no caso de inexistência de desvio para a inflação ou produto, estaria assegurado uma taxa de juros real doméstica mais elevada que aquela em vigor nos EUA. Desta forma, a regra de Taylor modificada cumpre três funções: 46 Não se deve esquecer que a regra supradita foi eleborada para o caso da economia americana, o que justifica a desnecessidade de apresentar elementos que capturem modificações no cenário internacional capazes de influenciar a definição da taxa de juros. 47 As decisões de política no país não causam mudanças nas decisões de política econômica para o resto do mundo. 48 O COPOM, tendo por referência o Federal Open Market Committee (FOMC), foi instituído em 20 de junho de 1996, com o objetivo de estabelecer as diretrizes da política monetária e definir a taxa de juros. 61 i) garante uma taxa de juros capaz de atrair a entrada do capital estrangeiro; ii) permite que a taxa de juros seja utilizada diante de flutuações na taxa de inflação; e iii) possibilita a fixação de uma taxa de juros que atenue os efeitos sobre o produto. Gráfico 3.1: Evolução da over/Selic e da RTM 60 fim do regime de câmbio fixo 50 40 crise asiática desaparecimento da relação crise russa 30 over/Selic 20 10 0 96/T2 RTM T3 T4 97/T1 T2 T3 T4 98/T1 T2 T3 T4 99/T1 T2 T3 T4 00/T1 Fonte: Banco Central do Brasil e Tabela 3.A.1 (Apêndice 3.A.2). O gráfico 3.1 revela a evolução da over/Selic e da taxa de juros obtida pela regra de Taylor modificada (RTM). A análise tem início a partir de junho de 1996 porque é nesta data que a variável πt deixa de refletir os efeitos do período de alta inflação vivenciado pela economia brasileira antes da implementação do Plano Real. Uma importante observação a ser feita refere-se ao período que se estende do segundo trimestre de 1996 até o terceiro trimestre de 1997. O coeficiente de determinação (R2) entre as duas séries (over/Selic e RTM) corresponde a 97%, o que sugere que a regra de Taylor modificada mostra-se razoável para explicar a estratégia da política monetária adotada pelo BCB durante o período supracitado. Um outro argumento que reforça o resultado encontrado é 62 que as taxas de juros passaram a ser fixadas pelo COPOM a partir de junho de 1996, o que demonstra uma clara sincronia entre os fenômenos.49 Não obstante, a relação entre as séries analisadas desaparece após o período sobredito. A justificativa para o rompimento com a possível regra utilizada pelo BCB na determinação da taxa de juros deve-se às mudanças no cenário internacional. O segundo semestre de 1997 é marcado por uma reversão nas condições de liquidez para os países emergentes devido à crise que teve origem no Leste da Ásia.50 Como o Brasil havia adotado uma variante do regime de câmbio fixo (reajustes cambiais pré-fixados a partir de março de 1995) e havia o temor de que uma forte desvalorização da moeda desse início a um novo processo de aceleração inflacionária, houve a necessidade de um aumento da taxa de juros a níveis não justificados pelos fundamentos econômicos como forma de evitar uma saída maciça de capitais. Este cenário também é adequado para o ano de 1998 em razão dos efeitos provenientes da crise russa. A conseqüência dos dois episódios - crise asiática e crise russa - culminou com a mudança do regime de câmbio para flexível em janeiro de 1999. Conforme pode ser observado pelo gráfico 3.1, logo após a mudança do regime de câmbio, a over/Selic sofreu forte redução passando a oscilar próximo ao nível de 20% a.a.. É importante observar que a presença de um regime de câmbio flexível permite a ação de uma política monetária ativa. Além disso, o argumento de que a manutenção de elevadas taxas de juros é fundamental para o equilíbrio do balanço de pagamentos deixa de ser verdadeiro. Assim, se for implementada uma regra para a determinação da taxa de 49 A primeira reunião do COPOM para fixar a taxa de juros ocorreu em 26 de junho de 1996. O efeito Ásia foi marcado pela queda das bolsas de valores e pelas desvalorizações das moedas dos países asiáticos. Este movimento acarretou impactos no mercado de câmbio doméstico em função da pressão advinda da maior demanda por divisas. 63 50 juros, tal como a sugerida pela equação (2), é possível reduzir a taxa de juros básica da economia sem que isto acarrete problemas para a meta de inflação ou flutuações inadequadas para o produto. Gráfico 3.2: Evolução da Dívida Pública (% PIB) 55 50 Crise Asiática 45 40 Início Regime Câmbio Flexível 35 30 Abr Jan/00 Out Jul Abr Jan/99 Jul Out Abr Jan/98 Out Jul Abr Jan/97 Out Jul Abr Jan/96 Jul Out Abr Jan/95 Out Jul/94 25 Fonte: Banco Central do Brasil. Uma importante observação prática para o impacto dos juros sobre a economia brasileira pode ser observado pela evolução da dívida líquida total do setor público em relação ao PIB no período posterior à introdução do Plano Real. Conforme pode ser observado pelo gráfico 3.2 a dívida não foi estacionária ao longo do período sobredito. Destarte, uma das questões que emerge é se o comportamento dos juros foi o responsável por uma trajetória que poderia colocar em risco a sustentabilidade da dívida pública. Observando-se os gráficos 3.1 e 3.2 verifica-se uma clara simetria entre os 64 movimentos da taxa de juros (over/Selic)51 e a aceleração do aumento da razão dívida/PIB para o período compreendido entre a crise asiática e o fim do regime de câmbio fixo. O principal marco que denota a necessidade de conter o crescente aumento na razão dívida/PIB foi o acordo firmado entre o Ministério da Fazenda e o Fundo Monetário Internacional em fevereiro de 1999. Ficou estabelecido que a relação dívida pública/PIB, ao final de 2001, deve situar-se abaixo de 46,5% do PIB. O principal instrumento para conter o aumento da relação supracitada tem sido a geração de superávits fiscais primários, o que por conseguinte, implica recursos indisponíveis para a sociedade. Gráfico 3.3: PIB*, Over/Selic e RTM (%) 6 5 4 3 2 1 PIB Over/Selic Mar/00 Dez Set Jun Mar/99 Dez Set Jun Mar/98 Dez Set Jun Dez Mar/97 -1 Set Jun 0 RTM Fonte: Insituto Brasileiro de Geografia e Estatística, Banco Central do Brasil e Tabela 3.A.1 (Apêndice 3.A.2). (∗) Taxa acumulada até o trimestre. 51 É importante ressaltar que a taxa Selic é o principal indexador da dívida mobiliária, sendo responsável por cerca de 50% da indexação da dívida. 65 O gráfico 3.3 não deixa dúvidas de que o aumento da taxa de juros em decorrência das crises asiática e russa teve implicações muito negativas para a razão dívida/PIB. Houve um duplo efeito (vide área contida no retângulo pontilhado do gráfico supradito), a taxa de juros aumentou e o PIB sofreu uma queda significativa no período. Assim, com uma taxa de juros acima da taxa acumulada do PIB, há a necessidade de uma substancial redução da taxa de juros para que seja obtida uma posição sustentável da dívida em relação ao PIB. Por outro lado, se a taxa de juros utilizada no período tivesse por base a regra de Taylor (RTM) o resultado seria um cenário em que não haveria problemas de solvência para o endividamento público. 66 Apêndice 3.A.1. Mecanismos de Transmissão Monetária O principal instrumento à disposição do BCB consiste no uso da taxa de juros,52 uma vez que por meio dela é possível afetar o nível de preços e a atividade da economia. A taxa de juros à disposição da autoridade monetária brasileira que serve como referência para às demais é a taxa de juros do mercado de reservas bancárias (taxa Selic). Em outras palavras, é via determinação da taxa Selic pelo BCB que as outras taxas, por arbitragem, são determinadas (ver esquema 3.A.1). Esquema 3.A.1: Determinação da Taxa de Juros na Economia Empréstimo Mercado de Reservas Bancárias Taxa Selic Mercado Financeiro Poupança, CDB, etc. Financiamento Fonte: Banco Central do Brasil, 1999. Com base na literatura que aponta como principal objetivo da política monetária a busca da estabilidade de preços e assumindo a neutralidade da moeda no longo termo, o BCB dá atenção especial a cinco mecanismos de transmissão da política monetária considerados básicos para as reuniões efetuadas pelo COPOM, são eles: i) taxa de juros; ii) taxa de câmbio; iii) preço dos ativos; iv) crédito; e v) expectativas. 52 Existem diversas taxas de juros na economia: taxas de poupança, taxas de empréstimo, taxas de financiamento, etc., que são classificadas de acordo com o prazo como: curto, médio e longo termo. É importante ressaltar que o BC possui controle direto apenas sobre a taxa de juros do mercado de reservas bancárias. 67 O mais conhecido canal de transmissão da política monetária é a taxa de juros. Neste canal o efeito da política monetária sobre o lado real da economia ocorre como descrito no modelo ISXLM.53 Ou seja, a interpretação do efeito de uma variação da taxa de juros sobre a economia é feita sob uma perspectiva keynesiana. Destarte, a ação de uma política monetária que visa a contração da demanda agregada pode ser compreendida da seguinte forma: o BC realiza uma contração monetária (M ↓); com menor quantidade de moeda disponível na economia ocorre uma elevação da taxa de juros de curtíssimo termo (i ↑),54 como conseqüência, assumindo-se que no curto termo há rigidez dos preços, a taxa de juros reais também aumenta (r ↑). Devido ao retorno real proveniente dos juros tornar-se superior à eficiência marginal do capital em parte da economia, tem-se como resultado a redução no nível de investimento (I ↓);55 o que por sua vez, acarreta queda na demanda agregada e conseqüente diminuição do produto (Y ↓). Em termos esquemáticos, M ↓ ⇒ i ↑ ⇒ r ↑ ⇒ I ↓ ⇒ Y ↓. Um outro canal de transmissão da política monetária é a taxa de câmbio quando a economia adota um regime de câmbio flexível. Este canal passou a ter maior importância, no caso brasileiro, no período posterior a janeiro de 1999. Assumindo-se uma contração monetária observa-se que a elevação da taxa de juros provoca uma entrada de capitais na economia que leva à apreciação da taxa de câmbio (E ↓). Além disso, considerando-se 53 O modelo ISXLM teve sua primeira versão com Hicks (1937) na tentativa de identificar de forma analítica as inovações presentes na Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda de Keynes (1936). 54 Conforme destacado por Keynes (1982, p. 162) “A autoridade monetária controla, com facilidade, a taxa de juros a curto prazo, não só pelo fato de não ser difícil criar a convicção de que sua política não mudará sensivelmente em um futuro próximo, como também em virtude de a possível perda ser pequena, quando comparada com o rendimento corrente (a não ser que este chegue a ponto de ser quase nulo).” 55 É admitido que o investimento absorve as decisões dos consumidores no que se refere à aquisição de bens duráveis. 68 que não houve variação nos preços domésticos e externos no mesmo período, a taxa real de câmbio também sofre apreciação (e ↓) o que implica menor competitividade dos produtos domésticos, visto que em termos relativos o preço do produto doméstico tornouse mais elevado que o estrangeiro. O resultado deste processo é a redução no nível das exportações líquidas (NX ↓) levando à queda do produto. Em termos esquemáticos podese dizer que: M ↓ ⇒ i ↑ ⇒ E ↓ ⇒ e ↓ ⇒ NX ↓ ⇒ Y ↓. Uma importante observação a ser feita no caso da taxa de câmbio é a influência deste canal sobre o nível de preços. Além do efeito direto de uma variação da taxa de câmbio sobre o preço dos bens que são comercializáveis no mercado internacional (tradeables), a taxa de câmbio influencia de forma indireta o nível de preços de duas formas: i) o uso de matérias-primas importadas na elaboração de bens domésticos - quando a taxa de câmbio sofre apreciação (depreciação) o custo de produção desses bens diminui (aumenta), o que implica provável redução (aumento) no preço; e ii) substituição de bens domésticos por similares importados - quando a taxa de câmbio sofre apreciação o preço dos bens importados torna-se mais barato. Este efeito acarreta um deslocamento de parte da demanda dos bens domésticos por similares importados, tendo por resultado queda na demanda agregada e menor pressão sobre o nível de preços. A relação entre a taxa de câmbio e os preços desempenhou papel importante no cenário brasileiro no período recente. O vínculo direto entre a taxa de câmbio e o preço dos bens tradeables concomitante à relação indireta proveniente das matérias-primas 69 importadas representaram o principal temor da equipe econômica brasileira quando da acentuada desvalorização da taxa de câmbio ocorrida no primeiro trimestre de 1999. Apesar disso, a manutenção das elevadas taxas de juros praticadas no período foi suficiente para neutralizar a possível alta dos preços. Ademais, um episódio que serve como ilustração para a segunda relação indireta mencionada diz respeito ao incentivo dado pelo governo, logo após a implementação do Plano Real, à importação de bens como forma de neutralizar um possível aumento dos preços devido ao incremento da demanda em virtude da súbita redução do imposto inflacionário. O terceiro canal de transmissão da política monetária a ser analisado refere-se ao canal de preço dos ativos. Ao contrário da visão keynesiana onde o efeito da política monetária sobre a economia concentra-se de forma exclusiva no preço de um ativo (a taxa de juros), monetaristas procuram analisar como a política monetária afeta o preço dos ativos relativos e a riqueza real. Os dois canais que são utilizados frequentemente na visão monetarista sobre transmissão monetária envolve dois componentes: i) a teoria de investimento q de Tobin; e ii) o efeito da riqueza sobre o consumo. O q de Tobin é definido como o valor de mercado das ações das firmas dividido pelo custo de reposição do capital. Esta razão permite mensurar o hiato entre o capital real e o capital planejado constituindo-se um bom mecanismo para avaliar o retorno de um novo investimento. Quando o q é maior que 1 (preço de mercado das firmas é maior que o custo de reposição do capital), isto significa que a aquisição de novos bens de capital é barata se comparada ao valor de mercado das firmas. Dessa forma, com uma pequena emissão de ações as firmas podem obter recursos suficientes para adquirir uma 70 grande quantidade de novos bens de investimento. Em contrapartida, um q menor que 1 não induz as firmas a acréscimos de capital. A conexão entre a política monetária e o preço das ações pode ser compreendida pelos efeitos provenientes de uma contração monetária. Com o decréscimo na oferta de moeda, os agentes possuem menos numerário o que leva à redução no dispêndio. Assim, em razão do menor volume de recursos o mercado de ações também sofre impacto negativo quanto à absorção de haveres. De forma análoga ao caso keynesiano, a contração monetária eleva a taxa de juros tornando os títulos mais atraentes do que as ações, o que por conseqüência, acarreta queda no preço das ações (PA ↓). Portanto, ocorre uma queda no q (q ↓) que leva a um menor nível de investimento na economia e conseqüente diminuição no produto. De forma esquemática o mecanismo de transmissão da política monetária corresponde a M ↓ ⇒ i ↑ ⇒ PA ↓ ⇒ q ↓ ⇒ I ↓ ⇒ Y ↓. Um canal alternativo para a transmissão do preço das ações ocorre por meio do efeito riqueza sobre o consumo. Este canal tem por referência o modelo do ciclo de vida de Modigliani, no qual a renda varia ao longo da vida das pessoas. Nesta interpretação, a poupança desempenha papel fundamental para um consumo estável, pois permite aos consumidores deslocar a renda dos períodos em que é mais elevada para os períodos em que é mais baixa. Sob esta perspectiva, a renda dos consumidores pode ser decomposta em três componentes básicos: i) capital humano; ii) capital real; e iii) riqueza financeira. Em geral, o principal componente da riqueza financeira é o nível de ações em posse do público. Quando o preço das ações caem, o valor da riqueza financeira diminui (RF ↓), e portanto, os recursos dos consumidores ao longo da vida decresce, o que denota uma 71 provável queda no consumo (C ↓). Assim sendo, uma contração monetária pode induzir à queda no preço das ações, o que implica um outro mecanismo de transmissão para a política monetária: M ↓ ⇒ i ↑ ⇒ PA ↓ ⇒ RF ↓ ⇒ C ↓ ⇒ Y ↓. Vale ressaltar que o canal de preço dos ativos é relevante para países como Estados Unidos e Inglaterra, entretanto, no caso da economia brasileira, a participação de consumidores no mercado acionário é desprezível o que torna este mecanismo de transmissão de pouca relevância prática para o Brasil. O quarto canal de transmissão monetária é o canal de crédito. Este canal pode ser compreendido por meio de outros dois canais de transmissão: o canal de empréstimos bancários e o canal de balanços. No primeiro caso é assumido que os bancos comerciais desempenham papel especial no sistema financeiro devido à capacidade de restringirem crédito para alguns tomadores, sobretudo para pequenas firmas onde os problemas de informação assimétrica tende a ser reduzido. O mesmo não é válido para o caso das grandes empresas, pois elas podem obter acesso direto ao mercado de crédito via mercados de ações e títulos sem precisar recorrer aos bancos. Não obstante, uma política monetária de contração da demanda agregada leva à redução de reservas e depósitos bancários (RB e DB ↓), o que culmina com a redução no volume de empréstimos concedido pelos bancos (EB ↓). Assim, com menos recursos disponíveis no mercado tende haver redução no nível de investimento, e por conseguinte, redução no produto.56 De forma esquemática o efeito da política monetária é 56 Devido ao processo de inovação financeira a partir da década de 80, diversos economistas - ver Edwards & Mishkin (1995), Bernanke & Gertler (1995) e Meltzer (1995) - tem salientado o fato de que os bancos possuem menor importância para o mercado de crédito. 72 M ↓ ⇒ i ↑ ⇒ RB ↓ & DB ↓ ⇒ EB ↓ ⇒ I ↓ ⇒ Y ↓. Um outro canal de transmissão é o canal de balanços. Neste caso, um menor lucro líquido significa que os emprestadores possuem menor colateral57 para seus empréstimos, e portanto as possíveis perdas oriundas de seleção adversa são elevadas (SA ↑). Logo, o volume de recursos à disposição de tomadores de empréstimos para o financiamento de novos investimentos é reduzido (RE ↓). Ademais, é observado que o problema de risco moral tende a aumentar (RM ↑), pois com a redução no valor das ações, há um incentivo dos proprietários das firmas buscarem projetos de investimento que apresentam risco mais elevado, o que por conseguinte, denota maior possibilidade dos emprestadores não serem pagos. Sob esta estrutura, uma contração monetária provoca um declínio no preço das ações, o que implica menor volume de recursos disponíveis para investimentos e conseqüente queda na demanda agregada. A análise realizada pode ser esquematizada da seguinte forma: M ↓ ⇒ i ↑ ⇒ PA ↓ ⇒ SA ↑ & RM ↑ ⇒ RE ↓ ⇒ I ↓ ⇒ Y ↓. Considerando-se a perspectiva monetarista é observado que o aumento da taxa de juros provoca deterioração no balanço das firmas devido à redução do fluxo de caixa (FC ↓). Assim, um novo esquema para o canal de balanços pode ser elaborado como: M ↓ ⇒ i ↑ ⇒ FC ↓ ⇒ SA ↑ & RM ↑ ⇒ RE ↓ ⇒ I ↓ ⇒ Y ↓. Além da relação entre o canal de crédito e os gastos das firmas, Bernanke & Gertler (1995) também consideram conveniente analisar o canal de crédito sobre os 57 Garantia extra que se dá a um credor, além da que presumivelmente seria suficiente. Em outras palavras, o colateral é utilizado quando o credor não se sente seguro de que a garantia normal poderá suprir seus prejuízos eventuais. 73 gastos dos consumidores. De acordo com esta concepção existe outro mecanismo de transmissão para a política monetária que se manifesta por meio da conexão entre a moeda e o preço das ações. Quando é esperado queda nos preços das ações o valor dos ativos financeiros tende a sofrer redução (VAF ↓) o que implica maior probabilidade de ocorrência de uma crise financeira (CF ↑). Assim, diante de uma posição financeira que não é segura, os consumidores tendem a reduzir o nível de consumo fazendo com que o produto da economia diminua. De forma esquemática tem-se M ↓ ⇒ i ↑ ⇒ PA ↓ ⇒ VAF ↓ ⇒ CF ↑ ⇒ C ↓ ⇒ Y ↓. Apesar da literatura internacional dar atenção especial ao canal de crédito no estudo dos mecanismos de transmissão da política monetária, no caso brasileiro o canal de crédito desempenha papel secundário. A justificativa para sua menor expressão no cenário doméstico é resultado de três características básicas: i) elevado grau de incerteza; ii) a incidência de impostos sobre a intermediação financeira; e iii) elevadas alíquotas dos empréstimos compulsórios. O quinto e último canal a ser analisado diz respeito ao canal das expectativas. Quando o BC altera a taxa de juros as expectativas dos agentes econômicos em relação à evolução presente e futura da economia podem sofrer alterações. Ou seja, um aumento da taxa de juros na tentativa de evitar um aumento da inflação causa efeitos recessivos no curto termo (Yct ↓), no entanto, o BC pode restabelecer a confiança no desempenho futuro da economia (CDFE ↑) fazendo com que as taxas de juros esperadas de médio e longo termo sejam menores (iemt & i elt ↓). Portanto, é esperado que no longo termo o efeito negativo sobre o produto oriundo de um aumento na taxa de juros para evitar um 74 processo inflacionário seja revertido; e que com a recuperação da normalidade,58 seja gerado, no longo termo, um estímulo ao investimento (Ilt ↑) capaz de promover um aumento no produto (Ylt ↑). O que foi dito pode ser sumariado por um esquema que se divide em duas fases: 1ª fase: M ↓ ⇒ i ↑ ⇒ r ↑ ⇒ Ict ↓ ⇒ Yct ↓; e 2ª fase: CDFE ↑ ⇒ iemt & i elt ↓ ⇒ Ilt ↓ ⇒ Ylt ↓. Esquema 3.A.2: Principais Mecanismos de Transmissão da Política Monetária Taxas de Mercado Investimento Privado Preço dos Ativos Consumo de Bens Duráveis TAXA SELIC Expectativas Exportações Líquidas Demanda Agregada INFLAÇÃO Crédito Choques Externos Taxa de Câmbio Preços Externos Fonte: Banco Central do Brasil, 1999. É importante salientar que conquanto a literatura sobre o mecanismo de transmissão monetária não considere o canal das expectativas como um dos mais importantes (em função da incerteza inerente aos efeitos da política monetária e à 58 Uma boa interpretação sob o critério de normalidade encontra-se na interpretação pós-keynesiana. De acordo com esta visão, o ponto de partida nas tomadas de decisões que envolve preços, investimento, produção, etc., tem por base o que o agente econômico considera como normal para que sua tomada de decisão seja realizada. Em outras palavras, mudanças em relação ao que os agentes consideram como normal são encarados como oportunidade de haver uma ação especulativa, enquanto que mudanças permanentes no cenário levariam os agentes a recalcularem sua decisão devido à mudança no próprio padrão de normalidade. Como caso ilustrativo dessa situação, pode-se citar os processos persistentes de 75 evolução da economia), o BCB faz uso da política monetária assumindo que o canal das expectativas é fundamental no caso brasileiro. A partir da análise realizada, o esquema 3.A.2, apresenta de forma simplificada a conexão entre os principais canais de transmissão monetária e a inflação na economia. alta inflação, onde devido às oscilações constantes e imprevistas das taxas de retorno, há um movimento que impede que seja formado um padrão de normalidade. 76 3.A.2. Tabela 3.A.1 Período Jun/1996 Set Dez Jan/1997 Jun Set Dez Jan/1998 Jun Set Dez Jan/1999 Jun Set Dez Jan/2000 Inflação média % a.a. (1) 21,92 18,72 15,46 12,46 10,15 8,10 6,79 5,75 4,79 3,93 3,01 2,50 2,42 2,91 4,27 5,84 Meta para a inflação % a.a. (2) 10 10 10 5 5 5 5 2 2 2 2 8 8 8 8 6 PIB real (3) 102,83 105,52 104,58 100,02 106,87 108,54 106,84 101,11 107,82 108,56 105,04 101,23 107,02 108,41 109,64 104,54 PIB potencial (4) 98,66 99,35 100,20 100,93 101,23 102,05 102,94 103,64 103,87 104,57 105,29 105,71 105,82 106,34 106,91 107,54 Hiato do produto % (5) 4,23 6,21 4,37 -0,90 5,57 6,36 3,79 -2,44 3,80 3,81 -0,24 -4,24 1,13 1,95 2,55 -2,79 Federal Funds Rate % a.a. 5,27 5,30 5,29 5,39 5,56 5,54 5,50 5,49 5,56 5,51 4,68 4,81 4,76 5,22 5,30 5,85 Over/Selic % a.a. 26,49 25,40 23,93 21,58 21,08 20,84 42,04 29,85 21,02 34,29 32,95 48,23 22,01 19,38 20,98 18,86 RTM % a.a. (6) 38,27 34,49 28,67 23,63 23,57 20,87 17,09 13,89 15,64 14,32 10,07 4,45 6,96 8,57 10,98 12,22 Fontes: Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), Federal Reserve Bank of St Louis e Banco Central do Brasil. (1) Média (geométrica) da inflação dos últimos 12 meses medida pelo IPCA, arredondada para centésimos. (2) Para os anos de 1996 e 1997 a meta para a inflação corresponde à tendência observada da inflação em 12 meses. Como a tendência observada para o ano de 1998 reflete uma meta próxima a 1%, achou-se conveniente adotar a meta considerada padrão internacional de 2%. A partir de 1999 foi considerada a meta anual da inflação estabelecida pelo Banco Central do Brasil. (3) PIB Trimestral Base Fixa (1995=100). (4) O PIB potencial foi estimado com base na tendência linear do log do PIB real (1985.T1-2000.T1). (5) O hiato do produto é obtido pela fórmula (100.(PIB real - PIB potencial)÷PIB potencial). (6) A RTM refere-se à taxa de juros obtida por meio da equação (2). 77 Conclusões A análise efetuada teve o objetivo de avaliar em que medida a coordenação de políticas representa uma estrutura alternativa viável para a busca da estabilidade de preços e solvência do endividamento público. Os modelos estudados revelam que a coordenação de políticas econômicas é factível e que seus resultados tendem a ser superiores ao uso de metas para a política econômica com autoridades políticas distintas. Em geral, verifica-se que a coordenação entre a política monetária e a fiscal reduz a possibilidade de conflito de interesses entre os responsáveis pela política econômica e reduz a incerteza para a tomada de decisão dos agentes econômicos. Com base no estudo realizado no capítulo 2, quatro pontos básicos podem ser observados (Nordhaus, 1994): i) os programas de redução do déficit na presença de alto desemprego, sobretudo quando a autoridade monetária é independente e possui metas, indicam alta aversão à inflação. Por outro lado, observa-se que um choque negativo sobre a demanda agregada não será compensado por um estímulo monetário no curto termo ou por um aumento suficiente no produto potencial de longo termo; ii) o ganho potencial a partir da coordenação é elevado. Uma política de coordenação macroeconômica deveria ser estruturada de forma que a reação da taxa de juros seja capaz de compensar a contração fiscal. A coordenação apresenta bons resultados porque permite à nação obter os ganhos de maior investimento sem sofrer as perdas de um desemprego transitório. 78 iii) a redução do déficit de uma grande economia aberta implica efeitos indesejáveis sobre o consumo porque uma grande parcela do aumento da poupança ocorre no exterior;59 e iv) o jogo fiscal-monetário pode gerar um problema de baixa poupança. No caso em que há autoridades fiscais avessas à recessões de curto termo e autoridades monetárias que possuem emprego relativamente estável e são avessas à inflação, a redução do déficit deve ser iniciada por aquela que possui o horizonte de tempo mais curto. Contudo, é provável que este procedimento provoque aumento temporário do desemprego e desagrade grupos que são contrários ao aumento de impostos. Além disso, observa-se que a contração resultante deve durar cerca de um ciclo eleitoral caso a autoridade monetária siga resultados orientados. O principal ponto a ser ressaltado é que o retorno social da redução do déficit é modesto no caso cooperativo e implica piora para os consumidores no caso não-cooperativo. O exame realizado no capítulo 3 evidenciou que a condução da política monetária para o período entre a crise asiática e a mudança do regime cambial teve implicações significativas para a aceleração do aumento do endividamento do setor público em proporção ao PIB. Destarte, buscou-se uma estratégia alternativa para a política monetária de forma que fossem evitados os efeitos negativos sobre o lado fiscal. Sob esta perspectiva, foi recuperada a proposta de Taylor (1993) para a determinação da taxa de juros, em que é assumido o mesmo parâmetro em resposta às flutuações da inflação e do produto. Em outras palavras, não faz parte das premissas da regra que o objetivo referente à inflação é preferível ao do produto, e vice-versa. Pode-se dizer que a regra de Taylor apresenta de forma implícita características que a aproximam da perspectiva 59 Isto não deve importar para pequenas economias (para as quais as perdas dos termos de comércio são triviais) ou para grandes economias relativamente fechadas (para as quais a explicação para o comportamento da poupança é doméstico). 79 keynesiana, e que por conseguinte, sua aplicação não está confinada à necessidade de um BCI com a preocupação básica para a busca da estabilidade de preços.60 Portanto, observa-se que a regra de Taylor modificada para o caso brasileiro indica que se esta estrutura fosse adotada implicaria menor custo social, uma vez que a economia apresentaria menores taxas de juros em relação à observada e seria compatível com o crescimento do PIB no período, o que por conseguinte, revela uma estratégia que não colocaria em risco a solvência da dívida pública. Ademais, as vantagens da regra proposta da adoção da RTM podem ser sumariadas em quatro pontos básicos: i) a regra é compatível com o regime de metas para a inflação em vigor no país desde junho de 1999; ii) como a regra incorpora a taxa básica de juros americana e é garantido uma remuneração real da RTM acima da federal funds rate,61 haveria um estímulo à entrada de capitais; iii) o anúncio da regra ajudaria os agentes na formação de expectativas; e iv) contribui para uma maior estabilidade da razão dívida/PIB. 60 Para uma análise detalhada sobre a teoria da independência do banco central, ver Mendonça (2000). A RTM seria inferior a federal funds rate apenas em um cenário onde fosse observado de forma simultânea uma inflação bem abaixo da meta pretendida e um PIB potencial muito acima do PIB real. 80 61 Bibliografia AKERLOF, G., DICKENS, W.T. & PERRY, G.L. The Macroeconomics of Low Inflation. Brooking Papers on Economic Activity, V. 1, 1996. William C. Brainard & George L. 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