ESTUDO DE UMA FORMULAÇÃO EXPLÍCITA-IMPLÍCITA PARA ESCOAMENTOS INCOMPRESSÍVEIS Rafael Alves Rodrigues Lucia Catabriga [email protected] [email protected] Universidade Federal do Espı́rito Santo-UFES, Av. Fernando Ferrari, 514, 29.075-910, Vitória, ES, Brasil Resumo. Este trabalho tem por objetivo estudar o comportamento de uma formulação explicı́ta-implı́cita das equações de Navier-Stokes para escoamentos incompressı́veis baseada no método das diferenças finitas. Os termos não lineares das componentes horizontal e vertical da velocidade são aproximados por diferenças finitas de primeira ordem utilizando uma aproximação upwind e as derivadas temporais são aproximadas pelo método de Euler explı́cito. A pressão é aproximada por diferenças finitas de segunda ordem e necessita da solução de um sistema linear em cada passo de tempo, tendo portanto caracterı́stica de um esquema implı́cito. São estudados problemas clássicos regidos pelas equações de Navier-Stokes como o problema do escoamento em uma cavidade, o problema do escoamento sobre um degrau, o problema em torno de um disco, dentre outros problemas na presença de obstáculos. Neste trabalho, a geometria irregular dos obstáculos no domı́nio é definida a partir de uma imagem que identifica a região de fluido e a região dos obstáculos pela diferença de cores de cada pixel, que representam uma célula do domı́nio. Também é feito um estudo do comportamento do sistema linear resultante para o cálculo da pressão considerando o método não estacionário GMRES com relação ao número de vetores necessários para reinicializar o método. Keywords: Escoamento incompressı́veis, Equações de Navier-Stokes, Método das diferenças finitas, Escoamento em geometria irregulares, Método GMRES. 1. INTRODUÇÃO Sem dúvida, um fato importante no processo do desenvolvimento cientı́fico e tecnológico é a simulação em software de diversas situações fı́sicas encontrada pelo homem no mundo real. Tal importância surge, porque é possı́vel analisar o comportamento das caracterı́sticas fı́sicas em projetos e processos antes da construção de protótipos reais, isto implica em uma redução de custo e tempo de desenvolvimento (ou aperfeiçoamento) do problema analisado. Como exemplo, a análise da dinâmica de fluidos tem sido muito solicitada para fornecer soluções a problemas complexos em hidrodinâmica, projetos de edificações, aeronaves, navios e veı́culos espaciais (Griebel, 1998; Fortuna, 2000). A modelagem desses problemas é determinada pelo conjunto de equações diferenciais conhecida como equações de Navier-Stokes. Nesse trabalho utilizamos o método das diferenças finitas para aproximar as equações governantes. Baseado nesse método, são construı́das expressões de caráter explı́cito para o cálculo das velocidades no escoamento, tendo como base o método de Euler explı́cito aplicado às derivadas temporais das equações. Para o cálculo da pressão, entretanto, o processo de aproximação por diferenças finitas gera uma expressão com caracterı́stica implı́cita. Dessa forma é necessário a solução de um sistema linear que possui uma ordem elevada que, em geral, são solucionados iterativamente através de métodos baseados em espaço de Krylov (Saad, 2003). Entre os métodos baseado no espaço de Krylov, um dos mais utilizados para resolução de sistemas de grande porte para matrizes não simétricas é o método iterativo dos Resı́duos Mı́nimos Generalizados (GMRES). Quando for considerado a estratégia de reinicialização é denominado GMRES(m), sendo m o número de vetores estabelecidos para a reinicialização (Saad, 2003). Dependendo do problema tratado, a convergência do GMRES(m) para solução do problema pode ser lenta sendo necessário um número maior de iterações e, consequentemente, um tempo maior de processamento. Com objetivo de acelerar o processo de convergência desses métodos são utilizados precondicionadores (Saad, 2003; Barrett et al., 1994). Neste trabalho estudaremos o comportamento do precondicionador baseado na decomposição incompleta LU sem nenhum nı́vel de preenchimento, denominado ILU(0), em problemas incompressı́veis na presença de obstáculos na solução do sistema linear resultante da equação da pressão para uma formulação implı́cita-explı́cita. Este artigo está organizado como a seguir. Na próxima seção descrevemos .... 2. METODOLOGIA 2.1 Equações Governantes As equações de Navier-Stokes modelam o escoamento de fluidos compressı́veis, incompressı́veis, turbulentos e laminares Fortuna (2000). Essas equações representam a expressão matemática de princı́pios fı́sicos simples: conservação da massa, conservação de momento (segunda lei de Newton) e conservação da energia (primeira lei da termodinâmica) Fortuna (2000). Os problemas considerados são isotérmicos, portanto a análise de energia será desprezada, o escoamento é incompressı́vel, viscoso e laminar sem atuação de forças externas. Nessas condições , o escoamento pode ser caracterizado pelas seguintes equações provenientes de simplificações Figura 1: Redução de escala do modelo – Ω e Ω∗ são similares. das equações gerais de Navier-Stokes: ∂u ∂v + = 0. (Eq. da continuidade) ∂x ∂y ∂u ∂p ∂u2 ∂uv 1 ∂ 2u ∂ 2u − + = + − . (Eq. de momento na direção x) ∂t ∂x Re ∂x2 ∂y 2 ∂x ∂y ∂v 2 ∂uv 1 ∂2v ∂2v ∂v ∂p − + = + − . (Eq. de momento na direção y) ∂t ∂y Re ∂x2 ∂y 2 ∂y ∂x (1) (2) (3) As grandezas u, v e p representam, respectivamente, a velocidade do escoamento na direção x, na direção y e a pressão do escoamento na região de domı́nio Ω do fluido. As equações de Navier-stokes apresentadas em (1), (2) e (3) estão na forma adimensional. Essa caracterı́stica é necessária para garantir que as propriedades de escoamento aplicadas a um modelo hipotético sejam válidas para um modelo em escala real, como, por exemplo, fazer com que o escoamento sobre um modelo da asa de um avião seja válido para uma asa em tamanho natural, Fig. (1). Com isso o conceito de similaridade de escoamento é verificado, ou seja, fica garantido que as caracterı́sticas do modelo e da asa são similares, diferindo apenas na escala (Fortuna, 2000; Griebel, 1998). Um importante parâmetro utilizado com esse objetivo é o número de Reynolds, Re, caracterizado por: Re = ρo Lo Vo µ (4) Sendo µ a viscosidade dinâmica do fluı́do, e os valores Lo , Vo , ρo , são, respectivamente, valores de referência de comprimento, velocidade e densidade do fluido. 2.2 Condições de contorno e iniciais Figura 2: Componentes normal un e tangencial ut da velocidade em uma fronteira. Na modelagem do escoamento dos fluidos, inicialmente (t = 0) é imposto condições iniciais sobre as velocidades, u = u0 (x, y) e v = v0 (x, y), de tal forma que satisfaça a Eq. (1). Também é necessário estabelecer as condições de contorno do domı́nio Ω de definição do problema. Para definição das condições de contorno, sejam as componentes velocidade tangencial (ut ) e normal (un ) ao contorno do domı́nio Ω. Para pontos ao longo do contorno do domı́nio, e para pontos que definem o contorno dos obstáculos caso haja, considera-se as seguintes condições de contorno: Condição tipo No-slip (parede ou obstáculo sólido não-escorregadios): Neste tipo de condição de contorno, tanto a velocidade normal un quanto a velocidade tangencial ut são nulas, Fig. (2). Essas condições refletem o fato do fluido imediatamente adjacente à superfı́cie da parede estar em repouso em relação à parede e também reflete o fato que o fluido não pode penetrar na parede. Condição tipo Free-slip (parede ou obstáculo sólido escorregadios): Da mesma forma que em uma fronteira tipo no-slip, a velocidade normal do fluido é nula. Porém, a derivada normal de velocidade tangencial é nula, ou seja, ∂ut /∂n = 0. Isso significa que a velocidade tangencial não muda na direção normal. Condição tipo Inflow (Região de entrada de fluido): A velocidade em uma região de entrada de fluido é explicitamente fornecida. Em certos problemas, a velocidade de entrada tem que respeitar certas condições inerentes para não criar dispersões numéricas na solução. Condição tipo Outflow (Região de saı́da de fluido): Em uma região de saı́da de fluido as derivadas normais da velocidade nomal un e tangencial ut são consideradas nulas, ou seja, ∂ut /∂n = ∂un /∂n = 0. Essa condição reflete o fato que a velocidade total não muda na direção normal no contorno. 2.3 Tratamento numérico As Eqs. (1), (2) e (3) são discretizadas pelo método das diferenças finitas. O processo de discretização das esquações de Navier-Stokes por diferenças finitas pode ser consultado com todos os detalhes em Griebel (1998). A seguir, apresentamos um resumo das principais caracterı́sticas da formulação de diferenças finitas para as equações de Navier-Stokes. Observando Figura 3: Malha deslocada as equações de Navier-Stokes, pode-se notar que elas definem um conjunto de equações com três incógnitas a serem determinadas: velocidade u na direção x, velocidade v na direção y e a pressão p. Uma forma de discretizar o domı́nio é considerar as incógnitas concentradas todas em um ponto da malha, entretanto tal abordagem pode gerar campos oscilatórios de pressão. Um forma de evitar isso é considerar as incógnitas localizadas em posições diferentes. Uma malha que tornou-se padrão no cálculo de escoamentos incompressı́veis formulados por diferenças finitas e aquela que utiliza as incógnitas armazenadas em posições distintas, denominada malha deslocada ou Staggered grid, Fig. (3) (Fortuna, 2000). Esta malha é caracterizada por células e não por pontos como usualmente encontrado na literatura. A distribuição das incógnitas nas células acontece de forma que a pressão pij esteja localizada nos centros, a velocidade uij nas aretas verticais e a velocidade vij nas aretas horizontais, como mostra a Fig. 3. Os termos de derivada primeira e segunda ordem, em relação a x e a y, das Eqs. (1), (2) e (3) são, respectivamente, discretizados por diferenças atrasadas e diferenças centrais. Figura 4: Interpolação de pontos não definidos na malha. Figura 5: Interpolação de pontos não definidos na malha para o esquema donor-cell. Para discretizar os termos convectivos, ∂u2 /∂x, ∂v 2 /∂y, ∂uv/∂x e ∂uv/∂y, é necessário uma estratégia especial. Tal estratégia surge devido a necessidade de serem considerados pontos não definidos na malha para realizar a discretização. Além disso, nos escoamento onde a convecção é dominante, como aqueles com alto números de Reynolds, uma discretização adequada dos termos convectivos é de extrema importância para que não ocorram oscilações ou dispersões na solução numérica (Fortuna, 2000). Uma forma de discretizar ∂uv/∂y, como sugerido por Griebel (1998), é calcular a média u e v nos pontos marcados com ×, mostrado na Fig. (4), através da média dos pontos definidos na malha, o que nos dá a Eq. ( 5).De forma semelhante, pode-se discretizar o termo ∂u2 /∂x tomando a diferença central dos pontos marcado com +, mostrado Fig. (4). Tais pontos são obtidos da média dos pontos na malha, como no caso anterior. ∂uv 1 (vi,j + vi+1,j ) (ui,j + ui,j+1 ) (vi,j−1 + vi+1,j−1 ) (ui,j−1 + ui,j ) (5) − = ∂y i,j δy 2 2 2 2 2 2 2 ! ∂u ui,j + ui+1,j ui−1,j + ui,j 1 − (6) = ∂x i,j δx 2 2 Entretanto, a utilização da discretização por diferenças finitas centrais para ∂uv/∂y como representado na Eq. (5), pode gerar oscilações numéricas quando os termos convectivos tornam-se predominantes, ou seja, quando o número de Reynolds ou a velocidade do escoamento tornamse elevados (Griebel, 1998). Para contornar esse fato, é utilizado critérios de estabilização na discretização dos termos convectivos, conhecidos como upwind. O critério upwind é um esquema de discretização que depende da direção do escoamento em um ponto (i, j) da malha. No presente trabalho utilizou-se o esquema de estabilização donor-cell, descrito em Griebel (1998). Para explicar o esquema donor-cell, considere os termos convectivos da forma ∂ku/∂x definidos em um domı́nio unidimensional, assumindo que k seja dado nos pontos médios, conforme Fig. (5). A discretização dos termos convectivos pela esquema donor-cell é dado por: kr ur − kl ul ∂ku (7) = ∂x i δx sendo ur e ul escolhido de acordo com o sinal de kr e kl : ui , kr > 0 ui−1 , kl > 0 ur = ul = ui+1 , kr < 0 ui , kl < 0 (8) O esquema de estabilização donor-cell é de ordem Θ(δx). Em geral, a discretização upwind introduz uma forte difusão numérica na solução (Fortuna, 2000). Uma forma de diminuir a difusão numérica e melhorar a ordem de aproximação obtida com o esquema é utilizar uma estratégia hı́brida de discretização, baseada na junção da discretização por diferenças centrais, como apresentada na Eq.(5), e da discretização por upwind: γ.diferenças upwind + (1 − γ).diferenças centrais (9) sendo o parâmetro γ escolhido no intervalo [0, 1]. De acordo com Griebel (1998), γ deve ser escolhido de tal forma que: ui,j δt vi,j δt (10) , γ ≥ max i,j δx δy onde ui,j e vi,j são as componentes de velocidades da célula (i, j) e δt representa o passo no tempo. Assim, utilizando o esquema hı́brido, a discretização do termo ∂uv/∂y será : ∂uv 1 (vi,j + vi+1,j ) (ui,j + ui,j+1 ) (vi,j−1 + vi+1,j−1 ) (ui,j−1 + ui,j ) + − = ∂y i,j δy 2 2 2 2 γ |vi,j + vi+1,j | (ui,j − ui,j+1 ) |vi,j−1 + vi+1,j−1 | (ui,j−1 − ui,j ) (11) − δy 2 2 2 2 Seguindo esses mesmos princı́pios utilizados para discretizar o termo ∂uv/∂y, pode-se discretizar os outros termos convectivos presentes nas Eqs. (2) e (3). As componentes da velocidade, u e v também variam com o tempo. A discretização temporal desses termos é aproximada de maneira semelhante as derivadas com relação ao espaço. Um intervalo de tempo [0, tf inal ] de análise é definido e subdivido em subintervalos de tempo δt. As equações das velocidades são discretizadas utilizando o método de Euler explı́cito (Fortuna, 2000). As derivadas são computadas no passo de tempo (n + 1) utilizando as informações do passo n. Tal abordagem, quando aplicada as equações da continuidade produzem uma expressão explı́cita para o cálculo das velocidades no passo de tempo (n + 1), ou seja, produz uma expressão que não há necessidade de solucionar um sistema linear para obtê-las: (n+1) (n+1) ∂u ∂v u(n+1) − u(n) v (n+1) − v (n) = = (12) ∂t δt ∂t δt Um fato importante que deve ser considerado é a escolha do tamanho da passo de tempo, pois um valor que não seja adequado pode gerar oscilações numéricas, já que o esquema explı́cito é condicionalmente estável. De acordo com Griebel (1998), δt deve ser escolhido de forma que: ! −1 Re 1 1 δy δx δt = τ min + , . (13) , 2 δx δy |umax | |vmax | onde τ é um parâmetro escolhido no intervalo ]0, 1], |umax | e |vmax | são as velocidades máximas no domı́nio nas direções x e y, respectivamente. Aplicando as derivadas temporais discretizadas por Euler explı́cito nas equações de momento, obtêm-se: ∂u2 ∂uv ∂p 1 ∂ 2u ∂ 2u (n+1) (n) − + − − . u = u + δt Re ∂x2 ∂y 2 ∂x ∂y ∂x 1 ∂ 2u ∂ 2u ∂u2 ∂uv ∂p (n+1) (n) v = v + δt − + − − . Re ∂x2 ∂y 2 ∂x ∂y ∂x Inserindo a abreviação: 1 ∂ 2u ∂ 2u ∂u2 ∂uv (n) (n) F = u + δt . − − + Re ∂x2 ∂y 2 ∂x ∂y 1 ∂ 2u ∂ 2u ∂u2 ∂uv (n) (n) G = v + δt − + − . Re ∂x2 ∂y 2 ∂x ∂y (14) (15) (16) Obtêm-se a seguintes expressões para o cálculo das velocidades: ∂p(n+1) . ∂x ∂p(n+1) = G(n) − δt . ∂y u(n+1) = F (n) − δt (17) v (n+1) (18) As Eqs. (17) e (18) representam a discretização das equações de momento Eqs. (2) e (3). No processo de cálculo das velocidades, os valores de F e G são associados ao nı́vel de tempo n, enquanto que os termos associados a pressão são referentes ao nı́vel de tempo n + 1. Substituindo as Eqs. (17) e (18) na Eq. (1), obtêm-se a equação de Poisson para a pressão: ∂ 2 p(n+1) ∂ 2 p(n+1) 1 ∂F (n) ∂G(n) (19) + = + ∂x2 ∂y 2 δt ∂x ∂y Essa abordagem de discretização é caracterizada sendo explı́cita na velocidade e implı́cita na pressão, já que há a necessidade de resolver o sistema linear esparso obtido a partir da Eq. (19) quando é aplicado o método das diferenças finitas. Uma vez calculado o valor da pressão no passo n + 1 obtido pela solução do sistema linear, pode-se obter os valores das velocidades utilizando as Eqs. (17) e (18). 2.4 Tratamento das geometrias irregulares A condições de contorno não acontecem apenas nos limites do domı́nio analisado, mas também podem ocorrer em obstáculos inseridos no domı́nio, como por exemplo na Fig. (6). Na presença de obstáculos, para aplicar as condições de contorno, é necessário identificar o conjunto de células (Fig. (3)) que fazem parte do obstáculo. Tal processo de identificação pode se tornar muito difı́cil quando se considera geometrias complexas. Considere, por exemplo, o estudo do escoamento no domı́nio mostrado na Fig. (6). A irregularidade na geometria dos obstáculo dificulta o processo de tratamento das condições de contorno. Uma forma de tratar as condições de contorno desse problema é gerar o domı́nio de discretização a partir de uma imagem que identifica a região de fluido e a região de obstáculos pela diferença de cores de cada pixel, que representam uma célula no domı́nio, como abordado em Rodrigues and Catabriga (2009); Griebel (1998). A partir de uma imagem que define a geometria do domı́nio, o processo de indentificação dessas células consiste em fazer com que cada pixel dessa imagem represente uma célula na malha. De acordo com a cor de cada pixel é identificado se uma determinada célula está na região de escoamento de fluido ou não. A Fig. (6) mostra uma região de um domı́nio onde os pixels de cor branca representam a região de escoamento do fluido e os pixels de cor cinza os obstáculos. Figura 6: Imagem que define as regiões do domı́nio. 2.5 Solução do sistema linear resultante Para a solução do sistema linear resultante adotamos o método dos Resı́duos Mı́nimos Generalizados com reinicializações, GMRES(m). Este método está baseado nos subespaços de Krylov, que podem ser definidos por: Km (A, r0 ) = span{r0 , Ar0 , A2 r0 , . . . , Am−1 r0 } (20) onde A é a matriz dos coeficientes do sistema linear, r0 = b − Ax0 é o resı́duo inicial do sistema, x0 é a solução inicial e m é a dimensão do subespaço de Krylov (Saad, 2003). A solução aproximada do sistema pode então ser representada por: xm = x0 + c0 r0 + c1 Ar0 + c2 A2 r0 + · · · + cm−1 Am−1 r0 (21) Para encontrar essa solução aproximada é necessário encontrar os coeficientes desconhecidos ci que podem ser determinados a partir da minimização da função: R(xm ) = r(xm )T r(xm ) (22) O processo de minimização da Eq. (22) pode ser encontrado com mais detalhes em Saad (2003); Barrett et al. (1994). Dependendo do problema fı́sico que resulta na necessidade de solução de um sistema linear, a convergência do GMRES(m) pode ser lenta. Com intuı́to de acelerar o processo de convergência, na resolução do sistema linear podem ser considerados precondicionadores (Saad, 2003; Barrett et al., 1994). Entre as classes de precondicionadores mais utilizados destacam-se os precondicionadores baseados na decomposição LU incompleta. Neste trabalho, estudamos a ação do precondicionador ILU (0), que desconsidera qualquer nı́vel de preenchimento fill-in na matriz resultante (Saad, 2003). Neste trabalho faremos comparações entre o método iterativo estacionário SOR (White, 2003) com o GMRES na solução do sistema linear proviniente da Eq. (19). 3. EXPERIMENTOS NUMÉRICOS Nesta seção mostramos os resultado obtidos para alguns problemas clássicos regidos pelas equações de Navier-Stokes, tais como: o escoamento em uma cavidade, o escoamento sobre um degrau e o escoamento em torno de um disco. Também mostraremos alguns exemplos de escoamentos através de obstáculos. Em todos os testes realizados foram considerados o parâmetro de upwind, γ = 0.9 e parâmetro de estabilização do passo de tempo τ = 0.5, conforme adotado em Griebel (1998). Na próxima seção concentraremos nossa discussão na verificação da acuidade do código desenvolvido para os três tipos escoamentos citados. Na seção 4.2 estudaremos o comportamento dos métodos iterativos SOR e GMRES(m) para alguns casos dos problemas fı́sicos citados acima. 3.1 Validação da implementação Escoamento em uma cavidade Considere a cavidade mostrada na Fig. 7(a). A partir do instante inicial t0 = 0, a tampa superior começa a ser mover com uma velocidade constante ū que, devido as tensões viscosas entre as camadas do fluido, gera o movimento do fluido no interior da cavidade (Fortuna, 2000). A velocidade de entrada é ū = 1 e os valores iniciais de pressão e velocidades são p = 0, u = 0 e v = 0. A condição no-slip é considerada em todas as fronteiras para um escoamento com Reynolds Re = 1000. No processo de discretização utilizamos uma malha com 128 × 128 células no domı́nio quadrado de dimensões (0; 1) × (0; 1). A (a) Descrição do domı́nio. (b) Linhas de corrente (c) Campo de velocidade do fluido Figura 7: Escoamento em uma cavidade para Re = 1000 em estado estacionário. Fig. 7(b) mostra as linhas de corrente e a Fig. 7(c) mostra o campo de velocidades do fluido para Re = 1000 após atingir o estado estacionário. Observamos que, além da região de circulação central, formam-se regiões de circulação secundárias. Esse fato não é observado quando se aplica valores pequenos de número de Reynolds. O comportamento de escoamento encontrado está de acordo com os resultados encontrados em Griebel (1998). As Figs. (8(a)) e (8(b)) apresentam, respectivamente, o domı́nio e o escoamento em uma cavidade na presença de obstáculos, considerando as mesmas caracterı́stica aplicada ao domı́nio mostrado na Fig. (7(a)). Observamos um comportamento coerente do escoamento em uma cavidade com obstáculos comparada com o escoamento na ausência de obstáculos. (a) Domı́nio com obstáculos (b) Linhas de corrente Figura 8: Escoamento em uma cavidade para Re = 1000 com obstáculos. Escoamento sobre um Degrau Outro problema bastante popular no processo de validação de códigos de simulação é a análise do comportamento do fluido sobre um degrau, como mostra a Fig. 9. O fluido entra no domı́nio com velocidade horizontal u0 e seu comportamento é alterado devido ao alargamento do canal. O fluido entra na fronteira da direita com condição de contorno tipo inflow e sai na fronteira da esquerda com condição de controno tipo outflow. Figura 9: Descrição do domı́nio - Escoamento sobre um degrau Nas fronteiras superior e inferior é considerado a condição de contorno tipo no-slip. O domı́nio, com dimensões de (0; 29) × (0; 1, 5), foi discretizado por uma malha com 288 × 72 células. O degrau está localizado em (7, 8; 0, 8). Os valores inicias de pressão e velocidades são p = 0, u = 0 e v = 0, entretanto é considerado u = 1 na metade superior do domı́nio para que, no instante inicial, o fluido dentro do domı́nio satisfaça a equação da continuidade (Griebel, 1998). As Figs. (10(a)) e (10(b)) mostram as linhas de corrente do escoamento sobre o degrau, (a) Linhas de corrente para Re = 100 (b) Linhas de corrente para Re = 500 Figura 10: Escoamento sobre um de degrau para Re = 100 e Re = 500 respectivamente, para Re = 100 e Re = 500 após atingir o estado estacionário. Observa-se que o aumento do número de Reynolds faz com que uma segunda região de recirculação adjacente a fronteira superior seja gerada. Resultados semelhantes podem serem encontrados em Griebel (1998); Fortuna (2000). Figura 11: Domı́nio do escoamento em torno de um disco com raio r = 1.2. Escoamento em um canal É considerado um domı́nio retangular (0, 29) × (0, 5) discretizado por uma malha com 288 × 72 células. As condições de contorno estão representadas na Fig. 11. Na entrada do fluido é considerado um perfil parabólico com velocidade máxima de u0 = 1, 5. A Fig. 12 apresenta o escoamento no canal na presença de um disco, onde nota-se a formação de vórtices periódicos para Re = 100. A Fig. 13 considera obstáculos com geometrias variadas no mesmo domı́nio apresentado na Fig. 11. O comportamento do escoamento em um canal para Re = 50 na presença de obstáculos pode ser observado na Fig. 14. 3.2 Análise dos métodos iterativos Para a solução do sistema linear resultante utilizamos os métodos SOR e GMRES com e sem o precondicionador ILU(0). Consideramos na análise dos métodos GMRES e GMRES- Figura 12: Linhas de corrente para o escoamento em torno do disco para Re = 100. Figura 13: Domı́nio para o escoamento em um canal com obstáculos. Figura 14: Linhas de corrente para o escoamento em um canal com obstáculos para Re = 50. PRE (GMRES com o precondicionador ILU(0)) diferentes números de vetores na base do espaço de Krylov (especificamente 5, 10, 15 e 20 vetores). No problema da cavidade, consideramos os mesmos dados já descritos na seção anterior, porém todos os testes são analisados no intervalo de tempo [0; 2] e a tolerâncida adotada é de 10−4 . Nas Figs. 15(a) e 15(b) podemos observar, respectivamente, o comportamento do número de iterações por passo de tempo para os métodos GMRES e GMRES-PRE. Nas figuras a medida que o problema avança no tempo o número de iterações diminui. Além disso, podemos notar claramente que a variação do número de vetores na base afeta o número de iterações do métodos GMRES e GMRES-PRE. Ocorre uma queda no número de iterações a medida que a ordem do espaço aumenta. Essa caracterı́stica está de acordo com o esperado, já que o número de vetores na base do espaço de Krylov tem forte influência sobre o número de iterações para atingir a precisão desejada. 5000 120 GMRES(5) GMRES(10) GMRES(15) GMRES(20) 4500 GMRES-PRE(5) GMRES-PRE(10) GMRES-PRE(15) GMRES-PRE(20) 100 4000 3500 Iteration number Iteration number 80 3000 2500 2000 60 40 1500 1000 20 500 0 0 0 10 20 30 40 50 step in time 60 (a) GMRES(m) 70 80 90 100 0 10 20 30 40 50 step in time 60 70 80 90 100 (b) GMRES-PRE(m) Figura 15: Número de iterações do método GMRES por passo de tempo - Problema da cavidade. A Fig. 16(a) mostra o número total de iterações e a Fig. 16(b) mostra o tempo total de processamento para os métodos SOR, GMRES com e sem precondicionamento para 5, 10, 15 e 20 vetores na base. Podemos observar que o método GMRES converge em um número menor de iterações para a maioria do número de vetores de Krylov quando comparado com o método SOR. Porém, o tempo de processamento compromete a eficiência do método GMRES se não for considerado um precondicionador. Para esse teste observamos que o GMRES-PRE(10) precondicionado necessitou do menor tempo de processamento. Além disso, pode ser observado que todos os testes realizados com o GMRES-PRE, obtiveram menor tempo de processamento que o método SOR. GMRES(5) GMRES(10) GMRES(15) GMRES(20) GMRES−PRE(5) GMRES−PRE(10) GMRES−PRE(15) GMRES−PRE(20) SOR 100000 100 total processing time total iteration number 10000 GMRES(5) GMRES(10) GMRES(15) GMRES(20) GMRES-PRE(5) GMRES-PRE(10) GMRES-PRE(15) GMRES-PRE(20) SOR 1000 1000 100 10 1 10 0.1 1 0.01 SO E E PR PR S- RE R M G S RE S− RE R M G SO M G S RE M G (b) Tempo total de processamento. (a) Número total de iterações. Figura 16: Comparativo do número de iterações e tempo de processamento - Problema da cavidade. A Fig. 17 mostra o tempo de processamento para os métodos SOR, GMRES(15) e GMRESPRE(10) durante todos os passos de tempo considerados. Os métodos GMRES(15) e GMRESPRE(10) foram escolhidos por apresentarem o menor tempo de processamento para os casos sem e com precondicionador. Observamos que a medida que o tempo avança o tempo de processamento tende a ser bem pequeno e o mesmo para os três métodos. Isso explica porque o método SOR, que reconhecidamente é um método com convergência bastante lenta, acaba sendo comparável em termos de número de iterações e tempo de processamento que o métodos GMRES para essa aplicação. 25 GMRES(15) GMRES-PRE(10) SOR time per step 20 15 10 5 0 0 10 20 30 40 50 step in time 60 70 80 90 100 Figura 17: Comparativo dos melhores tempo por passo dos métodos SOR, GMRES e GMRES-PRE Problema da Cavidade. No problema do disco, consideramos os mesmos dados já descritos na seção anterior, porém todos os testes são analisados no intervalo de tempo [0; 2, 4] e a tolerâncida adotada é de 10−3 . O comportamento dessa aplicação é similar aquele observado para o problema da cavidade. A Fig. 18 mostra o número total de iterações e o tempo total de processamento para os métodos SOR, GMRES com e sem precondicionamento para 5, 10, 15 e 20 vetores na base. Também neste caso podemos observar que o método GMRES converge em um número menor que o método SOR, mas que o tempo de processamento é maior quando não é considerado o precondicionamento. Na Fig. 19 podemos observar o tempo de processamento para os métodos SOR, GMRES(20) e GMRES-PRE(15) durante todos os passos de tempo considerados. Como no caso anterior, ss métodos GMRES(20) e GMRES-PRE(15) foram escolhidos por apresentarem o menor tempo de processamento para os casos sem e com precondicionador. Neste caso cabem as mesmas explicações que no caso da cavidade, ou seja, a medida que o tempo avança, o sistema linear converge para um número muito pequeno de iterações necessitando de um tempo pequeno e constante para atingir a convergência. GMRES(5) GMRES(10) GMRES(15) GMRES(20) GMRES−PRE(5) GMRES−PRE(10) GMRES−PRE(15) GMRES−PRE(20) SOR 100000 100 total processing time total iteration number 10000 1000 100 GMRES(5) GMRES(10) GMRES(15) GMRES(20) GMRES-PRE(5) GMRES-PRE(10) GMRES-PRE(15) GMRES-PRE(20) SOR 1000 10 1 10 0.1 1 0.01 SO E E PR PR S- RE R M G S RE S− RE R M G SO M G S RE M G (b) Tempo total de processamento. (a) Número total de iterações. Figura 18: Comparativo do número de iterações e tempo de processamento - Problema do disco. 100 GMRES(20) GMRES-PRE(15) SOR time per step(logarithm scale) 10 1 0.1 0.01 0 20 40 60 80 100 step in time Figura 19: Comparativo dos melhores tempo por passo dos métodos SOR, GMRES e GMRES-PRE Problema do disco. 4. CONCLUSÕES Este trabalho teve por objetivo estudar o comportamento de uma formulação explicı́taimplı́cita das equações de Navier-Stokes para escoamentos incompressı́veis baseada no método das diferenças finitas. Os termos não lineares das componentes horizontal e vertical da velocidade foram aproximados por diferenças finitas de primeira ordem utilizando uma aproximação upwind e as derivadas temporais foram aproximadas pelo método de Euler explı́cito. Já a pressão foi aproximada por diferenças finitas de segunda ordem necessitando portanto da solução de um sistema linear em cada passo de tempo. Foram analisados o comportamento da formulação implementada no problema do escoamento em uma cavidade, no problema do escoamento sobre um degrau, no problema em torno de um disco e em problemas similares na presença de obstáculos. A geometria irregular dos obstáculos no domı́nio foi definida a partir de uma imagem que identifica a região de fluido e a região dos obstáculos pela diferença de cores de cada pixel. Também foi feito um estudo do comportamento do sistema linear resultante para o cálculo da pressão considerando o método não estacionário GMRES com relação ao número de vetores necessários para reinicializar o método considerando o precondicionador ILU(0). Através dos testes realizados observamos a acurácia da formulação, mesmo na presença de obstáculos para todas as aplicações analisadas. A utilização do precondicionador ILU(0) no método GMRES foi crucial para esse método apresentar vantagens em tempo de processamento com relação ao método SOR. A principal razão para que o método SOR tenha um comportamento comparável ao GMRES nas aplicações estudadas está no fato delas necessitarem em tempos mais avançados de um número muito reduzido de iterações, consequentemente, menor tempo de processamento. Uma vez que o método GMRES possui cada iteração mais cara computacionalmente que o método SOR, quando o número de iteração para a convergência for pequeno para ambos, o método SOR tende a ter vantagens em termos de tempo de processamento. Agradecimentos Rafael Alves Rodrigues agradeçe a Fundação de Apoio a Pesquisa do Estado do Espı́rito Santo (FAPES) pela bolsa de Iniciação cientı́fica concedida pelo Programa de Institucional de Bolsas de Iniciação Cientı́fica (PIBIC). Os autores agradecem ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Cientı́fico e Tecnológico (CNPq) pelo apoio recebido dentro do escopo o do Projeto CNPq 620185/2008-2. Referências Barrett, R., Berry, M., Chan, T. F., Demmel, J., Donato, J., Dongarra, J., Eijkhout, V., Pozo, R., Romine, C., & der Vorst, H. V., 1994. Templates for the Solution of Linear Systems: Building Blocks for Iterative Methods, 2nd Edition. SIAM, Philadelphia, PA. Fortuna, A. O., 2000. Técnicas Computacionais para Dinâmica dos Fluidos - Conceitos Básicos e Aplicações. Edsup - Editora da Universidade de São Paulo. Griebel, M., 1998. Numerical Simulation Fluid Dynamics. SIAM, Philadelphia, PA. Rodrigues, R. & Catabriga, L., 2009. Tratamento de obstáculos com geometria complexa aplicada a escoamentos laminares. In Anais do Congresso Nacional de Matemática aplicada e Computacional, Cuiába, Brasil. Saad, Y., 2003. Iterative methods for sparse linear systems, 2nd Edition. Society for Industrial - Applied Mathematics. White, R. E., 2003. Computational Modeling with Methods and Analys. CRC Pres.