QUÍMICA GERAL UNIDADE 1: Introdução ao Estudo da Química 1. Aspectos Históricos A Ciência, como um conjunto organizado de conhecimentos, apresenta-se dividida em várias disciplinas, entre elas a Química, que estuda a natureza da matéria, suas propriedades, suas transformações e a energia envolvida nesses processos. O termo química tem origem no latim “chimica”, palavra que deriva de “alchimia”, modificação da expressão árabe “al kêmiyâ”, cujo significado é “grande arte dos filósofos herméticos e sábios da Idade Média.” É impossível dizer precisamente quando a química começou, na realidade, a idade da química é a idade do mundo. Ela sempre existiu, no entanto, seu surgimento é atribuído à descoberta do fogo, onde as condições de vida e segurança do homem primitivo foram aprimoradas. Apesar de se ter conhecimento de manifestações químicas muito antes da Idade Média (preparo do bronze e do vidro pelos egípcios, cerca de 3000 a.C.), foram os alquimistas (de 300 a 1400) que contribuíram de forma acentuada para o desenvolvimento do que constitui a ciência Química. Os alquimistas surgiram na Alexandria por espaço de três séculos. Por ordem de um imperador, chamado Dioclesiano, por volta do ano de 292 d.C., os escritos sobre a alquimia foram queimados. Os alquimistas ressurgiram no Oriente e lá, destacava-se, Abu Musa Jabir ibn Hayyan al Surffi, conhecido como Geber. É do Oriente que veio “O Livro dos Segredos”, livro este, tomado por base pelos ocidentais. Na Idade Média, os alquimistas realizaram uma busca sem sucesso pela “pedra filosofal” (substância que seria capaz de transformar qualquer metal em ouro) e pelo “elixir da longa vida” (um tipo de infusão capaz de curar todos os tipos de doenças e proporcionar a vida eterna). Os alquimistas não obtiveram sucesso em sua busca, mas introduziram e aperfeiçoaram técnicas de metalurgia; sintetizaram várias substâncias, entre elas: medicamentos, ácidos e sais; isolaram outras substâncias, além de terem identificado várias propriedades dos metais e registrado grande número de experimentos em suas observações. Com o surgimento da Iatroquímica, ou Química Medicinal, cujo desenvolvimento se deve ao alquimista e médico suíço Theophrastus Bombastos von Hohenheim, mais conhecido como Paracelsus, pioneiro na utilização de produtos químicos puros para tratar doenças, a química ganha um novo significado. A partir do século XVII, a ciência se transforma, tornando-se mais experimental e menos filosófica, pois, multiplicavam-se as observações e as experiências; os fenômenos eram classificados; procuravam-se vínculos entre esses fenômenos e eram elaboradas hipótese explicativas. Dentre os cientistas com esta nova proposta, destacava-se o francês Antoine Laurent Lavoisier (1743 - 1794), com a publicação, em março de 1789 de seu Tratado Elementar de Química, esta é considerada a certidão de nascimento da Química Moderna e por seu trabalho, Lavoisier é considerado o pai da química que conhecemos hoje em dia. Para saber mais sobre o tema, leia um dos livros: CHAGAS, Aécio Pereira. Como se Faz Química: Uma Reflexão sobre a Química e a Atitude do Químico. Campinas – SP: Unicamp, ISBN: 85268, 1992. FELTRE, Ricardo. Química: Química Geral. São Paulo – SP: Moderna. Vol. 1, 4ª ed., 1995, 467p. Ou acesse o site: www.vestibular/historiadaquímica.com.br 1.1. A Importância da Química Podemos dizer que tudo à nossa volta é química, pois todos os materiais que nos cercam passaram ou passam por algum tipo de transformação. Assim, a química está presente nos produtos de limpeza, nas roupas, nos alimentos, nos meios de transporte, nos remédios, em fim, tudo o que nos cerca é química e até nos mesmos somos química. Contudo, é comum ouvirmos comentários que depreciam essa ciência, relacionando-a a desastres ecológicos, poluição, envenenamentos, entre outros. Estes fatos, infelizmente, encobrem as importantes conquistas do homem através do conhecimento químico. Na verdade, o problema não está na Química, mas no seu uso, ela em si, não é má nem boa, tudo depende de quem a utiliza, pois ainda são muitos aqueles que, movidos por interesses pessoais, utilizam-na de forma inadequada. Mudar este papel não é apenas trabalho do químico, mas de toda a sociedade na busca pela melhoria da qualidade de vida e a coexistência harmoniosa entre o homem e o meio ambiente. 2. Conceitos Fundamentais A matéria é definida como tudo aquilo que tem massa e ocupa um lugar no espaço. Desta forma, podemos dizer que tudo aquilo que existe é matéria, pois se existe, tem uma certa massa, seja ela maior ou menor, se tem massa, ocupa um lugar no espaço. Uma porção limitada da matéria forma um corpo, se este corpo se presta a um determinado fim, é chamado de objeto. Existem vários tipos de objetos, constituídos por corpos e estes por tipos diversos tipos de matéria. Os diferentes tipos de matéria são chamados de substâncias. Veja os exemplos: Um copo de vidro – o copo é um objeto (se presta a um determinado fim); a matéria, o tipo de substância que forma o copo, é o vidro; se o copo for quebrado, um pedaço do vidro será um corpo (uma porção limitada da matéria). Uma cadeira de madeira – a madeira é a matéria que forma a cadeira; uma tábua é um corpo feito de madeira (é uma porção limitada da matéria); a cadeira é um objeto (se presta a um determinado fim); Nesses exemplos, observamos que a matéria pode ser transformada em um corpo e um corpo em um objeto, para que isto aconteça, é necessário que se gaste energia. Assim, podemos conceituar energia como tudo aquilo que pode modificar a matéria, provocar ou anular movimentos e ainda causar sensações. Suponha o exemplo de uma hidrelétrica: A água represada possui energia potencial; quando as comportas são abertas, a água passa a movimentar-se e sua energia potencial é transformada em energia cinética. A queda da água provoca o movimento das turbinas, transformando a energia cinética em energia mecânica; o movimento das turbinas converte a energia mecânica em energia elétrica, que é transportada por fios até as nossas casas. Em nossa casa, a energia elétrica pode ser transformada em luminosa (uma lâmpada acesa); calorífica (um ferro elétrico); mecânica (um ventilador); entre outras formas. Se você prestou atenção, em nenhum momento foi mencionado que a energia era criada ou destruída, isto constitui o que chamamos de Princípio de Conservação da Matéria e Energia – a matéria e a energia não podem ser criadas nem destruídas, apenas são transformadas de uma forma em outra. Assim, quando queimamos o papel, não estamos destruindo o papel, ele está sendo transformado em cinzas, fumaça e liberando energia na forma de calor, não está sendo destruído, está sendo transformado de uma forma em outra. 3. Fenômenos ou Transformações Todo e qualquer acontecimento da natureza é chamado de fenômeno e pode ser classificado em: Físico – não modifica a natureza do material, pois as entidades não são alteradas, ou seja, a substância continua sendo a mesma. Como por exemplo: O derretimento do gelo - é um fenômeno físico pois, o gelo é feito de água e quando derretido, continua sendo água, porém sua forma de agregação foi modificada, pois passou do estado sólido para o estado líquido. A quebra de um material, ou quando rasgamos o papel - ele não deixa de ser o que era antes, então, também constitui um fenômeno físico, pois a substância continua sendo a mesma, apenas a sua forma foi modificada. Químico – modifica a natureza do material, formando uma nova substância, pois as entidades são alteradas. Os fenômenos químicos também são chamados de reações. Exemplos: Quando queimamos o papel, ele será transformado em cinzas, fumaça e irá liberar energia na forma de calor, isto constitui um exemplo de fenômeno químico, pois modificou a natureza do material, formando uma nova substância. As entidades foram alteradas. 4. Estados Físicos da Matéria Uma das propriedades da matéria facilmente observável, e de muita utilidade, é o estado físico, ou fase de agregação. Conforme as condições em que se encontram, as substâncias podem se apresentar na fase sólida, líquida ou gasosa. O estado sólido pode ser reconhecido por ter forma rígida e volume constante, que muda muito pouco com a alteração da pressão, pois as partículas se encontram compactadas numa rede regular e não têm liberdade de movimento, têm apenas vibrações discretas, incapazes de alterar a forma da substância. O estado líquido apresenta volume constante, mas é um fluído, ou seja, toma a forma do recipiente que o contém, não tem forma própria, pois os átomos e as moléculas estão dispostos ao acaso, e não numa rede regular. Num gás, a forma e o volume são variáveis, o gás se expande ou se contrai muito facilmente, pois há muito espaço entre suas entidades. Veja a figura 1, ele mostra o arranjo das entidades nos três estados de agregação da matéria. Sólido H2O(s) Gasoso Líquido Δ H2O(l) Δ H2O(g) Figura 1: Representação dos estados de agregação da matéria - água (sólido, líquido e gasoso) Na figura 1, onde observamos as características dos três estados de agregação, exemplificamos a água, que muda de fase de acordo com o aquecimento, representado pelo símbolo Δ. Veja na representação, o arranjo das moléculas de água nas diferentes fases e como este arranjo explica as propriedades físicas que observamos na água ou em qualquer outra substância, de acordo com a fase de agregação em que se encontram. 4.1. Mudança de Fase de Agregação Imagine um bloco de gelo, se ele for colocado fora da geladeira, ele recebe energia na forma de calor, pois a temperatura ambiente ( ~25ºC ), é uma temperatura suficiente para provocar uma mudança de fase no gelo. A medida que o sólido é aquecido, a energia das partículas constituintes vão aumentando e as entidades que formam o sólido passam a vibrar de forma cada vez mais forte, até que conseguem quebrar a estrutura do sólido, assumindo a forma de um líquido. Se o líquido continuar sendo aquecido, as entidades passaram a vibrar de tal forma até que possam se livrar das forças de atração umas com as outras, e cada molécula fica afastada das demais e movimenta-se com muita velocidade, é o estado gasoso. Essas mudanças recebem denominações especificas, como mostra a figura 2. Sublimação Fusão sólido Vaporização líquido Solidificação gasoso Condensação Ressublimação Figura 2: Representação e denominações das mudançasdos de estado de agregação da matéria De acordo com a figura 2, percebemos que um sólido pode receber calor e passar para o estado líquido – é a fusão. Se o líquido continuar sendo aquecido, ele pode passar para o estado gasoso – é a vaporização. Se o vapor for resfriado, ele passa do estado gasoso para o estado líquido – é a condensação. Se o líquido for resfriado, ele passa para o estado sólido – é a solidificação. Se ocorrer um aquecimento brusco, excessivo, o sólido pode passar diretamente para o estado gasoso sem formação de líquido, esta mudança é denominada sublimação. De forma inversa (um resfriamento brusco), pode transformar determinadas substâncias do estado gasoso para o sólido sem que haja a formação de líquido, teremos então, uma ressublimação. 4.2. Substância Pura e Misturas: Diferença Prática As substâncias apresentam propriedades chamadas de propriedades especificas – propriedades que dependem do tipo de matéria. São exemplos de propriedades específicas: a dureza, a maleabilidade, a ductilidade, a densidade, o calor específico, o ponto de fusão, o ponto de ebulição, entre outras. Quando a temperatura de fusão e a temperatura de ebulição de uma substância são constantes, temos um comportamento que caracteriza uma substância pura. Portanto, durante a mudança de estado físico de uma substância pura, a temperatura permanece constante, caracterizando o ponto de fusão (PF - temperatura fixa e determinada, a certa pressão, onde o sólido se funde) e o ponto de ebulição (PE – temperatura fixa e determinada, a certa pressão, onde o líquido é vaporizado). A quantidade de calor utilizada pela substância para que ocorra a mudança de estado, recebe o nome de calor latente, é utilizada apenas para provocar a mudança de estado e não produz aquecimento. O calor que provoca aumento de temperatura num corpo é chamado de calor sensível. Para elevarmos em 1ºC a temperatura de 1g de água, necessitamos de 1 caloria, em outras palavras, o calor específico da água é de 1cal/gºC. De acordo com a figura 3, observamos que, toda substância, em temperaturas inferiores ao ponto de fusão, apresenta-se no T (ºC) L+V PE estado sólido. O sólido pode receber calor Líq (sensível) até atingir o ponto de fusão. Durante a fusão, a substância irá passar do estado Vap S+L PF sólido para o estado líquido sem que haja Sól mudança de temperatura (calor latente). Após Tem (min) o ponto de fusão, toda substância apresenta-se no estado líquido. Se o líquido receber calor Figura 3: Representação do comportamento de uma (sensível), pode atingir o ponto de ebulição. substância No ponto de ebulição, a substância irá passar do estado líquido para o estado gasoso em temperatura constante (calor latente). Após o ponto de ebulição, toda substância se encontra no estado gasoso. Vale lembrar que há uma diferença entre vapor e gás. Entende-se por vapor uma substância que, na temperatura ambiente, encontra-se no estado sólido ou líquido e recebe calor até vaporizar. Para voltar ao estado inicial (sólido ou líquido), basta-se resfriar o vapor, é uma Mistura T (ºC) Vap condensação. Já um gás, é uma substância que na temperatura ambiente, já se encontra no PE L+V estado gasoso. Para passar para o estado líquido, o gás deve ser resfriado e submetido a elevadas condições de pressão, esse tipo de condensação Líq PF S+L Sól recebe o nome de liquefação. Tem (min) Ao observarmos o comportamento de uma mistura quando submetida a um Figura 4: Representação do comportamento de uma aquecimento, percebemos que ela não apresenta mistura um ponto de fusão e de ebulição constante, como mostra a figura 4. No entanto, há misturas que não seguem essa regra. As misturas eutéticas apresentam temperaturas de fusão constante; as misturas azeotrópicas apresentam temperatura de ebulição constante. Observe este comportamento e alguns exemplos destes tipos de mistura na figura 5. Misturas Eutéticas T (ºC) Misturas Azeotrópicas Vap PE L+V T (ºC) Vap L+V PE Líq Líq S+L PF PF S + L Sól Sól Tem (min) Tem (min) Figura 5: Representação do comportamento de uma mistura eutética e de uma mistura azeotrópica 5. Substâncias São os diferentes tipos de matéria. As substâncias são chamadas de puras porque apresentam propriedades constantes e definidas, podendo ser classificadas em: Simples – formadas por átomos de um único elemento químico. Ex: Cl2, O2, H2, He. Compostas – formadas por átomos de mais de um elemento químico. Ex: NaCl, H2O. Em algumas situações, átomos de um mesmo elemento, podem formar substâncias simples diferentes, este fenômeno é chamado de alotropia. Veja os principais elementos que têm esta capacidade e suas respectivas fórmulas alotrópicas nas figuras de 6 a 9: Carbono * Diamante – é a substância Grafite: – é um sólido Fulereno – é bem menos duro que o mais dura da natureza e mole; lubrificante e diamante; solúvel em solventes não conduz a eletricidade conduz a eletricidade. orgânicos e utilizado no tratamento do câncer. Figura 6: Formas alotrópicas do carbono Oxigênio Oxigênio (O2) – inodoro e incolor, sendo o Ozônio (O3) – levemente azulado, poluente na responsável pela vida animal e vegetal. baixa atmosfera e utilizado como bactericida. Figura 7: Formas alotrópicas do oxigênio Fósforo Fósforo branco (P4) – tem cheiro de alho, é Fósforo vermelho (Pn) – é um pó inodoro, tóxico, forma cristais que fundem a 44ºC, na funde a 72ºC, não reage na presença da luz, presença da luz, transforma-se em fósforo não é tóxico e queima em atmosfera de vermelho. oxigênio somente por aquecimento. Figura 8: Formas alotrópicas do fósforo Enxofre Enxofre rômbico Enxofre monoclínico A substância simples enxofre apresenta-se como um sólido amarelo e pode ser encontrado em estado livre (S8). É encontrado combinado a certos minerais na forma de sulfetos ou sulfatos. É largamente utilizado na fabricação de ácidos, da pólvora e de inseticidas. Figura 9: Formas alotrópicas do enxofre 6. Misturas É a reunião de duas ou mais substâncias sem que haja reação entre elas. As misturas podem ser classificadas em: Homogêneas ou soluções – apresenta apenas uma fase, neste caso, a mistura apresenta apenas uma característica ao longo de sua extensão, ou seja, apresenta apenas um aspecto, não sendo possível distinguir seus componentes. Heterogênea – apresenta mais de uma fase, apresenta mais de uma característica ao longo de sua extensão, sendo possível distinguir os seus componentes, às vezes apenas com o uso de microscópios. Cada aspecto distinto de uma mistura que pode ser observado é chamado de fase. As misturas podem ser: monofásicas, bifásicas, trifásicas e polifásicas. Para saber mais sobre o tema, leia um dos livros: FELTRE, Ricardo. Fundamentos da Química Geral. São Paulo – SP: Moderna. Vol. Único, 3ª ed., rev. e ampl., 2004, 740p. SARDELLA, Antônio. Curso Completo de Química. São Paulo – SP: Ática. Vol. Único, 3ª ed., 2002, 751p. RUSSEL, John B. Química Geral. São Paulo - SP: Makron, 2ª ed, 1994.