189 TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO VIGÉSIMA CÂMARA CÍVEL APELAÇÃO CÍVEL Nº: 0076604-43.2013.8.19.0001 APELANTES: MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO E ESTADO DO RIO DE JANEIRO APELADA: TANIA ALVES PENA RELATOR: DES. MAURO PEREIRA MARTINS APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO À SAÚDE. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER PROPOSTA EM FACE DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO E DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTO NECESSÁRIO AO TRATAMENTO DE PÊNFIGO VULGAR. DOENÇA AUTOIMUNE, CRÔNICA, GRAVE, COM TAXA DE MORTALIDADE DE 5% A 10%, E MUITO RARA, COM INCIDÊNCIA ESTIMADA NA POPULAÇÃO EM GERAL, DE 1 (UM) A 5 (CINCO) CASOS POR 1.000.000 (UM MILHÃO) DE PESSOAS, DIAGNOSTICADAS A CADA ANO. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. APELO DE AMBOS OS RÉUS. DIREITO À SAÚDE. SOLIDARIEDADE DOS ENTES PÚBLICOS. IMPOSSIBILIDADE DE O ENTE PÚBLICO SE NEGAR A ENTREGAR MEDICAMENTO PRESCRITO PELO MÉDICO RESPONSÁVEL PELO TRATAMENTO DA DOENÇA DO PACIENTE AO ARGUMENTO DE OSTENTAR A QUALIDADE DE TRATAMENTO EXPERIMENTAL NÃO CONSTANTE DE BULA, NA MEDIDA EM QUE RESTA CONSOLIDADO O ENTENDIMENTO NO SENTIDO DE QUE O FATO DE O ÓRGÃO REGULADOR (ANVISA) NÃO RECOMENDAR O USO DO FÁRMACO REQUERIDO NA INICIAL NÃO IMPOSSIBILITA QUE SEJA PRESCRITO PARA TRATAMENTO DA MOLÉSTIA DESCRITA, DESDE QUE COM A DEVIDA ORIENTAÇÃO MÉDICA DE USO DO MEDICAMENTO OFF LABEL. DA MESMA FORMA SE ENTENDE QUE OS ARTIGOS 19-M, I, E 19P, § 2°, I, E 19-T, DA LEI N. 8.080/90 (COM A REDAÇÃO CONFERIDA PELA LEI N. 12.401/11) NÃO VEDAM A MINISTRAÇÃO DE MEDICAMENTOS DIVERSOS DOS CONSTANTES EM PROTOCOLOS CLÍNICOS DO SUS, SENDO CERTO QUE NADA AUTORIZA A CONCLUSÃO DE QUE NELES SE ENCERRE ROL TAXATIVO. AS MAURO PEREIRA MARTINS:000016692 Página 1 de 11 Assinado em 09/06/2015 15:26:41 Local: GAB. DES MAURO PEREIRA MARTINS 190 CONDENAÇÃO DO MUNICÍPIO AO PAGAMENTO DA TAXA JUDICIÁRIA QUE SE IMPÕE POR SE TRATAR DE RÉU E SUCUMBENTE. NEGATIVA DE SEGUIMENTO A AMBOS OS RECURSOS. AJUSTE, DE OFÍCIO, PARA IMPOR A EXIGÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO PERIÓDICA DE NECESSIDADE DO MEDICAMENTO E DE DOMICÍLIO NO MUNICÍPIO-RÉU. DECISÃO MONOCRÁTICA Trata-se de demanda de condenação ao cumprimento de obrigação de fazer, consistente no fornecimento de medicamentos, com requerimento de tutela antecipada, proposta por TÂNIA ALVES PENA em face do ESTADO DO RIO DE JANEIRO e do MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO. A autora sustentou ser portadora de pênfigo vulgar, que é uma doença autoimune, crônica, grave, com taxa de mortalidade de 5% a 10%, e muito rara, com incidência estimada na população em geral, de 1 (um) a 5 (cinco) casos por 1.000.000 (um milhão) de pessoas, diagnosticadas a cada ano, e que não possui condições financeiras de arcar com o custo do medicamento Mieofenolato de Mofetila 500 mg. Aduz que o preço médio do medicamento é de R$ 870,00 (oitocentos e setenta reais) por uma caixa contendo 50 (cinquenta) comprimidos, e que a dose prescrita à paciente é de 120 (cento e vinte) comprimidos por mês (quatro por dia). AS Página 2 de 11 191 Assevera que como professora da rede pública municipal, com remuneração no valor de R$ 3.701,08 (três mil setecentos e um reais e oito centavos), não tem condições de arcar com o custo mensal do medicamento, no patamar de R$ 2.088,00 (dois mil e oitenta e oito reais) por mês, sendo dever constitucional dos réus fornecer-lhe tal medicamento. Pugna pela condenação dos réus a fornecerem à autora o medicamento Micofenolato de Mofetila 500 mg, na quantidade prescrita por seu médico, ou outros medicamentos que a autora, porventura, venha a necessitar no curso do tratamento, de forma ininterrupta e enquanto houver necessidade. Foi formulado requerimento de liminar. Decisão de fls. 68/69, concedendo a liminar pretendida. Contestações às fls. 89/97 e 100/105. O Ministério Público opinou pela procedência parcial do pedido, condicionada a continuidade do fornecimento do medicamento pleiteado à apresentação trimestral de laudo firmado por médico do SUS, bem assim ao cadastramento da parte autora junto ao Componente Especializado da Assistência Farmacêutica - CEAF. A sentença de fls. 117/120, julgou procedente o pedido da inicial, nos seguintes termos: “JULGO PROCEDENTE o pedido para, confirmando a decisão que antecipou os efeitos da tutela, condenar os Réus a fornecerem à parte Autora o medicamento micofenolato de mofetila 500mg, ou quaisquer outros medicamentos, que se fizerem necessários ao tratamento da doença denominada pênfigo vulgar, com a devida prescrição médica, ressalvando-se a possibilidade de substituição por outros fornecidos regularmente pelos Réus, desde que haja indicação expressa do médico responsável pelo tratamento. Condeno os Réus ao pagamento de honorários advocatícios no valor total de R$ 500,00, (pro rata) na forma do disposto no § 4º do AS Página 3 de 11 artigo 20 do CPC. Sem custas pelo Estado, face isenção legal. Condeno, ainda, o Município ao pagamento da taxa judiciária (Súmula 145 do TJRJ). Condeno os Réus ao ressarcimento das custas pagas pela parte Autora. Em não havendo recurso voluntário das partes, deixo de submeter a presente sentença ao duplo grau obrigatório de jurisdição, diante do Aviso TJ nº 67 de 07.12.06, em seu Enunciado nº 07. P. R. I. Dê-se ciência pessoal ao Ministério Público.” Apelação do Município do Rio de Janeiro às fls. 121/137, sustentando que o medicamento mencionado na petição inicial não consta da relação de medicamentos essenciais da competência do Município, com base na RENAME _ Relação Nacional de Medicamentos Essenciais, como prescreve a Lei 6.360/76, com a regulamentação dada pela Portaria 3.916/98 do Ministério da Saúde, aduzindo que os medicamentos especiais e extraordinários devem ser fornecidos pelo Estado ou pela União, e que a imposição de tal obrigação de fazer ao demandado se consubstancia em violação ao princípio constitucional da independência e harmonia dos Poderes. Assevera que tal imposição violaria ainda o princípio da reserva de domínio, haja vista que há poucos recursos financeiros disponíveis para muitas necessidades a serem supridas, e existem vários medicamentos essenciais que o Município é obrigado a fornecer gratuitamente e com prioridade. Pugna, por fim, pelo afastamento da condenação ao pagamento da taxa judiciária, ao argumento de que ostenta a qualidade de isento. Apelação do Estado às fls. 154/173, alegando, resumidamente, que o medicamento micofelonato de mofetila não possui indicação terapêutica para tratamento da enfermidade descrita na inicial (Pênfigo Vulgar). Aduz que o medicamento pleiteado possui aprovação em bula pela ANVISA para o tratamento de falência ou rejeição de transplante de rim, rim transplantado, coração transplantado e fígado transplantado e que não consta da bula a informação de que o medicamento possa ser usado para tratamento da doença descrita nos autos. AS Página 4 de 11 192 193 Em suas razões transcreve trecho de parecer técnico realizado para instruir as razões de recurso que diz "O Micofenolato de Mofetila foi aprovado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) para uso em transplantes de órgãos sólidos, porém, existe uso off-label em Dermatologia e Reumatologia para diversas doenças autoimunes e inflamatórias, dentre elas o pênfigo vulgar (patologia que acomete à impetrante).” Assim, conclui que relativamente ao uso off label de qualquer medicamento, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária do Brasil (ANVISA) informa que o mesmo é, por definição, não autorizado pela agência reguladora. Ainda, informa que o uso off label de um medicamento é feito por conta e risco do médico que o prescreve, e pode eventualmente vir a caracterizar um erro médico, já que, para um tratamento específico, o medicamento off label equivale a medicamento sem registro na ANVISA. Assim, não havendo qualquer indicação, na própria bula, de que o medicamento possa ser utilizado para o tratamento da moléstia que acomete a parte autora, não há como exigir dos entes públicos essa prestação, porque não há direito constitucional ou infraconstitucional a participar de experimentação médica humana. Acrescenta que, caso esta e. Câmara entenda que a condenação merece ser mantida, afastando a incidência dos artigos 19-M, I, e 19-P, § 2°, I, e 19-T, da Lei n. 8.080/90 (com a redação conferida pela Lei n. 12.401/11), requer-se, desde já, a observância do disposto no artigo 97 da CRFB/88 e na Súmula Vinculante n° 10 do STF. Contrarrazões da autora às fls. 176/179, prestigiando a sentença recorrida. Parecer do Ministério Público em primeiro grau, às fls. 185/186, opinando pelo conhecimento do recurso. AS Página 5 de 11 194 A douta Procuradoria de Justiça, em parecer de fls. 182/188, manifestou-se pelo desprovimento de ambos os recursos. Ambos os recursos são tempestivos, sendo certo que os réus são isentos do pagamento de custas. É o relatório. Decido. Os presentes recursos devem ser de plano solucionados, não se fazendo, destarte, necessário o pronunciamento do órgão fracionário deste E. Tribunal, na forma autorizada pelo ordenamento processual vigente. A saúde é um bem jurídico que goza de amparo constitucional no plano federal, estadual e municipal, e a negativa de fornecimento de medicamentos para o combate de doenças crônicas viola as garantias dos cidadãos, ainda mais dos hipossuficientes, como é o caso da parte autora. Vale mencionar que o direito à vida e o direito à saúde são expressões de direitos subjetivos constitucionalmente consagrados como direitos fundamentais (Art. 5.º, X, da CRFB). Ademais, o direito à saúde está intimamente ligado ao princípio da dignidade humana (Art. 1.º, III, e 5.º, da CRFB/88), por ser constitucionalmente assegurado a todos. Impõe-se ressaltar que a Carta Magna, em seu artigo 196, atribui ao Estado lato sensu o dever de assegurar à coletividade o direito à saúde, estabelecendo in verbis: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e o acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação (sem grifos no original).” AS Página 6 de 11 Da mesma forma, em âmbito Estadual, prevê a Constituição do Estado do Rio de Janeiro, em seu artigo 284, ipsis litteris: “A saúde é direito de todos e dever do Estado, assegurada mediante políticas sociais, econômicas e ambientais que visem à prevenção de doenças físicas e mentais, e outros agravos, o acesso universal e igualitário às ações de saúde e a soberana liberdade de escolha dos serviços, quando esses constituírem ou complementarem o Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde, guardada a regionalização para sua promoção, proteção e recuperação (sem grifos no original).” Não existe distinção ou diferenciação quanto às obrigações impostas aos entes federativos. Cabe ao Estado, em sentido lato, a obrigação de garantir a saúde de todos, mediante políticas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos. A obrigação tem natureza e caráter solidário, podendo o cidadão exigir sua prestação por inteiro de qualquer um dos entes federados. Isso porque o art. 23, II, da Carta Magna, prevê a competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios quanto ao cuidado da saúde e assistência pública. José Afonso da Silva, in Comentário Contextual à Constituição – 6.ª edição – Ed. Malheiros, pág. 273, ensina que: “Todas aquelas entidades públicas indicadas no caput do artigo têm competência para prestar serviços de saúde e de assistência pública, como têm a obrigação de dar proteção e garantia às pessoas portadoras de deficiência (sem grifos no original).” A matéria apreciada no recurso é objeto do verbete n.º 65 da Súmula deste E. Tribunal de Justiça, que reconheceu a solidariedade entre a União, os Estados e os Municípios, na garantia do direito à saúde, a saber: “Deriva-se dos mandamentos dos artigos 6.º e 196 da Constituição Federal de 1988 e da Lei n.º 8080/90, a responsabilidade solidária da União, Estados e Municípios, garantindo o fundamental direito à saúde e consequente antecipação da respectiva tutela (sem grifos no original).” AS Página 7 de 11 195 Portanto, a ordem constitucional atribui aos entes públicos, incluindo-se, por óbvio, o Município do Rio Janeiro e o Estado do Rio de Janeiro, ora réus, o dever de garantir o exercício do direito à saúde, independentemente da existência de ato normativo relacionando os medicamentos que devam ser fornecidos por este ou aquele ente federativo, posto que tal circunstância não exonera o ente público de fornecê-los ou realizá-los, devendo até mesmo empregar esforços na sua aquisição, uma vez que se trata de um dever constitucional e não mera liberalidade. A propósito: Suspensão de Segurança. Agravo Regimental. Saúde pública. Direitos fundamentais sociais. Art. 196 da Constituição. Audiência Pública. Sistema Único de Saúde - SUS. Políticas públicas. Judicialização do direito à saúde. Separação de poderes. Parâmetros para solução judicial dos casos concretos que envolvem direito à saúde. Responsabilidade solidária dos entes da Federação em matéria de saúde. Fornecimento de medicamento: Zavesca (miglustat). Fármaco registrado na ANVISA. Não comprovação de grave lesão à ordem, à economia, à saúde e à segurança públicas. Possibilidade de ocorrência de dano inverso. Agravo regimental a que se nega provimento. STA 175 AgR, Relator(a): Min. GILMAR MENDES (Presidente), Tribunal Pleno, julgado em 17/03/2010, DJe-076 DIVULG 29-04-2010 PUBLIC 3004-2010 EMENTA: Suspensão de Segurança. Agravo Regimental. Saúde pública. Direitos fundamentais sociais. Art. 196 da Constituição. Audiência Pública. Sistema Único de Saúde - SUS. Políticas públicas. Judicialização do direito à saúde. Separação de poderes. Parâmetros para solução judicial dos casos concretos que envolvem direito à saúde. Responsabilidade solidária dos entes da Federação em matéria de saúde. Fornecimento de medicamentos: Reminyl, Herceptin e Rituximab. Fármacos registrados na ANVISA. Não comprovação de grave lesão à ordem, à economia, à saúde e à segurança pública. Possibilidade de ocorrência de dano inverso. Agravo regimental a que se nega provimento. SS 3724 AgR, Relator(a): Min. GILMAR MENDES (Presidente), Tribunal Pleno, julgado em 17/03/2010, DJe-076 DIVULG 29-04-2010 PUBLIC 30-04-2010. AS Página 8 de 11 196 Assim sendo, diante do grave risco de dano à saúde da autora, deve ser mantida a condenação ao cumprimento da obrigação de fazer, consistente no fornecimento dos medicamentos arrolados na inicial. Especificamente quanto ao Recurso do Estado do Rio de Janeiro, insta salientar que não pode o ente público se negar a entregar medicamento prescrito pelo médico responsável pelo tratamento da doença do paciente ao argumento de ostentar a qualidade de tratamento experimental não constante de bula, na medida em que resta consolidado o entendimento no sentido de que o fato de o órgão regulador (ANVISA) não recomendar o uso do fármaco requerido na inicial não impossibilita que seja prescrito para tratamento da moléstia descrita, desde que com a devida orientação médica de uso do medicamento off label. Da mesma forma que se entende que os artigos 19-M, I, e 19-P, § 2°, I, e 19-T, da Lei n. 8.080/90 (com a redação conferida pela Lei n. 12.401/11) não vedam a ministração de medicamentos diversos dos constantes em protocolos clínicos do SUS, sendo certo que nada autoriza a conclusão de que neles se encerre rol taxativo. Vide exemplo jurisprudencial a seguir mencionado: 0182771-21.2012.8.19.0001 - APELACAO DES. ANTONIO ILOIZIO B. BASTOS - Julgamento: 25/03/2015 QUARTA CAMARA CIVEL - APELAÇÕES CÍVEIS. OBRIGAÇÃO DE FAZER. ESTADO E MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO. FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS, INCLUSIVE DE MEDICAMNTOS OFF LABEL. DIREITO À VIDA E À SAÚDE. INCONFORMISMO DOS ENTES PÚBLICOS. O MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO TÃO SOMENTE NO QUE TANGE AO PAGAMENTO DA TAXA JUDICIÁRIA. JÁ O ENTE ESTATAL PELA IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS. 1. Mostra-se necessário o afastamento da condenação da Urbe que acostou aos autos cópia da Lei nº 5.621/2011, que institui a reciprocidade tributária entre a municipalidade e o Estado do Rio de Janeiro, o afastamento daquela condenação, com a reforma parcial da sentença, neste aspecto. 2. Já o Estado do Rio de Janeiro, repisa seus argumentos de defesa, pugnando pela improcedência dos pedidos, que não prospera. 3. O direito à saúde é garantia fundamental, prevista no art. 6º, caput, da Carta Magna, com aplicação imediata, leia-se, § 1º do art. 5º, da mesma Constituição, e não um direito meramente AS Página 9 de 11 197 programático. 4. Cumpre tanto à União, quanto ao Estado e ao Município, de modo solidário, à luz do disposto nos artigos 196 e 23, II da Constituição Federal de 1988, o fornecimento de medicamentos a quem deles necessita, mas não pode arcar com os pesados custos. 5. No que toca aos medicamentos off label prescritos, há laudos médicos e parecer do NAT indicando o seu uso, sendo insuficiente a alegação de que inexiste autorização da ANVISA para que os fármacos sejam utilizados com relação à doença da autora para afastar a responsabilidade dos entes federativos quanto ao seu fornecimento. 6. Os artigos 19-M a 19-R da Lei n° 8.080/90, introduzidos pela Lei n° 12.401/11, não vedam a ministração de medicamentos diversos dos constantes em protocolos clínicos do SUS. Nada permite concluir que neles se encerre elenco taxativo. 7. De mais a mais, decidir conforme a Constituição não implica, necessariamente, na declaração de inconstitucionalidade de lei. 8. A hipótese não é, pois, de declaração de inconstitucionalidade desses dispositivos, tampouco do afastamento de sua incidência (Súmula Vinculante nº 10/STF), mas sim da sua correta interpretação, à luz do direito à saúde consagrado na Constituição. 9. Recurso do Município do Rio de Janeiro a que se dá provimento para afastar de sua condenação o pagamento da taxa judiciária, na forma do artigo 557, §1º-A do CPC. Apelo do Estado do Rio de Janeiro a que se nega seguimento, na forma do caput do mesmo artigo, mantendo os demais termos da sentença guerreada. Decisão Monocrática - Data de Julgamento: 25/03/2015 (*) Quanto ao recurso do Município, relativamente à taxa judiciária, temse que esta é devida, por ostentar o apelante a qualidade de réu e sucumbente. Aplicam-se, na hipótese presente, os Enunciados nº 145 e nº 161 da Súmula deste Tribunal que assim dispõem: „Verbete nº 145: Se for o Município autor estará isento da taxa judiciária desde que comprove que concedeu a isenção de que trata o parágrafo único do artigo 115 do CTE, mas deverá pagála se for o réu e tiver sido condenado nos ônus sucumbenciais.’ ‘Súmula nº 161: Questões atinentes a juros legais, correção monetária, prestações vincendas e condenação nas despesas processuais constituem matérias apreciáveis de ofício pelo Tribunal.’ AS Página 10 de 11 198 199 Necessário se faz, porém, consignar que o Município responsável pelo fornecimento do medicamento será aquele onde a Autora reside, sob pena de se gerar o desequilíbrio no repasse de verbas pelo SUS, eis que tal repasse é feito de acordo com o número de moradores de cada Município. Tal comprovação é determinada em respeito ao manejo da verba pública, que deve ser lastreado em critérios que garantam o uso racional do erário, de forma a viabilizar a efetividade do uso do dinheiro público à população que necessita de seus serviços. Assim, impõe-se pequeno ajuste, de ofício, na Sentença, para impor à autora a apresentação de receituário médico indicativo da necessidade do medicamento, a cada três meses, diante do alto custo daquele, bem como para determinar que a demandante comprove sua residência no Município-réu a cada seis meses. Diante do exposto, com fulcro no art. 557, caput, do CPC, NEGO SEGUIMENTO A AMBOS OS RECURSOS, imprimindo pequeno reparo, de ofício, na Sentença, para fazer constar desta a obrigação de que a cada três meses, a autora apresente receituários médicos atualizados, e a cada seis meses também comprovante de residência. Rio de Janeiro, 09 de junho de 2015. MAURO PEREIRA MARTINS Desembargador Relator AS Página 11 de 11