Decisão Monocrática

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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO
VIGÉSIMA CÂMARA CÍVEL
APELAÇÃO CÍVEL Nº: 0076604-43.2013.8.19.0001
APELANTES: MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO E ESTADO DO RIO DE
JANEIRO
APELADA: TANIA ALVES PENA
RELATOR: DES. MAURO PEREIRA MARTINS
APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO À SAÚDE. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE
FAZER PROPOSTA EM FACE DO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO
E DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO.
FORNECIMENTO
DE
MEDICAMENTO
NECESSÁRIO
AO
TRATAMENTO DE PÊNFIGO VULGAR. DOENÇA AUTOIMUNE,
CRÔNICA, GRAVE, COM TAXA DE MORTALIDADE DE 5% A 10%,
E MUITO RARA, COM INCIDÊNCIA ESTIMADA NA POPULAÇÃO
EM GERAL, DE 1 (UM) A 5 (CINCO) CASOS POR 1.000.000 (UM
MILHÃO) DE PESSOAS, DIAGNOSTICADAS A CADA ANO.
SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. APELO DE AMBOS OS RÉUS.
DIREITO À SAÚDE. SOLIDARIEDADE DOS ENTES PÚBLICOS.
IMPOSSIBILIDADE DE O ENTE PÚBLICO SE NEGAR A ENTREGAR
MEDICAMENTO PRESCRITO PELO MÉDICO RESPONSÁVEL PELO
TRATAMENTO DA DOENÇA DO PACIENTE AO ARGUMENTO DE
OSTENTAR A QUALIDADE DE TRATAMENTO EXPERIMENTAL
NÃO CONSTANTE DE BULA, NA MEDIDA EM QUE RESTA
CONSOLIDADO O ENTENDIMENTO NO SENTIDO DE QUE O FATO
DE O ÓRGÃO REGULADOR (ANVISA) NÃO RECOMENDAR O USO
DO FÁRMACO REQUERIDO NA INICIAL NÃO IMPOSSIBILITA QUE
SEJA PRESCRITO PARA TRATAMENTO DA MOLÉSTIA
DESCRITA, DESDE QUE COM A DEVIDA ORIENTAÇÃO MÉDICA
DE USO DO MEDICAMENTO OFF LABEL.
DA MESMA FORMA SE ENTENDE QUE OS ARTIGOS 19-M, I, E 19P, § 2°, I, E 19-T, DA LEI N. 8.080/90 (COM A REDAÇÃO
CONFERIDA PELA LEI N. 12.401/11) NÃO VEDAM A MINISTRAÇÃO
DE MEDICAMENTOS DIVERSOS DOS CONSTANTES EM
PROTOCOLOS CLÍNICOS DO SUS, SENDO CERTO QUE NADA
AUTORIZA A CONCLUSÃO DE QUE NELES SE ENCERRE ROL
TAXATIVO.
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MAURO PEREIRA MARTINS:000016692
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Assinado em 09/06/2015 15:26:41
Local: GAB. DES MAURO PEREIRA MARTINS
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CONDENAÇÃO DO MUNICÍPIO AO PAGAMENTO DA TAXA
JUDICIÁRIA QUE SE IMPÕE POR SE TRATAR DE RÉU E
SUCUMBENTE.
NEGATIVA DE SEGUIMENTO A AMBOS OS RECURSOS. AJUSTE,
DE OFÍCIO, PARA IMPOR A EXIGÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO
PERIÓDICA DE NECESSIDADE DO MEDICAMENTO E DE
DOMICÍLIO NO MUNICÍPIO-RÉU.
DECISÃO MONOCRÁTICA
Trata-se de demanda de condenação ao cumprimento de obrigação
de fazer, consistente no fornecimento de medicamentos, com requerimento de
tutela antecipada, proposta por TÂNIA ALVES PENA em face do ESTADO DO
RIO DE JANEIRO e do MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO.
A autora sustentou ser portadora de pênfigo vulgar, que é uma
doença autoimune, crônica, grave, com taxa de mortalidade de 5% a 10%, e
muito rara, com incidência estimada na população em geral, de 1 (um) a 5
(cinco) casos por 1.000.000 (um milhão) de pessoas, diagnosticadas a cada
ano, e que não possui condições financeiras de arcar com o custo do
medicamento Mieofenolato de Mofetila 500 mg.
Aduz que o preço médio do medicamento é de R$ 870,00
(oitocentos e setenta reais) por uma caixa contendo 50 (cinquenta)
comprimidos, e que a dose prescrita à paciente é de 120 (cento e vinte)
comprimidos por mês (quatro por dia).
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Assevera que como professora da rede pública municipal, com
remuneração no valor de R$ 3.701,08 (três mil setecentos e um reais e oito
centavos), não tem condições de arcar com o custo mensal do medicamento,
no patamar de R$ 2.088,00 (dois mil e oitenta e oito reais) por mês, sendo
dever constitucional dos réus fornecer-lhe tal medicamento.
Pugna pela condenação dos réus a fornecerem à autora o
medicamento Micofenolato de Mofetila 500 mg, na quantidade prescrita por seu
médico, ou outros medicamentos que a autora, porventura, venha a necessitar
no curso do tratamento, de forma ininterrupta e enquanto houver necessidade.
Foi formulado requerimento de liminar.
Decisão de fls. 68/69, concedendo a liminar pretendida.
Contestações às fls. 89/97 e 100/105.
O Ministério Público opinou pela procedência parcial do pedido,
condicionada a continuidade do fornecimento do medicamento pleiteado à
apresentação trimestral de laudo firmado por médico do SUS, bem assim ao
cadastramento da parte autora junto ao Componente Especializado da
Assistência Farmacêutica - CEAF.
A sentença de fls. 117/120, julgou procedente o pedido da inicial,
nos seguintes termos:
“JULGO PROCEDENTE o pedido para, confirmando a decisão que
antecipou os efeitos da tutela, condenar os Réus a fornecerem à
parte Autora o medicamento micofenolato de mofetila 500mg, ou
quaisquer outros medicamentos, que se fizerem necessários ao
tratamento da doença denominada pênfigo vulgar, com a devida
prescrição médica, ressalvando-se a possibilidade de substituição
por outros fornecidos regularmente pelos Réus, desde que haja
indicação expressa do médico responsável pelo tratamento.
Condeno os Réus ao pagamento de honorários advocatícios no
valor total de R$ 500,00, (pro rata) na forma do disposto no § 4º do
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artigo 20 do CPC. Sem custas pelo Estado, face isenção legal.
Condeno, ainda, o Município ao pagamento da taxa judiciária
(Súmula 145 do TJRJ). Condeno os Réus ao ressarcimento das
custas pagas pela parte Autora. Em não havendo recurso voluntário
das partes, deixo de submeter a presente sentença ao duplo grau
obrigatório de jurisdição, diante do Aviso TJ nº 67 de 07.12.06, em
seu Enunciado nº 07. P. R. I. Dê-se ciência pessoal ao Ministério
Público.”
Apelação do Município do Rio de Janeiro às fls. 121/137,
sustentando que o medicamento mencionado na petição inicial não consta da
relação de medicamentos essenciais da competência do Município, com base
na RENAME _ Relação Nacional de Medicamentos Essenciais, como
prescreve a Lei 6.360/76, com a regulamentação dada pela Portaria 3.916/98
do Ministério da Saúde, aduzindo que os medicamentos especiais e
extraordinários devem ser fornecidos pelo Estado ou pela União, e que a
imposição de tal obrigação de fazer ao demandado se consubstancia em
violação ao princípio constitucional da independência e harmonia dos Poderes.
Assevera que tal imposição violaria ainda o princípio da reserva de
domínio, haja vista que há poucos recursos financeiros disponíveis para muitas
necessidades a serem supridas, e existem vários medicamentos essenciais
que o Município é obrigado a fornecer gratuitamente e com prioridade.
Pugna, por fim, pelo afastamento da condenação ao pagamento da
taxa judiciária, ao argumento de que ostenta a qualidade de isento.
Apelação do Estado às fls. 154/173, alegando, resumidamente, que
o medicamento micofelonato de mofetila não possui indicação terapêutica para
tratamento da enfermidade descrita na inicial (Pênfigo Vulgar). Aduz que o
medicamento pleiteado possui aprovação em bula pela ANVISA para o
tratamento de falência ou rejeição de transplante de rim, rim transplantado,
coração transplantado e fígado transplantado e que não consta da bula a
informação de que o medicamento possa ser usado para tratamento da doença
descrita nos autos.
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Em suas razões transcreve trecho de parecer técnico realizado para
instruir as razões de recurso que diz "O Micofenolato de Mofetila foi aprovado
pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) para uso em
transplantes de órgãos sólidos, porém, existe uso off-label em Dermatologia e
Reumatologia para diversas doenças autoimunes e inflamatórias, dentre elas o
pênfigo vulgar (patologia que acomete à impetrante).”
Assim, conclui que relativamente ao uso off label de qualquer
medicamento, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária do Brasil (ANVISA)
informa que o mesmo é, por definição, não autorizado pela agência reguladora.
Ainda, informa que o uso off label de um medicamento é feito por conta e risco
do médico que o prescreve, e pode eventualmente vir a caracterizar um erro
médico, já que, para um tratamento específico, o medicamento off label
equivale a medicamento sem registro na ANVISA.
Assim, não havendo qualquer indicação, na própria bula, de que o
medicamento possa ser utilizado para o tratamento da moléstia que acomete a
parte autora, não há como exigir dos entes públicos essa prestação, porque
não
há
direito
constitucional
ou
infraconstitucional
a
participar
de
experimentação médica humana.
Acrescenta que, caso esta e. Câmara entenda que a condenação
merece ser mantida, afastando a incidência dos artigos 19-M, I, e 19-P, § 2°, I,
e 19-T, da Lei n. 8.080/90 (com a redação conferida pela Lei n. 12.401/11),
requer-se, desde já, a observância do disposto no artigo 97 da CRFB/88 e na
Súmula Vinculante n° 10 do STF.
Contrarrazões da autora às fls. 176/179, prestigiando a sentença
recorrida.
Parecer do Ministério Público em primeiro grau, às fls. 185/186,
opinando pelo conhecimento do recurso.
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A douta Procuradoria de Justiça, em parecer de fls. 182/188,
manifestou-se pelo desprovimento de ambos os recursos.
Ambos os recursos são tempestivos, sendo certo que os réus são
isentos do pagamento de custas.
É o relatório. Decido.
Os presentes recursos devem ser de plano solucionados, não se
fazendo, destarte, necessário o pronunciamento do órgão fracionário deste E.
Tribunal, na forma autorizada pelo ordenamento processual vigente.
A saúde é um bem jurídico que goza de amparo constitucional no
plano federal, estadual e municipal, e a negativa de fornecimento de
medicamentos para o combate de doenças crônicas viola as garantias dos
cidadãos, ainda mais dos hipossuficientes, como é o caso da parte autora.
Vale mencionar que o direito à vida e o direito à saúde são
expressões de direitos subjetivos constitucionalmente consagrados como
direitos fundamentais (Art. 5.º, X, da CRFB).
Ademais, o direito à saúde está intimamente ligado ao princípio da
dignidade humana (Art. 1.º, III, e 5.º, da CRFB/88), por ser constitucionalmente
assegurado a todos.
Impõe-se ressaltar que a Carta Magna, em seu artigo 196, atribui ao
Estado lato sensu o dever de assegurar à coletividade o direito à saúde,
estabelecendo in verbis: “A saúde é direito de todos e dever do Estado,
garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução
do risco de doença e de outros agravos e o acesso universal e igualitário
às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação (sem
grifos no original).”
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Da mesma forma, em âmbito Estadual, prevê a Constituição do
Estado do Rio de Janeiro, em seu artigo 284, ipsis litteris: “A saúde é direito
de todos e dever do Estado, assegurada mediante políticas sociais,
econômicas e ambientais que visem à prevenção de doenças físicas e
mentais, e outros agravos, o acesso universal e igualitário às ações de
saúde e a soberana liberdade de escolha dos serviços, quando esses
constituírem ou complementarem o Sistema Unificado e Descentralizado
de Saúde, guardada a regionalização para sua promoção, proteção e
recuperação (sem grifos no original).”
Não existe distinção ou diferenciação quanto às obrigações impostas
aos entes federativos. Cabe ao Estado, em sentido lato, a obrigação de garantir
a saúde de todos, mediante políticas que visem à redução do risco de doença e
de outros agravos. A obrigação tem natureza e caráter solidário, podendo o
cidadão exigir sua prestação por inteiro de qualquer um dos entes federados.
Isso porque o art. 23, II, da Carta Magna, prevê a competência
comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios quanto ao
cuidado da saúde e assistência pública.
José Afonso da Silva, in Comentário Contextual à Constituição – 6.ª
edição – Ed. Malheiros, pág. 273, ensina que: “Todas aquelas entidades
públicas indicadas no caput do artigo têm competência para prestar
serviços de saúde e de assistência pública, como têm a obrigação de dar
proteção e garantia às pessoas portadoras de deficiência (sem grifos no
original).”
A matéria apreciada no recurso é objeto do verbete n.º 65 da
Súmula deste E. Tribunal de Justiça, que reconheceu a solidariedade entre a
União, os Estados e os Municípios, na garantia do direito à saúde, a saber:
“Deriva-se dos mandamentos dos artigos 6.º e 196 da Constituição
Federal de 1988 e da Lei n.º 8080/90, a responsabilidade solidária da
União, Estados e Municípios, garantindo o fundamental direito à saúde e
consequente antecipação da respectiva tutela (sem grifos no original).”
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Portanto, a ordem constitucional atribui aos entes públicos,
incluindo-se, por óbvio, o Município do Rio Janeiro e o Estado do Rio de
Janeiro, ora réus, o dever de garantir o exercício do direito à saúde,
independentemente
da
existência
de
ato
normativo
relacionando
os
medicamentos que devam ser fornecidos por este ou aquele ente federativo,
posto que tal circunstância não exonera o ente público de fornecê-los ou
realizá-los, devendo até mesmo empregar esforços na sua aquisição, uma vez
que se trata de um dever constitucional e não mera liberalidade.
A propósito:
Suspensão de Segurança. Agravo Regimental. Saúde pública.
Direitos fundamentais sociais. Art. 196 da Constituição.
Audiência Pública. Sistema Único de Saúde - SUS. Políticas
públicas. Judicialização do direito à saúde. Separação de
poderes. Parâmetros para solução judicial dos casos concretos
que envolvem direito à saúde. Responsabilidade solidária dos
entes da Federação em matéria de saúde. Fornecimento de
medicamento: Zavesca (miglustat). Fármaco registrado na ANVISA.
Não comprovação de grave lesão à ordem, à economia, à saúde e à
segurança públicas. Possibilidade de ocorrência de dano inverso.
Agravo regimental a que se nega provimento. STA 175 AgR,
Relator(a): Min. GILMAR MENDES (Presidente), Tribunal Pleno,
julgado em 17/03/2010, DJe-076 DIVULG 29-04-2010 PUBLIC 3004-2010
EMENTA: Suspensão de Segurança. Agravo Regimental. Saúde
pública. Direitos fundamentais sociais. Art. 196 da Constituição.
Audiência Pública. Sistema Único de Saúde - SUS. Políticas
públicas. Judicialização do direito à saúde. Separação de
poderes. Parâmetros para solução judicial dos casos concretos
que envolvem direito à saúde. Responsabilidade solidária dos
entes da Federação em matéria de saúde. Fornecimento de
medicamentos: Reminyl, Herceptin e Rituximab. Fármacos
registrados na ANVISA. Não comprovação de grave lesão à ordem,
à economia, à saúde e à segurança pública. Possibilidade de
ocorrência de dano inverso. Agravo regimental a que se nega
provimento. SS 3724 AgR, Relator(a): Min. GILMAR MENDES
(Presidente), Tribunal Pleno, julgado em 17/03/2010, DJe-076
DIVULG 29-04-2010 PUBLIC 30-04-2010.
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Assim sendo, diante do grave risco de dano à saúde da autora, deve
ser mantida a condenação ao cumprimento da obrigação de fazer, consistente
no fornecimento dos medicamentos arrolados na inicial.
Especificamente quanto ao Recurso do Estado do Rio de Janeiro,
insta salientar que não pode o ente público se negar a entregar medicamento
prescrito pelo médico responsável pelo tratamento da doença do paciente ao
argumento de ostentar a qualidade de tratamento experimental não constante
de bula, na medida em que resta consolidado o entendimento no sentido de
que o fato de o órgão regulador (ANVISA) não recomendar o uso do fármaco
requerido na inicial não impossibilita que seja prescrito para tratamento da
moléstia descrita, desde que com a devida orientação médica de uso do
medicamento off label. Da mesma forma que se entende que os artigos 19-M, I,
e 19-P, § 2°, I, e 19-T, da Lei n. 8.080/90 (com a redação conferida pela Lei n.
12.401/11) não vedam a ministração de medicamentos diversos dos constantes
em protocolos clínicos do SUS, sendo certo que nada autoriza a conclusão de
que neles se encerre rol taxativo.
Vide exemplo jurisprudencial a seguir mencionado:
0182771-21.2012.8.19.0001
-
APELACAO
DES. ANTONIO ILOIZIO B. BASTOS - Julgamento: 25/03/2015 QUARTA CAMARA CIVEL - APELAÇÕES CÍVEIS. OBRIGAÇÃO
DE FAZER. ESTADO E MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO.
FORNECIMENTO GRATUITO DE MEDICAMENTOS, INCLUSIVE
DE MEDICAMNTOS OFF LABEL. DIREITO À VIDA E À SAÚDE.
INCONFORMISMO DOS ENTES PÚBLICOS. O MUNICÍPIO DO
RIO DE JANEIRO TÃO SOMENTE NO QUE TANGE AO
PAGAMENTO DA TAXA JUDICIÁRIA. JÁ O ENTE ESTATAL PELA
IMPROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS. 1. Mostra-se necessário o
afastamento da condenação da Urbe que acostou aos autos cópia
da Lei nº 5.621/2011, que institui a reciprocidade tributária entre a
municipalidade e o Estado do Rio de Janeiro, o afastamento
daquela condenação, com a reforma parcial da sentença, neste
aspecto. 2. Já o Estado do Rio de Janeiro, repisa seus argumentos
de defesa, pugnando pela improcedência dos pedidos, que não
prospera. 3. O direito à saúde é garantia fundamental, prevista no
art. 6º, caput, da Carta Magna, com aplicação imediata, leia-se, §
1º do art. 5º, da mesma Constituição, e não um direito meramente
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programático. 4. Cumpre tanto à União, quanto ao Estado e ao
Município, de modo solidário, à luz do disposto nos artigos 196 e
23, II da Constituição Federal de 1988, o fornecimento de
medicamentos a quem deles necessita, mas não pode arcar com
os pesados custos. 5. No que toca aos medicamentos off label
prescritos, há laudos médicos e parecer do NAT indicando o
seu uso, sendo insuficiente a alegação de que inexiste
autorização da ANVISA para que os fármacos sejam utilizados
com relação à doença da autora para afastar a
responsabilidade dos entes federativos quanto ao seu
fornecimento. 6. Os artigos 19-M a 19-R da Lei n° 8.080/90,
introduzidos pela Lei n° 12.401/11, não vedam a ministração de
medicamentos diversos dos constantes em protocolos
clínicos do SUS. Nada permite concluir que neles se encerre
elenco taxativo. 7. De mais a mais, decidir conforme a
Constituição não implica, necessariamente, na declaração de
inconstitucionalidade de lei. 8. A hipótese não é, pois, de
declaração de inconstitucionalidade desses dispositivos,
tampouco do afastamento de sua incidência (Súmula
Vinculante nº 10/STF), mas sim da sua correta interpretação, à
luz do direito à saúde consagrado na Constituição. 9. Recurso
do Município do Rio de Janeiro a que se dá provimento para
afastar de sua condenação o pagamento da taxa judiciária, na
forma do artigo 557, §1º-A do CPC. Apelo do Estado do Rio de
Janeiro a que se nega seguimento, na forma do caput do mesmo
artigo, mantendo os demais termos da sentença guerreada.
Decisão Monocrática - Data de Julgamento: 25/03/2015 (*)
Quanto ao recurso do Município, relativamente à taxa judiciária, temse que esta é devida, por ostentar o apelante a qualidade de réu e
sucumbente.
Aplicam-se, na hipótese presente, os Enunciados nº 145 e nº 161 da
Súmula deste Tribunal que assim dispõem:
„Verbete nº 145: Se for o Município autor estará isento da taxa
judiciária desde que comprove que concedeu a isenção de que
trata o parágrafo único do artigo 115 do CTE, mas deverá pagála se for o réu e tiver sido condenado nos ônus sucumbenciais.’
‘Súmula nº 161: Questões atinentes a juros legais, correção
monetária, prestações vincendas e condenação nas despesas
processuais constituem matérias apreciáveis de ofício pelo
Tribunal.’
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Necessário se faz, porém, consignar que o Município responsável
pelo fornecimento do medicamento será aquele onde a Autora reside, sob pena
de se gerar o desequilíbrio no repasse de verbas pelo SUS, eis que tal repasse
é feito de acordo com o número de moradores de cada Município.
Tal comprovação é determinada em respeito ao manejo da verba
pública, que deve ser lastreado em critérios que garantam o uso racional do
erário, de forma a viabilizar a efetividade do uso do dinheiro público à
população que necessita de seus serviços.
Assim, impõe-se pequeno ajuste, de ofício, na Sentença, para impor
à autora a apresentação de receituário médico indicativo da necessidade do
medicamento, a cada três meses, diante do alto custo daquele, bem como para
determinar que a demandante comprove sua residência no Município-réu a
cada seis meses.
Diante do exposto, com fulcro no art. 557, caput, do CPC, NEGO
SEGUIMENTO A AMBOS OS RECURSOS, imprimindo pequeno reparo, de
ofício, na Sentença, para fazer constar desta a obrigação de que a cada três
meses, a autora apresente receituários médicos atualizados, e a cada seis
meses também comprovante de residência.
Rio de Janeiro, 09 de junho de 2015.
MAURO PEREIRA MARTINS
Desembargador Relator
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