Focus_Aux_ObesidadeCanina:FOCUS n°2 25/01/10 19:08 Página 1 Auxiliar Obesidade canina: como mudanças de comportamento podem ajudar a evitá-la Focus_Aux_ObesidadeCanina:FOCUS n°2 25/01/10 19:08 Página 2 SUMÁRIO 4Introdução INTRODUÇÃO ................................................................ 4Por que o cão se torna obeso? .......................................... 4Por que a obesidade é prejudicial para a saúde do cão? .............. 4Como podemos compreender o comportamento alimentar do cão? 3 4-5 6-7 .. 8-9 4Quais erros cometidos pelo proprietário favorecem a obesidade canina? .... 10-11 4A alimentação pode ser utilizada no processo de aprendizagem? .... 12-13 ............. 14-15 ............................. 16-17 ................................ 18-19 4Como evitar a obesidade a partir da fase de crescimento? 4Os 10 mandamentos do novo proprietário 4Como evitar a obesidade em cães adultos? 4Quais são as condições indispensáveis para o sucesso de um programa de emagrecimento? .......................... 4Como você pode ajudar um cão obeso atingir seu peso ideal? 20-21 ...... 22-23 ...................................... 24-25 4Qual o papel dos Auxiliares do Serviço Veterinário na prevenção da obesidade canina? 4Como motivar o proprietário a adotar um programa de emagrecimento? 4Como ajudar o proprietário durante todo o programa dietético? 4Conclusão . 26-27 .... 28-29 ................................................................. Muitos proprietários utilizam a alimentação para expressar o seu afeto pelo cão porque os consideram um membro da família. No entanto, para o animal os alimentos não possuem o mesmo significado que para o homem. Embora apenas pretendam agradar seu animal, os proprietários cometem erros comportamentais que favorecem o desenvolvimento da obesidade canina. Quando o Médico Veterinário e sua equipe estão ajudando o cão reduzir ou preservar o seu peso ideal, a ação deverá incidir prioritariamente sobre o comportamento do proprietário. A obesidade evolui lenta e insidiosamente, ao ponto da maioria dos proprietários não ter consciência do aumento de peso do animal. O seu tratamento é bastante difícil na medida em que a doença resulta de desequilíbrios há muito tempo instalados. Por causa disto, é muito importante alertar os proprietários para a prevenção da obesidade. Esta nova edição da Focus Auxiliar, elaborada com base nos mais recentes trabalhos de pesquisa de Médico Veterinários comportamentalistas europeus, apresenta os principais mecanismos susceptíveis de levar ao excesso de peso e à obesidade em cães. Abordando os pontos necessários que decodificam estes comportamentos, a presente edição tem como objetivo apoiar os membros da equipe veterinária no aconselhamento dos proprietários de cães, de forma a evitar os principais erros alimentares desde a fase de crescimento, e a favorecer a manutenção do peso ideal do animal por toda sua vida. O papel desempenhado por esse trabalho na motivação do proprietário constitui um fator determinante para o sucesso de um programa de emagrecimento, sempre que este se revele necessário. GILLIAN FURNISS DVMS MRCVS 30 3 Focus_Aux_ObesidadeCanina:FOCUS n°2 25/01/10 19:08 Página 4 A obesidade é resultado do excesso de energia obtido pela alimentação, em relação ao gasto energético do animal. Este desequilíbrio pode ter origem no próprio animal (doença, problemas comportamentais), mas também em fatores associados ao proprietário. A obesidade canina é diagnosticada através do peso e da silhueta Por definição, um cão obeso apresenta um acúmulo de gordura responsável pelo aumento do peso em pelo menos 15 a 20%, em relação ao seu peso ideal. Na espécie canina é difícil definir um peso ideal, uma vez que este apenas foi estabelecido para os cães de raça. A obesidade requer o diagnóstico por parte do Médico Veterinário São três as principais causas da obesidade canina: - Uma afecção sistêmica, como o Diabetes mellitus, a disfunção da tireóide ou das supra-renais (bastante raro) ou, com maior frequência, a administração contínua de progestágenos, utilizados para prevenção ou interrupção do cio das cadelas. É fundamental fazer o diagnóstico e tratamento destas afecções antes de iniciar um programa de emagrecimento do animal, sendo por isso essencial o acompanhamento Médico Veterinário. - Um distúrbio comportamental grave, passível de aumentar consideravelmente a ingestão alimentar (bulimia), ou problemas como a agressividade, a desobediência ou Dessa forma, nos basearemos, principalmente, na observação e na palpação das costelas: - costelas palpáveis, mas não visíveis: peso ideal - costelas dificilmente palpáveis: excesso de peso - costelas não palpáveis: obeso Ideal Excesso de peso Verifique a silhueta do cão 4 F O C U S A U X I L I A R - Obesidade canina: como mudanças de comportamento podem ajudar a evitá-la Obeso comportamentos destrutivos, que levam o proprietário a manter o animal em casa, diminuindo assim o exercício físico deste. Em casos desta natureza recomenda-se a consulta à um clínico especializado em Medicina Veterinária Comportamental. © P. Marniquet Por que o cão se torna obeso? - Fatores relacionados ao proprietário, que por falta de disponibilidade para passear ou brincar com o cão, induz involuntariamente a um comportamento alimentar inadequado. É muito importante detectar e corrigir estes fatores de modo a restabelecer o peso ideal de forma duradoura. Palpação das costelas P E R G U N TA S E R E S P O S TA S Quando é que se deve recomendar um programa de emagrecimento a um animal? Qualquer cão que evidencie um excesso de peso visível deve emagrecer. É fácil perceber que um cão de 5 kg, que agora pese 6 kg, já apresente uma sobrecarga ponderal de 20%, assim como uma mulher de 60 kg que pese 72 kg! Por isso não se deve hesitar em observar e palpar os cães para detectar um eventual excesso de peso e alertar o proprietário imediatamente. Existem cães com maior risco de se tornarem obesos? Sim, existem cães que precisam ser acompanhados com maior atenção: • raças com maior propensão (ex. Labradores, raças pequenas de companhia, os cães de guarda,...). • cães com uma alimentação desequilibrada: alimento muito apetitoso administrado à vontade, oferta de petiscos ou de sobras de refeições... • cães com atividade física reduzida: animais idosos, cães que vivem em apartamentos ou com doenças debilitantes (respiratórias, cardíacas, locomotoras, etc.). • cães e cadelas esterilizados. Como devemos dizer ao cliente que o cão é obeso? O termo “obeso” reveste-se de uma conotação pejorativa, mas o proprietário do animal deve compreender que a obesidade se trata de uma doença. Assim, torna-se mais fácil para o proprietário ouvir termos como “excesso de peso”, ou dizer que o animal "está bem rechonchudo para o seu tamanho”. Qualquer que seja o termo empregado, o mais importante é que o proprietário entenda as consequências da doença. Obesidade canina: como mudanças de comportamento podem ajudar a evitá-la - F O C U S A U X I L I A R 5 Focus_Aux_ObesidadeCanina:FOCUS n°2 25/01/10 19:08 Página 6 Por que a obesidade é prejudicial para a saúde do cão? P E R G U N TA S E R E S P O S TA S Porque diminui a facilidade de movimentação e altera o funcionamento de diversos órgãos, a obesidade reduz consideravelmente o bem-estar do cão e a sua esperança média de vida. A obesidade pode ser bastante precoce. O excesso de peso durante a fase de crescimento se agrava progressivamente e pode comprometer a saúde do animal no futuro. A esterilização constitui também um fator predisponente: 32% dos cães e cadelas esterilizados são obesos, contra 15% dos animais não esterilizados. A obesidade prejudica a saúde. A obesidade é responsável pela infiltração de gordura nos órgãos e por um maior esforço mecânico do corpo, devido ao excesso de peso. É por este motivo que surge muitas vezes associada a doenças orgânicas como o Diabetes mellitus, problemas de pele, intolerância ao esforço, doenças cardiovasculares e respiratórias e, sobretudo, a afecções osteoarticulares dolorosas (artrose, ruptura de ligamento cruzado, hérnia discal...). Como um animal com dores realiza menos exercício, terá ainda maior tendência para engordar! A obesidade afeta igualmente o bem-estar psíquico do animal, pois a falta de movimentos diminui os seus contatos sociais. A obesidade dificulta o trabalho do Médico Veterinário. A obesidade potencializa as hipóteses de complicações no decurso de intervenções cirúrgicas: aumenta o risco anestésico e o tempo operatório, maior dificuldade na realização de exames complementares devido à presença de tecido adiposo, retarda a cicatrização e diminui as defesas imunológicas, fatores responsáveis por um acréscimo do risco de infecções pós-operatórias. ANTES DA PERDA DE PESO 12 anos Cão com peso ideal 10 anos APÓS A PERDA DE PESO Cão obeso Foi cientificamente demonstrado que cães obesos têm sua esperança média de vida reduzida. 6 A obesidade deve ser encarada como uma doença? Sim. A obesidade constitui uma doença na medida em que é responsável pela diminuição da capacidade física do animal, por doenças associadas e, frequentemente, por uma locomoção dolorosa. Além disso, trata-se de uma situação não controlável pelo animal, uma vez que por si só é incapaz de reduzir a ingestão alimentar. Por isso, é muito importante o papel de Veterinários e membros de sua equipe na sensibilização precoce dos proprietários de cães obesos ou com sobrepeso. F O C U S A U X I L I A R - Obesidade canina: como mudanças de comportamento podem ajudar a evitá-la O que se deve fazer se o cliente não ficar totalmente convencido quanto aos riscos da obesidade? Por vezes os proprietários de cães obesos não conseguem aceitar a implicação de alguns riscos que consideram hipotéticos e bastante remotos. Nesse caso, poderá revelar-se útil pedir a eles que comparem o nível de atividade do seu cão, a resistência ao esforço, a frequência dos momentos de brincadeira e de interação com as pessoas, com a de cães não obesos da mesma idade e raça. De modo geral, facilmente irão constatar a discrepância existente entre o comportamento do seu animal com o de outros cães! A consulta é mesmo indispensável antes de administrar um alimento terapêutico? Sim. O Médico Veterinário deve examinar o animal para: • diagnosticar uma eventual doença subjacente ou um distúrbio psíquico responsável pela obesidade; • tratar possíveis complicações já existentes; • explorar todos os fatores comportamentais e ambientais responsáveis pela obesidade do cão e que, se forem subestimados, podem por a perder, inevitavelmente, o sucesso do programa nutricional ou provocar uma recaída em curto prazo. RX: Em um animal obeso, a gordura infiltra-se em todos os órgãos Foto: Alex German Obesidade canina: como mudanças de comportamento podem ajudar a evitá-la - F O C U S A U X I L I A R 7 Focus_Aux_ObesidadeCanina:FOCUS n°2 25/01/10 19:08 Página 8 Como podemos compreender o comportamento alimentar do cão? As relações sociais do cão são reguladas pelo controle das principais fontes de recursos, como é o caso da alimentação. Assim, é fundamental introduzir desde muito cedo regras claras e consistentes no acesso à alimentação para estabelecer uma hierarquia estável e uma estrutura social sólida. Se este enquadramento não for corretamente aplicado, o comportamento alimentar do cão pode tornar-se anormal. O apetite e a saciedade dependem da aprendizagem Graças à mãe, antes dos 3 meses de vida o filhote adquire a capacidade de autocontrole. Esta qualidade permite a ele controlar a sua atividade física, controlar a força da mordida e reconhecer a sensação de saciedade. Durante o desmame, o cão aprende a lidar com a frustração de não obter sistematicamente alimentos em resposta aos seus pedidos. Um filhote separado muito cedo da mãe, sem a aprendizagem do autocontrole, corre o risco de ser hiperativo, de não conseguir controlar sua força de mordida (observável nas mãos dos proprietários!) e de solicitar constantemente o fornecimento de alimentos. Além disso, um filhote criado num ambiente pobre em estímulos pode tornar-se medroso ou ansioso, fatores passíveis de influenciar o seu apetite. O acesso à alimentação favorece o estabelecimento da hierarquia Os cães regem-se por regras muito claras que regulam o acesso aos recursos enquanto evitam conflitos em potencial. O fato de se alimentarem em primeiro lugar, de ter acesso aos melhores alimentos ou de comer diante dos outros são elementos que caracterizam os indivíduos com uma posição dominante na matilha e que provavelmente ajudam a estabelecer a hierarquia. O filhote reconhece a posição privilegiada do proprietário devido ao fato deste controlar o acesso aos ali- mentos e não permitir que o animal ingira a sua refeição. Alguns rituais constantes em termos de alimentação desempenham uma “previsibilidade”, indispensável para conferir segurança ao filhote e para que ele se torne um adulto equilibrado. P E R G U N TA S E R E S P O S TA S Um filhote que mendigue alimentos constantemente tem necessidade de refeições mais abundantes? Não. Trata-se de um comportamento bastante frequente em filhotes, sobretudo se tiverem sido separados da mãe antes dos 2 meses de vida, antes de completar o aprendizado de autocontrole e de gestão das frustrações. Assim, o proprietário deverá continuar a educar o seu cãozinho (mesmo após os 3 meses), não tolerando comportamentos descontrolados (mordidas, monopolização do proprietário) e ignorando qualquer solicitação de alimentos fora do horário das refeições. Um filhote que come as fezes está mal-nutrido? Não. A coprofagia não significa carência de alimentos. Trata-se de um comportamento normal de filhotes que explorem o seu meio envolvente, sendo inútil aumentar ou alterar a quantidade de alimento. Também se deve ter em mente que o comportamento de coprofagia pode ser incentivado inconscientemente: • se o proprietário recolher rapidamente as fezes na presença do cão, este deduzirá que é um recurso muito valioso. Assim, o animal procurará ingeri-las antes que o proprietário se “aproprie” das fezes. • se o proprietário castigar o cão ou “esfregar seu nariz” nos excrementos sempre que o animal fizer as suas necessidades dentro de casa. Com efeito, o cachorro procurará ingerir as fezes com a maior rapidez possível para escondê-las e evitar o castigo eminente. É possível educar corretamente um filhote sem se respeitar as regras alimentares? Não, uma vez que a má educação alimentar perturba simultaneamente a forma como o filhote irá controlar o acesso a dois outros recursos fundamentais: o território e as relações sociais. A maioria dos proprietários desconhece a existência destes tipos de inter-relações e, como tal, subestimam o impacto da educação alimentar no comportamento geral do cão. No cão, um comportamento alimentar inadequado pode dar origem a problemas de higiene e até de agressividade. 8 F O C U S A U X I L I A R - Obesidade canina: como mudanças de comportamento podem ajudar a evitá-la Obesidade canina: como mudanças de comportamento podem ajudar a evitá-la - F O C U S A U X I L I A R 9 Focus_Aux_ObesidadeCanina:FOCUS n°2 25/01/10 19:08 Página 10 Quais erros cometidos pelo proprietário favorecem a obesidade canina? Os alimentos possuem um significado distinto para o proprietário e para o seu cão. Para o homem, partilhar a alimentação constitui um sinal de amizade através do qual procura conquistar o cão. Do ponto de vista do animal, a ausência de controle alimentar representa uma fonte de desestabilização. Isto encoraja as manifestações de comportamentos que chamem a atenção, reforçadas pelo proprietário através do fornecimento de alimentos. “Petiscos” um erro alimentar Para o homem ocidental, a alimentação constitui uma forma de interação e de expressar afetos. Por esse motivo é frequentemente encarada como o meio mais fácil de estabelecer contato com um animal (ex. dar alimentos aos animais dos zoológicos). A alimentação também pode ser uma forma de pedir desculpa ao animal ou de lidar com a própria sensação de culpa, por exemplo, quando o proprietário se sente culpado por deixar o cão sozinho durante todo o dia. recompensa funciona como um reforço do condicionamento do animal. A recompensa é bastante útil nos processos de aprendizagem (obediência, higiene, agilidade...), por isso o adestramento de animais recorre frequentemente a esta prática. Na perspectiva do cão, este sistema de comunicação não tem o mesmo significado. Com efeito, se lhe for dada uma guloseima sem ser como recompensa a um determinado comportamento, essa oferta irá confundir o animal, uma vez que não constitui nem um ritual previsível nem corresponde aos seus códigos sociais. O cão pode tornar-se ansioso e desenvolver alterações comportamentais, como por exemplo, uma atitude provocativa de solicitação de alimentos - insistente e por vezes agressiva – que adota como um novo meio de comunicação com o proprietário. P E R G U N TA S E R E S P O S TA S A diversificação alimentar pode tornar o cão caprichoso “Alimento-recompensa” consolida comportamentos O fato de se obter uma recompensa logo que concretiza um certo comportamento, no espaço de alguns segundos, incentiva o cão a repeti-lo, sendo que a No entanto, também pode ocorrer um reforço independentemente da vontade do proprietário quando este induz a repetição de comportamentos esquecendo-se de recompensá-los. A única recompensa em que o cão está interessado é uma guloseima muito apetitosa? Não. Para alguns cães a interação social (elogios, carícias ou jogar uma bola) pode revelar-se tanto ou mais eficaz que o alimento. No caso de animais que atribuam maior valor à alimentação, recomenda-se a sua substituição gradual por um contato social com o proprietário. O recurso desta estratégia diminui a dependência alimentar e, consequentemente, o risco de excesso de peso, além de reforçar a relação animal–proprietário. O bem-estar do filhote requer variações constantes de alimento? Não, ao contrário do homem o cão não é afetado pela monotonia alimentar. Em contrapartida, se o filhote for habituado à diversidade de sabores entre as 6 e as 12 semanas de vida, poderá desenvolver preferências alimentares e evidenciar maior tendência para recusar alguns alimentos em função de outros mais do seu agrado. Por outro lado, frente à recusa do cão, se a reação do proprietário consistir na administração de um novo alimento, ele estará iniciando um círculo vicioso “recusa = recompensa”, tornando-se ele próprio o responsável pelo comportamento caprichoso do animal. Em caso de excesso de peso, será ainda mais difícil a aceitação de um alimento terapêutico por parte de um cão educado desta forma! Deve-se aumentar a quantidade de alimento de um animal que não esteja comendo o suficiente? Não. Em primeiro lugar é necessário verificar as quantidades administradas, porque um proprietário que desconheça as qualidades nutricionais do alimento pode ser levado a acreditar que o cão come pouco e aumentar excessivamente a dosagem. Por outro lado, o animal pode perder o apetite devido a uma situação de stress, sendo que forçá-lo a se alimentar só irá aumentar a sua ansiedade. Se o cão não comer em quantidade suficiente é preferível recomendar uma consulta veterinária. Frequentemente os proprietários sentem-se culpados por deixar o cão sozinho em casa e utilizam a alimentação como forma de aliviar a sua própria sensação de culpa. 10 F O C U S A U X I L I A R - Obesidade canina: como mudanças de comportamento podem ajudar a evitá-la Obesidade canina: como mudanças de comportamento podem ajudar a evitá-la - F O C U S A U X I L I A R 11 Focus_Aux_ObesidadeCanina:FOCUS n°2 25/01/10 19:08 Página 12 A alimentação pode ser utilizada no processo de aprendizagem? O alimento utilizado no processo de aprendizagem deve funcionar sempre como uma recompensa e não como uma oferta ou incentivo. É muito importante explicar ao proprietário de um filhote a melhor forma de proceder para não induzir comportamentos indesejáveis. Recompensas ocasionais ajudam no aprendizado A alimentação pode ser utilizada como “isca” para o adestramento do animal. Por exemplo, para a aprendizagem do comando “senta”, o proprietário pode colocar um petisco entre os dedos, mantendo-o em frente ao nariz do cão. Em seguida, movimenta lentamente a mão para cima e para baixo de forma a que o cão incline a cabeça para trás. Esta posição obriga o cão a sentar, então o alimento é liberado, e o comportamento foi reconhecido e recompensado. Para que o cão repita os comportamentos esperados (“senta”, “deita”, “de pé”, “quieto”), a recompensa deverá ser oferecida imediatamente. Se o proprietário temer não ser suficientemente rápido, pode recorrer a um sinal verbal (“Bom menino!”), ou sonoro (como um “clicker”) para anunciar a recompensa no momento exato em que a ordem é executada, e então entregar a recompensa. Caso se utilize uma recompensa alimentar, esta deverá ser adequada. Em geral, é suficiente um croquete retirado do alimento fornecido diariamente. À medida que o processo de aprendizagem avança, é importante passar de uma recompensa sistemática (sempre que uma tarefa é corretamente executada) para uma recompensa intermitente (um prêmio apenas em algumas ocasiões). Da mesma forma, um petisco pode facilitar a aceitação da coleira e guia, alterando a percepção que o animal tem destes objetos. Utilizar a alimentação como recompensa para corrigir problemas comportamentais é um processo sensível que deve ser sempre acompanhado por um Médico Veterinário especializado em comportamento animal. Este esquema de reforço descontínuo permite aumentar a motivação do cão e evita a extinção progressiva do comportamento. F O C U S A U X I L I A R - Obesidade canina: como mudanças de comportamento podem ajudar a evitá-la P E R G U N TA S E R E S P O S TA S Porque alguns cães só obedecem aos comandos quando vêem alimentos? Esta situação resulta de um erro na manipulação da recompensa: ao invés de esconder o alimento até a execução do comando e posterior fornecimento, o proprietário adquiriu o hábito de segurá-lo e mostrá-lo previamente. Desta forma a alimentação passa a ser um estímulo e não uma recompensa: o cão tem que ver o alimento para obedecer aos comandos! O oferecimento de alimentos da mesa durante as refeições pode encorajar o comportamento de pedir alimentos? Sim, e o motivo é que se o proprietário começa por administrar alimentos ao cão quando ele os mendiga à mesa, está incentivando o animal a fazer isto novamente (recompensa imediata e sistemática). Então o proprietário (já cansado) recusa-se a administrá-los, mas perante a insistência do cão, acaba por ceder ocasionalmente (recompensa intermitente que consolida a aprendizagem). Então, a inconstância das reações do proprietário reforça o comportamento de mendicância! Os auxiliares da clínica podem ajudar a corrigir os comportamentos incorretos através de alimentos? Não. Trata-se de uma prática muito delicada que requer uma prescrição adaptada a cada caso por parte de um Médico Veterinário comportamentalista. De fato, se o alimento for administrado a um animal em situação de stress no intuito de acalmá-lo, incorre-se no risco de ser mal interpretado e fazer com que o animal associe o alimento a um estado emocional negativo, exatamente o oposto ao efeito desejado! Utilização de alimentos na terapia comportamental Uma vez que a alimentação constitui estímulo positivo, o Médico Veterinário pode aconselhar a sua utilização em condições específicas, A utilização de “clickers” ajudam o proprietário a utilizar os alimentos como recompensa e não como incentivo. 12 de modo a combater algumas situações de medo. Por exemplo, no caso de um cão que tenha medo de viaturas, o clínico poderá sugerir recompensá-lo primeiro pela aproximação ao automóvel e, em seguida e, de forma gradual, alimentá-lo dentro deste. Atenção: recompensar ocasionalmente um cão que mendigue à mesa vai reforçar esse comportamento! Obesidade canina: como mudanças de comportamento podem ajudar a evitá-la - F O C U S A U X I L I A R 13 Focus_Aux_ObesidadeCanina:FOCUS n°2 25/01/10 19:08 Página 14 Como evitar a obesidade a partir da fase de crescimento? Pôr em prática uma dieta constitui sempre uma tarefa difícil. Por isso é preferível estabelecer como objetivo a prevenção da obesidade. Um aconselhamento precoce, adaptado a cada caso, pode ajudar o proprietário a estabelecer um trinômio equilibrado “proprietário-cão-alimento” logo na fase de crescimento. Educando o filhote corretamente Para evitar que os excessos emocionais possam perturbar o apetite do filhote, este deverá ser criado num ambiente estimulante, que lhe proporcione contatos frequentes com seres humanos e outros animais. O futuro proprietário poderá verificar isto durante uma visita ao criador. A correta assimilação do autocontrole implica que o filhote não tenha sido separado da mãe antes de 8 semanas. Após o desmame, o proprietário deve evitar reagir às solicitações de alimento do filhote - sobretudo à mesa – e nunca utilizá-los como oferta para conquistar o animal ou estimular o seu apetite. O proprietário só deve alimentar o cão em duas situações: no horário de 14 administração das refeições ou como recompensa durante o processo de aprendizagem. 1 • Estabelecer um horário fixo para as refeições – uma a duas vezes ao dia, bem como a sua quantidade (de acordo com as recomendações do fabricante). 2 • o comedouro deve ser colocado à disposição do animal durante um período de tempo pré-estabelecido F O C U S A U X I L I A R - Obesidade canina: como mudanças de comportamento podem ajudar a evitá-la 3 4 • se o cão não terminar a refeição no tempo estipulado, deverá ser chamado a outra área da casa antes de se retirar o comedouro. 4 5 • o proprietário deve resistir à tentação de incentivar o animal a comer (exceto em caso de doença). 5 1 No segundo caso, o recurso do “clicker” permite reduzir a utilização de alimentos. Estabelecer rituais constantes para as refeições Desde a aquisição do filhote assim como ao longo de toda a vida do animal, o proprietário deve respeitar um ritual alimentar constante: 3 • o cão deve estar sozinho enquanto come, ou seja, o proprietário não deve observá-lo nem incomodá-lo enquanto se alimenta. P E R G U N TA S E R E S P O S TA S 2 Deve-se adquirir o hábito de retirar o comedouro ao final das refeições para educar os cães? Nunca! As regras sociais servem para evitar conflitos, por isso mesmo um cão com uma posição inferior deve comer sem ser incomodado. Retirar o comedouro não tem qualquer fundamento hierárquico: o cão pode tornarse ansioso (pois nunca sabe se poderá comer) e mesmo agressivo (para defender o alimento) chegando ao ponto de morder. Assim, deve se evitar interromper a refeição e desviar a atenção do animal antes de remover a tigela. O cão deve comer depois dos proprietários para estabelecer hierarquia? Nem sempre! Os proprietários são frequentemente aconselhados a só alimentar o cão depois de terem terminado a sua própria refeição, mas esta condição por si só não basta. A coisa mais importante é a consistência dos comandos e de sua aplicação por todos os membros da casa (ex. somente fornecer alimentos no comedouro), pois é o que vai determinar a relação entre o cão e os proprietários. Assim, mesmo que o animal coma antes dos proprietários, se ele não tiver acesso a alimentos fora das refeições o seu comportamento alimentar será equilibrado. Pode se alimentar na mão um cão que se recuse a comer? Sim, mas só se o animal estiver doente. Esta prática estimula o cão a comer, uma vez que ele atribui maior valor aos alimentos dados diretamente pelo proprietário. Este tipo de alimentação tem seu valor, entretanto, a rotina deve voltar ao normal o mais rápido possível, já que de outra maneira a hierarquia pode ficar comprometida. Obesidade canina: como mudanças de comportamento podem ajudar a evitá-la - F O C U S A U X I L I A R 15 Focus_Aux_ObesidadeCanina:FOCUS n°2 25/01/10 19:08 Página 16 10 dicas para você dar a novos proprietários de cães 1. Não altere a alimentação do cão ao se mudar ou visitar lugares diferentes 6. Não retire o comedouro enquanto o filhote se alimenta Para limitar o stress da mudança e evitar problemas digestivos, é aconselhável manter o alimento inicial durante alguns dias e então realizar a transição. É frequente que o cão (sobretudo se for ainda filhote) coma pouco no início. Por isso, é muito importante resistir à tentação de obrigar ele a comer ou de inserir novos alimentos. O fato de você poder retirar o comedouro do animal não constitui sinal de hierarquia. No universo canino, os cães com posição inferior comem depois dos dominantes, mas estes não os incomodam durante a refeição. Pelo contrário, esse comportamento irá provocar ansiedade no animal e forçá-lo a defender o seu comedouro. Para habituá-lo à proximidade de pessoas enquanto se alimenta, a aproximação deverá ser positiva (ex. adicionar mais alimentos), pouco frequente e de forma previsível para o animal. 2. Deixe seu cão comer em paz O proprietário pode querer vigiar o cão durante as refeições para verificar se ele está comendo. No entanto, o animal pode interpretar a sua presença como uma ameaça (porque pressupõe que o proprietário está interessado no seu comedouro), chegando a parar de comer ou mesmo a evidenciar agressividade. Por isso é conveniente colocar o comedouro num local calmo e deixar o cão alimentar-se tranquilamente. 3. Não alimente o cão durante as refeições das pessoas A administração de sobras da refeição familiar não é aconselhável na medida em que são alimentos desbalanceados e que favorecem o aumento de peso (de forma geral o proprietário subestima as quantidades fornecidas). Além disso, o fato de outro membro da família dar alimentos ao cão pode constituir uma fonte de perturbação, porque o animal tem necessidade que o proprietário controle o seu acesso aos alimentos. Por isso, fornecer restos de refeições deve ser evitado. Caso não seja possível, deverão ser colocados num prato e administrados ao animal depois de terminada a refeição familiar. No entanto, é imprescindível contabilizar as calorias disto e reduzir o fornecimento de ração para não ultrapassar a sua necessidade diária. 4. Não force o cão a comer e não o alimente à mão 7. Não ofereça petiscos ao cão porque se sente culpado ou porque ele foi te receber Utilizar os alimentos para estabelecer um relacionamento com o cão é um erro que pode dar origem à obesidade. O cão atribui mais valor aos contatos sociais: carícias, palmadinhas, brincadeiras com o proprietário, como por exemplo ir buscar brinquedos que este lance ou puxar pela extremidades de uma corda, e solicitar ao animal comandos simples para reforçar a relação. 8. Não ofereça ao cão refeições “comemorativas” Uma refeição abundante, diferente do alimento habitual, pode desequilibrar a alimentação e a microbiota intestinal do animal (risco de diarréia). É preferível fazer uma brincadeira ou realizar um grande passeio. 9. Não use alimentos para agradar o seu animal Um cão corretamente alimentado raramente tem fome. Mais do que alimentos, o animal precisa de contatos com o proprietário e com outros cães. É importante proporcionar este tipo de interações sociais ao animal. Obrigar o cão a comer favorece a superalimentação e a obesidade. Se ele for alimentado à mão, comerá menos do que numa refeição normal, exceto se estiver doente, mas nesse caso o proprietário deverá consultar o Médico Veterinário. 10. Não se preocupe se o cão não comer exatamente a quantidade indicada no rótulo do alimento 5. Não adicione nada à alimentação do cão para incentivá-lo a comer Se o alimento for balanceado, o cão deixará de comer logo que as suas necessidades forem satisfeitas. A adição de palatabilizantes (ex. óleo vegetal) pode fazer com que o cão coma sem ter fome, favorecendo assim o aumento de peso. 16 F O C U S A U X I L I A R - Obesidade canina: como mudanças de comportamento podem ajudar a evitá-la As quantidades indicadas no rótulo das embalagens são apenas indicações gerais e por isso devem ser ajustadas para cada animal e sua respectiva atividade física. A quantidade estará correta quando o cão se mostrar saciado e mantiver um peso estável ao longo do tempo. Obesidade canina: como mudanças de comportamento podem ajudar a evitá-la - F O C U S A U X I L I A R 17 Focus_Aux_ObesidadeCanina:FOCUS n°2 25/01/10 19:08 Página 18 Como evitar a obesidade Com cães adultos o proprietário também pode cometer erros na utilização dos alimentos para estabelecer comunicação com o animal. Também nesta situação, o aconselhamento técnico é fundamental para garantir um equilíbrio entre o volume da alimentação administrada e as necessidades reais do animal. Ficar atento ao valor energético total do alimento - A dose diária deve ser adaptada às necessidades energéticas do cão, que aumentam em função de crescimento, exercício físico, condições climáticas adversas e reprodução (gestação e lactação na cadela). Por outro lado, a necessidade energética diminui com a castração, o sedentarismo e o envelhecimento. De acordo com o estado fisiológico, o Médico Veterinário ou alguém de sua equipe deverá controlar de forma regular o peso do animal e indicar o alimento mais indicado. - Nunca administrar biscoitos açucarados nem sobras de refeições. - O alimento utilizado como recompensa deve ser impreterivelmente deduzido da dose diária prescrita. Dessa forma, até 50% da dosagem diária poderá ser utilizada como recompensa durante o processo de aprendizagem. Assegurar a prática de um mínimo de atividade física A vida urbana limita as possibilidades do animal realizar exercício (proprietário ocupado pelo trabalho ou pela televisão, número reduzido de espaços verdes, pas- em cães adultos? seios com guia). No entanto, os passeios ou brincadeiras estimulantes são imprescindíveis para preservar o peso ideal do cão. É muito importante que o proprietário compreenda sua necessidade e dedique um tempo mínimo a essas atividades. Evitar a utilização inadequada dos alimentos O proprietário nunca deve utilizar o alimento como um presente e nem ceder à tentação de fornecer alimentos para eliminar comportamentos indesejáveis. Por exemplo, fazer o cão parar de latir por meio do fornecimento de petiscos, favorece a obesidade e os latidos! Alimentação percebida como recompensa reforça comportamentos indesejáveis. É preferível dar um comando simples ao animal (ex. senta, deita) e recompensar a sua obediência. 1 • O cão late 18 2 • O proprietário dá a ele um petisco para que fique quieto F O C U S A U X I L I A R - Obesidade canina: como mudanças de comportamento podem ajudar a evitá-la P E R G U N TA S E R E S P O S TA S Os brinquedos com alimentos são uma boa idéia? Sim. Os brinquedos dispersores de alimentos são interessantes porque implicam numa certa atividade física e intelectual por parte do cão para obtê-los. Contudo, a sua utilização deverá limitar-se estritamente ao campo da recompensa, para reforço de um comportamento pretendido, e nunca como forma de controlar latidos ou a excitação do animal. A utilização inadequada dos alimentos favorece a obesidade? Sim. Os alimentos incorretamente utilizados como recompensa podem incentivar o comportamento mendicante do animal, de acordo com o esquema de reforço. Por exemplo, o cão late quando o telefone toca. O proprietário dá alimentos para que ele deixe de latir. Ao recompensar o comportamento indesejável, estará incitando o cão a latir de novo para obter outra guloseima. Deste modo, alguns proprietários chegam a administrar quantidades excessivas de alimentos, o que provoca a obesidade nos animais. Quais são os sinais que indicam o uso inadequado dos alimentos? • cão com excesso de peso • cão que receba petiscos ou restos de refeições • cão que solicite regularmente alimentos (mendigandoos durante as refeições dos proprietários, latindo...) • cão habituado a obter alimentos fora do horário das refeições (quando o proprietário volta do trabalho, quando está assistindo televisão, olhando fixamente o proprietário, implorando com o olhar...) 3 • O cão aprende a latir para pedir petiscos Obesidade canina: como mudanças de comportamento podem ajudar a evitá-la - F O C U S A U X I L I A R 19 Focus_Aux_ObesidadeCanina:FOCUS n°2 25/01/10 19:08 Página 20 Como um programa de emagrecimento pode ser realizado mais facilmente? P E R G U N TA S E R E S P O S TA S A administração de um alimento terapêutico na quantidade exata não é o único fator de sucesso de um programa de emagrecimento. Frequentemente se faz necessário modificar também o modo de vida e a interação cão-proprietário para evitar recaídas ou desistência. Mostrar a responsabilidade do proprietário no sucesso do tratamento - Frequentemente os proprietários de cães obesos não têm consciência do excesso calórico administrado ao animal. Para alterar este comportamento é imprescindível demonstrar a eles até que ponto os petiscos podem desequilibrar a dieta do animal. - Explicar o esquema ”alimento – recompensa”, para levá-los a entender de que forma eles próprios induzem esse ciclo vicioso. - Cães obesos frequentemente recebem quantidades insuficientes de estímulos físicos e psíquicos, e o proprietário precisa entender sua responsabilidade sobre isso avaliando seu modo de interagir com o animal. Modificar as expectativas do cão Na maioria dos casos, um cão obeso está acostumado a receber alimentos em resposta às suas solicitações por atenção, comportamento repetido a ponto de se ter estabelecido uma nova rotina. Assim, para cessar a administração de petiscos sem frustrar o animal, o proprietário deve adotar outros tipos de interações, como brincar com o cão, acariciá-lo, lançar brinquedos... Envolver toda a família nesta nova rotina Todos os membros da família deverão respeitar o ritual das refeições para proporcionar ao animal uma informação clara sobre a sua posição hierárquica no grupo social. Tratar os problemas comportamentais subjacentes O animal deverá ser examinado pelo Médico Veterinário para detectar e tratar eventuais distúrbios psíquicos passíveis de alterar a sensação de saciedade e aumentar a ingestão alimentar. Substituir os alimentos por brincadeiras 20 Como por exemplo, as oscilações de apetite associadas à depressão, o consumo de alimentos como atividade de substituição em casos de ansiedade, ou bulimia devido à ausência de saciedade num cão hiperativo. F O C U S A U X I L I A R - Obesidade canina: como mudanças de comportamento podem ajudar a evitá-la Faça o teste do “pacote de extras”, sobretudo em casas onde o cão pode receber alimentos de várias pessoas que ali vivem. Como se pode explicar ao proprietário o papel dos petiscos no desenvolvimento da obesidade do cão? Basta sugerir ao proprietário que, durante um dia, coloque num pacote vazio tudo o que for dado de “extras” ao animal, em igual quantidade. No final do dia, a embalagem conterá o volume total de alimentos consumidos pelo cão, além da dosagem diária de ração. Muitos proprietários se mostram impressionados ao verificar a quantidade armazenada. Também se pode recorrer a comparações mais palpáveis: para um cão de raça pequena, um pedaço de queijo é equivalente à ingestão de um hambúrguer para uma pessoa! É importante medir a quantidade de alimentos administrada diariamente? Sim. No entanto, os proprietários de animais com excesso de peso raramente têm este bom hábito, sendo pertinente saber como controlam as dosagens do alimento. Poder-se aconselhar que procedam à medição do volume alimentar, no mínimo, uma vez por dia (por exemplo, marcando com um risco o nível de croquetes no copo medidor) para evitar diferenças consideráveis em relação às doses recomendadas. Cinco questões chave para avaliar o nível de estímulos e de atividade física do cão: • Quantas vezes por dia o cão passeia? • O animal tem oportunidade de conviver e brincar com outros cães? • Leva o cão passear sempre no mesmo local realizando invariavelmente o mesmo percurso? • Com que frequência brinca com ele e em que consistem essas brincadeiras? • Qual é a brincadeira favorita do cão? Obesidade canina: como mudanças de comportamento podem ajudar a evitá-la - F O C U S A U X I L I A R 21 Focus_Aux_ObesidadeCanina:FOCUS n°2 25/01/10 19:08 Página 22 Como você pode ajudar um cão obeso atingir seu peso ideal? A perda de peso resulta da associação entre o consumo de um alimento nutricional hipocalórico e o aumento do nível de atividade física do cão. De qualquer forma, os objetivos estabelecidos devem ser realistas e rigorosos. consome um teor de energia inferior e, simultaneamente, sacia o seu apetite e limita a perda de massa muscular. É fundamental pesar rigorosamente a quantidade alimento Adaptar o aporte calórico à dosagem Um alimento terapêutico para cães obesos deve ter como característica baixo teor energético, isto é, pobre em gordura. De forma geral, este tipo de alimento é enriquecido com fibras para aumentar o volume do alimento e reduzir a sua digestibilidade. No entanto, verifica-se uma tendência crescente para a administração de alimentos ricos em proteínas, uma vez que o aproveitamento energético das proteínas é menor do que o dos carboidratos. Assim, o animal 22 As dosagens estipuladas pelo Médico Veterinário devem ser rigorosamente respeitadas. Por isso, qualquer “extra“ (recompensas, barras de higiene dentária) deve ser identificado e deduzido da dose prescrita de ração. Ao final do programa de emagrecimento, as quantidades de alimento têm de ser progressivamente aumentadas para impedir a reaquisição do peso perdido. Recomenda-se o fracionamento da dose diária em 3 ou 4 refeições, para evitar a sensação de fome. Um período de transição alimentar ao longo de uma semana favorece a adaptação ao novo alimento terapêutico. Atenção: o proprietário deverá insistir se o animal rejeitar o novo alimento no início! Uma perda de peso semanal entre 3% de perda 1% de perda Quilos Semanas Este tipo de gráfico permite verificar se a perda de peso se situa entre limites razoáveis F O C U S A U X I L I A R - Obesidade canina: como mudanças de comportamento podem ajudar a evitá-la 1 a 3% constitui um objetivo realista, ou seja, entre 100 a 300g por semana, para um cão de 10kg. O processo de emagrecimento não deve ser acelerado para não possibilitar “recaídas” ou desistência. Aumentar o nível de atividade física O exercício físico estimula o gasto energético e favorece a preservação da massa muscular. Por isso, é indispensável que o animal submetido a uma dieta de emagrecimento realize pelo menos 20 minutos de exercício diário (passeios, brincadeiras). No entanto, o nível de atividade física deve ser adaptado de forma gradual para evitar acidentes (ex. ruptura do ligamento cruzado) em animais com sobrepeso considerável. P E R G U N TA S E R E S P O S TA S Uma fotografia do “antes e depois” realizada sobre um fundo quadriculado permite melhor visualização da perda de peso. Foto Alex German As dietas caseiras são eficazes para realizar um programa de emagrecimento ? Sim. No entanto, é muito difícil produzir um alimento caseiro terapêutico perfeitamente balanceado. Se o proprietário não medir com rigor as quantidades de ingredientes, o alimento corre o risco de ser pobre ou pouco eficaz. Um cliente que não queira administrar um alimento comercial seco poderá obter melhores resultados através de dietas terapêuticas úmidas (em lata). Não é mais eficaz simplesmente diminuir a dose do alimento habitual? Não, porque nesse caso o animal continuará com fome e solicitará constantemente alimentos. Além disso, a restrição alimentar, por vezes, provoca alguns desequilíbrios, principalmente a perda de massa muscular. Por causa disso, é indispensável utilizar um alimento terapêutico com composição especificamente elaborada para favorecer o emagrecimento e evitar esses inconvenientes. Como fazer com que um cão que não goste de correr pratique exercício ? Em primeiro lugar, deve se certificar que o proprietário não confunde “exercício” com "corrida”, porque pode ser perigoso no caso de um animal obeso sedentário, com maior risco de acidentes cardiorespiratórios ou nas articulações. Assim, prolongar progressivamente um passeio constitui um método mais adequado. A natação também é uma boa solução. Também se deve sugerir ao proprietário que observe quais as brincadeiras que mais agradam ao cão de forma a brincar com ele pelo menos 20 minutos por dia (atirar uma bola, pega-pega, esconder objetos, etc.). Por último, poder-se sugerir o lançamento de recompensas ou a utilização de um brinquedo dispersor de biscoitos para obrigar o animal a gastar alguma energia para obtê-los. Obesidade canina: como mudanças de comportamento podem ajudar a evitá-la - F O C U S A U X I L I A R 23 Focus_Aux_ObesidadeCanina:FOCUS n°2 25/01/10 19:08 Página 24 Qual é o papel dos Auxiliares do Serviço Veterinário na prevenç ão da obesidade canina? - Comparar o peso atual com o peso registrado durante as últimas consultas; destacar a diferença em termos percentuais (“O Rex ganhou 3 kg de peso no espaço de dois meses, o que representa 20% do peso anterior”) e apresentar uma imagem equivalente para uma pessoa (“É como se o(a) senhor(a) tivesse engordado 13kg!”). Atitudes do Médico Veterinário e de sua equipe para motivar o proprietário Demonstrar a existência do problema de sobrepeso, salientar a sua gravidade e eventuais consequências. - Fazer comentários sobre o aumento de peso como “A Tina engordou bastante desde a última consulta, deve se cansar muito mais agora...” - Pedir ao proprietário que escolha a 24 - Pedir ao proprietário que o compare com outros cães - Solicitar ao proprietário uma descrição detalhada dos alimentos consumidos pelo animal. Atitudes do Médico Veterinário e de sua equipe para motivar o proprietário Confirmar para o cliente que a obesidade é perigosa e que a perda de peso será benéfica para o cão. Procurar não reagir à resistência do cliente (evitar o efeito “ping-pong”) e manter um discurso positivo. - Descrever as consequências clínicas da obesidade (diagramas, fotografias, etc.). - Comparar a obesidade com o cigarro (bem-estar atual, mas riscos em longo prazo). - Indicar consequências da obesida- F O C U S A U X I L I A R - Obesidade canina: como mudanças de comportamento podem ajudar a evitá-la - Insistir numa consulta sobre todas INÍCIO RECAÍDA MANUTENÇÃO PRÉ-CONTEMPLAÇÃO ÍDA Esta fase prolonga-se até ao momento em que o proprietário percebe realmente o problema. - Perguntar se observou alguma diferença no nível de atividade do animal 2 • CONTEMPLAÇÃO O proprietário tem consciência do problema, analisa-o pormenorizadamente, mas pode a qualquer momento retroceder para a etapa anterior (“O meu cão é feliz assim.”; “O meu outro cão também era gordo e viveu muito tempo” ; “Não é a mesma situação do que em seres humanos”...). as causas clínicas possíveis ÍDA silhueta correspondente ao seu cão, compará-la com a silhueta ideal e debater a questão. com a obesidade do cão RECA 1 • PRÉ-CONTEMPLAÇÃO O proprietário ainda não pensa que o seu cão tem excesso de peso ou, se já reconhece, não encara o fato como um problema (“Estamos no inverno, é normal que esteja mais pesado”; “Foi esterilizado”; “É um Labrador”; “É muito peludo”; “É um cão de guarda, é natural que seja mais forte!”). de em que o proprietário possa imaginar (redução da atividade esportiva, risco cardíaco...) - Comparar a obesidade do homem RECA A motivação do proprietário é fundamental para o sucesso da dieta e passa sempre por diversas etapas bem definidas. Para incentivar o proprietário a adotar um programa de emagrecimento, o Médico Veterinário e seus auxiliares deverão adaptar a respectiva atitude em função de cada fase psicológica alcançada. CONTEMPLAÇÃO AÇÃO PLANEJAMENTO REC AÍD A A AÍD REC Ciclo da motivação: Nunca se deve passar à fase seguinte sem certificar-se que a etapa anterior está bem estabelecida (ex. é inútil salientar as vantagens de um alimento terapêutico ao proprietário que ainda se encontre na fase da Contemplação ou Pré-contemplação). Obesidade canina: como mudanças de comportamento podem ajudar a evitá-la - F O C U S A U X I L I A R 25 Focus_Aux_ObesidadeCanina:FOCUS n°2 25/01/10 19:08 Página 26 Como motivar o pro prietário a adotar um programa de emagrecimento? Todos os Auxiliares do Serviço Veterinário devem estar bem familiarizados com o processo psicológico de motivação do cliente de forma a que as suas respostas constituam um reforço das indicações do Médico Veterinário. - Mudança possível: os alimentos terapêuticos são palatáveis e reduzem a sensação de fome; - Os procedimentos das etapas tornam as mudanças mais fáceis (relembrar o proprietário que o objetivo, o planejamento e os métodos são muito precisos); - Permitir a administração de recompensas (retiradas da dose diária), mas 26 4 • AÇÃO O proprietário já aceitou realizar o programa de emagrecimento. Tratase da etapa de mais difícil concretização porque requer muita disciplina e disponibilidade de tempo. Por vezes, o proprietário sente-se tentado a interromper a dieta (“O meu cão está infeliz”), devendo ser dado um apoio regular. Atitudes do Médico Veterinário e de sua equipe para motivar o proprietário Tranquilizar e assegurar ao proprietário que ele não será considerado culpado pelo eventual fracasso da dieta. - Falar sobre a possibilidade de insucesso - Insistir sobre os obstáculos a superar (por exemplo, um cão habituado a alimentos muito apetitosos pode recusar o alimento de tratamento de início, adaptando-se a este ao longo de alguns dias); - Recordar os objetivos estabelecidos pelo Médico Veterinário (1 a 3% de perda de peso semanal) e o prazo previsto para atingir o peso ideal, uma vez que um período de tempo determinado aumenta a motivação; - Manter-se atento a qualquer dificuldade referida pelo proprietário, de modo a agendar uma consulta sempre que necessário. O que fazer quando o proprietário possui um cão magro e outro obeso? É simples, basta separar os dois animais e administrar alimentos adaptados às respectivas necessidades, mas em locais distintos. Esta medida torna-se ainda mais simples se o proprietário utilizar uma rotina com tempo controlado para fornecer os alimentos. Como se reconhece a obesidade? IDEAL EXCESSO DE PESO OBESO Ausência de cintura. Depósitos adiposos na coluna vertebral e na base da cauda Distensão abdominal óbvia - Verificar se o proprietário compreendeu quais as recompensas autorizadas; - Insistir na importância de brincadeiras e passeios; - Mostrar ao proprietário fotografias que ilustrem como o cão ficará com o peso ideal; Costelas, coluna vertebral e ossos pélvicos não visíveis mas facilmente palpáveis MINI Atitudes do Médico Veterinário e de sua equipe para motivar o proprietário O Médico Veterinário deve propor alterações simples e facilmente aplicáveis. Frente às eventuais resistências do proprietário, deve-se demonstrar a ele que as medidas propostas são acessíveis. salientando que as brincadeiras e carinhos podem substituí-las de forma mais vantajosa. P E R G U N TA S E R E S P O S TA S - Fotografar o cão a cada retorno para visualizar os progressos alcançados; - Sugerir o recurso do apoio telefônico para motivá-lo; - Marcar consultas regulares para controlar a evolução do peso; - Nunca criticar nem ridicularizar qualquer insucesso; F O C U S A U X I L I A R - Obesidade canina: como mudanças de comportamento podem ajudar a evitá-la HOMEM 3 • PREPARAR A MUDANÇA O proprietário está prestes a aceitar a solução, mas pode levantar algumas objeções ao tratamento: “O animal não vai gostar do alimento”; “Vai se sentir infeliz”; “Tenho dois cães”, etc. - Elogiar a mais ínfima redução de peso. Obesidade canina: como mudanças de comportamento podem ajudar a evitá-la - F O C U S A U X I L I A R 27 Focus_Aux_ObesidadeCanina:FOCUS n°2 25/01/10 19:08 Página 28 Como ajudar o cliente durante todo o programa dietético? Uma vez iniciada a dieta, é fundamental reforçar constantemente a motivação do proprietário. Assistentes e auxiliares da clínica são a “linha de frente” e podem exercer uma ação benéfica em termos de acompanhamento terapêutico desde que respeitem as regras correspondentes a cada etapa. 5 • MANUTENÇÃO O processo de perda de peso deve ser mantido durante um longo período de tempo. Deve-se evitar que o proprietário retome os seus antigos hábitos logo que o animal atinja o peso ideal (“Agora, já chega!”), porque pode dar origem a um rápido retorno ao excesso de peso (efeito sanfona). Atitudes do Médico Veterinário e de sua equipe para motivar o proprietário Dar informações gerais sobre as soluções possíveis e não pressionar o proprietário. - Ajudá-lo a estabelecer um novo caminho de equilíbrio para manutenção do peso do animal com um alimento com baixo teor de gordu- ra, como prescrito pelo Médico Veterinário. - Transformar a manutenção do peso num o modo de vida, e o relacionamento com o cão no maior objetivo para o proprietário (ajudar a consolidação de boas práticas comportamentais); - Não esquecer que é normal ocorrerem pequenas oscilações de peso durante a fase de manutenção Peso ideal Quilos 6 • RECAÍDA A recaída representa um passo para trás, e é uma situação possível ocorrer em cada estágio do processo de mudança. 45,00 41,00 40,00 39,00 35,00 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 Gráfico de evolução do peso durante a fase de manutenção: neste período são aceitáveis pequenas oscilações do peso. 28 O papel dos atendentes e auxiliares de veterinária é fundamental para a motivação do proprietário F O C U S A U X I L I A R - Obesidade canina: como mudanças de comportamento podem ajudar a evitá-la Semanas Atitudes do Médico Veterinário e de sua equipe para motivar o proprietário De modo geral, a recaída resulta de um programa de redução de peso que se tornou muito difícil, ou então resultado da resistência do proprietário pela demanda do programa. No caso de uma recaída, o Médico Veterinário deverá rapidamente receber o proprietário para lhe propor soluções mais simples e de mais fácil aceitação. P E R G U N TA S E R E S P O S TA S O que se deve dizer a um cliente cujo cão não emagreceu o suficiente, apesar da dieta? A coisa mais importante é verificar se o proprietário controlou a quantidade de alimento fornecido e se as recomendações foram devidamente seguidas (especialmente referente ao oferecimento de petiscos e outros “extras”). Se apesar disso a perda de peso for inferior a 1% por semana, o Médico Veterinário deverá reduzir a quantidade de alimento prescrita. É essencial incentivar o proprietário, relembrando que as dietas de emagrecimento demoram sempre bastante tempo (diversos meses) e que não se deve esperar uma perda de peso muito rápida. Obesidade canina: como mudanças de comportamento podem ajudar a evitá-la - F O C U S A U X I L I A R 29 Focus_Aux_ObesidadeCanina:FOCUS n°2 25/01/10 19:08 Página 30 CONCLUSÃO A manutenção do peso ideal do cão contribui não só para a prevenção de inúmeras doenças, como também para o aumento da esperança de vida e do seu bem-estar. Nos últimos anos, a redução da atividade física e o aumento do número de animais esterilizados tem levado ao acentuado aumento de problemas com a obesidade, situação que afeta atualmente 1 em cada 3 cães na Europa ocidental! Assim, o Médico Veterinário dispõe de uma oportunidade de prestar um novo serviço aos seus clientes, proporcionando apoio especializado no caso de cães com maior predisposição para a obesidade, não só em termos de prevenção como também de terapia nutricional. Nesta edição da Focus Auxiliar, pretendemos demonstrar que todas as pessoas que trabalham numa Clínica Veterinária podem estar efetivamente envolvidas nos programas de emagrecimento, através do incentivo a adoção de um comportamento alimentar equilibrado em filhotes, e favorecendo a detecção precoce de uma eventual sobrecarga ponderal. AUTORA Michèle COLIN, DVM Diplomada pela Escola Nacional de Medicina Veterinária de Alford em 1982, exerceu clínica canina até 1992. Participou na criação e desenvolvimento do CNFA, Centro Nacional de Formação de Auxiliares de Veterinária do Ministério da Agricultura. Especializada na concepção e desenvolvimento de técnicas de formação profissional, está particularmente ligada à criação de módulos de formação contínua propostos há diversos anos aos auxiliares de veterinária em funções, assim como à redação de artigos e publicações destinadas à classe. Esta edição FOCUS Auxiliar é uma tradução da Focus Nurse – “Obesity in dogs: how behavioral changes can help”, que por sua vez é uma adaptação da Focus Edição especial – “A behavioural approach to canine obesity”, escrita por Christine 30 F O C U S A U X I L I A R - Obesidade canina: como mudanças de comportamento podem ajudar a evitá-la Halsberghe, Sarah Heath, Joanna Iracka e Gérard Muller e editada pela Royal Canin. © ROYAL CANIN - JANEIRO 2010 • Fotos : Renner - C. Hermeline - P. Marniquet - A. German - P. Helaine - Psaila • Illustrações : M. Pothier • Realização : Focus_Aux_ObesidadeCanina:FOCUS n°2 25/01/10 19:08 Página 32