ALGUNS MITOS E REALIDADES ORTOPÉDICOS Dr. José de Alvarenga A relação causa-efeito mostra-se manifesta também no campo da Ortopedia Veterinária. Assim, ao longo de anos de observação clínica de pacientes portadores de afecções ortopédicas, pôde-se, através da anamnese, obter informações que, invariavelmente, convergiam para o binômio Peso-Piso. Portanto, o manejo impróprio, indevido, inadequado, especialmente de animais da espécie canina de qualquer idade, sexo, raça ou porte, é o principal fator desencadeante de afecções ortopédicas quando estes animais são criados e mantidos em locais impróprios, como piso liso, escorregadio (pisos vitrificados, tábuas ou tacos, ou placas de madeira) ou, desde tenra idade, habituam-se a subir e descer escadas, muretas, camas, poltronas, sofás, mesas; sofrendo a curto, médio ou longo prazo as conseqüências naturais destas atividades, que se manifestam por lesões ósseas e/ou articulares (fraturas, artropatias, distensões, rupturas ligamentares, tendíneas) em membros locomotores, bem como na coluna vertebral (compressões medulares e/ou de raízes nervosas, protrusão ou extrusão discal), que, de alguma maneira, prejudicarão tais animais. Depreende-se, do até aqui exposto, que o velho adágio ou dito popular “mais vale prevenir do que remediar” também é recomendável em Ortopedia Veterinária. Por outro lado, a grande maioria dos proprietários raramente ou quase nunca recebem informações do veterinário quanto as atividades saudáveis ou não aos cães. Então, além de colocar animais em locais impróprios, eles interagem com seus animais jogando bolinhas, brinquedos e outros objetos para que seus cães pulem e corram, trazendo às suas mãos os objetos atirados, sendo esta interação aparentemente “agradável” a ambos, isto é, proprietário e animal. As bolinhas, como as de tênis, se arremessadas sobre piso liso, deslizando, causam menos mal; se, porém, são arremessadas repicando no solo ou nas paredes, fazem com que o animal, na ânsia de apanhá-las, saltem e corcovem até prendê-las entre os maxilares, causando comprometimento, por exemplo, entre os discos intervertebrais. A proximidade do ser humano com seu animal de estimação é benéfica e compensadora para ambos, entretanto, o subir e descer constante que o animal pode ter de uma poltrona ao lado do seu proprietário na sala de TV, pode iniciar e desencadear alterações no seu sistema músculo-esquelético. Outra atividade aparentemente inofensiva é “ensinar” e estimulad o animal a prender entre os maxilares geralmente um pano, e fazer com que ele agite freneticamente a cabeça e consequentemente o pano; não raro o dono traciona, puxa este tecido da boca do animal, praticando um tipo de “cabo de guerra” com ele, que pode produzir graves lesões da medula espinhal em porção cervical. A escolha das guias cervicais ou peitorais também desempenha fator importante para permitir ou reduzir lesões sobre a coluna vertebral, especialmente da porção cervical. Assim, o uso de coleiras cervicais possibilita maior desconforto para o animal, mormente quando o condutor da guia produz “trancos/arranques” sobre ela, com o objetivo de sujeitar/submeter o animal ao seu comando. Portanto, as guias peitorais são mais confortáveis e menos danosas aos cães, por não infligirem traumatismos na região cervical, que é menos protegida anatomicamente que a torácica. Quando me refiro ao peso do animal, quero enfocar àqueles animais obesos, com excesso de peso, que, em grande parte, são resultados de hábitos alimentares desregrados, como por exemplo: 1) o proprietário se ausenta o dia todo de casa e, por comodidade ou conveniência própria, deixa o recipiente/vasilha repleta de alimento para que o cão coma no momento em que lhe apetecer; 2) o cão convive com outro(s) cão(ães), e, além de ingerir seu próprio alimento, come o do(s) outro(s); 3) o cão “participa” das refeições dos membros da casa após ter sido alimentado. Esta obesidade adquirida, aliada às condições de piso impróprio, certamente colaborará decisivamente na ocorrência de afecções ortopédicas nos cães. Nestas poucas linhas, portanto, permiti-me expor algumas medidas adequadas a serem tomadas em determinadas situações, que estarão contribuindo para o que podemos chamar de “Medicina Preventiva”, evitando-se assim o recurso da “Medicina Curativa”, quer medicamentosa, fisioterápica ou cirúrgica. Convém ressaltar, contudo, que, quando um paciente canino desenvolve qualquer processo patológico ortopédico decorrente do manejo inadequado, o tratamento clínico ou procedimento cirúrgico isolado, sem o esclarecimento ou informações sobre alteração das condições de manejo, sem sua correção ou interrupção dos atos desfavoráveis, efêmero, pouco ou nenhum resultado poderá surtir. Isto significa que a cirurgia somente será bem sucedida se forem removidos os fatores causais. O cirurgião veterinário, por exemplo, opera uma ruptura de ligamento cruzado cranial do cão, mas não “opera” sobre o piso, a escada, as brincadeiras com bolinha, os trancos na coleira e o peso excessivo do animal e, assim, as causas continuarão e os sintomas logo recidivarão. A transmissão destes fatos aos proprietários dos animais é responsabilidade do cirurgião e/ou ortopedista que a visa à Medicina Preventiva. Dr. José de Alvarenga CeVe - Centro Veterinário Mourato Coelho Rua Mourato Coelho, 658 - Pinheiros http://cevebrasil.com