Revista Baiana de Saúde Pública RELATO DE CASO DOENÇA DE DUPUYTREN E LEDDERHOSE BILATERAL ASSOCIADAS: RELATO DE CASO Francisco Pereira de Araújoa Adelmo Sergio Lage de Almeidab Fabio Luiz Brazileiro Paixãob Bruno Manuel Moura de Sousac Marcos Vinicius Soares dos Santosd Danilo Lacerda Camargod Resumo Este artigo relata o caso de um homem de 58 anos com doença de Dupuytren nas mãos e doença de Ledderhose nos pés. São expostas as características clínicas e de imagem do paciente, assim como são discutidos aspectos clínicos e epidemiológicos, bem como apresentadas as indicações e complicações do tratamento cirúrgico para as duas doenças. Palavras-chave: Ledderhose. Dupuytren. Cirurgia. ASSOCIATED BILATERAL DUPUYTREN AND LEDDEHOSE DISEASE: CASE REPORT Abstract Authors present a 58 year-old man suffering from both Ledderhose disease in the feet and Dupuytren disease in the hands. Clinical and radiological features of the case are shown as well as the epidemiologic and clinical characteristics of both diseases are presented. Surgical treatment and its complications are presented and discussed in relation to both diseases. Key words: Ledderhose. Dupuytren. Surgery. Professor da Universidade Federal do Oeste do Pará (UFOPA). Chefe da Ortopedia da Clínica Albany. Ortopedista. Clínica Albany. c Radiologista do Hospital Regional Público do Oeste do Pará (HRPOP). d Acadêmico de Medicina da Universidade Estadual do Pará (UEPA). a b v. 34, supl. 1, p. 55-59 jul./dez. 2010 55 ENFERMEDAD DE DUPUYTREN Y LEDDERHOSE BILATERAL ASOCIADAS: RELATO DE CASO Resumen Este artículo relata el caso de un hombre de 58 años con enfermedad de Dupuytren en las manos y enfermedad de Ledderhose en los pies. Son expuestas las características clínicas y de imagen del paciente, así como son discutidos aspectos clínicos y epidemiológicos, bien como presentadas las indicaciones y complicaciones del tratamiento quirúrgico para las dos enfermedades. Palabras-clave: Ledderhose. Dupuytren. Cirugía. INTRODUÇÃO A Doença de Dupuytren foi mencionada inicialmente por Henry Cline e Astley Cooper, porém descrita e publicada pela primeira vez por Guillaume Dupuytren, na França, em 1832.1,2 É caracterizada pela contratura progressiva da fáscia palmar superficial e seus prolongamentos digitais, levando a uma deformidade em flexão das articulações metacarpofalangeanas e interfalangeanas.1,2 A etiologia é ainda desconhecida. Provavelmente o maior fator de risco isolado para o desenvolvimento da doença de Dupuytren é uma história familiar positiva.3 A herança é autossômica dominante, com penetrância variada, existindo também associação importante com a epilepsia, diabetes e ingestão alcoólica (radicais livres).2,3 No entanto, não há evidências de que se trate de uma moléstia ocupacional. Afeta mais homens que mulheres, com estudos mostrando variações entre 5-10:1 e principalmente descendentes do noroeste europeu, sendo rara em asiáticos e praticamente inexistente em negros.2-4 O aspecto anatomopatológico é de uma lesão agressiva, exibindo um grande número de células e mitoses. A célula básica encontrada é chamada de miofibroblasto (semelhante ao fibroblasto encontrado normalmente na fáscia palmar, mas com capacidade de retração).3,5 Pode haver associação com a formação de cordões fibrosos na fáscia plantar (moléstia de Ledderhose) e na fáscia peniana (moléstia de Peyronie).3-7 Relatamos a seguir o caso de um trabalhador rural que apresenta doença fibromatosa palmar e plantar. RELATO DO CASO RBA, 58 anos, masculino, pardo, casado, natural de Óbidos (PA), trabalhador rural, refere que há 13 anos começou a apresentou contratura em região hipotênar de mão direita (dominante) de quinto quirodáctilo e com posterior contratura de quarto quirodáctilo. Após um mês relata que iniciou um quadro com evolução parecida da mão direita em mão esquerda, percebendo ainda o aparecimento de nódulos em região medial plantar bilateral. Refere que as 56 Revista Baiana de Saúde Pública contraturas palmares bilaterais evoluíram progressiva e lentamente, acompanhadas de prurido, dor leve e limitação do arco de movimento. Os nódulos na região plantar bilateral permaneceram sem evolução (aumento/diminuição do tamanho), referindo apenas discretas dores. Tabagista (10 cigarros/dia), etilista social e hipertenso de longa data. Nega diabetes, epilepsia e história familiar de contraturas. Nunca procurou o serviço médico, fez uso de medicações homeopáticas, sem melhora. O exame físico revelou a presença de contratura em flexão das articulações metacarpo-falangeanas do 4º e 5º quirodáctilo bilateral com presença de feridas interdigitais (Figura 1). Presença de nódulos em região medial plantar bilateral, que podem ser vistos clinicamente (Figura 2) e por exame de ressonância magnética (Figura 3). Figura 1. Articulações metacarpo-falangeanas do 4º e 5º quirodáctilo bilateral com presença de feridas interdigitais Figura 2. Nódulos em região medial plantar bilateral Figura 3. Aspecto da doença de Dupuytren na ressonância magnética, evidenciando seus nódulos v. 34, supl. 1, p. 55-59 jul./dez. 2010 57 DISCUSSÃO Em pacientes com doença de Dupuytren, lesões semelhantes na fáscia plantar medial (doença de Ledderhose) ocorrem em 5 a 10% dos casos e na fáscia profunda do pênis (doença de Peyronie) em 1 a 3%.3,4 As manifestações iniciais relacionam-se, na maioria das vezes, ao aparecimento de nódulos ou cordões de consistência endurecida na palma da mão.2-5 Os nódulos e cordões, geralmente indolores, podem progredir e aumentar de tamanho. Com suas retrações, podem provocar uma deformidade em flexão das articulações metacarpofalangianas (MCF) e interfalangianas proximais (IFP).2,5 O quarto e quinto dedos são os mais comumente acometidos na doença de Dupuytren e a região plantar medial mais afetada na doença de Ledderhose.2,3 Acomete frequentemente a mão dominante, sendo comum a bilateralidade e, neste caso, a deformidade é mais importante na mão dominante (Figura 1).1,6 Esta foi a característica observada no paciente deste relato de caso. Observa-se essa mesma evolução da contratura de Ledderhose.7 Estudo sobre doença fibromatosa da mão (doença de Dupuytren) relata que alguns pacientes referem sentir dor, queimação, hiperestesia, prurido ou outras sensações nas fases de atividade da doença.3 A indicação para tratamento cirúrgico baseia-se no grau de limitação de movimentos da articulação (limitação da extensão), normalmente utilizando-se a limitação maior que 20° a 30° para a articulação MCF e de 10° a 20º para a IFP. Alguns autores indicam cirurgia para qualquer grau de limitação da extensão da IFP.2,3 Nos estágios iniciais, sem deformidade em flexão dos dedos, pode ser indicada cirurgia quando os nódulos palmares forem grandes e dificultarem a utilização da mão nas atividades diárias.2,3 Dentre as técnicas cirúrgicas disponíveis para o tratamento da doença de Dupuytren e Ledderhose estão a fasciectomia percutânea (utilizada em casos graves para correções progressivas, em etapas); fasciectomia limitada, regional ou parcial (mais utilizada); fasciectomia extensa ou total (raramente utilizada, grande morbidade); dermofasciectomia (ressecção da pele junto com a fáscia, utilizada em recidivas). Deste modo, a técnica a ser utilizada no caso exposto é a fasciectomia regional.2,3 REFERÊNCIAS 1. Dib CC, Gervais J, Monteiro CGZ, Mendonza E, Pimentel RAP. Doença de Dupuytren: nossa conduta. Rev bras Cir Plást. 2008;23(4):290-3. 2. Barros F, Barros A, Almeida SF. 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Extraído de [http://www.dermato.med.br/ ufrj2003/ Fibromatose.pdf], acesso em [9 de junho de 2010]. v. 34, supl. 1, p. 55-59 jul./dez. 2010 59