03/06/2007 - VACINA PARA ABORTO DE REPETIÇÃO O Liberal (Belém-PA) Mulheres que desejam saber mais sobre o diagnóstico e tratamento do aborto de repetição - um problema que afeta de 2% a 5% da população feminina em idade fértil têm, a partir de agora, um canal privilegiado de informação. Trata-se do site do ginecologista e professor livre docente de obstetrícia da Unicamp, Ricardo Barini (www.barini.med.br). De acordo com o especialista, que também coordena o Ambulatório de Perdas Gestacionais do Centro de Atenção Integral à Saúde da Mulher (Caism) da Unicamp, a maioria dessas mulheres apresenta alterações de ordem imunológica, por isso, no site, há explicações detalhadas sobre o que é a Imunologia da Reprodução, subespecialidade desenvolvida nos EUA e trazida por ele ao Brasil na década de 90. No endereço eletrônico, é possível, ainda, esclarecer dúvidas, verificar as questões mais freqüentes e acompanhar o depoimento de casais que obtiveram sucesso com o tratamento para a perda repetida do embrião. Há um glossário de termos técnicos com a respectiva explicação e um completo noticiário em torno do assunto. O dr. Ricardo Barini também é o criador da ´vacina do marido´, um método que trata disfunções imunológicas responsáveis pelas perdas recorrentes. O tratamento foi aplicado no casal Valéria Reis Paiosin, de 30 anos, e José Fernando Paiosin, que, depois de quase quatro anos e três tentativas frustadas de ter um filho, finalmente conseguiram engravidar. Agora, os dois comemoram a chegada do filho Fernando, que completou quatro meses no último dia 11 de maio. Outra que passou pelo processo foi a empresária Cecília Stafocher, de 32 anos, que, depois de sofrer dois abortos e perder uma filha cinco dias após o parto, iniciou uma peregrinação de médico em médico. Finalmente, ela e o marido, Valmir, beneficiaramse da imunologia da reprodução, subespecialidade da qual Ricardo Barini é um dos pioneiros no Brasil. Depois da terceira dose do imunizante, ouviu do médico que tinha as mesmas chances de engravidar que uma mulher normal. Realizada, Cecília curtiu pela segunda vez, este ano, o dia das mães com Valesca, hoje com 1 aninho e dois meses de vida. ´A vontade de ser mãe era muito grande´, recorda. SEGURANÇA A arquiteta Daniela de Lima, de 34 anos, comemora o sucesso do tratamento com o marido e os filhos Miguel, 2 anos, e Sofia, 1 ano e um mês. Antes, ela havia perdido três bebês (incluindo gêmeos). Daniela sentiu-se especialmente segura porque conheceu diversas mulheres que haviam tido filhos com o tratamento depois de várias tentativas. Depois que Miguel nasceu, o casal esperou um ano para tentar novamente. ´Eu sabia que seriam indicadas outras doses de reforço da vacina e jamais arriscaríamos tentar outra gravidez sem elas. Em três meses consegui engravidar´, destaca. A gestação da Sofia seguiu tranqüila e ela nasceu de parto parto normal, com 38 semanas: ´Conto a nossa história com grande alegria, pois há esperança para os casais que sofrem como nós sofremos´. RESULTADO POSITIVO PARA 85% DAS MULHERES O ginecologista e obstreta Ricardo Barini explica que a ´vacina do marido´ foi desenvolvida a partir da observação de que indivíduos submetidos a transplantes de rim, na década de 60, e que haviam recebido transfusões de sangue, aceitavam melhor o rim transplantado que os pacientes que não haviam recebido transfusões. Como a gravidez, para a mulher, é um transplante temporário, imaginou-se que a transfusão de sangue poderia melhorar a aceitação do transplante ´fetal´. O Programa de Imunologia da Reprodução foi estabelecido pelo Dr. Alan E. Beer na Chicago Medical School em 1987. ´Foi nesta instituição que me especializei nesta área, implantando o programa na Unicamp, e na minha clínica, a partir de 1993. Provavelmente, mais de 20 mil mulheres no mundo já foram tratadas. Aqui no Brasil, acredito que ao redor de 2 mil pacientes já tenham sido atendidas atendidas´, calcula. De acordo com o médico, a vacina estimula a produção de um anticorpo chamado bloqueador. Este anticorpo regula o sistema imune da mulher e o prepara para a aceitação da gravidez, uma vez que ela não tenha conseguido produzir esta resposta apenas pela gravidez. Este anticorpo se liga a células NK (natural killers, ou assassinas naturais, as células reguladoras do nosso organismo) e passa a informação de que o que está se desenvolvendo dentro do útero é uma gravidez e não uma doença ou agressão ao corpo da mulher. Nesse sentido, 85% das mulheres tratadas com essa técnica obtêm resultados positivos. ´Nos outros 15%, identificamos alterações genéticas nos fetos em metade deste grupo (cerca de 7,5%), enquanto a outra metade apresenta alterações imunológicas mais graves que necessitam de um tratamento especial´, observa. As situações nas quais a vacina devem ser evitadas são as seguintes: quando o parceiro é portador de uma doença transmissível pelo sangue, como as hepatite B ou C e HIV/Aids ou quando a mulher já tem a resposta imune para a gravidez, o que é feito pela pesquisa no teste de crossmatch (ou prova cruzada). ´Quando a prova cruzada é positiva ela já tem essa resposta e não precisa ser tratada´, acrescenta. Ao contrário da idéia que o nome do tratamento possa suscitar, a vacina não é aplicada no marido. Ela tem esse nome apenas porque é preparada com os linfócitos do marido. Isso é assim realizado para que a mulher consiga produzir o anticorpo especificamente para o esposo. O processo acontece dessa maneira: são realizadas duas imunizações e refeito o teste de crossmatch. Se ele estiver positivo, a paciente está apta a engravidar. Se negativo, ela receberá mais três doses até que refaça o teste de crossmatch. Se ainda assim estiver negativo, ela irá receber uma vacina do marido e de um doador não aparentado para que esse doador drible o sistema imune da mulher, estimulando-a a produzir o anticorpo para o marido. Na gravidez, ela deve receber quatro doses de reforço para conseguir manter a produção dos anticorpos elevados e assim facilitar a resposta na gravidez. ´Cada dose da vacina tem um custo ao redor de R$ 700 e ainda não há previsão de que venha a ser produzida e paga pela rede pública de saúde´, conclui o médico. Tire as Dúvidas: O QUE É ABORTO RECORRENTE? O aborto de repetição se caracteriza pela perda de duas ou mais gestações sucessivas de até 20 semanas. Ocorre em 2% a 5% das mulheres em idade reprodutiva. QUAIS AS CAUSAS? O problema pode ter várias origens - genética, anatômica, hormonal, infecciosa e imunológica. Segundo pesquisa realizada com 246 mulheres, com três ou mais perdas gestacionais, atendidas no Caism/Unicamp, a causa mais freqüente é a rejeição do sistema de defesa do organismo da mãe às características do embrião herdadas do pai. COMO É FEITO O TRATAMENTO? O tratamento é feito com uma vacina especial, produzida com glóbulos brancos do pai do bebê. ‘Para acontecer uma adaptação, é necessário que o corpo da mulher produza anticorpos que identifiquem proteínas de origem paterna na superfície do embrião e não mais o rejeite’, explica o dr. Barini. Em geral, são necessárias duas aplicações, separadas por quatro semanas, mas podem ser administradas três ou mais doses.