Livro SUAS UFJF

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Carina Berta Moljo e Maria Lúcia Duriguetto
(Organizadoras)
Sistema Único de Assistência
Social, Organizações da
SociedadeCivileServiçoSocial
Uma análise da realidade de Juiz de Fora
25 ANOS
Juiz de Fora
2012
© Editora UFJF, 2010
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25 ANOS
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Sumário
PREFÁCIO: Política Social e Cultura Profissional: breve nota de
apresentação – Ana Elizabete Motta e Yolanda Guerra........................
5
INTRODUÇÃO...............................................................................
9
Capítulo 1. Política de Assistência Social no contexto neoliberal:
desafios da implementação do SUAS..................................................
13
Rodrigo de Souza Filho; Cássia Pacheco Golvea Antinareli; Carla Alves de
Paula; Wesley Helker Felício Silva
Capítulo 2. Gestão do SUAS em Juiz de Fora: análise da estrutura
burocrática.........................................................................................
45
Rodrigo de Souza Filho e Ester de Almeida Oliveira
Capítulo 3. Apontamentos acerca do associativismo brasileiro e de
sua relação com as políticas sociais......................................................
71
Cristina Simões Bezerra; Maria Lúcia Duriguetto
Capítulo 4. Apontamentos do associativismo municipal e sua
relação com as políticas sociais............................................................
Cristina Simões Bezerra; Maria Lúcia Duriguetto; Maria Zilda F. Martins;
Mariana de Almeida P. Maddalena
85
Capítulo 5. O exercício profissional na implementação do SUAS:
projeto ético político, cultura profissional e intervenção profissional........
103
Alexandra Aparecida T. Seabra Eiras; Carina Berta Moljo; Cláudia Mônica dos Santos
APÊNDICE A - QUESTIONÁRIO APLICADO AOS
REPRESENTANTES DAS
ORGANIZAÇÕES/MOVIMENTOS/INSTITUIÇÕES................ ....
145
APÊNDICE B - QUESTIONÁRIO: ANÁLISE DAS
CONDIÇÕES SOCIAIS, POLÍTICAS E CULTURAIS E
DA INTERVENÇÃO PROFISSIONAL DO ASSISTENTE
SOCIAL NA IMPLANTAÇÃO DO SUAS EM JUIZ DE
FORA. APLICADO AOS ASSISTENTES SOCIAIS........................
153
ultura Profissional:
resentação
Nacional de Cooperação Acadêmica de pesquisa das Universidades Federais
o e Juiz de Fora na área do Serviço Social
e estudos e pesquisas que privilegiam a
erviço Social e os processos de produção
om destaque para as políticas sociais, as
o Estado.
uisadores do grupo de pesquisa “Serviço
s Públicas”, vinculado ao Programa de
pelas Professoras Carina Berta Moljo
este processo e revela a importância do
conhecimento da realidade, razão do
os para a realidade das políticas sociais
o integra tem como eixo articulador
década do Séc. XXI cuja principal
s sociais, é a expansão da Política de
primeiro bloco de discussões do livro
Assistência Social, no Sistema Único de
des da sua gestão no município de Juiz
m se referencia na realidade juizforana,
uisa junto a instituições, organizações
b) a relação entre Estado e Sociedade
uação do terceiro setor. Finaliza este
o sobre a experiência profissional de 37
tica de Assistência Social, abordando o
a prática analisada sob a perspectiva do
Serviço Social brasileiro.
de trabalho, merecem ser ressaltadas
afirma que uma política social voltada
as classes subalternas exige uma política
Prefácio
6
econômica que privilegie as demandas pela universalização e aprofundamento de
direitos, se se pretende que seu desenvolvimento obtenha êxito no enfrentamento
das desigualdades sociais. De outra forma, a política social enfrentará entraves
estruturais vinculados à política econômica, não viabilizando a expansão de
direitos sociais, independentemente de sua configuração institucional.
A articulação entre as dinâmicas da economia e da política é uma
referência obrigatória para aqueles que adotam uma perspectiva de totalidade
no exame da realidade. É neste sentido que a Política Nacional de Assistência
Social e o seu modelo gerencial e organizativo – o SUAS – embora contenham
inegáveis avanços democráticos, incorporando reivindicações que superam
o modelo meritocrático-particularista que sempre marcou esta política no
Brasil, conforme indicam os autores do ensaio, esse avanço parece estar
subordinado à lógica da política econômica.
Neste sentido, como demonstram os dados empíricos expostos em
alguns ensaios, a expansão da política de Assistência Social vem se dando
através dos programas de transferência de rendas, tais como o BPC e o Bolsa
Família. Seu principal componente político-estratégico é ter se transformado
num insumo imprescindível para a expansão do consumo e formação de um
mercado interno, resultando na emergência do que a grande imprensa vem
denominando de “a nova classe média”.
Nestes termos, embora os beneficiários e usuários da Assistência Social
possam “estar ocupando um lugar “cidadão”, não estamos seguras de que esta
situação avance para o estabelecimento do exercício real dos direitos sociais.
Menos pela positividade ou avanço que venha a ter a política de Assistência
Social e mais pela sua orgânica vinculação com as necessidades da economia.
É inegável que no Brasil do Séc. XXI convivem as sequelas da ortodoxia
neoliberal, o neodesenvolvimentismo, a financeirização da economia e a
expansão da assistência social.
Assim, como afirmam os Autores, faz-se essencial a retomada do papel
dos movimentos sociais e da participação das organizações democráticas da
sociedade civil na luta pela defesa da democracia e da cidadania, de uma forma
geral, e, especificamente, no campo da defesa de políticas sociais públicas
universalistas, se se pretende algum avanço democrático neste cenário.
Como parte do segundo bloco de textos, mas situado no mesmo
chão histórico e na mesma direção de apreensão da totalidade, emerge
a hipótese de que, sob o ideário neoliberal, o terceiro setor opera uma
ressignificação do conceito de sociedade civil, tanto por parte dos setores
supostamente progressistas quanto pelos defensores do projeto neoliberal,
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Ana Elizabete Motta | Yolanda Guerra
cumprindo funções econômicas, políticas e ideológicas. A faticidade
desta hipótese é apreendida nas lógicas que sustentam o “novo” trato
dado à questão social, em que se combinam e se complementam: a lógica
corporativa no sistema de representação de interesses e a lógica da solidariedade
e da concessão no que tange aos direitos.
Como parte de um mesmo movimento, esta lógica desencadeia e reforça
sentimentos e comportamentos de autoajuda, ajuda-mútua ou da ajuda
divina voltando-se para a auto-responsabilização dos sujeitos. Além de outras
funções, destaca-se a de justificar e legitimar o processo de desestruturação da
Seguridade Social, desresponsabilizando o Estado e desonerando o capital de cofinanciar as respostas às refrações da “questão social”, escamoteando os interesses
contraditórios das classes sociais no capitalismo e ocultando a luta de classes.
Esta discussão coloca premissas para pensar a intervenção sócio-política
e profissional do Serviço Social na implementação da Política Nacional de
Assistência Social e do SUAS, e a sua relação entre os elementos da cultura
profissional que têm referencia no projeto ético político-profissional .
O capítulo intitulado O exercício profissional na implementação do
Sistema Único da Assistência Social: projeto ético político, cultura profissional
e intervenção profissional expõe dados de pesquisa realizada em Juiz de
Fora, em 2009, sobre as condições sociais, políticas e culturais e da
intervenção profissional do Assistente Social na implantação do SUAS
naquele município. A análise dos dados transita por três vetores descritivos
e analíticos: 1) a apreensão da Política de Assistência Social no campo da
Seguridade Social brasileira, especialmente, no Governo Lula; 2) a inserção
sócio-ocupacional do Serviço Social no âmbito da assistência social em Juiz
de Fora, particularizada na Associação Municipal de Apoio Comunitário –
AMAC; 3) o projeto profissional hegemônico do Serviço Social brasileiro.
Consideramos que a abordagem da cultura profissional como resultado
das objetivações construídas pela profissão ao longo da sua trajetória incorpora
as suas diversas dimensões – teórico-metodológica, ético-política e técnicooperativa como produto histórico das intencionalidades dos sujeitos orientados
frente a realidade da cultura profissional, como resultado das causalidades postas
pela profissão se expressa em objetos (de conhecimento e de intervenção),
objetivos profissionais, referências teórico-metodológicas, princípios éticos e
políticos, valores e racionalidades (a lógica constitutiva destas práticas), como
resultante das dimensões objetivas e subjetivas que informam a constituição do
sujeito profissional e constitui-se em meio de socialização das conquistas e do
acervo cultural produzido pelo Serviço Social.
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
7
Prefácio
8
Contudo, os profissionais não constroem este processo de maneira
autônoma, posto que a profissão é socialmente determinada. Note-se que a
prática do Serviço Social sofre as determinações da divisão social e técnica do
trabalho e se insere no conjunto das relações sociais que particularizam cada
sociedade. Por isso mesmo, a profissão recebe as determinidades da dinâmica
macroeconômica, social e cultural prevalecente na realidade mais ampla.
Como exposto em um dos capítulos, esta cultura profissional, a despeito
das particularidades profissionais e, mesmo em contextos por vezes adversos,
vem afirmando a necessidade da efetivação dos direitos sociais conquistados
pelas classes subalternas, reafirmando a necessidade de construção de uma
cultura política democrática. Segundo os autores, uma cultura profissional
que converge com os valores do projeto ético político do Serviço Social, o que não
a exime de ser uma cultura profissional plural, como espaço de luta, de tensões.
Em resumo, o livro SUAS, Organizações da Sociedade Civil e Serviço
Social: Uma análise da realidade de Juiz de Fora é uma iniciativa das mais
relevantes para a produção e divulgação do conhecimento na área do
Serviço Social e afins, oferecendo à comunidade acadêmica e profissional
um conjunto de informações e reflexões que terão incidência no exercício
profissional e na construção de uma cultura política e profissional democrática
e comprometida com as necessidades das classes subalternas no âmbito das
contradições da sociedade capitalista contemporânea. Aos autores e autoras o
nosso reconhecimento pela originalidade e qualidade dos textos e aos leitores
e leitoras o desejo de uma leitura gratificante e profícua.
Recife/Rio de Janeiro, agosto de 2011.
Ana Elizabete Mota (Universidade Federal de Pernambuco)
Yolanda Guerra (Universidade Federal do Rio de Janeiro)
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Introdução
O presente Livro apresenta os resultados da pesquisa Análise das
condições sociais, políticas e culturais e da intervenção profissional do Assistente
Social na implantação do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) em Juiz
de Fora (período 2005-2009), realizada pelo Grupo de Pesquisa Serviço Social,
Movimentos Sociais e Políticas Públicas da Faculdade de Serviço Social da
Universidade Federal de Juiz de Fora (FSS/UFJF)1.
A Constituição de 1988 apresentou grandes avanços em relação aos
direitos sociais. Particularmente em relação à assistência social, pela primeira
vez, ela é concebida como política pública, dever do Estado e direito de
cidadania, compondo o campo da seguridade social. Esta concepção da
política apontava para a construção de um Estado de Bem-Estar social
pautado na concepção de seguridade social e cidadania universal.
Os movimentos sociais organizados, que participaram ativamente
do processo constituinte, continuaram, após a aprovação da Constituição
de 1988, a atuar politicamente em questões específicas, visando a
interferir na elaboração das leis complementares que viessem a consolidar,
institucionalmente, os avanços conquistados em suas áreas. Essa ação
ocorreu de forma emblemática nas áreas da saúde (elaboração e aprovação da
Lei Orgânica da Saúde — LOS), assistência social (elaboração e aprovação
da Lei Orgânica da Assistência Social — LOAS) e infância e adolescência
(elaboração e aprovação do Estatuto da Criança e do Adolescente — ECA),
e tinha por finalidade consolidar os dispositivos constitucionais referentes às
respectivas áreas de atuação.
Apesar de todas as dificuldades, a Lei Orgânica da Saúde, o Estatuto da
Criança e do Adolescente e a Lei Orgânica da Assistência Social foram aprovados
pelo Congresso e sancionados pelo presidente da República até 1993.
1
A pesquisa foi financiada pela FAPEMIG, PROPESQ (com bolsas de Iniciação
Científica e Bolsa Apoio ao Recém-Doutor – 2010 - e Enxoval – Bolsa de apoio a
consolidação de grupos de pesquisa 2009/2010) e pelo Programa de Cooperação
Acadêmica – PROCAD, que envolve a Faculdade de Serviço Social da UFJF
(Coordenado pela Profa. Maria Lúcia Duriguetto; a Escola de Serviço Social da
UFRJ (Coordenado pela Profa. Yolanda Guerra); o Depto. de Serviço Social da
UFAL (Coordenado pela Profa. Cristina Paniago) e da UFPE ( Coordenado pela
Profa. Ana Elizabete Mota – Coordenadora geral do PROCAD).
Introdução
10
O reflexo desse processo na assistência social é inequívoco. A Lei
Orgânica da Assistência Social apresenta a assistência social como política
pública, direito de cidadania e dever do Estado numa perspectiva de
universalização dos direitos sociais. Além dessa concepção, a legislação propõe
a descentralização e a participação como elementos democratizadores para a
implementação dos serviços sociais, projetando uma organicidade da política
através da articulação Estado-sociedade civil, União-estado-município e
entre os diferentes setores que compõem a política.
A partir da década de 1990, o Brasil adota as políticas de ajustes
neoliberais. Tendo em vista a relação entre a política econômica e a política
social, e considerando a orientação neoliberal de ambas, podemos afirmar
que o cenário global no campo das políticas sociais no Brasil, apesar da coexistência de diferentes padrões e referências para a estruturação das políticas
sociais, é constituído, indubitavelmente, pelo padrão neoliberal.
Do ponto de vista da política social, o padrão neoliberal tem como
características a subordinação do social a uma política econômica monetarista
e ortodoxa, pautada pela estabilização monetária, pela abertura comercial e
pela privatização. No campo próprio da política social, esse padrão se expressa
por meio de uma política de desresponsabilização do Estado no trato das
expressões da “questão social” através de ações focalizadas, fragmentadas e
privatizadas, depositando a maior parte da responsabilidade no sucesso das
ações na própria sociedade, apelando, assim, para a solidariedade social - no que
a mídia colabora fazendo um apelo à sociedade civil para o desenvolvimento
de medidas de caráter assistencialista, voluntário e filantrópico. Corroborando
com esse processo, os programas de renda mínima têm sido implementados
sob uma nítida concepção liberal de focalização e pobreza absoluta, o que
contribui para a redução de gastos sociais.
Independentemente dos constrangimentos que a ordem econômica do
último decênio tem imposto ao desenvolvimento da política de assistência
social numa perspectiva de universalização de direitos e a priorização quase
que absoluta em programas de transferência de renda, hoje, do ponto
de vista da engenharia institucional e da concepção expressa na Política
Nacional de Assistência Social (2004), conseguimos vislumbrar avanços
importantes nesta área. Os aspectos mais importantes que ocorreram na área
da assistência foram o fim da Comunidade Solidária, uma estrutura paralela,
criada no Governo FHC (Fernando Henrique Cardoso), que fragilizava
substantivamente a organização da política assistência nos moldes proposto
pela LOAS; a unificação das ações da política no atual Ministério de
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Introdução
Desenvolvimento Social e Combate à Fome e, como conclusão do processo,
a aprovação da Política Nacional de Assistência Social que se estrutura na
perspectiva de construção do Sistema Único de Assistência Social (SUAS).
No entanto, a análise realizada compreende que o Governo Lula (2002
-2010), ao manter a política econômica neoliberal e estruturar uma política
de assistência social fundada em programas focalizados de transferência de
renda, inviabiliza a democratização da assistência social prevista no SUAS.
Na trajetória da constituição e do desenvolvimento da política de
assistência social no Brasil, os assistentes sociais foram protagonistas centrais
desse processo, muitas vezes, inclusive, confundindo a profissão com a
própria política e incorporando dela seus traços conservadores. Porém,
no processo de mobilização dos anos 80, na dinâmica de renovação da
profissão, os profissionais do Serviço Social reorientaram sua intervenção
numa perspectiva afinada com os movimentos democráticos na defesa da
ampliação de direitos sociais, no caráter público estatal das políticas sociais,
na democratização dos espaços públicos, na constituição de uma cultura
democrática e de participação e controle social.
Nesse sentido, os assistentes sociais, desde a luta pela incorporação
da assistência social como política de seguridade social, vêm se destacando,
individual e coletivamente, como lideranças dos processos de formulação,
implementação e avaliação da política em sua proposição pública e estatal e
como direito de cidadania. Assim, a estruturação dessa política vem contando
intensivamente com a participação desses profissionais tanto no nível federal
quanto estadual e municipal.
Atualmente, a categoria dos assistentes sociais tem assumido funções
de formulação, execução e controle da implantação do Sistema Único de
Assistência Social (SUAS).
Nesse quadro, apresenta-se como necessário analisar as condições
econômicas, sócio-políticas e culturais para a implementação do SUAS e
verificar que características vem assumindo a intervenção profissional dos
Assistentes Sociais no processo de efetivação da política. Analisar estes
elementos no município de Juiz de Fora, bem como identificar as bases do
associativismo e dos processos de participação existentes, verificando suas
potencialidades e limites para a implementação do SUAS, constituem os
objetivos dos conteúdos dos capítulos que compõem o presente livro.
A pesquisa de campo que substantivou as análises aqui desenvolvidas
foi realizada por meio da técnica de entrevista com responsáveis pela
formulação e execução da política de assistência social no município; pela
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
11
Introdução
12
aplicação de questionário aos representantes das organizações/movimentos/
instituições existentes nas Regiões Administrativas do município e aos
profissionais de Serviço Social dos CRAS e rede conveniada2. Também, junto
aos profissionais, foram realizados laboratórios, grupo focal e um Simpósio.
Agradecemos a todos que contribuíram para a realização e conclusão
desta pesquisa: assistentes sociais, representantes das instituições/movimentos/
organizações, gestores, discentes da graduação e da pós-graduação, agências
de fomento (FAPEMIG, Capes/PROCAD) e UFJF/PROPESQ.
2
Os questionários estão em Anexo.
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Capítulo 1
Políticadeassistênciasocialno
contexto neoliberal: desafios
da implementação
do SUAS
1Introdução
Rodrigo de Souza Filho1
Cássia Pacheco Gouvea Antinareli2
Carla Alves de Paula3
Wesley Helker Felício Silva4
No marco do capitalismo monopolista, as políticas sociais, a partir de
seu objetivo imediato de garantir a reprodução da força de trabalho, atuam
Professor Adjunto da Faculdade de Serviço Social/UFJF, Doutor em Serviço Social/UFRJ.
Assistente Social da Prefeitura Municipal de Cataguases/MG.
Assistente Social da prefeitura de Teixeiras/MG e Especialista em Gestão da Política
de Assistência Social e SUAS/Pitágoras.
Assistente Social, Mestre em Serviço Social/UFJF e Doutorando em Serviço Social/UFRJ
1
2
3
4
Política de Assistência Social no contexto neoliberal: desafios da implementação do SUAS
14
em determinadas expressões da “questão social”5 como forma de construir
uma base ampla de legitimidade e consenso social, através do atendimento
concreto de demandas e necessidades da classe trabalhadora. No entanto, elas
encontram-se intrinsecamente relacionadas às políticas econômicas como
estratégia de intervenção do Estado, visando à realização da lógica monopólica
de maximização dos lucros pelo controle dos mercados. A forma e o conteúdo
das políticas econômicas e sociais, por conseguinte, dependerão das lutas sociais
concretas - dos processos de organização e de luta dos trabalhadores - que
produzirão a morfologia do Estado interventor e de sua política social, num
determinado contexto histórico (NETTO, 1992). Nesse sentido, entendemos
a política social como estratégia permanente e contínua da intervenção do
estado na área social (NETTO, 1992).
Assim, se por um lado o Estado interventor e a política social
apresentam-se como funcionais ao capital, por outro eles também atendem
a interesses da classe trabalhadora. Esse movimento contraditório processa
o limite e a possibilidade da ação política junto ao Estado, no aspecto
geral, e à política social, especificamente, numa perspectiva de reformas no
campo estatal.
Outro aspecto que expressa o limite e a possibilidade da intervenção
junto à política social diz respeito à sua relação com a política econômica.
Nesse sentido, para um enfrentamento das expressões da “questão social” que
venha a atender de forma mais ampla os interesses da classe trabalhadora,
exige-se uma política econômica também com este objetivo. Portanto, uma
política econômica que reforça as desigualdades sociais determina as (im)
possibilidades de construção de uma política social voltada para os interesses
das classes subalternas. Nesses termos, as políticas sociais públicas, por mais
5
Entendemos “questão social”, conforme destaca Iamamoto, como o “conjunto das
expressões das desigualdades sociais engendradas na sociedade capitalista madura,
impensáveis sem a intermediação do Estado. Tem sua gênese no caráter coletivo
da produção, contraposto à apropriação privada da própria atividade humana - o
trabalho -, das condições necessárias à sua realização, assim como de seus frutos
[...] A questão social expressa, portanto, disparidades econômicas, políticas e culturais
das classes sociais, mediatizadas por relações de gênero, características étnico-raciais
e formações regionais, colocando em causa as relações entre amplos segmentos
da sociedade civil e o poder estatal” (IAMAMOTO, 2001, p. 16-17). Para um
mapeamento das determinações teóricas e históricas da categoria “questão social” no
marco da tradição marxista, ver, também, Netto (2001).
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Rodrigo de Souza Filho | Cássia Pacheco Golvea Antinareli | Carla Alves de Paula | Wesley Helker Felício Silva
que sejam orientadas para a efetivação de objetivos democráticos6 e de um
processo de reformas no âmbito estatal, não viabilizarão um enfrentamento
mais amplo das expressões da “questão social”.
Assim posta, uma política social voltada para o atendimento das
necessidades das classes subalternas exige uma política econômica que
privilegie as demandas pela universalização e aprofundamento de direitos, se
se pretende que seu desenvolvimento obtenha êxitos no enfrentamento das
desigualdades sociais. De outra forma, a política social enfrentará entraves
estruturais vinculados à política econômica, não viabilizando a expansão de
direitos sociais, independentemente de sua configuração institucional.
Essas características mostram as articulações necessárias que devem
existir entre a política social e a política econômica, no marco do capitalismo,
para produzir ampliação de direitos.
Dessa forma, para analisarmos estruturalmente a tendência da
implementação do Sistema Único de Assistência Social (SUAS)7 do Governo
Lula, mostra-se essencial identificarmos que tipo de vinculação a política
social de assistência, de uma forma geral, estabelece com a política econômica
implementada, para avaliarmos sua potencialidade enquanto política social
orientada para a expansão de direitos.
Nossos estudos indicam que a estrutura geral da política de assistência social
do governo Lula apresenta-se como a contra-face social da política econômica
neoliberal. Esse entendimento será tratado na primeira parte do artigo.
Após desvelar a relação existente entre a política econômica e a política
de assistência social, apresenta-se como necessário explicitar a dinâmica da
própria política de assistência para verificar sua orientação geral e avaliar
aspectos que possam fortalecer uma perspectiva democrática. Dessa forma,
identificamos aspectos - do ponto de vista geral da política de assistência
social e na particularidade do SUAS - que podem ser reconhecidos como
Para efeito desse trabalho estaremos qualificando como democrática a política
social de “padrão institucional, redistributivista”. É o padrão que se orienta pelo
universalismo de direitos, a ampliação e a garantia, por parte do Estado, da proteção
e da promoção social, através da organicidade das políticas sociais de caráter público.
Conjunto de serviços, programas, projetos e benefícios no âmbito da assistência
social prestados diretamente – ou por meio de convênios com organizações sem
fins lucrativos -, por órgãos e instituições públicas federais, estaduais e municipais
da administração direta e indireta e das fundações mantidas pelo poder público. É
modo de gestão compartilhada que divide responsabilidades para instalar, regular,
manter e expandir as ações da assistência social (SPOSATI, 2006, p. 130).
6
7
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
15
Política de Assistência Social no contexto neoliberal: desafios da implementação do SUAS
16
avanços para a efetivação de uma política de assistência social de corte
democrático. Na segunda parte do artigo desenvolvemos esta análise.
Para concluir, explicitaremos a situação estrutural do SUAS na
sua potencialidade, contradição e adversidade e os rebatimentos destas
configurações para a implementação do sistema e suas possíveis consequências
para a política de assistência social brasileira.
2 A Política de Assistência Social do
Governo Lula
2.1Antecedentes
A década de 1990 apresentou uma conjuntura desfavorável para
a implementação do projeto democrático de política social previsto na
Constituição Federal de 1988 e em suas leis orgânicas (Lei Orgânica da Saúde,
Lei Orgânica da Assistência Social e Estatuto da Criança e do Adolescente).
A partir dos anos de 1990 e, de forma mais consistente, de 1994,
o governo brasileiro (governos Collor de Mello e FHC, respectivamente)
assume como orientação para as políticas econômicas e sociais os ditames
neoliberais fundados na lógica proposta pelo Consenso de Washington
(estabilização monetária, abertura comercial e privatização) e nos preceitos de
um “social-liberalismo” que não se distingue concretamente das experiências
neoliberais de redução do Estado na área social.
Em termos gerais, a Política Social desencadeada pelo governo FHC
seguiu os passos neoliberais de reestruturações social-democratas, num país
que não constituiu um padrão de intervenção do Estado na área social do
porte de tais experiências. Portanto, diminuiu o que não existia e redefiniu
o que não foi construído. Sendo assim, assistencialização, mercantilização,
re-filantropização e focalização das políticas sociais formaram a tendência de
tal proposição (MOTA, 1995; YASBECK, 1995; SOARES, 2000).
A conjuntura hegemônica do governo FHC apresentou, portanto,
um modelo econômico e social (ajuste neoliberal que aposta numa
política econômica ortodoxo-monetarista, supervalorizando a estabilização
e o controle inflacionário e a redução do papel do Estado na área social)
incompatível com a universalização e aprofundamento de direitos sociais
(FIORI, 1995; SOARES, 2001).
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Rodrigo de Souza Filho | Cássia Pacheco Golvea Antinareli | Carla Alves de Paula | Wesley Helker Felício Silva
No âmbito da assistência social, o governo FHC pautava-se em duas
frentes: o apelo à solidariedade e os programas de transferência de renda.
Pelo lado da “solidariedade”, o exemplo emblemático dessa política
neoliberal de assistência social foi o Programa Comunidade Solidária
(PCS), que desconheceu a LOAS e a legitimidade do Conselho Nacional
de Assistência Social e desenvolveu uma política de desresponsabilização
do Estado no trato das expressões da “questão social”, através de ações
focalizadas, fragmentadas e privatizadas.
Outro aspecto a destacar, ainda nesse campo, refere-se à
“descentralização destrutiva” (SOARES, 2000) operada pelo desmonte de
instituições nacionais (Legião Brasileira de Assistência/LBA e Fundação
Centro Brasileiro para Infância e Adolescência/FCBIA), sem planejamento
prévio, combinada com a transferência das ações para os municípios, sem
o devido apoio técnico e financeiro para que os mesmos fossem capazes de
assumir as ações.
A outra matriz da “era” Fernando Henrique Cardoso acerca da
Política de Assistência Social, diz respeito à implantação de programas de
transferências de renda com condicionalidades (como Bolsa-Escola, BolsaAlimentação, Vale-Gás, Programa de Erradicação do Trabalho Infantil
etc.), através de critérios restritos de elegibilidade e de distribuição de
benefícios ínfimos.
A partir desta estratégia, foi estruturada a Rede de Proteção Social, com
prevalência para os programas de transferência de renda, que foram criados
numa conjuntura sócio-econômica marcada pelo crescimento acentuado
do desemprego, acompanhado do acréscimo de formas de ocupações
precárias e instáveis, sem a proteção social garantida pela previdência social;
rebaixamento do rendimento da renda proveniente do trabalho; crescimento
da violência; ampliação dos índices de pobreza e da desigualdade social.
Enfim, os programas de renda mínima foram implementados sob uma
nítida concepção liberal de focalização e pobreza absoluta, o que contribuiu
para a redução de gastos sociais (SILVA, YASBECK e GIOVANNI, 2004).
Nesse quadro, as estratégias de focalização - via programas de combate
à pobreza - e descentralização/apelo à solidariedade voluntária contribuem,
como sinalizam Laurell (1995) e Soares (2000), para a manutenção de
mecanismos clientelistas na área social. Esse aspecto parece bem razoável
em se tratando de um governo fundado num pacto conservador, que
precisa articular politicamente apoio para a direção estratégica maior: a
transnacionalização radical da economia (FIORI, 2001).
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
17
Política de Assistência Social no contexto neoliberal: desafios da implementação do SUAS
18
2.2 A conjuntura dos governos Lula
Devido ao quadro político instaurado, a sociedade brasileira elege Lula
para a Presidência da República em 2002, e o reelege em 2006. A eleição
de Lula significava, para todos aqueles que votaram nele, uma possibilidade
de ruptura com o neoliberalismo e uma esperança de expansão dos direitos
sociais. Porém, o que se verificou foi a manutenção, no geral, da política
econômica e social do governo Cardoso (FILGUEIRAS; GONÇALVES,
2007; DRUCK; FILGUEIRAS, 2007).
Assim, através das metas de inflação, do ajuste fiscal permanente e
do câmbio flutuante, o Brasil passou durante o governo Lula, devido
ao contexto internacional favorável, por mudanças no desempenho da
economia com melhora da situação das contas externas. O crescimento dos
superávits na balança comercial, mesmo com o mercado interno medíocre,
possibilitou ao governo Lula a manutenção do modelo econômico do governo
FHC, conservando suas características fundamentais (FILGUEIRAS;
GONÇALVES, 2007).
A partir da dominação da lógica financeira, a inserção internacional
do Brasil, conduzida de forma passiva, tornou sua política macroeconômica
mais dependente dos ciclos do comércio internacional e dos movimentos
de curto prazo do capital financeiro. Desse modo, apoiada, sobretudo, em
commodities e produtos industriais com baixo e médio-baixo conteúdo
tecnológico, a gestão do governo Lula promoveu um aumento das exportações
concorrendo para um importante saldo comercial externo (FILGUEIRAS;
GONÇALVES, 2007).
Mas, vale lembrar que tal sucesso apresenta algumas particularidades:
primeiro, como indicado, encontrou campo fértil no cenário internacional
com o crescimento da economia global e do comércio internacional,
concomitante à elevação dos preços internacionais e da demanda das
commodities; em segundo, a relevante contribuição de uma taxa de câmbio
favorável aos exportadores brasileiros; além, claro, da implementação de
políticas governamentais específicas, como crédito e incentivos fiscais.
Neste cenário, a inserção internacional, iniciada pelos governos
de FHC, apoia-se na exportação de produtos primários, responsáveis por
promover uma melhora conjuntural no balanço de pagamentos do país e nos
indicadores de vulnerabilidade financeira externa. Todavia, do ponto de vista
estrutural, essa política econômica distancia o país dos países desenvolvidos
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na produção e exportação de produtos de alta tecnologia, significando um
aumento da vulnerabilidade externa do ponto de vista estrutural.
Como destacou Filgueiras e Gonçalves (2007), com a consolidação
do neoliberalismo no Brasil a estrutura industrial sofreu um retrocesso
impulsionado pela abertura comercial, pelas privatizações e pelo processo
de desnacionalização da economia. Nesse sentido, devido à presença
dominante de produtos intensivos em recursos naturais e pelo baixo
conteúdo tecnológico dos produtos industrializados, as exportações do país
passaram por um processo de reprimarização que diminuiu o dinamismo
industrial do Brasil.
No que tange ao plano interno, verifica-se a perda tendencial do
poder aquisitivo dos salários com redução da participação destes na renda
nacional, com intuito de canalizar para os donos do capital uma parcela
desta renda maior do que a parte atribuída aos rendimentos ao trabalho.
A reconcentração da renda nacional tem nas elevadas taxas de desemprego
sua principal razão: os rendimentos do capital têm sido favorecidos por
um sistema tributário regressivo que reduz os impostos sobre a produção
e sobre aplicações financeiras, e até desonera integralmente os setores mais
lucrativos voltados para a exportação e para os segmentos de tecnologia
avançada e dinâmica.
O enfrentamento dos compromissos da dívida externa, bem como a
garantia de acesso das empresas aos bens e serviços importados necessários
à continuidade das atividades, marcam o ajuste externo a que o Brasil vem
se submetendo, visando à recomposição da relação entre dívida externa e
exportações. Neste campo, o governo foi bem sucedido: reduziu a dívida
externa e obteve excelente saldo na conta de comércio de mercadorias.
Contudo, embora houve essa melhora na trajetória da dívida pública
externa devido aos grandes saldos da balança comercial, o país implementou
uma política de troca da dívida pública externa pela dívida pública interna.
Por conseguinte, a redução da dívida externa, por um lado, e aumento da
dívida interna em relação ao PIB, por outro, concorreram para flexibilizar as
restrições externas. Isso serviu fundamentalmente para viabilizar os objetivos
centrais da política econômica do governo Lula, visto que, buscaram reduzir
gradualmente a dívida pública por meio da obtenção de elevados superávits
primários e taxas de inflação cada vez menores, de acordo com o regime
de metas de inflação, por meio de taxas de juros elevadas. Essas diretrizes
essenciais da política econômica do governo Lula contribuíram, então, para
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19
Política de Assistência Social no contexto neoliberal: desafios da implementação do SUAS
20
reduzir o risco-país e elevar o Brasil como uma nação capaz de honrar suas
obrigações com o capital financeiro (FILGUEIRAS; GONÇALVES, 2007).
Assim sendo, esse conjunto de fatores tem sido utilizado para justificar o
aumento do superávit primário do orçamento público, paralisando recursos que
poderiam ser destinados aos gastos sociais ou a investimentos em infraestrutura.
A análise dos gastos públicos, no período 2001/2005, não deixa dúvidas
sobre a manutenção da lógica neoliberal do governo Lula: a) manutenção do
gasto com pessoal, educação e previdência dos servidores em relação ao PIB
(2,3%; 0,2%; 2,2%, respectivamente); b) redução das despesas correntes e
investimento (em 0,4p.p e 0,3p.p); c) crescimento dos gastos com programas
sociais e previdência (0,7p.p e 1,1p.p); d) elevação do superávit primário em
1,05 p.p. (ALMEIDA; GIAMBIAGI; PESSOA, 2006).
Além disso, os superávits obtidos no governo Lula vieram
acompanhados por uma elevação da carga tributária que, por sua vez, vem
aumentando sucessivamente desde a adoção do Plano Real e, sobretudo,
após o acordo com o FMI visando promover um ajuste fiscal permanente.
A análise da evolução da carga tributária brasileira, conforme o Tribunal de
Contas da União –TCU – (2010)8, indica que houve no período de 1995 a
2007 um aumento de 20,57%, correspondendo a um salto de cerca de 29%
em 1995 para cerca 35% em 2007 na composição do PIB. Essa evolução
diminuiu apenas no ano de 2009, com uma retração de 1,29%, devido ao
contexto de crise econômica.
Todavia, o sistema tributário brasileiro não obedece ao princípio
da equidade ou de capacidade contributiva compatível com a capacidade
econômica dos seus cidadãos, o que acaba por onerar aqueles com menor
nível de renda, exigindo deles um esforço tributário maior do que dos
cidadãos mais ricos. Por esse aspecto, o sistema tributário brasileiro penaliza
mais os contribuintes mais pobres, constituindo uma relação inversa entre os
tributos pagos e o nível de renda deste cidadão.
Esse quadro regressivo da carga tributária brasileira é composto pela
incidência indireta dos tributos sobre o consumo, constituído em 43% da carga
tributária, possuindo um peso maior do que os tributos diretos, incidentes na renda
e na propriedade, que constitui um percentual de cerca de 28% (BRASIL, 2007).
Por conseguinte, no Brasil, os tributos sobre o consumo possuem
maior peso que aqueles sobre a renda. Com isso, a população de baixa
8
Conforme Relatório e parecer prévio sobre as contas do Governo da República:
exercício de 2009, do Tribunal de Contas da União, disponível em www.tcu.gov.br.
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renda é responsável por financiar o Estado e carregar, sobretudo após acordo
do “pacote fiscal” com o FMI, o peso do aumento da carga tributária ao
longo dos últimos anos, já que esta possui quase metade de sua composição
proveniente dos impostos incididos sobre o consumo (SALVADOR, 2010).
Isso significa que há “uma brutal transferência de renda do conjunto da
sociedade para o capital financeiro e os rentistas” (DRUCK; FILGUEIRAS,
2007, p. 29). Em 2006, os serviços da dívida consumiram 34,1% do
orçamento federal, enquanto a previdência 26,6% e a assistência social,
apenas, 2,7% (BEHRING, 2007).
Em relação ao PIB, entre 2008 e 2009 a dívida pública chegou a
aumentar R$191,7 bilhões, marcando um crescimento em 5,62% do PIB,
que saltou de 37,34% em dezembro de 2008 para 42,96% no final de 2009.
A previdência contou com uma variação de 8,6% do PIB para 9,3%, entre
os anos de 2008 e 2009, respectivamente. Já a política de assistência social
passou por uma evolução no orçamento da União ao longo do período
2005-2009, representando uma evolução de 15,8 a 33,3 bilhões de reais,
correspondendo a uma evolução de 0,7% do PIB em 2005 para 1,1% em
2009 (BRASIL, 2010).
A tabela abaixo vem ilustrar este contexto, mostrando a tendência no
destino dos recursos da Seguridade Social desde o período de 2000 a 2007,
para cada uma das políticas.
Tabela 1 - Orçamento da Seguridade Social: distribuição de recursos entre as políticas sociais
(2000-2007) R$ milhões
Políticas de
Seguridade
social
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
Previdência
Social
93.407,56
107.544,25
123.218,08
154.477,54
165.509,44
187.799,51
212.965.46
234.374,19
Saúde
20.207,12
23.633,85
25.434,63
27.171,84
32.972,89
36.483,27
40.577,22
45.713,13
Assistência
Social
4.442
5.289
6.513
8.416
13.863
15.806
21.555
24.714
Total
em
R$ milhões
correntes
118.120
136.476
155.166
181.066
212.345
240.089
275.097
304.801
Participação
em %
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
Previdência
Social
79,08%
78,80%
79,41%
80,35%
77,94%
78,22%
77,41%
76,89%
Saúde
17,16%
17,32%
16,39%
15,01%
15,53%
15,20%
14,75%
15,00%
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21
Política de Assistência Social no contexto neoliberal: desafios da implementação do SUAS
22
Políticas de
Seguridade
social
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
Assistência
Social
3,76%
3,88%
4,20%
4,65%
6,53%
6,58%
7,84%
8,11%
Total em %
100,00%
100,00%
100,00%
100,00%
100,00%
100,00%
100,00%
100,00%
Políticas em
% PIB
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
Previdência
Social
7,92%
8,26%
8,34%
8,53%
8,52%
8,74%
8,99%
9,16%
Saúde
1,72%
1,82%
1,72%
1,60%
1,70%
1,70%
1,71%
1,79%
Assistência
Social
0,38%
0,41%
0,44%
0,50%
0,71%
0,74%
0,91%
0,97%
Total em %
do PIB
10,01%
10,48%
10,50%
10,65%
10,94%
11,18%
11,61%
11,91%
PIB em R$
milhões
1.179.482
1.302.136
1.477.822
1.699.948
1.941.498
2.147.944
2.369.797
2.558.821
Fonte: SIAFI/SIDOR. Elaboração: Salvador (2010)
Os dados apontados revelam que dentro do período abordado, a
previdência recebeu a maior parcela de recursos em todos os anos. Entretanto,
vale destacar que a maior parte dos gastos com a previdência social é custeada
pelas receitas provenientes dos trabalhadores e empresários. Em outro diapasão,
percebe-se que ocorre uma redução na participação relativa da saúde no total
deste quadro orçamentário, ao passo que a política de assistência social passa
por uma ampliação de gastos. Isso ocorre sobretudo a partir de 2004, devido
à redução de idade da população idosa (de 67 para 65 anos) para acesso ao
Benefício de Prestação Continuada – BPC, e ao aumento de recursos para
o principal programa de transferência de renda do governo federal, o Bolsa
Família, que tinha no ano de 2005 uma despesa equivalente a 0,21% do PIB,
aumentando para 0,36% em 2007 e 0,4% em 2008.
Nesse sentido, Druck e Filgueiras assinalaram (2007, p.30) que os gastos
sociais que têm maior capacidade de impacto no combate às desigualdades
e à pobreza, como saúde, educação, habitação e saneamento, perdem
participação relativa no orçamento social. A saúde, por exemplo, obteve
certa estabilidade em proporção ao PIB, com uma média de 2% desde o ano
de 2005. Apenas no ano de 2009 contou com uma participação de 2,2%
do PIB, o que, em parte, pode ser atribuído à estagnação do crescimento do
PIB devido ao contexto de crise. Já a habitação e o saneamento contaram
com um crescimento pouco expressivo, entre os anos de 2005 e 2009, na
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ordem de 0,07% para 0,08% em relação ao PIB na habitação, e 0,0% para
0,1 % no saneamento. Contudo, como acima demonstrado, os gastos com a
assistência social neste período dobraram, tendo um crescimento considerável
em relação ao PIB (BRASIL, 2010).
Ainda que se constate a ampliação dos montantes de recursos para o
Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS) desde a sua criação em 1996,
este tem tido uma participação tímida no orçamento da seguridade social.
Dessa forma, se em 1996 os recursos executados via FNAS correspondiam
a apenas 25,7% do total dispendido na função assistência social, no
orçamento previsto para 2010 corresponde a cerca de 62% do orçamento
previsto para a mesma função, de acordo com a Lei Orçamentária Anual
de 2010. Todavia, diante do orçamento previsto para a Seguridade Social,
neste mesmo ano, a função Assistência Social corresponde a apenas 9,1%, já
o FNAS a 5,5% diante do orçamento previsto para a Seguridade Social em
2010. Cabe lembrar que esta evolução dos recursos destinados ao FNAS tem
como responsáveis os programas de transferência de renda, expressados BPC
e na Renda Mensal Vitalícia - RMV, executados pelos recursos aportados na
Unidade Orçamentária FNAS.
Quando se procede a comparação entre os recursos destinados aos
principais programas de transferência de renda e às demais ações sociais do
MDS, verifica-se que o BPC consome cerca de 52% dos recursos, seguido
pelo Bolsa-Família com cerca de 35%. Estes dois programas de transferência
de renda concentram 87% dos recursos destinados à população. Os outros
13% dos recursos estão distribuídos entre a RMV, com 4,6%, a proteção
social básica e a proteção social especial com 2,3%, PROJOVEM com 0,9%,
o PETI com, aproximadamente, 0,7%, no enfrentamento da violência
sexual contra crianças e adolescentes com 0,1% e as outras ações do MDS
que somadas ficam com somente 4,4%, conforme indica a Lei Orçamentária
Anual de 2010.
Como se percebe, os gastos com a política de assistência social revelam
a consolidação da tendência dos mesmos constituir-se predominantemente
nos programas de transferência de renda. Somados os valores destinados a
esses programas, constata-se que são responsáveis pela execução de 91,6%
do valor total de recursos orçamentados para o MDS. Desse modo, o MDS
vem priorizando claramente os programas de transferência de renda para
categorias e/ou segmentos em situação de pobreza absoluta, o que lhes atribui
o caráter de programas altamente restritos e focalizados. Tal fato torna-se
ainda mais grave diante do reduzido investimento nos serviços, programas
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
23
Política de Assistência Social no contexto neoliberal: desafios da implementação do SUAS
24
e projetos de assistência social, o que atribui à política de assistência social
caráter residual e de manipulação política. Conforme analisam Filgueiras e
Golçalves (2007, p.163):
Mais do que o governo Cardoso, que deu início a esse tipo de política, Lula
levou a sério a importância política e social dessas despesas, compreendendo
sua função amortecedora de tensões no interior do projeto liberal. Este é o
objetivo essencial de um programa que não tem capacidade de desarmar os
mecanismos estruturais de reprodução da pobreza. Apenas maneja a pobreza,
pois mantém em permanente estado de insegurança, indigência e dependência
o seu público alvo, permitindo assim, a sua manipulação política.
A política social do governo Lula, tal como sua política econômica, é
também de natureza neoliberal, coerente com o modelo econômico vigente
e serve de instrumento poderoso de manipulação política de uma parcela
significativa da sociedade brasileira, ao mesmo tempo em que permite um
discurso “politicamente correto” (DRUCK; FILGUEIRAS, 2007, p. 32).
No governo Lula foram combinadas flexibilização e precarização do
trabalho e políticas focalizadas e flexíveis de combate à pobreza. Ambas
conduzidas
pela mesma lógica, qual seja, do curto prazo, do imediatismo inconsequente, de
intervenções pontuais e precárias que, para não se contrapor ‘à ordem econômica
neoliberal’ e às determinações do Banco Mundial, subordinam-se ao reino da
volatilidade, sem mudar e intervir sobre as causas estruturais dos problemas
fundamentais da sociedade brasileira” (DRUCK; FILGUEIRAS, 2007, p. 32).
O atual governo brasileiro optou pela continuidade deste modelo
econômico de estabilidade monetária e adotou uma política de severidade
fiscal que significam um verdadeiro sacrifício social, pois enquanto o gasto
social de 2004, por exemplo, foi de R$68,3 bilhões (BOSCHETTI, 2004,
p. 3), o superávit primário foi de R$70 bilhões (BOSCHETTI, 2004, p.
3). Ou seja, o governo investiu menos em políticas sociais do que poupou
recursos para pagamento dos juros da dívida. Para gerar esta economia, o
governo ampliou receitas por meio do aumento de impostos e das reformas
tributárias e da previdência, e ainda, por meio do corte de gastos, com a
redução de investimentos em políticas e programas sociais.
Tal postura ratifica o compromisso com o ajuste fiscal e a manutenção
do superávit primário, posicionando-se contra o princípio da universalidade,
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destacando a focalização nos grupos de menor renda como norteador das
políticas sociais.
As consequências desse quadro são o baixo crescimento econômico
e a continuidade da concentração de renda e riqueza (apesar de alguma
distribuição proporcionada principalmente pelo aumento real do salário
mínimo e pela influência dos programas sociais que proporcionaram um
crescimento da renda mensal do trabalhador de 20% em cinco anos).
Essa situação impede a possibilidade de existência da “porta de saída”
para a pobreza, visto que a política de assistência social garante direitos
socioassistenciais, mas ela não é capaz de construir saídas estruturais para a
condição de pobreza.
Nesse quadro, efetiva-se a tendência à privatização e assistencialização
das políticas sociais, já esboçada por Mota (1995), no início da década de
1990, e atualizada para a conjuntura atual (MOTA, 2008).
Esse processo de assistencialização da proteção social brasileira é,
então, determinado pela tendência à expansão da política de assistência
social, se tornando a principal política de proteção social brasileira, ao passo
de um processo de restrição e orientação privatizante das políticas de saúde,
previdência e educação.
Como se percebe, iniciou-se uma expansão da assistência social
como principal política de combate aos agravos cometido pelas medidas
neoliberais adotadas no país. Por isso, “se antes a centralidade da seguridade
girava em torno da previdência, ela agora gira em torno da assistência, que
assume a condição de uma política estruturadora e não como mediadora
de acesso a outras políticas e a outros direitos, como é o caso do trabalho”
(MOTA, 2008, p. 138).
Portanto, a assistência como uma política não contributiva adquire um
lugar privilegiado na proteção social brasileira, se tornando a principal política
de proteção social do país, denotando um movimento responsável por criar
uma nova engenharia da Seguridade Social brasileira (MOTA, 2008).
Instala-se uma fase na qual a Assistência Social, mais do que uma política de
proteção social, se constitui num mito social. Menos pela sua capacidade de
intervenção direta e imediata, (...), e mais pela sua condição de ideologia e
prática política, robustecidas no plano superestrutural pelo apagamento do
lugar que a precarização do trabalho e o aumento da superpopulação relativa
tem no processo de reprodução social. Na impossibilidade de garantir o direito
ao trabalho (postulado inexistente na sociedade regida pelo capital), seja pelas
condições que ele assume contemporaneamente, seja pelo nível de desemprego,
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
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Política de Assistência Social no contexto neoliberal: desafios da implementação do SUAS
26
ou pelas orientações macroeconômicas vigentes, o Estado capitalista amplia o
campo de ação da Assistência Social ao mesmo tempo em que limita o acesso à
saúde e à previdência social públicas (MOTA, 2008, p. 141).
Dito de outro modo, há uma nova maneira de tratar a questão
social na sociedade brasileira, focando-a enquanto objeto de programas e
ações socioassistenciais de combate à pobreza, como orienta os organismos
financeiros internacionais. A assistência social se torna, então, o principal
mecanismo de enfrentamento da questão social. Devido às mudanças no
mundo do trabalho, responsável por modificar o padrão de acumulação
capitalista e transformar em números exorbitantes a massa de trabalhadores
sem emprego, esta política é revalidada e colocada no centro da proteção
social como proposta de combate às expressões da questão social. Assim, a
parcela da população que não consegue atender suas necessidades por meio
do mercado, torna-se público-alvo da assistência social.
Portanto, nitidamente há uma expansão de programas de transferência
de renda no Brasil, inscrita no contexto das transformações econômicas,
políticas e sociais em curso, que foram responsáveis por engendrar uma
ampliação da mercantilização dos serviços sociais, caracterizando numa nova
forma de enfrentamento da questão social.
Para Pastorini e Galizia (2006), essa expansão dos programas de
transferência de renda, pautados na lógica da focalização, é uma das faces
do processo de “assistencialização” da proteção social, que tem a privatização
da previdência social, saúde e educação como par dialético no processo de
inflexão dessa relação entre as políticas permanentes de proteção social e os
programas e ações assistenciais.
Portanto, como se infere no padrão de proteção social que está
constituindo-se, esses programas passaram a receber um aumento de recursos
destinados a sua execução, enquanto as políticas permanentes (saúde e educação)
passam por estratégias diversas de privatização, redução e desresponsabilidade
do Estado, resultando no seu enfraquecimento político e social.
Neste contexto, cabe, então, destacar que o Programa Bolsa-Família é a
principal estratégia do governo Lula para combater a pobreza e a desigualdade
social. Sua proposta de unificação dos programas de transferência de renda,
inicialmente restrita à unificação de quatro programas federais: BolsaEscola, Bolsa-Alimentação, Vale-Gás e Cartão-Alimentação, foi lançada pelo
Governo Federal no dia 20 de outubro de 2003. Apresentou-se como um
programa inovador por se propor a proteger o grupo familiar como um todo
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e elevar o valor monetário do benefício, além de desconsiderar a hipótese de
diminuição da transferência monetária.
No entanto, é necessário ter em mente que junto a tal política,
precisa-se pensar em uma articulação da transferência monetária com outros
programas sociais e com uma política econômica de geração de emprego e
renda, de valorização da renda do trabalho e de desconcentração da renda e da
riqueza socialmente produzida, o que não se fará sob a orientação neoliberal
que continua marcando o desenvolvimento da economia brasileira.
Desse modo, o Bolsa Família destina-se a famílias indigentes, com renda
per capita familiar de até R$70,00 e a famílias consideradas pobres, com renda
per capita familiar de R$70,01 até R$140,00, de modo que o primeiro grupo
familiar recebe um benefício fixo de R$68,00, podendo receber mais R$22,00
por cada filho de até 15 anos de idade, no máximo de três filhos, e se tiver filhos
adolescentes de até 17 anos, sendo no máximo dois, poderá receber mais R$66,00,
podendo atingir o valor de R$200,00 por família. As famílias classificadas como
pobres recebem uma transferência monetária variável de até R$66,00, sendo
R$22,00 por cada filho de até 15 anos de idade, podendo receber mais R$ 66,00
do benefício variável vinculado ao adolescente. Portanto, o valor total do Programa
Bolsa Família pode variar de R$ 22,00 a R$ 200,00, sendo que as famílias têm toda
liberdade na aplicação do dinheiro recebido. A unidade beneficiária do Programa é
o grupo familiar, preferencialmente representado pela mãe.
Nota-se que a fixação da linha de pobreza reduziu de meio salário mínimo
per capita para um valor entre R$70,00 e R$140,00. Essa desvinculação da
referência ao salário mínimo pode acarretar uma crescente desvalorização
do valor adotado para classificação da indigência e da pobreza. Sendo assim,
devido à ênfase dada nas relações de mercado, o reconhecimento da pobreza
passou a ser representado por uma noção minimalista, resumindo-se apenas
na averiguação da renda familiar, objetando seu entendimento como aspecto
essencialmente estrutural, complexo e multidimensional (SILVA; YAZBEK;
GIOVANNI, 2004; SILVA, 2008).
O corte de renda proposto, não representa nem de longe o número real
de pobres que existem no país, e promove uma eleição dos mais pobres entre os
pobres, estipulado por uma chamada linha de pobreza que compara os pobres,
discriminando os que são miseráveis e os que são considerados pobres. Para
Yazbek (2004) esse corte do público beneficiário pela linha de pobreza tem
conotação discriminativa e fragmentada, levando a uma exclusão de famílias e
pessoas que também estão em condições de pobreza e vulnerabilidade.
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
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Política de Assistência Social no contexto neoliberal: desafios da implementação do SUAS
28
Dito de outro modo, a linha de pobreza estipulada pelo Bolsa Família
representa uma maneira de reduzir o número real de pobres, visto que definese como critério de acesso um corte de renda minimalista que visa atender
prioritariamente àquelas pessoas em condições de extremas carências. Por
isso, os critérios de elegibilidade do Programa utilizam-se dos famosos testes
de meios para classificar a população pobre, forçando-a a comprovar sua
pobreza para ter acesso a esse tipo de assistência do Estado.
Pereira (1998) afirma que esta estratégia é marcada por um vício
do passado na política de assistência social, quando houve a incorporação
do princípio de menor elegibilidade criado no século XIX pelos liberais.
Para tanto, de acordo com este princípio, a prestação de um serviço ou o
acesso a um benefício guia-se por uma “linha achatadíssima de pobreza”,
primando pela focalização extrema e reduzindo a demanda ao benefício,
impossibilitando, então, o acesso dos assalariados pobres a ele.
Portanto, constata-se que os maiores limites quanto a esta política de
assistência social pautada nos programas de transferência de renda caracterizados
acima são: o baixo montante das transferências monetárias a famílias vivendo em
extrema pobreza; a fragmentação de programas de iniciativa municipal, estadual
e federal; a não vigência destes programas com uma política macroeconômica de
distribuição de riqueza socialmente produzida9 e de geração de emprego e renda
faz com que esses programas cumpram uma função meramente compensatória.
Assim, “os programas de transferência de renda precisam ser, sobretudo,
articulados a uma política econômica superadora do modelo de concentração
de renda e desvinculada de um esforço de geração de emprego e renda adotada
ao longo da história brasileira” (SILVA; YAZBEK; GIOVANNI, 2004: 216).
Além disso, deve-se considerar também a articulação dessa política
com as demais políticas sociais básicas (saúde, trabalho, educação), o que
na maioria dos casos, não ocorre. Para que esse quadro possa ser revertido,
devem-se apresentar propostas que priorizem e democratizem os programas
e serviços sociais básicos, o que significa alterar o quadro conjuntural
contemporâneo, dando lugar a uma política de crescimento econômico, de
geração de emprego e de distribuição de renda.
Assim, no quadro de crescimento econômico, ainda reduzido,
precarização e instabilidade do trabalho, desemprego, rebaixamento do valor
9
(...) há de se considerar que a causa fundamental da pobreza no Brasil é a
desigualdade na distribuição da renda e da riqueza socialmente produzida mais do
que a incapacidade de geração de renda (SILVA et alii, 2004: 202).
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da renda e do trabalho, não enfrentamento das causas da desigualdade, frutos
do ajuste econômico preconizado pelo ideário neoliberal, a grande questão
que se coloca é: quais as potencialidades da Política Nacional de Assistência
Social? Quais seus principais entraves e consequências? São estas questões a
serem abordadas nas próximas seções.
3 Contratendências da Política de
Assistência Social do Governo Lula
Apesar da política de assistência social do Governo Lula se estruturar
como contraface da política econômica neoliberal implementada, não
podemos perder de vista que o processo de assistencialização, no que se
refere à expansão da política de assistência social, permitiu que forças
democráticas interviessem nesse contexto e elaborassem uma proposta que
incorporava elementos democráticos previstos na Constituição Federal de
1988 (CF-1988) e na Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS).
Nesse sentido, consideramos que os aspectos mais significativos
implementados pelo Governo Lula no campo da assistência social foram:
o fim do Programa Comunidade Solidária e a rearticulação do Conselho
Nacional de Assistência Social; a unificação dos programas de transferência
de renda no denominado Bolsa Família, que em maio de 2006 “estava
implantado em 99,9% dos municípios brasileiros, beneficiando 11,118
milhões de famílias, atingindo, portanto, quase 47 milhões de brasileiros”
(MARQUES; MENDES, 2007, p. 20); a centralização das ações da
política de assistência social no Ministério de Desenvolvimento Social
e Combate à Fome; e, por fim, a aprovação da Política Nacional de
Assistência Social (PNAS), em setembro de 2004, consubstanciando as
diretrizes da IV Conferência de Assistência Social (PNAS), que teve como
principal deliberação a implementação do Sistema Único de Assistência
Social (SUAS).
Conforme destacam Almeida et alli (2008, p. 69):
Sem dúvida alguma, estes avanços foram conquistados pela luta infatigável
das organizações democráticas da sociedade civil - que, desde a era FHC, vêm
criticando a condução da política de assistência social -, aliada às ações de
gestores [...] que se encontravam comprometidos com a implementação da
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
29
Política de Assistência Social no contexto neoliberal: desafios da implementação do SUAS
30
LOAS e não com o desenvolvimento de uma política focalista, fragmentada e
“filantropizada”, características típicas da orientação no período 1994-2002.
Desses aspectos que consideramos efetivos avanços na área da
assistência social, sem dúvida alguma, a PNAS, na perspectiva do SUAS e,
em seguida, a aprovação de suas normas operacionais básicas (NOB-SUAS
e NOB-RH), realizadas após um amplo processo de debate, via conselhos,
definindo, como destaca Sposati (2006), uma nova ordenação da gestão da
assistência social como política pública, configuram-se como a expressão
mais avançada da política de assistência social hoje em voga.
O SUAS implanta uma lógica de organização das ações sócioassistenciais.
Seu foco de atendimento é a família, seus membros e indivíduos em seu
território de organização. Além disso, ele é estruturado, de acordo com a
complexidade, em serviços de proteção social básica ou especial.
Os serviços de proteção social especial têm como função prioritária
proteger as famílias, seus membros e indivíduos onde seus direitos
fundamentais se encontrem violados, mantendo, ou não, os vínculos e/ou
laços de pertencimento.
Já os serviços de proteção social básica têm como função prioritária
[...] promover atenção às situações de vulnerabilidade apresentadas e prevenir
situações de potencial risco pessoal ou social, contribuindo para a inclusão
social e a autonomia das famílias, seus membros e indivíduos, bem como
para a redução dos índices de eventos (BRASIL, 2004, p. 12).
O equipamento que organiza, coordena e executa os serviços de
proteção social básica da política de assistência social é o Centro de Referência
da Assistência Social – CRAS.
Conforme destaca Sposati (2006), o SUAS reforça alguns preceitos
contidos na LOAS, tais como: universalização do sistema com fixação
de níveis básicos; territorialização de rede de assistência social, através da
oferta de serviços baseada na proximidade e necessidades locais; além da
descentralização político-administrativa com comando único. Em suas
diretrizes de implementação, o referido sistema padroniza os serviços
(nomenclatura, conteúdo, padrão de funcionamento), define e reconhece a
competência de cada ente federado (co-gestão das ações), integra os objetivos,
ações, serviços, benefícios, programas e projetos por meio de organização
em rede; substitui o paradigma assistencialista pelo de proteção social;
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estabelece pisos de financiamento para proteção social básica e especial; além
de respeitar a transferência via fundos, com aplicação autônoma de recursos
nos municípios.
A PNAS aponta ainda alguns instrumentos democratizadores de
gestão, como o caráter democrático da constituição e avaliação do plano;
o caráter democrático de construção, aprovação e gestão do orçamento,
a publicização da informação; a proporcionalidade de recursos no
fundo e no órgão gestor da função programática 8 (assistência social);
a dispersão/concentração dos recursos desta função entre os órgãos que
compõem a gestão municipal ou estadual e o exercício do comando
único por órgão gestor.
A tecnologia de informação constituída pela Rede SUAS também é
um dos avanços advindos com a atual PNAS, pois nos possibilita fazer uma
leitura das ações federais na área de assistência social, até então inexistente,
permitindo uma melhor apreensão a respeito de sua gerência.
A PNAS, ao destacar a participação da sociedade civil tanto na
execução dos programas através das entidades beneficentes e de assistência
social, como na participação, formulação e controle das ações em todos os
níveis, reforça que a perspectiva democrática, com centralidade no papel do
Estado, deve orientar a relação entre o poder público e as organizações da
sociedade civil que atuam no campo da assistência, evitando a manutenção
de uma articulação de cunho neoliberal que promove a desresponsabilização
do Estado na área social.
No entanto, como verificamos na seção anterior, a pedra angular da
política de assistência social do governo Lula é a política de transferência de
renda, principalmente a desenvolvida através do Programa Bolsa Família, que
apesar de ter tido o mérito de unificar e racionalizar as ações dispersas nessa
área o fez a partir de uma orientação tipicamente focalista, conformando um
conteúdo classicamente neoliberal.
Nesse sentido, se por um lado a PNAS/SUAS representa um
avanço democrático da concepção e do desenho institucional para a
operacionalização da política de assistência social brasileira, por outro lado,
esse avanço está subordinado à lógica neoliberal da política econômica e da
estrutura efetiva da política de assistência social do Governo Lula. Dessa
forma, a PNAS/SUAS não possui condições objetivas para sua efetivação,
podendo, inclusive, servir à proposta antagônica de política de assistência
social, fundada na perspectiva neoliberal. Analisar esse processo é tarefa da
última seção do presente trabalho.
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31
Política de Assistência Social no contexto neoliberal: desafios da implementação do SUAS
32
4 Contradições e Adversidades na
implementação do SUAS
Como vimos anteriormente, os gastos com a política de assistência
social revelam a consolidação da tendência da mesma constituir-se
predominantemente nos programas de transferência de renda. Segundo
dados apresentados por Behring (2009), entre 2006 e 2008, dos recursos do
MDS, aproximadamente 90% foram destinados a esses programas.
Se levarmos em conta, a partir dos dados orçamentários já
explicitados, que o Programa Bolsa-Família atende a 13 milhões de famílias
aproximadamente. Considerando que cada família seja constituída por
cerca de quatro pessoas e que este público (52 milhões de pessoas) será
atendido nos Centros de Referência de Assistência Social - CRAS, somado
ao fato de que a verba disponibilizada para a implantação do SUAS é
cerca de R$3.177.100.02310, teremos um valor em torno de R$61,00 para
atendimento per capta por ano. Ou seja, cerca de R$5,00 per capta/mês para
implementação do SUAS. O que ratifica a informação da então Secretária
Nacional de Assistência Social11 de que a cobertura do SUAS significa,
apenas, 5% da cobertura atingida pelo programa bolsa família.
Nesse sentido, a PNAS/SUAS pode reforçar a tendência de
assistencialização e re-filantropização da assistência social.
Assim sendo, consideramos que a expressão da assistencialização
das políticas sociais no campo assistencial realiza-se através dos Programas
de Transferência de Renda, em especial do Programa Bolsa Família. Ou
seja, a PNAS/SUAS sofre os mesmos constrangimentos relacionados à
assistencialização e privatização que as demais políticas sociais sofrem,
podendo, inclusive, servir a uma proposta antagônica à sua concepção.
Até o presente momento, pode-se constatar que historicamente a
assistência social foi marcada por características como: assistencialismo,
Dado obtido a partir do cálculo da verba total destinada ao MDS/FNAS em 2010
de acordo com a Lei Orçamentária Anual (LOA, nº 12.214/2010) (Disponível em:
http://www.planejamento.gov.br/secretarias/upload/Legislacao/Leis/100126_
lei_12214.pdf ) que, somados, dão um montante de R$38.926.287.018, sendo que
cerca 91,6% deste montante (R$35.749.187.195) destinam-se aos Programas de
Transferência de Renda. Assim, supõe-se que o restante, 8,4% dos recursos, sejam
destinados a todos os programas sociais e à implementação do SUAS.
Palestra proferida na FSS/UFJF.
10
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filantropia, descontinuidade, pulverização, financiamento ineficiente,
inexistência de critérios impessoais e racionais, com gestão e controle
fragmentados etc (MESTRINER, 2001; OLIVEIRA, 2003).
A partir da regulamentação da Lei Orgânica de Assistência Social,
algumas concepções ganharam relevância no debate acerca dessa política,
tais como: a prioridade no atendimento, universalidade, definição de
fontes, critérios de aplicação de recursos, descentralização, controle,
dentre outros.
O Sistema Único de Assistência Social (SUAS) é o responsável, na
atualidade, pela articulação em todo território nacional das responsabilidades,
vínculos e hierarquia do sistema de serviços, benefícios e ações de assistência
social, de caráter permanente ou eventual, executados e providos por pessoas
jurídicas de direito público sob critério de universalidade e de ação em rede
hierarquizada e em articulação com iniciativas da sociedade civil.
No entanto, as condições objetivas para a implementação do
SUAS estão postas: prioridade ao pagamento dos juros e serviços da
dívida, com elevação do superávit primário; foco no controle da inflação
(conseguido através do aumento dos juros); redução dos gastos públicos
da área social; pouco investimento em infraestrutura, saneamento
básico, saúde, educação; programas sociais altamente focalizados e
excludentes; altas taxas de desemprego; índices elevados de violências;
dentre tantos outros fatores.
Então, levando-se em consideração este conjunto de dados, quais as
principais consequências para a implementação da PNAS/SUAS? E qual seu
significado para o desenvolvimento da política pública de assistência social?
Em primeiro lugar, cabe destacar que sendo a preocupação estrutural
da PNAS/SUAS a sustentabilidade da família para que ela possa “prevenir,
proteger, promover e incluir seus membros”, a política econômica atual vai
de encontro a esta formulação, na medida em que seu foco privilegiado tem
sido a manutenção da hegemonia do capital financeiro expressa através da
política macroeconômica de elevação de juros, câmbio flutuante e controle
inflacionário ortodoxo, não priorizando a geração estrutural de emprego e
renda, numa perspectiva de distribuição de riqueza. Conforme destacam
Almeida, Giambiagi e Pessoa (2008, p. 73)
Garantir a sustentabilidade da família é o grande desafio para a implantação e
consolidação do SUAS. No entanto, esta garantia não depende da política de
assistência, mas, sim, das condições econômicas que possam vir a possibilitar
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
33
Política de Assistência Social no contexto neoliberal: desafios da implementação do SUAS
34
ou não a sustentabilidade dessas famílias. Uma política econômica que
não privilegia essa sustentabilidade para que a família tenha condições de
desempenhar suas funções, impõe limites para a efetividade da Política de
Assistência Social. Este é o quadro atual.
Nesse quadro, onde não se efetiva a sustentabilidade da família
para viabilizar a proteção de seus entes e os recursos para os serviços
socioassistenciais são extremamente restritos, a tendência é de se desenvolver
no país, a partir da estruturação dos Centros de Referência de Assistência
Social, uma dinâmica de política social que a literatura tem descrito como
“pluralismo de bem-estar”.
Segundo Abrahamson (2004, p. 111), pluralismo de bem-estar ou
economia mista de bem-estar consiste em um novo consenso em torno da
política social alcançado na maioria da Europa e na sociedade moderna.
Pereira (2004, p. 136-137) sintetiza com propriedade a configuração desse
sistema: “em vez da prevalência de relações hierárquicas, em que o Estado
assumia o protagonismo, seriam instituídas relações horizontais em que esse
Estado passaria a fazer parte de um esquema plural ou misto na condição de
co-responsável ou parceiro”.
O pluralismo de bem-estar expressa, na verdade, o processo de
desresponsabilização do Estado que tem ocorrido na área social. Conforme
desenvolvem diferentes analistas, o pluralismo “é tratado como modo
específico de implementação da privatização de medidas de bem-estar público,
antes estabelecidas, com efeitos negativos em termos de redistribuição e
qualidade” (ABRAHAMSON, 2004, p. 112).
Ou seja, no pluralismo de bem-estar, o Estado tem um menor
domínio da política social, reduzindo seu papel e incentivando outros
setores para o provimento da política. Com isso, a responsabilidade pelo
bem-estar é dividida em quatro setores-chave: o informal, que é entendido
pelos pluralistas como o setor que provê “assistência por parte dos grupos
primários de pertença dos indivíduos, como a família, os amigos próximos
e os vizinhos”); o voluntário, que se distingue do informal pelo fato de
“apresentar maior organização e formalidade, embora não seja homogêneo”;
o comercial ou mercantil, que “é o único lócus onde todos podem livremente
expressar suas preferências na condição de consumidores”; e o oficial, que
é “identificado com o Estado, ou mais especificamente com os governos
(PEREIRA, 2004, p. 139-140).
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No quadro de restrições de recursos para a implementação/expansão
dos serviços previstos na PNAS, porém, com a pressão para os municípios
constituírem os Centros de Referência de Assistência Social, visando estruturar
a “porta de entrada” do sistema e mapear os diferentes tipos de serviços
existentes na territorialidade de sua abrangência, podemos vislumbrar que
os profissionais localizados no CRAS terão conhecimento da gama de ações
“informais” e “voluntárias” que, na ausência de serviços “oficiais”, servirão
para atender as demandas que chegarão ao sistema de assistência social.
Dessa forma, a ausência de retaguarda institucional de serviços de
assistência social possibilita a estruturação do “pluralismo de bem-estar”, na
medida em que serão incorporadas a rede informal e a rede voluntária como
provedores de serviços.
Essa situação ratificará a precariedade da infraestrutura dos serviços
de assistência social e manterá a precariedade das condições de trabalho dos
profissionais da área.
Assim, a política de assistência social segue cada vez mais para o
caminho do pluralismo de bem-estar. O Estado faz parcerias com outros
setores para atender as necessidades dos seus usuários, na medida em que
ocorre uma prioridade de investimento nas políticas de transferência de
renda e, por conseguinte, um insignificante financiamento no restante da
política de assistência.
A focalização é outro fator preocupante da política de assistência
social na atualidade, uma vez que o público alvo do atendimento deve estar
dentro dos critérios de vulnerabilidade apresentados na NOB/SUAS. Esses
critérios podem levar a política de assistência social a ser minimalista, onde
são atendidos apenas os que se encontram em situação de extrema pobreza,
o que seria um retrocesso da assistência e não um avanço (FILGUEIRAS;
GONÇALVES, 2007).
Ademais, o público alvo prioritário de atendimento são aquelas famílias
que pertencem ao Programa Bolsa Família e/ou ao BPC. E, como se viu, estes
programas apresentam critérios de elegibilidade restritos e focalizados. Isso faz
com que se elejam os mais pobres dos pobres para serem atendidos, colocando
aqueles “quase-pobres”, ou pouco pobres, fora da proteção social, o que pode
acabar fazendo com que mais adiante esse grupo venha a trocar de papéis
com os que foram atendidos, tornando a política social cada vez mais perversa
(THEODORO; DELGADO apud DRUCK; FILGUEIRAS, 2007, p. 33).
Outra questão que merece destaque diz respeito ao foco do atendimento
na família, pois as políticas sociais sempre foram desenvolvidas de forma
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
35
Política de Assistência Social no contexto neoliberal: desafios da implementação do SUAS
36
setorizada: criança, adolescente, adulto, idoso etc. Embora esse foco possa
ser considerado um avanço, na perspectiva da não fragmentação da política,
temos que atentar para a seguinte questão:
[...] se essa centralidade da família vem ao encontro da perspectiva neoliberal
de elegê-la para que essa possa assumir o papel de provedora do bem-estar
de seus membros, como fonte privada de proteção social, ao mesmo tempo
em que se constitui como instrumento de controle social, ou se vem dentro
da perspectiva de estruturação das ações a partir da ótica da articulação e
integração das políticas públicas (CAVALCANTI, 2007, p. 66).
Deve-se alertar também para o modo como a família está sendo focada
nesses programas, se estão considerando as particularidades de cada grupo
familiar, viabilizando igualdade de acesso aos benefícios das políticas públicas
a todos os cidadãos. Já que o que se tem visto nos programas são ofertas de
pacote de serviços e benefícios pré-estabelecidos que são implantados por
todo país sem levar em consideração “as diferenças regionais, locais e as
reais necessidades dos diferentes grupos familiares e que dependem ainda
da capacidade instalada em cada localidade para garantir de fato a oferta dos
serviços e benefícios previamente propostos” (CAVALCANTI, 2007, p. 67).
Alguns organismos internacionais, como ressalta Mioto (2004, p. 44),
destacam a necessidade da importância da família como um lugar onde o
indivíduo busca condições materiais de vida, de pertencimento na sociedade,
de construção de identidade etc. Diante de tal perspectiva, percebe-se que foi
instaurada uma cultura “assistencialista no âmbito das políticas e dos serviços
destinados a dar sustentabilidade à família como unidade”, em que tais
políticas se fundam na premissa da existência de dois canais para satisfação
das necessidades dos cidadãos: o mercado (via trabalho) e a família. Somente
quando esses canais falham é que o Estado intervém.
Na medida em que for reforçada a concepção de que a família deve assumir
provimento de bem-estar em detrimento de uma estrutura pública-estatal, estará
sendo fortalecido o setor “informal” do “pluralismo de bem-estar”.
A diretriz que utiliza a PNAS/2004 com centralidade na família para
concepção e implementação de projetos, serviços e benefícios, visando
através da assistência social garantir a convivência familiar e comunitária,
pode, portanto, convergir com a desresponsabilização do Estado conforme a
estratégia do pluralismo de bem-estar.
Embora, como acima apontado, possa ser considerado um avanço a
perspectiva matricial da família presente na política de assistência social, é
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importante destacar que sua incorporação não está alheia a projetos distintos
de proteção social, e mesmo societário. Por isso, a NOB/SUAS, diante das
condições objetivas postas pela dinâmica socioeconômica brasileira, ao
incorporar a família como primazia das ações da assistência social parte de
uma concepção “familista” coerente com o modelo neoliberal (CAMPOS;
MIOTO, 2003).
Portanto, cria-se uma expectativa da capacidade protetora da família
com caráter substitutivo e decisivo para acesso aos direitos sociais em lugar
da obrigação do Estado. Diante do ocultamento dos determinantes sóciohistóricos, das determinações da contradição de classe, e das expressões da
desigualdade na demanda da assistência social, a atenção à família, de certa
forma, passa a ser entendida como uma via de superação das expressões da
questão social, podendo despolitizar o debate sobre as categorias centrais do
capitalismo (TEIXEIRA, 2009).
Portanto, como demonstrado neste trabalho, infere-se que o pouco
investimento nos serviços deixa o atendimento social às famílias dependente
do trabalho voluntário e do setor informal do pluralismo de bem-estar, como
já destacado. Tal fato ratifica o caráter privatista, coerente com a estratégia da
assistencialização, da proteção social brasileira.
Por este prisma, como concluiu Paiva et al. (2009), essa matricialidade
sociofamiliar, formulada de maneira quase mágica na política de assistência
social brasileira busca reconhecer o grupo familiar como referência afetiva
e moral. No entanto, extrai as relações sociais do contexto histórico,
contraditório e dialético no qual se inserem os sujeitos, e resulta num
comportamento conservador da política social, que deve servir para trabalhar
a conduta das famílias.
Assim sendo, para que se constitua uma política social que fortaleça a
família, é necessário que se ofereça serviços sociais universais, em quantidade
e qualidade, sistemáticos e continuados, que garantam direitos. Isso requer
uma requalificação dos recursos dirigidos à oferta dos serviços propostos pela
política de assistência social.
Portanto, a família deve ser focada no sentido do potencial que ela
apresenta na “construção de um sistema de proteção social propriamente dito
e para que a assistência, em particular, possa assumir efetivamente seu caráter
transversal e sua função agregadora às demais políticas sociais” (CAVALCANTI,
2007, p. 69) e não como forma de desresponsabilizar o Estado, tornando a
proteção social privada e/ou de responsabilidade exclusiva da família.
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
37
Política de Assistência Social no contexto neoliberal: desafios da implementação do SUAS
38
Outro desafio na implementação do SUAS está calcado na cultura
política do país fortemente centralizadora, confirmada pela NOB/2005. Em
outros termos, uma restrição para a implementação efetiva do SUAS está
na invasão da autonomia dos entes federados representados pelos estados
e municípios, devido ao caráter centralizador na proposta do SUAS ao
recomendar uma padronização e regulação dos serviços socioassistenciais em
todo o território nacional sem favorecer o pacto federativo na direção de
uma gestão pautada na autonomia partilhada entre as esferas do governo.
Portanto, as ações propostas pelo SUAS constituem relações
hierarquizadas, cuja finalização da política fica restrita ao âmbito municipal.
Isso impede a real descentralização e municipalização da política de assistência
social, conduzindo os municípios a, na prática, não conseguir converter os
programas e recursos federais em políticas municipais de acordo com as
prioridades e demandas locais. Portanto, o SUAS com sua normatização
atual não oferece condições para inovação na cultura política centralizadora
do país com vistas ao protagonismo dos entes federados.
Por isso, o papel dos estados acaba sendo esvaziado na sua
responsabilidade social, se tornando segundo plano no SUAS. Conforme
Carvalho (2006), sem uma explicitação do papel do estado na condução da
política de assistência social não há descentralização, nem fortalecimento
do pacto federativo. Por isso, ao estado é delegado funções secundárias que
ora assume o papel de operar serviços de alta complexidade, ora atua apenas
como capacitador de recursos humanos.
Outra dimensão a ser destacada em relação à efetivação da PNAS/
SUAS numa perspectiva democrática, refere-se, conforme Sposati (2006, p.
115) sublinha, à exigência de requisitos que o ingresso da assistência social
na condição de política pública demanda:
•
•
•
•
ser planejada – o que exige o conhecimento prévio da realidade
através da função de vigilância social, conhecendo demandas e
necessidades, construindo metas;
ser orçamentada – o que supõe o desenvolvimento da tecnologia de
orçamentação na assistência social o que é muito mais do que definir
percentuais de gastos anuais;
dispor de um quadro de trabalhadores permanentes e capacitados
para o exercício de suas funções;
desenvolver tecnologia de gestão democrática e participativa;
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•
ser avaliada – o que indica a necessidade da discussão dos resultados
e de seus indicadores, o que é muito mais do que constatar o número
de atendimentos dia, mês ou ano sem avaliação do conteúdo desses
atendimentos e da qualidade de respostas que contêm.
No entanto, cabe ressaltar que para a implementação da política
de assistência social publica e democrática, o principal empecilho a ser
enfrentado é a política econômica desfavorável ao financiamento das políticas
sociais, na medida em que prioriza o pagamento de juros da dívida visando
o atendimento das necessidades do capital financeiro.
Podemos concluir que a busca pela efetivação e a reafirmação da
assistência social como política pública de responsabilidade estatal e direito de
cidadania é um dos desafios a ser enfrentado para o processo de democratização.
Neste aspecto, faz--se essencial a retomada do papel dos movimentos sociais e
da participação das organizações democráticas da sociedade civil na luta pela
defesa da democracia e da cidadania, de uma forma geral, e, especificamente,
no campo da defesa de políticas sociais públicas universalistas, se se pretende
algum avanço democrático neste cenário.
5Conclusão
Conforme vimos, se por um lado a PNAS/SUAS representa um
avanço democrático da concepção e do desenho institucional para a
operacionalização da política de assistência social brasileira, por outro lado,
esse avanço está subordinado à lógica neoliberal da política econômica e da
estrutura efetiva da política de assistência social do Governo Lula, baseada
nos programas de transferência de renda. Dessa forma, a PNAS/SUAS não
possui condições objetivas para sua efetivação.
Assim sendo, consideramos que a expressão da assistencialização das
políticas sociais realiza-se através do Programa Bolsa Família.
Nesse quadro, a implementação do SUAS nos estados/municípios
pode, de forma geral, caminhar em, pelo menos, dois sentidos, opostos entre
si: reforço da dimensão democrática prevista na PNAS/SUAS ou, então,
seguir como estratégia de controle e fiscalização dos critérios de elegibilidade
e das condicionalidades previstas no PBF e consolidar o “pluralismo de bemestar” na área, reiterando a assistencialização da assistência social. Tanto uma
possibilidade quanto a outra sofrerão com a ausência de recursos, ratificando
a precarização da política de assistência social.
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
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Política de Assistência Social no contexto neoliberal: desafios da implementação do SUAS
40
Podemos, então, afirmar sintetizamente, que os desafios para a
efetivação do SUAS se apresentam em três principais dimensões: a) combinar
a luta imediata de implementação do SUAS (consolidação do desenho e
expansão dos serviços) com a luta por uma política econômica voltada para
o desenvolvimento econômico com distribuição de renda e riqueza (luta a
ser desencadeada na sociedade civil e nos espaços públicos; conferências,
conselhos...); b) qualificar, do ponto de vista técnico e político os atores para
enfrentar o desafio da luta pela implementação SUAS, através do reforço
de seus aspectos democráticos; e, por fim, mas não menos importante, c)
criar metodologias de trabalho socioassistencial, conforme destaca Paiva
(2006), que promovam a efetiva participação da população no campo da
assistência, especificamente, mas que propicie o engajamento da população
na luta política mais ampla. Só assim poderemos contribuir para que a
implementação da PNAS/SUAS caminhe na perspectiva de seu desenho
democrático e numa efetiva política redistributiva.
Nesse quadro, o processo social, político e cultural de implementação
do SUAS nos municípios, a gestão pública efetivada e a intervenção do
assistente social nesse contexto, passam a ter um grande significado na medida
em que, dependendo das condições existentes e da orientação desenvolvida
na intervenção social, pode-se tensionar a implementação da política de
assistência social no sentido de contribuir com a luta pela ampliação das
condições para que ela se efetive no sentido democrático preconizado pelos
parâmetros presentes na PNAS/2004.
Assim, a questão que se coloca é: quais as potencialidades da
implementação do SUAS nos municípios em termos de sua gestão, da
mobilização das organizações da sociedade civil e da intervenção profissional
do assistente social? São estas questões que serão abordadas nas próximas seções.
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Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Capítulo 2
Gestão do SUAS em Juiz de
Fora: análise da estrutura
burocrática
Rodrigo de Souza Filho1
Ester de Almeida Oliveira2
1 AperspectivadeanálisedaGestãoPública
1.1Introdução
Partimos da proposição de que no sistema capitalista, para atender à
satisfação da população numa perspectiva de ampliação de direitos sociais,
necessita-se da intervenção do Estado para implementar políticas sociais.
A mediação entre a intervenção do Estado e a implementação de políticas
sociais é realizada pela estrutura administrativa. Assim, a administração
pública, para implementar políticas públicas, no geral, e políticas sociais,
especificamente, orientadas para a finalidade de ampliação de direitos,
necessita estar estruturada de forma adequada para atingir o fim proposto.
Professor Adjunto da Faculdade de Serviço Social/UFJF, Doutor em Serviço Social/UFRJ
Graduanda em Serviço Social/UFJF, Bolsista de Iniciação Científica.
1
2
Gestão do SUAS em Juiz de Fora: análise da estrutura burocrática
46
Portanto, considerando essa perspectiva, cabe indicar que a
possibilidade de pensarmos a ampliação de direitos sociais, via políticas
sociais, inserida no processo de acúmulo de forças para construção de uma
sociedade emancipada, implica, também, a possibilidade de concebermos a
questão da administração de tais políticas no campo do fortalecimento do
processo de democratização.
Dessa forma, partimos da concepção que para desenvolver uma “gestão
pública” voltada para efetivar a expansão de direitos sociais, apesar de não
ser suficiente, não podemos prescindir de um Estado forte na área social e
burocracia estruturada, principalmente na dimensão de sua racionalidade
(SOUZA FILHO, 2011).
No entanto, a estruturação de um Estado com fim voltado para a
universalização de direitos e, em consequência, uma ordem administrativa
burocrática que efetive essa finalidade, depende da existência, na sociedade,
de uma hegemonia nessa direção.
Sendo assim, em última instância, as determinações para uma efetiva
reforma democrática da administração estão localizadas no tipo de formação
social do capitalismo brasileiro e em nossa estrutura de dominação, portanto,
não serão medidas técnicas que irão transformar a ordem administrativa
brasileira. E, na medida em que não foi gestada uma saída democrática para
a crise dos anos 1980, a reforma administrativa sofre os constrangimentos da
opção neoliberal da política econômica e social adotada a partir da década de
1990. Assim, a possibilidade de atuação, visando mudanças administrativas
numa perspectiva democrática, restringe-se.
Antes de concluirmos a perspectiva de análise proposta, convém
explicitarmos, brevemente, como interpretamos a dinâmica de
desenvolvimento da administração pública brasileira.
1.2 Gênese e desenvolvimento da administração
pública brasileira
O patrimonialismo, a partir da origem ibérica e centralizadora
(FAORO, 2004), combina-se com a estrutura “patriarcal” colonial (PRADO
JÚNIOR, 1981), fortalecendo essa lógica de dominação tanto a partir da
superestrutura estatal, quanto da organização do poder local. A neófita
burocracia brasileira será desenvolvida a partir da necessidade de especialização
e racionalidade instrumental capitalista, porém, evitando a impessoalidade
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Rodrigo de Souza Filho | Ester de Almeida Oliveira
como critério para a composição de seus quadros, reforçando, dessa feita, a
lógica patrimonialista de recrutamento baseada na lealdade pessoal.
Esse amálgama é consolidado na República Velha, através da
organização política descentralizada e da ausência de participação das classes
subalternas na estrutura de poder, para viabilizar o projeto nacional da
economia agroexportadora capitalista, conduzido pelas oligarquias agrárias,
sob hegemonia da oligarquia cafeeira paulista.
Esse é o cenário que se inicia na Independência, consolida-se com a
Proclamação da República e encontra seu esgotamento no final da República
Velha, quando entra em crise a economia exportadora capitalista e a
hegemonia da oligarquia cafeeira, o que projeta um novo objetivo político: a
industrialização e urbanização do país.
Assim sendo, no contexto do projeto desenvolvimentista de expansão
capitalista, Fiori (1995, p. 27) apresenta uma síntese consistente sobre o
ordenamento estatal e sua ordem administrativa: O Estado, mormente o seu setor produtivo e financeiro, estabelece
uma relação corporativa com o empresariado nacional, protegendo seu lucro
relativo, aumentando o potencial de acumulação e absorvendo o custo desta
expansão. A administração pública, através de suas agências previdenciárias e
múltiplas instâncias administrativas, dispensa serviços sociais e cria vínculos
empregatícios absorvendo, na dinâmica estatal, parcelas cada vez maiores da
população economicamente ativa. Com a negociação salarial dos pólos mais
dinâmicos da indústria, processava-se, de forma individualizada em acordos
de empresas, os conflitos salariais e redistributivos, que perdiam seu potencial
político; ou melhor: tinham limitado o potencial de difusão, o que, por
sua vez, permitia que as atividades de bem-estar do Estado se processassem
clientelisticamente, embora sem o vigor das negociações corporativas.
Para completar esse quadro, lembremos que o projeto de expansão
capitalista, de sua fase restringida até a consolidação monopólica, orientou-se
sob o signo da “dupla articulação” (FERNANDES, 1981) e da incorporação
seletiva e parcial das camadas populares. Portanto, a relação arcaico-moderno aparece também na configuração
do Estado brasileiro e da sua direção política, assim como na estruturação de
sua máquina estatal.
Sendo assim, a configuração do Estado e de sua máquina pública vão
expressar essa hegemonia. Do ponto de vista do Estado, as classes dominantes
(agrário e industrial) garantirão a reprodução da ordem, incorporando
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
47
Gestão do SUAS em Juiz de Fora: análise da estrutura burocrática
48
setores populares de acordo com a pressão existente e com a importância
para a acumulação.
Para implementar as ações do Estado, combinam-se, dessa forma,
elementos “novos” (burocráticos) e “arcaicos” (patrimonialistas) como
forma de garantir a estrutura de dominação existente. Portanto, a
ordem administrativa é composta de uma imbricação entre a dimensão
patrimonialista e a burocrática que, dialeticamente, são funcionais, do ponto
de vista estrutural, para a operação de dominação presente.
Por um lado, é necessário planejar a industrialização desde sua fase
restringida até a consolidação monopólica. Para isso, necessita-se de um
quadro administrativo especializado e profissional, assim como certas regras
e normas bem definidas, ou seja, necessita-se de burocracia.
No entanto, esse planejamento deve garantir a manutenção da
concentração de renda, propriedade e poder das elites dominantes, por isso
essa burocracia deve criar canais de comunicação com as elites empresariais.
Tal planejamento, portanto, não deve incorporar, substantivamente, os
interesses das classes trabalhadoras.
Simultaneamente a esses mecanismos, a máquina estatal também
abrigará um espaço para a continuidade da influência da elite tradicional
nas diferentes questões a serem debatidas e na garantia da reprodução de
sua fatia de domínio político. Dessa maneira, a lógica patrimonialista se
apresenta como necessária – todavia deixando de ser hegemônica - para a
manutenção da estrutura de dominação da sociedade brasileira.
Desse modo, o patrimonialismo não se apresenta como um elemento
de atraso que deve ser superado para o desenvolvimento do país. Ele é uma
determinação central do nosso modelo de desenvolvimento capitalista, não sendo
um obstáculo para tal.
A lógica dialética de Oliveira (2003) e Cardoso de Mello (1998)
ajudam a desvelar a não dualidade da ordem administrativa. Patrimonialismo
e burocracia se imbricam como estruturas de poder e estilos de dominação
necessários para a particularidade do desenvolvimento capitalista brasileiro.
A manutenção do processo de relações de produção não-capitalista (na
agricultura e no setor terciário) se desenvolve sob uma estrutura de poder
tradicional que exige uma ordem administrativa tradicional não-capitalista,
ou seja, patrimonialista. No entanto, como a manutenção dessas relações
de produção são necessárias para a acumulação capitalista brasileira, a
estrutura global de poder deve incorporar as classes dominantes tradicionais.
O Estado, então, ao expressar essa coalizão de classes para conduzir a
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Rodrigo de Souza Filho | Ester de Almeida Oliveira
expansão e consolidação capitalista, precisa contemplar os diferentes tipos
de dominação e as diferentes lógicas administrativas (dominação racional e
burocracia e dominação tradicional e patrimonialismo) que compõem essa
estrutura de poder.
Dessa forma, a ordem administrativa brasileira vai ser uma imbricação
de patrimonialismo e burocracia, não por uma dualidade entre o “arcaico” e o
“novo”, mas sim pela necessidade de ter uma ordem administrativa adequada à
lógica de dominação e à estrutura de poder forjada por nossa “revolução burguesa”.
1.3 Neoliberalismoecontrarreformaadministrativa
No contexto da redemocratização brasileira, abre-se pela primeira vez no
cenário nacional a possibilidade de maior incorporação dos interesses da classe
trabalhadora na estrutura de poder. Os anos de 1980 e início dos anos 1990 se
apresentam como um período de forte disputa hegemônica entre dois projetos:
liberal-corporativismo e democracia de massa (COUTINHO, 1992).
Mesmo sofrendo as influências internacionais, tanto do ponto de
vista econômico quanto do ponto de vista político – em um contexto
hegemonizado pelo pensamento neoliberal direcionado para a programática
de apoio à internacionalização da economia e para a crítica à intervenção do
Estado na área social – a década de 1980, no Brasil, expressou a resistência
ao alinhamento imediato a esse ideário.
Essa resistência contou efetivamente não apenas com o fortalecimento
dos setores democráticos da sociedade civil, mas também com certo receio
das classes dominantes em abrir mão do apoio do aparato público estatal
para a manutenção de seus privilégios, que poderia advir de uma política
pautada na refuncionalização do Estado, e sua consequente redução, para
efetivar um projeto radical de transnacionalização econômica.
A Constituição Federal de 1988 é o exemplo material emblemático
de resistência nacional aos preceitos neoliberais in toten. A área social e a
questão da administração pública foram os aspectos centrais que expressaram
a influência das forças democráticas e populares no destino do país.
A universalização e o aprofundamento de direitos de cidadania como
dever do Estado e a estruturação de uma ordem classicamente burocrática,
no sentido do fortalecimento das dimensões de formalidade, mérito e
impessoalidade da administração pública, previstos na carta magna de
1988, mostram um caminho democrático a ser seguido do ponto de vista
político e institucional, portanto, antagônico à hegemonia internacional da
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
49
Gestão do SUAS em Juiz de Fora: análise da estrutura burocrática
50
época e à história de desenvolvimento do Estado brasileiro e de sua ordem
administrativa.
Dessa forma, buscava-se articular um projeto para o país baseado na
incorporação substantiva da classe trabalhadora no desenvolvimento econômico
e social, a ser conduzido por uma coalizão de classes que excluísse os setores
tradicionais. Por isso, a necessidade de um Estado forte na área social e o consequente
fortalecimento da estrutura da burocracia nas dimensões de impessoalidade e
formalidade. Nessa configuração, abre-se a possibilidade teórica e política para
romper com a imbricação da burocracia com o patrimonialismo que marcou a
origem e o desenvolvimento da ordem administrativa brasileira.
No entanto, essa possibilidade teórico-política não se efetivou. A situação
econômica do país não melhora e, a partir do início dos anos 1990, um novo
consenso entre as forças conservadoras foi se constituindo em torno da idéia da
inexorabilidade de, mais uma vez, o Brasil inserir-se de forma subordinada ao
capital internacional, porém, agora, no contexto capitalista hegemonizado pelo
mundo das finanças. As forças tradicionais foram rearticuladas e convencidas
de que, nas novas condições da economia internacional, era necessário, para
manter o pacto de dominação conservador, que houvesse uma mudança de
estratégia em relação ao papel do Estado na sociedade. A negação do papel do
Estado como agente produtivo direto e como provedor de políticas sociais seria
o cerne das mudanças que se faziam necessárias para a manutenção do pacto
conservador de dominação (FIORI, 1998).
Dessa forma, o ideário neoliberal, e suas consequências políticas,
econômicas e sociais, foi introduzido no Brasil a partir da manutenção de
nosso tradicional pacto conservador. Assim, implementa-se uma verdadeira
“contrarreforma” do Estado brasileiro (BEHRING, 2003).
A consequência administrativa do projeto de transnacionalização radical,
que implica uma forte coordenação das ações e a redução da intervenção do
Estado na sociedade, tanto como setor produtivo quanto como provedor de
políticas sociais, é, por um lado, a concentração de poder burocrático e, por
outro, a diminuição da burocracia estatal. Entretanto, a dimensão administrativa
sofre também as consequências do pacto de dominação estabelecido, que
incorpora os setores tradicionais da sociedade e que, por isso, exige a manutenção
de mecanismos patrimonialistas na ordem administrativa.
Para realizar essas mudanças administrativas, será efetivada a
contrarreforma administrativa, fundamentada nos pressupostos da teoria da
escolha pública (ANDREWS; KOUZMIN, 1998).
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Rodrigo de Souza Filho | Ester de Almeida Oliveira
Nesse sentido, a proposta da “Administração Pública Gerencial”, conforme
denomina Bresser Pereira (1996), pauta-se na centralização burocrática,
via núcleos estratégicos do governo, combinada com a descentralização e
flexibilização burocrática, via agências executivas/reguladoras, organizações
sociais e o processo de terceirização de serviços e parcerias.
Através da centralização burocrática, que se configura como a
estruturação de uma burocracia monocrática, viabiliza-se a coordenação
das ações necessárias para o projeto de transnacionalização. Por intermédio
da flexibilização da burocracia, alcançam-se três objetivos: diminuição
de gastos públicos para contribuir com o ajuste fiscal, redução do poder
da burocracia permanente e manutenção de traços patrimonialistas na
administração pública para propiciar a participação dos setores tradicionais
da estrutura de dominação. Nessa perspectiva, a flexibilização da burocracia se apresenta como
a mediação necessária para a manutenção do patrimonialismo na ordem
administrativa brasileira, que precisa se efetivar para viabilizar a participação
dos setores tradicionais na estrutura de dominação.
Tal mediação provocará mudanças na fundamentação do
patrimonialismo brasileiro que passará da utilização dos elementos tradicionais
de garantia de lealdade entre o senhor e o servidor para a estruturação de
determinações racional-legais voltadas para viabilizar a lealdade, baseadas na
difusão ideológica do pensamento único da racionalidade economicista e no
poder coercitivo e discricionário da burocracia monocratizada, que definirá
padrões formais para repasse de recursos públicos. Portanto, a contrarreforma
administrativa efetiva um transformismo do patrimonialismo brasileiro.
1.4 Gestãopúblicademocrática:aburocraciaemquestão
Nesse quadro, reforçar, do ponto de vista administrativo, a estruturação
da burocracia é uma tarefa central na luta por uma gestão de políticas
sociais pautada na ampliação de direitos. O reforço da lógica burocrática,
principalmente o fortalecimento da dimensão formal e impessoal de sua
estrutura, assim como a construção de mecanismos democratizadores, no
contexto em que nos encontramos, é a possibilidade administrativa de
ampliarmos a capacidade de intervenção do Estado no atendimento aos
interesses das classes trabalhadoras.
Desta forma, concordamos com Nogueira (1998) quando afirma que,
no atual contexto, do ponto de vista da gestão e de seus operadores, o essencial
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
51
Gestão do SUAS em Juiz de Fora: análise da estrutura burocrática
52
numa proposta de construção contra-hegemônica ao neoliberalismo não está
na apreensão de tecnologias gerenciais, mas sim na qualificação das pessoas
para atuar na fronteira entre a técnica e a política.
Embora as sugestões possíveis de serem implementadas na gestão
pública de forma imediata sejam encontradas no campo das vertentes
democráticas, o que se percebe é que as propostas tendem a enfatizar os
instrumentos de democratização e de controle da administração pública
que precisam ser desenvolvidos; com algumas exceções (EVANS, 1993;
NOGUEIRA, 1998), pouco, ou quase nunca, destacam a importância do
fortalecimento da dimensão racional da estrutura burocrática.
Em nossa concepção, os instrumentos de democratização que precisam
ser fortalecidos e ampliados devem ser pensados, no campo da administração
pública brasileira, a partir da construção de uma espinha dorsal burocrática.
Dessa forma, a estruturação de uma burocracia com sentido
“universalista”, além de depender da existência de um Estado forte na área
social que desenvolva políticas públicas voltadas para a distribuição de
renda e riqueza, precisa ser constituída de forma a potencializar aspectos
de sua racionalidade, como por exemplo: a) garantia de um certo nível
de “mecanização”; b) o “direito ao cargo”; c) existência dos princípios das
competência fixas, mediante regras, leis ou regulamentos administrativos;
d) realização da administração dos funcionários de acordo com regras
gerais, mais ou menos fixas e mais ou menos abrangentes, que podem
ser aprendidas; e) existência de regras impessoais como estrutura central
do poder de mando e obediência, que envolva tanto o senhor legal típico
quanto o corpo burocrático.
A questão da organização de elementos democratizadores para permear
a ordem administrativa burocrática requer compreender que se propõe
incluir uma dimensão contraditória à própria lógica burocrática, visando
um processo de superação de seus fundamentos.
Por isso, é fundamental, simultaneamente ao fortalecimento da
dimensão racional da burocracia, propor o aprofundamento de mecanismos
de democratização para viabilizar maior controle social e público da
ordem administrativa burocrática, como forma de propiciar transparência
e possibilitar maior participação das classes subalternas na definição e
acompanhamento das políticas públicas.
Dessa forma, as tecnologias de gestão pública empregadas devem
favorecer essas construções.
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Rodrigo de Souza Filho | Ester de Almeida Oliveira
Neste sentido, o foco da análise da gestão da política de assistência
social em Juiz de Fora se concentrou na identificação e crítica da estrutura
burocrática desenvolvida, visando desvelar em que medida a administração
da referida política tem percorrido, ou não, uma construção democrática.
2 A DIMENSÃO BUROCRÁTICA DA GESTÃO
PÚBLICA DA ASSISTÊNCIA SOCIAL EM
JUIZ DE FORA
2.1 Breve caracterização do município
O município de Juiz de fora, localizado na Zona da Zata mineira, está
localizado a 255 Km da capital Belo Horizonte, 180 Km da cidade do Rio
de Janeiro e 480 Km da cidade de São Paulo.
A área da unidade territorial é de 1.437 km² (município mais extenso
da Zona da Mata) para uma população de 516.247 habitantes, segundo o
Censo Demográfico de 2010, realizado pelo IBGE (2011a).
De acordo com o Atlas Social do Município (TAVARES, 2006), a
expectativa de vida na cidade é de 72,3 anos, superior à do estado (70,55
anos) e a do país (67,7 anos). Esta fonte assegura também que a taxa de
urbanização do município é de 99,17%, superior a de Minas Gerais que
é de 82% e a do Brasil, que é de 81,25%. O seu Índice de Desenvolvimento
Humano (IDH) é de 0,828, considerado como elevado em relação ao
estado, sendo o nono maior de Minas Gerais, o quadragésimo nono de toda
a Região Sudeste e o 145° do Brasil .
No que se refere à economia, a agricultura não possui muita relevância
em Juiz de Fora, até por sua alta taxa de urbanização. A indústria atualmente
é o segundo setor mais relevante para a economia do município. Em 2008, do
PIB (Produto Interno Bruto) de Juiz de Fora, 1.716.450 reais foram do valor
adicionado bruto da indústria. A cidade conta com um Distrito Industrial
em operação sob administração da Companhia de Desenvolvimento
Econômico de Minas Gerais, sendo as principais atividades industriais do
município a fabricação de alimentos e bebidas, produtos têxteis, artigos
de vestuário, produtos de metal, metalurgia, mobiliário e montagem de
veículos. No mesmo período, do PIB municipal, 4.375.627 milhões reais
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
53
Gestão do SUAS em Juiz de Fora: análise da estrutura burocrática
54
foram de prestações de serviços (setor terciário). Este setor é a maior fonte
geradora do PIB de Juiz de Fora (IBGE, 2011b).
Esse quadro configurou, em 2008, um Produto Interno Bruto per
capita de 13.715,11 reais.
A Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2010 estimava uma receita e
despesa do município em R$1.045.660.677,95 (um bilhão, quarenta e
cinco milhões, seiscentos e sessenta mil, seiscentos e setenta e sete reais, e
noventa e cinco centavos). O Orçamento Fiscal aliado ao da Seguridade
Social indicava um montante de receita no valor de R$1.002.716.162,95,
sendo que a despesa com a Secretaria de Assistência Social seria de R$
36.767.885,00, com a Secretaria de Saúde de R$ 302.474.345,20 e com
a Secretaria de Educação o investimento seria de 84.546.316,00. Para o
fundo municipal de assistência social seria repassado um montante de R$
7.984.691,48 .
É válido dispor, também, sobre os resultados presentes no quadro
referido, que retratam o rendimento nominal mensal domiciliar per capita.
O IBGE (2011a) contabilizou um total de 170.535 domicílios em Juiz de
Fora. Destes, 3.333 famílias não possuem rendimento algum; o rendimento
per capita de até ¼ de salário mínimo fazia-se presente em 4.218 domicílios e
21.862 domicílios contam com um rendimento nominal mensal domiciliar
per capita entre ¼ e ½ de salário mínimo. Na outra ponta, os domicílios
que contam com mais de 3 a 5 salários mínimos per capita são de 14.293,
aqueles que possuem um rendimento mensal per capita de mais de 5 salários
mínimos são de 13.475.
Segundo o Mapa de Pobreza e Desigualdades dos Municípios
Brasileiros de 2003 (IBGE, 2011b), a incidência da pobreza no município
de Juiz de Fora é de 12,86%; a incidência da pobreza subjetiva é de 9,45 e
o índice de Gini, que mede a taxa de desigualdade e de renda, é de 0,41%.
Enfim, essas são as características básicas do município que o
configuram como uma cidade de grande porte, urbana e pólo central da
região da zona da mata mineira.
2.2 A implementação do SUAS em Juiz de Fora
A Prefeitura de Juiz de Fora iniciou em 2005 uma série de atividades
voltadas para a implementação do SUAS. Certamente, a existência de uma
ampla rede de atendimento socioassistencial no município, liderada pelo
conjunto de programas, projetos e serviços desenvolvidos pela Associação
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Rodrigo de Souza Filho | Ester de Almeida Oliveira
Municipal de Apoio Comunitário (AMAC), possibilitou o desencadeamento
de tais atividades3.
A AMAC, criada pelo governo municipal em novembro de 1984,
conforme análise de Toledo (2010, p. 81), “formou-se a partir de uma conotação
híbrida”, visto que, juridicamente, se constituiu como uma associação civil sem
fins lucrativos, embora seu financiamento e sua direção estivessem diretamente
vinculados à Prefeitura Municipal (Lei nº 6624 de 01/11/1984). Dessa forma,
a instituição tem atuado, desde a sua criação, na coordenação e execução de
ações, programas e projetos na assistência social do município.
Ao longo de sua existência, a AMAC, a partir principalmente do
investimento de recursos públicos municipais, ampliou significativamente o
seu leque de programas, projetos e serviços socioassistenciais. Assim sendo,
no período em análise (2005-2008), esta organização híbrida já estava
estabelecida no cenário municipal como a referência central para as questões
da política pública de assistência social.
A análise do balanço financeiro da função assistência social do
município e do Balanço Social da AMAC, do ano de 2005, não deixa dúvidas
sobre esta centralidade.
O balanço financeiro referido acima apresenta uma despesa da ordem
de R$24.572.437,63, enquanto o Balanço Social – 2005 da AMAC apresenta
uma despesa de R$31.459.579,72. Destas despesas, R$29.388.783,39 foram
realizadas a partir de receitas oriundas de recursos governamentais, conforme
indica o Balanço Social. Certamente, a maioria dos recursos utilizados pela
AMAC foi disponibilizada pela Prefeitura Municipal.
A título de ilustração4, podemos visualizar – com os dados disponíveis
de 2010, a respeito das despesas realizadas através de contratos e convênios
pela Secretaria Municipal de Assistência Social (SMAS) e Secretaria
Municipal de Saúde (SMS), de janeiro a agosto, e pelo Fundo Municipal de
De acordo com Anuário Estatístico de Juiz de Fora - 2006 (base de dados 2005),
a AMC, através de programas, projetos e serviços de assistência social, realizou um
total de 129.944 atendimentos. Este Anuário não apresenta atendimento na área
da assistência social realizado pela Prefeitura. Ou seja, a AMAC era a instituição
oficialmente responsável pelo atendimento socioassistencial realizado no município.
Consideramos que os dados de 2010 servem para ilustrar a relação de dependência
orçamentária e financeira da AMAC com a Prefeitura de Juiz de Fora e explicitar a
centralidade política da instituição na área da assistência social e comprovar nossa
hipótese de que a maioria dos recursos utilizados pela AMAC são oriundos da
Prefeitura de Juiz de Fora.
3
4
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
55
Gestão do SUAS em Juiz de Fora: análise da estrutura burocrática
56
Assistência Social (FUMAS) e Secretaria Municipal de Educação (SME), de
janeiro a julho – os seguintes resultados:
Tabela 1- Gastos realizados através de contratos e convênios com AMAC - 2010
Órgãos da Prefeitura
Contratos e convênios
com AMAC (abs)
Percentual de gastos de contratos/
convênios, por órgão da Prefeitura,
com a AMAC (%)
SMAS
10.591.952,88
47,6%
FUMAS
1.856.352,48
8,3%
SMS
6.427.295,24
28,9%
SME
3.374.446,71
15,2%
Total
22.250.047,31
100%
Fonte: Fonte: Disponível em: http://www.pjf.mg.gov.br/transparencia/despesas . Acesso
em: 07 out. 2010. Elaboração própria.
Dessa forma, considerando a média mensal das despesas acima
relacionadas, podemos estimar um gasto anual da Prefeitura de Juiz de Fora,
através de contrato e convênios realizados pela SMAS, FUMAS, SMS e SME
com a AMAC, de, aproximadamente, 29 milhões de reais. Valor próximo ao
relatado no Balanço Social da instituição, o que comprova que os recursos
que a mantém são oriundos da Prefeitura de Juiz de Fora através de suas
secretarias da área social. Outro aspecto importante a destacar, refere-se ao
fato de que 55,9% dos recursos de manutenção da AMAC advêm da área da
assistência social.
Em relação à centralidade da AMAC na área da assistência social,
podemos indicar que do total de recursos utilizados pela SMAS e FUMAS
para contratos e convênios, em 2010, 72,77% foram destinados à instituição
acima mencionada.
Tabela 2 - Contratos e convênios realizados pela área da assistência social com AMAC –
2010 (R$)
Total dos Gastos Gastos com AMAC (abs) Gastos com AMAC (%)
SMAS
13.302.005,61
10.591.952,88
79,63%
FUMAS
3.803.226,30
1.856.352,48
48,81%
Total
17.105.231,91
22.250.047,31
72,77%
Fonte: Disponível em: http://www.pjf.mg.gov.br/transparencia/despesas. Acesso em: 7 out.
2010. Elaboração própria.
Neste sentido, embora a gestão da Política de Assistência Social de Juiz
de Fora, no período 2005-2008, fosse, formalmente, de responsabilidade da
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Rodrigo de Souza Filho | Ester de Almeida Oliveira
Secretaria de Política Social (SPS), a coordenação e execução das ações foram
realizadas pela Associação Municipal de Apoio Comunitário - AMAC.
Na gestão 2005-2008, a AMAC coordenou e executou a política de
assistência social de Juiz de Fora, oferecendo serviços de Proteção Social
Básica e Proteção Social Especial às famílias e indivíduos em situação de
vulnerabilidade.
As competências da referida instituição são definidas em torno da
promoção e proteção da família, da maternidade, da infância, da adolescência,
da juventude, da pessoa adulta e da pessoa idosa.
A partir dessas competências, o trabalho da AMAC, conforme site
oficial, deve ser desenvolvido para:
“cooperar” com o município na implantação, ampliação, manutenção e
execução de programas e projetos de atenção à população vulnerabilizada e em
risco pessoal e/ou social; atuar em harmonia com os órgãos da administração
direta e indireta do município; captar recursos públicos e privados para o custeio
de suas atividades; desenvolver programas que visem a geração de ocupação e
renda; promover programas de treinamento e capacitação para jovens e adultos;
planejar, coordenar, supervisionar, executar, acompanhar, monitorar e avaliar as
ações das unidades operacionais a seu cargo, em consonância com os objetivos
da Administração Municipal e de forma a assegurar o desenvolvimento social e
aspirações das comunidades onde estão inseridas. (Disponível em: http://www.
amac.pjf.mg.gov.br. Acesso em: 27 jun. 2008)
De acordo com documento da Prefeitura de Juiz de Fora (TAVARES,
2006, p. 25), a AMAC tinha como objetivo “executar a Política de Assistência
Social no município em consonância com os princípios da Lei Orgânica de
Assistência Social, da Norma Operacional Básica e da Política Nacional de
Assistência Social, oferecendo serviços de Proteção Social Básica e Proteção
Social Especial às famílias e indivíduos em situação de vulnerabilidade”.
Ao observar as competências, a missão e o objetivo da AMAC,
podemos verificar e confirmar a natureza contraditória da mesma. Pois, ao
mesmo tempo em que é uma associação sem fins lucrativos é ela que teve a
função de executar e coordenar a Política de Assistência Social no município.
Essa estrutura montada no município para efetivar a gestão da
política de assistência social, no primeiro momento da implantação do
SUAS, foi extremamente frágil, na medida em que não se encontrava sob
responsabilidade direta do poder público, não efetivando uma estrutura
burocrática estatal, visto que a institucionalidade organizada constituiu um
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
57
Gestão do SUAS em Juiz de Fora: análise da estrutura burocrática
58
mix público-privado, representado pela relação SPS-AMAC na condução
do processo de implantação do SUAS no município, onde a expressão
institucional mais significativa estava localizada na organização da sociedade
civil. Esta configuração compromete, sobremaneira, a gestão da política de
assistência social, enquanto política pública democrática. A não estruturação
do poder público para conduzir políticas sociais enfraquece a possibilidade
de permanência e expansão das ações realizadas, debilitando a efetivação de
tais políticas enquanto direito de cidadania e dever do Estado.
Corroborando com essa fragilidade da gestão, temos a seguinte
configuração do gasto público para a área:
Tabela 3 - Gasto Público – Função Assistência Social (2003-2008)
Gasto Público (Função
Assistência Social)
Gasto Público Total
% do Gasto Público (Função
Assistência Social) em relação
ao Gasto Público Total
2003 19.689.869,34
962.946.623,84
2,04%
2004 25.284.765,50
1.091.590.581,34
2,32%
2005 24.572.437,63
1.297.417.711,86
1,89%
2006 30.998.947,03
1.559.899.946,65
1,99%
2007 32.173.148,49
1.756.030.381,52
1,83%
2008 40.138.342,32
2.148.196.991,58
1,87%
Fonte: Disponível em: http://www.pjf.mg.gov.br/transparencia/prestacao.
Acesso em: 07 out. 2010. Elaboração própria.
Os gastos públicos do município de Juiz de Fora na função assistência
social em relação ao gasto público total, no período 2003-2008, não indicam
a ampliação significativa de aportes de recursos na área, a partir de 2005,
ano de implantação do SUAS. Ou seja, do ponto de vista do gasto público
municipal na função assistência social, a implementação do SUAS não
implicou em elevação substantiva de recursos para a política de assistência
social. Muito pelo contrário, encontramos uma redução relativa dos gastos
na área frente ao total do gasto público municipal. Além disso, verificamos
uma redução do valor absoluto utilizado na função assistência na passagem
do ano de 2004 para o de 2005, o que, se considerarmos a inflação do
período, significa um impacto negativo ainda maior.
O aumento dos valores absolutos do gasto público na área da assistência,
no período compreendido entre 2005 e 2008, foi, aproximadamente, de 63%.
No entanto, se descontarmos a recomposição dos gastos em relação a 2004
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Rodrigo de Souza Filho | Ester de Almeida Oliveira
e à inflação do período 2004-2008, o aumento detectado corresponderá,
basicamente, ao crescimento vegetativo dos custos com as ações no campo
da assistência social.
Esta situação reflete nos atendimentos socioassistencias desenvolvidos
no município. De acordo com o Anuário Estatístico de Juiz de Fora/2009,
em 2008 a AMAC realizou 194.992 atendimentos, enquanto a Secretaria de
Política Social efetivou, diretamente, 43.462 atendimentos e, indiretamente,
através de convênios com 20 organizações da sociedade civil, 2.872
atendimentos, além de ter operacionalizado o Programa Bolsa Família,
atingindo 2.800 beneficiários. Sendo assim, do total de atendimentos
socioassistenciais do município em 2008, 81% foram realizados pela AMAC
e outras organizações da sociedade civil.
Outro aspecto que merece destaque, de acordo com os anuários
estatísticos da cidade, refere-se à ampliação do atendimento socioassistencial
registrado entre 2005 e 2008. Nesse período, o atendimento saltou de
129.944 para 244.126, ou seja, uma ampliação da ordem de 88%. Aqui
encontramos uma situação que merece outros levantamentos de dados
para melhor entendimento da questão, pois, se o aumento do orçamento
da função assistência social não foi expressivo, durante o período tratado,
como foi possível a ampliação do atendimento, neste mesmo período, em
quase 90%? A ampliação foi realizada reduzindo a qualidade? Ou a AMAC
conseguiu recursos de outras fontes para a ampliação de suas ações?
De qualquer forma, os dados apresentados reforçam a centralidade
das organizações da sociedade civil, em especial da AMAC, no campo da
assistência social em Juiz de Fora e, em contrapartida, indica a fragilidade
da estrutura pública para a efetivação da política de assistência social como
direito de cidadania e dever do Estado. Sem dúvida alguma, esta configuração
remete à efetivação do “pluralismo de bem-estar” no campo da assistência
social em Juiz de Fora, típico da dinâmica neoliberal de realização de políticas
sociais, como vimos no capítulo anterior.
Em relação ao processo de estruturação dos componentes institucionais
(organização do órgão gestor, estabelecimento das proteções sociais básica e
especial, implantação de Centros de Referência de Assistência Social - CRAS
e de Centros de Referência Especializados de Assistência Social - CREAS)
necessários para a implementação do SUAS em Juiz de Fora, podemos
problematizar alguns aspectos.
O município de Juiz de Fora iniciou a implementação do SUAS em
2005. Podemos indicar, como a primeira iniciativa significativa neste sentido,
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
59
Gestão do SUAS em Juiz de Fora: análise da estrutura burocrática
60
a proposta de implementação dos Centros de Referência de Assistência Social
elaborada pela SPS e pela AMAC. Esta proposta foi apresentada durante a 88ª
Reunião Ordinária do Conselho Municipal de Assistência Social, realizada
no dia 04/08/2005, e foi aprovada por unanimidade. Também se discutiu,
nesta reunião, o Plano Municipal de Assistência Social e a habilitação do
município na gestão plena5 da assistência social, ambas as questões também
foram aprovadas por unanimidade.
Assim, em agosto de 2006, foi inaugurado o primeiro CRAS de Juiz
de Fora, na região leste da cidade. Em 2008, foram implementados mais três
Centros de Referência de Assistência Social nas regiões norte, sul e sudeste.
Ainda em 2008, foram inaugurados três CREAS, dois CREAS Infância e
Juventude, nas regiões centro e norte6, e o CREAS Idoso/Mulher que era
centralizado.
É importante destacar que a lógica dos CREAS em Juiz de Fora está
vinculada à concepção de atendimento por segmento (infância, mulher e
idoso) e não a uma perspectiva generalista (articulação de ações de proteção
social especial) e territorializada.
Esta mesma lógica se reflete na organização institucional dos programas
e projetos da AMAC. Apesar destes programas e projetos constituírem uma
rede da instituição e corresponderem aos níveis de proteção social previstos na
NOB/SUAS, a organização institucional da entidade era departamentalizada
por faixa etária. Portanto, do ponto de vista da gestão, a organização da
AMAC não potencializava a lógica da proteção social prevista no SUAS, a
qual possui uma perspectiva orientada pelas particularidades das necessidades
sociais e não pelo corte etário ou de gênero.
Neste sentido, cabe destacar que os CRAS e os CREAS, do ponto
de vista da organização institucional, estavam inseridos como um programa
“Nível em que o município tem a gestão total das ações de Assistência Social, sejam
elas financiadas pelo Fundo Nacional de Assistência Social, mediante repasse fundo a
fundo, ou que cheguem diretamente aos usuários, ou, ainda, as que sejam provenientes
de isenção de tributos, em razão do Certificado de Entidades Beneficentes de Assistência
Social – CEAS” (BRASIL, 2005, p.101). O município de Juiz de Fora está habilitado
no nível de gestão plena do SUAS desde 2005, devido à existência de uma ampla rede
socioassistencial, conselhos e fundos funcionando, aporte de recursos do tesouro para
a área da assistência social, dentre outros critérios atendidos.
É importante ressaltar que, formalmente, também foi criado o CREAS sul. No
entanto, por falta de estrutura física, este CREAS funcionava no espaço do centro.
Assim, de fato, o CREAS sul, em nosso entendimento, não foi implantado.
5
6
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Rodrigo de Souza Filho | Ester de Almeida Oliveira
de atendimento da AMAC, na medida em que eles estavam subordinados
à Coordenação Socioeducativa, no caso dos CRAS, ou à Coordenação
da Proteção Especial, no caso dos CREAS, ambas as Coordenações eram
vinculadas ao Departamento da Infância/Adolescente.
Portanto, os CRAS e os CREAS foram classificados e implementados
como programas/projetos socioassistenciais e não como um equipamento
cuja função primordial deveria ser a coordenação das ações assistenciais de
um determinado território. Dessa forma, a função do CRAS/CREAS na
organização da gestão da política de assistência social, preconizada pelo
SUAS, foi esvaziada. Essa inserção institucional inadequada inviabilizou a
articulação entre as outras coordenações e departamentos existentes, além de
inviabilizar a articulação entre os serviços.
Essa configuração dos CRAS/CREAS em Juiz de Fora mostra
que a implantação destes institutos, além de não estruturar uma ordem
administrativa pública de corte burocrático, não contribuiu para o
reordenamento da lógica da política de assistência social, no sentido das
orientações presentes na PNAS/2004. Sendo assim, a implementação dos
CRAS/CREAS em Juiz de Fora não viabilizou um novo conteúdo para a
política municipal de assistência social, nem contribuiu para a estruturação
de uma ordem administrativa pública de caráter racional-legal para
operacionalizar tal política.
Outro aspecto a considerar refere-se ao quadro funcional. A
Secretaria de Política Social, em 2008, possuía 133 funcionários efetivos,
sendo 16 administrativos lotados na SPS, 33 administrativos cedidos pela
Secretaria de Educação e 84 profissionais do quadro do magistério cedidos,
também, pela referida secretaria. Além disso, estavam vinculados à SPS 15
conselheiros tutelares, 9 funcionários comissionados e 193 estagiários. E,
ainda, 137 professores temporários (término de contrato em 31/12/2008)
e 07 adolescentes/aprendiz do Programa Municipal de Atendimento ao
Adolescente (JUIZ DE FORA, 2008a). Por outro lado, a AMAC possuía
(até julho de 2008) 2.389 funcionários contratados pela CLT, para atuar
em 42 serviços, 8 ações e 69 unidades vinculadas à assistência social (JUIZ
DE FORA, 2008b). Desses funcionários da AMAC, aproximadamente 10%
passaram por algum tipo de processo seletivo (TOLEDO, 2010).
Podemos considerar que esse formato de enfraquecimento/
flexibilização da burocracia, principalmente através da estruturação do
quadro administrativo por vias não burocráticas, pode assumir uma feição
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
61
Gestão do SUAS em Juiz de Fora: análise da estrutura burocrática
62
que se assemelha ao que Weber define como “burocracia patrimonial”. De
acordo com o autor:
Quando trabalham funcionários não-livres [...] dentro de estruturas
hierárquicas, com competências objetivas, portanto de modo
burocrático formal, falamos de ‘burocracia patrimonial’ (WEBER,
1999, p. 145).
Assim, na medida em que parte do quadro administrativo passa a ser
composto de funcionários que não passam por uma seleção de competência
impessoal, via concurso público, mas através de uma relação direta com o
dirigente/senhor, forja-se uma situação típica de dominação tradicional,
pois, conforme ressalta Weber:
[...] seu quadro administrativo não se compõe primariamente de
‘funcionários’ mas de ‘servidores pessoais’ [...]. Não são os deveres objetivos
do cargo que determinam as relações entre o quadro administrativo e o
senhor: decisiva é a fidelidade pessoal do servidor (WEBER, 1999, p. 148).
Em outras palavras, podemos afirmar que o quadro administrativo
responsável pela política de assistência social em Juiz de Fora se aproxima
da situação de recrutamento na dominação tradicional definida por Weber
como recrutamento extrapatrimonial. Ou seja, um recrutamento em virtude
de um pacto de fidelidade com o senhor (WEBER, 1999).
Merece destaque, também, o fato de ter ocorrido uma dissonância
entre as discussões sobre a implementação do SUAS no Conselho
Municipal de Assistência Social e a realidade da implantação. Esta situação
fica evidente a partir da análise das atas do referido Conselho, durante os
anos de 2005-2008.
Dentre as discussões e deliberações do Conselho, em 2005, podemos
destacar a aprovação de requerimento solicitando a classificação dos
atendimentos prestados pelas entidades da rede socioassistencial nos níveis
previstos pelo SUAS (Proteção Social Básica, Proteção Especial de média
e alta complexidade); a palestra ministrada pelo presidente do Conselho
sobre a Lei Orgânica de Assistência Social - LOAS e a PNAS/SUAS;
aprovação do projeto de implantação dos CRAS; aprovação do Plano
Municipal de Assistência Social; informação sobre o cadastro da cidade de
Juiz de Fora no Sistema Único de Assistência Social e sobre a aprovação
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Rodrigo de Souza Filho | Ester de Almeida Oliveira
da gestão plena para o município e esclarecimentos acerca das mudanças
sobre o financiamento das ações da política de assistência social. Ou seja,
o Conselho aprovou o Plano Municipal e o projeto de implantação dos
CRAS. As outras questões tratadas sobre a implementação do SUAS tiveram
caráter de socialização de informação. Dessa forma, podemos considerar
que o Conselho participou da formulação/deliberação das estratégias de
implementação do SUAS em Juiz de Fora.
No ano de 2006, não houve discussões sobre o processo de
implementação do SUAS em Juiz de Fora. O Sistema foi apenas citado como
informe, lembrado como perspectiva para que não fossem implementadas
ações dissonantes às orientações existentes e no momento de qualificação
dos serviços em termos da proteção social realizada (básica, especial de média
complexidade ou especial de alta complexidade). Entretanto, no dia 26 de
janeiro, houve uma reunião extraordinária do CMAS, pois o mesmo recebeu
um oficio do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome
(MDS) exigindo a aprovação, até dia 28 de janeiro, do Plano de Ação para
2006, juntamente com o demonstrativo físico financeiro, relativo ao Plano
de 2005. Ou seja, a análise da execução física-financeira de 2005 e o Plano
de Ação 2006 foram apreciados pelo CMAS de forma aligeirada e sobre
pressão do MDS.
Ainda em 2006 cabe destacar a participação do Conselho na
elaboração da LDO 2007. Porém, podemos perceber que não ocorreu um
acompanhamento sistemático do Conselho em relação à implementação do
SUAS em Juiz de Fora.
Em 2007, foram aprovados o Plano de Ação 2007, que tinha como
objetivo regular e nortear a política de Assistência Social na perspectiva do
SUAS, contendo as metas previstas, e recursos a serem aplicados no âmbito
municipal, de acordo com as diretrizes da PNAS (JUIZ DE FORA, 2007a);
o Demonstrativo Sintético Anual da Execução Físico-Financeira do Sistema
Único da Assistência Social - SUAS do Ano de 2006, referente à prestação
de contas dos repasses de recursos do Ministério de Desenvolvimento Social
e Combate à Fome-MDS (JUIZ DE FORA, 2007b); o orçamento 2008
do FMAS, contendo as metas previstas e os recursos a serem aplicados no
âmbito municipal, ou seja, a execução da política e seu financiamento (JUIZ
DE FORA, 2007c); e os convênios para o ano de 2008, referentes a Recursos
Municipais – FUMAS (JUIZ DE FORA, 2007d e 2007e).
Cabe destacar, também, que em 2007 foi realizada a IV Conferência
Municipal de Assistência Social que teve como objetivo avaliar a
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
63
Gestão do SUAS em Juiz de Fora: análise da estrutura burocrática
64
implementação do SUAS a partir das metas aprovadas na III Conferência de
Assistência Social. A IV Conferência aprovou as seguintes metas prioritárias
para o município: implantação do CRAS e CREAS, garantindo a efetivação
dos direitos com estabelecimento de um sistema de monitoramento,
acompanhamento e avaliação, garantindo a intersetorialidade das Políticas
Públicas e Investimento no efetivo controle social através da implantação da
Ouvidoria Municipal de Assistência Social, capacitações e viabilização do
acesso aos trabalhos e deliberações do Conselho Municipal de Assistência
Social - CMAS, via implementação dos Conselhos Locais e Regionais de
Assistência Social.
É importante sinalizar ainda, que, pela primeira vez, ocorreram
duas reuniões onde foram discutidas questões relativas à dinâmica de
funcionamento do CRAS. Uma por ocasião do debate sobre o relatório
circunstanciado referente ao custeio do CRAS (Reunião de 09/2007) e outra
a partir da visita de um conselheiro ao CRAS para conhecer e monitorar
a proposta de trabalho e o funcionamento do mesmo, tendo como base
e orientação do MDS (Reunião de 10/2007). Entretanto, não houve
desdobramentos destas ações.
No ano de 2008 o CMAS fez quatorze reuniões, sendo quatro delas
reuniões extraordinárias. Percebe-se que no início daquele ano houve uma
preocupação maior com a questão do orçamento. A Resolução 10/2008
aprovou a Lei de Diretrizes Orçamentária 2009, conforme Sistema Único
de Assistência Social- SUAS. Assim como ocorreu em 2007, quando a
Resolução 31/2008 aprovou os convênios para o ano de 2009, referentes a
Recursos Municipais – FUMAS.
Apesar de ter ocorrido, excetuando o ano de 2006, a participação
do Conselho na definição de estratégias para a implantação do SUAS em
Juiz de Fora e seu respectivo acompanhamento, as fragilidades indicadas
anteriormente, em relação à institucionalidade da gestão da política, não
foram objeto de discussão e análise do mesmo. Em nenhuma ata foi verificada
alguma problematização a respeito da estrutura organizativa que estava sendo
montada para a operacionalização da política de assistência social.
Neste sentido, no acompanhamento do CMAS do processo de
implementação do SUAS em Juiz de Fora se resumiu as ações formais necessárias
parta garantir o fluxo de recursos para a cidade (aprovação da execução físicofinanceira, aprovação do Plano de Ação e dos relatórios circunstanciados
dos CRAS e registros das entidades). Em relação ao acompanhamento da
estruturação da assistência social no município, não houve uma preocupação
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Rodrigo de Souza Filho | Ester de Almeida Oliveira
dos conselheiros em avaliar esta questão, desconsiderando a importância da
existência de uma estrutura administrativa pública-estatal para viabilizar a
consolidação e expansão da política de assistência social. Mesmo quando o
debate referia-se ao orçamento, parecia ocorrer uma discussão meramente
formal sobre o tema ou, então, uma preocupação restrita com a partilha dos
recursos entre as entidades da área.
O não acompanhamento do processo de implantação da estrutura do
SUAS, por parte do CMAS, pode ter sido ocasionado, como bem registrado
pelos três conselheiros entrevistados7, pelo fato de desconhecimento da PNAS/
SUAS, por parte do CMAS e dos órgãos gestores da Prefeitura. Pois, ao mesmo
tempo que havia uma nova proposta de reorganização da Assistência Social,
havia uma preocupação com o volume de informações para serem repassadas
para os conselheiros, em curto tempo, principalmente para aqueles que não
possuíam conhecimento adequado sobre a temática. As servidoras entrevistadas
da AMAC8 corroboram com esta análise, na medida em que avaliam que as
mudanças indicadas pela PNAS/SUAS exigem estudos e aprofundamentos sobre
o tema, implicando em reestruturação da gestão da política de assistência social.
Neste sentido, o processo de implementação do SUAS em Juiz de Fora,
além de não ter contribuído para a estruturação de uma “espinha dorsal”
burocrática, não potencializou efetivamente o papel de controle social do
Conselho de Assistência Social.
3CONCLUSÃO
Os aspectos indicados acima constituem, então, os elementos centrais
da dimensão organizacional da gestão da política de assistência social em
Juiz de Fora.
Foram entrevistados dois conselheiros governamentais e um conselheiro não
governamental (não foi possível entrevistar um segundo conselheiro governamental
escolhido). A escolha dos entrevistados foi baseada na identificação dos conselheiros
com maior participação nos debates sobre a implementação do SUAS. Esta
identificação teve com fonte a análise das atas do período 2005-2008.
Em relação à Associação Municipal de Apoio Comunitário (AMAC), foram
entrevistadas a Chefe do Departamento de Planejamento - DEPLAN), a
Coordenadora do Projeto Socioeducativo, que compunha o Departamento da
Infância e Adolescente – DIA) e a Chefe do Departamento da Pessoa Adulta. A
Chefe do Departamento do DIP foi procurada para a entrevista, porém não pode
atender. Também foi entrevistada a Superintendente da AMAC do ano de 2008.
7
8
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
65
Gestão do SUAS em Juiz de Fora: análise da estrutura burocrática
66
Como foi possível constatar, se do ponto de vista organizacional a
estruturação de uma burocracia pública com controle social e público é
um dos elementos fundamentais para o processo de construção de uma
gestão pública democrática, a implementação do SUAS em Juiz de Fora
não tem contribuído para esse desenvolvimento. Muito pelo contrário,
o que verificamos foi a fragilidade da ordem administrativa burocrática
(organização estatal, quadro funcional e estrutura da política), assim como a
debilidade do Conselho em identificar esta fragilidade e propor reorientação
de rumo.
Dessa forma, a conclusão preliminar a que chegamos identifica
que, aliado ao cenário adverso para a implementação do SUAS, o tipo
de intervenção que constatamos existir em Juiz de Fora no processo de
implantação do SUAS (2005-2008), em relação à estrutura burocrática
de gestão, não possibilitou o tensionamento democrático da atual política
municipal de assistência social.
No entanto, vale destacar que no ano de 2009, com a constituição
de uma nova equipe de gestão (2009/2012) vinculada à eleição do
novo prefeito, foi criada a Secretaria de Assistência Social (SAS), e
imediatamente, a partir de fevereiro de 2009, foram implantados os
CRAS Centro, Sudeste, Oeste, Sul II, Leste II, Sudeste II, aproveitando
os espaços físicos já existentes, inclusive onde já estavam estruturados os
CURUMINS (programa da AMAC dirigido a crianças e adolescentes).
Os profissionais de serviço social, psicologia, pedagogia, entre outros,
vinculados aos diferentes programas da AMAC, foram remanejados para
constituir as equipes mínimas dos CRASs. Assim, os programas da AMAC
foram esvaziados dos técnicos que os constituíam, e as ações desenvolvidas
por eles ficaram temporariamente suspensas. No organograma da SAS,
estrutura-se uma Subsecretaria de Gestão do SUAS com os departamentos
de Proteção Básica e Proteção Especial, sugerindo que os CRASs ficariam
subordinados ao departamento de Proteção Básica. Por sua vez, a AMAC,
que estava incluída no organograma da SPS, ficou ausente do organograma
da SAS, sugerindo uma possível reorientação de seus programas sob nova
configuração na SAS atendendo à lógica da PNAS/SUAS.
Outro elemento importante nesse contexto (ano de 2009) foi a ação
movida pelo Ministério Público sobre a Prefeitura, exigindo a resolução da
situação da AMAC, associação de direito privado, executora de políticas públicas,
mantidas majoritariamente pela prefeitura. A solução exigida pelo Ministério
poria fim à AMAC. Porém, a centralidade da AMAC no município, pelo fato
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Rodrigo de Souza Filho | Ester de Almeida Oliveira
de ser a referência em termos da execução da política pública de assistência
social, tem alimentado a resistência dos seus trabalhadores e de muitos de seus
usuários, além de setores da sociedade, forçando a necessidade de uma solução
diferenciada, intermediária, com a perspectiva de continuidade da instituição,
através de outra configuração jurídico-administrativa. O impasse não chegou
à solução e há incerteza quanto ao tempo e às propostas que serão de fato
configuradas nesta disputa.
Obviamente, esses elementos indicam a necessidade de continuar
acompanhando a implementação do SUAS em Juiz de Fora, visando
identificar se a gestão 2009-2012 da Prefeitura promoverá ou não uma
inflexão na dinâmica de implementação da política pública de assistência
social. Mas isso é objeto de novas pesquisas.
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Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
69
Capítulo 3
Apontamentos acerca do
Associativismo Brasileiro e de
sua relação com as Políticas
Sociais
Cristina Simões Bezerra1
Maria Lúcia Duriguetto2
Constitui nosso objetivo, neste item, tecer considerações acerca do
associativismo brasileiro, o que necessariamente implica situá-lo no campo
das relações entre Estado e sociedade. Nestas considerações, estão dadas
as premissas analíticas que nos nortearão na análise do associativismo no
município de Juiz de Fora, em que buscaremos explicitar um panorama
deste campo associativo – em suas diferentes configurações – para a sua
problematização em relação à intervenção no campo das políticas sociais,
particularmente no da assistência social.
A temática do associativismo vem constituindo um campo de debates
na realidade nacional, sobretudo a partir do final da década de 1970.
Situados no campo das demandas pelo acesso às políticas públicas estatais ou
Professora Adjunta da FSS UFJF. Dra. em Serviço Social UFRJ
Professora Adjunta da FSS UFJF. Dra. em Serviço Social UFRJ
1
2
Apontamentos acerca do associativismo brasileiro e de sua relação com as políticas sociais
72
da atuação no campo das políticas e serviços assistenciais, as organizações/
movimentos/instituições que atuam no campo em tela foram alvo de variadas
perspectivas analíticas e prático-políticas, tanto da academia quanto dos
sujeitos que neles intervinham. Antes de tratarmos de algumas características
deste campo associativo, retomaremos, em linhas gerais, alguns elementos do
padrão de intervenção estatal na consolidação da modernização capitalista
brasileira e seus rebatimentos na configuração das agências da sociedade
civil que representam ou que revelam representar interesses e demandas das
classes subalternas.
Na nossa formação social, o processo de desenvolvimento capitalista
pode ser compreendido e caracterizado pela presença de dois traços típicos:
nossa modernização não eliminou de forma “revolucionária” as relações
sociais herdadas do passado, mas as redimensionou enquanto fator de
acumulação e desenvolvimento; o outro traço expressou-se no plano
imediatamente político, por meio da recorrente exclusão da participação
popular nos processos de decisão política. Tomando, então, a convergência
desses dois traços, podemos evidenciar que os mesmos caracterizam a nossa
modernização capitalista como conservadora.
Coutinho utiliza os conceitos de “via prussiana” formulado por Lênin e
o de “revolução passiva” formulado por Gramsci para caracterizar os processos
de modernização econômico-social ocorridos na nossa história. O autor
apropria-se do conceito de “via prussiana” para caracterizar o modo pelo qual
a “passagem” para o capitalismo no Brasil operou e adequou a estrutura e a
modernização agrária às suas necessidades. O conceito de “revolução passiva”
é utilizado para determinar processos sociais e políticos de ‘transformação
pelo alto’. Em termos gramscianos, uma revolução passiva expressa a presença
de dois momentos: reação das classes dominantes à possibilidade de uma
transformação efetiva de “baixo para cima”, reação que acaba por “restaurar”
o equilíbrio precedente, ao mesmo tempo em que “renova” suas práticas
sociais, antecipando-se a ou incorporando e controlando “por cima” certas
demandas populares com o que aumenta seu poder de controle e cooptação.3
3
Exemplo típico deste fenômeno de renovação é a legislação trabalhista brasileira,
reivindicada ao longo das lutas sociais das duas primeiras décadas do século XX,
que foi implantada junto com a imposição de dispositivos legais, que vinculavam
os sindicatos ao aparelho estatal. Para a especificação e análise da relação entre os
conceitos de “via prussiana” e “revolução passiva” como critério de interpretação do
processo de transição do Brasil à modernidade capitalista ( cf. COUTINHO, 1991,
p. 119-136).
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Cristina Simões Bezerra | Maria Lúcia Duriguetto
Essa característica da relação do Estado com as agências da sociedade
civil, que expressam os interesses das classes subalternas, segundo análise
de Netto (1991, p. 19), vai na direção não de sobrepor a/ou impedir seu
desenvolvimento, mas “[...] antes, consiste em que ele [Estado] [...] tem
conseguido atuar como um vetor de desestruturação, seja pela incorporação
desfiguradora, seja pela repressão[...]” servindo, assim, “[...] de eficiente
instrumento contra a emersão, na sociedade civil, de agências portadoras de
vontades coletivas e projetos societários alternativos”.
No campo particular das políticas sociais tivemos, como registro
maior, a arquitetura da ideia da cidadania corporativa, sob a qual o
Estado atrelava e subalternizava as demandas dos trabalhadores, criando
uma ideologia de concepção dos direitos como doação de um Estado
protetor. Como nos esclarece Telles (1999, p. 77-193), ao invés de
garantir e universalizar direitos, essa arquitetura destituiu indivíduos de
suas prerrogativas de cidadania e produziu a fratura entre a figura do
trabalhador e a do pobre incivil. Nessa direção, segundo Santos (1998, p.
63), a cidadania e a participação política, até os anos 60, não constituíram
resultado de um conjunto de valores políticos, mas da inserção ocupacional
em uma das profissões reconhecidas pelo Estado.
A processualidade organizativa das classes subalternas assumiu
características próprias dessas conformações que delinearam a relação do
Estado com as vozes demandantes de direitos de cidadania.
No período pós-Estado Novo (1946-1964), a pouca literatura
disponível aponta a existência de um número reduzido de associações civis,
em particular associações comunitárias, com predominância de práticas
recreativas e atrelamento político aos representantes do executivo e legislativo
estaduais e municipais, como no caso das Sociedades de Amigos de Bairro
(SABs) na cidade de São Paulo. As SAB’s se desenvolveram nos anos 50,
assumindo um caráter de troca de benefícios materiais por votos.
É com a bandeira da ideologia desenvolvimentista, particularmente
no Governo Kubitschek, e, posteriormente, com a autocracia burguesa,
que temos um profundo avanço no nosso processo de desenvolvimento
econômico e, em particular, da industrialização. O Estado propiciou uma
intensa e crescente abertura ao ingresso de capitais estrangeiros, criando
condições que buscavam promover um desenvolvimento capitalista de
tipo dependente-associado, padrão que foi substantivamente contestado
no período que imediatamente precedeu o golpe de 1964 pelo campo
democrático e popular. Este, sustentado na emersão de amplas camadas de
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
73
Apontamentos acerca do associativismo brasileiro e de sua relação com as políticas sociais
74
trabalhadores urbanos e rurais sob a bandeira das reformas de base, colocava
em questão aqueles dois traços que caracterizam a nossa formação social: o
capitalismo sem reformas e a exclusão das massas dos níveis de decisão.
A autocracia burguesa, na expressão de Florestan, instalada com
o golpe de 64, resultou na derrota desse campo democrático-popular,
contribuindo para a afirmação de uma nova integração, mais dependente, aos
interesses imperialistas, bem como na implementação de ações sociopolíticas
antidemocráticas, que implicaram em reverter o processo de democratização
que estava em curso antes de 1964.
A acelerada modernização capitalista do período da autocracia burguesa
transformou o Brasil num país urbano-industrial complexo e diferenciado,
o que criou os pressupostos objetivos para a promoção da dinamização da
organização de interesses em uma numerosa e diversificada vida associativa.
O mais representativo exemplo está na reinserção da classe operária na
cena política e nas ações e demandas dos movimentos sociais. Nesse
quadro conjuntural, assiste-se à redução da dependência dos movimentos
sociais da tutela estatal e um crescimento vertiginoso das associações civis,
principalmente as associações comunitárias, dos movimentos pela defesa
de demandas por direitos civis, políticos e sociais, da defesa de autonomia
organizacional em relação ao Estado, o reaparecimento e expansão das
organizações sindicais, a criação de novos partidos etc. (cf. BOSCHI, 1987).
É esse fato novo que obriga a autocracia burguesa a combinar medidas
repressivas com concessões e atos de negociação, culminando, assim, na sua
crise. (NETTO, 1991, p. 42-43).
Ganhando densidade teórica e prático-política no Brasil, o campo do
associativismo popular veio sendo debatido pela via das suas demandas e
formas de relação com as agências estatais. Diferentes enfoques analíticos
acompanharam essa trajetória: no final dos anos 70 e primeira metade da
década de 80, enalteceu-se seu caráter autonomista e opositor em relação
ao Estado e às políticas públicas; a partir da segunda metade da década
de 80, enalteceu-se seus vínculos com o campo das políticas e dos canais
institucionais criados para a sua incorporação a partir da Constituição de
1988. A partir deste período, constata-se a redução de atitudes de confronto
e de reivindicação por parte dos movimentos/instituições/organizações
sociais pela valorização de condutas institucionais pragmáticas e propositivas
na busca de diálogo, negociação e parcerias com o Estado. Essa redefinição
das formas de ação dos movimentos/organizações/instituições fomentou a
elaboração de análises, nas quais emerge uma nova concepção de sociedade
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Cristina Simões Bezerra | Maria Lúcia Duriguetto
civil. Esta passa a ser entendida como a esfera na qual se desenvolve uma
articulação entre o mundo associativo e as agências estatais por espaços
democráticos de representação e interlocução pública para o reconhecimento,
garantia e consolidação de direitos4 (DAGNINO, 1994).
O tema do associativismo e seu significado vem sendo ainda mais
polêmico em virtude da centralidade que ocupa, a partir da década de 1990,
pela ofensiva neoliberal. Ofensiva que se materializa, nas últimas duas décadas,
pelas mudanças no mundo do trabalho e pela estratégia estatal de redução
da oferta de serviços e políticas públicas em abrangência, universalidade e
qualidade, formalmente postas na Carta de 1988.
A esfera estatal, na sua regulação social, particularmente no campo
das políticas sociais, vem, também, imprimindo uma segmentação
do acesso das classes subalternas aos padrões das políticas, marcando o
universo dos consumidores dos serviços oferecidos pela via mercantil e o
dos beneficiários das políticas públicas, focalizadas ou das ofertadas pelo
chamado “terceiro setor”.
É neste chamado “terceiro setor” que o Estado, sob o ideário
neoliberal, opera uma ressignificação do conceito de sociedade civil. O
Estado passa a investir na participação da sociedade civil, mas não na direção
do seu controle na gestão e implementação das políticas como demandado
pelos movimentos sociais no decorrer da década de 1980, mas na direção
de transferir a ela o papel de agente do bem-estar. Sociedade civil é, aqui,
transformada numa esfera supostamente situada para além do Estado e
do mercado, cabendo a ela uma atuação na área social, sob o invólucro da
solidariedade, da filantropia e do voluntariado. Ou seja, há, aqui, um esforço
ideológico de despolitização da sociedade civil, concebendo-a como reino da
“a-política” e do “a-classismo”.
Este cenário de privatização das políticas – seja na sua oferta cada
vez mais avassaladora e abrangente pelo setor privado, seja pelo incentivo
crescente de sua oferta pelo terceiro setor – e de sua oferta compensatória
vem imprimindo um conteúdo despolitizador nas ações reivindicativas dos
movimentos sociais e restrito aos limites da particularidade de grupos sociais
diversos. Em outras palavras, em relação às organizações e movimentos que
defendem e representam os interesses das classes subalternas, a ofensiva
neoliberal vai em direção de submetê-las à lógica do mercado, à despolitização
4
Para uma análise crítica da ressignificação do conceito de sociedade civil, consultar
Duriguetto (2007).
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
75
Apontamentos acerca do associativismo brasileiro e de sua relação com as políticas sociais
76
e à fragmentação das suas lutas e demandas, orientando-as para a defesa
de interesses puramente corporativos e setoriais5. Toma a frente uma
dinâmica associativa restrita aos limites da particularidade de grupos sociais
diversos, cuja dimensão política é reduzida à responsabilidade moral, sendo a
linguagem dos direitos substituída pelo discurso humanitário da filantropia e da
solidariedade (TELLES, 1998, p. 113-114).
O campo do chamado Terceiro Setor:
ideologias, funções e ações
É, portanto, no contexto do ideário neoliberal que emerge o chamado
“terceiro setor”, entendido como um conjunto de organizações, instituições
e ações particulares da sociedade civil (entendida como “terceiro setor”),
que realiza atividades públicas com a função de resposta às necessidades
sociais a partir de valores da solidariedade e da iniciativa individual. Este
campo organizativo formaria uma esfera “pública não estatal”, em que a
sociedade civil (transmutada em “terceiro setor”) estaria situada num espaço
intermediário entre o Estado e o mercado.
No debate acerca da sociedade civil transformada em “terceiro setor”,
pode-se constatar a presença de duas tendências teórico-políticas: “uma
tendência regressiva” (inspirada nos princípios liberais e neoliberais, em que
a defesa do mercado como esfera reguladora das relações sociais é a tônica
central) e uma de “(suposta) intenção progressista” (que concebe a sociedade
civil - o “terceiro setor”- como espaço privilegiado de interação social)
(MONTAÑO, 2002, p. 59). O chamado “terceiro setor” atuaria como
espaço de interseção no desempenho de funções públicas a partir de espaços/
iniciativas privadas, articulando, assim, o público e o privado.
Nesta perspectiva, as organizações da sociedade civil, segundo Fernandes
(2000, p. 27), seriam definidas como “um conjunto que, por suas características,
distingue-se não apenas do Estado, mas também do mercado”. O “terceiro
setor” “é composto de organizações sem fins lucrativos, criadas e mantidas
pela ênfase na participação voluntária, num âmbito não-governamental,
5
No entanto, a conjuntura atual não é marcada única e exclusivamente pelo crescente
refluxo dos movimentos e organizações sociais classistas. Para uma apresentação
panorâmica de movimentos e organizações classistas e de programática antineoliberal
e anticapitalista Cf. Montãno e Duriguetto (2010).
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Cristina Simões Bezerra | Maria Lúcia Duriguetto
dando continuidade às práticas tradicionais de caridade, da filantropia e do
mecenato” [...].
Há, assim, uma constante referência ao fenômeno do “terceiro setor”
como se tratando de atividades públicas desenvolvidas por particulares:
são “iniciativas particulares com sentido público”, conformadas por “todas
aquelas instituições sem fins lucrativos (ONG’s, organizações e associações
comunitárias; instituições de caridade, religiosas; atividades filantrópicas –
fundações empresariais, filantropia empresarial, ações solidárias) que, a partir
do âmbito privado, perseguem propósitos de interesse público”; imbuídas de
altruísmo, compaixão, ajuda mútua e de ajuda ao próximo, ações voluntárias.
Essa esfera passa a ser dotada de uma áurea harmônica, despolitizada e
homogênea, voltada para o bem comum e para o solidarismo, que passam a
assumir funções de resposta às demandas sociais (antes de responsabilidade
do Estado), a partir dos valores de solidariedade local, autoajuda e ajuda
mútua, voltada para as autorrespostas imediatas às necessidades localizadas
(MONTAÑO, 2002, p. 183-184).
No campo das políticas sociais, essas organizações e suas ações
ideológicas são fomentadas por ideologias que propagam uma desconfiança
do Estado, tido como ineficiente e burocrático, e uma confiança na
sociedade civil (leia-se “terceiro setor”), considerada mais democrática e
próxima da população.
Exemplo de serviços e políticas sociais e sua alocação na sociedade
civil foi a programática presente no programa “Comunidade Solidária”,
que retirou a política de Assistência Social do campo dos direitos, da
universalidade dos acessos e da responsabilidade estatal em sua oferta, tal
como prevê a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS) para programas de
“combate à pobreza” através de ações focalizadas e seletivas nos municípios
mais pobres do país. Assim, o que restaria de público-estatal no âmbito
da política de assistência seria operado por programas que direcionavam o
atendimento segundo ações focalizadas a públicos seletivamente escolhidos
pela sua maior necessidade e urgência. Na medida em que amplos setores
da população ficaram excluídos desses serviços, pois não preencheram
os requisitos máximos de pobreza e também não tiveram condições de
acesso aos serviços privados, transferiu-se às “instituições não-estatais” que
compõem a sociedade civil a iniciativa de assisti-los. É neste campo de ação
social voluntária, solidária, filantrópica que surgirá o “terceiro setor”.
Por fim, vale mencionar as mudanças institucionais, que transportam
a função social de responsabilidade fundamentalmente estatal para o âmbito
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
77
Apontamentos acerca do associativismo brasileiro e de sua relação com as políticas sociais
78
particular das organizações do “terceiro setor”, transmutando a concepção
do direito para a chamada “solidariedade local”, da ajuda mútua ou da autoajuda e da universalidade dos serviços para ações focalizadas e localistas.
Como vimos no artigo que abre este livro, a política de assistência
foi sendo consolidada no Brasil sob forte impulso da solidariedade, do
trabalho voluntário e da filantropia, que na contemporaneidade aparecem
reatuzalizadas no nome moderno do “terceiro setor”. Todo o processo contido
no Plano Diretor de Reforma do Estado, que confere à assistência o atributo
de serviços não exclusivos do Estado possibilita a permanência destes velhos
e (modernos) móveis ideológicos ou no máximo a tensão entre direito (no
que ainda possa ser alvo de regulação estatal no campo da assistência) e favor.
A criação do SUAS significou, como também visto no artigo de abertura
deste livro, um avanço na tentativa de organizar, racionalizar e regulamentar
a relação público/privado. Não obstante este avanço, a subsunção desta
política a uma política econômica neoliberal, não abre caminho para a
redução daquelas ações anteriores no campo da assistência, mas a elas se
articulam e nelas também se apóia.
Portanto, a funcionalidade do terceiro setor para com o projeto
neoliberal consiste em torná-lo instrumento, meio, para:
•
•
justificar e legitimar o processo de desestruturação da Seguridade
Social e desresponsabilização do Estado na intervenção social.
Assume a função de transformar o padrão de respostas às
refrações da “questão social”, constitutivo de direito universal, sob
responsabilidade prioritária do Estado, em atividades localizadas
e de autorresponsabilidade dos sujeitos portadores de carências.
Atividades desenvolvidas por voluntários ou implementadas
em organizações sem garantia de permanência, sem a noção e a
perspectiva do direito. Difunde-se a ideia de que não se deve partir
somente do Estado o provimento de bens e serviços, mas também
das iniciativas particulares. Neste contexto, pode-se observar que
assistência social, saúde, geração de emprego e renda, dente outros,
passam a ser objetos de notória atuação das organizações sem fins
lucrativos.Temos uma ampliação da rede de “proteção social” em
detrimento da garantia e da qualidade dos serviços sociais estatais;
desonerar o capital da responsabilidade de co-financiar as respostas
às refrações da “questão social”;
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Cristina Simões Bezerra | Maria Lúcia Duriguetto
•
•
•
despolitizar os conflitos sociais dissipando-os e pulverizando-os. O
que é hegemônico, neste campo, é a noção de solidariedade, em que
a questão social deixa de ser uma questão política e transforma-se
em uma questão moral e suas organizações não têm por finalidade a
defesa de interesses coletivos, mas de grupos e/ou setores e segmentos
determinados. Reforça-se as ações particularistas e coorporativas,
tornado-se este o terreno propício para o desmonte de projetos
coletivos e a mitificação de práticas isoladas e fragmentadas. Isto
promove um esvaziamento do conteúdo político das ações pela
evocação da solidariedade no âmbito local, mobilizando grupos e
comunidades em favor de interesses particulares, imediatistas e
pontuais;
espraiamento dos sentimentos de autoajuda, ajuda-mútua ou na
ajuda divina;
localização da questão social, fortalecendo a perspectiva de uma
autorresponsabilização individual ou de grupos de solidariedade
pelas respostas às suas refrações.
Algumas organizações componentes do “terceiro setor”
refuncionalizaram suas ideologias e ações neste novo contexto de
instrumentalização de suas ações pelo ideário neoliberal. No período
referente ao final da década de 1970 e na década seguinte, as ONGs, por
exemplo, tinham como missão contribuir para a organização e articulação
dos movimentos sociais. Porém, no final dos anos 1990, houve uma inflexão
nesta relação, onde as mesmas passaram a assumir posições antes ocupadas
pelos movimentos sociais, e passam a tornar-se parceiras do Estado e do
mercado. Esta nova configuração provoca mudanças na relação entre os
movimentos sociais e o Estado, deixando de ser direta e passando a se
constituir intermediada pelas ONGs. Opera-se, portanto, uma mudança
na forma das lutas sociais, com possibilidade forte de perda do caráter
politizado e conflitivo, uma vez que as ONGs passam a conquistar maior
credibilidade e adesão da população, por terem fonte de obtenção de
recursos, respaldo e credibilidade social por estarem desenvolvendo uma
lógica gerencial, assentado em uma concepção de eficiência de projetos de
intervenção social e de seus “produtos”.
O campo das instituições denominadas sem fins lucrativos,
particularmente as filantrópicas e assistenciais, remete à questão da boa
vontade, da solidariedade e dos valores religiosos. São as que se dedicam
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
79
Apontamentos acerca do associativismo brasileiro e de sua relação com as políticas sociais
80
à prestação de serviços de naturezas diversas a grupos “fragilizados” e
“pobres”. Mas também há instituições que evocam a construção dos
direitos de cidadania, como no caso das associações comunitárias, de
moradores, de profissionais, entidades de defesa de direitos humanos, de
defesa de direitos civis etc. Já no campo das organizações voluntárias, há a
existência de uma variedade de iniciativas que abarcam desde organizações
de autoajuda ou ajuda-mútua, cooperativas dos mais diferentes tipos até
associações profissionais.
Segundo Landim (1993), as entidades de assistência social, por sua
vez, estão geralmente distantes dos valores da “militância” e do campo
dos movimentos sociais organizados. Se desenvolvem sob o monopólio da
Igreja Católica, seguindo-se uma diversificação, sobretudo com as várias
Igrejas Protestantes e os grupos Espíritas. Todas essas religiões possuem
uma ação social - creches, orfanatos, asilos, centros de assistência social
diversos - e são, no geral, pouco profissionalizadas. Esses grupos atingem
as camadas mais marginalizadas da população, que têm pouca visibilidade
e estão quotidianamente lá onde nem o Estado, nem os movimentos
sociais organizados penetram.
As organizações do “terceiro setor”, na maioria das vezes, não
geram receitas suficientes para se manterem. Assim, têm necessidade de
captar recursos fora de suas atividades fundantes. Estas atividades de
arrecadação de recursos tornam-se não apenas uma atividade essencial da
organização, mas ainda pode passar a orientar a filosofia e a condicionar
a sua “missão”. Os recursos podem derivar de “doações” espontâneas e
voluntárias dos membros filiados à organização e do público em geral;
recursos financeiros, materiais ou humanos de empresas “doadoras”
ou fundações de filantropia empresarial; instituições financeiras, que
desembolsam recursos de forma direta ou indireta para o “Terceiro Setor”
dos países periféricos; e os recursos governamentais, ou seja, o Estado
através das chamadas parcerias com o “terceiro setor”, transfere fundos
via subvenções, terceirizações e isenções de impostos.
Explicitadas algumas configurações e tendências da relação entre
Estado e associativismo - tendo como mediação o campo das políticas
sociais - não podemos deixar de reconhecer que o fenômeno da vida
associativa na sociedade brasileira ainda tem sido relativamente pouco
estudado. Pesquisas com dados levantados e organizados em contextos
históricos, especialmente nas realidades municipais, são ainda mais
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Cristina Simões Bezerra | Maria Lúcia Duriguetto
raras6. O que encontramos, por exemplo, nos anuários estatísticos
do IBGE, são dados fragmentados, descontínuos e seletivos sobre
associações voluntárias, nos quais predomina sua face tradicional,
assistencial e filantrópica e não (com a exceção dos sindicatos) o campo
caracterizado pela ação coletiva ou o campo dos grupos de defesa de
interesses e direitos7.
É com o objetivo de contribuir para este debate, que realizamos
uma pesquisa acerca do associativismo em Juiz de Fora. A importância
deste estudo, para além da contribuição ao debate das configurações
e características do associativismo brasileiro, é identificar as bases do
associativismo e dos processos de participação no município8 em suas
potencialidades e limites para a implementação do SUAS, que constitui
um dos objetivos da pesquisa tratada neste Livro.
6
Informações oficiais sobre organizações privadas de tipo associativo têm sido
residuais (as conhecidas pesquisas com base na Pesquisa Nacional por Amostra
de Domicílios/ PNAD, 1988/ e a Pesquisa Mensal de Emprego/PME, 1996, são
domiciliares e medem a participação associativa, não as organizações. Essas duas
pesquisas realizadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)
abrangeram seis das dez regiões metropolitanas do país: Recife, Salvador, Belo
Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo, Porto Alegre. Segundo os dados, as taxas
de associativismo girava, em 1996, em torno de 31%. Segundo Avritzer (2004,
p. 14), os dados do IBGE mostram um crescimento significativo da população
associada apenas nos casos das associações recreativas e religiosas, apontando a
quase estagnação no caso das associações comunitárias.
7
Entre 1996 e 2002 o número de entidades sem fins lucrativos cresceu 157%.
Trata-se de um conjunto formado, sobretudo por grupos de desenvolvimento e
defesa de direitos, religião, associações patronais e profissionais. Essa temática
é composta pela maior proporção de associações, em que temos o peso das
comunitárias e de moradores e entidades de defesa de direitos de grupos e de
minorias que são, em geral, denominadas de ONGs (entidades voltadas para a
defesa de mulheres, crianças, adolescentes, negros, índios, portadores do HIV,
de necessidades especiais). As de defesa de direitos e profissionais destacam-se em
termos de aumento relativo na participação do perfil associativo brasileiro. Em
termos de número de entidades, o primeiro lugar continua sendo o das religiosas
(cf. SHERER-WARREN, 2004).
A realização da presente pesquisa é uma continuidade de uma pesquisa realizada em
2007-08, Coordenada pela Profa. Maria Lúcia Duriguetto intitulada Participação
e Associativismo Popular em Juiz de Fora, cujos resultados parciais podem ser
consultados em Duriguetto, Ma. L et al (2009).
8
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
81
Apontamentos acerca do associativismo brasileiro e de sua relação com as políticas sociais
82
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Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
83
Capítulo 4
Apontamentos sobre o
AssociativismoMunicipalesua
relaçãocomasPolíticasSociais
Cristina Simões Bezerra1
Maria Lúcia Duriguetto2
Maria Zilda F. Martins3
Mariana de Almeida P. Maddalena4
A seleção das instituições pesquisadas foi feita a partir de um
levantamento realizado pelo Centro de Pesquisas Sociais da UFJF e dos
dados fornecidos pelo Conselho Municipal de Assistência Social de Juiz
de Fora. Estas fontes nos revelaram um universo de 132 instituições/
organizações/movimentos localizado nas diferentes Regiões Administrativas
do Município. Deste universo, 77 foram localizadas para a realização da
pesquisa. Seus representantes foram entrevistados por meio da técnica de
questionário, com perguntas abertas e fechadas. Neste item, a exposição
Professora Adjunta da FSS UFJF. Dra. em Serviço Social UFRJ
Professora Adjunta da FSS UFJF. Dra. em Serviço Social UFRJ
Aluna de Iniciação cientifica FSS- UFJF
Aluna de Iniciação cientifica FSS- UFJF
1
2
3
4
Apontamentos do associativismo municipal e sua relação com as políticas sociais
86
está organizada em subitens, que foram os eixos estruturantes das questões
formuladas no questionário.
1CaracterizaçãodaInstituição/Organização/
Movimento
Foram entrevistados representantes de 77 instituições/organizações/
movimentos conforme a tabela abaixo. A maioria delas se concentra na
região leste.
Tabela 1 - Distribuição das instituições/organizações/movimentos por regiões
Regiões
Instituições
%
Leste
26
33
Sudeste
9
11
Oeste
12
15
Nordeste
16
20
Centro
5
6
Norte
1
1,29
Sul
7
9,0
Sem endereço
2
2,59
Fonte: Pesquisa Análise das condições sociais, políticas e culturais e da intervenção profissional
do Assistente Social na implantação do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) em Juiz de
Fora (período 2005-2009).
Quanto ao que denominamos como natureza das instituições,
observamos a prevalência de instituições comunitárias (40,25%), religiosas
(29,87%) e filantrópicas (19,48%). Houve também uma menor incidência
(10,38%) de instituições cujos representantes mencionaram outra natureza,
como ajuda mútua, empresarial, particular, cultural, associação municipal,
associações recreativas e grupo de autoajuda.
Em relação ao perfil dos representantes, 55,84% são do sexo feminino
e 44,15% são do sexo masculino; 3,89% estão abaixo dos 30 anos; 14,28%
possuem de 30 a 40 anos; 27,27% possuem de 41 a 50 anos; 28,57%, de 51
a 60 anos; 19,48% de 61 a 70 anos e 3,89% estão acima de 70 anos.
No que diz respeito à escolaridade, verificou-se que 12,98% possuem
ensino fundamental incompleto; 11,68% possuem ensino fundamental
completo, 7,79%, ensino médio incompleto; 29,87%, ensino médio
completo; 7,79%, ensino superior incompleto; 22,07%, ensino superior
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Cristina Simões Bezerra | Maria Lúcia Duriguetto | Maria Zilda F. Martins | Mariana de Almeida P. Maddalena
completo e 7,79% possuem pós-graduação. No que se refere à área de
formação, alguns cursos se destacaram, tais como Serviço Social, Psicologia,
Pedagogia e Direito. É importante observarmos que este perfil aponta para
uma certa profissionalização dos representantes das instituições.
Com relação ao tempo de participação nas instituições/ organizações/
movimentos, constatou-se que 54,54% atuam de 1 a 10 anos; 23,37% de
11 a 20 anos; 15,58% de 21 a 30 anos; 1,29% mais de 30 anos e 3,89% não
informaram. Um representante informou atuar na instituição há menos de
um ano. Sobre este dado, é importante destacarmos que mais da metade dos
representantes iniciou sua militância nos últimos dez anos, mesmo período
do avanço do neoliberalismo no Brasil e da estratégia de refilantropização no
tratamento da questão social.
Com relação ao vínculo, a maioria dos representantes, 75,32%,
afirmou ser o dirigente da instituição; 14,28% são voluntários; 7,79% são
trabalhadores assalariados e 2,59% não informaram. Os representantes que
se declararam voluntários são, em sua maioria, membros de instituições
religiosas,10,38%, e filantrópicas, 3,89%.
Como podemos perceber, o número de pessoas que começou a
atuar nas instituições no contexto neoliberal é alto (77,92 %) e o número
de voluntários é quase o dobro em relação ao número de funcionários
contratados.
De acordo com as respostas coletadas, os motivos que levaram os
representantes a participarem da instituição/organização/movimento
seguiram direções bastante variadas. Contudo, algumas motivações aparecem
de forma recorrente, tais como: reivindicações para melhorias no bairro
(11,68%); motivações religiosas (9,09%) e interesse pela ação voluntária
(9,09%). No que diz respeito às instituições religiosas, é possível perceber
a preponderância de motivações de cunho particular nas respostas dos
representantes, tais como “garantir uma realização pessoal” e “se sentir útil”
após a aposentadoria.
Nas instituições comunitárias, por sua vez, nota-se que os motivos
que levaram os representantes a participar referem-se à atenção às demandas
imediatas de suas regiões e comunidades. No conjunto das outras
instituições, outros motivos também foram recorrentes, porém em menor
escala: questões relacionadas ao alcoolismo e dependência química, interesse
pela educação e trabalho com crianças, interesses profissionais e participação
em projetos sociais. Cabe salientar que apenas 2,59% dos representantes de
uma organização comunitária e uma cultural, relacionaram a motivação para
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
87
Apontamentos do associativismo municipal e sua relação com as políticas sociais
88
a participação a questões mais amplas que dizem respeito à democratização
da sociedade e da luta contra o racismo. Os motivos da participação estão,
assim, relacionados à atenção a demandas mais imediatas e locais e à busca
de respostas mais emergenciais às expressões da questão social, com uma
perspectiva de atenção para grupos específicos.
Ainda com relação à participação, vale ressaltar que todos os
representantes a consideraram importante, pois responde a diferentes
expectativas, tais como motivação pessoal (22,07%); motivos profissionais
(12,98%); importância de lutar pelos interesses do bairro (12,98%); interesse
pela ação voluntária e solidariedade (20,78%); motivos religiosos (6,49%);
melhorias nas condições de vida dos usuários (6,49%); atuação junto a um
segmento específico (6,49%); conscientização e construção de sociedade
mais justa (3,89%); busca de recursos orçamentários junto ao executivo
(2,59%); necessidade da existência de uma organização para responder às
demandas do bairro (2,59%); e 2,59% não responderam. Os itens que se
referem a motivações mais amplas, que refletem interesses por melhorias de
um coletivo, foram citadas exclusivamente por organizações comunitárias.
Quando indagamos sobre a principal contribuição que a participação
trouxe para a vida pessoal dos representantes, os entrevistados elencaram,
em sua maioria, mais de uma alternativa. Dentre as que mais se destacaram:
solidariedade e amor ao próximo (83,11%), ganhos espirituais (55,84%),
citado majoritariamente pelas instituições religiosas, aprendizado na
reivindicação dos direitos (49,35%), e consciência política (38,96%),
sendo que estes dois últimos itens foram enfatizados pelas organizações
comunitárias. Outras contribuições também foram citadas, porém em
menor escala, tais como: aprendizado na defesa de seus interesses e
ganhos materiais.
Em relação às atividades de capacitação e aos meios utilizados para se
atualizarem, a maioria dos representantes (79,22%) informou participar pela
necessidade de atualização e aperfeiçoamento dos conhecimentos. No que se
refere ao tipo de atividade de capacitação que participam, mais da metade
dos representantes informou palestras, seminários, cursos, assembléias e
oficinas, sendo que 49,35% mantém frequência eventual de participação e
27,27% são assíduos em suas participações. Dos entrevistados, 24,67% não
apresentaram informação sobre o tipo de atividade da qual participa. Já em
relação aos meios de informação utilizados pelos representantes para a sua
atualização foram elencados o jornal televisivo, conversas e jornal impresso.
Além destes meios de comunicação, alguns representantes também citaram,
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Cristina Simões Bezerra | Maria Lúcia Duriguetto | Maria Zilda F. Martins | Mariana de Almeida P. Maddalena
porém em menor escala, a internet. Os representantes das instituições
religiosas e filantrópicas elencaram as revistas, livros e rádio. É importante
registrar que 20,77% dos representantes revelaram não participar de nenhuma
atividade de capacitação ou de atualização, sendo que estes se concentram nas
instituições/organizações/movimentos religiosas e comunitárias. A principal
justificativa para esta não participação foi a falta de tempo e de recursos.
2 Histórico da Instituição/Organização/
Movimento Social
No que se refere ao tempo de existência das instituições/ organizações/
movimentos, a maioria é anterior à década de 1980: 10,38% surgiram nos
anos 50, 5,19%, nos anos 60, 11,68% na década de 70, 24,67% no decorrer
da década de 80, 29,87% nos anos 90 e 14,28% a partir do ano 2000. A
criação das religiosas se concentra nos anos 70; das filantrópicas laicas, nos
anos 80 e das comunitárias, na década de 90.
Quando indagados a respeito do motivo da criação da instituição/
organização/ movimento, as respostas concentraram-se em: busca de melhorias
nas condições do bairro (25,98%), enfatizadas pelas comunitárias, atenção
às demandas de segmentos sociais específicos (42,85%), citada por todos os
entrevistados, mas sobretudo ressaltadas pelas filantrópico-laicas; iniciativa
pessoal (9,09%), cuidado para com os necessitados (9,09%), organização
das demandas e difusão de informações (3,89%), promoção do amor ao
próximo (3,89%) e criação de elo entre poder público e comunidade (1,29%).
Algumas instituições não tinham esta informação (3,89%). Sobre este dado,
é importante ponderarmos que permanece uma motivação local (melhorias
nos bairros) e grupal para o surgimento destas instituições, o que fortalece um
traço ainda imediatista na organização da sociedade civil no município.
No debate realizado acerca das principais lutas que a organização tem
desenvolvido ao longo de sua existência, os representantes apontam que
estas giram em torno de três aspectos que se relacionam com demandas
institucionais (53,24%), demandas sociais (41,55%) e demandas
institucionais e sociais (2,59%). Vale registrar ainda que dois representantes
das instituições (2,59%) de natureza religiosa informaram que a organização
em que atuam não desenvolveu lutas neste período. As lutas mais elencadas
estão relacionadas às melhorias no espaço físico e ao reconhecimento da
comunidade. Já as demandas sociais relacionam-se com demandas imediatas
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
89
Apontamentos do associativismo municipal e sua relação com as políticas sociais
90
da população, tais como saneamento básico, doação de alimentos e diversas
melhorias para o bairro, tendo sido citadas, majoritariamente, organizações
comunitárias. No que diz respeito às demandas institucionais/sociais,
enfatizou-se a conscientização das famílias, a luta por recursos humanos, o
luta por transporte e a conquista de espaço físico.
Os dados reforçam a idéia de que as demandas postas encontramse setorializadas, como no caso em que mais da metade das instituições/
organizações/ movimentos lutam por demandas que se relacionam com
melhorias do espaço em que se instalam e, no campo social, por trazer
respostas às demandas imediatas.
No que se refere à problematização acerca das formas de
encaminhamento das lutas desenvolvidas pela instituição, os representantes
apontaram que, tanto as principais lutas desenvolvidas pela instituição/
organização/ movimento quanto às efetivadas no período de maior
concentração de conquistas foram encaminhadas de maneira similar, ou
seja, através de contatos com vereadores e prefeito (45,45%), reuniões com a
direção (12,98%) e contato com a comunidade (31,16%) - citado de maneira
preponderante pelas instituições religiosas. Em escala menor, informaram
que o encaminhamento das lutas se efetivou através de apoio da igreja
(7,79%), manifestações de protesto (9,09%), enfatizado pelas instituições
comunitárias e contato com os conselhos (3,89%). Esses dados evidenciam
o quanto as práticas de encaminhamento das demandas podem expressar
estratégias baseadas no clientelismo e na política de favores, comprovada pela
acentuada demanda para que os representantes do legislativo e do executivo
as atendam de forma individualizada.
Este processo nem sempre é percebido pelos representantes pois,
quando indagados acerca da relação que a instituição mantém com políticos e/
ou partidos políticos, a maioria dos representantes das instituições (88,31%)
informou que não existiu ou existe tal relação. Apenas (11,68%) dos
entrevistados afirmaram existir essa relação, os quais atuam, majoritariamente,
nas comunitárias e citaram contatos com vereadores e partidos políticos
diversos. Um número significativo de instituições (29,87%) citou o contato
com a comunidade no encaminhamento das lutas, o que nos parece um
dado positivo e importante. Porém, a análise da totalidade dos dados nos
faz indagar como e em que circunstância se dá este contato, bem como a
finalidade que o orienta.
Quando questionados sobre os principais problemas que as instituições
identificam na região em que atuam e no município, foi possível perceber
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Cristina Simões Bezerra | Maria Lúcia Duriguetto | Maria Zilda F. Martins | Mariana de Almeida P. Maddalena
que os representantes apontaram para problemas similares nestes dois
âmbitos. Argumentaram, em sua maioria, acerca da ausência de políticas
públicas nas mais diferentes áreas (57,14%), sendo que as mais citadas foram
saúde, educação, habitação, saneamento básico e trabalho. Ainda dentro
dos problemas mais citados, estão violência e drogas e, em menor escala,
segurança pública e recursos financeiros.
Quanto à problematização acerca das atuais demandas da instituição,
os representantes direcionaram seus apontamentos para o fato de que estas
se referem comumente à captação de recursos financeiros (37,66%), recursos
humanos (25,37%) e melhorias no espaço físico e na infraestrutura da
organização e da comunidade da qual faz parte (22,07%), o que evidencia
a predominância de demandas internas em detrimento das demandas mais
amplas. No entanto, podemos também concluir, a partir destes dados, que
as instituições ainda estão carentes de uma infraestrutura que permita a elas
potencializarem suas lutas e suas demandas, deixando de ampliar ou de
reorientar suas ações em razão destes limites.
No que se refere às estratégias utilizadas para o encaminhamento das
demandas, os representantes elaboraram respostas similares: contato com
vereadores e prefeito (37,27%), enfatizado pelas organizações filantrópicas
e comunitárias, contato com conselhos de direito (10,09%), citado
principalmente pelas instituições filantrópicas, contato com a comunidade
(29,27%), mencionado pelas instituições religiosas e contato com outras
instituições e órgãos municipais (12,38%), que foi a resposta mais recorrente
entre as organizações comunitárias. Este dado reitera um encaminhamento
que pode ser ainda referenciado pela troca de favores e pelo clientelismo, mas
demonstra também que, dentre as instituições comunitárias, parece existir
uma perspectiva de construção de lutas mais abrangentes e que congreguem
diferentes sujeitos coletivos, o que parece ser um diferencial importante na
condução das demandas.
Segundo os representantes, estas estratégias de definição dos
encaminhamentos das demandas são definidas em reuniões com a
comunidade (29,87%), majoritariamente citado pelas comunitárias, e
reuniões com membros da instituição/ organização/ movimento (71,42%).
Vale mencionar que os representantes das instituições de associação cultural
ou de ajuda mútua citaram que não há estratégias ou que esta é realizada
apenas pelo próprio dirigente.
Em relação ao processo de escolha dos representantes da instituição/
organização/movimento, em sua maioria (61,03%) se realiza através de
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
91
Apontamentos do associativismo municipal e sua relação com as políticas sociais
92
eleição direta com voto secreto ou da assembléia com voto aberto. Uma
parcela dos representantes (20,77%) destacou que esta escolha se realiza
por indicação.
Outro questionamento realizado diz respeito à participação da
população nas instituições/ organizações/ movimentos. Os representantes,
em sua maioria (67,53%), argumentam que esta ocorre e que é acentuada em
momentos de ocorrência de eventos promovidos pela instituição/ organização/
movimento, em datas festivas, religiosas e em situações emergenciais. Foi
citado pelos representantes que a divulgação e o conhecimento, por parte da
população, do trabalho realizado pela instituição/ organização/ movimento
é o fator responsável pela motivação à participação. No entanto, como
explicitado, esta participação está centrada em momentos e eventos festivos.
Parcela significativa dos representantes (32,46%) afirmaram não haver
participação devido à falta de interesse, de mobilização e de consciência
política por parte da população.
No item relacionado às reivindicações que mais mobilizam a
participação, apenas 31,17% dos representantes das comunitárias
enfatizaram questões relacionadas a políticas públicas (saúde, educação,
segurança, transporte, habitação), que apontam para demandas articuladas
a interesses mais amplos. Foram citadas como reivindicações que mais
mobilizam a população aquelas com caráter mais restrito, como demandas
institucionais (7,79%), demandas de segmentos sociais específicos (12,98%),
reivindicações individuais (5,19%) e questões relacionadas a infraestrutura
(15,19%). Vale registrar que uma parcela dos representantes das instituições
religiosas, comunitárias e filantrópicas (10,39%) informou que não existem
reivindicações que mobilizem a população, 5,19% não soube responder e
11,69% não tem esta informação.
A respeito das atividades que as instituições/ organizações/ movimentos
participaram nos últimos anos, os representantes, em sua maioria,
responderam mais de uma ação: lista ou abaixo assinado (35,06%), trabalhos
voluntários (75,32%), manifestações de protesto (15,58%), reuniões de
grupos locais (68,83%), conferências municipais (45,45%), conferências ou
reuniões de grupos locais (45,45%), reuniões e atividades dos conselhos de
direitos (31,16%), sendo os mais citados o de assistência, saúde e criança e
adolescente. Dentre as instituições comunitárias, as atividades evidenciadas
foram reuniões de grupos locais, trabalho voluntário e lista de abaixo
assinado, em escala bem menor também citaram manifestações de protesto.
Nas instituições de natureza filantrópica, sobressaíram ações como trabalho
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Cristina Simões Bezerra | Maria Lúcia Duriguetto | Maria Zilda F. Martins | Mariana de Almeida P. Maddalena
voluntário e conferências municipais e nas instituições religiosas as atividades
mais citadas foram trabalho voluntário e reuniões de grupos locais.
Estes dados apontam para uma diversificada ação destas instituições no
município. No entanto, podemos ver a acentuada ação em relação ao trabalho
voluntário. A maioria das instituições tem participado de conferências, que
representam um espaço de afirmação da participação popular e de construção
coletiva das demandas reivindicativas de políticas públicas no município.
Entretanto, a participação nos conselhos de direitos é residual.
3 Caracterizaçãodavisãodepolíticasocial/
assistência social
Neste outro eixo de discussões, buscamos analisar a relação entre as
instituições pesquisadas e a Política de Assistência Social.
No que se refere à indagação feita sobre o entendimento dos
representantes acerca das políticas públicas houve, majoritariamente,
(66,22%), a referência a um trabalho voltado para melhorar a vida da
população. Em menor escala, alguns representantes (6,49%) associaram seu
entendimento acerca dessas políticas à assistência social. Apenas 2,59% dos
representantes atuantes em instituições religiosas e de associação cultural
mencionaram que as políticas públicas constituem direitos de todo cidadão.
Vale registrar que 24,67% não souberam responder a essa questão.
A respeito da responsabilidade do Estado com relação às políticas
sociais, 35,06% acreditam que é dele o dever de garanti-las, 19,48%
atribuem à responsabilidade estatal a disponibilização de recursos financeiros
e contratação de profissionais, 6,49% acreditam que a responsabilidade é das
pessoas e não do Estado, item citado pelo menos uma vez por representantes
das instituições religiosas, comunitárias e filantrópicas e 38,96% não
souberam responder.
Com relação à indagação a respeito de como o Estado tem respondido
às suas responsabilidades para com a política social, as respostas ficaram
circunscritas entre 37,63% que afirmaram que o Estado tem respondido de
forma precária e 28,57% que afirmaram que o Estado não tem respondido
às necessidades da população, demonstrando reconhecer, ou pelo menos
identificar, o processo de desmonte do Estado impulsionado pelo ideário
neoliberal. Uma minoria (9,0%) de representantes afirmou que o Estado tem
respondido bem às suas responsabilidades, sendo que estes se concentram em
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
93
Apontamentos do associativismo municipal e sua relação com as políticas sociais
94
representantes das instituições comunitárias, 12,99% dos entrevistados não
souberam responder, sendo que metade são representantes de instituições
religiosas. Um representante de instituição religiosa (1,29%) e um de
organização comunitária (1,29%) informou que o Estado apenas responde
às reivindicações da população no período de eleição, 2,59% responderam
que o Estado tem respondido.
A análise dos dados referentes às políticas públicas aponta que é possível
perceber que os representantes reconhecem a responsabilidade pública no
que se refere às políticas sociais (embora a relativizem), demonstrando a
perspectiva de que o Estado ainda é reconhecido como a instância prioritária
para a garantia de direitos sociais.
Em relação ao conhecimento dos representantes acerca das políticas
públicas em Juiz de Fora, 66,23% não souberam responder, 18,18% citaram
a AMAC, sendo a metade destes representantes das instituições comunitárias,
e 7,79% citaram os conselhos. Em menor escala, as respostas enfatizaram
programas como o Bolsa Família, outros programas assistenciais municipais,
como também instituições e secretarias municipais de políticas sociais.
Apenas dois entrevistados enfatizaram o conteúdo das políticas, ressaltando
seu caráter clientelista e, no campo específico da juventude, ressaltaram o
caráter precário da política.
Tais dados corroboram com as respostas acerca das dificuldades
e limites que apontam na condução da política de assistência social no
município. A maioria dos entrevistados (59,74%) não soube responder,
sendo que as instituições religiosas em maior incidência. Os representantes
das instituições comunitárias (11,68%) ressaltaram a falta de investimento,
10,38% destacam a organização do sistema e também os interesses
eleitoreiros. Quando indagados acerca de como a administração municipal
tem tratado a política de assistência em relação às demais políticas
municipais, 31,16% não souberam responder, 23,27% afirmaram a
desatenção do poder público em relação à política e 9,09% explicitaram
que esta política tem recebido um tratamento mais positivo em relação
às outras, 2,59% ressaltaram que a política de assistência social tem sido
tratada da mesma forma que as demais políticas.
Os dados apontam para a confirmação da falta de uma concepção
mais crítica acerca do que constitui as políticas sociais. Os representantes
as relacionam muito mais com elementos, programas e instituições do que
com a dinâmica de correlação de forças ou de representação de interesses na
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Cristina Simões Bezerra | Maria Lúcia Duriguetto | Maria Zilda F. Martins | Mariana de Almeida P. Maddalena
sociedade, o que demonstra o desconhecimento e desarticulação da política
de assistência bem como o envolvimento com seus encaminhamentos.
Este elemento se confirma e se agrava quando analisamos acerca
do conhecimento a respeito do SUAS. A maioria (75,36%) respondeu
não conhecer o SUAS, o que foi também observado nas respostas acerca
da compatibilidade das ações da organização com o que está previsto no
SUAS, em que 83,11% dos entrevistados não souberam responder ou não
apresentaram informação.
Os representantes que informaram possuir conhecimento sobre
o SUAS (16,88%) atuam em instituições de natureza comunitária e
filantrópico-laica e relacionaram este conhecimento à implantação dos
CRAS ou fizeram referência a estes centros. Também foi destacado o
desenvolvimento da rede social.
Em relação ao conhecimento do processo de implementação do
SUAS, 74,02% dos representantes não souberam responder, assim como
também não souberam analisar o processo de implementação da política de
assistência social no município. Aqueles que revelaram ter conhecimento de
tal processo de implementação foram 23,37% dos entrevistados e 3,89%
elencaram a implantação dos CRAS. Dos entrevistados que conseguiram
analisar o processo, 6,49% afirmaram que este tem se dado de maneira
positiva, mas não identificaram os elementos que justificam essa afirmativa.
Apenas 2,59% representantes afirmaram que o referido processo tem se dado
de forma ruim, sob a alegação de que existe um número reduzido de projetos
na área da assistência social e falta de recursos.
4 Caracterizaçãodasaçõesdasinstituições/
organizações/movimentos
Com relação aos objetivos da instituição/organização/movimento,
36,36% estão concentradas no atendimento a demandas de segmentos sociais
específicos, o que foi mais evidenciado pelas instituições filantrópicas; 32,46%
destinam-se à ajuda para a promoção humana mencionado principalmente
pelas instituições religiosas, e 22,07% lutam pelo bem-estar da comunidade,
conforme destacado particularmente pelas comunitárias. As instituições
religiosas também destacaram como seus objetivos a orientação espiritual
(3,89%) e as comunitárias, a informação e a conscientização da população
(2,58%). Duas (2,58%) instituições de associação cultural citaram a luta
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
95
Apontamentos do associativismo municipal e sua relação com as políticas sociais
96
contra o preconceito como o seu objetivo principal. Quanto ao público
alvo destas instituições, foram mencionados, principalmente, crianças e
adolescentes (33,76%), moradores da comunidade (37,66%), população
carente em geral (15,58%), dependentes químicos (3,89%), portadores de
enfermidades como HIV, câncer, doenças renais (3,89%), idosos (2,58%) e
moradores de rua (2,58%).
O vínculo institucional dos participantes nas instituições se dá pela
via do trabalho voluntário (83,11%) e apenas 29,87% possuem vínculo
empregatício. Este dado comprova, mais uma vez, a lógica neoliberal
de fortalecimento do voluntariado e de encaminhamento da atenção das
manifestações da questão social por um processo de exaltação e de valorização
da ação solidária.
Outro dado que nos interessou particularmente foi saber como é o
vínculo de profissionais do Serviço Social com as instituições pesquisadas. Na
maioria delas (75,32%), não há profissional do Serviço Social. Nas instituições
em que há a presença deste profissional (23,37%), o vínculo empregatício
dos mesmos divide-se em contratados (15,58%) e voluntários (7,79%). As
instituições de natureza filantrópico-laica foram as que apresentaram a maior
presença de assistentes sociais com vínculo empregatício.
Em relação às principais demandas da população atendida, foram
citados serviços e políticas públicas (46,75%), resposta majoritariamente
enfatizada pelas comunitárias; 38,96% se relacionam com serviços
assistenciais, o que foi mencionado principalmente pelas religiosas; 19,48%
demandam atendimento de necessidades de segmentos específicos e 11,68%
apresentaram demanda por trabalho e qualificação profissional.
No que se refere às respostas às demandas da população atendida,
a maioria das instituições religiosas ressaltou as doações (12,98%). Os
representantes das comunitárias informaram que as respostas realizam-se
através de articulação com a prefeitura e órgãos competentes (14,28%). As
demais respostas ressaltaram o oferecimento de seus serviços e orientações
às famílias (18,18%) e a realização de encaminhamentos (12,98%). Uma
parcela dos representantes (9,10%) informou não estar respondendo às
demandas da população, 3,89% não souberam responder e 12,98% deram
respostas diversas. Este dado nos revela um atendimento emergencial às
demandas, constituindo uma condição de ausência ou de fragilidade de
articulações mais amplas e coletivas em torno das demandas da população. A
relação destas instituições com os conselhos de direitos também nos pareceu
uma informação relevante.
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Cristina Simões Bezerra | Maria Lúcia Duriguetto | Maria Zilda F. Martins | Mariana de Almeida P. Maddalena
A maioria dos representantes (54,54%) revelou não ter nenhum
conhecimento a respeito dos conselhos de direitos ou do trabalho por
eles desenvolvidos, sendo 20,77% representantes das religiosas. Os que
afirmaram ter conhecimento (40,25%), sendo mais da metade representantes
das comunitárias, citaram os conselhos da assistência, saúde e criança e
adolescente. A maioria dos representantes (63,63%) afirmou ainda que a
entidade em que participam não atuou ou atua como conselheira. Aqueles
representantes que informaram que a instituição já atuou ou atua como
conselheira (33,76%) citaram essa atuação nos conselhos de saúde, assistência
social, idoso, população negra e criança e adolescente.
No que se refere à fonte de recursos, as respostas recorrentes dos
representantes giraram em torno de doações, campanhas e contribuição
de sócios (57,14%), convênios/recursos AMAC (5,19%) pagamento de
mensalidades (10,39%), parcerias/convênios com a prefeitura (14,28%) e
eventos (2,58%). O número de instituições que recebem recursos públicos
é também significativo (19,48%), em que 14,28% recebem verbas do
governo municipal e 5,19% do governo federal. Vale registrar ainda que
10,39% dos representantes revelaram que a instituição não dispõe de
nenhuma fonte de recursos.
Em relação ao processo de planejamento e de avaliação das ações
desenvolvidas, a maioria (76,62%) desenvolve algum tipo de atividade com
esta finalidade. Apenas 22,07% das instituições não realizam este processo.
Das respostas afirmativas, a maioria (62,33%) é realizada através de reuniões,
sendo que em mais da metade delas são feitas apenas com a direção da
instituição. Em menor escala, estas reuniões são estendidas ao conjunto da
comunidade onde a instituição está inserida.
De forma geral, podemos afirmar que a preocupação dos representantes
com o processo de capacitação das pessoas que planejam, executam e
avaliam as ações das instituições é ainda relativamente pequena. Em apenas
44,15% delas afirmou-se a realização de palestras, cursos e seminários com
esta finalidade, enquanto 51,94% representantes responderam que não
existe nenhuma forma de capacitação, concentrados principalmente nas
instituições de natureza comunitária, (3,79%).
Ao serem indagados acerca das dificuldades para a realização das
atividades desenvolvidas, os representantes destacaram questões financeiras
(57,14%), falta de voluntários (42,85%), falta de espaço físico (5,19%),
falta de apoio e parceria dos órgãos públicos e da comunidade (3,89%).
Tais dificuldades, como podemos perceber, se referem principalmente a
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
97
Apontamentos do associativismo municipal e sua relação com as políticas sociais
98
questões internas à própria instituição, que demandam não só a organização
das mesmas, mas também um maior envolvimento da população atendida.
Em contraposição a estes dados, também houve um representante das
comunitárias que destacou o fato de dependerem do poder executivo e das
secretarias. Um representante das instituições filantrópicas citou a dificuldade
com a rede socioassistencial do município.
Quando indagados acerca da articulação da instituição com outras
organizações e movimentos sociais existentes no bairro e/ou no município,
50,64% dos representantes afirmaram que a instituição em que atuam
possui este tipo de articulação, principalmente com as instituições religiosas.
Os representantes também citaram as UBSs, associação de moradores,
escolas e programas da AMAC. No que se refere ao tipo de articulação, os
entrevistados afirmaram que é estabelecida em torno de ajuda, doações,
cursos de capacitação, convênio, encaminhamentos, utilização do espaço
físico, dentre outros.
5 Relação entre a instituição/organização/
movimento e o trabalho profissional do
Assistente Social
Em relação ao conhecimento dos representantes sobre atividades
realizadas pelo Serviço Social, constatou-se que 67,53% conhecem a prática
profissional do Assistente Social e a identificam, majoritariamente, através
de encaminhamentos, visitas domiciliares e no atendimento às famílias
e aos usuários em suas demandas específicas (sua atuação nas UBSs e
creches). Também foram citadas, por um representante das religiosas e por
um das filantrópicas, ações como conscientização e defesa dos interesses
e direitos da população. É importante ressaltar que, em muitas respostas,
percebe-se a presença de palavras como ajuda, auxílio, amparo, cuidado e
identificação de problemas.
Quando indagados sobre a realização de atividade do Assistente
Social, as respostas mostraram que em 58,44% das instituições/organizações/
movimentos, o Serviço Social não realizou atividades, resposta predominante
nas comunitárias e religiosas. Em 41,55%, houve a realização de trabalhos,
identificada em menor incidência nas religiosas e em maior nas filantrópicas.
Os representantes indicaram como a principal atividade realizada pelos
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Cristina Simões Bezerra | Maria Lúcia Duriguetto | Maria Zilda F. Martins | Mariana de Almeida P. Maddalena
Assistentes Sociais as visitas domiciliares, reuniões, trabalho com famílias,
palestras e encaminhamentos5.
Considerações e desafios
Compuseram o primeiro momento da nossa pesquisa questões
referentes à configuração das instituições/organizações/movimentos
(caracterização dos representantes, natureza, objetivos e ações desenvolvidas
pelas suas organizações, conhecimento da realidade municipal, entre outros.).
Quando questionados sobre os principais problemas que as instituições
identificam na região em que atuam, os entrevistados argumentaram, em sua
maioria, acerca da ausência de políticas públicas nas mais diferentes áreas,
sendo que as mais citadas foram saúde, assistência social, saneamento básico e
trabalho. A mesma argumentação foi recolocada pelos entrevistados quando
questionados acerca dos principais problemas que envolvem o município de
Juiz de Fora. Reafirmam a carência de políticas públicas e a falta de atenção
do poder público para com as comunidades, destacando as áreas de saúde,
segurança pública, trabalho, infância e juventude e educação.
Ao identificarem estes problemas, alguns entrevistados recolocam que
as expectativas de atenção das demandas do município ainda são depositadas
na figura do Estado e que a ausência ou o encolhimento deste em suas
responsabilidades, principalmente sociais, estratégia própria da orientação
neoliberal, acaba por reforçar uma perspectiva assistencialista e imediatista
no campo das políticas sociais.
O trabalho que as instituições/organizações/movimentos vêm
desenvolvendo nas comunidades em que estão inseridas também foi objeto
de problematização por parte dos entrevistados. No que se refere às principais
demandas atuais da instituição/organização/movimento, os entrevistados se
concentraram na apresentação de demandas internas e demandas externas,
que se referem, sobretudo, às condições e aos equipamentos sociais ausentes
nas regiões em que atuam.
Em sua maioria, os representantes reconhecem que as reivindicações
que mais mobilizam a população dizem respeito ao desenvolvimento de
5
Para uma reflexão acerca da relação do Serviço Social com as instituições/
organizações/movimentos que atuam no campo da assistência conferir o Capítulo 5
deste livro.
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
99
Apontamentos do associativismo municipal e sua relação com as políticas sociais
políticas públicas nas mais diferentes áreas, como a saúde, o saneamento
100 básico e a segurança pública.
Como vimos, uma das propostas de proteção social sob a ideologia
neoliberal veio da valorização do chamado “terceiro setor”. A justificativa
desta valorização reside na ideia de que não se deve partir somente do Estado
o provimento de bens e serviços, mas também das iniciativas particulares.
Durante a pesquisa, observamos que a maioria dos representantes tem
como objetivo desenvolver ações de assistência social, no atendimento às
necessidades materiais dos indivíduos, e observamos que grande parte das
ações realizadas estão na área da filantropia, da ajuda mútua. Poucos têm
como objetivo a promoção da defesa dos direitos. Pudemos constatar que
atuam com projetos e programas pontuais, seletivos e focalizados. Propõem
uma política de beneficência pública ou assistencialista, com um forte grau de
imposição sobre que programas instrumentar e quem incluir. Os critérios de
acesso dos “usuários” de suas ações nem sempre são publicamente definidos,
muito menos socialmente controlados.
Os representantes pesquisados ao se referirem às demandas e conquistas
de suas organizações partem de referências em o que se destaca não é o
discurso dos direitos ou da cidadania, mas a dimensão pragmática de uma
luta voltada para políticas e serviços localizados (para as suas regiões e bairros
de atuação) e para segmentos específicos.
Notamos que grande parte das instituições atuam com o apoio da
caridade individual e da solidariedade social devido ao fato de terem como
limites para a execução de seus serviços a falta de recursos financeiros e falta
de apoio do poder público. A forma de utilização dos recursos públicos
tampouco é transparente. O caráter voluntário ou o contrato precário do
trabalho não permite um vínculo duradouro necessário à continuidade dos
programas ou a uma profissionalização necessária à qualidade de suas ações.
A investigação do perfil dos representantes entrevistados levou à
identificação de indivíduos com pouca trajetória de militância política, déficit de
formação de novas lideranças (para a organização e mobilização das comunidades)
e de conhecimento acerca das políticas sociais, em particular da assistência social.
O conteúdo das entrevistas sinaliza uma valorização do contato das
associações com o poder executivo e legislativo para o encaminhamento das
demandas. Tais iniciativas não têm relação direta com a organização popular
e com a perspectiva de direitos, fortalecendo as práticas políticas clientelistas.
A ênfase na importância dos contatos com representantes do executivo e do
legislativo como forma de atendimento das demandas evidencia também uma
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Cristina Simões Bezerra | Maria Lúcia Duriguetto | Maria Zilda F. Martins | Mariana de Almeida P. Maddalena
desarticulação generalizada entre as instituições/organizações/movimentos
pesquisados, bem como a inexistência de formas de atuação voltadas para o 101
estabelecimento de relações com movimentos e organizações autônomas das
classes subalternas. Também revela a ausência de iniciativas de ocupação de canais
institucionalizados de participação nos campos da política, como os conselhos.
No que tange aos canais institucionalizados de participação, algumas
limitações comuns consistem na falta de informação sobre os espaços participativos
existentes, desarticulação dos movimentos sociais e a ausência de uma estratégia
articulada coletivamente para a ocupação dos espaços institucionais. Verificase uma escassez de conhecimentos a respeito dos acontecimentos e decisões
ocorridos nesses espaços. Tal constatação indica a ausência de interlocução
entre os movimentos participantes desses espaços e, por consequência, ausência
de estratégias coletivas que contribuíssem para aglutinar forças para a defesa de
bandeiras comuns em espaços onde interesses contraditórios encontram-se
representados. Muitas vezes essa desarticulação é atribuída à disputa de prestígio,
que coloca as lideranças na condição de rivalidade na disputa por recursos junto aos
setores públicos e privados. Tal fato é a expressão da fragmentação e setorialização
das reivindicações, e demonstra a necessidade de articulação entre as organizações
no sentido de ampliar a capacidade de luta e de intervenção nas políticas públicas.
Verificou-se, também, a marcante ausência de participação comunitária
nas instituições/movimentos/organizações, bem como a inexistência de
estratégias criadas por estas para fomentar e induzir esta participação.
O objeto de investigação, no segundo momento da pesquisa, foram
os eixos sobre a concepção de política social e a concepção de política de
assistência. Interessou-nos, aqui, analisar como é vista a política social
pública e a política de assistência na visão dos representantes.
Chama atenção o número significativo de representantes que não
souberam responder acerca do andamento das políticas sociais no município.
Este desconhecimento ganha contornos mais específicos quando observamos
que estes entrevistados reconhecem que a ausência de políticas públicas e a
demanda por elas por parte da população são marcantes nas regiões onde
atuam e no município.
Este dado revela pequena capacitação teórica e política dos
representantes destas entidades no entendimento do quadro operativo
e normativo maior aos quais suas ações estão dependentes. Em relação à
particularidade da política de assistência, essa lacuna se amplia.
O desconhecimento do SUAS e da política de assistência, bem como
o seu conhecimento sustentado apenas pelo conhecimento de programas e
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Apontamentos do associativismo municipal e sua relação com as políticas sociais
órgãos que são responsáveis pela condução da política no município, desdobra102 se nas respostas generalistas quando indagados acerca das dificuldades e
limites percebidos na condução da política de assistência social no município.
Nestas, a maioria destacou a falta ou má distribuição de recursos financeiros
e de investimento na política de assistência social. Os entrevistados também
não demostraram conhecimentos e condições de avaliar a atuação do poder
público municipal no campo da política de assistência, o que coaduna com
a desinformação acerca do processo de implementação dessa política exposto
anteriormente. Dessa forma, apesar de terem como lócus de atuação o campo
da assistência, a maioria dos entrevistados desconhecem o SUAS.
A relação entre direito e a política de assistência que se estabelece assume
significado inteiramente diverso de seu desenvolvimento como prática de
ajuda. Dessa forma, enquanto esta guia-se por princípios humanitários, por
sentimentos de dever moral, subjetivos e sujeitos à vontade e possibilidade
pessoais e políticas, o dever legal de assistência submete-se a alguns imperativos
públicos e ao controle social.
Podemos concluir que o chamado “terceiro setor” tem se tornado um
campo de fundamental importância para a execução das políticas sociais,
particularmente, da política de assistência. As concepções de política de
assistência, o desconhecimento das ações públicas federais e municipais dessa
política, seus objetivos etc., explicitados pelos representantes entrevistados, as
aproximam do ideário neoliberal e da concepção de política social defendida
por este, ou seja, o forte apelo à questão da filantropia e da solidariedade
social como ações que devem ser otimizadas ao lado das ações políticas
públicas seletivas e focalizadas.
Os dados da pesquisa revelam a configuração de organizações e
formas de participação inteiramente despolitizadas e despolitizadoras,
particularmente por preponderar uma cultura associativista religiosa cujos
ganhos de pertencimento são o do crescimento e enriquecimento espiritual
e o do desenvolvimento da solidariedade. Percebe-se, ainda, a inexistência de
movimentos sociais capazes de colocar em pauta algo mais que reivindicações
imediatas, pontuais e particularistas, centradas em demandas por serviços
que compõem o campo das políticas sociais.
Os conteúdos informativos dos dados levantados na realidade
municipal revelam um grande desafio para alimentar o “otimismo da
vontade”: a construção, pelas classes e camadas subalternas, de uma visão
integrada de suas necessidades, interesses, reivindicações e ações práticopolíticas, incorporando-as em um quadro abrangente e classista.
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Capítulo 5
O exercício profissional na
implementação do SUAS:
Projeto Ético Político, cultura
profissional e intervenção
profissional
Alexandra Aparecida T. Seabra Eiras1
Carina Berta Moljo2
Cláudia Mônica dos Santos3
Este capítulo tem como objetivo refletir acerca do exercício profissional
dos Assistentes Sociais no processo de implementação do Sistema Único
da Assistência Social em Juiz de Fora. Os parâmetros de análise foram as
dimensões ético-políticas, teórico-metodológicas e técnico-operativas
que constituem a intervenção profissional do Assistente Social. Nesta
direção, os eixos que balizaram nossas reflexões foram: 1) a apreensão da
Política de Assistência Social no campo da Seguridade Social brasileira na
Professora Adjunta FSS- UFJF. Drª em Serviço Social UFRJ
Professora Adjunta FSS- UFJF. Drª em Serviço Social. PUC-SP. Pesquisadora PQ CNPq
Professora Adjunta FSS- UFJF. Drª em Serviço Social UFRJ. Presidente da ABEPSS
1
2
3
O exercício profissional na implementação do SUAS: projeto ético político, cultura profissional e intervenção profissional
contemporaneidade e, dentro desta, a particularidade da Política Nacional
104 de Assistência Social no Governo Lula, com destaque para o modo de gestão
que ela inaugura e para a relação sócio-histórica de suas imbricações com o
desenvolvimento do capitalismo no Brasil; 2) a inserção sócio-ocupacional do
Serviço Social no âmbito da assistência social em Juiz de Fora, particularizada
pela mediação socioinstitucional materializada na Associação Municipal de
Apoio Comunitário – AMAC, responsável, até esta época, pela organização
e execução da política de assistência social no município e pelas instituições
conveniadas que constituem o “chamado” terceiro setor; 3) o projeto
profissional hegemônico no Serviço Social brasileiro, que fruto do processo
de renovação sob a perspectiva de intenção de ruptura, pode apreender
o significado sócio-histórico da profissão e de seus comprometimentos
ético-políticos, possibilitando o exercício da autonomia técnico-política
dos Assistentes Sociais. Tal projeto emerge como ruptura com uma cultura
profissional conservadora4, demonstrando um novo acúmulo político e
teórico no âmbito do Serviço Social.
Os dois primeiros eixos foram objeto de exposição nos primeiros
capítulos deste livro. Eles são centrais para a compreensão do exercício
profissional, considerando que a inserção sócio-ocupacional do Serviço Social
e sua apreensão implicam no desvelamento das mediações sócio-históricas
e socioinstitucionais, as quais atravessam as demandas ou as requisições
postas à profissão, constituindo as condições objetivas presentes no exercício
profissional. Essas condições objetivas aparecem na necessidade da profissão
em responder às demandas da sociedade e se expressam através de requisições
4
Partimos da compreensão que o conservadorismo seja um conjunto de ideias, um
modo de pensar que permeia tanto a teoria quanto a doutrina. Esta forma de pensar
se vincula historicamente ao pensador inglês Edmundo Burke (1729). Ele surge
como uma reação ao Iluminismo e ao projeto da modernidade. Tem imperativos
morais procurando conservar a ordem, tratando dos “problemas da integração e
desintegração”. Na década de 1930, nasce o reformismo conservador que procura
responder à questão social como uma questão moral e religiosa. O pensamento
conservador entende que seja o papel do Estado preservar e regular a força de
trabalho assim como “tutelar” os direitos que estavam sendo conquistados nesse
período histórico. Nessa direção é que surge o Serviço Social no Brasil, vinculado
à Igreja Católica, com bases doutrinárias. Será a partir de finais de década de 60
que o Serviço Social romperá, através de vertente de intenção de ruptura, com o
pensamento conservador, construindo outra concepção de sociedade, de sujeito e,
portanto, de Serviço Social. Esta visão está organicamente vinculada ao projeto éticopolítico-profissional, como veremos no transcurso deste artigo, para aprofundar
sobre essa questão.
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Alexandra Aparecida T. Seabra Eiras | Carina Berta Moljo | Cláudia Mônica dos Santos
sócio-profissionais e políticas, demarcadas pelas correlações de forças sociais,
105
principalmente, entre capital e trabalho.
A partir dessa compreensão, trabalhamos, neste capítulo, o exercício
profissional referenciado no projeto profissional hegemônico buscando
apreendê-lo no âmbito da cultura profissional do Serviço Social, a qual se
expressa, de modo heterogêneo, nas dimensões da intervenção profissional.
Nessa direção, problematizamos a intervenção profissional do Assistente
Social nas diferentes dimensões que a constituem: a teórico-metodológica, a ético-política e a técnico-operativa, entendendo que estas três dimensões
constituem uma unidade indissolúvel, mesmo que cada uma mantenha as
suas particularidades5, ou seja, elas constituem uma unidade na diversidade.
Trata-se de apreender a inserção do Serviço Social nos diferentes espaços sócioocupacionais, quer dizer na realidade concreta, bem como problematizar
a relação entre a intervenção profissional mediada pela condição de
assalariamento, ou seja, na condição de trabalho assalariado. Consideramos que o Serviço Social não se constitui como uma profissão
“homogênea”, mas sim, é uma profissão que tem projetos em confrontos e
que disputam a hegemonia. Esses projetos traduzem diferentes concepções
da profissão que, por sua vez, expressam a cultura profissional em seus
acúmulos teóricos, procedimentais e políticos, tensionados internamente e
confrontados com as condições objetivas e subjetivas presentes na ação dos
assistentes sociais.
Desta forma, este capítulo está assim constituído: no primeiro item
trabalhamos a cultura profissional e a construção do projeto ético-político no
Serviço Social Brasileiro. No segundo, trabalhamos a dimensão técnico-operativa
da intervenção profissional, oferecendo centralidade a um de seus elementos,
qual seja, os instrumentos e técnicas da intervenção por considerá-lo como um
dos elementos que expressa nossa cultura profissional e que materializa as demais
dimensões. Por último, nos detivemos na análise da intervenção profissional
do Assistente Social na implementação do Sistema Único de Assistência Social
(SUAS) através dos Centros de Referência de Assistência Social em Juiz de Fora
(CRAS) e rede conveniada, explicitando o processo de ação/compreensão dos
Assistentes Sociais, tendo como pressuposto a inserção do Assistente Social como
trabalhador assalariado (IAMAMOTO, 2007).
Assim, uma das preocupações que guiaram a nossa pesquisa foi a de
conhecer como os profissionais que estão inseridos na política de assistência
5
Ver Santos (2010).
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
O exercício profissional na implementação do SUAS: projeto ético político, cultura profissional e intervenção profissional
social compreendem e explicam o Serviço Social, a mediação com o projeto
106 ético-político e sua materialização no cotidiano profissional.
1 A construção da cultura profissional do
Assistente Social e a sua relação com o
projeto ético-político
O debate sobre “cultura ou cultura profissional” ainda não é muito
expressivo no âmbito do Serviço Social6, entretanto, como mostram diversas
pesquisas, ele vem crescendo, sobretudo, no âmbito da pós-graduação7.
Lembremos que o CBAS de 2010 foi o terceiro encontro da categoria a ter um eixo
de debate sobre esta temática.
Conforme os dados apresentados por Iamamoto em 2004, dentre as linhas de pesquisas
dos programas de pós-graduação, 14,5% trabalham sobre a “cultura e identidade:
processos e práticas sociais”, isto quer dizer que esta linha de pesquisa ocupava o terceiro
lugar dentro das linhas de pesquisas de todos os programas em 2004. Conforme os
dados apresentados por Carvalho e Silva (2005), a incidência das temáticas presentes nas
Áreas de concentração e Linhas de Pesquisa dos Programas de Pós-graduação em Serviço
Social mostram que a temática que envolve a cultura teve nove indicações, ocupando o
oitavo lugar em ordem decrescente. Se olharmos as linhas de pesquisa de cada programa,
teremos que a mesma é associada a diferentes temáticas, inclusive em alguns programas
ela faz parte de duas linhas de pesquisa (Subjetividade, Cultura, Práticas Sociais;
Questão Social, Relações de Poder e Cultura; Serviço Social, Sociabilidade, Cotidiano,
Cultura e Violência; Cultura, Identidade e Processos Sociais; Estado e Cultura; Cultura,
Representações Sociais e Políticas Sociais; Questões Sócioambientais, Estudos Culturais
e Desenvolvimento Sustentável; Cultura e Identidades Sociais; Política Social, Cultura
e Prática Sociais). A pesquisa também mostra que as produções do corpo discente dos
Programas de Pós-graduação de 1998 a 2002, com relação ao eixo da cultura e identidade
ou ética, cultura, política e direitos humanos, também não ocupam os primeiros
lugares, sendo que 4,60% das teses ou dissertações encontravam-se no eixo cultura e
identidade (ocupando o décimo lugar), enquanto que os eixos ética, cultura, política e
direitos humanos possuem 1,05% das teses ou dissertações (ocupando o décimo quarto
lugar). O que nos chama a atenção é que esta tendência é revertida na hora de analisar a
produção bibliográfica das pós-graduações no período compreendido entre 2001-2003.
No que diz respeito a livros e coletâneas 8,55% das produções encontram-se no eixo
ética, cultura, política, democracia, diversidade cultural, ocupando o quarto lugar dentro
de todas as produções. Já no que se refere a capítulos de livros, este eixo ocupa o primeiro
lugar dentre as produções bibliográficas (10,56%). Nos artigos publicados, este eixo
representa 7,74% da produção, ocupando o quarto lugar. Tudo isso demonstra que esse
eixo de análise vem crescendo dentro da nossa área.
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Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Alexandra Aparecida T. Seabra Eiras | Carina Berta Moljo | Cláudia Mônica dos Santos
Nas produções analisadas em outras pesquisas8 observamos que na maioria
das publicações existe uma referência à cultura, sobretudo relacionada às 107
políticas sociais, assim como a cultura política.
Entendemos que seja importante debater a dimensão da cultura na
configuração da profissão, já que esta expressa uma forma de conceber o
mundo e, portanto, uma forma de intervir na realidade concreta; implica ter
uma concepção dos sujeitos que se manifestam na forma de relacionarmos
com estes. Implica, ainda, escolher determinados objetos de estudos e
analisar o homem na sua sociabilidade humana. A dimensão da cultura
pode ser considerada como chave heurística para a analise de nossa profissão,
seja para a intervenção do Assistente Social, seja para o conhecimento dos
sujeitos, assim como para a compreensão da realidade concreta. Entretanto,
esta dimensão não pode ser isolada da totalidade social mais ampla. Ela se
inscreve dentro de uma totalidade maior e complexa. A cultura se inscreve
dentro do processo de construção da história, ela faz parte deste complexo
histórico, sendo a sua autonomia sempre relativa.
Williams (1992) afirma que cultura é uma palavra de origem romana,
criada a partir da expressão latina colere do cultivo, de cultivar alguma coisa.
Posteriormente, seu significado foi atribuído à civilização e, atualmente, está
relacionado às formas de expressão, arte, pensamento e ciência. Segundo
Bezerra (2006), a cultura surge, primeiramente, relacionada à categoria
trabalho, sendo que cada forma diferenciada de organização do trabalho
corresponde a um universo cultural equivalente.
Ainda segundo Bezerra (2006), Civilização irá evocar os progressos
coletivos alcançados por determinada sociedade através da cultura de seus
membros, significando o processo que arranca a humanidade da ignorância
e da irracionalidade. A civilização é, assim, um processo que pode e deve ser
estendido a todos os povos que compõem a humanidade, os quais devem
compartilhar do progresso oriundo da evolução humana.
Partimos do pressuposto de que é o sujeito histórico no seu “próprio
fazer-se9” quem produz a cultura, inserido numa classe que, coletivamente,
a transforma, a cria e a produz, determinada pelas condições concretas onde
este sujeito se insere e se reproduz. Estas condições não são “eternas”, elas
sofrem modificações no transcurso da história, conforme se desenvolve a
própria luta de classes.
Conforme Moljo et al. (2010).
A esse respeito ver Thompsom, (1987).
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Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
O exercício profissional na implementação do SUAS: projeto ético político, cultura profissional e intervenção profissional
Entendemos que a cultura expressa um modo de pensar e agir
108 sobre a sociedade. Desta forma, o Serviço Social vem construindo os
seus projetos de profissão dentro das diferentes visões de mundo que
parametrizam o mesmo no seu transcurso histórico, na sua gênese,
orientado por uma cultura profissional conservadora, passando pelo
processo de renovação – quando os projetos de profissão começam a
diferenciar-se –, até a contemporaneidade – quando temos uma cultura
profissional hegemônica que privilegia os direitos sociais afirmados
no nosso projeto ético político, como veremos a seguir. Conforme
Iamamoto (2004, p. 271) “É fundamental o rumo ético político do
projeto profissional, estimulando uma cultura democrática, o apreço à
coisa pública, atentando à dimensão cultural do trabalho cotidiano do
assistente social”.
Dessa forma, é importante salientar que a cultura nos auxilia na
compreensão da própria profissão, em algumas direções: nos permite decifrar
o seu modo de ser e de pensar, de refletir sobre os objetos de estudo, de
construir conhecimento sobre esses, e da, mesma forma intervir na realidade.
Mas também, nos permite compreender as classes com as quais trabalhamos,
o modo de ser das classes, a sua reprodução na vida cotidiana; a satisfação
ou não das necessidades sociais10. Permite analisar os processos de alienação,
mas, também as possibilidades de superação.
Nesta direção entendemos que o estudo da vida cotidiana é fundamental
para a compreensão do Serviço Social no seu “fazer-se” assim como para a
compreensão das classes subalternas – principais sujeitos a quem o Assistente
Social destina o seu exercício profissional.
Entendemos que a sociabilidade humana se constrói na vida cotidiana
dos sujeitos, espaço privilegiado da inserção do Assistente Social. Como
sabemos, o Assistente Social, é um dos profissionais que mais acesso tem à
vida cotidiana das classes subalternas, conhece as suas casas, as suas famílias,
penetram na “intimidade” destas classes, conhecendo os seus costumes, os
seus modos de pensar e de agir.
Concordamos com Netto (1996) ao afirmar ser a obra marxiana
aquela que tem fornecido um grande contributo ao estudo da vida cotidiana.
De forma sintética, poderíamos afirmar que é a vida cotidiana11 o âmbito
privilegiado da produção e reprodução da vida social.
Conforme Heller (1978).
Conforme Heller (1986, 1985), Lefevbre (1984) e Kosik (1967).
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Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
Alexandra Aparecida T. Seabra Eiras | Carina Berta Moljo | Cláudia Mônica dos Santos
Lefebvre afirma:
El estudio de la vida cotidiana ofrece un terreno de encuentro a las ciencias
parcelarias y también alguna cosa más pone de manifiesto el lugar de los
conflictos entre lo racional y lo irracional en nuestra sociedad, en nuestra
época. Determina así el lugar donde se formulan los problemas de la
producción en sentido amplio: la forma en que es producida la existencia
social de los seres humanos, con la transiciones de la escasez a la abundancia
y de lo precioso a lo despreciado. (1984, p. 35).
E ainda:
La cotidaneidad no solamente es un concepto, sino que puede tomarse tal
concepto como hilo conductor para conocer la “sociedad”. Y esto, situando
lo cotidiano en lo global: el Estado, la técnica y la tecnicidad, la cultura (o la
descomposición de la cultura) etc. Esta es, nuestra opinión, la mejor forma
de abordar la cuestión, el camino más racional para aprehender nuestra
sociedad y definirla penetrándo (LEFEBVRE, 1984, p. 41).
Portanto, não existe vida humana que não seja realizada na
cotidianeidade. É nesta instância que se produz a cultura e que se produz a
possibilidade de ultrapassar a cultura existente. É esse o espaço privilegiado
da reprodução social. Como analisaremos no momento de apresentarmos
os dados da pesquisa empírica, os Assistentes Sociais nem sempre têm o
conhecimento das classes com as quais trabalham. As condições objetivas
de trabalho nem sempre permitem acender-se a este conhecimento, já que
para aprofundar sobre condições de vida, projetos de vida, modos de vida,
enfim sobre a cultura, implica trabalhar com uma perspectiva que ultrapasse
o imediato, o “tratamento de emergência”.
Entendemos que seja fundamental aprofundar o conhecimento sobre
as classes subalternas12. Nessa direção, será preciso conhecer as suas formas
de organização13 e de resistência, e articular a nossa atuação com as próprias
organizações já existentes desta população, assim como articular com outros
profissionais.
Conforme Yazbek (1996), a categoria “subalterno” vem do legado gramsciano. Diz
respeito à ausência de poder de mando, de poder de decisão. A subalternidade diz
respeito ao mundo dos dominados, dos explorados.
Cf. Capítulo 3 e 4 deste livro.
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109
O exercício profissional na implementação do SUAS: projeto ético político, cultura profissional e intervenção profissional
Essa articulação torna-se estratégica, não somente para consolidar
110 uma política pública, uma cultura política de direitos, mas, sobretudo,
para indicar caminhos para a construção de uma cultura emancipatória
que vai ao encontro de nosso projeto ético-político, entendendo que a
cultura profissional “é constituída pelos objetos de pesquisas (âmbito
acadêmico), pelas práticas desenvolvidas (âmbito profissional) e pelas
dimensões objetivas e subjetivas que informam a constituição do sujeito
profissional” (MOTA, 2007, p. 3).
Conforme apontado acima, nos primórdios da profissão, a cultura
profissional era parametrizada por um profundo “conservadorismo14”,
moralizando a questão social, individualizando os “problemas sociais” e
culpabilizando os indivíduos pelas situações de pobreza. É no processo de
Renovação do Serviço Social15 - que se processa no Brasil a partir do Golpe
Militar de 1964 – que se rompe com o monolitismo imperante na profissão,
até então, produzindo o que Netto denominou de “pluralismo”. Como já
foi, suficientemente, analisado por Netto (1991), este processo assumiu três
direções: a modernização conservadora, expressa nos documentos de Araxá
(1967) e Teresópolis (1970), a reatualização do conservadorismo, expressa nos
documentos de Sumaré (1978) e Alto da Boa Vista (1982), e a Intenção de
Ruptura expressa inicialmente no método de Belo Horizonte (1972-75).
Conforme aponta Netto (1991), essa última perspectiva veio para se
confrontar com a autocracia burguesa em dois planos: no plano teórico-cultural, já
que os referenciais aos quais se recorreram se contrapunham com os hegemônicos
da modernização conservadora, e no plano político, que propunha uma concepção
de participação e cidadania que se opunha à institucionalidade da ditadura. Essa
perspectiva somente consegue emergir com a inserção da classe operária na cena
política brasileira e terá uma relação umbilical com a universidade.
Assim, desde o final dos anos 197016, vem sendo construída uma
nova hegemonia no Serviço Social, protagonizada pela vertente de “ruptura
IAMAMOTO, Marilda. Renovação e conservadorismo no Serviço Social: ensaios
críticos. São Paulo: Cortez, 1992.
Para um analise exaustiva do processo de renovação do Serviço Social, conferir a obra
do professor Netto (1991).
Outro momento significativo da direção de Intenção de Ruptura foi o III Congresso
Brasileiro de Assistentes Sociais, realizado em São Paulo em 1979. Este congresso ficou
conhecido como o “Congresso da Virada”, marcando um momento de inflexão no
Serviço Social Brasileiro. A esse respeito conferir Netto (2009) e Abramides (2007).
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com o Serviço Social Tradicional e com o conservadorismo” (NETTO,
1991). A emergência e a expressão desse projeto constituem uma nova 111
configuração na cultura profissional, próxima – e até mesmo inserida –
nos projetos da esquerda brasileira, nas ações progressistas de afirmação
e ampliação da cidadania. Convencionou-se denominar este projeto de
“projeto ético-político”.
O projeto ético-político tem em seu núcleo o reconhecimento da
liberdade como valor ético central – a liberdade concebida, historicamente,
como possibilidade de escolher entre alternativas concretas, daí o
compromisso com a autonomia, com a emancipação e com a plena expansão
dos indivíduos sociais (NETTO, 1999). Consequentemente, o projeto
profissional vincula-se a um projeto socioetário que propõe a construção
de uma nova ordem social, sem dominação e/ou exploração de classe,
etnia e gênero. A partir destas escolhas que o fundam, tal projeto afirma
a defesa intransigente dos direitos humanos e a recusa dos preconceitos,
contemplando positivamente o pluralismo.
Analisar a intervenção profissional referenciada pelo Projeto ÉticoPolítico do Serviço Social é uma tarefa necessária, haja vista a relevância
que esse projeto assume no âmbito da profissão por fundamentar-se no
processo de ruptura com o conservadorismo até então hegemônico: seja
pela re-organização da categoria nos Conselhos Regionais e Federal, nos
sindicatos, na Associação de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS)
e nas organizações estudantis, seja através da qualificação da produção
acadêmica referenciada criticamente e pela definição de marcos jurídicos
reguladores da profissão. Ou seja, este projeto reflete uma nova cultura
profissional que expressa a possibilidade de consolidação de referências
profissionais orientadas criticamente e comprometidas com horizontes
éticos, políticos, democráticos e emancipatórios, e de afirmação da luta
por uma sociedade igualitária.
1.1 Projeto ético-político: tensões, dificuldades e
possibilidades para o exercício profissional
A emergência do (Projeto ético-político) ocorre no contexto de lutas
pela conquista/ampliação – afirmação – dos direitos sociais no Brasil. Os
anos de 1980 (período culminante face aos enfrentamentos maciços da
sociedade brasileira com a autocracia burguesa manifestos desde o final da
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O exercício profissional na implementação do SUAS: projeto ético político, cultura profissional e intervenção profissional
década de 1970) incluem um conjunto de mobilizações, manifestações,
112 reivindicações que em muitas situações explicitam o confronto entre os
interesses e necessidades da classe trabalhadora, tensionados face aos interesses
da burguesia (NETTO, 1999; BRAZ, 2004). Essa conjuntura de lutas e
posicionamentos sociais, em um período de democratização, de avanços
democráticos efetivos para a classe trabalhadora, que se substancializam na
ampliação dos direitos sociais, foi o contexto que possibilitou a emergência
do Projeto ético-político através da vertente de ruptura com o Serviço Social
tradicional, a partir do acúmulo político-cultural, teórico-metodológico e
técnico-operativo alcançado no âmbito profissional.
Nesse sentido, as necessidades enunciadas pelos diferentes
movimentos sociais explicitaram a tensão, enunciaram e criaram novas
possibilidades para a sua satisfação. As respostas político-institucionais
(IAMAMOTO, 2007) emergentes nesse processo estão mais próximas
das necessidades reais dos trabalhadores e da população brasileira de um
modo geral.
Assim, o direito à saúde, à educação, à assistência social, à previdência,
o direito ao trabalho em condições de dignidade (jornadas de trabalho,
salário, salubridade), constituem um campo onde as lutas e enfrentamentos
possibilitam um avanço na direção das necessidades dos trabalhadores e da
maioria da população.
As conquistas no campo da seguridade social e a afirmação dos direitos
sociais na Constituição Brasileira de 1988 atestam os avanços efetivos, como
resultado desse conjunto de lutas e enfrentamentos.
Contudo, o projeto societário vinculado aos interesses da classe
trabalhadora – campo para o qual essas lutas e enfrentamentos tendem a
convergir – não catalisou a adesão da maioria da população brasileira, o que
ficou evidenciado nas disputas eleitorais de 1989 e 1993, com a derrota do
candidato Luis Inácio da Silva – Lula, pelo Partido dos trabalhadores, que
naquele momento representava a liderança desse projeto (BRAZ, 2004).
Na década de 1990, a oposição liderada pelo PT conseguiu resistir,
no âmbito do Legislativo, à maioria das investidas contra as conquistas
expressas na Constituição de 1988. Mas, no plano concreto: 1) as requisições
do processo de reestruturação produtiva, com o aumento da produtividade
a partir das estratégias de gestão da força de trabalho e, em menor escala,
pela utilização de novas tecnologias (particularidade brasileira, conforme
MOTA e AMARAL, 1998), articulado à redução dos postos de trabalho
(aumento do desemprego) e às estratégias de terceirização e precarização das
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relações de trabalho; 2) e a adoção da estratégia neoliberal (analisada no
capitulo I deste livro) impactando na redução de recursos para a seguridade 113
social pela proposição de um conjunto de reformas para a redefinição do
Estado, protagonizada pelo Ministério de Administração e Reforma do
Estado (MARE), tendo à frente o ministro Bresser Pereira, expressaram um
conjunto de restrições e regressões nas conquistas efetivadas.
Desde a década de 1990, as lutas regrediram ao nível da manutenção
do emprego e a expectativa pelos “mínimos sociais” foi reduzida a patamares
inferiores ao salário mínimo (que constituía o parâmetro do BPC na Lei
Orgânica da Assistência Social), como ocorre nos programas de transferência
de renda atuais, como o Programa Bolsa Família. As possibilidades vinculadas
a essa condição objetiva ficaram restritas às lutas segmentadas e pontuais. A
oposição político-partidária atuou na resistência pela manutenção do que
foi conquistado no plano jurídico-legal, pelo menos até a entrada do PT no
Governo Federal em 2003.
Nesse contexto, desde os anos 1990, década em que o Projeto éticopolítico foi divulgado expressivamente para o conjunto dos assistentes
sociais, principalmente a partir da formulação do Código de Ética de 1993 no qual são enunciados os princípios fundamentais do Projeto ético-político
do Serviço Social - o debate acerca desse projeto tem enfatizado as condições
concretas em que ele se manifesta enquanto horizonte para o exercício
profissional.
Os princípios que fundamentam esse projeto, explicitados no Código
de Ética de 1993, são: reconhecimento da liberdade como valor ético central
e das demandas a ela inerentes: autonomia, emancipação e plena expansão
dos indivíduos sociais; defesa intransigente dos direitos humanos e recusa do
arbítrio e do autoritarismo; ampliação e consolidação da cidadania, com vistas
à garantia dos direitos civis, sociais e políticos das classes trabalhadoras; defesa
do aprimoramento da democracia, enquanto socialização da participação
política e da riqueza socialmente produzida; posicionamento em favor da
equidade e justiça social, que assegure universalidade de acesso aos bens e
serviços relativos aos programas e políticas sociais, bem como sua gestão
democrática; empenho na eliminação de todas as formas de preconceito,
incentivando o respeito à diversidade, à participação de grupos socialmente
discriminados e à discussão das diferenças; garantia do pluralismo, através do
respeito às correntes profissionais democráticas existentes e suas expressões
teóricas e do compromisso com o constante aprimoramento intelectual;
opção por um projeto profissional vinculado ao processo de construção
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O exercício profissional na implementação do SUAS: projeto ético político, cultura profissional e intervenção profissional
de uma sociedade sem dominação – exploração de classe, etnia e gênero;
114 articulação com os movimentos de outras categorias profissionais que
partilhem os princípios deste Código e com a luta geral dos trabalhadores;
compromisso com a qualidade dos serviços prestados à população e com
o aprimoramento intelectual, na perspectiva da competência profissional;
exercício do Serviço Social sem ser discriminado nem discriminar por
questões de inserção de classe social, gênero, etnia, religião, nacionalidade,
opção sexual, idade e condição física.
A divulgação desse referencial, na conjuntura da década de 1990,
fortaleceu a hegemonia do PEP no âmbito da profissão, principalmente,
nas suas expressões: 1) político-organizativa; 2) na formação, na pesquisa
e na produção acadêmica (Diretrizes Curriculares de 1996); 3) no plano
jurídico-normativo através do CEP/1993, da Lei de Regulamentação
da Profissão 8662/93 e das resoluções do conjunto CFESS/CRESS;
4) no âmbito da intervenção – para os profissionais que assumiram um
posicionamento de resistência e de insistência na implementação dos
direitos garantidos juridicamente (ABRAMIDES, 2009; BOSCHETTI,
2004; SANT’ANA, 2000).
Em nosso entendimento, o PEP tem sido assimilado pelos assistentes
sociais e tem sido um guia do exercício profissional para uma parcela
significativa da categoria. Ao compreendermos o projeto ético-político
como um projeto profissional, conforme Netto (1999), observamos que a
construção da autoimagem da profissão na atualidade incorpora a visão de
que o Serviço Social é uma profissão inserida na divisão sócio-técnica do
trabalho. A autoimagem conservadora do Serviço Social como “vocação”, no
sentido neotomista do termo, conforme Barroco (2001), foi superada.
A autoimagem do Assistente Social como um profissional que atua
na defesa e na ampliação e na luta pela efetivação dos direitos sociais é
recorrente no Serviço Social. Está presente no modo como os profissionais
se autodefinem, se percebem, e como um horizonte que orienta seu exercício
profissional. Essa autoimagem é compatível com o horizonte ético-político
do projeto profissional e é constantemente reforçada nos espaços de debate
públicos da profissão – o que é confirmado em nossa pesquisa e apresentada
no item a seguir.
Uma vez que essa autoimagem é recorrente entre os Assistentes
Sociais, é possível afirmar que o projeto profissional está atuando como guia
da intervenção profissional a partir desse horizonte de defesa e ampliação
dos direitos sociais (EIRAS, 2011). Tal conclusão é adensada, quando ao nos
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
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aproximarmos do exercício profissional dos assistentes sociais observamos que
a dimensão técnico-operativa está relacionada a esse conteúdo/horizonte, pela 115
via da informação aos usuários acerca dos seus direitos, pela via da inserção
dos profissionais nos diferentes Conselhos de Gestão de Políticas Públicas,
espaços onde a possibilidade de resistência ainda existe, no sentido do controle
social e da insistência na qualificação dos serviços prestados à população.
Nessa direção, o CFESS (1996) indica que a estratégia fundamental para
enfrentar os desafios postos ao PEP na atualidade é a participação nos fóruns
de discussão, formulação e controle social das políticas públicas.
Na dimensão ético-política, a apropriação do PEP torna-se possível
nos pontos de convergência entre a experiência cultural dos assistentes sociais
na sociedade e as possibilidades de lutas nesse contexto.
Nossa hipótese é que essa convergência ocorre na dimensão da
defesa, afirmação e ampliação dos direitos, um conteúdo cuja viabilidade
ainda se apresenta como um horizonte possível para o profissional, seja
pelas conquistas recentes na década de 1980, seja pela existência de práticas
coletivas capazes de mobilização e de reivindicação, ou de resistência, que
atualizam a luta pela afirmação de direitos, seja pela existência de espaços de
organização e também de controle social que ainda sugerem a possibilidade
de tensionamentos e articulações.
Nesse campo, Raquel Sant’ana (2000) enfatiza que a adesão aos
princípios éticos instituídos pelo Código de ética profissional de 1993
pressupõe um compromisso político com o seu conteúdo transformador. Tal
compromisso nem sempre acontece no cotidiano do exercício profissional.
Na pesquisa empírica realizada pela autora, ela verifica que o PEP está
presente na atuação de 30% dos Assistentes Sociais entrevistados na área
da infância e juventude, através de seu engajamento ético-político e de seu
desdobramento em ações ou proposições de projetos e atividades no âmbito
institucional. Para ela, em qualquer espaço institucional é possível e exequível
uma prática comprometida com o PEP, a partir de um alinhamento teóricopolítico com esse projeto.
Para Maria Lúcia Barroco (2004), um dos problemas refere-se ao
fortalecimento da identidade profissional, à construção de um ethos [crítico]
que, conforme o artigo da ABEPSS (2004), é atravessado pelos processos de
alienação, discriminação, desrespeito, [ainda] autoritarismo, despolitização,
comodismo, fatalismo e subordinação. Como esse ethos crítico (nessa nova
cultura profissional) pode ser capaz de sustentar uma tomada de posição
ética e política que tensione esses processos?
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O exercício profissional na implementação do SUAS: projeto ético político, cultura profissional e intervenção profissional
Para Beatriz Abramides (2007), os novos desafios a serem enfrentados
116 no século XXI, a partir do Governo Lula, são: a esfera da institucionalidade e a
política de conciliação de classes do PT. Tais desafios expressam um conjunto
de determinações e, para enfrentá-los, torna-se necessário compreender,
interpretar e polemizar essas questões em um debate contínuo. A questão de
fundo é a manutenção da autonomia do projeto profissional face ao governo,
partido ou patronato.
Yolanda Guerra (2007) explicita a tensão no Serviço Social
entre o projeto profissional hegemônico (PEP) e as correntes
vinculadas ao pensamento conservador, revigoradas no contexto
dos anos 2000. Segundo a autora, existe um debate mascarado,
que desqualifica tal projeto, tanto do ponto de vista da sua não-implementação imediata quanto pela existência de projetos que se
confrontam com ele. Guerra argumenta que os projetos não se implementam
de modo imediato e que hegemonia não é sinônimo de homogeneidade e
nem ausência de confrontos e disputas. O desafio central para o Assistente
Social é realizar a crítica aos fundamentos da cotidianidade, na qual se insere
o profissional e também os usuários de seus serviços. É necessário reconhecer
esses fundamentos para transcendê-los.
A autora enfatiza os componentes do projeto profissional: técnicos,
teórico-metodológicos, éticos e políticos. Tais componentes qualificam a
prática profissional e a diferenciam daquelas realizadas por leigos, tornando
o exercício profissional consciente para os seus agentes. Uma implicação
direta da opção por determinados valores no campo da emancipação, da
democratização econômica e social e no campo da defesa das políticas públicas
exige o posicionamento do Assistente Social contra os diferentes modos de
dominação, preconceito, autoritarismo, concentração de renda, exploração
do trabalho pelo capital, os quais se expressam também na privatização da
vida social e no individualismo. Em síntese, Guerra explica que ser orientado
por um projeto progressista significa para o profissional a possibilidade de
adotar estratégias sociopolíticas e profissionais que acumulem forças com a
luta mais ampla dos trabalhadores.
Outro conteúdo importante no debate acerca do PEP, de suas
dificuldades e possibilidades no contexto atual, é a análise acerca das condições
objetivas de inserção do Assistente Social nos espaços sócio-ocupacionais,
como trabalhador assalariado (IAMAMOTO, 2007).
Iamamoto (2007) explica que embora a concepção segundo a qual
o Serviço Social é uma profissão inserida na divisão social e técnica do
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
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trabalho, historicamente determinada, tenha sido difundida na profissão, o
percurso teórico-metodológico, e os fundamentos dessa concepção, não está 117
igualmente difundido. Para ela,
A concepção de profissão [inserida] na divisão social e técnica do trabalho,
apresentada pela autora (referindo a sua obra), em 1982, tornou-se de
domínio público, mas não os seus fundamentos. Entretanto, eles indicam
um percurso teórico-metodológico capaz de elucidar o significado social
do exercício profissional do assistente social na divisão social e técnica do
trabalho coletivo: como ele participa do processo de produção e reprodução
das relações sociais. Daí a necessidade de retomá-los, incorporando e
ampliando a abordagem anterior, tendo em vista recolher elementos
que permitam atualizar e fundamentar a leitura do trabalho do assistente
social como uma especialização do trabalho coletivo na sociedade presente
(IAMAMOTO, 2007, p. 29)
Nessa direção, a autora explicita que o “trânsito da análise da profissão
ao seu efetivo exercício agrega um conjunto de determinações e mediações
no trabalho profissional mediado pela compra e venda dessa força de
trabalho especializada às instituições empregadoras” (IAMAMOTO, 2007,
p. 40). E continua:
Essas relações estabelecidas com sujeitos sociais distintos condicionam
o processamento do trabalho concreto cotidiano e o significado social de
seus resultados, ao mesmo tempo em que impregna essa atividade dos
constrangimentos do trabalho alienado. Eles restringem em graus variados a
autonomia profissional na direção social desse exercício, com incidências na
sua configuração técnico-profissional” (IAMAMOTO, 2007, p.40).
Desse modo, Iamamoto analisa a tensão existente entre projeto
profissional e condição assalariada. No trabalho assalariado, “a autoobjetivação do sujeito metamorfoseia-se na sua própria negação, na perda do
controle de sua atividade e de seu tempo de vida, subordinada a finalidades
que lhe são estranhas” (IAMAMOTO, 2007, p. 41).
Nesse sentido, a superação dessa alienação, pela consciência dela e pelo
enfrentamento coletivo face a essa condição, torna-se relevante. Se, por um
lado, o PEP é tensionado por essa inserção concreta dos Assistentes Sociais,
por outro lado, ele é a possibilidade de consciência – posto que se constitui
em um projeto coletivo – e de enfrentamento [coletivo] dessa condição.
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O exercício profissional na implementação do SUAS: projeto ético político, cultura profissional e intervenção profissional
A apreensão do exercício profissional pela condição de assalariamento
118 do Assistente Social nos aproxima do modo como essas determinações
tensionam o seu trabalho. Por sua vez, a explicitação dessa condição nos
posiciona frente à premência de ações articuladas com a classe trabalhadora.
Essa angulação nos aproxima novamente do PEP e nos faz ver a relevância
de suas formulações e a abrangência de sua referência teórico-metodológica.
2 Projetoético-político,culturaprofissionale
dimensões da intervenção profissional
No Brasil, o Serviço Social configura-se, juridicamente, como uma
profissão liberal. Porém, historicamente, o exercício profissional vincula-se
à inserção sócio-institucional, relacionada predominantemente às políticas
sociais públicas e privadas materializadas nas organizações/instituições que
prestam serviços à população em geral.
Na década de 1980, com a institucionalização da Seguridade Social,
sustentada no tripé saúde, assistência social e previdência – pela afirmação
da Saúde e da Assistência como direitos não contributivos e, desse modo,
reconhecidos como necessidades sociais assumidas pelo Estado, o qual se
responsabiliza diante da sociedade pela formulação de políticas públicas
nessas áreas –, os espaços sócio-ocupacionais do Serviço Social se expandem.
Essa expansão ocorre de modo qualificado, exigindo dos Assistentes
Sociais competências no âmbito do planejamento e da execução das
políticas públicas (IAMAMOTO, 2007), a partir de procedimentos
organizacionais elaborados na lógica da racionalidade burguesa impactada
pela reestruturação produtiva (MOTA; AMARAL, 1995) e sua intrínseca
relação com a ideologia neoliberal.
Enquanto trabalhador assalariado, o Assistente Social encontra os meios
de trabalho determinados no âmbito sócio-organizacional com processos de
trabalho já definidos e planejados previamente. Na organização/instituição,
materializam-se as normas de funcionamento, os parâmetros trabalhistas,
tais como a intensidade do trabalho, a jornada de trabalho, o salário, as
formas de controle sobre o processo de trabalho (metas a cumprir, padrões
de eficácia, índices de produtividade, avaliações); os recursos materiais,
financeiros, humanos e técnicos indispensáveis à objetivação do trabalho. A
organização/instituição em sua lógica interna indica os meios pelos quais as
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expressões da questão social serão compreendidas e se tornarão “objeto de
119
intervenção” para o Serviço Social (IAMAMOTO, 2007).
Por outro lado, o modo como os profissionais apreendem a sua inserção
sócio-institucional expressa os conteúdos teórico-metodológicos presentes
em sua análise que, por sua vez, atuam como eixos orientadores em relação
à intervenção profissional. Ou seja, não apenas as condições objetivas, mas
também as condições subjetivas são conteúdos relevantes para a intervenção
profissional.
Quais são os conteúdos teórico-metodológicos presentes na
compreensão dos Assistentes Sociais? Como eles se articulam à dimensão
técnico-operativa? No processo cotidiano do exercício profissional quais as
correlações de forças presentes na relação com os usuários, com a organização/
instituição e com a categoria profissional? Estas questões são fundamentais
para delimitar o projeto de profissão que orientam a intervenção profissional
do Assistente Social.
Segundo Iamamoto (2004), para a consolidação do Projeto éticopolítico profissional, são necessárias estratégias técnicas e políticas que
proporcionem ações coletivas que viabilizem propostas profissionais
capazes de ir além das demandas instituídas. Essa afirmativa nos permite
explicitar que a dimensão técnico-operativa da intervenção profissional
materializa em ações as concepções teórico-metodológicas e ético-políticas
que orientam o profissional. Ou seja, as duas últimas evidenciam a direção
e as finalidades assumidas pela profissão em dado momento histórico que
vão ser materializadas a partir da primeira. Isso implica afirmar que uma
competência profissional se faz, necessariamente, nestas três dimensões.
Guerra (2007) destaca que a cultura profissional possibilita aos
profissionais uma construção coletiva que serve de referência para toda
a categoria através da mediação entre conhecimentos e saberes (técnicos,
teóricos e interventivos) e entre estes e as particularidades da profissão. Com
isso, a competência teórico-metodológica, ético-política e técnico-operativa é
fundamental para que os profissionais possam refletir sobre a sua intervenção
e recusar uma intervenção profissional baseada na reprodução automática
de ações meramente conservadoras. Isso só é possível quando a categoria
profissional articula em suas ações todas as dimensões da prática profissional,
reconhecendo a dimensão técnico-operativa não como, puramente,
instrumental, o que contribui na elaboração de respostas mais qualificadas,
na construção de novas legitimidades que a razão instrumental não dá conta.
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O exercício profissional na implementação do SUAS: projeto ético político, cultura profissional e intervenção profissional
Ainda Guerra considera que a dimensão técnico-operativa se constitui
120 no modo de aparecer da profissão, pelo qual ela é conhecida e reconhecida.
Como profissão interventiva no âmbito da chamada “questão social”, é esta
a dimensão que vai dar visibilidade a profissão pela qual é demandada, já
que dela depende a resolutividade da situação apresentada ao profissional.
Contudo, apesar de necessária, a dimensão técnico-operativa, se considerada
de maneira autônoma, é insuficiente para dar respostas qualificadas à
realidade social. Ressalta a autora que, “como razão de ser da profissão”,
essa dimensão remete às competências instrumentais pelas quais a profissão
é reconhecida e legitimada; porém, ainda que seja necessário atendê-las, o
exercício profissional não pode se limitar às competências instrumentais.
Fundamentados na concepção de que os instrumentos e técnicas
constituem um dos elementos da dimensão técnico-operativa, destacamos,
neste estudo, o uso dos instrumentos e técnicas na intervenção profissional
dos assistentes sociais, entendendo que os conteúdos postos em seu manuseio
e a forma de utilizá-los expressam as concepções teórico-metodológicas e
ético-políticas dos profissionais.
O instrumento é considerado como um dos elementos que permitem
a operacionalização da ação como elemento potencializador da ação e
a técnica, é a habilidade no uso desse instrumento, como uma qualidade
atribuída aos instrumentos. Ambos são imprescindíveis para a concretização
do exercício profissional desde que situados no projeto profissional, não
podendo ser tratados de fora da instrumentalidade da profissão, uma vez
que constituem e são constitutivos do modo de ser da profissão (SANTOS;
NORONHA, 2010).
A concepção de instrumentos explicitada na literatura crítico-dialética
aponta seu caráter histórico e teleológico. O caráter histórico encontrase em dois aspectos: no fato dos instrumentos formarem um conjunto
dialeticamente articulado com as técnicas e, por isso, constantemente
serem aprimorados por elas, diante da exigência de adequação das
transformações da realidade. E, também, por visarem o atendimento das
mais diversificadas necessidades sociais que se colocam em determinadas
condições econômicas e sociais, sendo influenciado pelas relações sociais
postas na sociedade capitalista. Conforme Trindade (1999, p. 81): “A
criação e a utilização de instrumentos e técnicas configuram um processo
histórico, que se coloca em determinadas condições econômicas e sociais,
em diferentes momentos históricos”.
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No que se refere ao caráter teleológico, a escolha dos instrumentos de
intervenção está relacionada às diversas intencionalidades: à intencionalidade 121
da profissão, do profissional, da instituição e da população que procura o
Serviço Social. Tanto a escolha do instrumento quanto o domínio do mesmo
requerem que o profissional tenha consciência/conhecimento pelo suas
finalidades, uma vez que os instrumentos fazem parte do processo de busca
pelo alcance dessa finalidade.
A profissão, de acordo com o projeto ético-político hegemônico,
assume o compromisso com a defesa intransigente dos direitos humanos, com
a ampliação da cidadania, com a qualidade dos serviços prestados, com a luta
em favor da equidade e da justiça social. Compromissos estes que devem ser
materializados nas atividades desenvolvidas pelos assistentes sociais, que só
são possíveis com o espaço de participação e avaliação da população sobre os
serviços prestados. Para isso, os profissionais devem privilegiar a utilização de
instrumentos de caráter democrático, coletivo, menos burocrático, sempre
alinhados com a realidade em que intervêm.
O conhecimento da realidade é imprescindível neste processo de
escolha. A apreensão da dinâmica da realidade contribui para que haja
coerência entre os instrumentos utilizados e as determinações assumidas pela
questão social nos diferentes espaços sócio-ocupacionais, permitindo que o
Assistente Social consiga alcançar os resultados esperados na ação.
Na utilização do instrumental técnico-operativo, são necessárias
algumas competências importantes. A primeira é a competência teóricometodológica, através da qual os profissionais conseguem fundamentar
sua leitura da realidade. Destacamos que quanto maior o conhecimento
teórico, mais amplo será a cadeia de mediações e maiores as possibilidades
encontradas para a intervenção. Assim, através do referencial teóricometodológico, percebe-se a intencionalidade e a direção social empreendidas
na ação, podendo orientar a escolha de instrumentos e técnicas capazes de
materializar essa intencionalidade.
Por isso, outra competência é a ético-político, para a qual deve-se
considerar os princípios e normas para o exercício profissional contidos
no Código de Ética do Assistente Social e, também, as disposições sobre o
exercício da profissão – a lei 8662/93 que dispõe sobre as competências e
atribuições privativas do assistente social.
Além das competências teórico-metodológicas e ético-políticas,
encontra-se também a competência técnica, relacionada à habilidade do
profissional na utilização dos seus instrumentos de trabalho. Contudo, os
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O exercício profissional na implementação do SUAS: projeto ético político, cultura profissional e intervenção profissional
profissionais precisam adquirir todas essas competências e articulá-las para
122 materializar as intencionalidades da profissão na prática profissional. Como o
Serviço Social não possui um instrumento exclusivo, a clareza do significado
social da profissão, suas competências e atribuições, a direção assumida
pelo projeto ético-político e a habilidade de utilizar este instrumento de
acordo com as finalidades da profissão é que vão permitir que os mesmos
instrumentos sejam utilizados por diferentes profissões ou pela mesma
profissão, porém, com direções diferentes.
A utilização dos instrumentos exige habilidade técnico-operativa
que vai além do domínio dos procedimentos corretos como, por exemplo,
realizar uma entrevista, reunião etc. Por trás de uma aparente neutralidade,
a aplicação dos instrumentos articula dimensões econômico-sociais e
ético-políticas, relativas aos sujeitos profissionais individualmente e aos
sujeitos de classe.
O uso das técnicas e estratégias não deve contrariar os objetivos,
diretrizes e competências assinalados. Segundo orientações do CFESS
(2009, p. 31)
As condições objetivas de estruturação do espaço institucional devem
assegurar aos (às) profissionais o direito de realizar suas escolhas técnicas
no circuito da decisão democrática, garantir a sua liberdade para pesquisar,
planejar, executar e avaliar o processo de trabalho, permitir a realização de
suas competências técnica e política nas dimensões do trabalho coletivo e
individual e primar pelo respeito aos direitos, princípios e valores éticopolíticos profissionais estabelecidos nas regulamentações profissionais.
A tensão entre o PEP e a inserção do Assistente Social como trabalhador
assalariado aparece nos instrumentos e nas técnicas adotadas nos espaços
sócio-ocupacionais, na burocracia organizacional. Ir além do atendimento
à demanda sócio-institucional requer o desenvolvimento de habilidades
políticas no processo de formação de alianças e articulação com os próprios
usuários dos serviços. Tal posicionamento político requer uma abertura
democrática no plano institucional que aceite o debate e o posicionamento
diferenciado. As condições objetivas de trabalho podem favorecer a
articulação política ou dificultá-la. Nesta direção, o item a seguir analisa a
intervenção profissional dos Assistentes Sociais no âmbito da PNAS.
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3 Oexercícioprofissionalesuasexpressões
teórico-políticas e técnico-operativas no
âmbitodapolíticadeAssistênciaSocialem
Juiz de Fora: possibilidades e desafios
Neste item apresentaremos os dados coletados e organizados na
pesquisa “Análise das Condições Sociais, Políticas e Culturais e da Intervenção
Profissional do Assistente Social na Implantação do Sistema Único de
Assistência Social em Juiz de Fora (SUAS) e Região”. A coleta de dados foi
realizada em 2009 através de:
1. formulários aplicados aos Assistentes Sociais envolvidos com a
Política Municipal de Assistência Social PMAS em Juiz de Fora
(37 formulários aplicados aos assistentes dos CRAS e da Rede
Conveniada);
2. realização de 01 grupo focal e 02 laboratórios com os Assistentes
Sociais dos nove CRAS de Juiz de Fora (contando com a presença de
15 assistentes sociais, em média);
3. transcrição do Simpósio realizado com docentes, profissionais
e discentes com produções sobre a temática dos instrumentos e
técnicas e/ou envolvidos nesta pesquisa: 22 Assistentes Sociais dos
CRAS de Juiz de Fora; 03 assistentes sociais das Unidades Básicas
de Saúde; 05 profissionais do Grupo de Pesquisa “Serviço Social,
Movimentos Sociais e Políticas Públicas”; 12 alunos bolsistas do
núcleo de pesquisa e/ou dedicados a pesquisas relacionadas à esta
temática e 5 professores convidados para serem debatedores.
A realização do Grupo Focal e do Simpósio foi importante, uma vez
que, somente com as entrevistas não foi possível conhecer a concepção dos
Assistentes Sociais sobre os instrumentos e técnicas da intervenção, bem
como o “como” e o “por que” de seu manuseio. Portanto, as transcrições
desses dois instrumentos foram utilizadas por nós, apenas, ao analisarmos
a intervenção profissional no que se refere a esses elementos da intervenção
profissional.
Seguindo a direção do CFESS (2009), quando sinaliza que para o
exercício profissional são necessárias três dimensões indissociáveis: as
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123
O exercício profissional na implementação do SUAS: projeto ético político, cultura profissional e intervenção profissional
atividades exercidas pelos trabalhadores; as condições materiais, institucionais,
124 físicas e financeiras, e os meios e instrumentos necessários ao seu exercício,
neste item apresentamos o perfil dos 37 assistentes sociais entrevistados que
implementam a política de assistência social de Juiz de Fora, bem como
as condições de trabalho em que se desenvolve o exercício profissional do
Assistente Social e, finalmente, as dimensões desta intervenção.
No que se refere ao perfil das profissionais, das 37 Assistentes Sociais
entrevistadas, todas são do sexo feminino (100%). A idade das entrevistadas
varia entre 20 e 55 anos, concentrando-se entre 31 a 35 anos (12 entrevistadas
ou 32,4% do total), mostrando trabalhadoras jovens, inseridas recentemente
no mercado de trabalho a partir da expansão da política de assistência social,
especialmente dos CRAS em Juiz de Fora. As demais idades se dividem da
seguinte forma: de 20 a 25 anos 13,52%, de 26 a 30 anos 13,52%, de 36 a
40 anos 13,52%, de 41 a 45 anos 8,10%, de 46 a 50 anos 10,81%, de 51
a 55 anos 5,4% e mais de 55 anos somente uma Assistente Social, o que
representa 2,7%. Portanto, destacamos que 17 assistentes sociais estudaram
no período de 2000 a 2007 – supostamente, com o currículo de 1996 –, 15
se formaram no período de 1985 a 2000, sobre a vigência do currículo de
1982 e, apenas 05 se formaram pelo currículo anterior ao de 1982, o qual
materializava um projeto de formação conservador. Desta forma, temos que
32 Assistentes Sociais, supostamente, tiveram na sua formação a incorporação
de um projeto profissional crítico, inclusive, por, majoritariamente, terem se
graduado em universidades públicas, 97,3% (36 assistentes sociais).
23 Assistentes Sociais possuem cursos de especialização, porém,
nenhuma tem curso de mestrado e doutorado. É relevante considerar que
parte desses profissionais tem demandado da Faculdade de Serviço Social/
UFJF a realização de cursos de extensão e a existência de espaços para a
reflexão e para a formação continuada no intuito de qualificar as respostas
profissionais no plano da intervenção.
Quanto à inserção trabalhista, 25 trabalham em Programas da AMAC
ou vinculados à AMAC (67,56%), 05 trabalham em instituições da rede
conveniada, 05 Assistentes Sociais trabalham em instituições não conveniadas
e 02 Assistentes Sociais não forneceram esta informação.
A natureza das instituições é diversificada: do total, 12 são públicas,
13 são de programas da AMAC, 05 instituições são de natureza privadareligiosa, 01 de natureza empresarial, 01 de natureza privada-comunitária e
01 instituição não forneceu esta informação. 75,7% são regidas pela CLT e
100% não são estatutárias. Apenas duas Assistentes Sociais identificaram-se
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como profissionais autônomas. Tais condições confirmam a improbabilidade
de o Serviço Social constituir-se concretamente enquanto uma profissão 125
liberal e ratificam a condição de assalariamento a qual o Assistente Social
está submetido.
Verificamos que o salário das Assistentes Sociais, em sua maioria, está
na faixa de 2 a 6 salários mínimos (81,10%), destes, 45,95% recebem de 2 a
4 SM e 35,15% recebem de 4 a 6 SM, ou seja, a predominância é entre 2 a
4 salários mínimos. 67,5% possuem uma carga horária de trabalho variando
entre 30 a 40 horas semanais (pesquisa realizada anteriormente à aprovação
das 30 h de trabalho para o Assistente Social). 32 Assistentes, ou seja, 86,50%
possuem, apenas um emprego.
Este resultado segue a média de alguns Estados do país: Alagoas, Minas
Gerais, Rio de Janeiro, Mato Grosso e Sergipe, conforme Trindade (2010),
Delgado (2010), Lira et al. (2008).
Quando indagamos as entrevistadas sobre os motivos da escolha da
profissão, encontramos as seguintes respostas: “O interesse pela profissão” ou
“pela área de assistência social e de humanas” foram respostas mais frequentes
(45,45% das respostas). Podemos inferir dessa resposta uma intenção
de “tornar-se profissional” e o que ela implica, uma vez que se vincula à
necessidade de inserção no mercado de trabalho e de garantir as condições de
reprodução e sobrevivência, ou a intenção de trabalhar, como profissional,
através da conquista de um emprego.
Por sua vez, apesar de reduzidas, ainda aparecem motivações que
denotam um horizonte de ação humana em prol de outros seres humanos, no
qual a profissionalização não aparece, tal como “contribuir para a melhoria
da vida das pessoas” (2,27%). Em outro pólo, aparece, mesmo que reduzida,
a motivação pelo “inconformismo com o sistema capitalista” (2,27%) e a
“militância política” (2,27%) o que, também, não explicita o caráter de
profissionalização e o que ele implica.
O “interesse pela perspectiva de direitos” (4,55%) foi mencionado
em duas respostas, indicando uma relação entre Serviço Social e a perspectiva
de afirmação e defesa de direitos.
No que se refere à permanência ou não da motivação inicial na escolha
da profissão, 45,94% das profissionais disseram que a motivação inicial
permanece. Elas se inserem entre as Assistentes Sociais que mencionaram o
“interesse pela profissão” como a sua motivação primeira, e justificam essa
permanência na motivação e até a reafirmação dela à fundamentação teóricometodológica oferecida na graduação.
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O exercício profissional na implementação do SUAS: projeto ético político, cultura profissional e intervenção profissional
O mesmo acontece com as profissionais motivadas pela “perspectiva
126 de direito” (5,4%). A formação acadêmica, segundo elas, contribuiu para a
afirmação do interesse pela profissão afinado com a perspectiva de direitos.
Além delas, 10,81% mencionaram que a partir da fundamentação oferecida
na graduação elas entenderam que sua intervenção deveria pautar-se na
perspectiva de defesa/afirmação dos direitos.
Ainda, 10,81% disseram que a motivação permanece, parcialmente,
pois a “vocação permanece, mas o voluntariado não”; “existem dificuldades na
intervenção profissional”. Já 5,4% disseram que a motivação não permanece,
indicando que a fundamentação oferecida na graduação modificou a
motivação inicial.
Ao responderem como entendem a profissão de Serviço Social hoje,
51,35% citam o âmbito do direito, expressado da seguinte forma: “a garantia
ou a luta pelos direitos”, “intervenção no âmbito da garantia de direitos dos
usuários”, “intervenção profissional para estimular a consciência e mobilizar
os usuários na luta por seus direitos”.
De acordo com as respostas anteriores, podemos analisar que essa
concepção foi adquirida no processo da formação profissional. Essas duas
questões nos fornecem conteúdo para inferirmos a relação entre a apropriação
do Projeto ético-político e o exercício profissional.
O Serviço Social é entendido pelas Assistentes Sociais como uma
profissão da intervenção. Esse entendimento está associado à expectativa do
Assistente Social de atuar na defesa, na afirmação e na garantia dos direitos
dos usuários com os quais trabalha. Então, à compreensão do Serviço Social
como profissão, associa-se a finalidade ou o horizonte, ou o pôr teleológico
da defesa, a ampliação e a efetivação de direitos.
No campo da assistência social, com a implantação do SUAS, essa
apropriação se particulariza no entendimento de que a política nacional de
assistência social e o SUAS possibilitaram a realização desse horizonte, pelo
fato de garantir o acesso à assistência na perspectiva de política pública, de
afirmação do dever do Estado de efetivar o acesso a quem dela necessitar.
Sobre a relação entre o SUAS e o projeto ético-político da profissão
de Serviço Social, 100% dos entrevistados consideram que essa política vai
ao encontro de nosso “Projeto ético-político” (PEP), ou seja, consideram
que o SUAS possibilita a materialização do projeto profissional em vigor,
principalmente por: favorecer “a garantia de direitos/assistência como
direito/efetivação de direitos” (aparece em primeiro lugar com 12 menções);
ambos, intencionarem a “universalização de direitos” (03). Em menor
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escala apontam: “a descentralização e a participação popular”; “há um
direcionamento do trabalho e ação profissional”; “exclusão do clientelismo”. 127
Apenas uma resposta chama a atenção para a “deficiência nos critérios de
atendimento”, apesar de efetivar direitos.
Enfim, parte dessa associação entre projeto profissional e SUAS devese ao fato da sua implantação indicar uma superação da compreensão da
assistência social enquanto caridade/filantropia. Também, à possibilidade
de enfrentar a cultura política clientelista, afirmando o seu caráter de
política pública.
Outro elemento importante é que as Assistentes Sociais entrevistadas
consideram que essa política é universal. Essa concepção expressa a polêmica
que vem sendo travada acerca do caráter universal ou não dessa política.
As respostas obtidas sobre o tipo de conhecimento que consideram
fundamentais para o exercício profissional centram-se nas legislações sociais:
18 mencionaram as “legislações sociais”, 10 mencionaram “conhecimento
sobre o código de ética” (e não sobre ética), 07 mencionaram conhecimento
sobre “política social”, apenas 02 pessoas mencionaram conhecimentos
sobre política no sentido mais amplo, 07 citaram “arcabouço teóricometodológico”. Nossa preocupação é a não simplificação do PEP à aplicação
das legislações.
Segundo Iamamoto (2004), socializar os direitos deve ultrapassar
o simples repasse de informações sobre as normas legais. É necessário
tornar explícito o real significado social e implicações das demandas da
população, indo para além das aparências do que lhe é apresentado, bem
como informar sobre os meios e condições de ter acesso aos direitos e
suas implicações, exigindo, assim, que se extrapole a abordagem focada
no indivíduo, uma vez que a realidade dos sujeitos é compreendida, aqui,
como parte de uma coletividade. Daí a importância de se articular com as
entidades de representação.
Por outro lado, é preciso dizer que a busca por tais conhecimentos
também é fundamental no momento em que é necessário imprimir
novos direcionamentos e organizar novos equipamentos pois, conforme
CFESS (2009, p. 28), “o conhecimento da legislação social é pré-requisito
para o exercício do trabalho”. Contudo, precisamos, também, de outros
conhecimentos, tais como explicita Iamamoto (2004): das condições de vida
e de trabalho dos sujeitos; teórico-metodológicos; ético-políticos; técnicooperativos; para realizar diagnósticos socioeconômicos de municípios; para
leitura e análise dos orçamentos públicos.
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O exercício profissional na implementação do SUAS: projeto ético político, cultura profissional e intervenção profissional
Como já mencionamos, o grande avanço da política de assistência
128 social foi ser incorporada ao âmbito das políticas públicas, ser reconhecida
como uma política de direito. Isto, de alguma forma, se traduz nas respostas
de como as profissionais compreendem o Serviço Social, em que a defesa e
a luta pela garantia dos direitos sociais aparecem como um ponto relevante.
Os confrontos que o Serviço Social vem travando com relação aos
direitos sociais indicam que esse profissional vem lutando pela ampliação
dos direitos sociais, e, sobretudo, pela real efetivação daqueles que, embora
garantidos na lei, não estão implementados, entendendo a participação social
e o controle social como ferramentas indispensáveis nesta luta.
Assim, quando perguntamos acerca da participação em diferentes
conselhos de direitos que atuam na cidade de Juiz de Fora, 78,38% das
entrevistadas afirmaram participar. Evidentemente, esta taxa de participação
é muito alta, o que potencializa a atuação do Assistente Social e mostra
compromisso com o “controle democrático”. A participação concentra-se
no Conselho Municipal de Assistência Social, 32,5%; Conselho Municipal
da Criança e Adolescente, 27,5%; Conselho Municipal do Idoso, 10% e
Conselho Municipal da Saúde, 7,5%. É claro que em alguns casos a inserção
dos profissionais nestes conselhos faz parte do trabalho que eles “devem
desenvolver”, entretanto, isto não retira a importância desta participação.
Todavia, somente 03 assistentes sociais afirmaram ter uma participação como
conselheira, representando suas instituições. As demais participam, mas de
forma pontual, do processo de inscrição de sua instituição no conselho; da
emissão de pareceres; das conferências, cursos e demais eventos.
Já a participação dos Assistentes Sociais (atual ou anterior) em partidos
políticos, sindicatos ou movimentos sociais é reduzida, sendo 13,52% em
partidos políticos, 18,92% em sindicatos e 35,14% em movimentos sociais.
Entretanto, as respostas que englobam os movimentos sociais dizem respeito
não somente a movimentos sociais, mas a conselhos de controle social,
o que reforça a questão anterior de participação em espaços diretamente
articulados à atuação profissional.
De fato, aqui temos um “entrave”, ou pelo menos uma contradição,
próprio da organização do trabalho na sociedade capitalista. Se por um
lado temos uma cultura profissional que valoriza a participação tanto dos
profissionais quanto dos sujeitos com os quais trabalha, por outro vemos a
pouca concretude que esta assume, a não ser quando a participação faz parte
da organização do exercício profissional (a exemplo dos conselhos), mesmo
assim, de forma pontual.
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Os dados obtidos nas entrevistas, indicam que os Assistentes Sociais não
envolvem as organizações populares e sociais em seu trabalho, tendo em vista 129
a constatação que 29 Assistentes Sociais não desenvolvem intervenções junto
às organizações populares e 21 não realizam nenhum tipo de intervenção
voltada para a inserção dos usuários em organizações desse tipo. Soma-se
a este dado o fato de que 40,5% das profissionais afirmaram não conhecer
as organizações populares e movimentos sociais existentes na região. Apesar
de 59,4% afirmarem conhecer, consideramos relevante que 40,6% não
conhecem, uma vez que o trabalho em rede foi indicado por 29 profissionais
como uma das mudanças positivas na implementação do SUAS/JF.
Nessa direção, foi importante conhecer “os aspectos do processo de
implementação do SUAS em Juiz de Fora que os profissionais de Serviço
Social consideram fundamentais”. Quatro princípios da própria Política
Nacional de Assistência Social (PNAS) foram os mais destacados, são eles:
a territorialização (mencionada 13 vezes); o foco na família (mencionado
10 vezes); o trabalho em rede (10 vezes) e a descentralização, também
mencionada por 07 entrevistados.
Esses elementos, de certa forma, são premissas que o Serviço Social
vem defendendo historicamente, coexistindo posturas conservadoras e
críticas acerca desses temas, sendo que, a partir da década de 1980, há uma
hegemonia de uma concepção crítica em torno delas, no âmbito do projeto
profissional.
A territorialização, na Política de Assistência Social em Juiz de Fora,
caracteriza-se pela instalação de equipamentos como os CRASs e CREASs
regionalizados. Percebemos que a territorialização e a descentralização podem
estar se configurando como uma reorganização geográfica e administrativa,
o que, em parte, pode favorecer a organização e a realização das atividades
profissionais. Contudo, ainda não reflete a ampliação do acesso, embora
a aproximação entre as equipes profissionais e do Assistente Social junto
aos usuários possibilite o acesso à informação e à formação/apreensão de
demandas que poderão resultar na ampliação e no acesso real aos serviços.
Mas, pode ser uma territorialização formal, deslocada de uma descentralização
real que permita o acesso aos serviços socioassistenciais, pela universalização
ou atendimento integral às demandas existentes.
Quando examinamos o trabalho em rede, percebemos que os
equipamentos vinculados à política de assistência estão fragilizados, o que
acontece inclusive com os programas coordenados pela AMAC em Juiz de
Fora. No que diz respeito à rede conveniada, esta é restrita e as organizações
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O exercício profissional na implementação do SUAS: projeto ético político, cultura profissional e intervenção profissional
e instituições não conveniadas vivem efetivamente em uma situação de
130 instabilidade, tornando o serviço ofertado algo incerto e flutuante. Há,
inclusive, questionamentos sobre o que seria o trabalho em rede, citando,
por exemplo, a situação de famílias que participam de reuniões no CRAS,
na escola e na creche, todas tratando do mesmo assunto.
O trabalho em rede é mencionado, entendemos nós, como uma
necessidade para a efetivação das ações, para atendimento às demandas
postas pelos usuários, daí indicarem sua fragilidade no sentido de buscar a
ampliação da mesma. Inclusive no documento “Parâmetros para Atuação de
Assistentes Sociais na Política de Assistência Social” redigido pelo CFESS
(2009, p. 20-21) são indicadas algumas ações necessárias ao trabalho no
SUAS. Muitas delas referem-se à rede: “favorecer a participação dos
usuários e movimentos sociais no processo de elaboração e avaliação do
orçamento público”; “estimular a organização coletiva e orientar os usuários
e trabalhadores da política de Assistência Social a constituir entidades
representativas”, “instituir espaços coletivos de socialização de informação
sobre os direitos socioassistenciais e sobre o dever do Estado de garantir
sua implementação”, “assessorar os movimentos sociais na perspectiva
de identificação de demandas, fortalecimento do coletivo, formulação de
estratégias para defesa e acesso aos direitos”, “realizar estudo e estabelecer
cadastro atualizado de entidades e rede de atendimentos públicos e privados”
e “prestar assessoria e supervisão às entidades não governamentais que
constituem a rede socioassistencial”.
Um aspecto identificado por nós nos laboratórios (lembrando que estes
foram realizados somente com AS dos CRAS) é de que há um movimento
entre os profissionais para trabalhar interinstitucionalmente, somando
esforços com os profissionais de outros equipamentos, como o SUS, quando
estes trabalham com o mesmo público. Entretanto, o trabalho com essa rede,
ainda, não se encontra sistematizado. Não há um cadastro completo das
entidades não governamentais, dos movimentos sociais e nem um trabalho
de assessoria.
Quando analisamos as respostas das assistentes sociais aos “aspectos que
consideram relevantes da implementação do SUAS para o exercício profissional”,
o destaque é feito ao “trabalho com famílias” (mencionado 12 vezes).
Historicamente, o Assistente Social é reconhecido como o profissional
que trabalha com famílias, entretanto, este trabalho é um desafio no sentido
da superação de ações que reproduzem a responsabilização das famílias e dos
indivíduos pelas suas “mazelas” e “fracassos” na sociedade. Nesta direção, o
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documento “Parâmetros para a atuação de Assistentes Sociais na Política de
Assistência Social” (CFESS, 2009, p. 18) indica como uma das dimensões 131
interventivas as abordagens individuais, familiares ou grupais na perspectiva
de atendimento às necessidades básicas e acesso aos direitos e equipamentos
públicos. Ressalta-se, porém, que essa dimensão deve se orientar para a
potencialização da orientação social com vistas à ampliação do acesso dos
indivíduos e da coletividade aos direitos sociais e não pelo atendimento
psicoterapêutico. De acordo com Iamamoto (2004, p. 286)
O suposto é que o trabalho com indivíduos e famílias não incide sobre
fragmentos isolados da vida social, mas as situações individuais e/ou
familiares condensam dimensões, simultaneamente, universais, particulares
e singulares da vida em sociedade.
No Serviço Social, há uma busca por referências críticas que
possibilitem um trabalho com famílias e comunidades enraizado na análise
das necessidades concretas dessas famílias e que combinem a luta pelo acesso
aos serviços públicos como garantia de condições de sobrevivências dignas
dos seres humanos. Essa busca, também, aparece no discurso das profissionais
entrevistadas que assumem uma compreensão ampliada sobre o conceito de
família, admitindo os limites dos serviços que responderiam às necessidades
de sobrevivência e aos conflitos internos e externos relacionados à inserção
econômica e sociocultural dessas famílias.
Essas contradições na compreensão da política e do Projeto éticopolítico da profissão refletem na dimensão técnico-operativa, principalmente,
no que diz respeito aos instrumentos e técnicas da intervenção. Ou melhor,
o trato e a concepção desses instrumentos expressam essa contradição, o que
se justifica por entendermos estes elementos como os que materializam e/ou
expressam as dimensões teórico-políticas da intervenção profissional do AS,
bem como considerados como elementos que constituem e são constitutivos
de nossa cultura profissional.
No que se refere à concepção de instrumentos (tratada, apenas,
no Grupo Focal) os Assistentes Sociais compreendem os mesmos como
“ferramenta/meio de se alcançar um fim” e como “métodos que auxiliam na
intervenção profissional”. Entretanto, aparece também a compreensão de que
os instrumentos são “ferramentas/meios para chegar em uma atividade fim,
intrinsecamente ligados às dimensões teórico-metodológicas, ético-políticas
e técnico-operativas, respondendo a intencionalidade que se pretende com
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O exercício profissional na implementação do SUAS: projeto ético político, cultura profissional e intervenção profissional
a ação”. Percebe-se assim, que convivem diferentes concepções, com uma
132 perspectiva de avanços e continuidades nesta discussão.
Avanços no sentido de relacionar o uso dos instrumentos às diferentes
dimensões da intervenção e, de certa forma, associar seu uso às finalidades
da ação. Continuidades, ao confundirem, ainda, instrumentos com método
e quando não conseguem visualizar os instrumentos como elementos de
efetivação das finalidades, não somente da ação, mas, também, da finalidade
do profissional, da profissão, da instituição. Ou seja, finalidade parece estar
desvinculada da teoria, e dos valores. Percebe-se, também, que não fica
explícita a relação estabelecida entre as dimensões da intervenção, conforme
afirmativa abaixo
Aliado às dificuldades de utilizar os instrumentos, esbarramos em questões
institucionais, o que a instituição quer que a gente faça, como ela dá estes
espaços, será que ela valoriza o nosso esforço para estar indo além? O que
vamos fazer com aquelas angústias que a gente levantar? (SIMPÓSIO A
DIMENSÃO TÉNICO-OPERATIVA NO SERVIÇO SOCIAL: Desafios
Contemporâneos na Formação Profissional do Assistente Social Frente aos
Novos Padrões de Proteção Social, 2009, p. 14)
Ao indagarmos, nas entrevistas, sobre as atividades desenvolvidas
na política de assistência social, majoritariamente, as respostas são: visita
domiciliar (mencionada 14 vezes), atendimentos individuais/entrevista (15),
atendimentos grupais/reuniões (15) e encaminhamentos (mencionado 15
vezes). Estas respostas refletem a tensão entre instrumentos, procedimentos,
ações, técnicas e estratégias, tão comuns à profissão.
Quando (no Grupo Focal) solicitadas a indicarem as atribuições dos
Assistentes Sociais nos CRAS, enumeraram os mesmos elementos de quando
indagadas sobre quais os instrumentos utilizados em suas ações, reduzindo
atribuições a instrumentos, ou seja, apontaram como atribuições: realizar
entrevistas, grupos, visitas domiciliares e elaborar pareceres técnicos e
citaram os mesmos elementos quando indagadas sobre os instrumentos mais
utilizados na intervenção profissional. Não é uma questão simples, tanto é
que na Lei de Regulamentação da Profissão, essa complexidade é visível, a
similitude está entre competência e atribuições. Instrumentos, competência
profissional e atribuição profissional, atividades são termos que se imbricam
e precisam ser melhor definidos pela categoria.
Quanto aos instrumentos mais utilizados na intervenção – esta foi
uma questão fechada no formulário aplicado, em que deveriam marcar
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a intensidade da utilização, nunca, sempre e às vezes –, a entrevista, o
encaminhamento17 e a observação foram citados por todas as entrevistadas, 133
sendo que 32 assistentes sociais os utilizam “sempre” e 05 os utilizam
“às vezes”. Apenas uma profissional “nunca” utiliza a visita domiciliar,
entretanto, 18 a utilizam “sempre” e 18 “às vezes”. O grupo “nunca” é
utilizado por 03 profissionais, 15 o utiliza “sempre” e 19 “às vezes”;
a reunião “nunca” é realizada por 01, sendo que 24 assistentes sociais a
utilizam “sempre” e 12 “às vezes”.
Levando em consideração o uso frequente dos instrumentos – aqueles
que “sempre” são utilizados –, podemos afirmar que os instrumentos de
procedimento individual são os mais utilizados.
Esses dados foram confirmados no Grupo Focal (somente AS dos
CRAS). Os instrumentos mais utilizados foram: Entrevista; documentação
– relatório, formulário, pareceres –; encaminhamentos (100%); visita
domiciliar; visita institucional; reuniões (75%); atendimento individual
(50%); monitoramento; busca ativa; atendimento familiar; estudo
de caso; palestras; sala de espera; trabalho com grupos; acolhimento;
triagem; orientação; acompanhamento de caso; articulação com a rede
e evolução (25%).
Vimos que os instrumentos que respondem a procedimentos
individuais, ainda, são majoritários em detrimento aos procedimentos
coletivos, talvez pelas dificuldades indicadas: “não tem formação para isso,
falta de disponibilidade, não participação dos usuários”. Percebe-se, também,
aqui, a polêmica entre procedimentos, instrumentos e ações ao citarem
encaminhamentos, atendimento individual, monitoramento, atendimento
familiar, acolhimento, triagem, orientação, acompanhamento de caso,
articulação com a rede, como instrumentos.
O uso de procedimentos mais individualizados não significa,
necessariamente, que ao utilizá-los se está individualizando as expressões da
questão social ou que não se trabalha com uma postura crítica e coletiva.
Conforme aponta Iamamoto (2004, p. 272), “as situações singulares
vivenciadas pelos indivíduos são portadoras de dimensões universais e
particulares das expressões da questão social, condensadas na história de
vida de cada um deles”. O “como” utilizar os instrumentos, o compromisso
17
Citamos aqui o encaminhamento como instrumento, tendo em vista que, no
grupo focal, este foi citado como instrumento, inclusive, um dos mais utilizados.
Entretanto, alguns autores o consideram como procedimento.
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O exercício profissional na implementação do SUAS: projeto ético político, cultura profissional e intervenção profissional
teórico e ético-político implementados no uso dos instrumentos é que dirá se
134 isso está ocorrendo ou não. Conforme orientação do CFESS (2009, p. 22),
“o uso das técnicas e estratégias não deve contrariar os objetivos, diretrizes e
competências assinalados [...]”.
Se considerarmos “sala de espera” como um tipo de reunião, esta aparece
em 100%. Ressaltamos que utilizam o termo “reunião”, “grupo”, “sala de
espera”, como instrumentos diferentes, mas não trabalhamos a diferença que
estabelecem um do outro. No que se refere à entrevista, à abordagem,
ao atendimento individual e ao encaminhamento, levanta-se dúvidas se são
a mesma coisa ou não. No laboratório, não se chegou a nenhuma conclusão,
mas definiu-se que entrevista, abordagem e encaminhamento seriam tipos
diferentes de atendimentos individuais: “a abordagem é quando fazemos um
primeiro contato para contatar uma pessoa; o encaminhamento quando a
situação apresentada requer outros serviços que a instituição não oferece e a
entrevista, um momento mais aprofundado”.
Relacionando esses dados com as demandas da população que
procura os serviços socioassistenciais (cesta básica, bolsa família, vagas
em escolas e creches, emprego, atendimento psicológico, documentos,
cursos profissionalizantes, programas sociais para crianças e adolescentes,
moradia, violência doméstica), percebemos que eles indicam demandas por
necessidades, aparentemente, imediatas, fragmentadas, individualizadas,
que são respondidas, em sua maioria, através de procedimentos, também,
individuais, haja vista o grande uso do “encaminhamento”. Estes dados são
confirmados no Grupo Focal.
Essa demanda, aparentemente imediata, vai ao encontro da “expectativa
que a população possui acerca do exercício profissional”: 26 profissionais
responderam que a população espera o “atendimento às suas necessidades
imediatas” (acesso a bens e serviços; benefícios materiais; encaminhamento
para a rede), ou seja, o profissional oferece uma resposta que vai ao encontro
dessa demanda. Ele se preocupa em atender mesmo que, minimamente, essa
demanda, o que é correto. Porém, necessita-se ampliar a compreensão sobre
essa demanda e sobre os seus significados junto à população, extrapolando
a demanda aparente e, assim, poder direcionar suas respostas para uma
dimensão mais ampla dessa demanda. É necessário transformar essa demanda
que chega de forma individual em uma demanda coletiva.
Soma-se a isso o dado, apontado anteriormente, de que a maioria das
Assistentes Sociais respondeu que não desenvolve intervenção voltada para
a inserção dos usuários em organizações populares e 40,5% nem conhecem
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as organizações populares de seu entorno. Esses dados podem indicar que a
intervenção profissional não tem explorado as articulações de caráter mais 135
coletivo junto às organizações populares existentes e junto aos Conselhos.
Neste último, precisamos fortalecer nossa inserção nos mesmos na condição
de conselheiras, na condição de secretária executiva e prestando assessorias,
tendo como direção a perspectiva de fortalecimento do controle democrático
e ampliação da participação dos usuários e trabalhadores, conforme indicação
do CFESS (2009).
Considerando que a escolha por um determinado instrumento de
trabalho não é neutra, quando não utilizamos os procedimentos coletivos
e nem, através dos procedimentos individuais estamos propiciando uma
relação maior com o coletivo, indica uma determinada orientação teórica e
um determinado compromisso ético-político.
Indagadas, no Grupo Focal (somente AS dos CRAS), sobre as
dificuldades no manuseio dos instrumentos, as Assistentes Sociais apontaram a
imposição de utilização de alguns instrumentos que envolvem o uso da visita
domiciliar, da entrevista e do grupo. Essa dificuldade contraria, à primeira
vista, o processo de escolha dos instrumentos de intervenção – uma vez que,
como vimos, este está relacionado à finalidade da ação profissional –, bem
como, a autonomia técnica.
Ressaltamos, aqui, que na aplicação dos questionários, 27 Assistentes
Sociais, ou seja, 72,9%, afirmaram ser bom o nível de autonomia no emprego;
08 Assistentes Sociais, 21,6%, consideraram regular e, apenas, 02, 5,41%,
afirmaram ser ruim o nível de autonomia. Esse reconhecimento de que
possuem autonomia profissional foi justificado em razão da “liberdade para
planejar e executar ações” (7); de “realiza[r] atividades sem impedimentos”
(4); da “autonomia para conversar e acordar” (3); do “bom diálogo com as
hierarquias” (2), da “liberdade de expressão” (1); da “possibilidade de dar
sugestões e [fazer] críticas” (1); da “liberdade de trabalho” (1); da possibilidade
de “propor ações e definir estratégias” (1); do “respeito recíproco entre os
profissionais responsáveis pelo trabalho” (1).
Essa autonomia relativa, particularmente, na escolha dos instrumentos
de trabalho aparece no Grupo Focal e no Simpósio, citando, como exemplo,
o CADÚNICO. O mesmo é uma condicionalidade da instituição e, por
mais que critiquem, não podem deixar de preenchê-lo. Essa realidade é
igualmente vivida pelos os grupos do Programa de Ações Integradas para a
cidadania (PAIC), eles são orientados a fazê-lo, independente de concordarem
ou não. Contudo, as AS dos CRASs indicam que têm autonomia no modo
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O exercício profissional na implementação do SUAS: projeto ético político, cultura profissional e intervenção profissional
de conduzir, tanto o CADÚNICO quanto os grupos do PAIC, ou seja, a
136 forma de conduzir os instrumentos é de responsabilidade dos profissionais:
Por exemplo, uma das propostas dos CRAS é o acompanhamento das
famílias do Bolsa Família, então você pode dar uma palestra informativa
tanto para os profissionais da escola, quanto para a população. A partir disso,
você pode até tirar grupos que não cumpram as condicionalidades, mas estão
no Bolsa Família. Então, depende do que está acontecendo. Se você quer
fazer um trabalho preventivo ou ficar apagando incêndio (SIMPÓSIO A
DIMENSÃO TÉNICO-OPERATIVA NO SERVIÇO SOCIAL: Desafios
Contemporâneos na Formação Profissional do Assistente Social Frente aos
Novos Padrões de Proteção Social, 2009, p. 16)
Entendemos que mesmo os profissionais não escolhendo o tipo
de instrumento a ser utilizado, o fundamental é, justamente, garantir o
referencial teórico e ético-político que fundamentam a ação, o modo de
utilizá-los, ou seja, a direção que eles assumem.
É interessante destacar que os Assistentes Sociais têm clareza quanto
aos elementos orientadores da escolha dos instrumentos citados: a demanda
institucional; a formação profissional, teórico-metodológica, técnicooperativa; o Código de Ética Profissional; a cultura profissional; a escuta ativa
da população, da instituição; o objetivo da profissão; os objetivos da ação; a
disponibilidade de recursos; a situação demandada pelo usuário, a realidade
verificada. Desta forma, precisamos voltar a atenção para as mediações que
constituem a ação, as mediações entre o conhecimento e ação profissional.
Apesar de citarem estes elementos, ao escolherem o instrumento de sua
intervenção, as Assistentes Sociais que participaram do simpósio, constatam
que o exercício profissional do Assistente Social está muito na execução, sem
uma reflexão teórica sobre a mesma, “então, acaba que o profissional é um
ser desmembrado: o que executa, separado daquele que pensa. Não deveria
ser assim” (SIMPÓSIO A DIMENSÃO TÉNICO-OPERATIVA NO
SERVIÇO SOCIAL: Desafios Contemporâneos na Formação Profissional
do Assistente Social Frente aos Novos Padrões de Proteção Social, 2009, p.
17) e, ainda:
Muitas vezes nós somos engolidos pela demanda mesmo que chega, pela rotina
que chega para os profissionais. O Serviço Social não dá para só fazer, fazer,
fazer, a gente tem que conciliar a teoria com a prática e sempre fazer reflexão.
Hoje, o grande desafio que nós detemos apenas buscando estes espaços além
do institucional, ainda mais que o que predomina é o fazer, fazer, fazer e
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o atender, atender, que se reflete em números. Eu acho que o nosso fazer,
além de estar qualificado, ele tem que mostrar um sentido daquilo que nós
sabemos para os usuários e para a instituição, que é um desafio muito grande
(SIMPÓSIO A DIMENSÃO TÉNICO-OPERATIVA NO SERVIÇO
SOCIAL: Desafios Contemporâneos na Formação Profissional do Assistente
Social Frente aos Novos Padrões de Proteção Social, 2009, p.17).
Essas afirmativas nos fazem crer que, apesar de saberem os elementos
que perpassam a escolha dos instrumentos, não conseguem pensar sobre eles
ao agir, diante do volume de suas atividades. Entretanto, antes de agirem
afirmam ter um planejamento das ações. Este contexto merece uma reflexão:
têm clareza do processo de escolha dos instrumentos, se fazem planejamento,
e a ação não é considerada reflexiva.
De um lado, na implantação dos CRAS os Assistentes Sociais (no total,
vinte e oito profissionais) têm sido protagonistas ao acumularem esforços no
âmbito do planejamento e da organização das ações realizadas. Tal processo
tem ocorrido pelo trabalho coletivo através das reuniões sistemáticas entre
os assistentes sociais e a coordenação geral dos CRAS (realizada por uma
assistente social). É nesse fórum que os profissionais têm possibilidade de
influenciar na organização do seu trabalho, no âmbito do planejamento
das ações, problematizando as dificuldades enfrentadas face ao processo de
implantação do SUAS.
Contudo, o planejamento está limitado ao campo de ação direta do
Serviço Social, ou seja, não envolve o conhecimento e administração dos
recursos financeiros envolvidos no processo. Nesse sentido, há separação
entre o planejamento das ações e o conhecimento e o manejo dos recursos
financeiros envolvidos nas ações, bem como as decisões de investimento ou
as decisões estratégicas (e políticas) que envolvem a aplicação dos recursos e
a definição das ações na área da assistência social.
No Brasil, a participação dos trabalhadores nas decisões sobre a
organização de suas atividades, bem como o seu envolvimento com o
planejamento das atividades no plano técnico-operacional têm sido estratégias
utilizadas nos diferentes processos de trabalho (MOTA e AMARAL, 1995);
Mas, prevalece a separação entre o planejamento e a execução (constantes
do processo taylorista/fordista), uma vez que a participação não implica na
democratização das relações de trabalho, no que tange à tomada de decisões
estratégicas e ao acesso às informações, ações restritas aos dirigentes.
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137
O exercício profissional na implementação do SUAS: projeto ético político, cultura profissional e intervenção profissional
138
4 Considerações Finais
As entrevistas indicam que 29 Assistentes Sociais (78,38%),
identificam mudanças positivas nas condições do exercício profissional
após a implementação do SUAS em Juiz de Fora, tais como: interlocução
maior entre os programas; atendimento regionalizado; valorização do
Assistente Social; maior visibilidade da profissão; melhores condições
para o exercício profissional; aumento de renda; trabalho em rede;
direcionamento do trabalho; planejamento das ações. Esse dado é
significativo, uma vez que grande parte desses profissionais foi remanejada
no quadro da AMAC, portanto, eles possuem uma referência anterior de
trabalho do âmbito da assistência.
Essa avaliação positiva pode justificar o fato de que 31 Assistentes
Sociais consideram bom seu nível de satisfação no emprego e 06 profissionais
consideram sua satisfação regular, não havendo nenhuma resposta negativa,
apesar dos salários serem baixos, como indicamos anteriormente.
Os dados acima indicam uma contradição face aos questionamentos
feitos pelos profissionais, uma vez que no Grupo Focal e no Simpósio foram
apontadas dificuldades em atuarem de uma forma mais crítica ao encontro
do projeto ético-político da profissão, tendo em vista a realidade institucional
e a política no município. Inclusive questionam a possibilidade de efetivação
desse projeto.
Finalmente, concluímos que, mesmo num contexto adverso, as
Assistentes Sociais vêm afirmando a necessidade da efetivação dos direitos
conquistados assim como a ampliação dos mesmos, reafirmando a construção
de uma cultura política democrática. Uma cultura profissional que converge
com vários dos princípios apontados no SUAS, sobretudo, o da afirmação
da assistência social como direito de todos, como política pública de
responsabilidade do Estado, embora saibam dos limites das políticas sociais
no contexto da sociedade de classes. Enfim, uma cultura profissional que
converge com os valores do Projeto ético-político do Serviço Social hoje
hegemônico como antes analisado, o que não exime de ser uma cultura
profissional plural, como espaço de luta, de tensões. Uma cultura profissional
que assume a necessidade da participação social e do controle social, mas,
que nem sempre consegue efetivar no seu exercício cotidiano, colocando-se
como desafio constante do mesmo. Uma cultura profissional que se constrói
coletivamente nesse cotidiano que afirma a necessidade da competência
teórica, metodológica, política e técnica instrumental no nosso exercício,
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embora ainda apresente dificuldades no trato teórico metodológico. Nesse
sentido, uma profissão que, considerando todo o seu acúmulo histórico, 139
compreendeu a sua inserção na sociedade, a necessidade urgente de respostas
à questão social, que se expressa em múltiplas demandas.
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Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
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Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
143
APÊNDICE A – QUESTIONÁRIO APLICADO
AOSREPRESENTANTESDASORGANIZAÇÕES/
MOVIMENTOS/INSTITUIÇÕES
1 Caracterização da organização/movimento/
instituição:
1.1 Nome da organização ou instituição:
1.2 Vínculo com a Política Municipal de Assistência Social
(A) Conveniada(A) Não conveniada
1.3 Endereço:Rua: —
nº_
Compl._
Bairro:__ CEP: _
Telefone:_
1.4 Natureza da Instituição:
(A) Religiosa
(A) Empresarial
(A) Comunitária
(A) Político-partidária
(A) Político-sindical
2
(A) Filantrópico; laico
(A) Associação recreativa (A) Outra
Caracterizaçãodorepresentantedainstituição
2.1Idade: _ anos
2.2Sexo: _
2.3Escolaridade:
(A) Ensino fundamental incompleto
(A) Ensino fundamental completo
(A) Ensino médio incompleto
(A) Ensino médio completo
(A) Ensino superior incompleto
APÊNDICE A
146
(A) Ensino superior completo. Qual curso?
(A) Pós graduação
2.4 Qual o seu vínculo com a organização/movimento/instituição?
(A) Dirigente (A) Funcionário (A) Voluntário
2.5 Há quanto tempo você mora no bairro?
2.6 Há quanto tempo você participa da organização/movimento/
instituição?
2.7 Quais os motivos que o levaram a participar da organização/
movimento/instituição?
2.8 Você considera importante
movimento/instituição?
(A) Sim (A) Não
Por quê?
participar
da
organização/
2.9 Qual a PRINCIPAL contribuição que sua participação na
organização/movimento/instituição trouxe para a sua vida
pessoal? Elencar três motivos em ordem decrescente.
(A) Aprendeu a defender seus interesses
(A) Solidariedade e amor ao próximo
(A) ganhos materiais
(A) ganhos espirituais
(A) consciência política
(A) Aprendeu a reivindicar direitos
(A) Outros
2.10 Você participa de atividades de capacitação (palestras, seminários,
congressos, cursos de extensão etc.)?
(A) Sim (A) Não
Por quê?
Se sim, quais e com que frequência?
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
QUESTIONÁRIO APLICADO AOS REPRESENTANTES DAS ORGANIZAÇÕES/MOVIMENTOS/INSTITUIÇÕES
2.11 Quais os meios de informação você utiliza para se atualizar?
147
Elencar três motivos em ordem decrescente.
(A) Jornal televisivo (A) Revista (A) Conversando
(A) Jornal impresso (A) Internet (A) Outros
3
Histórico da Organização/Movimento Social/
Instituição
3.1 Quando a organização/movimento/instituição foi criada? E
por quê?
3.2 Quais foram as principais lutas da organização/movimento/
instituição desenvolvidas ao longo de sua trajetória?
3.3 Como essas lutas foram desenvolvidas?
(A) Contato com vereadores
(A) Contato com prefeito
(A) Manifestações de protestos (abaixo-assinados, passeatas,
greves, dentre outros)
(A) Contato com os conselhos de direitos
(A) Outros
3.4 Qual foi o período de maior concentração de conquistas da
organização/movimento/instituição?
3.5 Como eram encaminhadas as demandas neste período?
(A) Contato com vereadores
(A) Contato com prefeito
(A) Manifestações de protestos (abaixo-assinados, passeatas,
greves, dentre outros)
(A) Contato com os conselhos de direitos
(A) Outros
3.6 Quais são os principais problemas que a instituição identifica na
região? E no município?
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
APÊNDICE A
148
3.7 Quais são as demandas atuais da organização/movimento/
instituição?
3.8 Quais são as estratégias utilizadas para o encaminhamento das
demandas atuais?
(A) Contato com vereadores
(A) Contato com prefeito
(A) Manifestações de protestos (abaixo-assinados, passeatas,
greves, dentre outros)
(A) Contato com os conselhos de direitos
(A) Outros
3.9 De que forma estas estratégias são definidas?
(A) Reuniões com a comunidade
(A) Reuniões com os membros da organização/movimento/
instituição
(A) Outros
3.10 Como se dá o processo de eleição da direção da associação?
(A) Assembléia com voto aberto
(A) Eleição indireta
(A) Eleição direta com voto secreto
(A) Não sabe
(A) Outros
3.11 A população participa da organização/movimento/instituição?
(A) Sim (A) Não
Por quê?
3.12 Que estratégias são utilizadas para a população participar da
organização/movimento/instituição?
3.13Em que situações há aumento da participação popular na
organização/movimento/instituição?
3.14 Quais as reivindicações que mais mobilizam a população da sua
região?
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
QUESTIONÁRIO APLICADO AOS REPRESENTANTES DAS ORGANIZAÇÕES/MOVIMENTOS/INSTITUIÇÕES
3.15 Quais as organizações/movimentos/instituições mais importantes
149
da sua região? E do município?
3.16 Atividades que a organização/ movimento/ instituição participou
no último ano:
(A) Lista ou abaixo-assinados
(A) Trabalhos voluntários
(A) Manifestações de protesto
(A) Reuniões de grupos locais
(A) Conferências municipais
(A) Conselhos. Quais?
(A) Outros. Quais?
3.17 A organização/movimento/instituição teve e/ou tem relação
com políticos/partidos políticos?
(A) Sim (A) Não
Quais?
4) Caracterização da visão de política social/
assistência social da instituição/organização
4.1 O que você entende por políticas sociais públicas?
4.2 Na sua opinião, quais são as responsabilidades do Estado no que
se refere às políticas sociais?
4.3 Como o Estado tem respondido a estas responsabilidades?
4.4 Qual o seu conhecimento acerca das políticas sociais em Juiz de Fora?
4.5 Você tem conhecimento sobre o SUAS/política de assistência
social em Juiz de Fora?
(A) Sim (A) Não
Se sim, destaque 3 aspectos.
4.6 Qual o seu conhecimento acerca do processo de implementação
da política de assistência social em Juiz de Fora?
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
APÊNDICE A
150
4.7 Como você analisa este processo de implementação?
4.8 Como a administração municipal tem tratado a política de
assistência social em relação às demais políticas municipais?
4.9 Quais são as dificuldades e limites percebidos na condução da
política de assistência social no município?
4.10 As ações da organização/movimento/instituição no campo da
assistência social são compatíveis com o previsto no SUAS?
5) Caracterização das Ações Das Organizações/
Movimentos/Instituições
5.1 Quais são os serviços prestados pela instituição?
5.2 Os membros da organização/movimento/instituição são
voluntários e/ou têm vínculo empregatício?
5.3 Há o profissional do serviço Social?
(A) Sim (A) Não
Se sim, qual o vínculo empregatício:
(A) Voluntário (A) Contratado
5.4 Qual é o objetivo da instituição?
5.5 Qual é o público alvo da organização/movimento/instituição?
5.6 Quais as principais demandas da população?
5.7 Como a instituição responde a essas demandas da população?
5.8 Como é feita a seleção das pessoas atendidas?
5.9 Quais são as fontes de recursos financeiros da organização/
movimento/instituição?
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
QUESTIONÁRIO APLICADO AOS REPRESENTANTES DAS ORGANIZAÇÕES/MOVIMENTOS/INSTITUIÇÕES
5.10Existe um processo de planejamento e avaliação das ações
151
desenvolvidas?
(A) Sim (A) Não
Se sim, como é feito?
5.11 Existe capacitação das pessoas que planejam, avaliam e executam
as ações?
(A) Sim (A) Não
De que forma isso ocorre?
5.12 Quais são as dificuldades para a realização das ações desenvolvidas?
5.13Há conhecimento por parte da organização/movimento/
instituição do que é discutido no interior dos conselhos de
direitos?
(A) Sim (A) Não
Se sim, quais conselhos?
5.14 Destaque 3 questões discutidas:
5.15 A entidade já atuou ou atua como conselheira?
(A) Sim (A) Não
Se sim, em que conselho?
5.16 Se sim, qual é a relação da sua atuação no conselho com as ações
desenvolvidas pela organização/movimento/instituição que você
participa?
5.17A organização/movimento/instituição tem articulação com
outras organizações e movimentos sociais existentes no bairro e
no município?
(A) Sim (A) Não
Se sim, com quais organizações/movimentos/instituições?
Se sim, que tipo de articulação?
5.18 Como se efetiva a relação da organização com a prefeitura?
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
APÊNDICE A
152
6
Relação associação/trabalho profissional do
Serviço Social
6.1 Você conhece a prática profissional do Assistente Social?
(A) Sim (A) Não
Se sim, qual?
6.2 O Assistente Social realizou algum trabalho com a associação?
(A) Sim (A) Não
6.3 Qual foi o trabalho desenvolvido pelo assistente social que você
participou?
Data: ___/ ___/ ____
Entrevistadores:
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
APÊNDICE B – ANÁLISE DAS CONDIÇÕES
SOCIAIS, POLÍTICAS E CULTURAIS E DA
INTERVENÇÃOPROFISSIONALDOASSISTENTE
SOCIAL NA IMPLANTAÇÃO DO SUAS EM JUIZ
DE FORA/REGIÃO LESTE
Formulário Para Entrevista Com Assistentes Sociais
1
Caracterização da organização/instituição:
1.1 Nome da organização ou instituição:
1.2 Vínculo com a Política Municipal de Assistência Social
(A) Conveniada (A) Não conveniada
1.3 Endereço: Rua:
n° ACompl.A A Bairro: A A CEP: A A A Telefone
1.4 Natureza da instituição:
Pública:
(A) Municipal
(A) Estadual
(A) Federal
Privada:
(A) Religiosa
(A) Empresarial
(A) Comunitária
(A) Político-partidária
(A) Político-sindical
(A) Filantrópica
(A) Associação recreativa
(A) Outra
APÊNDICE B
154
2
Caracterização do entrevistado
2.1Idade:
2.2Sexo:
2.3 Graduou-se em faculdade:
(A)Pública (A)Privada
Qual?
2.4 Ano em que se formou:
2.5 Você desempenha atividade profissional em outra organização/
instituição? ( ) Sim
( ) Não
Em caso afirmativo, responda a questão a seguir:
[Em caso negativo responder a partir do bloco 3]
2.6 Em relação a essa outra atividade,
A)
Qual (ais) o (s) tipo (s) de vínculo (s)?
(A) Autônomo
(A) Voluntário
(A) Estatutário
(A) CLT
(A) Consultoria
(A) Contrato temporário
(A) Prestação de serviço
(A) Outro:
B)
Qual a carga horária semanal?
(A) menos de 4 horas
(A) 4 horas
(A) 8 horas
(A) 12 horas
(A) 20 horas
(A) 30 horas
(A) mais de 30 horas
(A) Outra:
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
QUESTIONÁRIO: ANÁLISE DAS CONDIÇÕES SOCIAIS, POLÍTICAS E CULTURAIS E DA INTERVENÇÃO PROFISSIONAL...
C)
Qual a sua renda mensal?
(A) Até 2 salários mínimos
(A) Mais de 2 e até 4 salários
(A) Mais de 4 e até 6 salários
(A) Mais de 6 e até 8 salários
(A) Mais de 8 e até 10 salários
(A) Mais de 10 e até 12 salários
(A) Mais de 12 e até 14 salários
(A) Acima de 14 salários.
2.7 Em qual instituição/organização você possui seu vínculo
principal?
3) Política e cultura profissional:
3.1 O que o (a) motivou a optar pela profissão de Serviço Social?
3.2 Atualmente esta motivação permanece? Justifique.
3.4 Você realizou ou está realizando algum curso após a sua
graduação?
(A) Sim (A) Não
3.5 Em caso negativo, justifique:
3.6 Em caso afirmativo, quais as opções que se aplicam:
(A) Especialização/Aperfeiçoamento
Em que área? Onde? Ano de Conclusão:_
(A) Mestrado
Em que área? Onde? Ano de Conclusão:_
(A) Doutorado
Em que área? Onde?_ Ano de Conclusão:_
(A) Outra graduação.
Em que área? Onde? Ano de Conclusão:_
3.7 Você participa de atividades de atualização (palestras, seminários,
congressos, cursos de extensão etc.)?
(A) Sim (A) Não
Em caso afirmativo, com que frequência?
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
155
APÊNDICE B
156
3.8 Você tem ou teve participação em:
a) organizações da categoria profissional?
(A) Sim (A) Não.
Em caso negativo, justifique por que não participa. Em caso
afirmativo, indique qual e quando
Que motivos o levaram a participar destas organizações?
Que motivos o levaram a deixar de participar destas organizações?
b) partidos políticos?
(A) Sim (A) Não.
Em caso negativo, justifique por que não participa. Em caso
afirmativo, indique qual e quando.
Que motivos o levaram a participar destas organizações?
Que motivos o levaram a deixar de participar destas organizações?
c) sindicatos?
(A) Sim (A) Não.
Em caso negativo, justifique por que não participa. Em caso
afirmativo, indique qual e quando.
Que motivos o levaram a participar destas organizações?
Que motivos o levaram a deixar de participar destas organizações?
d) movimentos sociais?
( ) Sim ( ) Não.
Em caso negativo, justifique por que não participa. Em caso
afirmativo, indique qual e quando.
Que motivos o levaram a participar destas organizações?
Que motivos o levaram a deixar de participar destas organizações?
e) conselhos de direitos/políticas públicas?
( ) Sim ( ) Não.
Em caso negativo, justifique por que não participa. Em caso
afirmativo, indique qual e quando.
Que motivos o levaram a participar destas organizações?
Que motivos o levaram a deixar de participar destas organizações?
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
QUESTIONÁRIO: ANÁLISE DAS CONDIÇÕES SOCIAIS, POLÍTICAS E CULTURAIS E DA INTERVENÇÃO PROFISSIONAL...
4
Política De Gestão Da Política De Assistência
Social/Suas
4.1 Qual o vínculo com a organização/instituição pesquisada:
(A) Autônomo
(A) Voluntário
(A) Estatutário
(A) CLT/Contrato por tempo indeterminado
(A) Contrato Temporário
(A) Prestação de serviço
(A) Outro:___
4.2 Atualmente, que cargo você ocupa na organização/instituição?
4.3 Quais os requisitos necessários para ocupar este cargo?
4.4 Qual é a sua renda mensal neste emprego(em salários mínimos)?
(A) Até 2 salários mínimos
(A) Mais de 2 e até 4 salários
(A) Mais de 4 e até 6 salários
(A) Mais de 6 e até 8 salários
(A) Mais de 8 e até 10 salários
(A) Mais de 10 e até 12 salários
(A) Mais de 12 e até 14 salários
(A) Acima de 14 salários.
4.5 Qual a sua carga horária de trabalho?
(A) menos de 4 horas
(A) 4 horas
(A) 8 horas
(A) 12 horas
(A) 20 horas
(A) 30 horas
(A) mais de 30 horas
(A) Outra:___
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
157
APÊNDICE B
158
4.6 Como você avalia seu nível de satisfação neste emprego?
(A)Bom
(A) Regular
(A) Ruim
Justifique:___
4.7 Como você avalia seu nível de autonomia neste emprego?
(A) Bom
(A) Regular
(A) Ruim
Justifique:___
4.8 Destaque três aspectos do processo de implementação do
SUAS em Juiz de Fora e do CRAS/Leste que você considera
fundamentais.
4.9 Em que tipos de serviços do SUAS você se insere?
Proteção Social Básica:
(A) Programa de Atenção Integral à Família
(A) Programa de inclusão produtiva e projetos de enfrentamento
à pobreza
(A) Centro de convivência para idosos
(A) Serviços para criança de 0 a 6 anos,que visem o fortalecimento
dos vínculos familiares, o direito de brincar, ações de socialização
e de sensibilização para a defesa dos direitos das crianças
(A) Serviços socioeducativos para crianças, adolescentes e jovens
na faixa etária de 6 a 24 anos, visando sua proteção,
socialização e o fortalecimento dos vínculos familiares e
comunitários
(A) programas de incentivo ao protagonismo juvenil e de
fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários
(A) Centros de informação e de educação para o trabalho,
voltados para jovens e adultos
Proteção Social Especial – média complexidade
(A) Serviço de orientação e apoio sociofamiliar
(A) Plantão social
(A) Abordagem de rua
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
QUESTIONÁRIO: ANÁLISE DAS CONDIÇÕES SOCIAIS, POLÍTICAS E CULTURAIS E DA INTERVENÇÃO PROFISSIONAL...
(A) Cuidado no domicílio
(A) Serviço de habilitação e reabilitação na comunidade das pessoas 159
com deficiência
(A) Medidas socioeducativas em meio aberto (Prestação de Serviços
à Comunidade e Liberdade Assistida)
Proteção Social Especial – alta complexidade
(A) Atendimento integral institucional
(A) Casa Lar
(A) República
(A) Casa de Passagem
(A) Albergue
(A) Família substituta
(A) Família Acolhedora
(A) Medidas socioeducativas restritivas e privativas de
liberdade(semiliberdade, internação provisória e sentenciada
(A) Trabalho protegido
4.10 Qual o significado de trabalhar vinculado à uma política pública?
5
Exercício Profissional
5.1 Qual a demanda do SUAS para o exercício profissional do
assistente social?
5.2 Que relação você estabelece entre o SUAS e o projeto ético-político
da profissão de Serviço Social?
5.3 Você identifica mudanças nas condições de realização do exercício
profissional após a implementação do SUAS em Juiz de Fora?
(A)sim (A)não
Em caso afirmativo, quais?_
_
_
_
_
_
_
_
_
5.4 Quais as atribuições do Assistente Social no SUAS?
(A) coordenação de pesquisas, planos, programas e projetos
na área de Serviço Social;
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
APÊNDICE B
160
(A) elaboração de pesquisas, planos, programas e projetos na
área de Serviço Social;
(A) execução de pesquisas, planos, programas e projetos na
área de Serviço Social;
(A) supervisão de pesquisas, planos, programas e projetos na
área de Serviço Social;
(A) avaliação de estudos de pesquisas, planos, programas e
projetos na área de Serviço Social;
(A)assessoria;
(A)consultoria;
(A) perícias técnicas sobre matéria de Serviço Social;
(A) laudos periciais;
(A)pareceres
(A) supervisão de estágio sobre matéria de Serviço Social;
(A) direção e coordenação de serviços técnicos em Serviço
Social.
(A) Nenhum delas.
(A)Outras
5.5 Destaque três aspectos da política de assistência social, a partir da
implementação do SUAS, que você considera mais importantes
para o exercício profissional?
5.6 Quais conhecimentos você considera importantes para o
trabalho profissional?
5.7 Quais atividades você desenvolve?
5.8 Quais instrumentos você utiliza nas suas atividades de trabalho?
(A) grupo
(A) reunião
(A) entrevista
(A) visitas domiciliares
(A) estudos sociais
(A) pareceres
(A) encaminhamentos
(A) abordagem
(A) observação.
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
QUESTIONÁRIO: ANÁLISE DAS CONDIÇÕES SOCIAIS, POLÍTICAS E CULTURAIS E DA INTERVENÇÃO PROFISSIONAL...
5.9 Qual a contribuição destes instrumentos para o desenvolvimento
161
de suas atividades?
5.10 A quem se destinam os serviços sociais prestados pela organização?
5.11 Quais as demandas mais comuns apresentadas pela população
atendida?
5.12 Por que essas demandas são as mais comuns?
5.13 Quais são as condições de vida da população atendida?
5.14 Quais conhecimentos você considera importantes a respeito da
população atendida?
5.15 Você conhece as organizações populares e movimentos sociais
existentes na região que você intervém e no município?
(A) sim (A)não
Quais?
5.16Você visualiza articulação entre os usuários da sua prática
profissional e os espaços de organização popular ou das lutas
populares? (A) Sim (A) Não
De que forma?
5.17 Qual a relação da sua prática profissional com as organizações
populares existentes na região que você atua e as do município?
5.18 Você desenvolve alguma intervenção voltada para a inserção dos
usuários em organizações populares e movimentos sociais?
(A) Sim (A)Não
Como?
5.19 Quais as expectativas que a população atendida possui acerca do
seu exercício profissional?
5.20 Como você obtém esta informação?
Sistema Único de Assistência Social, Organizações da Sociedade Civil e Serviço Social
APÊNDICE B
162
5.21 Quais as implicações da sua atividade profissional na realidade
sobre a qual você atua?
5.22 Qual a relação do seu trabalho com os Conselhos da Assistência
Social, Criança e Adolescente, Idosos e outros?
Data: _/_/_ Entrevistador (a): __
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Informações Gráficas
Formato: 16 x 23 cm
Mancha: 12,3 x 19,29 cm
Tipologia: Adobe Garamond Pro (OTF) Bold; Adobe Garamond
Pro (OTF) Italic; Adobe Garamond Pro (OTF) Regular; Bailey
Sans ITC TT Book; Myriad Pro Regular; OttawaPlain.
Papel : Offset 90 g/m² (miolo) - Cartão Supremo 250 g/m² (capa)
Tiragem: 1000 exemplares
Impressão e acabamento: Global Print Editora e Gráfica LTDA
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