Decisão de não introduzir ou de retirar tratamentos de Suporte para

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RBTI / Artigo Original
Decisão de não Introduzir ou de Retirar Tratamentos
de Suporte para Pacientes Terminais Internados
em Unidades de Terapia Intensiva*
Decisions about Withholding and Withdrawing
Treatment on Terminal Patients in Intensive Care Units
Rodrigo Abensur Athanazio1, Marcelo Campos Barbetta1, Almir Galvão Vieira Bitencourt1,
Flávia Serra Neves2, Lara de Araújo Torreão3, Sydney S. Agareno4, José Mário Meira Teles4, Octávio Messeder5
SUMMARY
BACKGROUND AND OBJECTIVES: The aim of this study was to gather information on physician’s perception, regarding
factors that may play a role in the decision making when caring for a terminally ill patient.
METHODS: This is a descriptive study, involving a systematic sample of critical care physician’s in the largest city of the
Brazilian Northeast. We used a questionnaire composed of four groups of questions: 1) individual characteristics 2) ICU
admission process 3) ethics 4) decision of offering or denying treatment to terminally ill patients.
RESULTS: Seventy-five physicians were included in the study, 70.7% male, mean age 32.7 ± 4.3. The majority (58.1%) of
individuals claimed that they seldom admit terminal patients to the ICU. The main criteria to admit these patients to the
ICU were based on underlying disease, prognostic and admitting diagnostic. Forty-seven (47.8%) of responders considered
themselves prepared to make withholding or withdrawing treatment decisions. Do not institute new form of therapy was
considered easier than withdrawing one already in place. Treatments like resuscitation (87.1%) and dialysis (77.4%) were
the procedures most commonly omitted, while dialysis (80.6%) and hemotherapy (51.7%) were more frequently discontinued by physicians treating terminal ill critical care patients. Seventy-five percent of the intensive care physicians were aware
of a case of a management, regarding end of life decision, in the ICU setting.
CONCLUSIONS: Discussions about this complex ethical issue should be encouraged in order to understand factors that
influence decision making and prevent unnecessary life-sustaining treatments.
Key Words: ethics, exclusion criteria, terminal patient
A
decisão sobre a manutenção, recusa ou suspensão
de um tratamento é um dos momentos mais críticos
na prática médica em terapia intensiva1. Isto pare­
ce decorrer, pelo menos em parte, da magnitude das conse­
qüências que uma ou outra conduta pode desencadear ou da
ausência de diretrizes seguras que fundamentem essa tomada
de decisão2. Existem dúvidas sobre qual o melhor momento
para um tratamento ser mantido ou retirado. Por definição
um tratamento pode ser considerado fútil, aquele que não
atingirá as metas pretendidas, ou inútil aquele que possui pe­
quena probabilidade de trazer benefícios ao paciente3.
A habilidade de prolongar artificialmente a vida de pa­
cientes sem expectativa de recuperação, produzida pelo re­
cente e acelerado desenvolvimento tecnológico da Medicina,
particularmente em relação ao suporte avançado de vida, tem
levantado inúmeros questionamentos morais, éticos e práti­
cos4-7. Segundo Moritz e col.8, em Unidades de Terapia Inten­
siva (UTI), esta discussão torna-se evidente, desde a admissão
de um paciente com prognóstico reservado até a percepção
de uma evolução indesejável e o momento da avaliação de
que estes limites terapêuticos foram ultrapassados9. A partir
deste momento torna-se necessário optar entre manter um
tratamento provavelmente fútil, retirá-lo ou recusar novas
terapêuticas. Por trás desta decisão, podem ser encontrados
muitos outros fatores, que estão relacionados às instituições
de saúde (qualidade e organização das UTI e existência de
Comitês de Ética locais) ou aos próprios profissionais médi­
cos (religião, idade, experiência profissional e conhecimentos
do intensivista)9,10.
Num campo onde predominam as probabilidades e incer­
tezas, são necessárias evidências que possam contribuir para
o estabelecimento de uma relação dialética entre a bioética
de morte anunciada, a qualidade de vida dos pacientes, seu
direito à autonomia e os conhecimentos e vontade dos médi­
cos que trabalham em terapia intensiva11. A construção des­
sas evidências, que representará um grande salto no modo
de lidar com a morte, passa pelo reconhecimento das nossas
deficiências e dos aspectos individuais e institucionais que
contextualizam a prática médica, bem como pela proposição
de novos caminhos a serem trilhados.
A importância da conduta do médico em manter, recu­
sar ou suspender um determinado procedimento/terapêutica
1. Acadêmico de Medicina – Universidade Federal da Bahia
2. Acadêmica de Medicina – Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública
3. Mestre em Pediatria. Preceptora da Unidade Docente Assistencial de Pediatria - UFBA. Médica da UTI Pediátrica do Hospital Aliança/BA e
Hospital São Rafael/BA
4. Coordenador do Grupo de Pesquisa do Hospital Português/Ba. Médico da UTI Geral do Hospital Português/BA
5. Professor Adjunto da Universidade Federal da Bahia. Coordenador da UTI Geral do Hospital Português/BA
* Recebido da Universidade Federal da Bahia, Salvador, BA
Apresentado em 28 de julho de 2005 – Aceito para publicação em 13 de setembro de 2005
Endereço para correspondência: Dr. Rodrigo Abensur Athanazio – Rua Ceará 853/1503 – Pituba – 41830-450; Salvador, BA – Fone: (71) 32489479; Fax (71) 3240-4194 – E-mail: [email protected]
Volume 17 - Número 3 - Julho/Setembro 2005
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RBTI / Artigo Original
torna necessária a realização de estudos que procurem identi­
ficar o perfil dos intensivistas quanto a esse tipo de conduta,
tentando destacar os possíveis fatores que nela interferem. O
objetivo deste estudo foi, então, identificar a percepção dos
médicos intensivistas da cidade de Salvador/BA, sobre os fa­
tores que determinam sua tomada de decisões terapêuticas
frente a pacientes terminais.
Figura 1 - Conduta em Relação à Internação na UTI de Paciente
com Prognóstico Reservado cuja Probabilidade de Recuperação
com o Tratamento Intensivo será Praticamente Nula.
MÉTODO
Foi realizado um estudo de corte transversal e descriti­
vo, envolvendo uma amostra sistemática dos profissionais
médicos com atividade em UTI da cidade de Salvador/BA,
independente do tipo de especialização. Cada participante
respondeu um questionário auto-aplicável contendo na sua
maioria perguntas de múltipla escolha que visaram avaliar
a percepção dos médicos intensivistas sobre a recusa ou sus­
pensão de tratamentos em pacientes terminais. O questioná­
rio era composto de três grupos de questões: caracterização
dos entrevistados, avaliação do processo de admissão de pa­
cientes graves na UTI e avaliação da tomada de decisões com
relação à oferta e suspensão de tratamentos. A coleta de da­
dos ocorreu em fevereiro de 2003.
Um estudo piloto foi realizado para validação da quali­
dade do instrumento de coleta. Este trabalho foi aprovado
pelo Comitê de Ética do Hospital Português da Bahia. Para
a análise dos dados foi utilizado o programa SPSS versão
10.0. Foram analisadas as freqüências simples de todas as va­
riáveis, seguida de associações entre variáveis que poderiam
interferir na postura/comportamento do intensivista diante
da questão-problema do estudo, através dos testes Qui-qua­
drado e t de Student.
RESULTADOS
Foram incluídos no estudo 75 médicos atuantes na área
de terapia intensiva na cidade de Salvador, BA, a maioria do
sexo masculino (70,7%), com média de idade de 32,7 ± 4,3.
Os dados demográficos dos participantes do estudo estão
apresentados na tabela 1. A média de duração da atividade
em UTI dos profissionais entrevistados foi de 6,1 ± 4,2 anos,
com uma jornada semanal de trabalho de cerca de 40 horas.
Tabela 1 – Dados Demográficos
Idade (anos)
Sexo (masculino)
UTI adulto / pediátrica
Tempo de formado (anos)
Tempo de atuação em UTI (anos)
Tempo de dedicação em UTI
(h/semana)
32,7 ± 4,3
70,7% (n=53)
85,2% (n=64) / 14,7% (n=11)
8,1 ± 4,3
6,1 ± 4,2
39,2 ± 14,5
A maior parte dos médicos (78,4%) revelou que nunca ou
raramente admitem pacientes terminais em UTI (Figura 1).
A doença de base, o diagnóstico de admissão e o prognóstico
foram os principais critérios utilizados para recusar a admis­
são desse grupo de pacientes (Tabela 2). A admissão desses
pacientes na UTI é influenciada principalmente pela necessi­
dade do seu bem-estar (Tabela 3).
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Tabela 2 – Critérios Considerados para a
Recusa de Admissão de Paciente em UTI
Idade
Diagnóstico
Doença de base
Prognóstico
Qualidade
prévia de vida
Número de
leitos
Custo
Sempre
15,1% (n=11)
78,7% (n=59)
78,6% (n=55)
77,3% (n=58)
50,0% (n=37)
As vezes
43,8% (n=32)
9,3% (n=7)
8,6% (n=6)
10,7% (n=8)
33,8% (n=25)
Nunca
28,8% (n=21)
1,3% (n=1)
1,4% (n=1)
1,3% (n=1)
5,4% (n=4)
26,7% (n=20)
57,3% (n=43)
6,7% (n=5)
27,1% (n=19)
45,7% (n=32)
15,7% (n=11)
Tabela 3 – Fatores que Influenciaram
na Admissão de Paciente na UTI
Pressão familiar
Pressão do médico
assistente
Pressão do médico
da emergência
Necessidade do
bem-estar do
paciente
Sempre
6,8% (n=5)
27,0% (n=20)
As vezes
58,9% (n=43)
60,8% (n=45)
Nunca
34,2% (n=25)
12,2% (n=9)
22,9% (n=16)
64,3% (n=45)
12,9% (n=9)
86,5% (n=64)
13,5% (n=10)
0,0% (n=0)
Quase todos os profissionais (98,6%) declararam partici­
par das discussões sobre a não introdução ou a retirada de
tratamentos, 91,8% o fazem pelo menos uma vez por semana.
No entanto, apenas 47,8% dos entrevistados consideraram-se
completamente capazes de tomar este tipo de decisão, 44,9%
consideraram-se quase sempre preparados. Médicos, familia­
res, pacientes e Comissões de Ética foram considerados os
elementos que mais freqüentemente participam dessas dis­
cussões (Figura 2).
Figura 2 – Participação das Decisões sobre a
Recusa de um novo Tratamento ou Suspensão de
Tratamento já Instituído em Pacientes Terminais.
Médicos
Enfermeiros
Fisioterapeutas
Pacientes
Familiares
Comissão de Ética
Religiosos
RBTI - Revista Brasileira Terapia Intensiva
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A não-introdução de um novo tratamento foi considerada
mais fácil do que a suspensão de um tratamento já instituído
para 78,4% dos entrevistados, para os restantes (21,6%) não há
diferença entre os dois. Reanimação cardiopulmonar (87%) e
diálise (77,4%) foram os procedimentos mais comumente omi­
tidos, enquanto diálise (80,6%) e hemoterapia (51,7%) foram os
procedimentos mais freqüentemente retirados pelos intensivistas
no tratamento de pacientes terminais (Tabela 4). Sedação e anal­
gesia foram os procedimentos menos omitidos ou suspensos.
Tabela 4 – Procedimentos Terapêuticos Freqüentemente
Omitidos ou Suspensos em Pacientes em Estado Terminal.
Antibioticoterapia
Nutrição parenteral total
Métodos dialíticos
Drogas vasoativas
Sedação e analgesia
Ventilação mecânica invasiva
Reanimação cardiopulmonar
Hemoderivados
Omissão
8,1% (n=5)
40,3% (n=25)
77,4% (n=48)
25,8% (n=16)
1,6% (n=1)
16,1% (n=10)
87,1% (n=54)
31,1% (n=19)
Suspensão
37,1% (n=23)
33,9% (n=21)
80,6% (n=50)
38,7% (n=24)
1,6% (n=1)
4,8% (n=3)
51,7% (n=31)
Os fatores que mais interferem na tomada de decisão sobre
recusa de um novo tratamento ou suspensão de um tratamen­
to previamente instituído foram prognóstico, qualidade de vida
posterior, diagnóstico e doença de base (Tabela 5). A grande
maioria dos intensivistas (75%) já teve conhecimento de algum
caso que consideraram mal conduzida a abordagem terapêutica
no paciente terminal, 4% relataram que ocorre freqüentemente.
Tabela 5 – Fatores que Interferem na Tomada de
Decisão sobre a Recusa de Novo Tratamento ou
a Suspensão de Tratamento já Instituído.
Idade
Prognóstico
Diagnóstico
Doença de base
Desejo da família
Qualidade de vida posterior
Possibilidade de sofrer processos Éticos,
Profissionais e Jurídicos
Religião do profissional
Religião do paciente
5,5% (n=4)
76,2% (n=55)
34,3% (n=25)
31,0% (n=22)
11,0% (n=8)
36,4% (n=26)
5,6% (n=4)
0,0% (n=0)
0,0% (n=0)
DISCUSSÃO
Pode ser observado neste estudo que a população de in­
tensivistas das principais UTI de Salvador é jovem (idade mé­
dia de 32 anos) e dedica grande parte da sua carga horária de
trabalho à terapia intensiva.
A presença de discussões sobre interrupção de medidas
terapêuticas em pacientes sem expectativa de cura mostrou-se
rotineira nesse meio, acompanhando uma tendência nacional
e internacional1,6,9. Estudos têm demonstrado que a omissão e
a retirada de mecanismos de suporte vital estão entre as princi­
pais causas de mortalidade em UTI12-14. Embora as discussões
sobre este tema sejam freqüentes, uma parcela considerável de
intensivistas considera-se despreparada para o momento da to­
mada de decisão. Este resultado é esperado, visto que se trata
de um tema de extrema controvérsia, na literatura e que exige
Volume 17 - Número 3 - Julho/Setembro 2005
um debate entre o médico intensivista, o paciente, que muitas
vezes se encontra impossibilitado de expressar sua vontade,
seus familiares, médico assistente e outros profissionais da área
de saúde. Nesse meio, a participação dos familiares na tomada
de decisão foi considerada alta (86,7%) em relação aos dados
encontrados em estudos europeus7,15-17 e semelhante ao que é
observado em estudos na América do Norte10,18 e China19. A
participação da enfermagem em 26,7% dos casos foi superior à
encontrada em estudos em Portugal15 e Canadá20, mas inferior
a outros estudos europeus7,16, onde sua participação chega até
85% num trabalho realizado em Londres21. Neste estudo foi
considerado freqüente, também, a participação de Comitês de
Ética na decisão de omitir ou suspender medidas de suporte.
Existem poucos dados na literatura nacional sobre a parti­
cipação desses Comitês nesse tipo de discussão, no entanto,
trabalhos estrangeiros têm dado cada vez mais importância à
contribuição destes no processo de tomada de decisões22.
Apesar de terem conseqüências e significados iguais, a
atitude de omitir uma nova intervenção é considerada uma
decisão mais confortável do que retirar uma terapêutica já
instituída, isto talvez se deva ao fato da primeira não causar
uma morte tão imediata quanto a segunda. A não adoção de
medidas de reanimação cardiopulmonar, atitude comum na
Europa e EUA onde os pacientes são classificados em DNR
(do-not-resucitate, não reanimar), foi a mais importante me­
dida de suporte omitida nessa casuística. Esta decisão de não
reanimar um paciente em estado crítico irreversível no caso
dele sofrer uma parada cardiorrespiratória é uma atitude
mais cômoda que tenta simular de certa forma um quadro
mais natural, em que o médico não teria uma interferência
direta na morte do paciente. Seguindo esta tendência de evi­
tar uma ação mais direta do médico, é fácil entender que os
métodos dialíticos são freqüentemente omitidos e retirados
nestes casos, por também não provocar uma morte imediata
do paciente. Medidas que possam causar desconforto ou so­
frimento ao paciente são evitadas e por isso a retirada de se­
dação, analgesia e ventilação mecânica raramente são feitas.
Outra grande dificuldade encontrada pelos profissionais
da área é a admissão em UTI de pacientes com prognósti­
co reservado. A tendência atual é não internar esse tipo de
paciente visto que o tratamento intensivo nesses casos pou­
co alteraria a história natural da doença23. Esta recusa pode
acarretar conseqüências importantes para a sobrevida do
paciente, tornando essa decisão difícil e criteriosa. Os fato­
res indicados como mais importantes na recusa da admissão
desses pacientes foram o diagnóstico da doença de base e o
prognóstico, no entanto sabe-se que esta avaliação passa a ser
subjetiva visto que os índices prognósticos atuais se mostram
limitados. Vários outros fatores passam, então, a interferir
nesse processo, dentre eles a qualidade de vida prévia e futura
do paciente, a idade, a expectativa de vida e os custos, não
só financeiros como psíquicos desta internação9. O número
de leitos disponíveis foi citado como critério para recusa da
admissão de pacientes em UTI por aproximadamente um
quarto dos entrevistados, revelando as conseqüências decor­
rentes da escassez de leitos de terapia intensiva nesse meio.
Este dado está presente também em estudos europeus que
mostraram que as admissões em UTI são freqüentemente
limitadas pela disponibilidade de leitos, principalmente na
Espanha, Portugal, Itália e Reino Unido7,24. As pressões exer­
183
RBTI / Artigo Original
cidas pelo médico assistente, o da emergência e pela família
também podem atrapalhar a avaliação25, mas neste trabalho
ficou evidenciado que o bem-estar do paciente é, na maioria
das vezes, o fator primordial na decisão de admiti-lo numa
UTI. Apesar da amostra avaliada ter revelado que raramente
admitem pacientes terminais em UTI, menos da metade con­
sidera-se capaz de tomar este tipo de decisão. Destacando-se,
então, mais uma vez a importância das discussões sobre o
assunto, com participação das Comissões de Ética de cada
hospital, das coordenações e direções médicas juntamente
com os familiares e médicos assistentes é que oferece-se o me­
lhor cuidado médico.
O processo de omissão e retirada de medidas de suporte
vital em UTI deve ser conduzido com a mesma eficiência com
que são realizados os demais processos em UTI. Discussões
sobre esta questão ética complexa devem ser encorajadas
para expandir os conhecimentos sobre os fatores intervenien­
tes no momento da tomada de decisão e evitar abordagens
terapêuticas fúteis ou inúteis. Este processo é complexo, en­
volve múltiplos fatores e é vinculado à realidade regional. O
conhecimento destas peculiaridades locais, torna possível o
estabelecimento de intervenções específicas no processo deci­
sório e figura como aliado indispensável da troca internacio­
nal de informações e consensos já existentes na busca de uma
terapia intensiva que encare a morte com dignidade.
CONCLUSÕES
Esta tentativa de reconhecimento da realidade das UTI,
reveste-se de caráter exploratório, podendo servir de base para
que outros trabalhos estabeleçam em definitivo a força da asso­
ciação entre alguns determinantes aqui levantados e a conduta
do intensivista em relação à manutenção, recusa ou suspensão
de um determinado tratamento. Todo este esforço é empreen­
dido com a finalidade de promover intervenções justificáveis
na rotina das UTI, que permitam num futuro próximo evitar a
obstinação terapêutica/ distanásia e promover uma morte mais
digna aos nossos pacientes, além de auxiliar a prática diária
daqueles que trabalham em terapia intensiva.
RESUMO
JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS: Este estudo visou
investigar a percepção dos intensivistas sobre os fatores que
atuam na tomada de decisões terapêuticas frente a pacientes
terminais.
MÉTODO: Foi realizado um estudo descritivo, envolven­
do uma amostra sistemática dos profissionais intensivistas da
cidade de Salvador, BA. Utilizou-se um questionário autoaplicável composto de quatro grupos de questões: caracteri­
zação dos entrevistados, atualização em temas éticos, avalia­
ção do processo de admissão de pacientes graves na UTI e
da tomada de decisões com relação à oferta e suspensão de
tratamentos.
RESULTADOS: Foram incluídos no estudo 75 médicos
atuantes na área de terapia intensiva, a maioria do sexo mas­
culino (70,7%), com média de idade de 32,7 ± 4,3. A maior
parte da amostra revelou que raramente admite pacientes ter­
minais em UTI. A doença de base, o diagnóstico de admis­
são e o prognóstico foram os principais critérios utilizados
184
para admitir esse grupo de pacientes. Apenas 47% dos entre­
vistados consideraram-se completamente capazes de tomar
este tipo de decisão. A omissão de um novo tratamento foi
considerada mais fácil que a suspensão de um já instituído.
Reanimação (87%) e diálise (77,4%) foram os procedimentos
mais comumente omitidos, enquanto diálise e hemoterapia
foram os procedimentos mais freqüentemente retirados pelos
intensivistas no tratamento de pacientes terminais. A grande
maioria (75%) dos intensivistas já tiveram conhecimento de
algum caso que consideraram má condução na sua aborda­
gem terapêutica.
CONCLUSÕES: Discussões sobre esta questão ética com­
plexa devem ser encorajadas para expandir os conhecimentos
sobre os fatores intervenientes no momento da tomada de de­
cisão e evitar abordagens terapêuticas fúteis ou inúteis.
Unitermos: critérios de exclusão, ética, paciente terminal
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