os significados do bolsa família para as famílias em extrema

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FACULDADE CEARENSE
CURSO DE SERVIÇO SOCIAL
ANA PAULA CHAYN PEREIRA
OS SIGNIFICADOS DO BOLSA FAMÍLIA PARA AS FAMÍLIAS
EM EXTREMA POBREZA ATENDIDAS NO CRAS ANTÔNIO JUSTA MARACANAÚ/CE
FORTALEZA
2014
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ANA PAULA CHAYN PEREIRA
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OS SIGNIFICADOS DO BOLSA FAMÍLIA PARA AS FAMÍLIAS
EM EXTREMA POBREZA ATENDIDAS NO CRAS ANTÔNIO JUSTA
MARACANÁU/CE
Monografia apresentada à Faculdade
Cearense como parte dos requisitos para
obtenção do título de graduada em Serviço
Social.
Orientadora: Profª. Ms. Ana Paula da Silva
Pereira
FORTALEZA
2014
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ANA PAULA CHAYN PEREIRA
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OS SIGNIFICADOS DO BOLSA FAMÍLIA PARA AS FAMÍLIAS
EM EXTREMA POBREZA ATENDIDAS NO CRAS ANTÔNIO JUSTA
MARACANÁU/CE
Monografia apresentada ao Curso de
Serviço Social da Faculdade Cearense –
FAC, como requisito parcial para a obtenção
do título Assistente Social.
Data da aprovação: _____/_____/_____
BANCA EXAMINADORA
______________________________________________
Profª. Ms. Ana Paula da Silva Pereira
(Orientadora)
_________________________________________________
Profª. Ms. Joelma Maria Freitas
________________________________________________
Profª. Ms. Rúbia Cristina Martins Gonçalves
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AGRADECIMENTOS
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A Deus, por permitir mais essa conquista em minha vida.
À minha mãe e ao meu pai, que em suas particularidades me
incentivaram para vencer mais essa etapa.
À minha família de coração, Deusa, Carlos Mendes, Deib, Caio e todos os
tios e tias, que me acolhem com tanto amor e me apoiam sempre.
Às minhas amadas amigas Jordânia da Luz e Suelen Costa, que apesar
da distância, me dão força e não me deixam desanimar nunca.
Às minhas amigas e companheiras de CRAS, Érica, Chirle, Elizete,
Simone; em especial: Lenilúcia, Alânia e Clécia, todas – carinhosamente - me fazem
tão bem e me engrandecem enquanto pessoa.
Ao meu amado noivo, que me incentiva e me apoia, sempre com carinho,
amor e cuidados diários.
À minha orientadora, pela sua serenidade e leveza na construção desse
trabalho.
Às professoras da banca, Joelma e Rúbia, que atenciosamente aceitaram
meu pedido para leitura e avaliação do meu trabalho.
Às mulheres participantes da pesquisa, pelo consentimento das
entrevistas, tornando possível a existência desse estudo.
A todas as amizades que construí ao longo dessa caminhada acadêmica:
Cris Maia, Nathalie Liberato, Patrícia Braga, Leidiane Chaves, Carol Dias, Marjorie,
Mônica, Hianne, Manu, Juliana Cândido, Paulina Lauriano, Soraia, Andrea, Keliane
Barroso. Sejamos fortes na batalha, pois a luta não para!
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“A história humana não se desenrola apenas nos campos de
batalha e nos gabinetes presidenciais. Ela se desenrola
também nos quintais, entre plantas e galinhas, nas ruas de
subúrbios, nas casas de jogos, nos prostíbulos, nos colégios,
nas usinas, nos namoros de esquinas. Disso eu quis fazer a
minha poesia. Dessa matéria humilde e humilhada, dessa vida
obscura e injustiçada, porque o canto não pode ser uma traição
à vida, e só é justo cantar se o nosso canto arrasta consigo as
pessoas e as coisas que não tem voz.”
(Ferreira Gullar)
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RESUMO
O presente estudo tem como objetivo principal compreender os significados do
Programa Bolsa Família para as famílias que vivenciam a situação de extrema
pobreza no município de Maracanaú, atendidas no CRAS Antônio Justa. A
metodologia utilizada é de natureza qualitativa, utilizando-se como principal técnica
para coleta de informações, a entrevista semi-estruturada gravada, com quatro
mulheres residentes nos territórios atendidos pelo CRAS em destaque, bem como
pesquisa bibliográfica e documental. Para análise do objeto, as categorias analíticas
utilizadas no processo investigativo foram: família, pobreza, política social e
significado. Como principais resultados alcançados na pesquisa, observa-se que o
Bolsa Família é muitas vezes a única renda das famílias e que para elas o benefício
recebido agrega positivamente em suas vidas. Conclui-se que o Programa de
Transferência de Renda em questão tem contribuído na vida dessas famílias, como
garantia mínima de acesso a alimentação e a outras formas de consumo. Contudo,
reforça a questão contínua da desigualdade social, pois a garantia de renda mínima
não consegue, em si, superar a extrema pobreza que essas famílias vivenciam.
Palavras-chave: Família. Pobreza. Políticas sociais. Bolsa Família.
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ABSTRACT
This study aims to understand the meanings of the Bolsa Família Program for
families who experience extreme poverty in Maracanaú treated at CRAS Antonio
Justa. The methodology is qualitative in nature, using as the main technique for
gathering information, a semi - structured interview recorded with four women living
in the territories served by CRAS highlighted, as well as literature and documents.
For analysis of the object, the analytical categories used in the investigative process
were : family, poverty, social and political significance. The main results achieved in
the research, it was observed that Bolsa Família is often the only income of the
families who received the benefit for them adds positively on their lives. It is
concluded that the Cash Transfer Program in question has contributed to the lives of
these families, as a minimum guarantee of access to food and other forms of
consumption. However, reinforces the continuing social inequality, because the
guaranteed minimum income itself unable to overcome the extreme poverty that
these families experience.
Key Words: Family. Poverty. Social policies. Bolsa Família.
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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
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BF – BOLSA FAMÍLIA
BPC – BENEFÍCIO DE PRESTAÇÃO CONTINUADA
CADÚNICO – CADASTRO ÚNICO
CF – CONSTITUIÇÃO FEDERAL
CLT – CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO
CRAS – CENTRO DE REFERÊNCIA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL
CREAS – CENTRO DE REFERÊNCIA ESPECALIZADO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL
FGTS - FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO
GESUAS – GESTÃO DO SISTEMA ÚNICO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL
IBGE – INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA
IAPs – INSTITUTOS DE APOSENTADORIAS E PENSÕES
IPECE – INSTITUTO DE PESQUISA E ESTRATÉGIA ECONÔMICA DO CEARÁ
LBA – LEGIÃO BRASILEIRA DE ASSISTÊNCIA
LOAS – LEI ORGÂNICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL
ODM – OBJETIVOS DE DESENVOLVIMENTO DO MILÊNIO
ONGS- ORGANIZAÇÃO NÃO GOVERNAMENTAL
ONU – ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS
PBF – PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA
PAIF – SERVIÇO DE PROTEÇÃO E ATENDIMENTO INTEGRAL À FAMÍLIA
PGRM – PROGRAMA DE GARANTIA DE RENDA MÍNIMA
PNAD – PESQUISA NACIONAL POR AMOSTRA DE DOMICÍLIOS
PRONATEC – PROGRAMA NACIONAL DE ACESSO A ENSINO TÉCNICO E
EMPREGO
PTR – PROGRAMA DE TRANSFERÊNCIA DE RENDA
SCFV – SERVIÇO DE CONVIVÊNCIA E FORTALECIMENTO DE VÍNCULOS
SENARC – SECRETARIA NACIONAL DE RENDA E CIDADANIA
SUDENE – SUPERINTENDÊNCIA DO DESENVOLVIMENTO DO NORDESTE
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SUMÁRIO
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INTRODUÇÃO ...................................................................................................................................... 9
1. FAMÍLIA E EXTREMA POBREZA: INTERFACES DA REALIDADE BRASILEIRA ............ 11
1.1. Panoramas históricos e demográficos da família brasileira contemporânea:
mudanças societárias nos últimos 20 anos. .............................................................................. 11
1.2. Extrema pobreza: vulnerabilidade e exclusão social ....................................................... 14
1.3. A centralidade da família nas políticas públicas: perspectivas de intervenção ........... 20
2. BOLSA FAMÍLIA: UMA APROXIMAÇÃO AO PROCESSO DOS PROGRAMAS DE
TRANSFERÊNCIA DE RENDA NO BRASIL ................................................................................. 27
2.1. A Política Social Brasileira no século XXI: a hegemonia dos programas de
transferência de renda como estratégia de gestão da pobreza .............................................. 27
2.2. Programa Bolsa Família: um programa de transferência de renda condicionada ...... 44
3. FAMÍLIAS EM EXTREMA POBREZA ATENDIDAS NO CRAS ANTÔNIO JUSTA EM
MARACANAÚ/CE............................................................................................................................... 49
3.1. Trajetórias Metodológicas da Pesquisa ............................................................................. 49
3.2. O Lugar da Pesquisa: Cras Antônio Justa em Maracanaú ............................................. 51
3.3. Os Sujeitos da Pesquisa: Famílias em Situação de Extrema Pobreza ........................ 53
3.4. Análises da pesquisa ............................................................................................................ 55
CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................................. 62
REFERÊNCIAS .................................................................................................................................. 64
APÊNDICE .......................................................................................................................................... 69
9
INTRODUÇÃO
O interesse pela temática surgiu em junho de 2012, quando comecei a
trabalhar no CRAS Antônio Justa, exercendo a função de educadora social,
atendendo às famílias na recepção e realizando inscrições no Cadastro Único. Essa
aproximação despertou o interesse em entender o que significa - para aquelas
famílias - receber ou não o Bolsa Família e em quê isso mudava em suas vidas. Por
isso, decidi falar acerca desse programa de transferência de renda que objetiva
superar a pobreza e buscar entender as suas dimensões dentro do contexto
socioeconômico dessas pessoas.
O presente estudo tem como objetivo, analisar os significados do
Programa Bolsa Família na vida das famílias extremamente pobres. O campo de
pesquisa foi o Centro de Referência de Assistência Social – CRAS Antônio Justa, no
município de Maracanaú/CE, sendo os sujeitos da pesquisa as famílias em situação
de extrema pobreza.
A pesquisa tem o propósito de contribuir para o debate acerca das
políticas sociais na sociedade brasileira e como elas se configuram dentro do
contexto político, social e econômico, bem como fomentar a discussão sobre o real
sentido dos programas de transferência de renda que visam minimizar a pobreza.
Diante desse cenário, o Serviço Social, deve inserir-se cotidianamente em suas
ações, com elementos pautados na reflexão crítica sobre as diversas expressões da
questão social e quais são os impactos que as políticas públicas tem na vida dos
usuários.
As categorias centrais desse estudo são família, pobreza e política social.
Servindo de embasamento teórico autores como Socorro Osterne, Maria do Carmo
Brandt Carvalho, Maria Carmelita Yazbek, Pedro Demo, Regina Célia Mioto, Raquel
Raichelis, Maria Ozanira da Silva e Silva, entre outros, para refletir sobre a realidade
das famílias extremamente pobres beneficiadas pelo Bolsa Família, mais
especificamente as dos territórios atendidos pelo CRAS Antônio Justa, no município
de Maracanaú.
No Capítulo I, intitulado “Família e extrema pobreza: interfaces da
realidade brasileira”, há a apresentação de uma discussão sobre os novos modelos
estruturais da família e as principais transformações ocorridas na sociedade
10
brasileira, desde a década de 1990, que refletiu diretamente no processo de
reprodução social. Em seguida faz-se uma reflexão no tangente da extrema
pobreza, enquanto resultante do sistema capitalista que, apesar de fomentar o
desenvolvimento
econômico,
esse
não
cresce
proporcionalmente
com
o
desenvolvimento social, agravando a desigualdade social e as vulnerabilidades das
famílias que vivenciam essa situação, fortalecido ainda por um debate teórico e
conceitual sobre a pobreza na percepção de diversos autores. Por fim, o capítulo I
eleva a proposta da centralidade das famílias nas políticas públicas brasileiras na
perspectiva de atuação do Estado e na tentativa de promover direitos e cidadania.
No capítulo II, com o título “Bolsa Família: uma aproximação ao processo
dos programas de transferência de renda no Brasil”, realiza-se um resgate histórico
das políticas de proteção social implementadas nesta República Federativa,
perpassando as mudanças ocorridas a cada governo e a forma como elas se
desenvolveram
até
nos
apresentar
a
predominância
dos
Programas
de
Transferência de Renda em todo o país desde a década de 1990, consolidando
atualmente o maior programa de garantia de renda mínima do país, o Bolsa Família;
que ganha destaque ao final do capítulo, como transferência de renda condicionada
à saúde e à educação, devendo as famílias atender critérios de elegibilidade,
acrescentando a isso diversas citações de estudiosos da temática.
Por fim, no Capítulo III, “Famílias em extrema pobreza atendidas no
CRAS Antônio Justa em Maracanaú/CE”, retrata o percurso metodológico da
pesquisa e a aproximação e escolha do objeto de estudo. Em seguida é descrito o
local da pesquisa bem como é feita a análise do perfil das famílias entrevistadas.
Finaliza-se com as reflexões acerca do que foi pesquisado enfatizando os
significados do Bolsa Família para essas famílias e suas contribuições enquanto
programa de transferência de renda, que busca a superação da pobreza.
Nas considerações finais, é feita uma síntese das discussões expostas no
corpo de texto desse trabalho, contribuindo com a autonomia da autora na produção,
ao colocar em evidência as questões desafiadoras que perpassam nossa sociedade,
imbricada em um contexto socioeconômico excludente, com políticas públicas
focalizadas e compensatórias, que não atendem a todas as necessidades básicas
de seu público alvo: as famílias que vivenciam situação de pobreza extrema.
11
1. FAMÍLIA E EXTREMA POBREZA: INTERFACES DA REALIDADE BRASILEIRA
O modelo estrutural da família brasileira ou sua referência, como assim
denominam alguns autores, desde os anos 1990 tem passado por transformações
acompanhando os acontecimentos históricos, sociais e econômicos. São essas
transformações que se pretende discutir nesse capítulo, as quais refletiram
diretamente na composição familiar e seu significado no processo de reprodução
social.
1.1. Panoramas históricos e demográficos da família brasileira contemporânea:
mudanças societárias nos últimos 20 anos.
“A família brasileira seria o resultado da transplantação e adaptação da
família portuguesa ao nosso ambiente colonial, tendo gerado um modelo com
características patriarcais e tendências conservadoras em sua essência” (SAMARA
1998, p.7 apud NASCIMENTO, 2006, p.6). Os traços de família patriarcal persistiram
expressivamente até o século XX. Somente com a Constituição de 1988, em seu
artigo 5º inciso I, dirá legalmente que homens e mulheres são iguais em direitos e
obrigações, modificando a condição do homem ou da mulher como chefe da família.
Nesse processo de modernização nas configurações familiares é
impossível estabelecermos uma única definição de família, pois esta - enquanto
forma específica de convivência e de relações sociais - participa das dinâmicas do
desenvolvimento
socioeconômico,
político
e
cultural
e
é,
inevitavelmente,
influenciada por essas questões. Sobre o conceito de família Osterne (2006) afirma
que:
[…] não é possível admitir a existência de um único conceito de família,
tampouco sustentar sua idealização enquanto fato concreto. A família, tanto
pode constituir-se condição de possibilidades para si e para os seus
membros, como espaço de limitações e sofrimento. Não se pode falar em
família, mas em famílias. O plural comporta a diversidade de arranjos
familiares capazes de existir, hoje, na sociedade brasileira.” (p.2)
As mudanças ocorridas na última década do século XX e início do século
XXI expressam significativamente o novo padrão demográfico da sociedade
brasileira. Esses novos arranjos familiares tornam-se complexos dentro do
dinamismo em que acontecem. Osterne (op. cit.) ressalta que:
essas mudanças dizem respeito, principalmente a: entrada maciça,
duradoura e irreversível das mulheres no mundo do trabalho; deslocamento
nos papeis de gênero; modificações no trato da sexualidade; diminuição dos
12
casamentos; grande número de separações conjugais; aumento da cohabitação e das uniões consensuais; redução dos índices de fecundidade e,
consequentemente, do número de filhos; aumento da concepção em idade
mais precoce; aumento significativo de famílias monoparentais,
principalmente “chefiada” por mulheres; elevação da taxa de atividade das
mulheres casadas com filhos; aumento da perspectiva de vida e,
consequentemente, de uma população mais velha além de novos tipos de
unidades familiares (recompostas ou recombinadas) [...] as influências do
alastramento de todas as formas de violência, a luta dos homossexuais pelo
direito a ter direitos, como fortes intervenientes para a configuração dos
novos arranjos familiares. (p.3)
Portanto, podemos afirmar que as famílias em seus diferentes “modelos”
fazem parte das múltiplas determinações da questão social e articulam-se
dialeticamente à estrutura social na qual estão inseridas.
Segundo Carvalho (2008, p.93) “independente das múltiplas formas e
desenhos que a família contemporânea se apresente, ela se constitui num canal de
iniciação e aprendizado dos afetos e das relações sociais.”
A família enquanto instituição expressa às contradições mais amplas da
sociedade, para Maria Jacinta da Silva (2007, p.3) “a maioria das famílias brasileiras
vivem num contexto de pobreza, desigualdade, vulnerabilidade e exclusão social.”
Segundo Gueiros (2002, p.118) “a família ao longo da história moderna, foi-se
caracterizando como um espaço de inserção e apoio para o indivíduo, embora não
se negue também a existência nela da reprodução da desigualdade e da violência.”
Podemos observar diversas mudanças nas últimas décadas no que diz
respeito ao modo de reprodução da sociedade brasileira, como já foi dito
anteriormente, vários fatores contribuíram para essa nova conceituação de família,
como a diminuição da fecundidade e mortalidade, o aumento da longevidade, o
papel da mulher dentro e fora do espaço doméstico, etc.
Conforme levantamento do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas
– IBGE (2001), sobre a década de 1990, revela um Brasil com famílias menores,
mais escolaridade, melhores resultados na taxa de mortalidade infantil e
transformações diversas no mercado de trabalho. O país termina o século marcado
pela permanência da desigualdade: na década de 90, o rendimento dos 10% mais
ricos e dos 40% mais pobres cresceu 38% (passando de 13,30 salários mínimos
para 18,40) e 40% (da fração de 0,70 salários mínimos para 0,98), respectivamente,
mantendo inalterada a elevada concentração da renda da sociedade brasileira.
13
Segundo esse Instituto, o tamanho das famílias brasileiras - que na
década de 1980 foi de 4,5 pessoas em média - chega ao fim dos anos 1990 com
apenas 3,4 pessoas. A família tradicional, composta pelo casal com filhos, caiu de
quase 60%, em 1992, para 55%, em 1999, ao mesmo tempo em que aumentou a
proporção de outros tipos de composição familiar: de mulheres sem cônjuge e com
filhos (de 15,1% para 17,1%) e de casal sem filhos (de 12% para 13,6%). Cresce
também o número de pessoas vivendo sozinhas, representando 8,6% em todo o
país.
Em comparação aos dados referentes a 2001 o IBGE afirma, no Censo
de 2012, que várias tendências relativas à dinâmica de transformação do padrão de
organização dos arranjos se mantem. Primeiramente, destaca-se o contínuo
crescimento da proporção dos arranjos unipessoais. No Brasil esses arranjos
passaram de 9,2% para 12,4%, no período de 2001 a 2011, o que significa um
crescimento relativo de 35,6%.
Houve
também
modificações
na
distribuição
dos
arranjos
com
parentesco, com redução do peso relativo daqueles constituídos por casal com filhos
(de 53% para 46,3%) e, consequentemente, aumento dos casais sem filhos (de
13,8% para 18,5%).
A PNAD 2011, sobre os arranjos constituídos por mulher sem cônjuge
com filhos, chamados arranjos monoparentais femininos, mostrou uma ligeira
redução. Observamos que tal organização está associada à tendência de queda da
fecundidade, podendo se atribuir também ao desenvolvimento das relações de
gênero, no contexto das transformações econômicas e sociais por que passa a
sociedade brasileira contemporânea.
Podemos afirmar com esses dados que, mudaram as relações de
trabalho, o poder aquisitivo, o formato das famílias, principalmente de quem as
lidera, sendo as mulheres principais protagonistas nas mudanças ocorridas nas
últimas décadas.
As transformações ocorridas dentro e fora das famílias nas últimas décadas
passam, principalmente, pela mudança de valores, pois o valor da família
não prevalece mais sobre o dos sentimentos individuais das pessoas. Por
muito tempo e ainda hoje, os valores associados à família estiveram sempre
apoiados num princípio que atrelava sexualidade, reprodução e casamento,
resultando num modelo de família conjugal, com casamento indissolúvel e
monogâmico. (FUKUI, 1998, p.18-19 apud NASCIMENTO, 2006, p.4)
14
A autora citada acima aponta três grandes transformações que mudaram
as representações de família na sociedade brasileira: primeiro ocorreu a separação
da sexualidade e da reprodução, o número de filhos passou a ser planejado;
segundo, a reprodução dissociou-se do casamento, não há mais filhos ilegítimos e,
finalmente, a sexualidade foi dissociada do casamento, reconhecendo o direito das
uniões consensuais. (FUKUI, op. cit.) Diante dos fatos, Osterne (op. cit.) vem afirmar
que:
[…] os gestores públicos resolveram atentar para a importância do recurso
social representado pela família. Assim, questões relativas ao tema família
ganharam repercussão nacional e internacional, significativa a partir da
década de 1990 [...] Colocando, portanto, a família como lócus do
protagonismo social, remetendo ao entendimento de que os problemas que
as pessoas trazem às instituições, de alguma forma, sempre se relacionam
direta ou indiretamente à vida familiar. (p.1)
As leis brasileiras tiveram que ser adaptadas diante dessas mudanças
societárias. A família compreendida no novo Código Civil é definida por unidade
formada por casamento, união estável ou comunidade de qualquer genitor e
descendente, diferente do Código de 1916, quando a família era apenas aquela
formada por casamento oficial; o casamento passou a ser comunhão plena de vida,
com base na igualdade de direitos e deveres dos cônjuges, reconhecendo também a
união estável; filhos fora do casamento têm direitos idênticos ao dos nascidos dentro
do matrimônio; igualdade dos sexos, a família é dirigida pelo casal e não mais
apenas pelo homem; referente à guarda dos filhos, na lei do divórcio de 1977 a
guarda ficava com quem não tivesse provocado a separação, no novo Código, ela é
concedida a quem revelar melhores condições para exercê-la.
1.2. Extrema pobreza: vulnerabilidade e exclusão social
Avaliar os fundamentos da pobreza no sistema de produção capitalista é
perceber um processo excludente, que gera e reproduz a desigualdade na
distribuição
da
renda
nacional
produzida
pela
classe
trabalhadora
e
consequentemente o aprofundamento da exclusão de uma classe social. Toda essa
dinâmica neoliberal está centrada na expropriação e exploração para garantir a
mais-valia. Portanto, a pobreza manifesta-se como uma das expressões da questão
social, pois é inerente às relações sociais.
Sobre as novas denominações de pobreza, Cézar Henrique Maranhão
(2010) afirma que:
15
[…] na década de 90 do século passado, multiplicam-se designações como
“nova pobreza”, “nova questão social” e “exclusão social”. À medida que o
desemprego e a pauperização avançam, o que se caracterizava como um
fenômeno residual e limitado aos países periféricos ganham relevo e
necessidade de ser explicado. (p.95)
Essa abordagem de uma “nova pobreza” se dá a partir dos efeitos da
globalização, arraigada no contexto neoliberal que fragiliza as relações sociais,
expressa a precarização do trabalho e desregulamenta a proteção social do Estado.
A “nova pobreza” remete a mudanças econômicas e sociais da sociedade
industrial do fim do século. O desemprego de longa duração, as dificuldades
de acesso a um emprego estável para camadas crescentes da população,
as situações de isolamento ligadas, ainda que parcialmente, à
reestruturação dos modelos familiares explicaram o surgimento dessas
“novas figuras” da pobreza nas sociedades desenvolvidas. (SIQUEIRA,
2013, p.201 apud PAUGAM, 2003)
Yazbek (2012) aborda a pobreza como:
[…] uma das manifestações da questão social, e dessa forma como
expressão direta das relações vigentes na sociedade, localizando a questão
no âmbito de relações constitutivas de um padrão de desenvolvimento
capitalista, extremamente desigual, em que convivem acumulação e
miséria. Os "pobres" são produtos dessas relações, que produzem e
reproduzem a desigualdade no plano social, político, econômico e cultural,
definindo para eles um lugar na sociedade. (p. 289)
Para a autora, a condição social das classes subalternas está ligada não
apenas às circunstâncias econômicas, sociais e políticas, mas também aos valores
culturais, pois esses são desqualificados por suas crenças, seu modo de se
expressar e seu comportamento social. (YAZBEK, op. cit., p. 289).
Afirmamos, então, que a pobreza não está ligada somente às privações
materiais, ela "é uma categoria multidimensional [...], não se caracteriza apenas pelo
não acesso a bens, mas é categoria política que se traduz pela carência de direitos,
de oportunidades, de informações, de possibilidades e de esperanças” (MARTINS,
1991, p.15 apud YAZBEK, 2012, p. 290).
Se a exclusão social tem sido enfatizada ultimamente como forma atual da
pobreza, e que sem dúvida oferece uma atenção especial e urgente, não se
pode olvidar que ela não é um estado social dado, mas o resultado do
modelo de desenvolvimento seguido, de sequelas de um processo secular e
que adquire contornos com o processo de globalização e de programas
neoliberais.” (WANDERLEY, 2008, p.34)
Portanto podemos compreender que a pobreza está diretamente ligada à
exclusão social, pois as pessoas que vivem à margem da produção e da riqueza
socialmente produzida, revelam a face da desigualdade social, vivenciando todos os
tipos de vulnerabilidades.
16
A partir dos anos 90, além da pobreza, a vulnerabilidade social tem se
convertido no traço dominante, na América Latina, expondo as grandes
maiorias, de forma prolongada, a condições de vida que geram medo,
insegurança e indefinição face à evolução do mercado de trabalho, à
retração da ação do estado e às dificuldades no acesso e precariedade na
qualidade dos serviços básicos” (CEPAL, 2000, p.43 apud ARREGUI;
WANDERLEY, 2009, p.155)
Para Luana Siqueira (2013, p. 164) a “pobreza não é um aspecto residual,
transitório do capitalismo, é estrutural e resultado do seu próprio desenvolvimento. O
capitalismo gera acumulação, por um lado, e pobreza por outro.”
Maranhão (2010)
ressalta um escrito de Marx em que ele define a sociedade burguesa e suas
contradições:
O trabalhador torna-se tanto mais pobre quanto mais riqueza produz,
quanto mais a sua produção aumenta em poder e extensão. O trabalhador
torna-se uma mercadoria mais barata, quanto maior número de bens
produz. Com a valorização do mundo das coisas, aumenta em proporção
direta a desvalorização do mundo dos homens. (MARX, 2002, p.111 apud
MARANHÃO, 2010, p.99-100)
Essa dinâmica contraditória apresentada caracteriza negativamente a
produção capitalista: de um lado o trabalhador que independente de quanta riqueza
produza, dificilmente sairá da condição de vulnerabilidade e, de outro a consolidação
da acumulação de riquezas e o aprofundamento da desigualdade social.
Para Sposati (1996) é inviável o enfrentamento das condições de pobreza
sem mudanças estruturais no modelo econômico concentrador, embora a inserção
da questão na agenda pública brasileira, em meados da década de 1990, represente
um avanço. (apud YAZBEK, op. cit., p.2)
Maranhão (2010) afirma que “em pleno século 21, o capital não
conseguiu livrar-se de uma lei tendencial básica de seu desenvolvimento: quanto
mais se acumula riqueza em forma de capital de um lado mais se aglutina a massa
de trabalhadores despossuídos do outro.” (p. 127)
Exclusão social envolve a negação de direitos, torna a discussão sobre
pobreza bem mais abrangente, pois coloca os indivíduos à margem de todo o
funcionamento político e econômico da estrutura social em que vivem apesar de
estar diretamente ligados à sociedade capitalista; envolve não somente a renda
como é colocada para mensuração da pobreza.
A noção de pobreza vem sendo caracterizada por indicadores de renda e
emprego, bem como o acesso aos recursos sociais (saúde, moradia, educação,
alimentação, entre outros), que a partir deles serão definidos os pobres e os não-
17
pobres. "... São considerados pobres aqueles que, de modo temporário ou
permanente, não tem acesso a um mínimo de bens e recursos, portanto, excluídos
em graus diferenciados, da riqueza social." (YAZBEK, op. cit., p.291) A categoria
pobreza por ser multidimensional, perpassa além da natureza econômica, as
privações materiais e insuficiência no acesso aos direitos sociais e políticos.
Alguns autores discutem dois tipos de pobreza: a absoluta e a relativa.
Segundo Demo (2006, p.81), “a pobreza absoluta é aquela comparada aos próprios
pobres: os pobres estariam menos pobres quando comparados consigo mesmos. Já
a pobreza relativa seria aquela que os pobres são comparados aos mais ricos”.
Para o IPECE (2009) (Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do
Ceará), o conceito de pobreza baseado exclusivamente na renda monetária implica
distinguir entre os dois tipos de pobreza citados, o primeiro deve-se atribuir um valor
monetário limiar aos pobres e não-pobres, definindo uma forma universal. A pobreza
relativa é diferente em cada lugar e está ligada à exclusão social dos indivíduos em
relação à sociedade em que vivem.
Deste modo, a pobreza absoluta fundamenta-se na subsistência, nas
condições básicas que as pessoas necessitam para sobreviver (alimentação,
vestuário, saúde, etc.). Quando se trata da pobreza relativa, existe a relação direta
com a desigualdade na distribuição de renda, ou seja, comparativamente ao
contexto social no qual está inserido, o indivíduo será identificado como pobre
através de seus rendimentos.
Tornou-se uso considerar absolutamente pobre quem sobrevive com menos
de um dólar por dia, e relativamente pobre quem sobrevive com menos de
dois dólares por dia. Tais linhas de pobreza são volúveis ao extremo e
servem, acima de tudo, para dar a entender que o problema não seria tão
grave assim. Por isso mesmo, a pobreza foi repartida em absoluta e
relativa, porque, com isso, mais ou menos metade dela já não seria
preocupação maior.” (DEMO, op. cit,, p.86)
Para a economista Sônia Rocha, "pobres são aqueles com renda se
situando abaixo do valor estabelecido como linha de pobreza, incapazes, portanto,
de atender o conjunto de necessidades consideradas mínimas naquela sociedade."
(2007, p.13)
Amartya Sen tem uma visão oposta quando se restringe a pobreza
apenas à privação de renda. Para o autor, o crescimento econômico, e
especialmente àquele que vincula crescimento ao aumento do PIB de um país, ao
avanço tecnológico ou à modernização social, “não pode ser considerado um fim em
18
si mesmo. O desenvolvimento deve estar relacionado, sobretudo, com a melhoria da
vida que levamos e da liberdade que desfrutamos.” (SEN, 2000, p.29 apud
ARREGUI; WANDERLEY, 2009, p.146)
Para se elaborar medidas de pobreza, durante muito tempo, a
complexidade desse fenômeno tendeu a ficar reduzida aos indicadores de
renda e consumo. Argumentava-se do ponto de vista técnico, que, para criar
parâmetros nacionais e internacionais que permitissem comparações entre
realidades tão diversas, seria necessário encontrar medidas objetivas.
(ARREGUI; WANDERLEY, 2009, p.147)
Definir as famílias que vivenciam a situação de extrema pobreza apenas
pelo perfil monetário, é negar a existência de outros fatores que também
caracterizam essa questão. As famílias que ultrapassam esse valor diário, mas que
não tem condições mínimas de moradia, saneamento básico, alimentação, saúde,
acesso ao mercado de trabalho, essas também deveriam estar no perfil de extrema
pobreza, independente de quanto financeiramente vivem por dia.
Observamos então, que as definições de pobreza em geral, são baseadas
na capacidade de adquirir produtos e serviços, e os resultados desses cálculos
definirão a linha de pobreza. No Brasil ainda não existe uma linha oficial de pobreza.
Basta analisarmos as políticas públicas que utilizam os critérios de renda como
forma de acessá-las. Por exemplo, para o Programa Bolsa Família, a renda
estabelecida é de até R$ 140,00 per capita, já para o Benefício de Prestação
Continuada, os rendimentos mensais da família devem ser inferiores a um 1/4 do
salário mínimo.
Atualmente uma das principais fontes para calcular a pobreza no Brasil é
a PNAD - Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do IBGE e o Cadastro Único
do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Esse permite de forma
ampliada analisar mais detalhadamente o perfil das famílias cadastradas e suas
condições de vida. Apesar de não existir ainda uma linha oficial de pobreza, é mais
comum o cálculo baseado no salário mínimo. É considerado pobre, aquele que
possui renda per capita igual ou inferior a meio salário mínimo. Esses critérios de
rendimentos irão delimitar o que o Governo Federal define como pobreza e extrema
pobreza no Cadúnico, e a partir daí tornar possível o acesso aos programas sociais
voltados para atender essa população vulnerável.
Segundo o IBGE (2010), a linha de extrema pobreza foi estabelecida em
R$ 70,00 per capita considerando o rendimento mensal domiciliar. Deste modo,
19
qualquer pessoa residente em domicílios com rendimento inferior ou igual a esse
valor é considerada extremamente pobre.
Ao tentarmos construir as medidas para mensuração da pobreza,
devemos considerar diversos fatores: econômicos, políticos, sociais e culturais, pois
ao avaliarmos as suas medidas apenas pelo âmbito do consumo e renda, estaremos
reduzindo a pobreza apenas a esses dois aspectos, não considerando a
universalidade desse fenômeno como expressão da questão social. Sobre a questão
social Iamamoto (2008) declara que:
[...] essa é mais do que as expressões de pobreza, miséria e “exclusão”. O
predomínio do capital fetiche conduz à banalização da vida humana, à
descartabilidade e indiferença perante o outro, o que se encontra na raiz
das novas configurações da questão social na era das finanças [...] A
subordinação da sociabilidade humana às coisas – ao capital-dinheiro e ao
capital
mercadoria,
que
retrata,
na
contemporaneidade,
um
desenvolvimento econômico que se traduz como barbárie social. Ao mesmo
tempo desenvolvem-se, em níveis sem precedentes históricos, em um
mercado mundial realmente unificado e desigual, as forças produtivas
sociais do trabalho aprisionadas pelas relações sociais que as sustentam.
(IAMAMOTO, op. cit., p.29 apud SIQUEIRA, 2013, p.221-222)
O Banco Mundial define a pobreza extrema como não ter rendimentos
suficientes para satisfazer as necessidades humanas mais básicas, de alimentação
adequada, água, abrigo, vestuário, saneamento, cuidados de saúde e educação. Até
2008 considerava-se perfil de pobreza, pessoas que viviam com até um dólar por
dia, para atender suas necessidades básicas. Atualmente esse limiar de pobreza é
estabelecido pelo Banco Mundial em 1,25 dólares por dia. De acordo com Luana
Siqueira (2013):
O Banco Mundial pretende identificar, quantificar e qualificar os pobres. A
partir das condicionalidades impostas pelo BM aos países que demandam
de apoio técnico e financeiro para receberem "ajuda" ou empréstimos,
condiciona-se a política econômica desses países, colocando-os como
reféns de suas normas e sua compreensão do que é melhor para o
"desenvolvimento humano", para os trabalhadores e para as relações de
produção, assim como indicam e fomentam instituições que estão direta ou
indiretamente vinculadas aos interesses do poder hegemônico
(organizações não governamentais e fundações, entre outras). (p.122)
Incentivado pelos interesses da economia capitalista, o Banco Mundial
representa e reforça a acumulação de riquezas, pois fomentam suas ações de
combate à pobreza baseadas nas dívidas públicas de nações subdesenvolvidas, ou
seja, ações contraditórias que visam o desenvolvimento econômico, político,
tecnológico, mas que continuam sendo distribuídos de maneira desigual à
20
sociedade. Mesmo com esses investimentos internacionais para auxiliar os países
que vivenciam expressivamente a situação de pobreza, não será possível a
superação dessa questão - que é multidimensional -, sem que haja um rompimento
da apropriação privada das riquezas socialmente produzidas.
A ONU em parceria com os Estados à ela vinculados criou no ano de
2000, um documento chamado “Declaração do Milênio”, tendo entre os Objetivos de
Desenvolvimento do Milênio (ODM) a erradicação da extrema pobreza e da fome
mundial no prazo de quinze anos. No quarto relatório nacional de acompanhamento
dos ODM no Brasil, último levantamento foi realizado em 2010 pelo Ipea, a redução
da pobreza extrema desde 1990 foi de tal ordem que, em 2008, apenas 4,8% da
população eram pobres segundo o critério internacional (de poder de compra de
US$ 1,25 por dia). Segundo o documento, o crescimento econômico acelerado a
partir de 2003 foi o principal fator para que o Brasil alcançasse a meta nacional de
redução da pobreza.
Nesse sentido, o que define a redução da pobreza extrema é o
rendimento econômico da população, esses estudos demonstram a artificialidade
dos dados em que são formulados, pois à proporção que o país cresce
economicamente não é a mesma com que as pessoas tem acesso aos mínimos
sociais e/ou aos direitos garantidos. Marcelo Garcia (2009) aponta a pobreza como:
[...] a tradução de ausências. Ausências de renda, de habitação segura, de
habilitação para o mundo do trabalho, de escolaridade, de saúde, de
educação ou de segurança. A pobreza se expressa no esfacelamento do
acesso aos direitos mínimos de sobrevivência. (p.16)
É consenso que a situação de vulnerabilidade vivenciada pela parcela da
população brasileira com perfil de extrema pobreza, a maior parte está associada à
desigualdade de distribuição de renda no Brasil. Diante da compreensão dos
conceitos de pobreza, o Estado busca desenvolver estratégias para o enfrentamento
dos impactos causados por essa categoria, através da promoção de políticas
públicas focalizadas, bem como a criação de programas de transferência de renda,
uma maneira de garantir renda às famílias que vivenciam a situação de extrema
pobreza.
1.3
A centralidade da família nas políticas públicas: perspectivas de
intervenção
21
Historicamente, a família, apesar de sua importância no âmbito da
proteção social, nem sempre foi merecedora da atenção do Estado, tampouco, no
debate acerca das políticas sociais. Conforme Mioto (2009):
Essa condição altera-se a partir dos anos de 1970, relacionada ao
desenvolvimento e consolidação da crítica feminista sobre a centralidade
dos homens nas teorias prevalentes relacionadas ao “Welfare State”,
recolocando a família em cena. Acrescentando a esses fatos, a autora
também aponta que “a redescoberta da família” vincula-se também ao
declínio da sociedade salarial e à crise do Welfare State. (p.130)
Já nos anos 1980, segundo Raichelis (2006), com a crise do capitalismo
contemporâneo somada à derrocada do Leste Europeu, abre-se o caminho para as
questões emergentes das teses neoliberais de desmontagem do Estado enquanto
mediador da universalização dos direitos e da cidadania.
Para se adaptar a essas novas configurações assumidas pela sociedade
capitalista diante da crise, serão feitos ajustes mundiais, influenciando as políticas
econômicas e sociais, ditados pelo processo de globalização que, conforme a
realidade de cada Estado, irão ter impactos diferenciados. Como é o caso do Brasil,
que é dependente economicamente de instituições internacionais. Nessa mesma
década, o país sofre um processo de lutas pela democratização e confronto com a
ditadura militar, com o objetivo de construir uma sociedade democrática,
intensificando o debate sobre políticas públicas. Em 1988, é criada uma nova
Constituição Federal, redefinindo novas relações entre o Estado e a sociedade civil a
favor da democracia.
Mioto aponta a década de 1990 como divisor de águas para a política
pública brasileira, pois irá coincidir com o avanço da tese liberal do Estado Mínimo e
do mercado enquanto instância reguladora da vida social no contexto mundial (2009,
p.142). Nessa década, a família passa a ter centralidade na agenda pública do
Estado, com seus novos arranjos. Esse debate trouxe novas adequações para as
políticas públicas, alterando o formato de intervenção estatal e o processo de
reprodução social.
De acordo com Osterne (op. cit., p.1) a partir da década de 1990, as
questões relativas ao tema família ganharam repercussão nacional e internacional,
passando a representar um importante recurso social para os gestores públicos.
Mais ainda, a categoria família torna-se núcleo central de estudos para
implementação de políticas públicas. Nos anos 1990 o Brasil enfrenta um processo
22
de disputas no campo político, a proteção social é questão fundamental nesse
debate. Mioto (op. cit.) afirma que:
Esse processo é caracterizado, por um lado, pela tensão entre a proposta
de institucionalização da proteção social definido na Constituição de 1988, e
a desconstrução através da retração do Estado, aderindo ao princípio de
focalização nas políticas públicas e a afirmação do pluralismo do bem-estar.
Por outro lado, pela tensão entre a afirmação da família como parceira na
condução das políticas sociais. (p.143)
É interessante apreendermos as conceituações acerca do que é política
social e, mais especificamente, como ela se expressa enquanto política pública.
Pereira (2011, p,173) apresenta as especificidades de política social e
política pública, salientando que ambas as designações são políticas de ação e
partes integrantes. A política social é uma espécie do gênero política pública. A
autora afirma ainda sobre o conceito de política pública “... todas as políticas (entre
as quais a econômica) que requerem a participação ativa do Estado, sob o controle
da sociedade, no planejamento e execução de procedimentos e metas voltados para
a satisfação de necessidades sociais...”.
Quando se aborda o termo público associado à política, é importante
defini-lo, referenciando à coisa pública, que do latim res (coisa) e publica (de todos),
ou seja, algo que é para todos. Ao abordamos esse conceito, coisa de todos,
estamos aliando Estado e sociedade em prol do atendimento às demandas e
necessidades sociais. Vale ressaltar que a política pública é provida pelo Estado,
mas as escolhas devem ser controladas pelos cidadãos, comprometendo a todos
para atender os interesses comuns. Por haver essa relação Estado/Sociedade,
como consequência existirá um campo de conflitos e acordos que buscará garantia
de direitos. Conforme Pereira (op. cit., p. 174), “... o termo “público” que a qualifica
como política tem um intrínseco sentido de universalidade e de totalidade”.
A autora acrescenta que “a política pública não é só do Estado, visto que,
para sua existência, a sociedade também exerce papel ativo e decisivo; e o termo
público é muito mais abrangente do que o termo estatal.” (PEREIRA, 2009, p.94)
Daí a importância de tornar a família elemento central na discussão e
efetivação das políticas públicas e sociais. Sendo necessário desmitificar o conceito
de família ideal, e entender os diversos formatos que a família contemporânea
apresenta. Independente das suas múltiplas formas, a família se constitui em um
canal de mediação entre o sujeito e a sociedade. Historicamente o trabalho com as
23
famílias tinha um caráter conservador e disciplinador. As ações - quando existiam eram fragmentadas à criança, à mulher, etc.
Todavia, devemos considerar que a família é uma instituição contraditória
podendo exercer funções de caráter protetivo, oferecendo apoio, refúgio, ou até
mesmo sendo geradora de sofrimento, violência, insegurança. Portanto, torna-se
importante o papel do Estado de analisar e atender as necessidades das famílias, a
partir das suas múltiplas formas impostas pela problemática social que elas
expressam.
A família, enquanto forma específica de agregação, tem uma dinâmica de
vida própria, afetada pelo processo de desenvolvimento sócio-econômico e
pelo impacto da ação do Estado através de suas políticas econômicas e
sociais. Por esta razão, ela demanda políticas e programas próprios, que
dêem conta de suas especificidades, quais sejam, a divisão sexual do
trabalho, o trabalho produtivo, improdutivo e reprodutivo.” (FERRARI;
KAULOUSTIAN, 2008, p.12)
Sobre o protagonismo das famílias nas políticas públicas Osterne (op. cit.)
argumenta que:
deve-se observar o real sentido do protagonismo das famílias no interior das
políticas públicas. Fala-se muito sobre as metodologias de intervenção
nessa área, devendo sempre buscar o princípio básico de elevar a família à
condição de parceria dos programas sociais, no sentido da construção de
sua autonomia. A família está sendo pensada como base estratégica para a
condução de políticas públicas. Nesse âmbito, destaca-se a importância das
competências familiares e das redes de sociabilidade e solidariedade
tecidas nesses grupos para o processo de inclusão e proteção social de
seus membros. (p.4)
Devemos considerar, portanto, as análises de alguns autores que
apontam o “familismo” no contexto da formação sócio-histórica dos sistemas de
proteção social no Brasil, onde a família passa a assumir a responsabilidade sobre
seus membros, e o Estado fica isento, temporariamente, de exercer seu papel. Mioto
(op. cit.) esclarece que:
nesse caráter familista, a família constitui em fonte principal de provisão das
necessidades sociais. O Estado somente irá intervir mediante a falência da
unidade familiar no atendimento de bem-estar e na sua impessoalidade de
compra de bens e serviços, no mercado. (p.136)
O incremento da ideia da família como centro de proteção e com ela o
amplo desenvolvimento do voluntariado, das entidades não-governamentais
e o delineamento de „novas profissões‟ no interior das políticas sociais,
inclusive nas públicas, vai favorecer não só a reativação exponencial da
ideia liberal da responsabilidade da família em relação a provisão de bem
estar, como também a reativação das práticas disciplinadoras tão comuns
nos séculos anteriores, principalmente em relação às famílias pobres.” (141)
24
Devemos analisar quais alternativas de proteção social que as famílias
tem atualmente dentro da conjuntura social, política e econômica apresentada pela
ordem capitalista. Segundo Carvalho (2008, p.97) “a crise do „Welfare State‟, o
déficit público, o individualismo crescente, a institucionalização das necessidades
individuais/grupais e o desemprego estrutural introduzem hoje velhos e novos
desafios à política social brasileira e mundial”. Osterne (op. cit.) aponta quem são os
usuários das políticas sociais públicas no Brasil:
Os pobres e excluídos, por excelência, são os usuários das políticas sociais
públicas. Uma característica marcante entre as famílias pobres é a sua
configuração em rede, contrariando uma ideia corrente, porém artificial, de
que estas se constituem em núcleo. É exatamente esta rede de reações na
qual se movem os sujeitos em família que provê os recursos materiais e
afetivos que contam para manterem-se vivendo, cotidianamente, uma vez
que seus direitos de acesso a uma cidadania plena não são garantidos.
(p.3)
Somam-se dificuldades às famílias que vivem a condição de pobreza,
tornando-as um lugar de opressão e conflitos relacionais, a violência doméstica,
tráfico de drogas, a incerteza do ingresso no mercado de trabalho, analfabetismo,
baixa qualificação de mão-de-obra, entre outras vulnerabilidades. Frente a essas
questões as ações do Estado, conjuntamente com a sociedade, devem traçar
metodologias que fortaleçam a categoria família na sua autonomia e emancipação.
Osterne (op. cit., p.5) afirma que “é fundamental adotar a família como realidade
estratégica na operacionalização de políticas públicas interessadas em fortalecer a
condição de cidadania”
As políticas públicas, além de se ocuparem com a provisão de bens
materiais [...] tem que contribuir para a efetiva concretização do direito do
ser humano à autonomia, à informação, à convivência familiar e comunitária
saudável, ao desenvolvimento intelectual, às oportunidades de participação
e usufruto do progresso. (PEREIRA, op. cit., p. 103)
Portanto, as políticas públicas têm como uma de suas principais funções
a efetivação dos direitos de cidadania conquistados pela sociedade dentro do
cenário de lutas e contradições com o Estado, e operacionalizam-se através de
programas, projetos e serviços. Apesar dessa dicotomia, as políticas públicas
também sofrem influências neoliberais, que contribuem negativamente para o
aprofundamento das situações de vulnerabilidades em que vivem as famílias.
Pereira (2009, p.95) cita Sétien e Arriola para explicitar as formas que as
políticas públicas se materializam “são os programas, projetos e serviços sociais
(especialmente estes últimos), que cumprem o papel de materializar, de fato, as
25
propostas, as ideias, os desenhos de ação, os objetivos e meios especificados pelas
políticas públicas”.
Necessita, portanto, romper com as ações voltadas para o indivíduo e
colocar a família no foco das discussões. Segundo Osterne (2010):
para que os esforços de inclusão e extensão de garantias de proteção
social às famílias se traduzam em efetivas, eficientes e eficazes políticas
sociais, necessitam incluir a ideia de intersetorialidade entre as políticas
públicas como prática imprescindível [...] tendo como horizonte sua
emancipação social. (p.5)
A Constituição Federal de 1988, no Artigo 226, expressa que, “A família,
base da sociedade, tem especial proteção do Estado”, mais adiante no parágrafo 8º
explicita que, “O Estado assegurará assistência à família na pessoa de cada um dos
que a integram, criando mecanismos para coibir a violência no âmbito de suas
relações.” Apesar da centralidade na família, cada membro que a compõe é sujeito
de direitos. Portanto, apesar da família ser considerada espaço de proteção
primária, a mesma deve ser assegurada e protegida pela sociedade e pelo Estado.
Osterne (op. cit., p.1) alerta que “é fundamental ser crítico, realista e cuidadoso na
elaboração de políticas públicas para famílias. Somente um conhecimento real e
atualizado, livre de idealizações [...] poderá garantir melhores resultados nas
práticas com os grupos familiares”.
No Brasil, as políticas públicas são segmentadas, setorializadas, apesar
da centralidade ser a família, ainda há uma total desarticulação quando se trata da
aplicabilidade dessas políticas. Aparta cada membro para aplicar suas ações
conforme a situação apresentada, deixando de lado o conceito que a família é uma
rede e, assim, os conflitos e problemáticas expostas se interrelacionam. Osterne
(2006, p.6) explana algumas estratégias acerca da abordagem intersetorial
considerando a mudança de paradigma no modelo de administração pública
tradicional, um projeto ético-político voltado às políticas públicas para a
concretização de cidadania, ação governamental em rede (parcerias entre Estado,
ONGs, comunidade, setor produtivo, etc.).
Segundo Bronzo (2007) programas centrados no atendimento às famílias
tem sido a estratégia dominante nos sistemas de proteção social em todo mundo.
No Brasil, a partir dos anos 90, a família é considerada elemento central na doutrina
da proteção integral, norteadora do Estatuto da Criança e do Adolescente e da Lei
26
Orgânica de Assistência Social, sendo o eixo orientador das ações da Política
Nacional de Assistência Social.
Na tentativa de romper com o que foi apontado acima, o atendimento
segmentado e fragmentado, delibera-se a implementação do Sistema Único de
Assistência Social – SUAS, que pretende no ato de sua criação, dar efetividade à
assistência social como política pública. Essa deve levar em conta três vertentes de
proteção social: “as pessoas, as suas circunstâncias e dentre elas seu núcleo de
apoio primeiro, isto é, a família.” (BRASIL, 2005, p. 15), tendo em vista a
centralidade sociofamiliar no âmbito de suas ações, assegura entre os seus
princípios e diretrizes a convivência familiar e comunitária, bem como a concepção e
implementação dos benefícios, serviços, programas e projetos.
A política de assistência social, com o intuito de promover os direitos
humanos e os direitos da cidadania, tem entre seus princípios e diretrizes do
Sistema Único de Assistência Social - SUAS, a matricialidade sócio-familiar, declara
que:
a família, independentemente dos formatos ou modelos que assume, é
mediadora das relações entre os sujeitos e a coletividade, delimitando,
continuamente os deslocamentos entre o público e o privado, bem como
geradora de modalidades comunitárias de vida. (p.41)
A assistência social reforça a ideia que a família é o núcleo básico de
acolhida, autonomia, convívio e protagonismo social. Devendo o Estado promover
as condições adequadas para que essa política exerça, de fato, suas
responsabilidades, na reprodução social, onde muitas vezes as famílias sofrem o
processo de fragilização e exclusão social.
Apesar da assistência social ser um direito assegurado na Constituição
Federal de 1988 e, em outras legislações específicas, ela ainda esbarrar na
burocratização das gestões nas esferas municipais, estaduais e federais; na
incipiente articulação com outras políticas públicas, que dificultam as ações que
devem ser desenvolvidas com as famílias diante das problemáticas apresentadas
dentro do território ou do espaço sociofamiliar em que vivem; e, principalmente, a
falta da provisão das necessidades básicas, o que está garantido, pelo menos em
lei, são apenas os mínimos sociais.
27
2. BOLSA FAMÍLIA: UMA APROXIMAÇÃO AO PROCESSO DOS PROGRAMAS
DE TRANSFERÊNCIA DE RENDA NO BRASIL
Inicialmente faremos um resgate histórico de como, no Brasil, foram
instituídas as primeiras tentativas de proteção social e de cidadania, desde a criação
do salário mínimo, da previdência social, da Lei Orgânica de Assistência Social, do
Bolsa Escola, da Bolsa Alimentação, do Programa de Erradicação do Trabalho
Infantil, auxílio-gás, até chegarmos ao Bolsa Família.
Apresentaremos a Política Social Brasileira, mais especificamente o
Programa de Transferência de Renda, Bolsa Família, que tem como principal
objetivo a superação da pobreza, aliada a um benefício monetário mensal que,
segundo o Governo Federal, contribui com o acesso das famílias à alimentação
adequada, saúde e educação.
2.1. A Política Social Brasileira no século XXI: a hegemonia dos programas de
transferência de renda como estratégia de gestão da pobreza
Todas as conquistas na área da proteção social brasileira, concomitante
ao Programa de Transferência de Renda em estudo, tem como debate central a
proposta de superação ou erradicação da pobreza, a diminuição da desigualdade
social e, consequentemente, a ampliação da classe média, se levarmos em
consideração que o poder de compra das famílias aumentou nos últimos anos,
devido à garantia mínima de renda, uma forma encontrada de administrar a pobreza.
Pereira (2007, p.127) destaca cinco períodos históricos essenciais da
regulação política, econômica e social. O primeiro momento foi o período anterior a
1930, com a política social do laissez-faire; de 1930-1964, política social
predominantemente populista, com traços desenvolvimentistas; de 1964-1985,
política social do regime tecnocrático-militar, incluindo a fase de abertura política; de
1985-1990, política social do período de transição para a democracia liberal e a
partir dos anos 1990, política social neoliberal.
Nos anos que antecedem a década de 1930, a economia brasileira era
agroexportadora e não havia planejamento social do Estado, sendo esse totalmente
ausente da regulação da área social, deixando para o mercado e a iniciativa privada
não-mercantil as respostas às demandas da pobreza. “A „questão social é questão
28
de polícia‟, fala do então presidente da República, Washington Luís.” (PEREIRA,
2007, p. 128).
[…] ação do Estado perante as necessidades sociais básicas limitava-se,
nesse período, a reparações tópicas e emergenciais de problemas
prementes ou a respostas morosas e fragmentada a reivindicações sociais
dos trabalhadores e de setores populacionais empobrecido dos grandes
centros urbanos.
No âmbito das políticas sociais, as áreas atendidas foram a do trabalho
e da previdência, ainda assim, de maneira precária. Destaca-se, a criação em 1923,
do Departamento Nacional do Trabalho e da Saúde, Código Sanitário, a Lei Elói
Chaves. (FAUSTO, 1999) Percebe-se que a ausência das ações do Estado na área
social não garantia nem o atendimento básico às famílias.
Historicamente, a construção da proteção social brasileira se fortaleceu
nos anos de 1930, com a criação do Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, do
Ministério da Educação e Saúde e dos Institutos de Aposentadoria e Pensão, e a
Constituição de 1934. Com o Estado Novo, no governo populista de Getúlio Vargas,
a Constituinte de 1937, retirou do trabalhador o direito à greve, instituiu o voto
secreto, propiciou o voto feminino, estabeleceu o voto obrigatório para maiores de
dezoito anos. Foi criado, também, o Conselho Nacional de Serviço Social, em 1938,
vinculado aos Ministérios da Educação e da Saúde, objetivando normatizar e
fiscalizar as obras públicas e privadas de “amparo social”, relações entre o Estado e
a segmentos da elite para práticas clientelistas e manipulação de verbas públicas.
(FAUSTO, op. cit.)
Na Era Vargas as leis trabalhistas (CLT) foram consolidadas, definindo
as horas trabalhadas, descanso semanal, férias, criação do imposto sindical, o
surgimento das instituições do Sistema S (SESC, SENAC, SESI, SENAI) e outros
importantes direitos sociais, como o salário mínimo, somente aos trabalhadores
urbanos. (FAUSTO, op. cit.). A criação de todas essas leis não foi pensando apenas
no trabalhador, mas fez parte da estratégia do governo no processo de
industrialização que vivia o país, com a entrada de capital externo e a criação de
estatais, para gerenciar as indústrias de base (aço, petróleo, mineração). Essa forma
de governo centralizava a economia e a política do país, por acreditar na maior
eficiência do Estado, baseado no modelo econômico nacionalista.
Devido o engajamento do Brasil na 2ª Guerra Mundial, em 1942, foi
organizada a Legião Brasileira de Assistência – LBA, gerida pelas Primeiras Damas,
29
e teve como objetivo inicial o amparo às famílias dos soldados enviados à Guerra.
Logo após o fim do conflito mundial, a instituição continuou suas ações filantrópicas
às famílias carentes da época, guiadas conforme os interesses governistas. Foi
extinta em 1995, no governo de Fernando Henrique Cardoso. (FAUSTO, op. cit.)
As instituições sociais e assistenciais, a partir da década de 1930,
serviram de instrumentos para o controle político e social. Essa foi a estratégia
encontrada pelo Estado para manter as relações sociais estáveis, evitar os conflitos
sociais e conseguir elevar os efeitos econômicos da industrialização, que dava –
então – seus primeiros passos no Brasil.
Em 1946, com a derrocada do Estado Novo, o país passou por uma fase
de redemocratização, contrária à fase ditatorial vivenciada no governo de Vargas.
Em relação aos direitos sociais, foi reconhecido o direito de greve e mantidas as
garantias dos trabalhadores já conquistadas na Constituinte de 1934, não havendo
um retrocesso no campo dos direitos dos cidadãos. No campo econômico, Dutra
inseriu
no
país
o
modelo
de
desenvolvimento
econômico
chamado
de
internacionalização, que abriu as portas para a entrada de multinacionais,
desvalorizando a moeda nacional e aumentando a inflação; consequência disso, foi
uma forte crise econômica no Brasil.
Em 1951, Getúlio Vargas voltou ao poder, agora eleito por voto popular,
reforçando junto aos brasileiros sua denominação de “pai dos pobres”. No seu
segundo governo Vargas retornou às suas bases populista e nacionalista, buscando
diminuir a abertura do capital internacional e estatizando o petróleo produzido no
país. Devido à desvalorização do salário mínimo, que aconteceu no governo de
Dutra, por conta da crise econômica, Vargas implementou o projeto de aumento de
cem por cento do salário mínimo. Contrariando as elites, o então Presidente, foi
fortemente criticado por suas ações populistas. Com a tentativa de um novo golpe,
Vargas se suicidou. (FAUSTO, op. cit.). Pereira (2007) afirma que:
do ponto de vista econômico a principal característica do período foi a
passagem da economia agroexportadora para a urbano-industrial. Mas esta
mudança econômica não foi acompanhada de igual impulso no campo
social. A ausência de planificação central, mesmo que indicativa, continuou
sendo a marca da proteção social brasileira até 1954. (p.129)
Juscelino Kubitschek, em 1955, assumiu a Presidência da República,
depois de diversos governos provisórios, com a ideia nacional-desenvolvimentista,
ficando conhecido como “anos dourados”, com o propósito de desenvolver o Brasil,
30
“cinquenta anos em cinco”. Com seu Plano de Metas, JK previu a integração do
desenvolvimento industrial com outros setores, como transporte, educação, energia,
portos, entre outros objetivos, bem como levou para o centro do país a nova capital,
construída em quatro anos. (FAUSTO, op. cit.). Brasília passou a ser nova sede do
Governo. Esse governo incentivou a entrada de capitais estrangeiros e ao
empresariado nacional, bem como propôs uma maior intervenção do governo na
economia. Frente a toda essa perspectiva de crescimento, houve uma disparidade
da dívida externa, e da inflação; as cidades aumentaram desordenadamente num
processo de empobrecimento da população.
Nessa época, foi criada a Superintendência do Desenvolvimento do
Nordeste - SUDENE, para diminuir a desigualdade socioeconômica dessa região em
relação ao Centro-Sul, apontando a desigualdade de renda como o mais grave
problema para o desenvolvimento econômico nacional (FAUSTO, op. cit.). O ritmo
de crescimento da economia da região Nordeste nas últimas décadas estava muito
aquém se comparado ao de outras regiões. Esse órgão atuava no combate à seca,
com medidas de curto prazo, principalmente de caráter assistencial e de longo prazo
na construção de açudes. Mesmo assim não foi possível alcançar muitos resultados
positivos, sendo a seca determinada por fatores climáticos. O Plano de Ação da
Sudene era o de intensificar os investimentos industriais na região Nordeste;
modificar
a
economia
agrícola
para
ofertar
alimentos
para
os
centros
industrializados; transformar a economia das zonas semiáridas para torná-las mais
resistentes às secas. Comparativamente a região Nordeste, em relação às questões
econômicas e sociais, sempre ficou em menor escala com os dados das regiões
Sudeste e Sul do país. Seja pelas condições climáticas, como a seca, seja pela
intensa desigualdade na distribuição das riquezas socialmente produzidas, apesar
da mão-de-obra utilizada ser, prioritariamente, de nordestinos que saíram de suas
terras almejando uma renda que garanta sua sobrevivência e a de sua família.
Quanto ao planejamento central, de 1954 a 1964, Pereira afirma:
que passou a ser valorizado, mas, nele, os aspectos sociais continuaram
marginais. Quando esses aspectos eram contemplados, ficavam sempre a
serviço da rentabilidade econômica e do crescimento industrial, como
aconteceu no governo de Juscelino Kubitschek, que incluiu a educação no
seu Plano de Metas com o objetivo de preparar recursos humanos para a
indústria de bens e consumos duráveis. (2007, p. 130)
Na década de 1960 até 1964, aconteceram os governos de Jânio
Quadros e João Goulart. O primeiro ficou apenas sete meses como presidente da
31
República, com um governo em bases conservadoras, tentou reorganizar as
finanças, dívidas e inflações herdadas das gestões anteriores. Goulart implementou
em seu governo reformas de base – agrária, bancária, fiscal e administrativa. Foram
criados também o Estatuto do Trabalhador, o 13º salário, o salário-família para o
trabalhador urbano e a promulgação da Lei Orgânica da Previdência Social, com o
objetivo de uniformizar os benefícios e serviços prestados pelos antigos IAP‟s.
(FAUSTO, 1999). Pereira (2007, 134) afirma que “apesar de curto, esse governo
apresentou uma proposta mais progressista de política social e uma intenção
deliberada de intervir nas bases de políticas e instituições estratégicas.” Muito
embora tenham acontecido as reformas de base, com intuito de atender as
demandas da sociedade, aconteceu o que o historiador Bóris Fausto chama de uma
mobilização “anti-jango”. Goulart não conseguiu atender às expectativas da classe
média e da burguesia, tanto de ordem econômica como de ordem política, pois
temiam que o populismo levasse ao comunismo, resultando no golpe militar de
1964.
O capitalismo não permite que os direitos e garantias sejam assegurados
a todos, já que é excludente e imparcial, pois grande parcela da população não tem
acesso às condições básicas.
Na verdade, o pacto conservador que sustentou o Estado
desenvolvimentista no Brasil não computou a participação democrática em
nenhuma de suas formas, e jamais patrocinou, por conseqüência, a
institucionalização de estruturas que pudessem dar conta das pressões pela
ampliação da cidadania política e social. (FIORI, 1995, p.145 apud
RAICHELIS, 2000, p.68)
Os militares acreditavam que para a modernização do país seria
necessário a instauração de uma ditadura, que foi de 1964 a 1985, vinte anos de
autoritarismo, cassação aos opositores, exílio, extinção dos partidos políticos,
censura, e tantas outras ações de coerção à sociedade brasileira.
O modelo econômico e político versaram contrariamente ao populismo
que vinha sendo implantado nos governos anteriores. Pereira explicita alguns
acontecimentos da ditadura:
menosprezo pelas massas; valorização do capital estrangeiro; e a
concepção de política social como uma decorrência do desenvolvimento
econômico. [...] privilegiou-se a industrialização de bens de consumo
duráveis; [...] arrocho salarial; reduções das inversões públicas; controle do
crédito; [...] estatização de áreas de infraestrutura, de indústria pesada e de
insumos básicos; [...] proibição de greves... (2007, p. 135)
32
Nos
três
primeiros
anos
de
regime
tecnocrático-militar
deu-se
continuidade aos programas e projetos da era populista. Algumas políticas sociais
foram muitas vezes ligadas à política econômica, exemplo disso foi a criação do
Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS.
(...) Os programas sociais que passaram a ser desenvolvidos desde então
tinham como objetivo prioritário atender aos interesses específicos da
economia de empresa, embora integrassem a ação estatal. Ou seja,
embora públicos na sua gestão, tais programas tiveram a sua execução
privatizada.” (PEREIRA, 2007, p.137)
A década de 1970 foi o momento mais violento da ditadura, sob o governo
Médici. O Brasil emergiu economicamente, com o “milagre econômico” e a política
brasileira passou pelos momentos mais repressores da história: pessoas foram
torturadas, presas, mortas ou desapareceram, pelo simples fato de não
concordarem com o cenário ditatorial que o país enfrentava; bem como a falta de
liberdade e de cidadania. O Estado desenvolveu estratégias de reaproximação com
a sociedade. Iniciou-se, então, a falar sobre a pobreza, apesar do instrumento de
exceção, o Ato Institucional nº 5 – AI5, golpe mais duro contra a democracia.
(FAUSTO, op. cit.).
Ou seja, as políticas sociais desenvolvidas no cenário ditatorial, tinham
caráter eminentemente assistencialista e clientelista, pois a sua execução se
baseava no caráter repressor e excludente do período, com ações emergenciais e
fragmentadas. Eram aplicadas apenas para manutenção dos governos autoritários,
que transmitia uma ideologia que o desenvolvimento social estava ligado ao
desenvolvimento econômico. O Brasil expandia economicamente, estava no auge do
“milagre econômico”, com a ajuda de capital internacional, mas na área social,
houve o aumento da desigualdade e tornavam-se mais intensos os movimentos
sociais e a repressão estatal. Raichelis (2000, p.93) expõe que “os períodos de
maior avanço na institucionalização da política social brasileira ocorrem no contexto
de regimes autoritários, quando as relações entre política social, acumulação e
legitimação são fortemente acentuados.” Paiva afirma que:
As históricas estruturas de poder político e econômico no Brasil, e na
América Latina em geral, estabelecem padrões extremamente injustos e
assimétricos de usufruto da riqueza coletivamente construída, além de
processos cada vez mais excludentes de acesso ao trabalho forma
assalariado. Neste contexto, pensar as políticas sociais para além do
horizonte de mera estratégia de acomodação de conflitos, requer referenciála no processo de disputa política pelo excedente econômico real pelas
massas historicamente expropriadas, de maneira a que ela não possibilite
somente reduzir as manifestações mais agudas da pobreza, através da
ampliação dos serviços básicos e do seu acesso, mas sobretudo permitir
33
que a política social torne-se um instrumento de transformação social que
mobiliza e organiza as massas a partir de seus interesses mais fortes.
(PAIVA, 2006, p.6 apud DALLAGO, 2007, p.6)
Nesse movimento de descontentamento com o governo autoritário,
surgiram vários movimentos sociais clamando por democracia: a União Nacional dos
Estudantes (UNE), a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Associação Brasileira
de Imprensa (ABI), algumas organizações da Igreja Católica, movimentos feministas,
de funcionários públicos, da classe operária, a mais representativa foi a do ABC
paulista, coordenada por Lula. (FAUSTO, op. cit.).
O governo de João Batista Figueiredo, último governo militar, levantou a
bandeira da democracia como forma de amenizar os conflitos nacionais, instituiu a
anistia, a criação moderada de partidos políticos, deu autonomia aos poderes
Judiciário e Legislativo, mas não deixou de lado algumas contenções políticas. Ou
seja, as políticas sociais nesse período, foram impostas para acalmar os ânimos da
sociedade, e não como forma consciente de atender as necessidades sociais, que
se aprofundavam no contexto de pobreza, miséria, inflação desenfreada e
desigualdade social. O Estado desejava com isso se reaproximar da sociedade.
Segundo Pereira (2007, p.144) “os flagrantes focos de pobreza absoluta, [...]
tornaram-se alvo prioritário dessa política. Sem poder negá-la, a melhor tática
governamental foi reconhecê-la e incluí-la nos Planos de Desenvolvimento.”
Foram criados órgãos e mecanismos de formulação, coordenação e
execução de políticas sociais: Conselho de Desenvolvimento Social (CDS), Fundo
de Apoio ao Desenvolvimento Social (FAS), Ministério da Previdência e Assistência
Social, Sistema Nacional de Previdência e Assistência Social. (PEREIRA, 2007)
Esse governo sofreu com a crise econômica gerada pelo fim do “milagre
econômico”, a elevação do déficit público, forte pressão da sociedade civil, crise
fiscal do Estado. Toda essa crise rebateu diretamente na execução e nos recursos
destinados às políticas sociais. Nesse período, são desenvolvidos diversos
programas nas instituições, com ações fragmentadas que buscavam atender à
parcela da população mais vulnerável.
[...] até 1985, as políticas sociais funcionaram como uma espécie de „cortina
de fumaça‟ para encobrir as verdadeiras intenções de um regime que
relutava em sair de cena, tornando mais fugaz a pretensão de ao menos
criar aquele mínimo de bem-estar alcançado pelas democracias liberaisburguesas. (PEREIRA, op. cit., p.138)
34
Em 1983, houve um grande movimento civil no Brasil, denominado
“Diretas Já”, para que fosse eleito um Presidente através do voto direto, mas a
proposta não foi totalmente aprovada no Congresso. No ano seguinte, Tancredo
Neves, foi escolhido pelo colégio eleitoral, para representar a nação, simbolizando o
fim do regime ditatorial; mas, o então Presidente, não chega a ser empossado
devido sua morte, assumindo o cargo o vice presidente José Sarney. Inicia-se nesse
período o momento de “Transição Democrática”/; o país passaria, portanto, por uma
reorganização institucional. Uma Constituinte é convocada em 1986, para fazer uma
reformulação na Constituição Federal, com a colaboração dos membros da Câmara
dos Deputados e do Senado Federal, obtendo seu resultado definitivo em 1988.
(FAUSTO, 1999) Na Carta Magna de 1988, pela primeira vez, a assistência social foi
incluída como componente do Sistema de Seguridade Social, saindo do status de
filantropia. Ficou definida também, a descentralização administrativa e financeira das
esferas federal, estadual e municipal. Nessa nova fase da República, os canais de
participação da população são abertos e ampliados, criando-se mecanismos de
controle democrático, como os conselhos de políticas públicas e de defesa de
direitos, bem como a representação paritária do Estado e da sociedade na
composição.
Pereira (op. cit., p. 149) aponta alguns documentos criados nesse
governo civil: “Subsídios para a Ação Imediata contra a Fome e o Desemprego;
Comissão para o Plano de Governo; Programas de Prioridades Sociais; [...] amplia a
Seguridade Social, sugerindo uma vertente não contratual e não contributiva de
proteção social pública.”
O lema do governo de Sarney era fazer “tudo pelo social” e esse objetivo
social era o de atuar de modo emergencial no combate à fome, desemprego e à
pobreza. Como de costume na política social brasileira, essa sempre estará
vinculada ao desenvolvimento econômico do país. Sarney tomou algumas iniciativas
de conteúdo econômico-social, como a criação do Plano Cruzado, na tentativa de
controlar a hiperinflação; outra foi a criação do Plano de Metas, que planejava
combater à pobreza e manter o crescimento nacional, bem como a criação de outras
políticas emergenciais. (FAUSTO, op. cit.). Algumas ações foram frustradas, e não
conseguiram atender às necessidades dos brasileiros e minimizar a desigualdade
social no país. Raichelis (2000, p. 72) afirma que “a aspiração democrática que se
irradia nos países capitalistas periféricos da década de 1980 traz no seu bojo a
35
recessão econômica, a escalada inflacionária, a crise fiscal do Estado, o
agravamento da miséria, [...] assim chamada década perdida.” A crise econômica
deixou cada vez mais o Brasil dependente dos organismos internacionais, com
propostas de estabilização e privatização, interferindo diretamente no financiamento
do Estado nas políticas públicas.
A década de 1980 foi marcada pelo processo de redemocratização e
rearticulação da sociedade civil organizada, que colocou na pauta as lutas políticas
por direitos sociais básicos, com destaque para a consolidação da cidadania. O
resultado de toda essa efervescência resultou na Constituição Federal de 1988, que
definiu o Estado como responsável pela garantia dos direitos sociais. Apesar dessa
conquista ser reflexo das lutas e mobilizações da sociedade, também não deixou de
existir as correlações de forças de interesses específicos e a disputa pela
hegemonia, mantendo de certa forma alguns traços conservadores.
A área social foi a que ganhou maior destaque na nova Constituição de
1988, ampliando a responsabilidade do Estado, garantindo a assistência social como
direito do cidadão. Mais ainda: concretizando direitos a diversos segmentos sociais,
como a família, a criança e o adolescente, ao idoso, a pessoa portadora de
deficiência, entre outros. Consolidar a assistência social como direito, não significa a
diminuição da representatividade estatal, pelo contrário, reforça sua atuação para
assegurar os direitos de quem dela necessite.
A Seguridade Social se destacou dentro do novo contexto legal,
abrangendo três políticas: a de Saúde, Previdência e Assistência Social, garantindo
proteção social pública. Draibe (2003, 1993) salienta que:
Além de considerar tais políticas como mecanismos imprescindíveis de
concretização de direitos, concebeu um novo modo de financiamento da
área, apoiado em fundos e orçamento únicos, e redefiniu benefícios e
formas de organização pautadas pelo princípio da universalização. (apud
DALLAGO, 2007, p. 5)
Na entrada da década de 1990, como vinha ocorrendo na década
anterior, a organização da sociedade civil continuou se fortalecendo nas decisões
das políticas públicas, abrindo espaço para o surgimento de novos sujeitos sociais.
Gohn (1995) declara que “essa década foi palco de múltiplas tendências, que se
expressaram com grande visibilidade, ganhando a opinião pública: o crescimento
das ONGs e as propostas de políticas de parceria implementadas pelo Estado em
36
suas diferentes esferas...” (apud RAICHELIS, 2000, p.78) Mais adiante Raichelis
(op. cit.) define essa parceira entre Estado e sociedade:
Esta versão comunitarista de conceber a sociedade civil reaparece no bojo
de um conjunto de propostas que estimulam iniciativas voluntárias de
parceria da comunidade na realização de projetos de enfrentamento da
pobreza, que, na perspectiva que as orienta, não consegue ser
equacionada dada a falência do Estado e sua incapacidade de fazer frente
ao volume das demandas sociais... (p.79)
No governo Collor, houve um redirecionamento do Estado, levando ao
avanço das teses neoliberais, com bases governamentais na modernização da
economia, incentivado pela iniciativa privada e a articulação com agentes privados,
executando políticas que são complementares ao mercado. A política social no
governo Collor foi concebida de “forma marginal, residual e emergencial.”
(RAICHELIS, op. cit., p.96)
Collor vetou, em 1991, o Projeto da Lei Orgânica de Assistência Social,
que já tinha sido aprovado pelo Congresso Nacional, que trazia como destaque os
benefícios de prestação continuada que garantia um salário mínimo ao idoso e ao
deficiente. O Estado não queria abonar financiamento para garantia dos direitos
sociais, preferia transferir verbas públicas às entidades assistenciais e filantrópicas,
a LBA era o principal órgão da assistência na época, vale ressaltar que sua gestão
cabia à Primeira-Dama.
Depois do impeachment de Fernando Collor, assumiu Itamar Franco.
Este presidente encontrou uma área social desarticulada e sem recursos definidos.
Lula, enquanto presidente do PT, manifestou a proposta da sociedade civil, o
Programa de Segurança Alimentar, que virou Conselho (Consea), atuava no
programa de merenda escolar, no atendimento ao desnutrido e ao trabalhador, a
reforma agrária e na distribuição de alimentos (ROCHA, 2013). Apesar de iniciativas
pontuais, poucos resultados foram alcançados para a diminuição da desigualdade
social. Para Raichelis (op. cit., p.101) “a ausência de um plano social de governo
articulado e orgânico levou à permanência da histórica fragmentação e pulverização
de iniciativas dispersas no campo das políticas sociais.” Houve a incapacidade do
governo de evitar desperdícios, corrupção, o clientelismo e romper com os
interesses empresariais.
Em 1993, foi sancionada a Lei Orgânica de Assistência Social, introduzindo
novos significados da assistência social enquanto política pública de seguridade. A
37
LOAS tornou-se mais um avanço no campo da Política de Assistência Social,
propondo novas práticas como: descentralização político-administrativa, ampliando
os espaços democráticos e aproximando o atendimento das particularidades em
cada
território;
garantia
do
financiamento
das
três
esferas
de
governo;
responsabilizando o Estado como regulador, rompendo a trajetória de benemerência
e assistencialismo da política social; buscando atender as demandas das famílias,
legitimando a assistência social como direito, favorecendo o protagonismo e a
autonomia dos cidadãos.
Fernando Henrique Cardoso assumiu o cargo de Ministro da Fazenda
em 1993. Criou-se o Plano Real que o ajudou a assumir a presidência da República.
Baseado no Consenso de Washington, esse novo governo, planejou a estabilização
da moeda, a privatização das estatais, a redução do papel regulador do Estado,
diminuiu os gastos públicos nas áreas sociais a fim de pagar a dívida externa.
(FAUSTO, op. cit.). Nesse contexto de globalização e ajuste estrutural, a falta de
emprego, a desigualdade social, a miséria ficaram acentuados.
Apesar da “Constituição Cidadã” de 1988 garantir deveres do Estado e
direitos aos cidadãos, as reformas estatais na década de 1990, baseados nas
influências neoliberais, transformaram as políticas sociais em seletivas e
compensatórias. As responsabilidades do Estado foram transferidas para a
sociedade civil e para o mercado. Yazbek (op. cit., p.24) reflete sobre essa
contradição na relação do Estado com as políticas sociais:
[...] plena de ambiguidades e de profundos paradoxos. Pois se, por um lado,
os avanços constitucionais apontam para o reconhecimento de direitos e
permitem trazer para a esfera pública a questão da pobreza e da exclusão,
transformando constitucionalmente essa política social em campo de
exercício de participação política, por outro, a inserção do Estado brasileiro
na contraditória dinâmica e impacto das políticas econômicas neoliberais,
coloca em andamento processos articuladores, de desmontagem e retração
de direitos e investimentos públicos no campo social, sob a forte pressão
dos interesses financeiros internacionais.
No governo de FHC a política social sofreu o desmonte de alguns órgãos
governamentais de assistência social como a LBA e o Consea (ROCHA, 2013). Para
atender as demandas sociais, o presidente criou o Programa Comunidade Solidária,
com ações assistenciais desenvolvidas inconstitucionalmente, pois não articulava
com a assistência social, a saúde e a previdência, demonstrando retrocessos nos
direitos assegurados na Constituição Federal de 1988 e na LOAS. Oliveira (1995)
38
explicita sobre a maneira que o governo de FHC conduziu suas ações no campo das
políticas sociais:
O projeto político do governo como a combinação de uma diretriz
fortemente liberal com uma prática populista que busca estabelecer uma
relação direta com o “povo”, passando por cima das representações
construídas pela sociedade brasileira: os movimentos populares
organizados, os sindicatos, as organizações civis, as entidades
profissionais, ou seja, o movimento associativo que vem se adensando
desde a década de 80 na luta pela democratização política, econômica e
social. (apud RAICHELIS, op. cit., p.111)
O Estado brasileiro teve como prioridade a inserção na economia
internacional, considerando, portanto, os direitos sociais conquistados ao longo das
décadas, como uma barreira para adentrar na nova ordem mundial. Alguns
instrumentos normativos foram criados, mesmo que a longo prazo, como a Política
Nacional de Assistência Social e a Norma Operacional Básica, estabelecendo
condições de gestão, financiamento e controle social.
Como já foi visto, a política social no governo FHC sofreu retrocessos
devido à desresponsabilização do Estado na área social, que estimulou a
solidariedade na sociedade civil, através das organizações não-governamentais,
para que essa combatesse a pobreza, além da privatização dos serviços sociais
públicos intermediados pelo mercado.
Desse modo, afirmamos que as leis em pauta na CF de 1988 e na LOAS,
não estiveram em curso nesse governo, ampliando as discussões e conflitos em
torno da assistência social. Na sua implementação, as políticas sociais são limitadas
às políticas neoliberais, conforme os seus interesses econômicos.
A pobreza certamente não será debelada tão somente pelas políticas
sociais, muito menos se estas são tópicas e de caráter emergencial, como
tem sido no Brasil. A articulação das políticas econômicas com as políticas
sociais é pressuposto fundamental para priorização da área social, não
numa perspectiva de mera subordinação destas àquelas, mas como
reconhecimento de que o desenvolvimento econômico não se faz sem
desenvolvimento social e que este não pode prescindir do progresso
econômico. (SILVA, 2003, p.238)
O Sistema de Proteção Social, apesar de grandes avanços
democráticos, tem sido insuficiente no atendimento às necessidades sociais da
população brasileira, principalmente na parcela mais empobrecida. Podemos
apontar diversos fatores que agravam essas questões como: o não acesso ao
mercado de trabalho, elevando a informalidade do trabalho; a desproteção social por
parte do Estado; as instabilidades nos empregos e baixas remunerações; políticas
39
compensatórias
ligadas
ao
desenvolvimento
econômico;
a
exclusão
e
a
desigualdade social acentuadas.
No início dos anos 1990, os Programas de Transferência de Renda,
começam a ocupar espaço no debate sobre as questões sociais. No Brasil, a
proposta mais específica sobre Programas de Transferência de Renda surgiu em
1991, quando foi aprovado o Projeto de Lei nº 80 do, então, Senador Eduardo
Suplicy, sugerindo o Programa de Garantia de Renda Mínima – PGRM, que
beneficiaria, sob a forma de imposto de renda negativo, todas as pessoas residentes
no país, maiores de 25 anos e que auferiam rendimentos brutos mensais inferiores a
CR$ 45.000, estes teriam direito a um benefício igual a 30% da diferença entre sua
renda e o valor de referência. O projeto previa a implementação gradativa em oito
anos, dos mais velhos aos mais jovens.
Silva (2012) destaca que nessa época o Brasil vivia a maior crise
recessiva desde os anos de 1930, pois toda a atenção do governo e da opinião
pública estava voltada para o combate da inflação, os problemas decorrentes do
endividamento externo. O foco era o crescimento econômico e a política de
exportação, não havendo espaço para a implantação de qualquer política de
enfrentamento à pobreza e de redistribuição de renda. A superação da pobreza era
percebida como decorrência da estabilidade da moeda e do crescimento da
economia.
A proposta que Suplicy, de certa forma, vinha sendo discutida desde a
década de 1970. O pioneiro dessa discussão foi Antônio Maria da Silveira, em 1975,
em um artigo chamado “Redistribuição de Renda”, o texto apontava que não existia
adequação entre desenvolvimento econômico e social, a economia brasileira não
conseguia atender às demandas sociais, mesmo para aqueles que estavam no
trabalho formal. A questão social no país necessitavam de maior intervenção do
Estado.
A proposta foi fundamentada no Imposto de Renda Negativo, de autoria
de Friedman (1962), tendo em vista a redução da pobreza. Seria uma transferência
monetária proporcional à diferença entre um nível mínimo de isenção e a renda
auferida pelo pobre, tomando por base um nível de subsistência como referência
para fixação do nível de isenção. (SILVA, 2012, p. 97) Ou seja, a proposta era
destinada apenas aos pobres, somente teriam direito trabalhadores cuja renda anual
40
não ultrapassasse o limite fixado, caso superasse a margem, pagaria o imposto de
renda. Em 1978, Bacha e Unger, destacam a importância da redistribuição de renda
para garantia de uma democracia política, proporcionando a diminuição da
desigualdade e pobreza no país, ainda baseado na proposta de Imposto de Renda
Negativo. Conforme os idealizadores, a transferência de renda deveria ser mínima,
para que não houvesse por parte dos trabalhadores, desestímulo para o mercado de
trabalho.
No mesmo ano do projeto do, então, Senador Eduardo Suplicy, cresceu o
debate sobre renda mínima no Brasil e começaram a surgir outras propostas. José
Márcio Camargo defendeu uma proposta inovadora de complementação de renda
ligada à educação, equivalente a um salário mínimo, pago para as famílias que
tivessem criança ou adolescente frequentando a escola pública. Camargo criticou o
PGRM de Suplicy pelas propostas de iniciar o programa pelos mais idosos e por
acreditar que a renda mínima incentivaria o trabalho informal.
Conforme Silva (2012, p.100), o debate sobre Renda Mínima, no Brasil,
assumiu novo patamar: a família assumiria o lugar do indivíduo como beneficiário
dos programas e a vinculação da transferência monetária com a educação.
Em 1994, Cristovam Buarque, coloca como proposta, enquanto pleiteava
o cargo de governador do Distrito Federal, a instituição de uma renda mínima para
todas as famílias poderem ter as suas crianças frequentando a escola. A proposta
foi implantada em janeiro de 1995, dando início ao Programa Bolsa Escola: toda
família que não ganhasse pelo menos meio salário mínimo per capita, com crianças
de 7 a 14 anos, que morasse no Distrito Federal há pelo menos cinco anos, teria o
direito de receber um salário mínimo por mês, com o compromisso da família de
garantir a frequência de 90% das crianças na escola pública, esse benefício seria
concedido por até dois anos. A mulher era a principal responsável pelo recebimento.
A partir da década de 1990, os programas de transferência de renda passaram a
priorizar as mulheres para serem as principais responsáveis pelo benefício, pois o
governo acreditava que seria mais bem administrado em favor das crianças.
Na época, os PGRM estavam acontecendo em Campinas, no Distrito Federal, e em
1995, em Ribeirão Preto. Estes programas começaram a dar resultados positivos na
redução da evasão escolar, na melhoria da qualidade de vida das famílias e nas
atividades econômicas das regiões (SUPLICY, 2002) É interessante considerar a
realidade socioeconômica dessas cidades pioneiras na implementação do Bolsa
41
Escola. Como observa a economista Sônia Rocha (2013, p. 25), a incidência de
pobreza nesses municípios, não atingia níveis críticos, a abrangência de serviços
públicos básicos se situava bem acima da média nacional, e a situação financeira do
governo local era relativamente confortável. No Encontro Extraordinário do PT, em
1998, ficou instituído na campanha presidencial que:
no governo democrático-popular se instituirá o Programa de Garantia de
Renda Mínima. Todo cidadão tem direito de participar da renda da nação,
de receber pelo menos o necessário para sua sobrevivência. Toda família
tem o direito de enviar seus filhos à escola. (SUPLICY, 2002, p.130)
Em março de 2001, no governo de Fernando Henrique Cardoso, foi
aprovada a lei que autorizava o Governo Federal a realizar parcerias com os
municípios que adotassem os PGRM ou o Bolsa Escola, desde que estivessem
associados à educação. Os municípios ficaram responsáveis pela gestão do
programa, enquanto o governo federal repassava os recursos para as famílias
através de transferência direta, por meio de um cartão magnético. O perfil das
famílias beneficiárias eram crianças de 6 a 15 anos, que frequentassem a escola,
com renda por pessoa até meio salário mínimo. O valor do benefício variava de
acordo com o número de crianças que tinham no domicílio, era pago um benefício
no valor de R$ 15, R$ 30 ou R$ 45 reais por mês (ROCHA, 2013).
Nesse mesmo ano, muitas polêmicas surgiram em torno dessa garantia
de renda mínima aos cidadãos, em destaque o Projeto Fome Zero, que tinha como
intuito a erradicação da fome e da miséria no país: a primeira delas qual seria a
melhor forma de garantia dessa renda, o repasse em dinheiro, cupom de
alimentação e a cesta básica, estavam entre as opções. Alguns críticos acreditavam
que restringir o benefício a cupons era, de certa forma, não garantir a liberdade de
uso e consumo das famílias beneficiárias, pois pra elas a necessidade urgente pode
ser outra, do que somente a alimentação. Segundo Suplicy (op. cit., p. 143) “o
pagamento em dinheiro propicia muito maior eficiência, grau de liberdade, menor
possibilidade de desvios e economia de tempo para as pessoas [...] confere às
pessoas muito maior grau de cidadania.”; outra questão foi a renda mínima ser
direito das pessoas independentemente se elas estão trabalhando ou não. Nem toda
renda advém do trabalho, pois muitas pessoas por alguma razão não conseguirão
entrar no mercado de trabalho. Pedro Demo (op. cit.) argumenta:
que os programas atingem apenas a pobreza absoluta e com aportes
irrisórios. Mostra que o neoliberalismo encontrou uma maneira esperta de
42
lidar com a pobreza sem comprometer o orçamento, sobretudo sem tocar
na desigualdade social vigente. Na verdade, o conceito de renda mínima já
é perverso, porquanto, na concepção dos direitos devidos por cidadania, se
deveria falar de renda necessária, não mínima. (p.83)
Também em 2001, Eduardo Suplicy deu entrada no Senado a um outro
projeto de lei, com a proposta de instituição da Renda de Cidadania, complementar
ao que havia projetado em 1991, agora se tratando de uma renda mínima a todos os
brasileiros ou estrangeiros residentes no país por cinco ou mais anos, independente
de critérios. Foi sancionada como Lei de Renda Básica de Cidadania, para ser
implementada a partir de 2005. (SUPLICY, 2002) Ao longo do caminho, diversas
críticas, debates e a criação de novos projetos de lei foram surgindo em torno dessa
temática, até chegarmos em 2003 com a implementação do Programa Bolsa
Família.
Analisando historicamente, podemos denominar alguns Programas de
Transferência de Renda no Brasil, para a garantia de acesso da população aos
mínimos sociais. A primeira iniciativa foi a instituição do salário em 1934, formalizado
apenas em 1940. Esse salário objetivava garantir que o trabalhador e sua família
tivessem condições de alimentação, educação, vestuário, habitação, saúde. Embora
exista o salário mínimo, ele é recebido apenas para o trabalhador formal, excluindo
as pessoas que por algum motivo não tenham acesso ao mercado de trabalho.
O Seguro-desemprego, criado em 1986, é outra forma de garantia ao
trabalhador formal, doméstico, pescador profissional durante o defeso e aos
trabalhadores em condição análoga à de escravo. Trata-se um benefício temporário,
podendo ser o valor do salário-mínimo ou mais, pago de três a cinco parcelas. Está
garantido pelo artigo 7º, dos direitos sociais na CF 88. (BRASIL, 1988)
Na garantia dos mínimos sociais apontamos também o Abono Salarial no
valor de um salário-mínimo, destinado aos trabalhadores formais ou públicos que
contribuem para o PIS/PASEP, tendo que atender a alguns critérios.
Na Constituição Federal de 1988, foram instituídos três benefícios, com
destaque para dois, que hoje são considerados grandes Programas de
Transferência de Renda, são eles: a equiparação dos benefícios da Previdência
Social ao valor do salário mínimo e a instituição de Renda Mensal Vitalícia, atribuída
aos brasileiros com 70 anos de idade, que não possuam meios de subsistência,
esse benefício é para idosos e portadores de deficiência, que não tenham condições
43
para trabalhar, ou que não possuam renda per capita superior a um quarto do salário
mínimo, sendo regulamentado na LOAS, fica instituído então o Benefício de
Prestação Continuada – BPC, que entra em vigor somente em 1996.
As transferências de renda do sistema de proteção social brasileiro
possuem em alguns dos seus benefícios, caráter assistencial, eventual e
emergencial, preferencialmente destinados aos pobres. Sobre os mínimos sociais, a
LOAS traz em seu artigo 1º, “A assistência social, direito do cidadão e dever do
Estado, é Política de Seguridade Social não contributiva, que provê os mínimos
sociais, realizada através de um conjunto integrado de ações de iniciativa pública e
da sociedade, para garantir o atendimento às necessidades básicas.” (BRASIL,
1993)
A partir de 2003, no governo do presidente Lula, os Programas de
Transferência de Renda foram reformulados. Iniciou-se o processo de unificação de
todos os PTR existentes no país, como o Bolsa Escola, Bolsa Alimentação, ValeGás e Cartão-Alimentação, para o Bolsa Família. Outro avanço foi a criação, em
2004, do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, representando a
Assistência Social e a Segurança Alimentar. A indicação desse governo foi o do
enfrentamento da fome e da miséria, com pressupostos de articulação entre as
políticas sociais e econômicas.
Segundo Silva (2012, p.106) o Governo Federal vem se propondo, mais
precisamente, a partir de 2001, a desenvolver o que passou a denominar de “Rede
de Proteção Social”, direcionada à população pobre do país, considerando os
programas de caráter compensatórios, articulados aos campos da educação, saúde
e trabalho. Com destaque para o Benefício de Prestação Continuada – BPC;
Programa de Erradicação do Trabalho Infantil – PETI; o Programa Agente Jovem;
Bolsa Escola; Auxílio-Gás; Programa Cartão-Alimentação. Silva (2007) afirma que:
os Programas de Transferência de Renda, quando não articulados a uma
política macroeconômica de crescimento sustentável e de redistribuição de
renda, podem significar melhorias imediatas das condições de vida, de
famílias que vivem em extrema pobreza, o que já é importante, mas não
superam a pobreza, ultrapassando, somente em caráter marginal, a
denominada linha de pobreza. (p.221-222)
Na
perspectiva
neoliberal,
os
PTR
devem
atender
apenas
as
necessidades mínimas dos pobres para não desestimular o trabalho, bem como
responsabiliza o Estado como regulador da estrutura social de desigualdade,
causada pelo processo de produção excludente. Nesse processo não existe
44
articulação entre o desenvolvimento econômico e social, nos deparamos com um
Sistema de Proteção Social ainda marcado pelos traços neoliberais, influenciado por
organismos
internacionais,
que
visam
a
focalização,
a
privatização
e
a
descentralização dos programas sociais.
No Brasil, a maioria dos PTR usam como critério a renda per capita da
família, pois se destinam, principalmente, às famílias consideradas pobres e
extremamente pobres. Para definir seus beneficiados, em 2001, foi criado o
Cadastro Único dos Programas Sociais do Governo Federal, um formulário com a
identificação e caracterização das famílias em situação de pobreza. O município é o
principal responsável pelo processo de gestão das informações do Cadastro Único.
Dependendo do diagnóstico socioeconômico, as famílias poderão ter acesso aos
PTR e aos demais programas sociais de inclusão produtiva, segurança alimentar,
entre outros. Sobre as transferências de renda Rocha (2013) relata que:
as transferências de renda não podem e não devem ser vistas como um fim
em si, que reduz a pobreza e a desigualdade de imediato. Constituem
apenas um dos mecanismos de um sistema mais amplo visando apoiar as
famílias beneficiadas nas suas necessidades específicas... (p.167)
Desse modo, o Governo Federal pretende, com as transferências
monetárias, combater a necessidade mais imediata das famílias, bem como
promover maior acesso, principalmente, nas políticas de educação e saúde. Demo
(op. cit.) explicita que:
o Brasil é um dos países mais concentrados em termos de renda. Enquanto
se tenta, através de programas assistenciais, atacar a pobreza material,
deixa-se intacta a concentração de renda. A grande diferença está em que,
no ataque à pobreza absoluta, bastam políticas distributivas (transferências
de renda), enquanto, no ataque à pobreza relativa, são imprescindíveis
políticas redistributivas (que desconcentram renda).” (p.85)
Apesar de ser rico, gerando anualmente mais de US$ 1 trilhão em bens e
serviços, possui um grande contingente de famílias pobres. Deve-se considerar
ainda que o Brasil é grande, em termos populacionais e territoriais, contando hoje
com mais de 180 milhões de habitantes, dos quais cerca de 45 milhões vivem em
situação de pobreza. (MDS; UNESCO, 2009)
2.2. Programa Bolsa Família: um programa de transferência de renda
condicionada
45
O Bolsa Família é um programa de transferência de renda direta que
beneficia famílias pobres e extremamente pobres no Brasil. O Programa foi instituído
pela Medida Provisória nº 132, de 20 de outubro de 2003, e regulamentado em
2004, pelo Decreto nº 5.209. Nasceu da unificação de outros PTR Federais (Bolsa
Escola, Auxílio Gás, Bolsa Alimentação e Cartão Alimentação).
Possui três eixos principais: a transferência de renda promove o alívio
imediato da pobreza; as condicionalidades reforçam o acesso a direitos sociais
básicos nas áreas de educação, saúde e assistência social; e as ações e programas
complementares objetivam o desenvolvimento das famílias, de modo que os
beneficiários consigam superar a situação de vulnerabilidade. (MDS, 2013)
O PBF é um programa focalizado para atender às famílias pobres,
devendo as famílias beneficiadas assumir alguns compromissos nos campos: da
educação, garantindo a frequência escolar de crianças a partir dos seis anos de
idade e adolescentes até dezessete anos; na saúde, a vacinação de crianças até
sete anos e o pré-natal de gestantes; e na assistência social, crianças e
adolescentes com até quinze anos em risco ou retiradas do trabalho infantil pelo
Programa de Erradicação do Trabalho Infantil (Peti), devem participar do Serviço de
Convivência
e
Fortalecimento
de
Vínculos.
Essas
condicionalidades
são
acompanhadas pelo gestor municipal. Caso as famílias descumpram por algum
motivo, para que não haja repercussão no benefício (bloqueio, suspensão ou
cancelamento), podem procurar o Centro de Referência de Assistência Social
(CRAS) ou o Centro de Referência Especializada de Assistência Social (CREAS), na
tentativa de superação das dificuldades.
São responsabilidades das famílias a relação ao cumprimento de uma
agenda mínima na área da saúde e da educação que possam melhorar as
condições para que as crianças e jovens de famílias beneficiárias desfrutem de
maior bem estar no futuro. (MDS; UNESCO, 2009) O MDS é o responsável por fazer
o acompanhamento das condicionalidades de forma articulada com o Ministério da
Saúde e da Educação.
Os objetivos do acompanhamento são: monitorar o cumprimento dos
compromissos pelas famílias beneficiárias; responsabilizar o poder público pela
garantia de acesso aos serviços; identificar, nos casos de não cumprimento, as
famílias em situação de maior vulnerabilidade e orientar as ações do poder público
para o acompanhamento dessas famílias. (MDS, 2013) Silva aponta que:
46
a obrigatoriedade de frequência à escola não é suficiente para alterar o
quadro educacional das futuras gerações, e consequentemente alterar a
pobreza. Essa exigência implica na expansão, na democratização e na
melhoria dos sistemas educacionais estaduais e municipais. (p.212)
Ou seja, não basta a criança ou o adolescente estar frequentando a
escola para receber o benefício, deve-se reforçar a importância da educação e essa
ser de boa qualidade, com espaços adequados e profissionais capacitados. Quanto
ao atendimento nas unidades de saúde, a autora afirma que a associação da
transferência de renda às necessidades de saúde, também implicam numa melhoria,
ampliação e democratização dos serviços de atendimento.
A articulação com outras políticas e programas apresenta pontos a
serem melhorados, pois ainda há muitas dificuldades no atendimento às famílias,
principalmente no número insuficiente de profissionais para atender às demandas.
Silva afirma (2012, p.212-213) a intencionalidade da relação dos PTR com a
educação, a saúde e o trabalho, para que seja materializada, requer que priorizem e
democratizem os programas e serviços sociais básicos, o que significa alterar o
quadro conjuntural contemporâneo, dando lugar para que uma política de
crescimento econômico, de geração de emprego e de distribuição de renda seja
articulada à Política Social.
Entendemos que a pobreza é um fenômeno multidimensional e deve
ser compreendida não só como insuficiência monetária, mas também como a
desigualdade na distribuição da renda, aprofundada pela exploração do trabalho e
pelo processo excludente da sociedade capitalista, que concentra riquezas para uma
parcela selecionada e mantém os pobres com políticas compensatórias, voltadas
para amenizar a pobreza e não de fato superá-la, como propõe a implantação do
PBF, que integra o Plano Brasil Sem Miséria, do Governo da Presidenta Dilma
Roussef, iniciado em 2011. Rocha (op. cit., p. 172) afirma que
enquanto governo de continuidade do Partido dos Trabalhadores na
Presidência da República, o Governo Roussef tem como objetivo declarado
prosseguir e aperfeiçoar as ações empreendidas no Governo Lula. Tem
como meta específica para a área social, eliminar a pobreza extrema até o
final do governo, em 2014.
Para a inclusão das famílias no PBF é necessária a inscrição no
Cadastro Único, devendo atender aos critérios de elegibilidade. Caso as famílias não
estejam no perfil de renda, elas podem fazer parte de outros programas e ações
sociais através do Número de Identificação Social - NIS, como tarifa social de
47
energia elétrica, Minha Casa Minha Vida, cursos do PRONATEC, isenção de taxas
de concursos públicos, vestibular, entre outros.
Em 2011, o MDS adotou o valor de até R$ 70 per capita como linha
oficial para definir extrema pobreza. Esse valor é utilizado para critério de
elegibilidade no Bolsa Família. As famílias que tem renda per capita entre R$ 70,01
até R$ 140, ingressam no programa se possuírem crianças ou adolescentes de 0 a
17 anos de idade, ou famílias com renda de até R$ 70, independente das idades dos
membros da família, essa se encontra no perfil de extrema pobreza. O critério
principal para inclusão é a renda, apesar de ser um indicador insuficiente para
mensurar a pobreza, por esse motivo as famílias que ultrapassam a per capita
estabelecida, ficam excluídas do programa, mas continuam dentro dos índices de
pobreza. Silva (2012, p. 215) considera baixo o corte de renda per capita familiar
para a inserção no PBF, considerando o número de famílias atendidas a partir dos
critérios fixados, grande contingente de famílias brasileiras pobres ainda ficam de
fora desses programas. Deveriam, de fato, ser considerados outros indicadores
sociais, como as condições de saúde, saneamento básico, alimentação adequada,
luz elétrica, afirmando as múltiplas expressões da pobreza.
Vale ressaltar a questão sobre o valor dos benefícios. Para Rocha (op.
cit., p.170), “embora as transferências de renda do Bolsa Família possam não alterar
muito o valor da renda de parte das famílias beneficiárias, permitem em todos os
casos a melhoria nas condições de vida devido à previsibilidade da receita num
dado momento do mês.” Entendemos, portanto, que a transferência de renda é
apenas uma pequena ação estatal para minimizar os impactos da desigualdade
social, não desfazendo da reflexão sobre a articulação do desenvolvimento
econômico e social.
A estrutura da desigualdade permanece intacta, mas em compensação, os
pobres estão um pouco menos pobres, um resultado típico do atual PBF: é
adequado no plano da assistência, porque é devido por direito; é
inadequado no plano de confronto político, porque o abafa. (DEMO, op. cit.,
p. 82)
O PBF ao longo desses dez anos vem se aperfeiçoando na tentativa de
retirar as famílias pobres e extremamente pobres dessa situação; contudo, a
transferência de renda consegue reduzir os impactos negativos imediatos, mas não
consegue retirá-las da pobreza.
Os Programas de Transferência de Renda, quando não articulados a uma
política macroeconômica de crescimento sustentável e de redistribuição de
48
renda, podem significar melhorias imediatas das condições de vida, de
famílias que vivem em extrema pobreza, o que já é importante, mas não
superam a pobreza, ultrapassando, somente em caráter marginal, a
denominada linha de pobreza. (SILVA, 2012, p. 221)
O programa constitui a maior política pública de transferência de renda
da América Latina, tanto em orçamento quanto em cobertura. Atualmente estima-se
o total de 13,7 milhões de famílias pobres beneficiadas em todo Brasil, com gastos
de mais de R$ 24 bilhões por ano (MDS/SENARC, 2013). As avaliações de impacto
do PBF demonstram que ele contribui para a elevação da frequência escolar, a
ampliação do atendimento à saúde e o combate à desnutrição. (CAVALCANTE E
RIBEIRO, 2012, p.59)
Em maio de 2012, o Governo Federal anunciou o Benefício para
Superação da Extrema Pobreza (Brasil Carinhoso), que objetiva complementar a
renda das famílias que recebem o BF e estão na linha de extrema pobreza, que
tinham em sua composição familiar crianças de zero a seis anos. Em dezembro do
mesmo ano, a faixa etária mudou abrangendo a faixa etária de crianças de zero a
quinze anos. Esse acréscimo na renda das famílias extremamente pobres é irrisório,
pois o benefício é temporário e irá variar conforme a composição familiar.
O MDS é responsável pela gestão do PBF em âmbito federal,
representado nacionalmente pela Secretaria Nacional de Renda e Cidadania –
Senarc, a Caixa Econômica Federal é quem opera e paga os benefícios. Para apoiar
os municípios, o Governo Federal repassa recursos mensalmente conforme o
desempenho da coordenação local, através de uma gestão descentralizada. Todos
os financiamentos e ações do PBF aos governos locais são acompanhados pelo
Índice de Gestão Compartilhada – IGD, baseados em dados como, a qualidade das
informações do Cadastro Único, a atualização cadastral pelo menos a cada dois
anos e o atendimento das famílias beneficiárias na área da saúde e da educação.
Com esses recursos os municípios podem realizar a gestão de condicionalidades,
acompanhamento das famílias beneficiárias, cadastramento de novas famílias,
atualização e revisão de informações, bem como planejar ações complementares.
49
3. FAMÍLIAS EM EXTREMA POBREZA ATENDIDAS NO CRAS ANTÔNIO JUSTA
EM MARACANAÚ/CE
O último capítulo deste trabalho se fragmenta em quatro tópicos. O
primeiro aborda o percurso metodológico da pesquisa, onde descrevemos as
estratégias metodológicas que foram utilizadas e como surgiu o interesse pelo tema.
O segundo tópico caracteriza onde foi realizada a pesquisa. Já o terceiro tópico
retrata os sujeitos da pesquisa, as famílias com perfil de extrema pobreza atendidas
no CRAS Antônio Justa, que recebem o Bolsa Família. Por fim, são destacadas as
reflexões e análises acerca do que foi proposto na pesquisa.
3.1. Trajetórias Metodológicas da Pesquisa
O interesse pela pesquisa voltada a esse Programa de Transferência de
Renda, Bolsa Família, surgiu no decorrer do trabalho que comecei a executar como
educadora social, no CRAS Antônio Justa, em 2012, através dos atendimentos às
famílias na recepção, nos grupos e nas inscrições no Cadúnico. Despertou-me
algumas reflexões acerca das perspectivas das famílias para receber o benefício, e
para os que já recebiam a angústia de um dia não receber mais. Após alguns meses
fui me aproximando de leituras sobre o tema, bem como as demais leituras
referentes à Política de Assistência Social.
O objetivo central desta pesquisa é analisar os significados do Programa
Bolsa Família na vida das famílias em situação de extrema pobreza, atendidas no
CRAS Antônio Justa em Maracanaú/CE.
Delimitei as famílias em extrema pobreza como foco da pesquisa por ver
de perto a situação que elas vivenciam, através de visitas domiciliares e de
atendimentos particularizados e, não apenas, pelo critério de renda per capita
estipulado pelo PBF.
O tema torna-se relevante, pela representatividade que possui o Bolsa
Família, como programa de transferência de renda direta às famílias, o maior
programa em andamento no Brasil, servindo de referência para outros países, bem
como sua estratégia de superação da extrema pobreza. Além disso, o PBF completa
dez anos de atividades e chega a atender, segundo o Ministério de Desenvolvimento
Social e Combate à Fome – MDS (2013), mais 13,8 milhões de famílias, cerca de 50
milhões de pessoas.
50
A pesquisa tem como referência o método hermenêutico-dialético, por
considerar que essa união leva a um melhor entendimento do que se pretende
analisar, como sendo um resultado de um processo social, com diversas expressões
subjetivas. Sobre o método Minayo (2010) afirma:
Nesse método a fala dos atores sociais é situada em seu contexto para
melhor ser compreendida. Essa compreensão tem como ponto de partida, o
interior da fala. E, como ponto de chegada, o campo da especificidade
histórica e totalizante que produz a fala. (p.77)
A pesquisa de campo foi do tipo qualitativa, por entender que é a melhor
forma de investigar o objeto em estudo.
Nas Ciências Sociais, tendo como referência a pesquisa qualitativa, o
trabalho de campo se apresenta como uma possibilidade de conseguirmos
não só uma aproximação com aquilo que desejamos conhecer e estudar,
mas também de criar um conhecimento, partindo da realidade presente no
campo. (MINAYO, op. cit., p.51)
Para a construção teórica utilizei a pesquisa bibliográfica e documental
que tratam sobre a temática. Segundo Gil (2011, p.50), “a principal vantagem da
pesquisa bibliográfica reside no fato de permitir ao investigador a cobertura de uma
gama de fenômenos muito mais ampla do que aquela que poderia pesquisar
diretamente.” O mesmo autor esclarece também que a pesquisa documental “valese de materiais que não receberam ainda um tratamento analítico, ou que ainda
podem ser reelaborados de acordo com os objetivos da pesquisa”. (p.51)
A coleta dos dados foi realizada através de 04 entrevistas semiestruturadas, com as famílias consideradas extremamente pobres, beneficiadas pelo
PTR em destaque, atendidas no CRAS Antônio Justa, localizado em Maracanaú,
com o objetivo de aproximar e conhecer a realidade vivida por cada família,
principalmente os seus aspectos socioeconômicos e sua relação com o PBF. Minayo
(op. cit.) explicita que:
A entrevista é o procedimento mais usual no trabalho de campo. Através
dela, o pesquisador busca obter informes contidos na fala dos atores
sociais. Ela não significa uma conversa despretensiosa e neutra, uma vez
que se insere como meio de coleta dos fatos relatados pelos atores,
enquanto sujeitos-objeto da pesquisa que vivenciam uma determinada
realidade que está sendo focalizada. (p.57)
Todas as famílias entrevistadas são acompanhadas pela Equipe PAIF, e
fazem parte dos grupos de famílias com isenção no Restaurante Popular,
“Alimentando conhecimento: debate sobre direitos”, e das famílias inseridas no
Programa de Aquisição de Alimentos – PAA Leite, “Comida: direito e vida”. Esses
51
dois grupos foram criados no primeiro semestre de 2013 e, finalizadas as atividades
no mês de dezembro desse ano, para acompanhar as famílias em extrema pobreza
que fazem parte das ações complementares na área de Segurança Alimentar e
Nutricional, coordenadas pela Secretaria de Assistência Social e Cidadania de
Maracanaú. A partir desses grupos, nos quais participava enquanto educadora
social em alguns encontros, selecionei as famílias entrevistadas para a pesquisa. O
critério de escolha não foi somente a renda per capita que consta na base do
Cadastro Único, no qual define as famílias que estão em extrema pobreza, mas,
principalmente, pela aproximação que tive da realidade vivida por cada família que
escolhi para entrevistar. As visitas domiciliares possibilitou-me conhecer um pouco
suas vulnerabilidades. Inicialmente o quantitativo era de 06 famílias, porém duas não
compareceram, reduzindo o número para 04 famílias. Somente uma das
entrevistadas foi bem objetiva nas repostas, demonstrando certa resistência na fala.
As demais responderam tranquilamente a todos as indagações de forma clara.
Segundo dados levantados pela Gestão do Sistema Único de Assistência
Social – GESUAS, equipe responsável pelas informações sobre o Cadúnico no
município, atualmente estão cadastradas cerca de 877 famílias com perfil de renda
média mensal de R$ 0,00 até R$ 70,00, que são atendidas somente no CRAS
Antônio Justa. Essas famílias, pelo perfil de renda, estão em situação de extrema
pobreza e tornam-se elegíveis a receber o benefício, conforme critérios estipulados
pelo MDS.
3.2. O Lugar da Pesquisa: Cras Antônio Justa em Maracanaú
O Centro de Referência de Assistência Social – CRAS Antônio Justa,
localiza-se no município de Maracanaú, a Rua Manoel Pereira da Silva, nº 80 –
Bairro Alto da Mangueira.
O CRAS Antônio Justa subordina-se a Secretaria de Assistência Social e
Cidadania de Maracanaú, é uma unidade pública estatal descentralizada da política
de assistência social, responsável pela organização e oferta de serviços da proteção
social básica do Sistema Único de Assistência Social (SUAS). Tem como objetivo
atender famílias que se encontram em situação de vulnerabilidade social e riscos
sociais, nos bairros: Colônia Antônio Justa, Alto da Mangueira, Horto, Picada, Vida
Nova, Olho d‟água, Bela Vista e Boa Vista, por meio do desenvolvimento de
52
potencialidades, do fortalecimento de vínculos familiares e comunitários, e da
ampliação do acesso aos direitos de cidadania.
Tais objetivos se materializam através do desenvolvimento do Serviço de
Proteção e Atendimento Integral à Família – PAIF, que consiste no trabalho social
com
famílias,
de
caráter
continuado,
por
meio
de
atendimento
e/ou
acompanhamento familiar; Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos –
SCFV realiza trabalhos em grupos, a fim de complementar o trabalho social com
famílias e prevenir a ocorrência de situações de risco social.
Além dos serviços anteriormente mencionados, o CRAS articula ações
complementares de Segurança Alimentar e Nutricional e Inclusão Produtiva, provê
Benefícios (eventuais, Benefício de Prestação Continuada - BPC e Programa Bolsa
Família) e disponibiliza ações do Cadastro Único para Programas Sociais do
Governo Federal.
Os serviços, programas, projetos e benefícios são de caráter preventivo,
protetivo e proativo, ofertados diretamente no CRAS ou desenvolvidos por outra
unidade pública ou entidade de assistência social desde que sejam referenciados.
Para atender toda essa demanda, existe uma equipe composta por: uma
coordenadora, duas assistentes sociais, uma pedagoga, uma psicóloga, duas
agentes administrativas, duas educadoras sociais, duas entrevistadoras sociais, uma
estagiária de pedagogia, uma orientadora social, um facilitador de esporte, um
facilitador de cultura, auxiliar de serviços gerais, porteiro e motorista.
O CRAS Antônio Justa foi implantado no ano de 2006, quando foi possível
verificar o avanço no âmbito da política de assistência social do município de
Maracanaú. Tal avanço foi resultado do êxito no atendimento direto às famílias em
situação de vulnerabilidade e/ou risco social no município.
A implantação deste CRAS se deu a partir da necessidade de um olhar
mais aprofundado no bairro Antônio Justa, em virtude do alto índice de
vulnerabilidade e risco social, uma vez que desde a década de 1940 existia o
Hospital de Dermatologia Sanitária Antônio Justa que tratava de pessoas vítimas de
hanseníase de todo o estado.
As ações desenvolvidas pelo CRAS estão pautadas nas seguintes
legislações, desde a Constituição Federal de 1988, a assistência social como direito
do cidadão e dever do Estado, utilizando também da Lei Orgânica de Assistência
Social – LOAS, Lei nº 8.742/93, que responsabiliza o Estado quanto a sua
53
organização e condução das ações aos que dela necessitam bem como a Política
Nacional de Assistência Social – PNAS, um instrumento de gestão, que versa sobre
a Proteção Social às famílias em situação de vulnerabilidade e/ou risco social.
3.3. Os Sujeitos da Pesquisa: Famílias em Situação de Extrema Pobreza
Foram realizadas quatro entrevistas. Todas as entrevistas com mulheres,
pois essa é a realidade da maioria das famílias beneficiárias do BF. As mulheres são
as principais responsáveis pelo recebimento do benefício, por incentivo até mesmo
do Governo Federal, mas também pela cultura que se estabeleceu que a mulher é
melhor gestora de seu lar, recaindo para nós toda a responsabilidade de criar os
filhos e manter a estabilidade familiar. Conforme artigo 23 do Decreto 5.209, de 17
de setembro de 2004 que regulamenta o Programa Bolsa Família, “O titular do
cartão de recebimento do benefício será preferencialmente a mulher ou, na sua
ausência ou impedimento, outro responsável pela unidade familiar.” Outra realidade
que deve ser apontada é a pobreza que vivenciam essas mulheres. Segundo dados
da PNAD 2008, 20% dos domicílios mais pobres residiam pessoas do sexo feminino.
As regiões Norte e Nordeste destacam-se pelas distribuições mais equilibradas entre
homens e mulheres, apesar do predomínio ainda ser de mulheres (SILVA, 2010, p.
49). Dados do MDS (2013) apresentam que 93% das famílias que recebem BF são
chefiadas por mulheres. Silva (2010) afirma que:
o bem-estar social, direito inalienável de todo cidadão, sustentável, coletivo
e universal, é colocado sob a responsabilidade dos indivíduos e das
famílias, recaindo principalmente sobre a mulher a obrigação de administrar
a família com valores monetários insuficientes para a aquisição da cesta
básica. (p. 101)
Para guardar o sigilo das famílias entrevistadas, substitui seus nomes por
nomes de pedras preciosas brasileiras: Ágata, Turmalina, Safira e Ametista. Apesar
de ser contraditório, pois estamos falando sobre extrema pobreza e sabemos quanto
essas pedras possuem valores financeiros no mercado, a escolha foi muito além do
valor, foi simplesmente por avaliar todo o processo de “lapidação” que passam
essas mulheres, que vivenciam tantas vulnerabilidades e desigualdades sociais.
Ágata – tem 42 anos, casada, parda, mãe de duas filhas, natural de
Maracanaú/CE, residente do bairro Alto da Mangueira, estudou até a 2ª série do
Ensino Fundamental. A família é composta por quatro membros e na sua casa não
54
possui saneamento básico, apenas água encanada e energia elétrica. A beneficiária
recebe o BF há sete anos. Sua renda advém do BF e de trabalhos avulsos de seu
companheiro. A família recebia R$ 280 até janeiro desse ano quando foi cancelado e
retornou no mês de março, agora no valor de R$ 110.
Turmalina - tem 51 anos, mestiça, “amasiada”, natural da cidade de
Crato/CE, tem quatro filhos, mas só três moram com ela. A família é composta por
cinco pessoas, ela está completando o Ensino Fundamental, trabalha como
recicladora. Reside no bairro Antônio Justa, em sua casa não possui os serviços
básicos de saneamento, água e a luz é “gambiarra”. A renda principal da família é o
BF, complementada pelo que ela recebe da reciclagem e do programa Universidade
Operária, instituído no município de Maracanaú, a fim de que jovens e adultos
possam completar seus estudos, o valor recebido por esse programa é de R$ 100. A
família recebe BF há seis anos, no começo recebia R$ 80, atualmente o valor
recebido é de R$ 306.
Safira
- casada, tem três filhos, natural de Maracanaú/CE, moram cinco
pessoas em sua casa, localizada no bairro Vida Nova. Possui água, luz e
saneamento básico, está completando a 8ª série através do Projovem. Recebe o BF
há dois anos, sendo esse a única renda da família, no valor de R$ 166.
Ametista – tem 27 anos, parda, solteira, tem três filhos, natural de
Maracanaú/CE, está concluindo a 8ª série, residente do bairro Antônio Justa. Sua
casa não possui saneamento básico, água e a luz é improvisada. No momento o BF,
recebido há três anos, é a única renda, no valor de R$ 166, sendo complementada
às vezes por ajuda de sua mãe nas despesas com alimentação, mas somente
quando ela tem condições.
A partir dos perfis das entrevistadas, podemos observar que nenhuma
delas concluiu o ensino fundamental, três voltaram a estudar esse ano. Das quatro
entrevistadas,
apenas
uma
trabalha
com
reciclagem,
as
demais
estão
desempregadas. Destaque para a renda das famílias, todas recebem BF há, no
mínimo, dois anos e esse benefício é prioritariamente a única renda das famílias,
que segundo elas, não atende todas as necessidades da família, principalmente a
alimentação. Outra realidade que nos chamou atenção foi que a maioria dos
domicílios não tem os serviços básicos funcionando normalmente, como água
encanada, luz elétrica e saneamento básico, o que deveria ser essencial, não ocorre
55
para essas famílias que, para ter um mínimo de acesso, acabam recorrendo aos
improvisos, trazendo sérios riscos.
O objetivo central do BF é o combate à fome e à pobreza; entretanto as
famílias que tem acesso a renda, mesmo que mínima, não atenderão às
necessidades do programa, logo, falta muito mais que dinheiro para superação da
extrema pobreza: a questão perpassa – também – por questões de atendimento
básico com qualidade às famílias nas áreas da saúde, educação, infraestrutura, e
demais políticas que promovam o acesso à direitos. O benefício somente garante
que a situação de miséria que vivem essas famílias seja minimizada, como forma de
manutenção da pobreza. Essa é a realidade de boa parte das famílias atendidas no
CRAS Antônio Justa, um dos territórios que apresentam as maiores vulnerabilidades
dentro do município de Maracanaú. Os bairros que se destacam em termos
extremos de pobreza, são Antônio Justa e Vida Nova, onde existem pessoas que
comem do lixo e que não possuem serviços regulares de água, luz e saneamento,
onde dificilmente os resíduos são coletados. Concluímos, então, que o acesso à
renda, não significa acesso à cidadania e à dignidade da pessoa humana.
3.4. Análises da pesquisa
As análises foram a partir das falas das famílias, conforme roteiro de
entrevista (apêndice). Destacaremos os aspectos que achamos mais relevantes da
pesquisa, que atendam o objetivo central desse estudo, os significados do Bolsa
Família para as famílias em situação de extrema pobreza atendidas no CRAS
Antônio Justa.
3.4.1. Os gastos que são feitos com o benefício.
Ágata: “gasto com as minhas filhas, elas precisa de roupa, precisa de alguma
merenda, eu tenho dinheiro pra dar, tudo isso me ajuda.”
Turmalina: “eu faço tanta coisa, eu multiplico. Porque dele, um exemplo, um
mês eu... faço a tabela, um mês vamos supo tem necessidade mais de roupa pras
criança, aí aquele mês é pra roupa. Aí no outro mês é pra calçado, no outro mês eu
to devendo uma cesta básica. A gente almoça, no Restaurante Popular, mas tem a
56
janta, tem a merenda. Às vezes eu compro fiado, tenho que pagar a bodega.
Compro cesta básica de duas vezes.”
Safira: “pago água, luz, compro alimento.”
Ametista: “gás e no mercantil. Quando não é, que acaba o dinheiro, minha
mãe vai e dá um dinheirinho e ajuda, e assim vai, é difícil viu.”
Observamos então que os gastos são voltados principalmente para a
alimentação e mesmo assim, ainda não supre, pois o valor do benefício é irrisório
para atender as necessidades. Precisando algumas vezes da ajuda de familiares
para complementar as despesas.
Sobre a importância do PBF para a família:
Ágata: “ele é importante assim pra mim porque quando ele faltou eu me senti
sem nada porque era a única renda que eu tinha, que eu tava ganhando era essa
renda do Bolsa Família, e era boa, era R$ 280 que eu tirava, aí agora vem R$ 110.
Com R$ 110 ainda faço coisa com ele, ainda dá pra mim fazer, é bom.”
Turmalina: “Foi maravilhoso, porque através do Bolsa Família, quando o
Bolsa Família começou a surgir, foi quando começou a surgir vários benefícios pra
gente. Foi quando começou a existir os projetos do CRAS, porque foi a partir dos
projetos do CRAS foi que a gente começou a conhecer os nossos direitos.”
Safira: “acrescentou nada tá do mesmo jeito, tá até pior, porque nós só
recebe final do mês. Aí o resto do mês? Até chegar o dia de receber de novo?”
Ametista: “antes eu passava apertada, agora que tá melhorando mais. Hoje
em dia já é uma ajuda. Melhorou mais as condições. Antes era pior ave Maria.”
Para quase todas as famílias que recebem o BF, esse acrescentou
positivamente em suas vidas. Apenas uma teve resposta contrária das outras, mas
sua crítica foi direcionada apenas para o dia que é feito o pagamento do seu
benefício, pois o recebimento é organizado pelo último número do NIS que está no
cartão, conforme esse número, existe um calendário para as famílias sacarem o
dinheiro. Daí a crítica da Safira, em relação aos dias do pagamento que fica
complicado para ela receber apenas no final do mês.
Sem dúvida, o Bolsa Família tem importância significativa na vida dessas
famílias, pois relatam que “antes não tinha nada” ou que se “sentiu sem nada”
quando deixou de receber. Reforçamos essa ideia quando comparamos com a
pergunta a seguir.
57
3.4.2. A vida das famílias antes do Programa
Ágata: “era ruim demais, não tinha condições de comprar coisas, pagar uma
água, uma luz.”
Safira: “não fazia nada.”
Ametista: “comia do lixo, se alimentava do resto do lixo, porque em casa não
tinha nada pra comer. Se vencia também eu via que não tava estragado, levava e
comia eu e os meninos.”
Percebemos que o programa trouxe para a vida dessas famílias além de
acesso à renda, certa autonomia, para que elas pudessem adquirir um alimento ou
pagar uma conta, têm liberdade na aplicação do dinheiro recebido. Porém, para
continuarem a receber, elas devem garantir a frequência escolar das crianças e dos
adolescentes e o acesso à saúde das crianças e das mulheres gestantes, tendo que
enfrentar serviços precários e de baixa qualidade, na educação e na saúde, uma
forma
condicionada
de
alegar
acesso
aos
serviços
públicos
básicos,
responsabilizando as famílias na manutenção do benefício. As famílias também só
continuarão a ter acesso ao benefício se permanecerem na linha da pobreza, esse é
um dos grandes problemas do programa, pois as famílias temem não receber mais o
benefício, algumas até mesmo desconhecem que ele é temporário e que dependerá
sempre da manutenção da renda nos critérios pré-estabelecidos pelo MDS, ou seja,
manter-se na condição socioeconômica em que se encontram. Apesar de existirem
algumas ações complementares, como o PRONATEC, que promove cursos
profissionalizantes aos inscritos no Cadastro Único, na tentativa dos usuários
entrarem para o mercado de trabalho, esses cursos exigem grau de escolaridade
que às vezes são empecilho ao acesso de algumas pessoas. Mais ainda, esses
cursos são muito pontuais, a maioria são voltados para vagas na indústria, corte e
costura ou beleza, ou seja, servem para manter a força de trabalho nas fábricas ou
fomentam o empreendedorismo, pois nem todos conseguirão ser introduzidos no
mercado.
3.4.3. Como as entrevistadas imaginam sua família hoje sem esse benefício.
Ágata: “eu acho que eu ia ficar procurando meios de vida, porque não pode
faltar não. Porque o leite dela é de lata e é caro.”
58
Safira: “ia passar fome.”
Ametista: “ia voltar a comer do lixo.”
Definir a pobreza pelos critérios de renda é no mínimo, ignorar a realidade de
vida dessas pessoas, que às vezes por ultrapassar alguns reais, ficam sem receber.
Apesar de expressarem na fala a dependência ao PBF, na pergunta a seguir elas
afirmam que tem perspectivas de não mais precisar do benefício, pois ele é
insuficiente até mesmo para os gastos mais necessários, bem como vêm às
necessidades de outras famílias receberem.
Ágata: “eu quero arrumar um emprego, você nem imagina. Porque se eu
deixar de receber esse benefício, vai ajudar outra pessoa.”
Safira: “quando nós terminar o Projovem, nós vamos ser encaminhado pra
outro curso, aí faz o primeiro, o segundo ano, aí quando terminar ela disse que nós
vamos logo assim encaminhada para trabalho.”
Ametista: “to estudando né, fazer o curso agora, no momento eu dependo
deles mesmo. Não quero ficar dependente desse benefício. To fazendo um curso aí,
se eu passar, corte e costura.”
3.4.4. Sobre a avaliação do PBF a partir da visão das famílias entrevistadas.
Ágata: “deveria melhorar assim, porque se tivesse um aumento era bom,
porque quando minha filha pede, mãe quero comer isso, aí o dinheiro nem sempre
dá pra mim comprar.”
Safira: “é boa pra um lado, pra outro não é. Por causa do final do mês né,
porque quem é o sete sempre recebe no final do mês. Quem é o primeiro um
instante recebe.”
Turmalina: “pra mim é uma coisa boa, tu é doido é ótimo, pra mim é ótimo.”
Ametista: “a única renda que eu tenho é isso.”
Todas avaliam bem o PBF, pois esse muitas vezes é a única renda da família,
e que propicia principalmente o acesso à alimentação.
Ágata: “com o bico que o pai delas faz, aí a gente compra, compra... nem
sempre a gente compra assim de muito não, uns dois quilos. Compra mesmo pra
poder manter, arroz ou macarrão, alguma coisa assim.”
59
Turmalina: “a renda da família é só o benefício e, agora esse negócio da
educação operária que eu recebo né e o da reciclagem que é pouco, mas é o que dá
pra escapar.”
Ametista: “esse benefício não atende nem o básico, só o gás e comida e olhe
lá, que teve semana retrasada que eu não tinha nada dentro de casa.”
3.4.5. O que acha que o PBF trouxe de bom para os cidadãos e o que deveria
melhorar.
Ametista: “para outras famílias é ótimo do jeito que foi pra mim. Tem famílias
que é igual eu ou pior do que eu né. Acho que ajuda muito. Ajuda muito mesmo.”
Turmalina: “é muito bom porque tem muita gente que necessita do benefício
e não tem. Porque eu necessito até hoje dele, se faltar pra mim, ai nem sei.”
O valor do benefício não acompanha as alterações do salário mínimo e muito
menos a flutuação da inflação no país, tornando o valor do benefício ainda muito
aquém para atender a dimensão da complexidade de pobreza extrema que vive as
famílias. Ou seja, para passar a receber o benefício ou mantê-lo, as famílias devem
enquadrar-se em condições de vida precarizadas.
Ágata: “por mim eu gostaria que fosse mais, aí eu ia me sentir mais feliz. Fica
faltando alimentação, a gente quer deixar assim, quando ela pede biscoito aí não
tem, aí eu fico... como ela tem problema de alergia, ela não come tudo assim, têm os
remédios da alergia dela, que é trinta reais cada um, aí eu tive que comprar.”
Safira: “porque R$ 50 reais a gente compra três quilos de arroz e pronto.
Arroz, feijão, aí tem que ter a mistura também.”
3.4.6. As condições socioeconômicas comparadas à vizinhança, bairro, ou
município, com a realidade que vive a sua família.
Safira: “comparada a outras que não recebe, a condição tá a mesma. Pelo
menos eu não tiro nada do lixo e não pego nada de ninguém.”
Ametista: “situação pior, não tem saneamento, não tem nada. No posto tem
calçamento e lá na rua onde eu moro não tem. Só tem calçamento onde tem
transporte, onde não tem, é só a lama. Segurança é horrível, nem fala não que é tiro
direto, tem que ficar preso em casa.”
60
Como já foi comentado, o território do CRAS Antônio Justa, é um dos mais
vulneráveis do município de Maracanaú, principalmente no que diz respeito aos
serviços de utilidade pública.
3.4.7. A perspectiva de não mais receber o PBF.
Turmalina: “porque a partir que eu tiver meu emprego de carteira assinada e
o meu marido também ter, ele não vai precisar desse benefício, aí já vai dar a
chance pra outra pessoa mais necessita que a gente. Por isso que eu digo, se fosse
mais fiscalizado sobre esse projeto, pra quem receber ser só realmente que tem
mais necessidade seria muito melhor. Porque eu acho se você tem condições de
comprar todo dia um quilo de carne, porque carne não é barata, uma pizza pra
merendar, você não tem precisão de um benefício desse. O benefício eu acho que é
pra pessoas que realmente precisam. Hoje você vai comer o arroz, aí o benefício
chegou amanhã você tem condições de comprar um quilo de frango, e às vezes nem
um quilo de frango, uma bandeja de ovo pra passar uma semana, já é muito bem
vindo.”
Ametista: “só trabalhando mesmo. Tem que ter curso, tem que ter estudo.
Tudo eles pede curso, e eu não tenho nenhum. O bico que eu fazia parou, costurava
mais não tem mais.”
A maioria dos depoimentos foram positivos em relação ao Bolsa Família,
poucas críticas foram feitas. Em quase todas as famílias entrevistadas o benefício é
a única renda, e que para elas essa renda seria uma forma, mesmo que mínima, de
acessar uma alimentação mais adequada, já que antes do programa algumas
famílias viviam da reciclagem e tiravam seu sustento do lixo ou não tinha o que
comer, ou passavam certa necessidade. Revela-se também que, para as mulheres
responsáveis pelo benefício há uma sensação de autonomia ao conseguir consumir
algum produto ou pagar uma conta, que desperta a reflexão sobre gênero e
pobreza. Todas as famílias que fazem parte da pesquisa são isentas da taxa de um
real do Restaurante Popular, devido à situação socioeconômica e suas
vulnerabilidades, elas são acompanhadas pela Equipe PAIF. Essa isenção só afirma
que o valor do benefício recebido no PBF é irrisório frente às necessidades mínimas
das famílias pobres que fizeram parte da pesquisa, que apesar de ser uma amostra
61
pequena, ela reflete a realidade da maioria das famílias atendidas no CRAS Antônio
Justa.
Percebi que as mulheres têm perspectivas de não precisar mais do benefício,
e para isso estão concluindo seus estudos ou pretendem fazer cursos para que
possam acessar o mercado de trabalho formal ou informal, aumentar a renda e
melhorar suas condições de vida, pois o que recebem do programa não supre todos
os gastos e necessidades de seus familiares. E que mesmo tendo uma garantia de
renda mínima para aliviar as necessidades imediatas, as vulnerabilidades que vivem
essas famílias pouco alterou, pois como descrevi, a maioria não tem acesso a
serviços básicos de utilidade pública. Como garantir um benefício para superar a
pobreza, levando em conta apenas seus rendimentos, por que não acrescentar
também suas condições estruturais de moradia e outras questões que envolvem as
famílias brasileiras, em suas determinações regionais, históricas e sociais.
Analisando o formulário do Cadastro Único, que é preenchido com todas as
informações de cada membro da família, bem como seus gastos, grau de
escolaridade, remuneração e trabalho, tipos de deficiência, entre outros dados,
deparei-me com uma contradição. Para a elegibilidade no PBF, o MDS leva em
consideração apenas a renda dividida pelo número de pessoas da composição
familiar, ou seja, se a família vivencia situações de vulnerabilidades ou risco social,
mas sua renda não atinge os critérios, ela por causa somente da renda, tem suas
condições de vida ignoradas e não receberá o benefício. Portanto o que define a
entrada das famílias no programa é a renda e, para continuar recebendo o benefício,
deve ser mantida sua condição financeira dentro dos critérios, ou seja, manter-se na
pobreza. Considero o Programa como benefício para as urgências de alimentação
que vivem as famílias do território que foi feita a pesquisa, mesmo assim, ainda
algumas delas precisam complementar com outros serviços como o PAA-Leite e o
Restaurante Popular, ele, porém, limita a possibilidade de mudanças mais profundas
nas condições de vida dessas famílias.
Partindo dessas reflexões posso afirmar que o programa apesar da
focalização nas famílias pobres e extremamente pobres, na perspectiva de
superação da pobreza, ele atende na verdade as políticas neoliberais, pois está
pautado apenas na reprodução da sobrevivência, garantindo com a renda mínima
soluções imediatas de melhoria nas condições de vida dessas famílias, de certa
forma, aliviando os impactos da pobreza, mas essa dificilmente será superada
62
apenas controlada, assim o sistema pressiona o Estado para adoção de políticas
sociais compensatórias que impulsionem o desenvolvimento, sem mexer com suas
bases capitalistas, apenas como forma de controle e gestão dos grupos
populacionais vulneráveis. Sendo assim, o respectivo estudo tem como motivo
também propiciar essa discussão acerca dos significados do PBF para essas
famílias, pois apesar de acréscimos positivos em suas vidas, deve-se fomentar a
crítica.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Esse estudo tem como objetivo analisar os significados do Bolsa Família
para as famílias em situação de extrema pobreza, atendidas no CRAS Antônio Justa
em Maracanaú. A partir das entrevistas feitas com as mulheres, denominadas pelo
Programa como “responsáveis familiares” pelo recebimento do benefício, buscou-se
a compreensão de como essas famílias atribuem importância ao Bolsa Família e
quais as mudanças ocorridas em suas vidas após a inserção neste programa de
transferência de renda.
Com essa finalidade, percebemos que os debates sobre programas que
tem por objetivo a superação da pobreza não se esgotam: sempre surgirão novas
reflexões, pois essas políticas perpassam o caráter econômico, político e social, e
envolvem as famílias que vivenciam as mais diversas vulnerabilidades e riscos
sociais.
As famílias, ao longo das décadas, apresentam novos arranjos por
diversas motivações e vem ganhando centralidade nas políticas públicas,
principalmente nas ações voltadas para o enfrentamento da pobreza. Destaque para
as mulheres que ganham cada vez mais representatividade dentro dos programas e
projetos, reforçando as discussões sobre gênero. Ressaltamos que em face da
delimitação temporal da pesquisa, não foi possível adentrar com profundidade a
temática sobre gênero, expressa tão fortemente na construção sócio-histórica do
nosso país. Tendo em vista, as novas configurações familiares, as mulheres ainda
adquirem papeis dentro dos espaços públicos e domésticos, como figura
intercessora pelos membros de sua família.
Para as quatro famílias entrevistadas, todas são unânimes na visão
positiva sobre o Programa em discussão, pois ele trouxe certa autonomia para elas
enquanto responsáveis pela sua família e pelo benefício. Apesar de sempre
63
sobressair em suas falas que o benefício não atende todas as necessidades da
família, a crítica se dirige apenas para que o valor fosse maior. Algumas delas
complementam o recurso advindo do Programa, com outras atividades muitas vezes
precárias ou temporárias.
Pode-se dizer, portanto, que o Programa Bolsa Família tem para essas
famílias delimitadas na pesquisa, diversos significados, possibilidades de consumo,
autonomia, integração social, acesso à alimentação. Apesar do objetivo desse
programa ser a superação da pobreza, ele proporciona - de maneira ínfima - o alívio
dessas vulnerabilidades que as famílias vivenciam. No Brasil, grande concentrador
de renda e modelo de desigualdade social, para que haja de fato a concretização
dessa superação, algo macro deveria ser realizado, pois envolve o desenvolvimento
econômico e social, os dois fatores deveriam crescer na mesma medida e ser dada
igualmente a devida importância.
Sobre as condicionalidades do Programa é de essencial importância a
intersetorialidade entre as políticas públicas e a prática de um serviço público
qualificado. Mais ainda: é necessário que sejam criadas estratégias que atendam
com qualidade a grande demanda de pessoas que necessitam do acesso às
políticas de habitação popular, saúde, educação, infraestrutura, entre outras, e que
atuem em rede, e fortaleçam os direitos e garantias para os cidadãos.
O Estado, influenciado pelo contexto neoliberal, transfere de certa forma,
responsabilidades para os cidadãos, artimanhas que servem para a gestão da
pobreza e manutenção da ordem social. No município de Maracanaú, essa renda
mínima para as famílias, é insuficiente para o combate à pobreza, pois os valores do
benefício não conseguem suprir as necessidades mínimas, necessitando de ações
complementares, principalmente na área da Segurança Alimentar e Nutricional. Pois
além da situação de fome dessas pessoas, faltam condições estruturais adequadas
para uma vida com dignidade.
As políticas sociais no Brasil tiveram diferenciações a cada governo e o
grande marco da consolidação dos direitos dos cidadãos é a Constituição Federal de
1988, onde a Assistência Social é concebida enquanto direito social e instituída no
tripé da Seguridade Social. Mais adiante foi elaborada a Política Nacional de
Assistência Social, o SUAS e a LOAS, havendo um avanço no campo da assistência
social no país, principalmente em relação ao enfrentamento da pobreza, a garantia
dos mínimos sociais e a universalização dos direitos sociais.
64
Nessa conjuntura, os programas de transferência de renda começaram a
ganhar maior visibilidade na década de 1990, no Governo de Fernando Henrique
Cardoso, como forma de suprir as necessidades das famílias em situação de
pobreza: auxílio-gás, bolsa escola, entre outros. Já no governo Lula, todos os
programas que existiam foram unificados. Surge então o Programa Bolsa Família,
atualmente o maior programa de transferência de renda do Brasil.
Por fim, reiteramos a partir desse estudo, a necessidade da constante
reflexão crítica sobre as políticas públicas, utilizadas muitas vezes como marketing
governamental. Precisamos debater sobre seus objetivos e no que podem ser
melhorados para atender o grande número de famílias que vivenciam a pobreza
extrema em nosso país. Enquanto se diz que a cada ano o Brasil cresce
economicamente, precisamos que esse crescimento se reflita no social e que de fato
os serviços públicos sejam prestados com qualidade para toda a sociedade
brasileira. Devemos lutar pela garantia da universalização dos direitos sociais, pela
necessidade de conscientização política para superarmos a alienação das ações
veladas do capitalismo.
Que esta pesquisa possibilite novas reflexões e discussões sobre as
políticas públicas no Brasil, em destaque, o Programa Bolsa Família e seus
desdobramentos. Com propósito de formação crítica e tendo como base o Projeto
Ético Político do Serviço Social, podemos nos articular enquanto sujeitos de direitos,
para a construção de uma nova ordem societária, em que essas desigualdades
sejam superadas, havendo mais democracia nas relações sociais.
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69
APÊNDICE
ROTEIRO DE ENTREVISTA
Entrevista nº: ____ Data:___/___/___
1. DADOS DAS FAMÍLIAS, REALIDADE E VIDA E DE TRABALHO
1) Sexo: ( ) Masculino ( ) Feminino;
2) Idade: _____ ;
3) Etnia: ( ) Branca ( ) Negra ( ) Parda ( ) Amarela;
4) Estado Civil: ( ) solteiro/a ( ) casado/a ( ) viúvo/a ( )divorciado/a;
5) Você tem filhos? ( ) sim ( ) não Quantos? ______;
6) Naturalidade: ________________;
7) Quantas pessoas moram na mesma casa que você? ______;
8) Água encanada? ( ) sim ( ) não;
9) Saneamento básico? ( ) sim ( ) não;
10) Eletricidade? ( )sim ( ) não;
11) Qual a sua escolaridade? ( ) não alfabetizado ( ) alfabetizado
( ) ensino fundamental I ( ) ensino fundamental II ( ) ensino médio
( ) superior incompleto ( ) superior completo;
12) Você trabalha? ( )sim ( ) não Qual a profissão? _______________;
13) Possui algum tipo de deficiência? ( ) sim ( )não;
2. SOBRE O PROGRAMA BOLSA FAMÍLIA
1) Há quanto tempo recebe o benefício? ____;
2) O Bolsa Família é a única renda da família? ( ) sim ( )não;
3) Como é gasto o recurso do benefício?
4) Qual a importância do Programa Bolsa Família para sua vida?
5) Como era sua vida antes do Programa Bolsa Família?
6) Como você imaginaria hoje sua família sem esse recurso?
7) A família tem perspectiva de não mais precisar do PBF?
( ) sim ( ) não;
8) Como avalia o PBF?
9) Quando soube do PBF o que você acha que ele trouxe de bom para os
cidadãos? O que deveria melhorar?
70
10) Defina sua condição sócio econômica e compare-a ao que existe ao
seu redor (vizinhança, bairro, município), a realidade em que vive a sua
família.
11) Como você utiliza esse benefício? É suficiente para atender as
necessidades básicas da sua família?
12) Que ganhos a sua família teve a partir do PBF?
13) Quais as suas perspectivas em relação ao mercado de trabalho?
Participa de alguma qualificação? Se não, gostaria de participar?
14) Você acredita que pode fazer algo para mudar as condições de vida
da sua família?
15) Qual a importância do PBF na vida da sua família?
71
TERMO DE CONSETIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
O (a) Senhor (a) está sendo convidado (a) a participar da pesquisa: “Os
significados do Programa Bolsa Família para as famílias em situação de
extrema pobreza atendidas no CRAS Antônio Justa – Maracanaú”, sob a
responsabilidade da pesquisadora Ana Paula Chayn Pereira.
Meu objetivo com esta pesquisa é compreender os significados do PBF para as
famílias que vivenciam a extrema pobreza e que são atendidas no CRAS Antônio
Justa - Maracanaú.
Esperamos com esta pesquisa contribuir para a discussão e reflexão acerca desse
Programa de Transferência de Renda e seus significados para as famílias
extremamente pobres.
Na sua participação o (a) Senhor (a) me concederá uma entrevista onde me falará
sobre o significado do PBF para a sua família. Esta entrevista será gravada e ao
final da transcrição da gravação ela será desgravada.
Os resultados desta pesquisa serão publicados nos meios científicos e em nenhum
momento o (a) Senhor (a) será identificado (a).
O (a) Senhor (a) é livre para deixar de participar desta pesquisa a qualquer
momento, sem que isto implique em qualquer prejuízo.
Uma cópia deste Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ficará com o (a)
Senhor (a).
Qualquer dúvida a respeito da pesquisa o Senhor (a) poderá entrar em contato com:
Ana Paula Chayn Pereira
Endereço: Rua Manoel Pereira, n° 80 – Alto da Mangueira - Maracanaú.
Fones: (85) 88166893/97314320
Maracanaú, _____ de ____________________ de 2013.
_____________________________________________
Ana Paula Chayn Pereira
Eu aceito participar, voluntariamente, da Pesquisa acima citada, após ter sido
devidamente esclarecido (a).
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Nome do participante
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