UNIVERSIDADE VALE DO RIO DOCE PROGRAMA DE MESTRADO EM CIÊNCIAS BIOLÓGICAS Fernanda Elízia Silva Mendes CORRELAÇÃO ENTRE A SUSCEPTIBILIDADE IN VITRO E A ATIVIDADE IN VIVO DO FLUCONAZOL EM MODELO MURINO DE INFECÇÃO CEREBRAL CAUSADA POR Cryptococcus gattii Governador Valadares 2009 FERNANDA ELÍZIA SILVA MENDES CORRELAÇÃO ENTRE A SUSCEPTIBILIDADE IN VITRO E A ATIVIDADE IN VIVO DO FLUCONAZOL EM MODELO MURINO DE INFECÇÃO CEREBRAL CAUSADA POR Cryptococcus gattii Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Ciências Biológicas da Universidade Vale do Rio Doce – Univale, para a obtenção do título de Mestre em Ciências Biológicas. Área de Concentração: Imunopatologia das Doenças Infecciosas. Orientador: Dr. Daniel de Assis Santos Governador Valadares 2009 AGRADECIMENTOS Primeiramente agradeço a Deus pelo cuidado e por iluminar minha vida sempre. Aos meus pais, Moreira e Ecy, pelo incansável e incondicional apoio. Obrigada por não permitirem que eu desista dos meus sonhos. Ao meu marido Cláudio, pelo amor, paciência e companheirismo... sempre. Aos meus irmãos, Fabrício e Flaviane, pela amizade e por desejarem sempre meu sucesso e felicidade. Ao meu orientador Daniel, por ter me dado a oportunidade de aprender e por se fazer presente em todos os momentos necessários. Obrigada pelas palavras de incentivo, pela dedicação, paciência e disponibilidade. À Lorena pela preciosa ajuda durante todo o desenvolvimento deste trabalho. Às técnicas do laboratório de Microbiologia, Elaine e Adiléia, pela presteza em me auxiliarem sempre que precisei. À professora Elaine Speziali por possibilitar a quantificação de citocinas. Ao Daniel Alvarenga pelo auxílio na análise histopatológica. À Renatha pela amizade, companheirismo e pelos conselhos. A todos que de alguma maneira contribuíram para a realização deste estudo. RESUMO Um bioensaio para a quantificação de fluconazol no tecido cerebral murino foi desenvolvido. Camundongos Swiss receberam infusões diárias do antifúngico e o cérebro dos animais foi retirado em diferentes períodos durante 14 dias. O método apresentou linearidade adequada. A concentração da droga variou de 12,98 a 44,60 µg/mL no primeiro e último dia respectivamente. O ensaio foi usado para avaliar a terapia com o fluconazol em modelo de infecção cerebral causada por Cryptococcus gattii. Camundongos Swiss foram infectados intracerebralmente e tratados diariamente com fluconazol durante 7, 10 e 14 dias. O tratamento antifúngico reduziu a carga fúngica, mas um aumento no crescimento do microrganismo foi observado no dia 14. A concentração inibitória mínima do fluconazol contra isolados sequenciais foi 16 µg/mL, exceto para os isolados obtidos de animais tratados por 14 dias, nesse grupo a CIM foi 64 µg/mL. Esse fato foi correlacionado com o aumento da concentração do antifúngico e com a carga fúngica. A quantificação de citocinas dos animais com 10 dias de infecção revelou predomínio da resposta Th1 (IFN-γ e IL-12) no grupo não-tratado e aumento na produção de citocinas Th2 (IL-10 e IL-4) no grupo tratado. A análise histopatológica do cérebro dos animais mostrou um maior número de células microgliais nos animais do grupo não-tratado comparado ao grupo tratado. O modelo animal de criptococose cerebral demonstrou ser útil para estudos in vitro-in vivo. Nossos dados revelaram a possibilidade de adquirir resistência durante a terapia antifúngica. Palavras-chave: Fluconazol. Susceptibilidade. Criptococose. ABSTRACT A bioassay for the quantitation of fluconazole in murine brain tissue was developed. Swiss mice received daily injection of the antifungal and the brains were withdrawn in different moments during 14 days. The method presented adequate linearity. The drug concentrations varied from 12.98 to 44.60 µg/mL at the first and the last day, respectively. This assay was used to evaluate the therapy with fluconazole in a model of cerebral infection caused by Cryptococcus gattii. Swiss mice were intracranial infected and daily treated with fluconazole during 7, 10 or 14 days. The antifungal treatment reduced the fungal burden, but an increase of the fungal growth was observed at the day 14. The minimum inhibitory concentration for fluconazole against sequential isolates was 16 µg/mL, except for the isolates obtained from animals treated during 14 days, for which MICs were 64 µg/mL. This fact was correlated with the increase of the antifungal levels and also of the fungal burden. Cytokines quantitation at 10 days of infection revealed a predominance of Th1 response (IFN-γ and IL-12) in the non treated group and elevation of Th2 cytokines (IL-10 and IL-4) in the treated group. Histopathology of the brain of animals showed an increased number of microglial cells in the non treated group compared to the group treated. Furthermore, the animal model of cerebral cryptococcosis demonstrated to be useful for in vitro-in vivo studies. Our data revealed the possibility of acquired resistance during the antifungal drug therapy. Keywords: Fluconazole. Susceptibility. Cryptococcosis. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Foto 1 - Cryptococcus spp. em preparação com tinta nanquim.................................27 Foto 2 - Cultivo de C. gattii em Ágar Sabouraud Dextrose........................................27 Foto 3 - Teste canavanina-glicina-bromotimol (CGB) para identificação de C. gattii e C. neoformans............................................................................................................27 Foto 4 - Exame direto de leveduras crescidas em meio ASD submetido à coloração com tinta nanquim......................................................................................................55 Foto 5 - Células microgliais em quantidade moderada obtido do cérebro de camundongos Swiss não-tratados com fluconazol e infectados com isolados de C. gattii ATCC 32608......................................................................................................59 Foto 6 - Células microgliais em quantidade leve obtido do cérebro de camundongos Swiss tratados com fluconazol e infectados com isolados de C. gattii ATCC 32608..........................................................................................................................60 Gráfico 1 - Logaritmo do número de UFC/g encontrado no cérebro dos camundongos infectados via intracerebral com isolados de C. gattii e pertencentes aos grupos nãotratado (NT) e tratado (T), sacrificados respectivamente com 7, 10 e 14 dias de infecção......................................................................................................................54 Gráfico 2 - Concentrações de fluconazol detectadas no cérebro de camundongos sacrificados após 1, 2, 4, 8, 10, 12 e 14 dias de infusão da droga e os valores de CIM para o fluconazol frente aos isolados obtidos no grupo tratado.........................57 Gráfico 3 - Teor de citocinas obtido de sobrenadante de cultura de células de baço de camundongos Swiss após 10 dias de infecção com isolados de C. gattii.............58 LISTA DE TABELAS Tabela 1 - Concentrações de fluconazol determinada pelo ensaio microbiológico usando o cérebro de camundongos Swiss após a administração diária de fluconazol (40 mg/Kg), durante 1, 2, 4, 8, 10, 12 ou 14 dias.......................................................53 Tabela 2 - Valores da CIM do fluconazol frente a isolados sequenciais de C. gattii obtidos de camundongos pertencentes aos grupos tratado (T) e não tratado (NT), sacrificados após 7, 10 e 14 dias de infecção............................................................56 Tabela 3 - Correlação entre as concentrações de fluconazol determinadas no cérebro dos camundongos nos diferentes tempos de sacrifício com a CIM do grupo tratado (T) e o número de UFC/g no cérebro para animais tratados (T) e não tratados (NT)..............................................................................................................................56 LISTA DE ABREVIATURAS AMФ - Macrófagos Alveolares CO2 - Dióxido de carbono ConA - Concanavalina A DMSO – Dimetilsulfóxido GaIXM - Galactoxilomanana GXM – Glicuronoxilomanana HE - Hematoxilina Eosina H2O2 - Peróxido de hidrogênio IFN-γ - Interferon gama IL - Interleucina iNOS - Óxido nítrico-sintase induzida LCR - Líquido cefalorraquidiano mg -miligramas mL - mililitro MOPS - Ácido 3-(N-morfolino) propanosulfônico NK - Células matadoras naturais (“natural Killer”) nm - nanômetro OPD - Ortofenilenodiamina pg - picograma Th - Linfócito T auxiliar (T “helper”) Th1- Linfócito T auxiliar (T “helper”) do tipo 1 Th2 - Linfócito T auxiliar (T “helper”) do tipo 2 TNF-α - Fator de necrose tumoral alfa var. - Variedade µg - Micrograma µL - Microlitro µm - Micrometro 5-FC - 5-Flucitosina LISTA DE SIGLAS AFLP - Amplificação de Fragmentos Aleatórios do DNA (“Amplified Fragment Lengh Polimorphism”) AIDS - Síndrome da Imunodeficiência Adquirida APCs - Células Apresentadoras de Antígenos ASD - Ágar Sabouraud Dextrose ATCC - Coleção de Cultura Americana (“American Type Culture Collection”) CGB - Canavanina-Glicina-azul de Bromotimol CIM - Concentração Inibitória Mínima CLSI - Instituto de Padronização Clínico Laboratorial (“Clinical and Laboratory Standards Institute”) DC - Células Dendríticas ELISA - Ensaio de Imunoabsorção por Ligação Enzimática (“Enzime Linked Immunosorbent Assay”) g - grama h - horas HAART - Terapia anti-retroviral altamente eficaz (“Highly Active Antiretroviral Therapy”) HIV - Vírus da Imunodeficiência Humana IMC - Imunidade Mediada por Células Kg - quilograma NO - Óxido Nítrico NOS - Óxido Nítrico Sintases OMS - Organização Mundial da Saúde PBS - Tampão Salina Fosfato (“Phosphate Buffered Saline”) PBS-BSA - Tampão Salina Fosfato-Albumina Bovina (“Phosphate Buffered SalineAlbumin Bovine”) RFLP - Fragmentos de DNA gerados por enzimas de restrição (“Restriction Fragment Length Polymorphism”) RPMI - Meio de cultura desenvolvido pelo Roswell Park Memorial Institute SNC - Sistema Nervoso Central UFC - Unidades Formadoras de Colônias LISTA DE SÍMBOLOS % - porcentagem ºC - grau Celsius > - maior < - menor ≥ - maior ou igual SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO 14 2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 16 2.1 A CRIPTOCOCOSE 16 2.2 AGENTES ETIOLÓGICOS 17 2.3 ECOLOGIA 18 2.4 EPIDEMIOLOGIA 20 2.5 FATORES DE VIRULÊNCIA 22 2.6 QUADRO CLÍNICO 24 2.7 DIAGNÓSTICO LABORATORIAL 26 2.8 TRATAMENTO 28 2.9 TESTES DE SUSCEPTIBILIDADE AOS ANTIFÚNGICOS 32 2.10 RESPOSTA IMUNE NA CRIPTOCOCOSE 35 2.11 ANÁLISE HISTOPATOLÓGICA NA CRIPTOCOCOSE 38 3 OBJETIVOS 40 4 JUSTIFICATIVA 41 5 METODOLOGIA 43 5.1 DETERMINAÇÃO DA BIODISTRIBUIÇÃO CENTRAL DE FLUCONAZOL 43 POR MÉTODO MICROBIOLÓGICO 5.1.1 Construção da curva analítica 43 5.1.1.1 Droga antifúngica 43 5.1.1.2 Isolado 43 5.1.2 Determinação da concentração de fluconazol no cérebro de 44 animais 5.1.2.1 Droga antifúngica 44 5.1.2.2 Isolado 44 5.1.2.3 Animais e infusão de fluconazol 45 5.2 INFECÇÃO EXPERIMENTAL INTRACEREBRAL POR Cryptococcus gattii 46 5.2.1 Isolado 46 5.2.2 Teste piloto 46 5.2.3 Métodos de anestesia e inoculação 47 5.3 TESTE DE SUSCEPTIBILIDADE AO FLUCONAZOL UTILIZANDO 47 MÉTODO DA MICRODILUIÇÃO EM MEIO LÍQUIDO 5.4 QUANTIFICAÇÃO DE CITOCINAS 49 5.4.1 Animais 49 5.4.2 Preparação de suspensões de células do baço 49 5.4.3 Quantificação de citocinas por Ensaio Imunoenzimático (ELISA) 50 5.5 ANÁLISE HISTOPATOLÓGICA 51 6 RESULTADOS 52 6.1 DETERMINAÇÃO DA BIODISTRIBUIÇÃO CENTRAL DE FLUCONAZOL 52 POR MÉTODO MICROBIOLÓGICO 6.2 INFECÇÃO EXPERIMENTAL INTRACEREBRAL POR Cryptococcus gattii 53 ATCC 32601 6.3 TESTE DE SUSCEPTIBILIDADE AO FLUCONAZOL UTILIZANDO 55 MÉTODO DA MICRODILUIÇÃO EM MEIO LÍQUIDO 6.4 QUANTIFICAÇÃO DE CITOCINAS 57 6.5 ANÁLISE HISTOPATOLÓGICA 59 7 DISCUSSÃO 61 8 CONCLUSÃO 69 REFERÊNCIAS 70 ANEXOS 83 14 1 INTRODUÇÃO Cryptococcus spp. constitui um gênero de leveduras capsuladas causadoras de micose profunda tanto em indivíduos imunocomprometidos como em imunocompetentes (PFALLER et al., 2004). A meningoencefalite é a apresentação clínica mais frequente da doença (ALLER et al., 2000). Duas espécies são as principais responsáveis pela infecção: Cryptococcus neoformans e Cryptococcus gattii, sendo a primeira responsável pela maioria dos casos em imunocomprometidos e a segunda responsável por acometer principalmente imunocompetentes. No entanto, o número de indivíduos acometidos por ambas as espécies fúngicas aumentou em diversas partes do mundo. Até o momento a maioria dos estudos tem focado apenas na espécie C. neoformans e pouco se conhece sobre a espécie C. gattii. Atualmente, o tratamento da condição é realizado com um pequeno número de agentes antifúngicos e a terapia convencional tem apresentado efeitos adversos. O fluconazol é um antifúngico que apresenta um bom perfil terapêutico, uma vez que apresenta menor toxicidade, porém, vários registros mostram a seleção de isolados de Cryptococcus spp. resistentes a esta droga. A falta de um regime fungicida efetivo e a recente seleção de isolados de C. neoformans e C. gattii resistentes, demonstram a necessidade do estabelecimento de regimes terapêuticos seguros e eficazes (LARSEN et al., 2004). A análise da atividade de antifúngicos permite a comparação entre diferentes antimicóticos, o que pode auxiliar na escolha da terapia (SANTOS; HAMDAN, 2007). Vários estudos com o objetivo de determinar a concentração inibitória mínima (CIM) de antifúngicos, por meio de testes de susceptibilidade, foram desenvolvidos porém pontos de corte não foram estabelecidos para o fluconazol frente a Cryptococcus spp. (LARSEN et al, 2005b). A maioria dos estudos de susceptibilidade de antifúngicos para Cryptococcus spp. tem sido realizados com isolados clínicos ou ambientais de C. neoformans e existe uma escassez de dados sobre a susceptibilidade de C. gattii a diferentes antifúngicos. Alguns poucos estudos têm relatado que isolados clínicos de C. gattii são relativamente menos sensíveis do que C. neoformans a anfotericina B, 5-flucitosina e azóis (KHAN et al., 2009). 15 Experimentos utilizando modelos animais de criptococose podem auxiliar, em muito, no estabelecimento de pontos de corte das drogas antifúngicas. Apesar do grande número de estudos envolvendo modelos animais de criptococose, não foi encontrado na literatura nenhum trabalho que correlacionasse a resposta do animal à terapia com resultados de testes de susceptibilidade. No presente estudo foi avaliada a atividade in vitro e in vivo do fluconazol contra C. gattii. A concentração de fluconazol no cérebro dos animais foi determinada por meio de um ensaio microbiológico e os resultados foram correlacionados com a concentração inibitória mínima de isolados sequenciais do microrganismo. Além disso, avaliou-se o padrão de citocinas produzidas em resposta à infecção a fim de conhecer o tipo de resposta imune hospedeira associada ao controle da infecção na presença do fluconazol. Exame histológico do órgão acometido também foi realizado para analisar possíveis alterações quantitativas nas células microgliais. Os resultados apresentados no decorrer do trabalho poderão ser úteis para o melhor norteamento da terapia contra a infecção causada por C. gattii. 16 2 REVISÃO BIBLIOGRÁFICA 2.1 A CRIPTOCOCOSE Dentro do gênero Cryptococcus spp. as espécies Cryptococcus neoformans (sorotipos A, D e AD) e Cryptococcus gattii (sorotipos B e C) são os principais patógenos causadores de doença em humanos (MERSHON et al., 2009). O antígeno que determina os sorotipos das leveduras é composto fundamentalmente, por glicuronoxilomanana (GXM) (FELDMESSER; KRESS; CASADEVALL, 2001). Os sorotipos diferem em aspectos ecológicos, epidemiológicos, fisiológicos e genéticos (REZENDE; MUNHÓZ; ALMEIDA, 2008). C. neoformans foi isolado e identificado pela primeira vez como patógeno humano, em 1894, em uma lesão de tíbia (CASADEVALL; PERFECT, 1998) e, a partir de 1980, sua importância clínica aumentou devido à maior incidência em virtude do aparecimento da síndrome da imunodeficiência adquirida (AIDS) e da crescente utilização de fármacos imunossupressores (PAPPALARDO; MELHEM, 2003). O primeiro isolamento ambiental de C. gattii foi em 1990, associado ao Eucalyptus camaldulensis (ELLIS; PFEIFFER, 1992). No Brasil, os primeiros relatos da doença ocorreram nos anos de 1941 e 1944, descritos por Carlos da Silva Lacaz e Floriano de Almeida (REISFILHO et al., 1985). Cryptococcus spp. pode também infectar animais, especialmente gatos (MITCHELL; PERFECT, 1995), porém, nenhuma transmissão de criptococose entre animais ou seres humanos foi relatada (SORRELL, 2001). A criptococose é uma condição infecciosa fúngica predominantemente oportunista que ocorre com grande frequência em pacientes imunodeprimidos com alguma doença de base como, por exemplo, AIDS, neoplasias linfoproliferativas ou sarcomas, diabetes e em transplantados (CASADEVALL; PERFECT, 1998; PAPPALARDO; MELHEM, 2003). No hospedeiro imunocompetente, a infecção é muitas vezes assintomática e limitada ao pulmão. Contudo, em pacientes com a imunidade comprometida, pode ocorrer disseminação extrapulmonar para o sistema nervoso central (SNC), sendo a meningoencefalite a apresentação clínica mais comum da criptococose (FELDMESSER; KRESS; CASADEVALL, 2001). 17 Acredita-se que a infecção por Cryptococcus spp. seja adquirida pela inalação de basidiósporos ou células dissecadas da levedura (SORRELL, 2001) que se depositam nos alvéolos, comprometendo inicialmente o pulmão de onde pode disseminar-se para outros órgãos (RETINI et al., 2001). A criptococose causada por C. neoformans caracteriza-se por ser uma doença generalizada, que pode causar infecção em indivíduos hígidos, mas a maior proporção de humanos afetados são os indivíduos imunocomprometidos. Esses podem não responder satisfatoriamente ao tratamento com antifúngicos de forma que o decurso da doença é geralmente fatal. Por outro lado, a doença causada por C. gattii se diferencia por acometer principalmente indivíduos imunocompetentes, sendo considerado um patógeno não-oportunista relacionado à criptococose de ocorrência endêmica e focal. Nesse caso, ocorre manifestação pulmonar exuberante que em grande parte das vezes responde bem ao tratamento com antifúngicos e comporta bom prognóstico (LACAZ et al., 2002a; PAPPAS et al., 2001). 2.2 AGENTES ETIOLÓGICOS Identificados ao longo dos anos nos gêneros Saccharomyces, Cryptococcus, Torula e Debaryromyces, em 1935, todos os isolados causadores da criptococose foram classificados em um só gênero e espécie – Cryptococcus neoformans (CASADEVALL; PERFECT, 1998). Evans em 1949 descreveu os sorotipos A, B e C. Posteriormente foram identificados os sorotipos D e AD. Em 1975, Kwon-Chung, baseada em seus estudos com cruzamento sexuado entre os isolados que causavam a micose, propôs duas variedades para a espécie de C. neoformans: a variedade C. neoformans var. neoformans (sorotipos A, D e AD) e a variedade C. neoformans var. gattii (sorotipos B e C) (LAZÉRA; IGREJA; WANKE, 2004). Franzot, Salkin e Casadevall (1999), por meio do método de Restriction Fragment Length Polymorphism (RFLP) fizeram análises moleculares de C. neoformans e baseados em evidências genotípicas e fenotípicas, propuseram separar os sorotipos A, D e AD em duas variedades distintas da mesma espécie. Assim, C. neoformans var. neoformans compreende os sorotipos D e AD e C. neoformans var. grubii compreende o sorotipo A. 18 Estudos moleculares mais recentes mostraram também que a variedade C. gattii deve ser reconhecida como uma espécie. Barreto de Oliveira et al. (2004), por meio de Analyse Fragment Lengh Polimorphism (AFLP), analisaram a estrutura genética do C. neoformans revelando a existência de dois genótipos principais e portanto duas espécies distintas. C. neoformans compreende os genótipos VN I a VN IV e C. gattii os genótipos VG I a VG IV (KHAN et al., 2009). Já foram descritas aproximadamente 40 diferentes espécies do gênero Cryptococccus (CASADEVALL; PERFECT, 1998). C. neoformans e C. gattii são leveduras ovaladas variando de 3 a 8 µm de diâmetro, envoltos por uma cápsula de polissacarídeos (JANBON, 2004). O estado leveduriforme corresponde à forma assexuada de Cryptococcus spp. e sua reprodução ocorre por brotamento único ou múltiplo a partir de qualquer ponto da parede celular. Entretanto, esse microrganismo apresenta reprodução sexuada correspondendo ao estado perfeito, sendo identificado na classe Basidiomicetes, família Filobasidiaceae e gênero Filobasidiella. Na reprodução sexuada, forma teleomórfica, os isolados são heterotálicos e têm como característica principal a produção de basidiósporos e, ocasionalmente, pseudo-hifas (KWON-CHUNG, 1976). Os basidiósporos de C. neoformans (Filobasidiella neoformans) são esféricos, alongados ou cilíndricos, com a parede ligeiramente rugosa, enquanto os de C. gattii (Filobasidiella bacillispora) são baciliformes e de parede lisa (MITCHELL; PERFECT, 1995). Todas as espécies de Cryptococcus spp. não fermentam glicose, hidrolisam amido, assimilam inositol e produzem urease. Estas características, bem como as características morfológicas da cápsula e a rara presença de pseudo-hifas distinguios de outras leveduras clinicamente importantes (CASADEVALL; PERFECT, 1998). 2.3 ECOLOGIA C. neoformans é cosmopolita, encontrado principalmente em fezes de pombos e excretas de outras aves, sobretudo aquelas relacionadas à criação em cativeiro, no ambiente doméstico, como canários, periquitos e papagaios (FILIÚ et al, 2002). As excretas das aves são ricas em creatinina e constituem importantes 19 substratos para a levedura, uma vez que a creatinina é assimilada pelo fungo (POLACHECK; KWON-CHUNG, 1980). As aves não se tornam doentes provavelmente porque sua temperatura corporal relativamente elevada é prejudicial ao fungo. Contudo, esses animais são capazes de distribuir a levedura na natureza, favorecendo a aquisição da doença (MITCHELL; PERFECT, 1995). Mais recentemente, foi demonstrada em diferentes localidades, a ocorrência natural de C. neoformans colonizando ocos de árvores vivas (FERNANDES et al., 2000). Estudos posteriores apresentaram um novo habitat natural e possível nicho ecológico do fungo, relacionado à madeira em decomposição em diferentes árvores tropicais, inclusive do Brasil (LAZÉRA et al., 1998; LAZÉRA et al., 2000). O primeiro isolamento ambiental de C. gattii foi descrito em 1990 na Austrália associada a uma árvore nativa da região da espécie Eucalyptus camaldulensis (ELLIS; PFEIFFER, 1992). Nas regiões Norte e Central da Austrália, o fungo é endêmico (EINSIEDEL; GORDON; DYER, 2004). C. gattii foi exportado da Austrália para outras partes do mundo por meio de sementes do E. camaldulensis, contendo o micélio dicariótico da levedura (MELO et al., 1993). A dispersão dos basidiósporos no ambiente ocorre concomitantemente com o período de floração do eucalipto (SORREL, 2001). Estudos ambientais mais recentes demonstraram um novo habitat relacionado à madeira em decomposição em ocos de árvores tropicais de diferentes espécies (Cassia grandis, Senna multijuga, Ficus microcarpa, Moquilea tometosa e Guettarda acreana) nas regiões Norte e Nordeste do Brasil (LAZÉRA et al., 1998; LAZÉRA et al., 2000; FORTES et al., 2001), o que pode sugerir que C. gattii bem como C. neoformans não estão associados a uma árvore específica, mas a um nicho especializado resultante da biodegradação natural da madeira (LAZÉRA et al., 2000). Os casos humanos de infecção por C. gattii predominam em regiões tropicais e subtropicais, no entanto, um surto recente da infecção causada por C. gattii na ilha de Vancouver, Canadá, indicou o surgimento da infecção em clima temperado (KHAN et al., 2009; KIDD et al., 2004; MERSHON et al., 2009), aumentando o interesse no estudo deste patógeno (JAIN et. al., 2006). Em 2001 e 2002, C. gattii foi isolado de árvores nativas de Vancouver como Arbutus menziensii, Alnus spp. Cedrus spp. e Pseudotsuga spp. (KIDD et al., 2004). Provavelmente, as alterações climáticas, sobretudo o aquecimento global, favoreceram a colonização de C. gattii 20 em ambientes de clima temperado (DATTA; BARTLETT; MARR, 2009; KIDD et al., 2004). 2.4 EPIDEMIOLOGIA Não se tem idéia da exata prevalência da criptococose em todo o mundo. É certo que após o advento dos transplantes e o surgimento da AIDS sua frequência aumentou de maneira significativa, sendo C. neoformans o agente mais incriminado como causa de meningite em indivíduos com AIDS (DANNAOUI et al., 2006; MANSOUR et al., 2004). Em muitos pacientes a criptococose é a primeira indicação de AIDS (MITCHELL; PERFECT, 1995). O estado imune do hospedeiro pode ser um determinante significativo da infecção causada por C. neoformans ou por C. gattii. Nos estudos de Chen et al. (2000), 80% dos pacientes infectados com C. neoformans estavam imunocomprometidos e, 89% das infecções causadas por C. gattii ocorreu em hospedeiros imunocompetentes. Antes de 1981 a criptococose era uma infecção rara, com um número total de casos entre 500 a 1000 nos Estados Unidos. Desde então, pacientes em estágios avançados de AIDS foram associados com marcada susceptibilidade à infecção por C. neoformans. No início dos anos 90, a criptococose foi epidêmica em algumas regiões. Em 1991 apenas na cidade de Nova York foram registrados 1200 casos de meningite criptococócica (CASADEVALL; PERFECT, 1998). C. neoformans e C. gattii são endêmicos na Austrália e Nova Guiné onde a criptococose tem sido relatada principalmente em aborígenes (CHEN et al., 2000). No Brasil, 215.810 casos de AIDS foram registrados entre 1980 a 2002, sendo a criptococose diagnosticada em 6% desses pacientes e São Paulo o estado com maior incidência (MINISTÉRIO DA SAÚDE DO BRASIL, 2002). A criptococose é considerada atualmente a doença oportunista com maior morbidade e mortalidade entre os pacientes soropositivos (MOREIRA et al., 2006). A doença já foi relatada em diversos estados do Brasil como Mato Grosso do Sul (FILIÚ et al., 2002), Minas Gerais (MOREIRA et al., 2006; SILVA et al., 2008; SOARES et al., 2008), Pará, Roraima, Amazonas (CORRÊA et al., 1999), Piauí, Maranhão (SEVERO; OLIVEIRA; LONDERO, 1999), São Paulo (ALMEIDA et al., 21 2007; LACAZ et al., 2002b), Rio de Janeiro (LACAZ et al., 2002a), Espírito Santo (BALTAZAR; RIBEIRO, 2008) e Rio Grande do Sul (REOLON; PEREZ; MEZZARI, 2004). C. neoformans é prevalente nos estados do Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul e C. gatti é endêmico no Pará, Maranhão, Piauí e outros estados nordestinos, provocando doença em indivíduos imunocompetentes (SEVERO; OLIVEIRA; LONDERO, 1999). Segundo Barreto de Oliveira et al. (2004), a diversidade genotípica de Cryptococcus spp., no Brasil, é distribuída em C. neoformans var. grubii sorotipo A (65%), C. neoformans var. neoformans sorotipos D (9%) e AD (5%), e C. gattii sorotipos B (17,5%) e C (3,5%). Em todo o mundo, é estimado que 25% a 30% dos pacientes com AIDS morrerão em virtude da meningite criptococócica. Sua incidência varia em diferentes partes do planeta apresentando-se entre 5 a 10% na Europa Ocidental e Estados Unidos e mais de 20% na África Central e leste da Ásia (LARSEN et al., 2004; MITCHELL; PERFECT, 1995). De acordo com os estudos de Pappalardo e Melhem (2003) desenvolvidos no Brasil, a letalidade da infecção criptococócica com ou sem condição predisponente, situa-se entre 45% a 65%. Estudos apontam que a criptococose ocorre com maior prevalência no sexo masculino tendo sido observado em algumas pesquisas que aproximadamente 80% dos casos de criptococose do SNC pertencem a este sexo (FERNANDES et al., 2000; MOREIRA et al., 2006; SILVA et al., 2008). Chen et al. (2000) também observaram um predomínio da doença no sexo masculino, principalmente em indivíduos imunocompetentes infectados com C. gattii. O fato foi atribuído a maior exposição de homens ao reservatório ambiental do fungo, influências hormonais e/ou predisposição genética. É relatado também a rara ocorrência da doença em crianças (CHEN et al., 2000; FERNANDES et al., 2000; MOREIRA et al., 2006), entretanto, na região Norte do Brasil, houve um incremento nos relatos da criptococose nessa faixa etária (CORRÊA et al., 1999). Em Minas Gerais, foi relatado um caso de criptococose com envolvimento do SNC causado por C. gattii em uma criança de 10 anos de idade sem sinal aparente de imunossupressão (SOARES et al., 2008). Lacaz et al. (2002b) identificaram em São Paulo um caso de criptococose cutânea provocado por C. gattii em um homem sem qualquer doença de base. Entre 1999 a 2003 a incidência da infecção por C. gattii em Vancouver foi de 37 casos por milhão de habitantes por ano (KIDD et al.; 2004). Esta incidência é significativamente maior do que a infecção caudada por C. 22 gattii na Austrália (0,94 casos por milhão de habitantes por ano), onde C. gattii é endêmico (CHEN et al., 2000). A infecção também foi diagnosticada em uma grande variedade de animais em Vancouver (KIDD et al.; 2004). Nos últimos dois anos, nos EUA, oito casos humanos de criptococose causada por C. gattii foram registrados em Washington, sendo que quatro destes indivíduos não haviam viajado para fora do estado. Nove casos foram relatados em Oregon. O potencial de dispersão de linhagens de Cryptococcus spp. capazes de infectar imunocompetentes é motivo de preocupação e C. gattii é atualmente um patógeno emergente na América do Norte (MERSHON et al., 2009). Outras espécies, como C. albidus, C. curvatus, C. laurentii, C. luteolus e C. uniguttulatus também já foram isoladas de pacientes com diferentes formas de criptococose (CASADEVALL; PERFECT, 1998; MITCHELL; PERFECT, 1995). 2.5 FATORES DE VIRULÊNCIA Como muitos outros patógenos, Cryptococcus spp. é capaz de manipular o sistema hospedeiro para facilitar a sua evasão (JONG et al., 2008). A cápsula do Cryptococcus é a principal responsável por sua virulência e também por diversos efeitos inibitórios sobre a resposta imune. A mesma é constituída de polissacarídeos, polímeros de xilose, manose e ácido glicurônico, livres de nitrogênio e enxofre. O antígeno que determina os sorotipos das leveduras é composto fundamentalmente por 90% de GXM e em menores quantidades de galactoxilomanana (GaIXM) e manoproteínas (FELDMESSER; KRESS; CASADEVALL, 2001; MITCHELL; PERFECT, 1995). O tamanho da cápsula é determinado pelo genótipo e condições de crescimento oferecidas, sendo que normalmente as leveduras apresentam pequenas cápsulas quando no ambiente e cápsulas espessas durante a infecção (MITCHELL; PERFECT, 1995). Os polissacarídeos capsulares inibem a fagocitose, consomem complemento, adsorvem e neutralizam opsoninas e outros anticorpos protetores. (LAZÉRA; IGREJA; WANKE, 2004). Além disso, conforme Larsen et al. (2005a), os polissacarídeos capsulares podem ainda inibir a migração leucocitária; induzir espalhamento de L-selectina; promover edema cerebral e desregulação na produção de citocinas. Por todas estas razões, o polissacarídeo capsular de 23 Cryptococcus spp. é um importante fator de virulência que interfere com os mecanismos de defesa do hospedeiro (DIXIT; CARROLL; QURESHI, 2009). Cryptococcus spp. produz uma enzima fenoloxidase capaz de oxidar substâncias fenólicas, como a tirosina, produzindo pigmento tipo melanina que se deposita na parede e confere às colônias a cor escura (LACAZ et al., 2002a). Na criptococose a melanina parece interferir na virulência da levedura, com grande tropismo para o SNC, rico em catecolaminas como a L-DOPA (FELDMESSER; KRESS; CASADEVALL, 2001). A melanina pode funcionar ainda como um antioxidante que pode proteger Cryptococcus spp. da defesa oxidativa do hospedeiro. Estudos anteriores mostraram que mutantes deficientes da enzima fenoloxidase são mortos pelo sistema oxidativo do hospedeiro, enquanto que fungos tipo selvagem são resistentes. A capacidade de produzir melanina também é um dos fatores responsáveis pela dificuldade de obter sucesso na terapia antifúngica (MITCHELL; PERFECT, 1995). A produção de melanina contribui ainda para a proteção do fungo contra os raios ultravioletas provenientes da luz solar (DATTA; BARTLETT; MARR, 2009). A capacidade de crescer em condições fisiológicas também é um fator de virulência do fungo (CASADEVALL; PERFECT, 1998). C. neoformans mantém sua curva de crescimento a 38-39 ºC e começa a perder a viabilidade somente após 24 h a 40 ºC. C. gattii possui limite de tolerância de 35 ºC e tem seu crescimento reduzido a 37 ºC (LAZÉRA; IGREJA; WANKE, 2004). De acordo com Jain et al. (2006) a capacidade de mudar fenotipicamente é outro importante fator de virulência de Cryptococcus spp.. No estudo dos autores foi observado que C. gattii é capaz de mudar de colônia lisa para rugosa sendo essa mudança reversível em alguns sorotipos. O microambiente do hospedeiro pode determinar o fenótipo rugoso ou liso dominante da população patogênica. A mudança fenotípica tem papel crucial na patogênese e facilita a disseminação do fungo para o SNC. A modificação fenotípica permite ainda que o patógeno se adapte a diferentes microambientes, o que pode afetar a relação patógeno-hospedeiro com consequências que podem levar à alteração na virulência. A capacidade de mudar fenotipicamente foi associada com mudanças na cápsula polissacarídica, fato que pode afetar a fagocitose ou impedir a rápida destruição da levedura pelo intenso processo inflamatório. 24 O gene CPS1 da cápsula de C. neoformans codifica a síntese do ácido hialurônico, que pode funcionar como molécula de adesão durante a infecção da levedura (JONG et al., 2008). A produção de manitol pode contribuir para o aumento da pressão intracraniana e na proteção fúngica contra o estresse, choque térmico, diferenças osmóticas e radicais de oxigênio (DIXIT; CARROLL; QURESHI, 2009; HOANG et al., 2004). É provável que a urease produzida por Cryptococcus spp. facilite a disseminação da levedura para o SNC (DIXIT; CARROLL; QURESHI, 2009). Adicionalmente, a capacidade de secreção de proteinases e fosfolipases extracelulares, tolerância a baixos pH e elevados níveis de sal também contribuem para a patogenicidade do fungo (DIXIT; CARROLL; QURESHI, 2009). 2.6 QUADRO CLÍNICO A criptococose se manifesta com quadros clínicos variados que incluem desde um simples nódulo no pulmão até a disseminação sistêmica do microrganismo (MANSOUR et al., 2004), dependendo do estado imunológico do hospedeiro (HOANG et al., 2004). As manifestações clínicas gerais podem ser inespecíficas. Geralmente, os doentes relatam história crônica com duração de semanas ou meses caracterizada por febre baixa, anorexia e perda de peso. As manifestações específicas são polimorfas e variam com os órgãos afetados (KAVANAUGH; FRASER; DIETRICH, 2006; MITCHELL; PERFECT, 1995). O pulmão é invariavelmente a porta de entrada e o sítio de infecção inicial de Cryptococcus spp. A infecção pulmonar inicial pode ser assintomática, mas tem potencial para disseminar no hospedeiro. Nos casos sintomáticos pode ocorrer tosse (54%), dor no peito (46%), produção de escarro (32%), perda de peso (26%), febre (26%) e hemoptise (18%). Outros sintomas podem ocorrer com menor frequência e incluem dispnéia, suores noturnos, e obstrução da veia cava superior (MITCHELL; PERFECT, 1995). As lesões pulmonares são frequentes, podendo ser primárias ou secundárias (LACAZ et al., 2002a). A maioria dos casos de lesões tegumentares é decorrente da doença disseminada, ocorrendo em 10 a 15% dos casos de criptococose (TANEJA et al., 2008). Tais lesões podem se apresentar como lesões acneformes, pápulas, 25 vesículas, nódulos, tumores, abcessos, úlceras e granulomas superficiais (MITCHELL; PERFECT, 1995). De acordo com Franzot, Salkin e Casadevall (1999), C. neoformans var. grubii sorotipo A, é o agente etiológico predominante nas lesões criptococócicas cutâneas. Lesões mucosas também podem ocorrer (LACAZ et al., 2002a). A criptococose disseminada corresponde a 90% dos casos diagnosticados quando o paciente procura assistência médica (LAZÉRA; IGREJA; WANKE, 2004) devido à diminuição da visão ou é encaminhado em decorrência de distúrbios mentais, tais como confusão, depressão, ou agitação (MITCHELL; PERFECT, 1995). A mais frequente manifestação de disseminação é a meningoencefalite sendo essa a forma clínica mais importante e que se não tratada é fatal (POSTERARO et al., 2003). Outros locais atingidos pela disseminação sistêmica da criptococose incluem retina, conjuntiva, seios paranasais, esôfago, próstata, glândulas adrenais, ossos, coração, fígado, linfonodos, articulações, músculos, rins e placenta (CASADEVALL; PERFECT, 1998). Dentre os sintomas que podem ser encontrados pode-se citar cefaléia intermitente ou contínua, diplopia, diminuição da visão chegando mesmo à cegueira, nistagmo, letargia, sonolência, vômitos, hidrocefalia, rigidez de nuca, fotofobia (PAPALLARDO; MELHEM, 2003), hipertensão intracraniana, redução do estado de consciência, papiledema bilateral grave podendo ocorrer hemorragia da retina e paralisia de nervos cranianos (EINSIEDEL; GORDON; DYER, 2004). Segundo Chen et al. (2000), algumas características clínicas da criptococose diferem conforme a espécie de Cryptococcus spp. A doença pulmonar localizada é incomum em pacientes imunocomprometidos (11%) e é frequentemente associada a hospedeiros imunocompetentes (60%), sendo esse sintoma mais comumente associado à infecção causada por C. gattii. Inversamente, 90% dos pacientes imunocomprometidos apresentam meningite contra somente 30% a 40% dos imunocompetentes. Nos estudos de Hoang et al. (2004) o envolvimento pulmonar também foi significativamente mais comum em pacientes imunocompetentes, enquanto que pacientes HIV positivos apresentaram principalmente compromentimento do SNC. A presença de criptococomas (lesões de > 1 cm de diâmetro) nos pulmões ou cérebro são mais frequentes em pacientes imunocompetentes, sendo associado à infecção por C. gattii (CHEN et al., 2000). A ocorrência de disseminação para outros sítios é característica da infecção por C. neoformans. De acordo com Lizarazo (2006), 60% dos pacientes com meningite 26 criptococócica e AIDS apresentam hipertensão intracraniana sem hidrocefalia no momento do diagnóstico. Contudo, é importante mencionar que o estado imune hospedeiro também é um fator determinante da apresentação clínica da criptococose (SORRELL, 2001). 2.7 DIAGNÓSTICO LABORATORIAL O exame micológico direto do material suspeito submetido à coloração com tinta nanquim (tinta da China) é considerado o padrão ouro para o diagnóstico laboratorial da criptococose, uma vez que a tinta revela muito bem a cápsula do agente etiológico (LACAZ et al., 2002a) (foto 1). A levedura pode ser isolada do fluido cérebro-espinhal, dos tecidos, escarro e amostras respiratórias, raspados e de aspirados de lesões cutâneas. Para o cultivo, utiliza-se o meio Sabouraud (foto 2). A levedura cresce facilmente, formando colônias mucóides, lisas e úmidas, de coloração branca a creme (MITCHELL; PERFECT, 1995). O teste mais usado para diferenciar C. neoformans de C. gattii é o CGB (foto 3). C. gattii é resistente à L-canavanina metabolizando-a a produtos não tóxicos e sendo portanto capaz de crescer no meio CGB, onde a glicina é utilizada como única fonte de carbono e nitrogênio. A alcalinização do meio resulta da liberação de amônia durante a degradação da glicina levando à elevação do pH e alteração da cor do indicador para azul-cobalto. Por outro lado, C. neoformans é inibido pela Lcanavanina e não é capaz de crescer ou utilizar a glicina no meio CGB, portanto não alteram o pH e a cor original do meio é mantida (CASADEVALL; PERFECT, 1998; LAZÉRA; IGREJA; WANKE, 2004). 27 Foto 1 – Cryptococcus spp. em preparação com tinta nanquim. Fonte: Lazéra, Igreja e Wanke, 2004 Foto 2 - Cultivo de C. gattii em Ágar Sabouraud Foto 3 - Teste canavanina-glicinabromotimol (CGB). Á esquerda teste CGB (+) identifica C. gatti. À direita teste CGB (-) identifica C. neoformans. Fonte: Canelo et al. (1999) 28 Nenhuma espécie do gênero Cryptococcus spp. fermenta açúcares e a maioria produz urease (MITCHELL; PERFECT, 1995). A produção de melanina é uma característica amplamente utilizada para a identificação de C. neoformans e C. gattii em laboratório de pesquisa (PEDROSO et al., 2007). Os testes de aglutinação de partículas de látex e ensaio de imunoabsorção enzimática (ELISA) são sensíveis e específicos para detecção de antígenos capsulares (BROUWER et al., 2005). A pesquisa de anticorpos específicos não se mostrou de utilidade prática até o momento (LAZÉRA; IGREJA; WANKE, 2004). Exames subsidiários podem ser úteis ou necessários como o hemograma, o exame liquórico e as provas radiológicas (LACAZ et al., 2002a). Os cortes histológicos corados pela Hematoxilina-Eosina (HE) permitem a visualização dos basidiósporos de C. neoformans que se apresentam esféricos, ovais ou elípticos com parede fina rósea ou azul pálido com 5 a 15 µm de diâmetro. A cápsula não se cora pelo HE devido a sua natureza mucopolissacarídea, permanecendo em seu lugar um halo claro. No entanto, a cápsula pode ser visualizada pelas colorações PAS, azul alciano ou mucicarmim de Meyer (LACAZ et al., 2002a). A tomografia computadorizada e a ressonância magnética são muito informativos com o último tendo sensibilidade muito elevada para a detecção e caracterização das lesões criptococócicas (PATRO et al., 2009). A medição da pressão do líquido cefalorraquidiano (LCR) durante a punção lombar diagnóstica de meningite aguda é um procedimento simples com implicações terapêuticas. A presença de meningite, LCR claro e alta pressão intracraniana podem ser úteis para o diagnóstico diferencial de meningite por Cryptococcus spp. A punção do LCR pode diminuir a hipertensão intracraniana e contribuir para a redução das taxas de mortalidade e sequelas neurológicas nos pacientes que recebem esse tipo de tratamento (LIZARAZO, 2006). 2.8 TRATAMENTO Em decorrência dos fungos serem agentes eucarióticos, assim como o hospedeiro humano, o desenvolvimento das drogas antifúngicas surgiu bem mais 29 tarde que os agentes antibacterianos e tem sido limitado (SIDRIM; ROCHA, 2004). Além disso, o pequeno espectro de atividade, a toxicidade, a baixa estabilidade, a falta de disponibilidade oral e o alto custo das drogas antifúngicas também limitam a terapia com antifúngicos (WIDMER et al., 2006). Apesar dos diversos avanços terapêuticos ainda é considerado difícil o tratamento da criptococose e vários esquemas terapêuticos têm sido empregados (LARSEN et al., 2004). A anfotericina B foi introduzida em 1950 e continua a ser a principal terapia de escolha para o tratamento da meningite criptococócica. A 5-flucitosina (5-FC) foi introduzida no final de 1970, e os azóis itraconazol e fluconazol foram introduzidos no final dos anos de 1980 e início de 1990. Essas são as drogas mais utilizadas para o tratamento da criptococose (LARSEN et al., 2004). A anfotericina B é um poliênico cuja ação primária consiste na alteração da permeabilidade celular da membrana fúngica. O fármaco liga-se ao ergosterol, principal esterol da membrana celular dos fungos, produzindo poros ou canais (SANGLARD, 2002) que aumentam a permeabilidade da membrana, permitindo o extravasamento de íons e macromoléculas intracelulares, levando à morte da célula fúngica (SHEPPARD; LAMPIRIS, 2005). Esse fármaco tem se mostrado eficaz no tratamento de todas as formas de criptococose, porém, a droga apresenta diversos efeitos colaterais dentre os quais, nefrotoxicidade, fato que limita seu uso terapêutico (BENNETT, 2003). Poucos relatos têm sido descritos na literatura sobre a resistência à anfotericina B (SILVA et al., 2008) e tal resistência é explicada pelo decréscimo da quantidade de ergosterol presente na membrana fúngica ou pela modificação da molécula-alvo de esterol de modo a reduzir sua afinidade pela droga (SHEPPARD; LAMPIRIS, 2005). Devido a alta nefrotoxicidade dessa droga, novas formulações lipídicas de anfotericina B (lipossomal, em dispersão coloidal e complexo lipídico) já estão disponíveis para uso clínico. Tais formulações são de baixa toxicidade, fácil utilização e permitem alcançar doses mais elevadas em curto espaço de tempo. Contudo, seu preço é tão alto que poucos pacientes podem utilizá-la (MARTINEZ, 2006). A 5-FC é captada pelas células fúngicas pela enzima citosina permease. A droga apresenta mecanismo de ação que interfere na síntese do DNA da célula fúngica. O uso do fármaco deve ser monitorado uma vez que apresenta toxicidade para medula óssea com anemia, leucopenia e trombocitopenia (SHEPPARD; LAMPIRIS, 2005). Além disso, essa droga não deve ser utilizada isoladamente uma 30 vez que podem ocorrer casos de resistência da célula fúngica. A taxa de recidiva da meningite criptococócica com isolados resistentes a 5-FC é de 30 a 40% (MITCHELL; PERFECT, 1995). O fluconazol e o itraconazol são triazólicos que inibem a atividade da 14-αdemetilase lanosterol, uma enzima fundamental na síntese do ergosterol da célula fúngica (DUNKEL, 2008). Sem a incorporação do ergosterol, a fluidez e a estabilidade da membrana ficam comprometidas, assim como o crescimento e a divisão celular. Esses fármacos possuem efeito fungistático nas concentrações terapêuticas (SANGLARD, 2002). O surgimento de efeitos colaterais com fluconazol não é comum, podendo alguns pacientes apresentar distúrbios gastrointestinais relativamente insignificantes (SHEPPARD; LAMPIRIS, 2005). O fluconazol pode ser administrado por via oral ou intravenosa e sua biodisponibilidade é de aproximadamente 90% após ingestão oral (KOKS et al., 1996). No plasma, as concentrações máximas são obtidas 0,5 a 1,5 h após a administração oral, com meia vida de 30 h (SIDRIM; ROCHA, 2004). A ligação a proteínas plasmáticas é baixa possibilitando uma boa penetração no líquido cefalorraquidiano. É excretado principalmente por via renal (KOKS et al., 1996). É uma droga pouco tóxica e, entre todos os azóis é o que possui menos efeito sobre as enzimas microssomais hepáticas (SHEPPARD; LAMPIRIS, 2005). Porém, diversos casos de isolados resistentes ao fluconazol já foram relatados (ALLER et al., 2000; CASADEVALL; PERFECT, 1998; MITCHELL; PERFECT, 1995). Alterações nas bombas de efluxo estão associadas à seleção de isolados de C. neoformans resistentes ao fluconazol (POSTERARO et al., 2003). O itraconazol é administrado por via oral. Esse fármaco apresenta boa distribuição em tecidos queratinizados como a pele, entretanto, não alcança níveis terapêuticos em alguns fluidos orgânicos como líquor e humor aquoso (SIDRIM; ROCHA, 2004). Estudos clínicos que testaram um único agente antifúngico contra a criptococose obtiveram taxas de sucesso de 35 a 40%. Por outro lado, estudos que utilizaram combinações de droga tiveram como resultado taxas de sucesso na faixa de 55 a 65% em indivíduos com e sem AIDS (DIAMOND et al., 1998). Assim, as melhorias no tratamento da meningite criptococócica vieram principalmente com a utilização da combinação de antifúngicos. No entanto, a necessidade do uso frequente de agentes tóxicos, particularmente a associação de anfotericina B e 5-FC, 31 e o recente surgimento de isolados de C. neoformans resistentes ao fluconazol demonstram a necessidade de melhorias dos regimes terapêuticos e da utilização de terapias combinadas que sejam menos tóxicas a fim de prevenir o aparecimento de organismos resistentes (LARSEN et al., 2004). A terapia de escolha mais comumente indicada para as formas disseminadas da criptococose é a associação da anfotericina B com a 5-FC (MITCHELL; PERFECT, 1995). A combinação dessas drogas permite uma menor quantidade de anfotericina B a ser administrada com consequente diminuição na incidência de seus efeitos colaterais, sem haver prejuízo na resposta terapêutica. No entanto, devido à alta toxicidade para a medula óssea da 5-FC, o uso da droga exige monitoramento terapêutico e não se encontra disponível no Brasil e em outros países da América Latina (SIDRIM; ROCHA, 2004). A toxicidade da anfotericina B e da 5-FC levou à prática comum de usar anfotericina B com ou sem 5-FC durante um período curto de tratamento, seguido por terapia com azóis. O fluconazol e o itraconazol têm sido associados à anfotericina B em imunocomprometidos, sendo a combinação de anfotericina B e fluconazol mais utilizada devido à capacidade dessa combinação de melhor esterilização do líquor (LARSEN et al., 2004). A introdução da terapia anti-retroviral altamente eficaz (HAART) a partir de 1995-1996 diminuiu a incidência da criptococose em todo o mundo. No Brasil dados mostram que houve diminuição da ocorrência de meningite criptococócica em pacientes com AIDS após a introdução da HAART, com redução do percentual de 7,7% em 1995 para 3,1% em 2001 (PAPPALARDO; MELHEM, 2003), mas ainda assim existe uma clara e urgente necessidade de desenvolver antifúngicos mais seguros e específicos contra a criptococose. Estudos in vitro demonstram que isolados de Cryptococcus spp. são sensíveis aos triazóis de última geração, voriconazol (PERFECT et al., 2003) e posaconazol (PITISUTTITHUM et al., 2005). Esses fármacos apresentam maior potência e espectro de ação mais amplo que os antigos azóis, porém, seu custo é mais elevado. As equinocandinas não apresentam boa atividade antifúngica contra Cryptococcus spp. (BERGOLD; GEORGIADIS, 2004). Como a maioria dos pacientes com meningite criptococócica está imunocomprometida, Larsen et al. (2005a), propuseram que uma alternativa lógica para a melhoria dos resultados do tratamento nesses indivíduos seria melhorar a 32 resposta imune do hospedeiro. O método estudado pelos pesquisadores é a administração de anticorpos que se ligam ao polissacarídeo capsular do fungo. Segundo os autores, a administração de anticorpos contra o polissacarídeo capsular do C. neoformans em camundongos infectados prolonga sua sobrevivência, reduz a carga fúngica no tecido e reforça a formação do granuloma. Além disso, anticorpos contra o polissacarídeo capsular aumenta a morte fúngica em camundongos tratados com anfotericina B, fluconazol e 5-FC. Blasi et al. (1994) observaram que o tratamento de camundongos com células de leveduras de C. neoformans inativados pelo calor, alguns dias antes da infecção com organismos viáveis, aumenta o tempo de sobrevivência dos animais e diminui o crescimento fúngico comparado a camundongos sem nenhum tratamento prévio. Assim, o desenvolvimento de uma vacina contra C. neoformans pode ser promissor. 2.9 TESTES DE SUSCEPTIBILIDADE AOS ANTIFÚNGICOS O interesse e dedicação da comunidade científica pela padronização de testes de susceptibilidade de fungos a drogas antifúngicas é relativamente recente. O aumento na incidência de micoses sistêmicas e a mudança no espectro dos microrganismos causadores dessas micoses aliado aos casos de resistência dos fungos às drogas disponíveis, justificam o interesse no desenvolvimento de testes de susceptibilidade in vitro para os antifúngicos (COLOMBO; ALVES, 2004). O objetivo dos testes de susceptibilidade in vitro é prever a resposta do paciente ao tratamento. Um teste in vitro que prediz com confiança a resposta clínica do paciente permite ao clínico selecionar os medicamentos com melhor atividade, estender tratamentos intensivos, indicar a utilização de combinação de drogas ou substituir uma droga por outra (LARSEN et al., 2005b). A fim de obter um método padrão, o Clinical and Laboratory Standards Institute (CLSI), designou um subcomitê para padronizar os testes de susceptibilidade de fungos a drogas antifúngicas. As variáveis mais importantes na definição do resultado final do teste e que foram objeto de padronização, incluíram a definição de método e preparo do inóculo, composição e pH do meio a ser utilizado, temperatura e tempo de incubação e determinação dos critérios de leitura do teste 33 (COLOMBO; ALVES, 2004). O protocolo aprovado M27 A2 é um método de referência desenvolvido para facilitar a concordância entre laboratórios na determinação da susceptibilidade de leveduras do gênero Candida e de C. neoformans a agentes antifúngicos. O protocolo descreve os parâmetros para a determinação da CIM dos antifúngicos para fungos leveduriformes por meio de técnicas de diluição em meio líquido (CLSI, 2002). A CIM indica a atividade de uma determinada droga antifúngica em condições laboratoriais e pode auxiliar na escolha do tratamento mais adequado levando em consideração fatores como farmacocinética, farmacodinâmica e mecanismos de resistência (RODRIGUEZTUDELA et al., 2008). Apesar dos avanços na padronização dos testes de susceptibilidade e embora a resistência in vitro do Cryptococcus spp. tenha sido associado à falha clínica durante o curso da doença em alguns casos, ainda é limitado o número de estudos que avaliam a potencial relação entre os resultados dos testes de susceptibilidade in vitro obtido no momento do diagnóstico e o resultado do tratamento da criptococose (DANNAOUI et al., 2006). Estudos mostraram resistência in vitro quando a 5-FC foi usada isoladamente em testes de susceptibilidade para meningite criptococócica. Tal fato foi confirmado por recaídas e falhas durante o tratamento clínico para infecções criptococócicas usando a 5-FC isoladamente (MITCHELL; PERFECT, 1995). Sabe-se também que a anfotericina B é uniformemente ativa contra isolados iniciais de Cryptococcus spp., e que as CIMs são geralmente baixas e apresentam pouca variação (MITCHELL; PERFECT, 1995). A resistência a anfotericina B não é comum (SILVA et al., 2008). A terapia com fluconazol tem se mostrado mais eficaz e com melhor resposta clínica, quando os testes de susceptibilidade in vitro com isolados de C. neoformans apresentam CIM menor que 16 µg/mL (PFALLER et al., 2004). É importante ressaltar que a CIM de antimicrobianos não define isoladamente o resultado da terapia anti-infecciosa com a droga testada. A capacidade de resposta imunológica do hospedeiro, formação de coleções purulentas em vísceras ou cavidades, presença de próteses ou cateteres e diagnóstico tardio da doença são fatores que podem causar falha no tratamento, independente da eficácia microbiológica da droga utilizada. Assim, existe uma correlação parcial entre falha ou sucesso terapêutico com o perfil de susceptibilidade in vitro à droga utilizada. 34 Entretanto espera-se que, se resistente, tenha-se maior chance de falha do tratamento e, se susceptível, maior chance de eficácia (COLOMBO; ALVES, 2004). Quando existe uma boa correlação clínico-laboratorial é possível prever a resistência clínica pela determinação laboratorial da resistência micológica, de forma que são estabelecidos pontos de corte que são utilizados para indicar ou modificar os tratamentos com antimicrobianos (LARSEN et al., 2005b). Pontos de corte são valores específicos da CIM que permitem classificar os fungos nas categorias susceptíveis, intermediários e resistentes (RODRIGUEZ-TUDELA et al., 2008). O fluconazol foi o primeiro antifúngico a ter pontos de corte estabelecidos para leveduras do gênero Candida. Resultados entre a correlação da farmacocinética do antifúngico e dados clínicos do tratamento de pacientes com candidose orofaríngea por Candida albicans, permitiram o estabelecimento de pontos de corte para a interpretação dos resultados da CIM obtidos pelo método de referência. Dessa forma, linhagens de Candida spp. que apresentam CIM ≤ 8 µg/mL são consideradas susceptíveis. Isolados de Candida spp. com CIM entre 16 e 32 µg/mL são classificados como susceptibilidade dependente da dose ou intermediários e, isolados com CIM ≥ 64 µg/mL são considerados resistentes (REX et al., 1997). Para Cryptococcus spp. não existem pontos de corte definidos (DANNAOUI et al., 2006; LARSEN et al., 2005b). Muitos estudos são ainda necessários para correlacionar os valores das CIMs para as drogas contra Cryptococcus spp. com a evolução clínica dos pacientes, para então se estabelecer pontos de corte significativos para a escolha ou modificação do tratamento da criptococose (LARSEN et al., 2005b). Além disso, apenas testes com C. neoformans tem sido incluído no documento do CLSI e dados sobre C. gattii são escassos (KHAN et al., 2009). Suspeita-se que C. gattii seja menos susceptível aos antifúngicos que C. neoformans (KHAN et al., 2009; SILVA et al., 2008; TRILLES et al., 2004). Mais investigações relacionadas aos testes de susceptibilidade in vitro de Cryptococcus spp. são necessárias e urgente devido ao crescente número de indivíduos com criptococose (LARSEN et al., 2005b). 35 2.10 RESPOSTA IMUNE NA CRIPTOCOCOSE As citocinas constituem o principal fator envolvido na comunicação entre células T, macrófagos e outras células do sistema imune durante o curso da resposta imune a antígenos e agentes infecciosos. Diversos estudos com clones de células T helper (Th) de camundongos e de humanos mostraram a existência de duas subpopulações diferentes de células T que foram divididas em células T helper do tipo 1 (Th1) e T helper do tipo 2 (Th2), conforme a função e padrões diferenciais de produção de citocinas (BELARDELLI, 1995). A resposta imune Th1 é geralmente associada com a produção de IgG2 e o desenvolvimento da imunidade celular. A resposta Th2 está associada à produção de IgE, eosinófilos e mastócitos. Derivadas de células Th1, as citocinas interferon gama (IFN-γ), interleucina 2 (IL-2) e fator de necrose tumoral alfa (TNF-α) favorecem a ativação de macrófagos, enquanto que citocinas Th2 como interleucina 4 (IL-4) e interleucina 10 (IL-10) exibem atividade supressora sobre a função dessas células. Um fator chave na diferenciação da resposta imune para o tipo Th1 é a produção de interleucina 12 (IL-12), uma citocina produzida principalmente por macrófagos. As citocinas produzidas por células Th1 e Th2 podem regular-se mutuamente, sendo exemplo disto o IFN-γ produzido por células Th1, que pode aumentar a produção de IL-12 e inibir a proliferação de células Th2 bem como a produção de lL-10, enquanto que as citocinas Th2 são capazes de inibir a síntese de citocinas produzidas por células Th1 (BELARDELLI, 1995). Como C. neoformans é ubíquo na natureza pode-se considerar que a incidência da criptococose é ainda relativamente baixa. Tal fato implica que muitas pessoas provavelmente são expostas ao fungo, mas não desenvolvem os sintomas. Essa observação sugere que no hospedeiro hígido um ou mais componentes do sistema imune pulmonar tem função protetora contra a infecção (WOZNIAK; VYAS; LEVITZ, 2006). A integridade da defesa hospedeira é fundamental na criptococose, assim, a elevada susceptibilidade à infecção de indivíduos com AIDS evidencia a importância da imunidade mediada por células (IMC). Nesses pacientes ocorre uma redução progressiva da imunidade celular devido à diminuição ou alteração do funcionamento de linfócitos T levando à disfunção do sistema linfocítico-fagocitário e 36 favorecendo o aparecimento de infecções fúngicas oportunistas (MITCHELL; PERFECT, 1995). Durante o inicio do processo de infecção por C. neoformans, as células T produzem citocinas ativadoras de macrófagos com formação de granuloma e destruição do fungo intracelular (FELDMESSER; KRESS; CASADEVALL, 2001). Nos indivíduos com a imunidade celular debilitada, o fungo multiplica intracelularmente podendo lisar o macrófago e então infectar outros fagócitos, aumentando o crescimento fúngico. C. neoformans também é capaz de crescer extracelularmente escapando da fagocitose por meio da produção de fatores específicos que bloqueiam a sua adesão e internalização pela célula fagocítica, incapacitando o reconhecimento e o desenvolvimento da resposta imune do hospedeiro (DEL POETA, 2004). A criptococose é iniciada no pulmão após a inalação de células leveduriformes. As células fúngicas que não são expelidas pelo epitélio respiratório, podem penetrar nos alvéolos (MITCHELL; PERFECT, 1995). No espaço alveolar, os microrganismos são inicialmente confrontados pelos macrófagos alveolares (AMФ) (CHEN et al., 2008; MITCHELL; PERFECT, 1995). Se a infecção ativa vai prosseguir depende da competência das células de defesa do hospedeiro bem como do número e da virulência da célula fúngica (MITCHELL; PERFECT, 1995). Os AMФ com o fungo interiorizado possuem atividade apresentadora de antígeno e produzem citocinas pró-inflamatórias que podem controlar a infecção (WOZNIAK; VYAS; LEVITZ, 2006). As células dendríticas (DCs) são um grupo heterogêneo de células apresentadoras de antígenos (APCs), importantes na ativação do sistema imune inato e adquirido. Elas apresentam os antígenos estranhos às células T no tecido linfóide, iniciando uma resposta imune adaptativa contra estes. Estudos mostraram que as DCs pulmonares são capazes de fagocitar C. neoformans in vivo e iniciar uma resposta imune adaptativa anticriptococócica. Neutrófilos também são capazes de fagocitar o fungo (WOZNIAK; VYAS; LEVITZ, 2006). A indução da produção de citocinas pró-inflamatórias que recrutam e ativam leucócitos para inibir e matar as células fúngicas é fundamental para uma resposta imune mediada por células que protege o hospedeiro de infecções causadas por fungos. Vários estudos demonstraram que a IL-12 é uma citocina importante na defesa do hospedeiro contra C. neoformans por induzir a produção de IFN-γ. O IFN- 37 γ estimula a atividade anticriptococócica de macrófagos (RETINI et al., 2001). De fato, há evidências que respostas polarizadas Th1 são mais protetoras que respostas polarizadas Th2, no entanto, o equilíbrio entre ambos os tipos de resposta é importante para evitar danos ao hospedeiro (ZARAGOZA, et al., 2007). A formação do granuloma foi descrito como a reação tecidual clássica da criptococose nos casos em que a inflamação se desenvolve. Células gigantes com múltiplas leveduras intracelulares foram descritas em vários casos indicando que o fungo pode persistir em ambos espaços intracelular e extracelular (CASADEVALL; PERFECT, 1998). A cápsula e talvez outros componentes da levedura são capazes de modular e subverter a resposta imune do hospedeiro (MANSOUR et al., 2004). O GXM da cápsula fúngica afeta diversos parâmetros da resposta imune capazes de promover a persistência do fungo no interior do hospedeiro. Os principais aspectos afetados são as funções dos macrófagos (inibição da fagocitose e da apresentação de antígenos), de células T (modulação da secreção de citocinas) e interferência com a migração leucocitária (LARSEN et al., 2005a). A cápsula do C. neoformans também inibe a fagocitose do fungo por DCs e neutrófilos e inibe a internalização do fungo por células endoteliais (DEL POETA, 2004). C. neoformans encapsulado promove a secreção de IL-10 por monócitos humanos, e em contraste, este parece suprimir a secreção de IL-12. Este fenômeno pode estar associado com a habilidade de C. neoformans encapsulado suprimir a resposta Th1, por meio da supressão de IL-12, inibindo consequentemente a produção de IFN-γ (RETINI et al., 2001). A atividade anti-Cryptococcus exercida pelas células do sistema imune também parece ser dependente de outros mediadores solúveis além das citocinas. A produção de óxido-nítrico (NO) por leucócitos humanos possui um papel importante na defesa contra diversas infecções, por apresentar ação microbicida (RIVERA et al., 2002). O NO é um radical livre ubíquo, gasoso, produzido por ação de uma família de enzimas denominadas de óxido nítrico sintases (NOS) a partir do aminoácido L-arginina que produz NO e L-citrulina. O NO é produzido por uma ampla variedade de tipos celulares que incluem células epiteliais, nervosas, endoteliais e inflamatórias. Existem três isoformas de NOS. Duas delas são denominadas constitutivas, sendo uma forma encontrada nas células neuronais e outra nas células endoteliais. A terceira isoforma é a NOS induzível (iNOS), que 38 pode ser encontrada em quase todos os tipos celulares após estimulação (FILHO; ZILBERSTEIN, 2000). Citocinas pró-inflamatórias como TNFα, IL-1β ou IFN-γ e produtos microbianos como o LPS, estimulam as iNOS a produz NO (CERQUEIRA; YOSHIDA, 2002). 2.11 ANÁLISE HISTOPATOLÓGICA NA CRIPTOCOCOSE O exame histológico de camundongos e humanos com criptococose revela que quando a função das células T está intacta, granulomas e células gigantes multinucleadas podem ser observadas nos órgãos afetados, com reduzido crescimento fúngico comparado a animais e humanos com função das células T prejudicada (LIPOVSKY et al., 1998). A análise histopatológica da resposta granulomatosa pulmonar à criptococose em indivíduos imunocompetentes, feita por Shibuya et al. (2005), apresentou presença de um granuloma típico formado por um agregado compacto de macrófagos e células gigantes multinucleadas contendo numerosas leveduras intracitoplasmáticas, mas com infecção limitada e benigna. Em pacientes imunocomprometidos foi observado proliferação da levedura nos alvéolos, resposta histiocítica, presença de células gigantes multinucleadas e extenso envolvimento capilar. Resposta inflamatória purulenta não foi observada nas lesões criptococócicas dos últimos pacientes provavelmente devido aos polissacarídeos criptococócicos, especialmente o GXM, causar espalhamento de L-selectina na superfície de neutrófilos, o que pode impedir os neutrófilos de se ligar à superfície da célula endotelial. De acordo com Patro et al. (2009), o desenvolvimento de lesões granulomatosas depende da resposta imune do hospedeiro e é incomum em pacientes imunocomprometidos. Hoang et al. (2004) realizaram avaliações histológicas do tecido cerebral de pacientes imunocompetentes e imunocomprometidos com criptococose e constataram inflamação mínima com predomínio de linfócitos e praticamente nenhum polimorfonucleares. A inflamação mínima observada provavelmente reflete a habilidade do microrganismo de evadir do sistema imune do hospedeiro. Os estudos neuropatológicos não revelaram diferenças discerníveis entre os pacientes 39 imunocompetentes e imunocomprometidos. A análise histopatológica do cérebro de camundongos com infecção criptococócica realizada por Blasi et al. (1994) também mostrou poucas células inflamatórias. Alguns estudos histopatológicos tanto do cérebro humano como de camundongos infectados por Crytococcus spp. demonstraram que células microgliais são capazes de internalizar Cryptococcus spp. (LEE et al., 1995a; LEE et al., 1995b; ZHOU et al., 2007). As células microgliais são macrófagos residenciais encontrados no cérebro que podem permitir a sobrevivência e replicação intracelular de Crytococcus neoformans ou exercer atividade anticriptococócica (ORSI et al., 2009). Tais células precisam ser ativadas para aumentar sua capacidade fagocítica e provavelmente o IFN-γ participa dessa ativação (ZHOU et al., 2007). 40 3 OBJETIVOS 3.1 OBJETIVO GERAL Avaliar a correlação entre a susceptibilidade in vitro e a atividade in vivo do fluconazol em modelo murino de infecção cerebral causada por C. gattii. 3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS Desenvolver um método microbiológico para quantificar os níveis de fluconazol no cérebro de camundongos. Desenvolver um modelo de infecção cerebral causada por C. gattii. Determinar a susceptibilidade in vitro de isolados sequenciais de C. gattii ao fluconazol e correlacionar os valores de CIM com o número de UFC em modelo animal. Avaliar comparativamente a produção de citocinas entre grupos de animais tratados e não-tratados com o fluconazol. Comparar, por meio de análise histopatológica, as possíveis alterações quantitativas nas células microgliais, causadas pela criptococose em camundongos tratados e não-tratados. 41 4 JUSTIFICATIVA De acordo com os dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) reportados por Lin e Heitman (2006), aproximadamente três milhões de pacientes infectados pelo HIV morrem por ano no mundo, devido a complicações associadas a criptococose. O número de indivíduos acometidos por C. gattii também aumentou em diversas partes do mundo, no entanto, a maioria dos estudos tem focado apenas na espécie C. neoformans e existe uma escassez de dados sobre C. gattii. Além disso, o tratamento da condição ainda hoje é considerado difícil devido aos diversos efeitos tóxicos e a emergência de isolados fúngicos resistentes às drogas comumente utilizadas. O fluconazol é uma droga com bom perfil terapêutico uma vez que é pouco tóxico e apresenta boa penetração no SNC. O aparecimento de resistência de determinadas leveduras à terapia usual, em especial o fluconazol, tem estimulado o desenvolvimento de testes de susceptibilidade in vitro para escolha e acompanhamento da quimioterapia antifúngica mais adequada a cada caso. Apesar das investigações atuais visando determinar a CIM de antifúngicos por meio de testes de susceptibilidade, pontos de corte não foram estabelecidos para isolados de Cryptococcus spp. frente a antifúngicos. Apesar do grande número de estudos envolvendo modelos animais de criptococose, não foi encontrado na literatura nenhum trabalho que correlacionasse a resposta do animal à terapia com resultados de testes de susceptibilidade. Acredita-se também que tal correlação deva levar em consideração a concentração do antifúngico no alvo de infecção e, para isso torna-se necessário a determinação da concentração do antifúngico no órgão acometido. Assim, poder-se-ia aventar sobre uma provável concentração da droga que promoveria o efeito terapêutico em um órgão específico. No entanto, as técnicas utilizadas para a quantificação de antifúngicos em fluidos e tecidos biológicos são baseadas na utilização de aparelhos de alto custo, não acessíveis à maioria dos laboratórios clínicos. A identificação do perfil de citocinas produzidas após a infecção com Cryptococcus spp., bem como a análise histológica do tecido acometido podem ampliar os conhecimentos sobre os mecanismos da resposta imunológica hospedeira, possibilitando o estabelecimento de estratégias futuras para o tratamento da infecção. 42 Diante do exposto, a proposta desse trabalho foi correlacionar a susceptibilidade in vitro e a atividade in vivo do fluconazol em modelo murino de infecção cerebral causada pelo C. gattii. O teste de microdiluição em meio líquido foi realizado utilizando o método proposto pelo CLSI, segundo protocolo M27 A2, para determinar a CIM de isolados de C. gattii frente ao fluconazol. Os valores da CIM foram correlacionados com o número de UFC/g de cérebro de camundongos infectados com isolados ATCC 32608 de C. gattii. Também foi desenvolvido um método microbiológico para quantificar a concentração do fluconazol no cérebro dos animais em diferentes períodos de tratamento. Visando ampliar os conhecimentos sobre os mecanismos da resposta imunológica hospedeira, foi avaliada a produção de citocinas em resposta à infecção criptococócica. Além disso, análises histológicas do cérebro infectado foram realizadas a fim de observar possíveis alterações quantitativas nas células microgliais. Espera-se que os resultados obtidos possam contribuir para melhor conhecimento sobre o valor prognóstico dos testes de susceptibilidade ao fluconazol para o tratamento da criptococose. 43 5 METODOLOGIA 5.1 DETERMINAÇÃO DA BIODISTRIBUIÇÃO CENTRAL DE FLUCONAZOL POR MÉTODO MICROBIOLÓGICO 5.1.1 Construção da curva analítica 5.1.1.1 Droga antifúngica Para construção da curva analítica, 10 mg de fluconazol obtido na forma de padrão da Cipla Limite, foi diluído em dimetilsulfóxido (DMSO) na concentração final de 1000 µg/mL. A partir desta solução foram realizadas diluições seriadas de razão 2 em tubos de ensaio contendo 9 mL de meio RPMI-1640 tamponado com MOPS [ácido 3-(N-morfolino) propanosulfônico], propiciando a obtenção de concentrações de 15 a 0,007 µg/mL. 5.1.1.2 Isolado Como reagente biológico foi utilizado o isolado Candida parapsilosis ATCC 22019, obtido da coleção de culturas da Universidade da Geórgia, Athens, EUA, recomendado pelo CLSI (documento M27 A2, 2002) para bioensaio e testes de susceptibilidade aos antifúngicos. O isolado foi mantido em Ágar Sabouraud Dextrose (ASD) a 4 ºC e repicado no mesmo meio 24 h antes da realização do teste. A partir das colônias obtidas foi feita uma suspensão da levedura em água destilada esterilizada. A suspensão foi ajustada para se obter a transmitância de 85% medida em espectrofotômetro (Femto, modelo 700S, 530 nm, São Paulo – SP), que corresponde a 1,0 X 106 – 5,0 X 106 UFC/mL (FIGUEIREDO et al., 2007). 44 Posteriormente, a suspensão foi diluída 10 vezes em água destilada esterilizada, resultando na concentração final de 1,0 X 105 – 5,0 X 105 UFC/mL. Na série de tubos contendo as diferentes concentrações da droga, foi adicionado 1,0 X 105 – 5,0 X 105 UFC da suspensão de C. parapsilosis ATCC 22019 em volume de 1 mL. Os tubos foram incubados a 28 ºC durante 48 h e a leitura foi efetuada pela medição da transmitância determinada em espectrofotômetro (530 nm). Como controle negativo (branco) foram testados tubos contendo apenas o meio RPMI-1640, e como controle de crescimento, tubos contendo o meio RPMI1640 e o inóculo. Os dados foram plotados para a construção de uma curva analítica. Esta curva foi utilizada para padronizar e relacionar as diferentes concentrações de fluconazol com o crescimento do inóculo por meio da transmitância e para determinar a concentração da droga no cérebro dos animais em diferentes períodos. 5.1.2 Determinação da concentração de fluconazol no cérebro de animais 5.1.2.1 Droga antifúngica Em todos os experimentos a solução de fluconazol foi preparada em água destilada esterilizada na concentração de 2 mg/mL. A solução foi preparada a cada três dias e estocada a 4 ºC. 5.1.2.2 Isolado A suspensão contendo o inóculo de C. parapsilosis ATCC 22019 foi preparada como supramencionado (item 5.1.1.2). 45 5.1.2.3 Animais e infusão de fluconazol Em todos os experimentos foram utilizados camundongos Swiss, machos, com idade entre seis a oito semanas e pesando de 23 a 33 g. Os camundongos foram mantidos em gaiolas e foi fornecido ração e uma garrafa de água por gaiola. A utilização de camundongos foi aprovada pelo Comitê de Ética da Univale – parecer CEP/UNIVALE 10/2007 de 12 de março de 2007 (ANEXO A). Os animais foram divididos em sete grupos, cada um contendo, pelo menos, seis animais. Camundongos não submetidos à infusão de fluconazol foram utilizados como controle. Com exceção dos camundongos do grupo controle, os outros animais receberam uma dose diária de fluconazol por via intraperitoneal. A concentração da droga administrada foi de 40 mg/Kg/dia em volume máximo de 1 mL (LARSEN et al., 1996). Cada grupo recebeu a infusão até o dia do sacrifício, sendo o tempo máximo de infusão de 14 dias. Todos os animais foram pesados após o sacrifício. Os animais foram anestesiados por via intraperitoneal com ketamina / xilazina (80mg/kg/ 10 mg/kg) em volume de 300 µL e sacrificados por deslocamento cervical, sendo o primeiro grupo de camundongos sacrificado 24 h após ter recebido a primeira infusão de fluconazol. O sacrifício dos outros grupos aconteceu aos 2, 4, 8, 10, 12 ou 14 dias de infusão após terem recebido a primeira dose de fluconazol. Posteriormente, os cérebros foram retirados, pesados em uma balança analítica e diluídos em tubos de ensaio contendo 9 mL de meio RPMI-1640 tamponado com MOPS. Cada tubo foi inoculado com 1,0 X 105 – 5,0 X 105 UFC/mL do inóculo de C. parapsilosis ATCC 22019, em volume de 1 mL. Os camundongos do grupo controle não receberam o tratamento com fluconazol, mas o cérebro dos animais foi retirado e inoculado com C. parapsilosis ATCC 22019. Outro grupo foi constituído por camundongos que não receberam infusão de fluconazol nem o inóculo de C. parapsilosis ATCC 22019 (branco). Os tubos foram incubados a 28 ºC durante 48 h e a transmitância foi determinada em espectrofotômetro (530 nm). Os valores de transmitância foram utilizados para a determinação da concentração da droga no cérebro pela utilização da equação gerada pela curva analítica. 46 O teste Análise de Variância (ANOVA) foi usado para verificar se o aumento na concentração de fluconazol no cérebro dos camundongos ao longo dos dias foi estatisticamente significativo, considerando p<0,01, como significativo. 5.2 INFECÇÃO EXPERIMENTAL INTRACEREBRAL POR Cryptococcus gattii 5.2.1 Isolado O isolado Cryptococcus gattii ATCC 32608, obtido da coleção de culturas da Universidade da Geórgia, Athens, EUA, foi mantido em ASD a 4 ºC e repicado nesse meio 48 h antes da realização de cada teste. 5.2.2 Teste piloto Testes-piloto foram realizados com diferentes concentrações do inóculo de C. gattii ATCC 32608 com objetivo de verificar aquela que melhor se estabelecesse no modelo animal. O primeiro inóculo testado foi uma suspensão fúngica com 85% de transmitância medida em espectrofotômetro (530 nm) que corresponde a 1,0 X 106 – 5,0 X 106 UFC/mL (FIGUEIREDO et al., 2007). Antes da infecção, a suspensão foi diluída 10 vezes de forma que o animal foi inoculado com 1,0 X 105 – 5,0 X 105 UFC/mL. Foi observado que esse inóculo não foi suficiente para promover a recuperação de colônias após 14 dias de infecção. O inóculo escolhido para o experimento foi de 1,2 X 106 UFC que correspondeu a 70% de transmitância determinada em espectrofotômetro (530 nm). O número de UFC foi confirmado pelo método de diluição até 1:10000, usando placas com ASD. Após 48 h de incubação a 28º C, as colônias foram contadas. 47 5.2.3 Métodos de anestesia e inoculação Grupos de seis camundongos foram utilizados e todos os animais foram pesados no início e no final do experimento. Os animais foram anestesiados por via intraperitoneal com ketamina / xilazina (80mg/kg/ 10 mg/kg) e infectados por via intracerebral com 1,2 X 106 UFC do inóculo de C. gattii ATCC 32608 em volume de 50 µL. A infecção foi feita com seringa acoplada a uma agulha número 25 X 7, inserida na região frontal, acima dos olhos dos camundongos. Após 24 h, os animais foram divididos em dois grandes grupos cada um contendo dezoito camundongos, sendo um grupo tratado com 40 mg/Kg/dia de fluconazol por até 14 dias, e outro grupo não-tratado. Os animais do grupo tratado receberam uma dose diária de fluconazol por via intraperitoneal até o dia do sacrifício. O sacrifício dos animais ocorreu aos 7, 10 e 14 dias após a infecção. Seis animais tratados e seis não-tratados foram sacrificados em cada dia. O cérebro de cada animal foi retirado, pesado e homogeneizado em tubos de ensaio contendo 9 mL de água peptonada, sendo diluídos seriadamente até 1:1000. Cada diluição foi plaqueada em duplicata no volume de 100 µL em placas de ASD a 4 ºC e incubadas a 28 ºC durante 48 h. A leitura foi feita por meio da contagem de colônias e os resultados foram expressos em UFC/g de órgão. Para confirmar a identidade dos isolados nas placas de ASD, amostras das colônias foram submetidas a exame direto com tinta nanquim. A pesquisa dos fungos foi feita por meio de microscópio óptico em objetiva de 40 X. A análise estatística foi feita por meio do teste ANOVA. 5.3 TESTE DE SUSCEPTIBILIDADE AO FLUCONAZOL UTILIZANDO MÉTODO DA MICRODILUIÇÃO EM MEIO LÍQUIDO Para o teste de susceptibilidade ao fluconazol foram utilizadas colônias isoladas em 7, 10 e 14 dias dos grupos tratado e não-tratado. As colônias foram colocadas em tubos de ensaio contendo 5 mL de solução salina esterilizada e a 48 transmitância da suspensão foi ajustada para 85% que corresponde a 1,0 X 106 – 5,0 X 106 UFC/mL (FIGUEIREDO et al., 2007). Desta forma, no último dia de leitura, foram obtidos seis inóculos diferentes em solução salina. Posteriormente, foi feita uma diluição de cada suspensão do inóculo em meio RPMI-1640 resultando em uma concentração de 1,0 X 103 a 5,0 X 103 UFC/Ml (CLSI, 2002). Em seguida, cada suspensão do inóculo foi dispensada em volume de 100 µL em placas de microdiluição de 96 poços, fundo chato, esterilizadas e com tampa. A CIM de colônias de C. gattii ATCC 32608 antes da infecção nos animais também foi determinada. Para realização do teste, o fluconazol foi diluído em DMSO na concentração de 1000 µg/mL. A partir desta solução foram realizadas diluições seriadas em meio RPMI-1640 tamponado com MOPS [acido 3-(N-morfolino) propanosulfônico] (pH ajustado para 7,0 com NaOH), obtendo-se as seguintes concentrações de fluconazol: 128, 64, 32, 16, 8, 4, 2, 1, 0,5 e 0,25 µg/mL. As referidas diluições foram dispensadas em volume de 100 µL nas placas de microdiluição contendo o inóculo. Em cada placa foi realizado o controle de esterilidade do meio e o controle de crescimento do isolado. As placas foram incubadas a 28 ºC durante 72 h. A determinação das CIM foi realizada visualmente como 80% de redução do crescimento fúngico em comparação ao controle de crescimento conforme CLSI, documento M27 A2 (CLSI, 2002). Os dados obtidos da análise da concentração de fluconazol no cérebro foram correlacionados com os resultados dos testes de susceptibilidade e com o número de UFC/g de cérebro. O quociente da concentração de fluconazol no cérebro pela CIM (CD/CIM) foi usado para a interpretação dos resultados encontrados no número de UFC/g de cérebro. Todos os experimentos foram repetidos duas vezes e resultados similares foram obtidos. 49 5.4 QUANTIFICAÇÃO DE CITOCINAS 5.4.1 Animais O nível das citocinas IFN-γ, IL-12, IL-10 e IL-4 foi determinado utilizando sobrenadante de cultura de células de baço dos camundongos dos grupos tratado e não-tratado (seis animais de cada grupo) sacrificados após 10 dias de infecção. Camundongos não infectados foram utilizados como controle negativo. 5.4.2 Preparação de suspensões de células do baço O baço de cada animal foi retirado e colocado em tubos de ensaio estéreis contendo meio RPMI-1640 incompleto (ausência de antibióticos e aminoácidos não essenciais). O órgão foi macerado com auxílio do êmbolo de uma seringa de 5 mL e a suspensão foi transferida para tubos falcon estéreis. Com uma pipeta Pasteur a suspensão celular foi retirada até a obtenção de debris no fundo de cada tubo. O sedimento celular foi centrifugado a 1200 rpm durante 5 minutos a 4 oC. Água bidestilada estéril foi usada para lisar as hemácias e posteriormente, foi adicionado 1 mL de tampão salina fosfato (PBS). A suspensão foi novamente centrifugada, o sobrenadante foi descartado e o pellet foi ressuspendido em 1 mL de meio RPMI1640 completo. O número de células foi ajustado para 5 x 106/mL. As suspensões celulares foram distribuídas em placas de ELISA e estimuladas com Concanavalina A (ConA). As placas foram incubadas a 28 ºC durante 72 h em estufa de CO2. 50 5.4.3 Quantificação de citocinas por Ensaio Imunoenzimático (ELISA) As concentrações das citocinas IFN-γ, IL-12, IL-10 e IL-4 foram avaliadas no sobrenadante de cultura de células de baço de camundongos dos grupos controle, tratado e não-tratado por ELISA utilizando kits Pharmigen. As placas de ELISA foram sensibilizadas com 100 µL/poço com o anticorpo purificado da citocina a ser quantificada. Em seguida as placas foram estocadas a 4 ºC overnight em câmara escura e posteriormente lavadas três vezes com SalinaTween (NaCl 0,9% contendo 0,05% de Tween20). Para o bloqueio foram utilizados 200 µL/poço de PBS-BSA (Albumina Bovina). As placas foram mantidas durante uma hora a 37 ºC, posteriormente foram novamente lavadas três vezes com Salina-Tween. Os respectivos anticorpos biotinilados foram diluídos em PBS-BSA e 100 µL da solução foram colocados nos poços da placa. As placas foram mantidas durante uma hora a temperatura ambiente e lavadas seis vezes com Salina-Tween. Foi adicionada a placa 100 µL da solução de Estreptavidina/Peroxidase na concentração de 3 µL para 15 mL de PBS-caseína. As placas foram mantidas por 60 minutos a temperatura ambiente e novamente foram lavadas seis vezes com Salina-Tween. Foram adicionados 100 µL/poço de peróxido de hidrogênio (H2O2) e ortofenilenodiamina (OPD) diluídos em tampão citrato. As placas foram mantidas no escuro à temperatura ambiente por 30 minutos e posteriormente foi adicionado 20 µL/poço de ácido sulfúrico para paralisar a reação. A leitura foi feita em leitor de ELISA Bio-Rad Modelo 450 (492 nm). Para verificar se os diferentes níveis de cada uma das citocinas dosadas em cada um dos grupos (tratado, não-tratado e controle), foram diferentes estatisticamente, foram feitas análises estatísticas por meio dos teste ANOVA e Tukey, sendo p<0,05. 51 5.5 ANÁLISE HISTOPATOLÓGICA Análises histopatológicas do cérebro dos camundongos infectados via intracerebral com isolados de C. gattii ATCC 32608 e pertencentes aos grupos tratado e não-tratado, sacrificados com 7, 10 e 14 dias de infecção foram realizadas. O cérebro de camundongos não infectados foi utilizado como controle. Os cérebros dos animais foram fixados em formalina a 10%, desidratados e embebidos em parafina. Cortes histológicos de quatro micra foram corados com HE. Os cortes foram observados em microscópio óptico. 52 6 RESULTADOS 6.1 DETERMINAÇÃO DA BIODISTRIBUIÇÃO CENTRAL DE FLUCONAZOL POR MÉTODO MICROBIOLÓGICO Os resultados obtidos durante a determinação da transmitância dos tubos contendo as diferentes concentrações da droga (15 a 0,007 µg/mL) e o teor fixo do inóculo (1,0 X 105 – 5,0 X 105 UFC/mL) de C. parapsilosis ATCC 22019 foram usados para a construção da curva analítica. A curva analítica foi construída plotando-se a concentração de fluconazol versus a porcentagem de transmitância e apresentou a equação y = 5,2029x + 4,6394 (R2 = 0,9926 e R = 0,9963). A curva apresentou inclinação de 5,203 ± 0,2004 e intercepto no eixo y de 4,639 ± 1,190. Esses dados demonstram linearidade adequada da curva (p<0,05). A tabela 1 apresenta as concentrações de fluconazol recuperadas do cérebro dos animais em cada dia. A detecção máxima da droga presente no cérebro foi de 44,60 µg/mL nos animais que receberam infusões de fluconazol durante 14 dias. A média da concentração de fluconazol recuperada do cérebro dos camundongos foi de 27,29 µg/mL. Por meio do teste ANOVA foi verificado que o aumento na concentração de fluconazol presente no cérebro dos camundongos foi estatisticamente significativo (p<0,01) nos animais sacrificados com até 8 dias de administração do antifúngico. Após esse período, o aumento nos níveis da droga não foi diferente estatisticamente. 53 Tabela 1 - Concentrações de fluconazol (µg/g de cérebro ± desvio padrão) determinada pelo ensaio microbiológico usando o cérebro de camundongos Swiss após a administração diária de fluconazol (40 mg/kg), durante 1, 2, 4, 8, 10, 12 ou 14 dias Tempo de sacrifício (dias) Fluconazol (µg/g de cérebro) n=6 1 12,99 ± 3,47 2 16,49 ± 3,56 4 18,60 ± 9,59 8 30,98 ± 6,69 10 32,91 ± 15,43 12 34,45 ± 13,52 14 44,60 ± 7,65 6.2 INFECÇÃO INTRACEREBRAL POR Cryptococcus gattii ATCC 32608 O modelo animal utilizado neste trabalho possibilitou a recuperação de unidades formadoras de colônias em todos os dias de sacrifício testados. O resultado das médias da contagem das colônias de C. gattii ATCC 32608 provenientes do cérebro dos animais do grupo tratado foi igual a 4,81 x 103 UFC/g para os animais sacrificados sete dias após a infecção, 6,08 x 103 UFC/g para os animais sacrificados com dez dias e 1,75 x 104 UFC/g para os animais sacrificados com quatorze dias de infecção. Os resultados das médias da leitura das colônias dos animais do grupo não-tratado revelaram valores estatisticamente (p<0,05) maiores, que foram respectivamente 4,82 x 104; 9,79 x 104 e 4,28 x 105 UFC/g para os animais sacrificados com sete, dez e quatorze dias de infecção. O gráfico 1 apresenta as médias dos log UFC/g de cérebro dos camundongos dos grupos tratado e não-tratado sacrificados em diferentes dias. 54 * Log UFC/g de cérebro 6 5 * * 4 3 2 1 0 7 NT 7T 10 NT 10 T 14 NT 14 T T e m p o ( d ia s ) Gráfico 1 - Logaritmo do número de UFC/g encontrado no cérebro dos camundongos infectados via intracerebral com isolados de C. gattii ATCC 32608 e pertencentes aos grupos não-tratado (NT) e tratado (T), sacrificados respectivamente com 7, 10 e 14 dias de infecção. Os asteriscos representam diferença estatisticamente significativa (p<0,05) no número de UFC/g de cérebro nos animais do grupo não-tratado. Diferença também estatisticamente significativa (p<0,05) foi observada entre o grupo tratado e não-tratado em todos os dias de sacrifício O método estatístico ANOVA mostrou que o aumento no número de UFC no cérebro dos animais do grupo tratado durante os períodos analisados não foi estatisticamente significativo (p>0,05). Entretanto para o grupo de animais nãotratado esse aumento foi estatisticamente significativo (p<0,05). Resultados semelhantes foram obtidos quando se comparou o número de UFC/g no cérebro do grupo tratado e do grupo não-tratado em todos os dias de sacrifício dos animais. O crescimento fúngico em 7 dias no grupo tratado correspondeu a 9,97 % do total de crescimento do grupo não-tratado, de forma que o tratamento nesse período inibiu 90,02% do crescimento da levedura. Em 10 dias o crescimento fúngico do grupo tratado correspondeu a 6,21% do total de crescimento do grupo não-tratado, sendo a inibição igual a 93,78%. Em 14 dias o crescimento do microrganismo no grupo tratado correspondeu a 4,08% do total de crescimento do grupo não-tratado e a inibição foi de 95,91%. O exame micológico direto das colônias crescidas em meio ASD, submetido à coloração com tinta nanquim, revelou a presença de leveduras (foto 4). 55 Foto 4 - Exame direto de leveduras crescidas em meio ASD submetido à coloração com tinta nanquim 6.3. TESTE DE SUSCEPTIBILIDADE AO FLUCONAZOL UTILIZANDO MÉTODO DA MICRODILUIÇÃO EM MEIO LÍQUIDO A CIM de fluconazol capaz de inibir 80% do crescimento de C. gattii ATCC 32608 obtidos do cérebro de camundongos foi igual a 16 µg/mL, exceto para os isolados provenientes de animais do grupo tratado sacrificados com 14 dias. Nesse grupo a CIM foi de 64 µg/mL (tabela 2), sendo verificado aumento de quatro vezes no valor da CIM quando comparado aos demais. A CIM do isolado de C. gattii ATCC 32608 antes da infecção foi de 16 µg/mL. 56 Tabela 2 - Valores da CIM (µg/mL) do fluconazol frente a isolados sequenciais de C. gattii ATCC 32608 obtidos de camundongos pertencentes aos grupos tratado (T) e não tratado (NT), sacrificados após 7, 10 e 14 dias de infecção CIM (µg/mL) Tempo (dias) T NT 7 16 16 10 16 16 14 64 16 A tabela 3 apresenta as correlações entre as concentrações de fluconazol encontradas no cérebro dos camundongos e os valores da CIM do grupo tratado (CD/CIM), e as médias de UFC/g de cérebro nos grupos tratado e não-tratado. Tabela 3 - Correlação entre as concentrações de fluconazol determinadas no cérebro dos camundongos nos diferentes tempos de sacrifício e a CIM do grupo tratado (T). O quociente da concentração da droga no órgão / CIM (CD/CIM) foi calculado para cada dia e correlacionado com a redução no número de UFC/g no cérebro para animais tratados (T) e não tratados (NT) CIM Tempo de Fluconazol sacrifício (µg/g de (dias) cérebro) 7 30,98 16 1,936 4,81 X 103 4,82 X 104 10 32,91 16 2,056 6,08 X 103 9,79 X 104 14 44,60 64 0,696 1,75 X 104 4,28 X 105 (µg/mL) Grupo CD/CIM UFC/g de cérebro (T) Tratado UFC/g de cérebro (NT) O gráfico 2 demonstra a tendência de aumento na concentração de fluconazol até cerca de oito dias de infusão do antifúngico. Após este período foi observado um menor grau de aumento na concentração do antifúngico. Os valores dos índices CD/CIM foram semelhantes em 7 e 10 dias (1,936 para 7 dias e 2,056 para 10 dias) 57 e o aumento na inibição do crescimento fúngico foi de 3,76% nesse período. Os teores da droga detectados nestes dias foram superiores aos valores de CIM. Apesar da maior concentração de fluconazol ter sido detectada em 14 dias, a porcentagem de inibição do crescimento fúngico nesse período aumentou apenas 2,12% comparado ao dia 10, sendo observada uma notável redução na taxa CD/MIC (0,696). Gráfico 2 - Concentrações de fluconazol (µg/g de cérebro) detectadas no cérebro de camundongos sacrificados após 1, 2, 4, 8, 10, 12 e 14 dias de infusão da droga. Os asteriscos representam os valores de CIM para o fluconazol frente aos isolados obtidos no grupo tratado 6.4 QUANTIFICAÇÃO DE CITOCINAS A resposta imune foi caracterizada por uma predominância do padrão do tipo 1 demonstrado pela elevada produção das citocinas IFN-γ e IL-12, quando comparado a produção das citocinas IL-10 e IL-4 em ambos os grupos tratado e 58 não-tratado, embora o nível de produção de cada citocina tenha sido diferente em cada um desses grupos. Comparado ao grupo não-tratato, os animais do grupo tratado apresentaram níveis menores de produção de IFN-γ e IL-12 e aumento na produção de IL-10, o que possivelmente pode representar um equilíbrio entre as respostas do tipo 1 e tipo 2. O gráfico 3 ilustra os teores das citocinas IFN-γ, IL-12, IL-10 e IL-4 obtidos do sobrenadante de cultura de células de baço de camundongos tratados, não-tratados e controle. 2500 * 2000 pg/mL 1500 1000 * 500 * 0 IFN -γ IL-12 IL-10 IL-4 Gráfico 3 - Teor de citocinas (pg/mL) obtido de sobrenadante de cultura de células de baço de camundongos Swiss após 10 dias de infecção com isolados de C. gattii ATCC 32608. As células foram estimuladas com ConA. As barras pretas correspondem ao grupo controle, as barras pontilhadas representam grupos de camundongos infectados e não tratados e as barras listradas representam grupos de camundongos infectados e tratados por dez dias com fluconazol. Os asteriscos representam teores com diferença estatisticamente significativa (p<0,05) Os métodos estatísticos ANOVA e teste de Tukey foram usados para verificar se os níveis de produção de cada citocina dosada foram diferentes estatisticamente em cada um dos grupos de animais. O nível de citocinas no grupo não-tratado foi caracterizado por uma elevação estatisticamente significativa (p<0,05) na produção de IFN-γ (1924,57 pg/mL) quando comparado aos grupos controle (125,67 pg/mL) e 59 tratado (1448,33 pg/mL), e aumento significativo de IL-10 (267,96 pg/mL) comparado ao grupo controle (43,97 pg/mL), porém, a produção de IL-10 nesse grupo foi estatisticamente menor quando comparado ao grupo tratado (541,36 pg/mL). A produção de IL-12 foi mais elevada no grupo não-tratado (982,70 pg/mL) comparado ao grupo tratado (744,20 pg/mL), embora essa diferença não tenha sido significativa. No grupo controle o nível de IL-12 foi de 126,72 pg/mL. Os níveis de IL-4 foram similares entre os grupos tratado e não-tratado (225,31 e 234,51 pg/mL respectivamente), e no grupo controle foi de 80,84 pg/mL. 6.5 ANÁLISE HISTOPATOLÓGICA A análise histopatológica do cérebro dos camundongos infectados com isolados de C. gattii ATCC 32608 revelou presença moderada de células microgliais no grupo de animais não-tratado (foto 5) e presença leve de células microgliais no grupo de animais tratados (foto 6). Dentro de cada grupo não foi observada diferenças significativas nas células microgliais ao longo dos dias. Foto 5 – Células microgliais em quantidade moderada obtido do cérebro de camundongos Swiss não-tratados com fluconazol e infectados com isolados de C. gattii ATCC 32608 60 Foto 6 – Células microgliais em quantidade leve obtido do cérebro de camundongos Swiss tratados com fluconazol e infectados com isolados de C. gattii ATCC 32608 61 7 DISCUSSÃO Embora uma variedade de terapias antifúngicas para o tratamento da meningite criptococócica tenha sido experimentada, os progressos têm sido lentos (LARSEN et al., 1996; LARSEN et al., 2004). Os principais antifúngicos usados no tratamento da infecção são tóxicos e frequentemente ineficazes para a erradicação da infecção do SNC mesmo após semanas de terapia (LARSEN et al., 2004). Por ser o fluconazol uma droga pouco tóxica (MITCHELL; PERFECT et al., 1995), ele é o antifúngico de escolha quando há a necessidade da manutenção terapêutica durante longos períodos. No entanto, o uso dessa droga por períodos prolongados está associado à emergência de isolados de Cryptococcus spp. resistentes ao antifúngico (ALLER et al., 2000). A frequência crescente dos casos de criptococose, a toxicidade dos principais antifúngicos disponíveis e a existência de isolados de Cryptococcus spp. resistentes, demonstram a dificuldade da terapia contra esta doença. O desenvolvimento de testes de susceptibilidade aos antifúngicos pode ser importante ferramenta para selecionar e monitorar drogas apropriadas para o tratamento de infecções criptococócicas (ALLER et al., 2000). Diante desses fatos, o presente estudo avaliou a utilização de modelo murino de criptococose cerebral para estudo de correlação clínico-laboratorial de testes de susceptibilidade ao fluconazol. Além disso, desenvolveu-se um método microbiológico para quantificar a concentração da droga presente no órgão do animal, e por último, observou-se o tipo de resposta imune do hospedeiro associada à infecção criptococócica. Os animais utilizados no presente trabalho podem ser considerados imunologicamente competentes. Sinais de apatia foram observados em alguns animais pertencentes principalmente ao grupo não-tratado, porém, outros sinais clínicos associados à doença do SNC ou morte por criptococose não ocorreram provavelmente devido ao curto período de infecção. O método microbiológico para quantificação de fluconazol desenvolvido no presente trabalho foi satisfatório, simples, reprodutível e apresentou linearidade suficiente para avaliar a concentração da droga presente no cérebro dos animais. A maioria dos estudos desenvolvidos para quantificar a concentração de drogas presente em tecidos biológicos utilizam a cromatografia líquida (KOKS et al., 1996) e 62 a cromatografia gasosa (HARRIS et al., 1989), sendo este o primeiro trabalho a utilizar a metodologia aqui apresentada para avaliar a concentração do antifúngico no cérebro animal. Sabe-se que o modelo animal não fornece a dose precisa do antifúngico que irá produzir o melhor efeito terapêutico na clínica (DIAMOND et al., 1998). Contudo, informações sobre a distribuição da droga no cérebro e sua correlação com a redução do número de UFC/g no tecido animal podem auxiliar no esclarecimento do processo clínico. Os trabalhos anteriores que avaliaram modelos animais de criptococose, utilizaram C. neoformans para infecção (DING et al., 1997; KIRKPATRIC et al., 2007; LARSEN et al., 1996; LARSEN et al., 2004), sendo este o primeiro trabalho utilizando C. gattii para infecção intracerebral de camundongos. Nenhuma morte animal foi desejada no presente estudo uma vez que o mesmo visou analisar a correlação da atividade in vivo do fluconazol com os valores da CIM in vitro do antifúngico em diferentes momentos da infecção criptococócica. O método microbiológico possibilitou a detecção de 12,98 µg/mL de fluconazol no cérebro de animais que receberam uma dose de 40 mg/Kg do antifúngico. Esse resultado está de acordo com os encontrados por Lortholary et al. (1999). Por meio dos métodos HPLC-UV e bioensaio por difusão em ágar, estes pesquisadores detectaram concentrações de fluconazol no cérebro de camundongos infectados com C. neoformans e tratados durante 4 dias com 15 mg/Kg/dia do antifúngico correspondentes a 19,10 µg/g e 14,85 µg/g respectivamente. No presente modelo experimental de criptococose, o fluconazol foi eficaz na inibição do crescimento fúngico em animais tratados quando comparado a animais não-tratado. Assim, em 7 dias de infecção o número de UFC/g de cérebro do grupo não-tratado foi 10 vezes maior do que o número de UFC/g de cérebro do grupo tratado. A mesma relação foi de 16 vezes em 10 dias e de 24 vezes em 14 dias de infecção. Ding et al. (1997) também avaliaram o efeito da terapia com o fluconazol em modelos murinos de meningite criptococócica e observaram redução significativa da carga fúngica no cérebro de camundongos tratados comparado aos animais não-tratados. Houve uma tendência de aumento significativo na concentração de fluconazol no cérebro até cerca de oito dias de infusão da droga, sendo nesse momento observada uma inibição do crescimento fúngico de 90,02%. Após esse período de tempo o aumento na concentração da droga no cérebro não foi significativo e a porcentagem de inibição do crescimento fúngico aumenta muito pouco quando se 63 compara os dados de atividade da droga em 10 e 14 dias (93,78% e 95,91% respectivamente). A taxa CD/CIM pode auxiliar a interpretação dos resultados do teste de susceptibilidade in vitro associado aos níveis de fluconazol encontrados no cérebro. No presente estudo, os valores dos índices CD/CIM foram praticamente os mesmos em 7 e 10 dias (1,936 e 2,056 respectivamente) e foi observado notável redução em 14 dias (0,696). Neste período esperava-se maior inibição do crescimento fúngico, uma vez que a concentração de fluconazol detectado no cérebro de 14 dias foi superior aos obtidos nas dosagens anteriores, entretanto esse fato não foi observado uma vez que ocorreu nesse período um aumento no valor da CIM de 16 para 64 µg/mL no grupo tratado. Esse aumento no valor da CIM promoveu a redução na taxa CD/CIM e uma inibição no número de UFC/g de somente 2,13% a mais quando comparado ao grupo tratado por 10 dias. Foi observado ainda que os níveis da droga determinados no cérebro dos animais foram superiores aos valores de CIM nos dias 7 e 10 e inferiores no dia 14. O CLSI (2002) estabeleceu os seguintes pontos de corte para susceptibilidade de isolados de Candida spp. ao fluconazol: isolados que apresentam CIM ≤ 8 µg/mL são considerados susceptíveis, isolados com CIM entre 16 e 32 µg/mL são classificados como susceptíveis dose-dependente ou intermediários e, isolados com CIM ≥ 64 µg/mL são considerados resistentes. Considerando os pontos de corte propostos para Candida spp., os isolados do presente trabalho obtidos do grupo não-tratado e os isolados do grupo tratado de 7 e 10 dias são classificados como susceptíveis dose-dependente e, os isolados obtidos do grupo tratado de 14 dias são classificados como resistentes. Mondon et al. (1999), estudaram a susceptibilidade ao fluconazol de isolados de C. neoformans obtidos de dois pacientes infectados e demonstraram que a proporção de isolados resistentes aumentou de forma constante durante períodos prolongados de terapia, sendo considerados resistentes aqueles que apresentaram CIM igual a 64 µg/mL. Mitchell e Perfect (1995) sugeriram que um aumento na CIM da droga de 4 vezes para isolados de C. neoformans pode representar resistência. No presente estudo foi observado aumento de quatro vezes no valor da CIM quando os isolados foram expostos por 14 dias a terapia com fluconazol, apoiando a hipótese de que a resistência pode surgir durante o tratamento. O aumento no valor da CIM pode predizer maior dificuldade de eliminar o microrganismo. Dessa forma, apesar da 64 redução no número de UFC/g de cérebro, as leveduras remanescentes podem exibir maior resistência in vivo, o que pode revelar a necessidade da administração de altas doses da droga ou a substituição do antifúngico. Dessa forma, é possível que o aumento da concentração de fluconazol a fim de alcançar níveis da droga no cérebro superiores a 64 µg/mL (CIM do dia 14), possa reduzir a gravidade da infecção. Almeida et al. (2007) sugeriram que isolados de C. neoformans possam tornar-se resistentes durante o tratamento com fluconazol. Os autores observaram em seus estudos aumento no valor da CIM de 2 para 16 µg/mL frente ao fluconazol. Soares et al. (2008) também relataram um caso de resistência em um garoto infectado com C. gattii e tratado com fluconazol. Os valores da CIM encontrados no último estudo foram ≥ 64 µg/mL. Aller et al. (2000), mostraram que uma melhor resposta clínica a terapia é observada quando as amostras de C. neoformans apresentavam valores de CIM menores que 16 µg/mL e Larsen et al. (2005b) relataram que os resultados de CIM in vitro podem corresponder ao efeito in vivo para o antifúngico fluconazol. No entanto, também foi demonstrado em um modelo experimental de criptococose disseminada que outros fatores além da CIM, tais como o tamanho da carga fúngica no cérebro, influencia na eficácia do fluconazol in vivo (DANNAOUI et al., 2006). Estudos que estabelecem valores de CIM para prever a resposta clínica à terapia em indivíduos com infecções criptococócicas são escassos (ALLER et al., 2000) e muitos estudos são ainda necessários para se estabelecer pontos de corte para o fluconazol frente a esse patógeno. Suspeita-se que os isolados clínicos de Cryptococcus são menos susceptíveis ao fluconazol do que os isolados ambientais (ALVES et al., 2001), e Khan et al. (2009) relataram que isolados de C. gattii são relativamente menos sensíveis do que C. neoformans a anfotericina B, 5-flucitosina e azóis. Porém, as causas das diferenças de susceptibilidade a antifúngicos entre C. neoformans e C. gattii não são totalmente compreendidas, e segundo os autores um importante fator que pode estar implicado na susceptibilidade aos antifúngicos é o conteúdo de melanina na parede celular, o qual pode impedir a droga de alcançar seu local de ação na célula fúngica. Assim, é ainda necessário determinar se isolados de C. gattii e C. neoformans diferem em sua capacidade de sintetizar melanina in vitro e/ou in vivo. Almeida et al. (2007) evidenciaram em seus estudos a ocorrência de mudanças genéticas em algumas linhagens de C. neoformans e C. 65 gattii durante o curso da infecção e que tais mudanças podem estar associadas ao aumento nos valores da CIM. O mecanismo que causa a diversidade genética entre os isolados não é totalmente compreendido, mas é possível que a população fúngica se altere e se adapte a fim de escapar da pressão de drogas antifúngicas ou para evadir do sistema imunológico. Outras formas de resistência dos fungos aos azóis vêm sendo estudado (ALBERTSON et al., 1996; NAKAMURA et al., 2001; WHITE; MARR; BOWDEN, 1998). Apesar da maioria desses estudos serem desenvolvido com espécies de Candida albicans é provável que muitos dos mecanismos descritos para essa espécie possam ser aplicados a outros fungos. Estes incluem a superexpressão de genes que codificam para bombas de efluxo (CDR1, CDR2 e MDR1), alterações no nível de expressão ou mutações no gene ERG11 que codifica para a proteína alvo dos azóis, a enzima 14α-demetilase, envolvida na via de biosíntese do ergosterol (WHITE; MARR; BOWDEN, 1998). Alguns desses mecanismos têm sido explorados para C. neoformans (POSTERARO et al., 2003). Por meio das bombas de efluxo o fungo é capaz de reduzir as concentrações intracelulares do antifúngico, sendo esse o principal mecanismo de resistência de isolados clínicos de C. albicans ao tratamento com fluconazol (ALBERTSON et al., 1996; NAKAMURA et al., 2001), e o gene CDR1 o mais frequentemente associado ao efluxo de drogas nesses microrganismos (NAKAMURA et al., 2001). Posteraro et al. (2003), por meio de técnicas moleculares, identificaram que a superexpressão do gene CnAFR1 que codifica uma bomba de efluxo da família de transportadores ABC pode estar associado ao aumento da resistência de C. neoformans após várias exposições ao fluconazol. As mutações no gene ERG11 podem ocasionar alterações conformacionais que interferem na afinidade de ligação do azol no seu alvo conferindo resistência ao microrganismo. Há relatos de substituição de nucleotídeos no gene ERG11 de isolados resistentes a azóis (SANGLARD, 2002). O melhor entendimento dos mecanismos de resistência do Cryptococcus spp. poderão auxiliar a interpretação de testes de susceptibilidade. Embora dados clínicos e experimentais demonstrem que a imunidade mediada por células é crucial na defesa hospedeira contra Cryptococcus spp. os mecanismos específicos por meio dos quais a resposta resulta em proteção são pobremente compreendidos. A indução de citocinas pró-inflamatórias, as quais recrutam e ativam leucócitos para inibir e matar fungos invasivos, é central para a resposta imune protetora contra infecções causadas por fungos. Entre as citocinas 66 mais importantes envolvidas na resposta protetora ao Cryptococcus spp. estão IL-12 e IFN-γ (RETINI et al., 2001). De uma forma geral, nesse estudo houve predomínio de um padrão de resposta tipo 1 caracterizada pelo aumento na produção das citocinas IFN-γ e IL-12. A IL-12 é essencial para iniciar uma sequência de respostas envolvendo macrófagos, células natural killer (NK) e linfócitos T, que resultam na eliminação de microrganismos. Para o desenvolvimento da resposta imune específica, o fungo deve ser fagocitado e seus antígenos devem ser apresentados pelas células apresentadoras de antígenos às células T, que estimulam a produção de IL-12. A IL12 secretada estimula células NK e células T a produzirem IFN-γ (ABBAS; LICHTMAN, 2005). O IFN-γ acentua a função microbicida dos macrófagos levando a eliminação dos microrganismos fagocitados (RETINI et al., 2001) por meio da produção de moléculas tóxicas como o NO. O NO é uma importante molécula microbicida, sendo que trabalhos com camundongos Knock-out para a enzima iNOS (NOS2-/-) mostraram um maior número de células fúngicas no pulmão destes animais após a infecção com C. neoformans comparado aos camundongos normais (RIVERA et al., 2002). Diversos estudos sugeriram que citocinas tipo 1 podem estar associadas com a resposta imune protetora na criptococose. Guillot et al. (2008) mostraram que a diminuição significativa da carga fúngica nos pulmões de camundongos infectados com C. neoformans foi associada a uma resposta Th1 caracterizada por elevados níveis de IFN-γ e IL-12, enquanto que uma maior carga fúngica esteve relacionada a uma resposta Th2 mostrada por meio da eosinofilia e produção de IL-4. Biondo et al. (2008) demonstraram que camundongos que não possuíam receptores para IFN-γ morreram devido à infecção criptococócica, sendo a resposta imune nesses animais caracterizada pelo aumento da expressão das citocinas IL-4, IL-13 e IL-10. Conforme Biondo et al. (2003), citocinas Th2 podem ser responsáveis pela patologia pulmonar destrutiva na criptococose e, de acordo com Zaragoza et al. (2007), a resistência à infecção criptococócica está relacionada a uma resposta Th1 envolvendo a formação de granuloma e, uma resposta polarizada Th2 está associada ao aumento da susceptibilidade ao Cryptococcus em camundongos. No entanto, a produção exagerada de citocinas Th1 pode causar danos teciduais ao hospedeiro devido à inflamação exacerbada e pior controle da disseminação fúngica. Portanto, a resposta Th1 é importante para a eliminação do fungo, mas, o 67 equilíbrio entre as respostas Th1 e Th2 é essencial para que não ocorram danos ao hospedeiro. A citocina IL-10 é uma citocina do tipo 2 (ABBAS; LICHTMAN, 2005) e é também uma citocina moduladora da resposta imune (MILLS, 2004), sendo capaz de inibir a produção de IL-12 que é um estímulo crítico para a secreção de IFN-γ (ABBAS; LICHTMAN, 2005). A IL-10 é também um potente inibidor da função de macrófagos (ZARAGOZA et al., 2007). É também importante mencionar que o GXM da cápsula criptococócica induz as células mononucleares a secretar IL-10, podendo no caso dessa infecção, balancear o desenvolvimento de uma efetiva resposta imune do hospedeiro (EISENDEL; GORDON; DYER, 2004). A análise histológica da infecção criptococócica do cérebro dos camundongos revelou a participação de células microgliais da resposta imune hospedeira. Foi observado maior número destas células no cérebro dos animais não-tratado comparado aos animais tratados com fluconazol. Estes dados podem ser correlacionados com os maiores níveis de IFN-γ para os animais do grupo nãotratado, uma vez que esta citocina pode estar envolvida na ativação de fagócitos. Estudos in vitro sobre a função das células microgliais na infecção criptococócica cerebral indicaram que tais células são capazes de internalizar e conter inicialmente as leveduras dentro de fagolisossomas (LEE et al., 1995b). Além da associação do gene AFR1 ao aumento da resistência de C. neoformans ao fluconazol (POSTERARO et al., 2003), Orsi et al. (2009) evidenciaram o papel desse gene na resistência de C. neoformans à atividade antifúngica de células microgliais. No estudo dos autores, as linhagens mutantes de C. neoformans que superexpressavam o gene AFR1 sobreviveram por mais tempo dentro de células microgliais comparado às linhagens tipo selvagem. Apesar de ambas as linhagens terem sido fagocitadas em extensão semelhante, na linhagem mutante foi observada reduzida acidificação e maturação mais tardia dos fagócitos em relação à linhagem selvagem. Nos estudos de Zhou et al. (2007), a ativação de células microgliais inibiu o crescimento criptococócico e prolongou o tempo de sobrevivência dos camundongos. Como o fluconazol é uma droga fungistática, nem todos os microrganismos presentes no organismo do hospedeiro são eliminados, e os microrganismos restantes deverão ser combatidos pelo sistema imune do hospedeiro e pela droga. No presente estudo, o número de UFC/g presente no cérebro dos camundongos do 68 grupo tratado foi significativamente menor, indicando a ação do fluconazol. A diminuição do número de células fúngicas causada pela droga, provavelmente permitiu ao hospedeiro produzir uma resposta inflamatória menor, demonstrada pela diminuição na expressão de IFN-γ e aumento significativo de IL-10, proporcionando um equilíbrio entre as respostas tipo 1 e tipo 2. Além disso, o tratamento dos animais resultou em uma resposta imune mais controlada demonstrada pelo menor número de células microgliais. 69 8 CONCLUSÃO Os resultados observados após a análise e processamento dos dados apresentaram as seguintes conclusões: 8.1 O ensaio microbiológico desenvolvido no presente trabalho foi adequado para a determinação da concentração de fluconazol presente no cérebro de camundongos. 8.2 O modelo animal de infecção intracerebral criptococócica demonstrou ser útil para estudos de correlação da atividade in vitro e in vivo do fluconazol. 8.3 Apesar da redução na carga fúngica, os isolados sequenciais de C. gattii obtidos de camundongos infectados via intracerebral desenvolveram menor susceptibilidade no 14º dia de terapia com fluconazol. 8.4 A terapia com fluconazol contra a criptococose favoreceu o equilíbrio entre as respostas hospedeira tipo 1 e tipo 2. 8.5 O tratamento de animais infectados propiciou uma menor carga fúngica, que foi correlacionado com o menor número de células microgliais quando comparado aos animais não-tratados. 70 REFERÊNCIAS ABBAS, A. 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Prof. Lineu Prestes, 1374, 2° andar, São Paulo, SP, 05508-900, Phone: 55 11 3091 7345, Brazil. c Departamento de Microbiologia, Instituto de Ciências Biológicas, Universidade Federal de Minas Gerais, Av. Antonio Carlos, 6627, Belo Horizonte, Minas Gerais, 31270-901, Brazil. * Corresponding author: [email protected] Abstract A bioassay for the quantitation of fluconazole in murine brain tissue was developed. Swiss mice received daily injection of the antifungal and the brains were withdrawn in different moments during 14 days. The method presented adequate linearity. The drug concentrations varied from 12.98 to 44.60 µg/mL at the first and the last day, respectively. This assay was used to evaluate the therapy with fluconazole in a model of cerebral infection caused by Cryptococcus gattii. Swiss mice were intracranial infected and daily treated with fluconazole during 7, 10 or 14 days. The antifungal treatment reduced the fungal burden, but an increase of the fungal growth 86 was observed at the day 14. MIC for fluconazole against sequential isolates was 16 µg/mL, except for the isolates obtained from animals treated during 14 days, for which MICs were 64 µg/mL. This fact was correlated with the increase of the antifungal levels and also of the fungal burden. Cytokines quantitation at 10 days of infection revealed a predominance of Th1 response (IFN-γ and IL-12) in the non treated group and elevation of Th2 cytokines (IL-10 and IL-4) in the treated group. Our data revealed the possibility of acquired resistance during the antifungal drug therapy. Keywords: fluconazole, susceptibility, cryptococcosis 1. Introduction Cryptococcus spp. are fungal pathogens that present a polysaccharide capsule composed mainly of glucuronoxylomannan. Two species, C. neoformans and C. gattii are the main human pathogens of the genera. C. neoformans tends to infect immunocompromised patients, while C. gattii generally infects apparently immunocompetent people (1, 2) and it is predominantly restricted to tropical regions (3). Exposure to colonized soil or trees enhances the possibility of inhalation of airborne propagules and may cause pulmonary and/ or central nervous system disease (4). Fluconazole, a triazole agent, is one of the most commonly prescribed systemic antifungals (5,6). It is well absorbed after oral administration and shows good penetration into cerebrospinal fluid (7, 8). The recent emergence of C. neoformans fluconazole-resistant isolates highlights the need for improved treatment regimens for the resistant organisms (9). Aiming the detection of the resistance, the in vitro analysis of the antifungal activity may clarify the reasons for lack of clinical response and assist clinicians in choosing an effective therapy for their patients (10). However it is not clear yet whether the antifungal prescription could be based on the available data from susceptibility studies (11). During the last decades, considerable efforts have been expended to establish a reproducible standard for minimum inhibitory concentration (MIC) determination of the antifungals against the yeasts. The limited data provided by the method 87 developed by the Clinical and Laboratory Standard Institute (12) suggest that this method might also be useful for C. neoformans, but data regarding C. gattii are scarce; in addition, no interpretative guidelines or breakpoints have been identified (13). A difficult that applies to the most of the studies focused on MIC-clinical outcome correlation is that potentially resistant isolates (elevated MIC values) are not frequently found in most of the clinical trials, and this circumstance may limits the detection of the emergence of resistance. There are few published studies of in vivoin vitro correlation and they did not include a representative number of strains, besides they are focused mainly on candidiasis (14). Based on these difficulties, animal models of cryptococcosis caused by C. neoformans (9, 13) have been used for studying the predictable value of the in vitro susceptibility data. Some of them used a nonparametric regression method to estimate the dose-response curve for antifungal agents in the animal blood (13). There is a scarcity of works focused on the in vivo-in vitro correlation of cerebral infection caused by C. gattii. Recently, a possible predictable value of CLSI method was proposed by Soares et al. (15). The present study was designed to evaluate the in vitro and in vivo activity of fluconazole against C. gattii. The fluconazole levels in the mice’s brain were determined by a microbiological assay and the results were correlated to MIC for sequential isolates of the microorganism. In addition, the inflammatory response was evaluated for treated and non-treated mice by measuring cytokine levels. 2. Material and methods 2.1. Determination of fluconazole levels in the brain of mice by microbiological assay (i) A turbidimetric assay was developed and a standard curve was plotted using fluconazole reference standard (kindly donated by Cipla Limite) in concentrations from 15.00 to 0.007 µg/mL. The antifungal was diluted in dimethilsulfoxide (DMSO) and further in RPMI-1640 medium buffered with 3-(N-morpholinepropanesulfonic) acid (MOPS) in 5 mL tubes. An inoculum constituted of Candida parapsilosis ATCC 22019 were made with yeasts grown on Sabouraud Dextrose Agar at 28 °C during 24 h. A small quantity of the colony was diluted on sterile distilled water and the 88 transmittance was adjusted to 85% at 530 nm, which corresponds to 1.0 x 106 to 5 X 106 CFU/mL (16). The inoculum was adjusted to 1.0 x 103 to 5.0 x 103/ mL in the tubes containing the dilutions of fluconazole. The tubes with the drug inocula were incubated at 28 °C during 48 h and the transmittanc e values at 530 nm were determined and used to plot a curve versus the tested drug concentrations. (ii) Non infected male Swiss mice with six to eight weeks (weigh from 23 to 33 g) were submitted to a daily intraperitoneal injection of fluconazole (40 mg/kg/day) in a maximum volume of 1 mL for 1 to 14 consecutively days. This work was approved by Ethics Committee from Universidade Vale do Rio Doce, Brazil. Groups of at least six animals were injected with ketamine/ xilazine (80mg/kg/ 10 mg/kg) anesthesia and they were sacrificed after 1, 2, 4, 8, 10, 12 or 14 days of fluconazole injection. The heads of the mice were swabbed with 70% alcohol and the brain tissue were withdraw without blood contamination with further dispersal in a tube containing 9 mL of RPMI-1640 (buffered with MOPS) with 1.0 x 103 to 5.0 x 103 CFU of C. parapsilosis ATCC 22019. The final volume was adjusted to 10 mL. The tubes with the inocula and the tissue were incubated at 28 °C during 48 h and the transmittances were determined at 530 nm. The brains from mice with no injection of the drug were submitted to the same protocol and they were used as blank control. The transmittance values were used to calculate the fluconazole concentration in the brain tissue by using the equation of the standard curve. 2.2. Cerebral infection with Cryptococcus gattii The strain Cryptococcus gattii ATCC 32601 was used for the intracranial infection of male Swiss mice with 6 to 8 weeks (weigh from 23 to 33 g). The microorganism was cultured on Sabouraud Dextrose Agar during 48 h at 28 °C. The yeast was transferred to sterile saline and the transmittance was adjusted to 70% at 530 nm which corresponds to 1.2 x 107 CFU/mL. The mice were submitted to intraperitoneal ketamine/ xilazine (80mg/kg/ 10 mg/kg) anesthesia previously to the intracranial infection. Further their heads were closely clipped, and the area was swabbed with 70% alcohol. The inoculum (in a maximum volume of 50 µL) was delivered through a 27-gauge needle following direct puncture through the cranial vault approximately 6mm posterior to the orbit. 89 Groups of at least six infected animals were daily treated intraperitoneally with 40 mg/kg/day of fluconazole during 7, 10 or 14 days of infection. Non treated groups were also included as control. The groups of mice were sacrificed after ketamine/ xilazine (80mg/kg/ 10 mg/kg) anesthesia in the days mentioned. The brain of each mouse was obtained without blood contaminatin, followed by dispersal and serial dilutions in sterile peptone water from 1:10 to 1: 1000. 100 µL of each dilution were placed into duplicate plates containing Sabouraud Dextrose Agar. The plates were incubated at 28 °C during 48 h. The colonies were c ounted and the results were expressed as CFU/ g of brain. The identity of the yeast was confirmed by microscopic test with Indian ink. Colonies of each plate were used for susceptibility testing with fluconazole. The spleens from the animals sacrificed at the day 10 were chosen to be used for cytokines quantitation. 2.3. Susceptibility testing Colonies obtained after 7, 10 and 14 days of infection from the treated (T) and non treated (NT) groups were obtained randomly to be tested with fluconazole according CLSI method (12). The inocula were performed in sterile saline with the yeast and the transmittance was adjusted to 85% (530 nm), followed by further dilution in RPMI1640 medium to achieve 1.0 x 103 to 5.0 x 103 CFU/mL. The fluconazole was diluted in DMSO, followed by dilution in RPMI-1640 in order to test the concentrations of 128, 64, 32, 16, 8, 4, 2, 1, 0.5 and 0.25 µg/mL. An aliquot of 100 µL of the inocula and 100 µL of the different drug concentrations were placed into sterile 96-flat bottomed well plates, which were incubated during 72 h at 28 °C. Sterile and growth control were also performed. The MICs were determined visually as 80% of growth inhibition in comparison to the growth control. For the interpretation of the data, the rate Drug Concentration in brain /MIC (DC/MIC) was calculated using the fluconazole levels obtained in the same days (7, 10 and 14) of the MIC determination. 2.4. Measurement of cytokines The spleens from animals of the non treated and treated groups sacrificed after 10 days of infection were withdrawn and their cells were dispersed manually, followed by 90 centrifugation at 1,200 rpm during five minutes. The lyses of erythrocytes were performed by adding 1 mL of sterile distilled water. A new centrifugation step was performed and the cell pellet was suspended in 1 mL of RPMI-1640 medium with 20 mM NaHCO3, 10 mM HEPES, 100 U of penicillin/mL, 100 mg of streptomycin/ml, 2 mM L-glutamine and 100 mM nonessential amino acids with 1% normal human serum. The cells were counted in 1:1 dilutions in 0.1% trypan blue. Viable cells were cultured at a density of 5 x 106 per well in 96-well plates with concanavalin A during 72 h at 37 °C and 5.0% of CO 2. The supernatants of the culture were collected and the concentration of IFN-γ, IL-12, IL-4 and IL-10 were analyzed by sandwich enzyme-linked immunosorbent assay (ELISA) with a Pharmingen kit, following all directions except for the substrate, which was replaced by orthophenylenediamine (Sigma) at 500 mg/ml. The final reading was at 492 nm. Recombinant cytokines (Pharmingen) were used for standard curves with the respective monoclonal antibodies. Spleen cells from non infected mice were submitted to the same protocol and they were used as control. 2.5. Analysis of the Results The concentration of fluconazole in the brain were correlated with the results from susceptibility testing, CFU/g of brain and with the cytokine measurement. The rate fluconazole concentration/ MIC (DC/MIC) was used for the interpretation of the fungal burden. Student’s t test, ANOVA and Tukey test were used for statistical analysis, a P value of < 0.05 was considered to be significant. All the experiments were repeated twice and similar results were obtained. 3. Results 3.1. Determination of the fluconazole concentrations in the brain of mice: The standard curve of fluconazole concentrations (from 15.00 to 0.007 µg/mL) versus % of transmittance resulted in the equation y = 5.2029x + 4.6394 with adequate linearity (R=0.9963). The slope was 5.203 ± 0.201 and the Y-intercept was 4.639 ± 1.190. The equation was used for the determination of fluconazole concentration in the brain of mice. Table 1 summarizes the levels of the antifungal in the brain. The concentrations of fluconazole obtained varied form 12.98 ± 3.47 µg/g of brain at the 91 first day to 44.60 ± 7.65 µg/g of tissue at the day 14 (Table 1). Fig. 1 illustrates the pharmacokinetics of fluconazole in the brain during the period of this study. We observed a significantly (p<0.05) increase of the drug concentrations from day 1 to day 8 and a maintenance of the levels from 8 to 14 days. 3.2. Cerebral infection with C. gattii: The animal model of cerebral infection developed in this work resulted in the recovery of countable colonies in all the days of sacrifice. We did not detect any morbidity signals of cerebral disease despite the significant increase of fungal burden. The identity of C. gattii was confirmed by microscopic test with Indian ink. Fig. 2 illustrates the log10 of CFU/g of brain obtained for treated and non treated groups. The values of CFU/g in brain of non treated groups increased from 7 to 14 days (p<0.05). We also noted a significantly difference (p<0.05) when data within each day were analyzed, revealing an important reduction (of at least 1 log) on the fungal burden in the treated group in comparison to the animals with no fluconazole administration (data also shown on table 2). In general, the CFU/g in brain for the treated group varied from 4.81 x 103 to 1.70 x 104 CFU/g of tissue, while the results for the non treated group varied from 4.82 x 104 to 4.30 x 105 CFU/g of brain (Table 2). The spleen, liver and lungs were tested for the presence of countable CFU in pilot experiments and no dissemination of the C. gattii was verified. 3.3. Susceptibility testing: All the MIC values found for fluconazole against the sequential isolates of C. gattii obtained at distinct moments were 16 µg/mL, except for the yeasts isolated from the treated group at the day 14, for which the MICs were four times higher (64 µg/mL). Table 2 also demonstrates the MIC values obtained, the fluconazole concentrations found in the brain and the data about CFU/g of brain. We verified an increasing on the rate DC/MIC from 1.93 to 2.05 from 7 to 10 days of test. Furthermore, a reduction on DC/MIC from 2.07 to 0.70 was observed from the day 10 to the day 14. An engrossing observation is that the reduction in the rate DC/MIC occurred concomitantly with the increase from 6.1 x 103 to 1.7 x 104 CFU/g of brain from the day 10 to 14. Fig. 1 also demonstrates the MIC values obtained in each day in the context of the kinetics of fluconazole in the brain. In general, MIC values were lower than the fluconazole concentration found in the brain, except for the colonies obtained at the day 14. 92 3.4. Measurement of IFN-γ, IL-12, IL-10 and IL-4: The cytokine levels on supernatant of spleen culture from animals after 10 days of infection for groups treated and non-treated are illustrated on Fig. 3. Control groups (non infected animals) were included as control. The levels of IFN-γ and IL-12 were higher in the non treated group. Different results were obtained for the treated animals, from which IL-10 and IL-4 presented higher levels. A significant (p<0.05) reduction of IFN-γ and increasing of IL-10 quantities were verified when non treated and treated groups were compared. 4. Discussion In this work we developed a microbiological assay for the fluconazole quantitation in the murine brain tissue. The most common described methods aiming the fluconazole determination in biological tissues are performed using blood samples and the equipments used were liquid chromatograph (LC) and gas chromatograph (GC) (5, 7). Our method showed adequate linearity and demonstrated to be reliable. The levels of the antifungal in the brain of mice found in our study are close to those obtained by Lortholary et al. (17). In that study, the authors determined the antifungal concentration in the brain by an agar diffusion method with similar doses to those used in our work. We can expect that the contents determined by bioassay could be higher than that quantified by chemical methods, since subtle changes can not be revealed by chemical assays and bioassay also gives the possibility to evaluate the real activity of fluconazole (8, 19). The drug activity is an important factor to be considered since it might be correlated with the effect of the drug against the infection. Furthermore, the drug levels in the brain could be an important information for predicting the adequate concentration of the drug in the organ in order to achieve a successful outcome of cerebral fungal infections. It is widely recognized that animal models are not likely to provide the precise doses which will produce the optimum therapeutic effect in the clinic (20). However, information regarding the antifungal distribution to the brain and its correlation with the fungal burden provides best response in the animal model and the results could be helpful for the delineation of clinical trials. Previous works focused on animal model of cerebral cryptococcosis used C. neoformans as test organism for the infection of mice and guinea pigs (9, 17, 21, 22) 93 being the present work the pioneer using C. gattii for the cerebral infection. A slowly progressive infection with no deaths during the protocol was desired, since we aimed analyzing the correlation of the in vivo activity of fluconazole with the in vitro MIC values for this antifungal in different moments of the therapy. In addition, we consider the intracranial injection a simple, reproducible and reliable way for the infection of mice with C. gattii, since it mimics the clinical characteristics of the disease, which shows focal features in the cerebrum and prolonged symptoms. Neurological sequelae may occur requiring surgery and extended therapy; the dissemination rarely occurs in immunocompetent patients (23). Some cases reported the occurrence of only cerebral infection without pulmonary disease (15). As we can expect, therapy with fluconazole (40 mg/g/day) resulted in significantly reduction of the fungal burden in comparison to the non treated group, although an increasing on CFU/g of brain was verified at the day 14 in comparison to the day 10. The possibility of the degradation of the drug should not be considered, since bioassay revealed the biological activity of the antifungal in the brain during all the protocol. This result might reveal a probably lack of efficacy and lower activity of the drug at this time of treatment due to the emergence of fungal resistance. Further increasing on the fluconazole doses in order to achieve levels of the drug in the brain higher than 64 µg/mL (the MIC at day 14) could possible reduce the severity of the infection. According to Larsen et al. (13), it is not known whether the drug concentrations used in vitro that correspond to the observed murine response represent peak or through drug levels in the brain. We proposed that the rate DC/MIC could be helpful for the interpretation of the in vitro susceptibility data associated with the kinetics of the drug. In this work the increase of fluconazole in the brain occurred concomitantly with the increase of the MIC values from 16 to 64 µg/mL. It might reveal the possible evolution of a change in microbial response to the increasing drug concentrations, suggesting the emergence of resistant organisms, which in part may clarify the meaning of the increase of the CFU/g of tissue (table 2). The goal of the in vitro susceptibility testing is to predict the clinical outcome. An in vitro measure that can reliably predict the response of the treatment would permit physicians to select the drug with the highest activity (13). Taking into consideration the breakpoints proposed by CLSI (12), for Candida spp., the isolate was classified as susceptible dose-dependent when it was obtained from non-treated group and also from treated group at the days 7 and 10. On the other hand, the strain was classified as resistant 94 when obtained from treated group at the day 14, which might reveal the need of higher doses of the drug or even its replacing by other antifungal agent. Similar results were found by Almeida et al. (24) when comparing sequential isolates provided from patients under antifungal therapy. The authors verified an increasing on MIC values for fluconazole against Cryptococcus spp. They also suggested a clinical significance for the heteroresistant phenotype as a potential cause of the failure of the fluconazole treatment, raising the hypothesis of the acquired resistance during the antifungal treatment. The possibility of less favourable response to antifungal therapy and relatively worse prognosis for infections caused by C. gattii than those caused by C. neoformans was related (25), reinforcing the need to establish whether susceptibility data would be helpful for treating diseases caused by the former microorganism. An interesting observation is that the most recurrences of cryptococcal meningitis during maintenance therapy were due to the persistence of the original infecting strains rather than the reinfection with a new criptococcal strain (24) Previous works (26) revealed that Cryptococcus isolates can undergo genetic changes in vitro and in vivo, which may contribute to the survival by providing means to evade host defenses. For human pathogens, the host represents a microenvironment of particular interest, and phenotypic alterations may affect the host-pathogen relationship with consequences that can translate into changes in virulence (3) and also in drug susceptibility profile. The Th1 response based on the production of cytokines such as IFN-γ is essential for the clearance of the infection. We noted the predominance of IFN-γ and IL-12 mainly for the non treated group. On the other hand, higher levels of Th2 cytokines were verified for the treated group. It is important to consider that the major capsular component of Cryptococcus spp. induces the peripheral blood mononuclear cells to secrete IL-10, which suppress the production of pro-inflammatory cytokines, such as IFN-γ and IL-12, and may inhibit the development of an effective host immune response (27). A possible reason for the increase of the IL-10 levels is that fluconazole, provides higher levels of circulating cryptococcal capsular antigens by promoting cell membrane destabilization, which could drives the course of the host response. Another hypothesis is that the IL-10 in treated mice may reflect the animals regulating the inflammatory IFN-γ and IL-12 responses. In conclusion, our microbiological assay developed for the quantitative determination of fluconazole in murine brain tissue provided analytical information when dealing 95 with the in vitro susceptibility data of this agent against C. gattii. Furthermore, the animal model of cerebral cryptococcosis demonstrated to be useful for in vitro-in vivo studies. The correlation of the data raised the possibility of the development of resistance during the antifungal therapy. 5. Acknowledgments This investigation, FESM and LVNO were financially supported by Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG) grant APQ-2864-07. DAS was supported by Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) grant 2008/04289-7. MRP was supported by CNPq. 6. REFERENCES (1) Brower AE, Teparrukkut P, Pinpraphaporn S, Larsen RA, Chierakul W, Peackock S, Day N, White NJ, Harrison TS. Baseline correlation and comparative kinetics of cerebrospinal fluid colony-forming unit counts and antigen titers in cryptococcal meningitis. JID. 2005; 192:681-684. (2) Mershon KL, Vasuthasawat A, Lawson GW, Morrison SL, Beenhower DO. Role of complement in protection against Cryptococcus gattii infection. Infec. Immun. 2009; 77:1061-1070. 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The rate DC/MIC (Drug Concentration/ Minimum Inhibitory Concentration) was calculated for each day. CFU/g of brain is shown for treated and non treated groups. The increase of the MIC value and the reduction on the rate DC/MIC occurred concomitantly with the increase of the CFU/g of tissue in the group treated with fluconazole during 14 days. Time of MIC (µg/mL) for infection (days) DC/MIC CFU/g of CFU/g of brain fluconazole in brain from from treated the treated non treated groups group groups 7 16 1.93 4.82 x 104 4.81 x 103 10 16 2.05 9.80 x 104 6.10 x 103 14 64 0.70 4.30 x 105 1.75 x 104 100 Figure 1: The line represents the pharmacokinetics of fluconazole (µg/g of tissue ± s.d.) in the brain of male Swiss mice determined by microbiological assay after the daily administration of 40 mg/g/day. The curve demonstrates the significantly (p<0.05) increasing of the antifungal in the brain from the day 1 to 8. There were two determinations which the MIC value was 16 µg/mL (at days 7 and 10) and there was one determination which MIC was 64 µg/mL (at the day 14). The first two values were below the fluconazole kinetics curve, while the last MIC was above the antifungal levels in brain. This high MIC value occurred concomitantly with the increasing on CFU/g of tissue in the animals treated during 14 days. 101 Log CFU/g of brain 6 5 4 3 2 7 NT 7T 10 NT 10 T 14 NT 14 T Time (days) Figure 2: Log10 of CFU/g of brain of C. gattii obtained from male Swiss mice infected with C. gattii. The lines represent the average of the determinations. The animals were sacrificed after 7, 10 and 14 days of infection for non treated (NT) and treated (T) groups. The levels of CFU/g of tissue significantly increased in the NT groups from 7 to 14 days of infection (p<0.05). A significantly reduction (p<0.05) on the CFU/g of brain occurred in the T groups in comparison to the NT animals. Within treated groups, higher levels of CFU/g of brain were obtained from animals sacrificed at the day 14. This fact occurred concomitantly with the reduction of the susceptibility (increase on MIC) for the tested isolate. 102 2500 * 2000 pg/mL 1500 1000 * 500 * 0 IFN -γ IL-12 IL-10 IL-4 Figure 3: Cytokine levels (pg/mL ± s.d.) obtained from the culture of spleen from male Swiss mice. Black bars correspond to the control group (non infected and non treated mice), dotted bars correspond to the results obtained from infected and non treated mice, while hatched bars correspond to the animals infected and treated with fluconazole. We noted significantly reduction (p<0.05) on the IFN-γ and increase on the IL-10 levels when comparing the non treated with the treated groups. The asterisks represent statistically difference within data obtained for the same cytokine (p<0.05).