71 RELATO DE CASO Paracoccidioidomicose Simulando Metástases Pulmonares* DANIEL DI PIETRO1 , MARIA HELENA G. NUNES 2 , NICOLAU FERNANDES KRUEL3, ELIZA T. MARQUES4 , MARCELA B. SCHAEFER5 RESUMO A paracoccidioidomicose é uma micose não contagiosa causada por fungo, sendo rara em mulheres e apresenta-se principalmente de duas formas: infecção regressiva e forma assintomática com regressão espontânea. Os autores relatam um caso de paracoccidioidomicose de apresentação atípica. primeiro por tratar-se de um caso de paracoccidioidomicose em mulher, segundo, pela apresentação radiológica com vários nódulos bilaterais que sugeriam metástases pulmonares. Após esgotar os meios diagnósticos, a paciente foi submetida à mini-toracotomia com biópsia pulmonar, que revelou o diagnóstico. Foi tratada com anti-fúngico, obtendo melhora clínico-radiológica. Paracoccidioidomycosis Simulating Pulmonary Metastasis ABSTRACT The paracoccidioidomycosis is a mycosis caused by a fungus it is a rare condition in women and has mainly two clinical forms of presentation: regressive infection and assymptomatic disease with spontaneous regression. The authors report a case of atypical paracoccidioidomycosis in a female patient with x-ray suggesting pulmonary metastasis. After all diagnostic methods the patient were submitted to a mini-thoracotomy with pulmonary biopsy and the diagnosis was done. The patient was medicated with anti-fungal drugs with Clinical and Radiological improvement. *Serviço de doenças do tórax do Hospital Regional de São José Dr. Homero de Miranda Gomes (HRSJHMG) 1 Cirurgião Torácico do HRSJHMG. doutorando em Medicina pela UFRGS. 2 Pneumologista do HRSJHMG. Coordenadora do Estágio dos Acadêmicos na Emergência. 3 Cirurgião Torácico do HRSJHMG, Preceptor da Residência em Cirurgia, Diretor Clínico do HRSJHMG, Doutor em Medicina pela USP. 4 Médica Residente do terceiro ano em Cirurgia Geral do HRSJHMG. 5 Radiologista do HRSJHMG, Radiologista do HPM. Endereço para correspondência: Descritores: - Paracoccidioidomicose - Micose - Infecção pulmonar Keywords: - Paracoccidioidomycosis - Mycosis - Pulmonary infection Arq Cat Med 1997 Jan/Dez; 26(1-4):71-3 72 Di Pietro D, Nunes MHG, Kruel NF et al. INTRODUÇ ÃO Paracoccidioidomicose, antigamente denominada blastomicose americana, é uma micose não contagiosa causada pelo fungo dimórfico Paracoccidioides brasiliensis que habita o solo como saprófita. pode produzir doença pulmonar progressiva ou disseminação e xtra-pulmonar, mas, como regra geral tem caráter regressivo. é uma infecção que ocorre somente na américa latina, estendendo -se do México (20ºn) até a Argentina (35ºs). Em torno de 80% dos casos são registrados no Brasil, sendo mais prevalente nas regiões sul, sudeste e centro oeste1,2, 3. Os autores relatam um caso de paracoccidioidomicose com apresentação atípica. RELATO DO CASO Feminina, preta, 59 anos, natural e procedente de Lages/SC, internou neste hospital para investigação diagnóstica de nódulos pulmonares bilaterais encontrados em RX convencional de tórax de rotina (foto 1 e 2). Não tinha exames radiológicos anteriores. As queixas apresentadas pela paciente eram tosse seca de pequena intensidade e de longa data, dor no ombro direito e dificuldade de mobilização do membro superior direito, dor nos joelhos com aumento de seu volume, principalmente à esquerda, e edema de membros inferiores que iniciaram há 4 meses. Negava tabagismo, negava outros sintomas associados. realizou tratamento para tuberculose há 13 anos, tendo que repetir 2 anos após. Faz uso irregular de tiazidico para tratamento de hipertensão. ao exame físico encontrava-se em bom estado geral, eupneica, afebril, hipertensa. Ausculta pulmonar: murmúrio vesicular universalmente diminuido, com creptações leves em 1/3 inferior do hemitórax esquerdo e sibilos bilaterais. Ausculta cardíaca: ritmo regular em 2 tempos, bulhas normofonéticas, sopro aórtico de regurgitação 1+/6. Abdome sem anormalidades. Limitação da abdução e rotação externa do ombro direito, creptações grosseiras nos joelhos e edema nos membros inferiores. a paciente permaneceu estável durante a internação. Após exaustiva investigação, que incluiu exames laboratoriais de rotina, provas de função reumática, exames de escarro, fibrobroncoscopia, tomografia computadorizada de tórax (foto 3), ecografia abdominal, mamografia, cintilografia da tireóide, entre outros; a mesma foi submetida à biópsia pulmonar a céu aberto por mini-toracotomia anterior esquerda, cujo diagnóstico anatomopatológico foi o de paracoccidioidomicose, tendo sido tratada com itraconazole, obtendo melhora radiológica das lesões. Fotos 1 e 2 - Raio X de tórax nas incidências posteroanterior e perfil, revelando múltiplos nódulos pulmonares, sugestivo de metastases pulmonares. . Arq Cat Med 1997 Jan/Dez; 26(1-4):71-3 73 Paracoccidioidomicose Simulando Metástases Pulmonares Um aspecto importante é a relação da Paracoccidioidomicose brasiliensis com os hormônios sexuais 2 . O fungo produz proteínas que se ligam seletivamente ao beta-estradiol, o que impede sua passagem da fase filamentosa para a fase leveriforme. A conseqüência disto é que, na presença de hormônio feminino, o fungo não pode multiplicar-se. Os achados radiológicos são habitualmente infiltrado misto intersticial e alveolar, podendo também se apresentar como bolhas de enfisema, fibrose, nódulos e cavidades2,6 . A raridade da apresentação clínico-radiológica do caso relatado, que ocorreu em uma mulher com lesões nodulares disseminadas sugerindo metástases, alerta para o diagnóstico mais precoce, sendo o tratamento de fundamental importância para evitar evolução fibrótica. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 1. 2. Foto 3 - Tomografia computadorizada de tórax que evidencia lesões nodulares múltiplas bilaterais. 3. 4. COMENTÁRIOS 5. A apresentação clínica da paracoccidioidomicose pulmonar pode ser de duas formas: como infecção regressiva ou como doença progressiva. A infecção regressiva é a forma assintomática com regressão espontânea, e a doença progressiva apresenta sintomas comuns a várias doenças pulmonares, como a tosse, expectoração, dispnéia, hemoptise, anorexia e febre 4, 5. 6. Almeida AV, Fogaça J, Chamma LG et al. Optimization of a mouse immunization protocol with Paracoccidioides brasiliensis antigens. Mem Inst Oswaldo Cruz 1995; 90(1):45-9. Severo LC. Paracoccidioidomicose. In Silva LCC. Compêndio de pneumologia. 2 a ed. São Paulo: Fundo Editorial Byk, 1991: 601-6. Komaid AVG, Duran EL. Histoplasmosis in northwestern argentina II: prevalence of histoplasmosis capsulati and paracoccidioidomycosis in the population south of chuscha, gonzalo and potrero in the province of tucuman. Mycopathologia 1995; 129:17-23. Bernard G, Neves CP, Gryschek RCB et al. Severe juvenile type paracoccidioidomycosis in an adult. Journal of Medical & Veterinary Mycology 1995; 33:67-71. Drut R. Paracoccidioidomycosis: diagnosis by fine - needle aspiration cytology. Diagn Cytopathol 1995; 13(1):52-3. Severo LC, Porto NS, Camargo JJ et al. Multiple paracoccidiodomas simulating wegner’s granulomatosis.Mycopathologia 1985; 91:117-9. Arq Cat Med 1997 Jan/Dez; 26(1-4):71-3