1. TÍTULO O Empírico na Linguagem Científica em Carnap. 2.NOME Bruno Felipe Mininel Ortolan 3. RESUMO Este projeto tem como objetivo discutir e reavaliar a posição carnapiana dentro da discussão da filosofia da ciência não apenas com valor histórico, mas, e fundamentalmente, como parte influente nos trabalhos propostos por filósofos da ciência atuais. Analisaremos o desenvolvimento do pensamento de Carnap a partir de algumas de suas principais obras e tentaremos mostrar um posicionamento neutro quanto à construção da linguagem científica e, tendo como pressuposto o princípio de tolerância linguística, apresentar um método para resolver ou dissolver disputas filosóficas através da relativização destas a um sistema linguístico de referência. PALAVRAS-CHAVE: Carnap, Friedman, empirismo, linguagem científica. 4. INTRODUÇÃO Tomando a obra de Carnap como início de nossa investigação, partiremos de alguns de seus conceitos e objetivos para tentar solucionar os problemas que ainda preocupam a filosofia da ciência, como o da unidade da ciência e a interpretação da linguagem científica. Ao tratar do princípio de tolerância linguística, Carnap apresenta uma posição neutra quanto à construção da linguagem científica, sem se comprometer ontologicamente. Assim, ao relativizar disputas filosóficas em um sistema linguístico de referência, ele poderá resolver, ou até dissolver, estas disputas linguísticas. Tendo como objetivo principal a unificação do conhecimento científico, a reconstrução racional deste conhecimento obteria como consequência a eliminação da metafísica, através da construção de uma linguagem científica compatível com o empirismo, ou seja, a realidade do mundo externo não pode ser discutida dentro de tal linguagem, ela passa a ser uma “questão externa”. Estas “questões internas” e “questões externas” são em relação a um determinado sistema linguístico de referência, ou seja, dizem de entidades abstratas e são tratadas por Carnap como: “[. . .] Devemos distinguir dois tipos de questões de existência: em primeiro lugar, as questões da existência de certas entidades do novo tipo no interior do sistema de referência; chamamo-las de questões internas; e em segundo lugar, as questões concernentes à existência ou à realidade do sistema de entidade como um todo, chamadas de questões externas. ” (Carnap 1975a, p.120) Sendo assim, é possível introduzir novas entidades no discurso científico, contanto que estas entidades possam fazer parte da construção da estrutura linguística e das regras de referência. Logo, é de tal forma que ocorre a exclusão dos conceitos metafísicos através do método carnapiano. Tais conceitos não podem ser definidos de acordo com seu sistema construcional, e considerando-os indecidíveis quanto à existência, o que resta são apenas disputas linguísticas. 5. MATERIAL E MÉTODOS O presente subprojeto de iniciação científica se justifica na medida em que pretende discutir e analisar um dos argumentos centrais do projeto a que está vinculado. Historicamente, estamos analisando um dos principais autores da filosofia da ciência, a partir de um argumento que pretende revalorizar um período da filosofia cuja influência se apresenta de forma direta nas discussões atuais da filosofia analítica pós-positivista de orientação empirista, relacionados à interpretação da linguagem científica, sobretudo em seus aspectos sintáticos e semânticos. A metodologia a ser utilizada consiste na leitura e interpretação de textos filosóficos, acrescentando ainda a leitura de comentários referentes à problemática em questão, a saber, a interpretação empírica da linguagem científica. Discussão com o professor orientador. 6. RESULTADOS, DISCUSSÃO E CONCLUSÕES Este relatório tem como objetivo mostrar que através do princípio de tolerância linguística proposto por Carnap é possível relativizar todas as perplexidades filosóficas em um sistema linguístico de referência e assim resolvê-las, ou até mesmo dissolvê-las. Segundo Michel Friedman, a proposta de Carnap é construir uma linguagem científica compatível com o empirismo para que assim as indecidíveis discussões filosóficas sejam eliminadas por não serem relativizadas a esta estrutura linguística pré-estabelecida. Ele deixa mais claro com a seguinte citação: “Deste modo, muito mais que apresentar um relato tradicional empirista, ou fenomenalista do nosso conhecimento do mundo externo, o Aufbau, por sua vez, antecipa a estratégia de Carnap em ‘Empiricism, Semantic, and Ontology’: a questão da realidade do mundo externo é dissolvida em ‘questões externas’, ou seja, se deve, ou não, ser aceita e usada na forma de expressão da ‘linguagem objeto’. Assim sendo, uma ‘questão externa’ não está, naturalmente, sujeita à disputa racional como um todo, mas apenas às considerações convencionais puramente pragmáticas.” (FRIEDMAN, 1999, p.124). Ou seja, já no Aufbau, Carnap eliminou esta questão da realidade do mundo externo, uma vez que as questões externas são apenas pseudoproblemas e não sujeitas às disputas racionais. Portanto, entendemos que não houve uma ruptura em suas obras filosóficas, mas sim uma adaptação/reformulação de seu pensamento. Sendo assim, ao analisar a distinção entre ciência e metafísica, um sistema linguístico de referência permite o uso do termo ‘realidade’ sem compromisso ontológico-metafísico, por isso é possível designar um objeto como sendo ‘real’ se, e somente se, ele fizer parte deste determinado sistema linguístico. Em uma passagem de sua obra Filosofia e Sintaxe Lógica, Carnap exemplifica como a controvérsia entre os realistas e os idealistas não passa de um problema externo à ciência, pois tal discussão está para além do domínio empírico, impossibilitando qualquer decisão que possa ser racionalmente considerada. “Quando um zoólogo afirma a realidade dos cangurus, sua afirmação significa que existem coisas de um certo gênero que podem ser localizadas e percebidas em determinados tempos e lugares; que há objetos de um certo tipo que são elementos do sistema espaço-temporal do mundo físico. Esta afirmação, de fato, é verificável; através de investigações empíricas, todo zoólogo chega a uma efetiva verificação, independentemente de ser um realista ou um idealista.” (Carnap, 1963c, p.12) De fato, a distinção entre as questões internas e as questões externas podem ser o limite para o que pode ser considerado significativo ou não em relação à um sistema. Em outras palavras, as regras que constituem este sistema é o que limita quais entidades fazem parte dele, ou sobre o que se pode e sobre o que não se pode dizer de modo significativo, excluindo, portanto, a ontologia desta discussão e deixando-a apenas a mercê das regras. “[. . .] Devemos distinguir dois tipos de questões de existência: em primeiro lugar, as questões da existência de certas entidades do novo tipo no interior do sistema de referência; chamamo-las de questões internas; e em segundo lugar, as questões concernentes à existência ou à realidade do sistema de entidade como um todo, chamadas de questões externas.” (Carnap 1975a, p.120) O que queremos deixar claro aqui é, parafraseando Carnap, que a realidade de um objeto é a possibilidade deste estar situado em um determinado sistema. Sendo assim, se está contido no sistema é verificável, e se não está contido, é apenas uma pseudoquestão, pois não pode ser verificável, uma vez que lhe falta significado e conteúdo cognitivo perante tal sistema. Se faz necessária a existência de uma linguagem unificada para a ciência, e como diz Carnap (1963c, p.58): “a existência de um sistema único de linguagem, no qual cada termo científico tenha conteúdo, implica, todavia, que todos estes termos pertençam a gêneros logicamente conectados”. Para tal empreendimento, na construção desta linguagem, Carnap se preocupou em construir uma linguagem empirista estendida, com termos lógicos e termos não-lógicos divididos em dois vocabulários (Lo & Lt , onde Lo = linguagem observacional e Lt = linguagem teórica), mais as regras de correspondência que relacionam o vocabulário teórico com o vocabulário observacional. As regras de correspondência são postulados que estabelecem uma relação entre a linguagem observacional e a linguagem teórica, uma vez que não há uma interpretação direta e independente para a linguagem teórica, nem ao menos uma definição, pois é possível a introdução de novas regras na linguagem a qualquer momento. Deste modo, conseguimos mostrar que um termo teórico só tem significado no interior de uma teoria e nunca de forma isolada, pois podemos facilmente relacionar o termo ‘massa’ com o predicado observável ‘mais pesado que’, entretanto nunca de forma significativa se não especificado o sistema, sendo este: quilograma, libra, onça, etc. O que queremos dizer é que se faz necessário analisar o significado de um termo de Lt a partir da teoria T em que este ocorre. Por fim, segundo Friedman (2011, p.249): “Realistas e instrumentalistas têm encontrado dificuldade para entender (muito menos aceitar) a visão desenvolvida por Carnap sobre termos teóricos, que estabelece uma posição neutra entre realismo e instrumentalismo. ”. Esta posição neutra, de Carnap, dentro desta discussão, deve ser vista como uma tentativa de dissolução das disputas ontológico-metafísicas. E assim abandonar as disputas linguísticas obscuras e indecidíveis da filosofia tradicional. 7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BÁSICAS 1. Carnap, R. The Logical Structure of the World and Pseudoproblems in Philosophy. tradução Rolf A. George. Chicago : Open Court , 2005, 2003. 2. ———. 1975a [1950]. Empirismo, Semântica e Ontologia. São Paulo: Abril Cultural. 3. Friedman, M. 1999. Reconsidering Logical Positivism. Cambridge: University Press. 4. Ghins, Michel. Uma Introdução à Metafísica da Natureza: Representação, Realismo e Leis Científicas. tradução Eduardo Salles O. Barra, Ronei Clécio Mocellin. Paraná: Editora UFPR, 2013. 5. Kuhn, T. 1969 [1962]. A Estrutura das Revoluções Científicas. São Paulo: Perspectiva. 6. Liston, G. 2013. Carnap, Friedman e o Revisionismo. Principia 17(1): 137–164. 7. ———. 2012. Carnap e o Revisionismo. Principia 16(1): 99–119. 8. ———. 2013. O Holismo Fisicalista de Neurath: uma autocrítica do positivismo lógico. Dissertatio 37: 47–67. 9. Quine, W. V. 1985a. Dois Dogmas do Empirismo. São Paulo: Nova Cultural. 10. Schlick, M. 1988 [1934]. O Fundamento do Conhecimento. São Paulo: Abril Cultural. 11. Van Fraassen, Bas C., 1941-. A Imagem Científica. tradução Luiz Henrique de Araújo Dutra. São Paulo: Editora UNESP: Discurso Editorial, 2007.