a proibição do aborto e a laicidade brasileira

Propaganda
A PROIBIÇÃO DO ABORTO E A LAICIDADE BRASILEIRA
Luiz Augusto Mugnai Vieira Jr1
Yonissa Marmitt Wadi2
1. INTRODUÇÃO
Neste contexto da não legalização do aborto em algumas sociedades, como a
brasileira, a qual se encontra a nossa discussão, analisaremos a questão da lei da
laicidade do estado brasileiro junto com seus dispositivos da sua Constituição. Puxando
o fio condutor “proibição do aborto” dessa discussão, notaremos que nesse fio condutor
estão presentes outros fios “amarrados”, que também estão envolvidos nele. Para isso,
partiremos de um raciocínio reflexivo de que a proibição do aborto, a laicidade e as
políticas públicas de saúde (alguns desses fios “amarrados”) estão intrinsecamente
envolvidas e nos traz a seguinte indagação: Se o Brasil é um país laico, por que existem
questões religiosas envolvidas na não legalização da prática do aborto?
Assim,
reconhece-se que a falta de uma discussão aberta, da resolução deste grave problema de
saúde pública que é o aborto, possuiria a sua não legalidade prática uma relação estreita
com pressões religiosas?
Para isso analisaremos por meio da leitura do preâmbulo da Constituição de
1988 para refletirmos tal indagação:
Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional
Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o
exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bemestar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de
uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia
social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução
pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte
CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL.
1
Mestrando do curso de História – Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE. Contato: email: [email protected].
2
Doutora em História / Pesquisadora do CNPq / Professora Adjunta da UNIOESTE.
1
A Constituição brasileira segue em princípio o modelo de separação de Estado
e Igreja, mas o que verifica é uma neutralidade que configura em uma "neutralidade"
benevolente, provida de simpatia à religião e às igrejas. Segundo Santos (2007) isso é
observado nas normas adiante assinaladas:
1) A Constituição não é atéia. Invoca no Preâmbulo o nome de Deus, pedindolhe a proteção.
2) Aceita como absoluta a liberdade de crença (art. 5º, VI).
3) Consagra a separação entre Igreja e Estado (art. 19, I).
4) Admite, porém, a "colaboração de interesse público" (art. 19, I, in fine).
5) Assegura a liberdade de culto (art. 5º, VI)
Ressalta Soriano (2002) que houve desde a primeira Constituição promulgada
em 24 de fevereiro de 1891 até a Constituição atual, promulgada em 05 de outubro de
1988, algumas alterações significativas no que se refere ao modelo de separação. Aqui
no Brasil o tratamento da questão da laicidade caminha aparentemente na contramão da
tendência que tem sido registrada na Europa que consiste em um distanciamento cada
vez maior entre a organização política e as organizações religiosas.
Em um primeiro momento podemos afirmar que o estado brasileiro é laico,
assim sendo estaria desvinculado da igreja ou de qualquer religião. Portanto, ser um
estado laico o que conta, mais do que dogmas ou crenças, é o direito civil. O estado
laico tem como farol a ciência, que dá os subsídios para a confecção de leis que visam
ampliar o espaço democrático e os direitos individuais. Mas, segundo Santos (2007)
existem dois modelos básicos de laicidade estatal que seriam um mais aberto e outro
mais fechado à invasão de fatores religiosos no espaço público. A atual Constituição
Federal do Brasil segue um modelo de laicidade que favorece os aspectos religiosos e,
no particular, ainda é mais aberto para a incursão da religião no espaço público.
O princípio da separação estado e religião dependem das particularidades
históricas de cada país que o adotou afirma Santos (2007), de uma precedência histórica
de uma intenção sobre a outra, seja capaz de atender a ambos os interesses. Nos Estados
Unidos,
por
exemplo,
vê-se
claramente
que
a
intenção
inicialmente
dos
constitucionalistas foi trazer uma proteção às igrejas da interferência governamental,
2
garantindo assim também uma proteção ao pluralismo religioso que marcou a história
norte-americana desde os seus primórdios. Questionando se de fato a laicidade se
cumpre no Estado brasileiro, se há de fato separação entre Estado e Igreja, percebe-se
então que entre os dois modelos básicos de laicidade estatal: um mais aberto e outro
mais fechado, existe no Brasil um modelo mais aberto à incursão do fenômeno religioso
no espaço público.
Neste sentido, pretende-se discutir, neste artigo, numa ótica
histórica antropológica, o posicionamento imposto pelas leis que delimitam (proibindo e
criminalizando) o lugar do aborto na sociedade brasileira.
Para Capez (2006) “considera-se aborto a interrupção da gravidez, com a
conseqüente destruição do produto da concepção. Consiste na eliminação da vida
uterina”. Porém, segundo Bitencourt (2004) de maneira geral, os códigos penais não
definem em o que consiste o aborto, trazendo a dúvida sobre “se é suficiente a expulsão
do feto ou se é necessária a ocorrência da morte para caracterizá-lo”. De acordo com o
autor, o nosso atual Código Penal não o define, tornando assim limitado a uma fórmula
neutra e indeterminado, porém mesmo assim o artigo 124 do Código Penal prevê
detenção de um a três anos para a gestante que provocar o aborto em si mesma ou
consentir que o outro o faça.
O aborto inseguro é reconhecido pela comunidade internacional como um
grave problema de saúde pública desde a década de 1990. O termo “inseguro” é
definido pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como procedimento para
interromper a gravidez não desejada realizada em ambientes e condições inadequadas
através de pessoas sem habilidades necessárias. Reunidos em uma mesa-redonda
organizada pela Casa Brasil cientistas promoveram uma discussão tendo o tema à
importância de se descriminalizar o aborto não somente em casos de anencefalia, mas
em condições normais de saúde do feto e a defesa de um Estado laico, no qual questões
religiosas não determinem políticas.
Segundo o professor Ivo Pitanguy presente na mesa redonda, destacou que as
mulheres devem ter o direito de decidir se querem ou não reproduzir, e que o aborto
inseguro é um problema grave de saúde pública, elevou-se a um debate sobre a
interrupção da gravidez a um novo patamar que deverá trazer mudanças na legislação
brasileira e no Código de Ética Médica.
3
Portanto, a polêmica do aborto traz em cena diferentes atores que reivindicam
um poder de decisão sobre a vida, trata-se de médicos, dos governos e de poder
judiciário. Para Foucault (1979) trata-se de um biopoder, um poder que necessita de
mecanismos contínuos, reguladores e corretores da vida. Nessa disputa entre esses
atores na qual o aborto é objeto de discussão na sociedade, dos fatos "da vida de todos
os dias" estão ligados, sobretudo às disputas jurídicas.
Focault (1979) afirma que as sociedades contemporâneas são caracterizadas
por um poder político que se convenciona na tarefa de gerenciar a vida, pois na
sociedade moderna essa vida é um tema de disputa diferentemente das épocas onde um
soberano possuía o direito de matar ou de deixar viver.
Ao falar da proibição do aborto, fio condutor da nossa discussão aqui, não se
pode deixar de mencionar e ressaltar, a questão da mulher, já que essa seria também um
fio de grande importância o qual estaria também amarrado aos demais fios mencionados
inicialmente para entendermos a não legalização da tal prática. Esse poder de
mecanismos contínuos, reguladores e corretores da vida utilizam-se de acordo com Eluf
(1993) uma ótica exclusivamente masculina da sexualidade humana, imposta durante
séculos, trouxe imensos prejuízos à saúde física e mental da mulher, dentre os quais se
destaca a proibição legal do aborto, por vontade da gestante, ainda presente na lei penal
brasileira. Obviamente a reprodução resulta do instinto, da atração que a mulher sente
pelo homem, do impulso sexual que ela está biologicamente programada para sentir e
da satisfação da sua afetividade, que não está diretamente ligada à vontade de procriar.
Muito ao contrário, aliás: no mais das vezes o sexo tem uma função que se esgota em si
mesma, por isso a necessidade dos anticoncepcionais. Embora evidente, hoje, ter a
mulher pleno direito ao exercício da sexualidade, tanto como os homens, cabe ressaltar
que essa realidade está indissociavelmente à atualidade não podendo ser estendida ao
passado. O poder de decidir sobre o corpo é conquista feminina recente, ainda em
processo de solidificação no Brasil, embora já bastante avançada nos países do primeiro
Mundo.
Por meio de uma breve retrospectiva histórica, é possível visualizar a evolução
da condição legal feminina no Brasil. Até 1934, a mulher brasileira não tinha direito
sequer de votar ou ser votada. O conceito de “mulher honesta” foi sustentado até o
começo do século XXI, com a manutenção do Código Penal de 1940 que vigorou até
4
2004. Na década de 60, comumentemente associada às transformações e a efervescia
cultural, foi criado o estatuto da Mulher Casada, Lei n.4121, de 27/01/1962, a mulher
era:
Considerada relativamente incapaz pela Lei Civil, equiparada às crianças e
aos silvícolas, numa condição de extrema humilhação, só recentemente
reparada. A mulher “direita”, “de família” ou outros adjetivos similares, era
aquela que se transformava num objeto a mercê de seu proprietário (pai ou
marido) e, após o casamento, servia de receptáculo do sêmen do marido, com
o fim de procriar. Desprovida de vontade, estava condicionada aos desígnios
incontornáveis da maternidade que, mais do que uma função biológica,
representava sua única contribuição social possível (ELUF, 1993, P.89).
Não podemos deixar de ressaltar também a influência da Igreja, do poder papal,
das religiões cristãs que, de certa forma, se deparam com a prática ou não do aborto
como já mencionamos no início desse artigo e assim como também da uma construção
da imagem de “ser mulher” a ser seguida e aceita. O cristianismo, com o culto à Virgem
Maria, acentua e reforça a importância da maternidade, de acordo com Hurst (1992).
Para Nunes (2007) a Igreja proclama sua concepção imaculada e a torna um dogma de
fé, isto é, define Maria como a única criatura humana a conceber sem pecado,
reafirmando o modelo cristão de mulher submissa, pura, virgem e, ao mesmo tempo,
mãe. Por essa razão, em nossa cultura, ser mãe tem um “peso” maior do que ser pai. A
representação social do papel da mãe e do pai apresenta significativa diferença no que
tange a responsabilidade sobre o filho. Não assumir a paternidade, ou o abandono dos
filhos pelo pai, acarreta um impacto menor do que o não exercício da maternidade.
Tido invariavelmente como polêmico, o aborto há muito vem sendo discutido,
ora apontado como problema, ora como solução. Uma breve observação histórica verá
que tal prática teve diferentes olhares, posicionamentos e valores conforme as
sociedades, períodos históricos e traços culturais. Gregos, romanos, estóicos e cínicos,
segundo Martielo (1994), chegavam aconselhar a prática ilimitada do aborto. Grandes
pensadores como Aristóteles e Platão pregavam a utilidade do aborto, como meio de
conter o aumento populacional, que acreditavam ser a fonte inesgotável da miséria
humana. Já Sócrates admitia o aborto como a própria liberdade de opção pela
interrupção da gravidez. Porém, na época da República Romana, o aborto foi
considerado algo imoral, entretanto, teve larga utilização entre as mulheres que se
preocupavam com aparência física e que nesse período assumiram grande importância
5
no meio social romano. Devido ao aumento do aborto por tal motivo, houve a
necessidade de considerá-lo crime previsto em lei. É interessante ressaltar que os persas,
segundo o autor, adotavam um sistema de repressão à mãe e ao pai, colocando ambos
como responsáveis pelo aborto. Eram, em conjunto, submetidos à execração pública e,
por fim, executados. Portanto, somente com o surgimento do Cristianismo alterou-se
profundamente a visão que se tinha a respeito do aborto, haja vista o aparecimento da
crença de que o homem possuía uma alma imortal, bem como a figura de um Deus
onipresente que provinha e que somente a Ele era cabível o poder da vida e da morte.
Em suma, o Cristianismo, dentro da sua estrutura dogmática, jamais deixou de ser
contrário ao aborto, estabelecendo discussão entre os filósofos, com divergências que
residiam na questão de o feto possuir ou não uma alma dada por Deus, herança histórica
ainda presente nas discussões cientificas, religiosas e de senso comum. Por isso, o
aborto é um ato ainda tão polêmico e traz à tona, em sua não legalização, toda a forma
de pensar, costumes, regras, poderes político e econômico e diversos fatores de uma
determinada sociedade.
Esse pensamento se coaduna perfeitamente com a proposição da feminista
Beverly W. Harrison, também teóloga: a coerção das mulheres, pela esterilização
forçada ou por uma gravidez forçada, legitima o poder injusto sobre relações humanas
de intimidade e ferem o coração da nossa capacidade de relações sociais morais.
Assim, segundo Muraro (2001), impor a qualquer mulher, mesmo seguidora de
um credo religioso, uma norma que restringe sua liberdade, é impedi-la de exercer sua
capacidade moral de julgamento e decisão. É negar-lhe sua humanidade.
Aparentemente, a Igreja ainda exerce influência como exemplificação, podemos citar os
quinze países católicos da América Latina, que continuam mantendo uma rígida
legislação contra o aborto. Se a mulher é católica, que ela assuma as responsabilidades
perante sua religião e não faça aborto. Mas e todas aquelas que não são ligadas a essa
religião e que são punidas por uma lei claramente influenciada pela posição do
catolicismo?
Observa-se que essa definição varia culturalmente entre as sociedades, pois em
algumas não existe nem mesmo uma aceitação em caso de riscos de vida da mãe por
causa da gravidez, em casos de estupros, de acordo com a legislação e valores de certos
países e também havendo uma variação na permissão do tempo de vida do feto a ser
6
abortado. Com o aborto legalizado a sociedade seria menos hipócrita e morreriam
menos mulheres, de acordo com Muraro (2001).
Nota-se que o aborto envolve polêmica em sua legalização e indagações são
colocadas cada vez mais em pauta e recentemente a mídia tem dado uma repercussão a
essa questão. Por que o aborto no Brasil não é legalizado, sendo-o em outros países,
como grande parte da Europa, EUA e, recentemente, até Portugal e México, países
predominantemente católicos? O ministro da Saúde, José Temporão, disse para redação
do site Terra que a proibição do aborto no País tem um viés machista e que o tema é,
antes de tudo, de saúde pública e não apenas "religiosa, ética, filosófica ou
fundamentalista”.
Temporão afirmou que gostaria de ouvir as mulheres. Para ele as manifestações
são majoritariamente compostas por homens. E observou que, infelizmente, os homens
não engravidam. Se engravidassem, essa questão já estaria resolvida há muito tempo. E
acrescenta que “as mulheres é que sofrem e se vêem sozinhas e as leis são feitas pelos
homens", argumentou. Para ele, a sociedade brasileira evoluiu bastante nos últimos anos
e a discussão sobre aborto não pode mais ser considerada apenas do ponto de vista
religioso ou ético e sim do prisma da saúde pública. "Eu tenho tentado há muito tempo
tirar essa discussão da questão ética, religiosa, filosófica e do fundamentalismo e trazêla para o campo real da dor, da morte e do sofrimento", comentou o ministro.
A polêmica sobre a liberação do aborto no Brasil (e no mundo) é antiga, mas
reacendeu com a chegada do papa Bento XVI ao Brasil, no ano de 2007. O presidente
Luiz Inácio Lula da Silva disse em entrevista às redes católicas de rádio e TV, que é
pessoalmente contra o aborto, mas que o governo tem que tratar o tema no âmbito da
saúde pública. Esse tipo de abordagem vai contra os interesses da Igreja, que pretende
manter a proibição para a prática no Brasil. Segundo Temporão, um estudo norteamericano apontou que no Brasil são feitos cerca de um milhão de abortos clandestinos
por ano. "Quem sofre mais são as mulheres pobres. As mulheres de classe média ou alta
podem recorrer a clínicas clandestinas com alguma segurança", salienta. Rose Marie
Muraro concorda: “Sou a favor da descriminalização do aborto em qualquer caso,
principalmente por causa das mulheres de baixa renda. As mulheres de classe média
pagam o aborto e não sofrem tanto. Já as mulheres mais pobres, muitas vezes são
obrigadas a manter relações sexuais com os maridos sem preservativo. Ficam sujeitas ao
7
aborto porque não conhecem os métodos anticoncepcionais. O único método é fazer o
aborto em más condições.”
Portanto, o interesse deste artigo foi desenvolver uma reflexão sobre até que
ponto a influência religiosa sobre o estado brasileiro mesmo sendo laico acaba
delimitando a legalização do aborto na sociedade brasileira. Para isso, é de grande
importância para análise a lei da laicidade brasileira, pois através da lei percebemos não
somente os valores, os costumes, as crenças de uma sociedade refletida como também
as possíveis colisões com moral estabelecida nela. A lei acaba sendo, assim podemos
dizer uma narrativa mestra da nação, e disso deriva a luta para inscrever uma posição
nela e obter legitimidade e audibilidade dentro dessa narrativa. Para Bourdieu (1989),
trata-se de verdadeiras e importantes lutas simbólicas. Exemplos como a luta em torno
da questão do aborto e do casamento gay são particularmente reveladores, pois neles se
encontra em jogo não meramente a legislação sobre tais práticas, já que essas encontram
caminho com ou sem a lei, mas o próprio status de existência e legitimidade, na nação,
das comunidades morais que as aceitam reconhecendo-as.
Discursando sobre a historicidade e a expansão dos direitos, Bobbio (1991) nos
coloca:
[...] os direitos do homem constituem uma classe variável, como a história
destes últimos séculos demonstra abundantemente. A lista dos direitos do
homem modificou-se e continua a se modificar com a mudança das
condições históricas, ou seja, das necessidades, dos interesses, das classes no
poder, dos meios disponíveis para sua realização, das transformações técnicas
etc. [...] Direitos que tinham sido declarados absolutos em fins do século
XVIII, como a propriedade sacré et inviolable, foram submetidos a radicais
limitações nas declarações contemporâneas; direitos que as declarações do
século XVIII sequer mencionavam, como os direitos sociais, estão
proclamados com grande ostentação em todas as declarações recentes. Não é
difícil prever que no futuro poderão surgir novas exigências que agora nem
conseguimos vislumbrar (ênfase minha) [...] (Bobbio 1991:56-57).
Neste sentido acredita-se que novos estudos possam ser realizados a partir das
questões abordadas inicialmente, por ser de grande importância e complexidade a
temática aqui apresentada, possibilitando uma melhor compreensão para teóricos,
profissionais e também pessoas interessadas sobre o assunto que, de certa forma,
compartilham deste universo.
8
2. OBJETIVOS
Analisar a questão da lei da laicidade do estado brasileiro junto com seus
dispositivos da sua Constituição frente à proibição do aborto no Brasil.
2.1 Objetivos específicos
Mostrar se ou como os fatores religiosos e políticos influenciam na questão da
proibição do aborto
Verificar a construção da representação da mulher na sociedade brasileira.
3. METODOLOGIA
Num primeiro momento foi realizado um levantamento bibliográfico sobre
aborto e a laicidade brasileira. Este estudo foi desenvolvido por meio de pesquisa de
campo exploratória, com abordagem qualitativa, tendo em vista a intenção de
compreender as questões da proibição do aborto, frente a esse processo, que envolve
também outras questões como jurídicas, religiosas e de saúde pública.
A pesquisa exploratória é uma categoria que tem por objetivo proporcionar
maior familiaridade com o problema, tendo em vista torná-lo mais explicito ou
aproximar idéias (GIL, 1995).
Segundo Minayo (1994, p.21), a pesquisa qualitativa responde a questões
muito particulares, preocupando-se com o nível da realidade que não pode ser
qualificada, trabalhando com um universo de significados, motivos, aspirações, crenças,
valores e atitudes, o que corresponde a um espaço mais aprofundado da relação dos
processos e dos fenômenos que não pode ser reduzido à operacionalização.
Foi também um estudo descritivo, pois a pesquisa descritiva verifica se o
pesquisador já vivenciou a primeira aproximação, que é a exploratória e, num segundo
momento, levanta as características conhecidas, componentes do fato, fenômeno ou
processo, podendo ser realizado também com observação sistemática (FLEMING,
2005).
9
Após a pesquisa bibliográfica e as questões norteadoras que objetiva delimitar o
objeto de análise foi iniciado por meio de coleta de dados que consistiram na lei da
laicidade do estado brasileiro junto com seus dispositivos da sua Constituição, as leis e
artigos, informações, dados sobre a prática abortiva. Posteriormente, da conclusão das
pesquisas bibliográficas e do levantamento das leis foi desenvolvido uma análise sob o
viés da história antropológica com o propósito de se investigar a possível existência de
elementos de influência religiosa na lei da laicidade do estado brasileiro que pode assim
levar a não legalização do aborto no Brasil.
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Portanto, na difícil tarefa de abordar o assunto que consiste o aborto, existe uma
tentativa de analisar os fios que estão amarrados e envolvidos, fios que são as questões
de saúde pública, das mulheres, dos âmbitos jurídicos e das religiões nesse fio condutor
“proibição do aborto” discutido no presente artigo e perceber que a legalização ou não
da tal prática é uma disputa de poderes. Observamos através da discussão sobre a
laicidade que não existe apenas um modelo universal de Estado Laico que se pode
aplicar indistintamente a todos os países que adotam o regime de separação entre o
Estado e as Igrejas. Existem sim dois modelos básicos de laicidade estatal que consiste
em um mais aberto e outro mais fechado à incursão do fenômeno religioso no espaço
público. Assim, a atual Constituição Federal do Brasil sufraga um modelo de laicidade
que favorece o fenômeno religioso e nela se encontra elementos que levam a uma
abertura maior para a incursão da religião no espaço público. A aplicação e a
interpretação do direito e dos fatos relacionados com o exercício da liberdade religiosa
visto sob um viés histórico antropológico nos traz como a sociedade se comporta diante
de tal procedimento, seus tabus e suas questões morais, culturais e religiosas frente a
prática do aborto. Frente a tudo isso, nota-se que o tabu do aborto está longe de ser
solucionado seja no campo moral ou na prática social, porém a sua discussão e reflexão
não podem ser silenciadas.
Portanto, a pesquisa deve ser vista como um procedimento formal, um método
de pensamento reflexivo, de tratamento científico. Desta forma, a pesquisa possui a
tarefa de contribuir para o conhecimento da realidade ou das verdades parciais. Enfim, a
10
pesquisa busca respostas num determinado universo para comprovações de diversas
questões, como é o caso deste trabalho.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito penal: parte especial. São Paulo:
Saraiva, 2004.
BOBBIO, Norberto. Sobre el fundamento de los derechos del hombre. In: El tiempo
de los derechos. Madrid: Editorial Sistema, 1991.
BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1989.
BRASIL, Constituição (1988). Constituição da republica federativa do Brasil.
Brasília, DF: Senado, 1988.
CAPEZ, Fernando. Curso de direito penal, volume 2: parte especial: dos crimes
contra a pessoa a dos crimes contra o sentimento religioso e contra o respeito aos
mortos. São Paulo: Saraiva, 2006.
CARDOSO, Ciro Flamarion, VAINFAS, Ronaldo. Domínios da Historia: Ensaios de
Teoria e Metodologia. Rio de Janeiro: Campus, 1997.
ELUF, Luiza Nagib. O aborto e o Código Penal in: PINSKY, Jaime. Brasileiro (a) é
assim mesmo: cidadania e preconceito. São Paulo: Contexto, 1993.
FOUCAULT, Michael. A História da Sexualidade I: a vontade de saber. São Paulo:
Graal, 1979.
DEL PRIORE, Mary (Org.). História das mulheres no Brasil. São Paulo: Contexto,
1997.
DUBY, George, PERROT, Michelle. História das Mulheres no Ocidente. São Paulo,
Ebradil, 1991.
HURST, J. A história das idéias sobre o aborto na Igreja Católica, in Hurst, Jane e
Rose Marie Muraro, Uma história não contada, Montevideo, Católicas por el Derecho
a Decidir, 1992.
MARTIELO, Fabrício Zamprogna. Aborto e direito penal. Porto Alegre: Sagra, 1994.
MURARO, Rose Marie, BOFF, Leonardo. FEMININO E MASCULINO: Uma Nova
Consciência para o Encontro das Diferenças. Sextante: Rio de Janeiro, 2000.
11
MURARO, Rose Marie, PUPPIN, Andréa Brandão. Mulher, gênero e sociedade.
Relume –Dumara: Rio de Janeiro, 2001.
ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DA SAÚDE. Aborto espontâneo e provocado.
Genebra, 1990.
SANTOS, Aloísio Cristovam Junior. A liberdade de Organização Religiosa e o
Estado laico Brasileiro. São Paulo: Mackenzie, 2007.
SCOTT, Joan W. Gênero: uma categoria útil para analise histórica. Recife: SOS
Corpo, 1991.
SORIANO, Aldir Guedes. Liberdade religiosa no direito constitucional e
internacional. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002.
TEDESCO, João Carlos; Maciel, Elisabeth Nunes. Revista Temas Sociais em
Expressão. Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões. – Vol.1.
URI: Frederico Westphalen, 2002.
TOCCI, Arturo. II Procurato Aborto, Trattato Medico-Legale. Milão: Giuffre, 1994.
Fontes:
NUNES, Maria José Rosado. Aborto, maternidade e a dignidade da vida das
mulheres.
Disponível
em
<HTTP://
/www.patriciagalvao.org.br/novo2/textoZecaRosado.htm>Acesso em 29 de julho de
2007.
RIBEIRO, Jéferson. Redação Terra: Discussão sobre aborto é machista, diz
ministro.
Disponível
em
<http://noticias.terra.com.br/brasil/visitadopapa/interna/0,,OI1602648-EI8325,00.html>
Acesso em 12 de novembro de 2007.
FÓRUM DE ENTIDADES NACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS. Para os
cientistas,
aborto
nem
sempre
é
crime.
Disponível
em
http://www.direitos.org.br/index.poption=com> Acesso em 15 de fevereiro de 2009.
12
Download