O ENSINO DA HISTÓRIA DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA E AS FONTES Eva Waisros Pereira/UNB Lúcia Maria da Franca Rocha/UFBA Introdução O presente estudo é o resultado de reflexões sobre a utilização das fontes no ensino da História da Educação Brasileira, decorrente de pesquisa realizada pelas autoras, ao longo de três semestres letivos, junto a alunos de graduação do curso de pedagogia e de outras licenciaturas. A metodologia utilizada teve por base o desenvolvimento de um trabalho pedagógico, de caráter experimental, no qual aliou-se o conteúdo da disciplina a atividades específicas relacionadas às fontes. A idéia de trabalhar com documentos em sala de aula emergiu da preocupação de fazer o aluno compreender que a história é uma construção e não mero reflexo dos acontecimentos, e que o historiador, no seu ofício, utiliza-se das fontes como matéria prima indispensável para construir o fato histórico, a partir do seu objeto de estudo e da problemática proposta. Ao iniciar os alunos nos caminhos da produção do conhecimento histórico, teve-se, sobretudo, a pretensão de mostrar-lhes que o resultado da pesquisa, materializado em livros e textos, não traduz uma verdade absoluta e um saber definitivo, uma vez que essa produção depende da postura teórica do historiador e das escolhas que realiza. Os resultados alcançados, embora ainda preliminares, indicam a efetividade da utilização das fontes no ensino da História da Educação Brasileira e sua contribuição para o fortalecimento teórico e prático da formação docente. Um novo olhar sobre a História da Educação Brasileira Estudos recentes evidenciam que a disciplina História da Educação Brasileira, desde a sua origem, tem sido marcada pelo caráter utilitário, sendo a sua eficácia medida não pelo que é capaz de explicar e interpretar dos processos históricos objetivos da educação, mas pelo que oferece de justificativas para o presente e de guia para a construção do futuro (Warde, 1990: 9). Nessa ótica, o conhecimento histórico tem em vista a melhoria das práticas pedagógicas. Em face da relevância atribuída às práticas pedagógicas nos cursos de formação de professores, tornava-se necessário dar respostas imediatas aos problemas que surgiam na ação educativa. Daí, no dizer de Warde (1998:91), a História da Educação estar marcada pela pragmatização. Prevalecia o entendimento de que a disciplina, ao estabelecer relação mecânica entre o passado, o presente e o futuro, possibilitaria, mediante o estudo do passado, compreender o presente e intervir no futuro, evitando que se cometessem os mesmos erros dos antepassados. No entanto, como questionam Lopes e Galvão (2001: 26), teria a História da Educação esse poder? Pesquisas que avaliam a produção científica na área identificam um número significativo de estudos em História da Educação pautados por narrativas que desconsideram as descontinuidades, retrocessos, ambigüidades e contradições que caracterizam a História (LOPES; GALVÃO, 2001: 38). Esses estudos concebem o processo histórico de forma linear, desenvolvendo-se mediante etapas sucessivas, numa marcha contínua rumo ao progresso, ignorando as práticas educativas dos vencidos e assumindo um caráter homogeneizador. Como assinalam Cabrini et al (2000: 36), esses conteúdos “tradicionais” (...) procuram reconstituir uma totalidade enganosa, uma única história (...).. Não obstante, os pressupostos positivistas que fundamentam essa concepção de história têm sido criticados por outras tendências, como o marxismo, e, mais recentemente, pela Nova História. Warde (1998: 94-95) destaca a recente aproximação e identificação da História da Educação com os processos cognitivos em curso no campo específico da história, fenômeno esse que atribui a diversos fatores, especialmente à proeminência da História Cultural sobre outras vertentes da História. Em decorrência dessa aproximação, significativas mudanças vêm ocorrendo no campo da História da Educação, configurando novos problemas, novas abordagens e novos objetos (NUNES, 1992:151). A influência culturalista no campo da história da educação é comentada por Warde (1998: 96): Em primeiro lugar, e por uma razão de mais longo alcance, penso que os educadores, enfim, encontraram a partir da História, um lugar adequado, para acomodar a educação. A cultura é indiscutivelmente um bom lugar para inscrever os objetos, os sujeitos, as práticas e as instituições educacionais. Aliás, foi preciso ler os novos historiadores da cultura para se ter revalorizados muitos dos temas menosprezados no campo pedagógico (...). Em segundo lugar, incitados a citar novos objetos, novos problemas, a história cultural abriu para os educadores um manancial inesgotável de novas fontes. No entanto, pesquisadores constatam que os novos conhecimentos produzidos, em geral, não chegam à sala de aula, gerando a desatualização e a desvinculação entre as atividades de ensino e de pesquisa. Como diz Rodrigues (2002:586): A existência de uma defasagem e incongruência entre a produção historiográfica e os conhecimentos constantes dos programas e atividades dos professores no ensino de História e História da Educação parece ser recorrente nos diversos estudos já realizados sobre as mesmas. Entretanto, parece haver controvérsias em torno das formulações teóricas que se manifestam no sentido de explicar essa questão, pois essa é uma problemática das mais contingenciais na explicação dos fatores que permeiam o ensino, principalmente em relação às clivagens entre ensino e produção do conhecimento, ensino e pesquisa ou disciplina escolar e área acadêmica. Esses conhecimentos trouxeram novos elementos para repensar o ensino da disciplina, uma vez que as novas abordagens permitem que se analise o objeto de estudo sob diversas perspectivas, fazendo emergir aspectos antes ignorados, desconsiderados ou secundarizados, desnaturalizando algo já dado, desconstruindo o que já estava assentado, enfim, possibilitando a releitura do fato histórico. Partindo da concepção de história como construção, da qual o homem é o agente principal, nega-se o mito do saber acabado e da história como verdade absoluta (CABRINI, 2000: 43). Essa postura teórica implica na adoção de práticas educativas que levem o estudante a valorizar a diversidade de pontos de vista, a refletir criticamente a respeito, a levantar indagações, criando, assim, um espaço de embate diante do próprio saber. Dessa forma, o aluno é estimulado a exercer a sua condição de ser intelectualmente ativo e capaz de construir o seu próprio percurso para a apropriação do conhecimento, o que se contrapõe radicalmente à prática vigente, que transforma em mercadoria o conhecimento como produto pronto e acabado. As estratégias adotadas no ensino da disciplina O trabalho pedagógico a que se refere este estudo desenvolveu-se com turmas de História da Educação Brasileira constituídas por alunos de graduação em pedagogia e de demais licenciaturas, que possuiam experiências diversas. Muitos deles, inclusive, já se encontravam no exercício do magistério do ensino fundamental e médio. O programa da disciplina estruturou-se com base na tradicional periodização Colônia, Império e República, buscando aliar à cronologia temas que pudessem traduzir questões educacionais relevantes de cada época. Com essa opção, pretendeu-se, por um lado, tratar de todos os períodos considerados importantes na nossa História da Educação, e, por outro, estudar assuntos consagrados pela discussão na área, bem como aqueles que, embora importantes, só recentemente vêm sendo objeto de análise dos pesquisadores. Assim, os textos selecionados não se limitavam a oferecer ao aluno uma visão geral da trajetória da escola brasileira, mas permitiam uma leitura da história da educação sob uma pluralidade de perspectivas. Na tentativa de compatibilizar a nossa prática docente com os pressupostos que sustentam a nossa visão de educação e de história, buscamos no desenvolvimento do conteúdo propiciar condições para que os alunos, mediante a sua atividade, pudessem apropriar-se criticamente dos conhecimentos. As estratégias adotadas visavam fundamentalmente a provocar no aluno uma reflexão histórica sobre o objeto de estudo. Sistematicamente discutiram-se os textos, procurando tornar explícitas as relações que surgiram em cada momento da História da Educação, seu caráter dinâmico e contraditório, bem como as diferentes situações e especificidades que apresentavam. Exemplo disso é o estudo que realizamos em sala de aula sobre a escolarização dos meninos e meninas em Minas Gerais durante o Período Imperial, que veio oferecer maior concretude à temática, uma vez que as macroanálises tendem a obscurecer aspectos relevantes devido a seu caráter generalizador. No intuito de exercitar o raciocínio histórico, priorizou-se, no decorrer das aulas, a expressão oral dos alunos, visando a que levantassem questões acerca do objeto de estudo, bem como refletissem sobre questões que nós, professores, formulávamos. Isso fez com que percorressem um caminho próprio, onde se colocavam indagações a respeito dos fatos educacionais, de como foram e se poderiam ter sido diferentes, o que influiu para que fossem de uma forma e não de outra, quais foram os seus protagonistas, que interesses estavam em jogo, o porquê de determinados agentes históricos não terem sido considerados, etc. O trabalho com as fontes em sala de aula Ao iniciar as atividades com as fontes, utilizou-se a literatura sobre o assunto, a fim de que os alunos tivessem a compreensão do seu significado intrínsico à pesquisa historiográfica. Nesse sentido, nos detivemos na discussão de alguns aspectos importantes, quais sejam: - as fontes não espelham fielmente a realidade e são representação parcial de um objeto; - as fontes constituem o testemunho daqueles que as produziram; - as fontes não falam por si; cabe ao historiador interrogá-las, relêlas e explicar as mensagens nelas contidas. - a diversidade de fontes atualmente utilizadas em história da educação, desde as mais tradicionais, como os documentos escritos, oficiais ou não, leis, portarias, atas, relatórios, discursos, cartas, revistas, jornais, etc., até aquelas menos convencionais de que os historiadores atualmente lançam mão, como depoimentos orais, iconografia, vídeos, filmes, programas de TV, Internet, e outros testemunhos de linguagens diversas. Para cada unidade do programa, selecionamos fontes com conteúdos estritamente relacionados aos textos discutidos em sala de aula. Assim, por exemplo, na educação colonial, optamos pelas Cartas dos Jesuítas; na instrução escolar durante o Império, utilizamos a legislação (Constituição de 1824; o Ato Adicional de 1834; a Lei Geral de Instrução Primária, de 15 de novembro de 1827); no período republicano, o documento escrito (O Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, de 1932), além de vídeos, dentre eles, o que trata da repressão à Universidade de Brasília durante a ditadura militar. Essa relação proposital entre as fontes e o conteúdo estudado teve em vista possibilitar aos alunos compreensão mais clara de que as fontes testemunham pensamentos e ações dos sujeitos do processo histórico no qual surgiram. Para o desenvolvimento dessas atividades, foram organizados grupos de trabalho, cabendo aos próprios alunos a escolha dos seus parceiros. Cada grupo deveria fazer uma leitura cuidadosa do documento e levantar questões. Essa tarefa, num primeiro momento, apresentou um certo grau de dificuldade para os alunos, porque, segundo seus depoimentos, estavam habituados a assimilar passivamente o conhecimento que lhes era transmitido. O nosso intento era, justamente, o de provocar o exercício da reflexão, especialmente em se tratando de futuros professores, que devem ter consciência de que são agentes históricos e sujeitos capazes de produzir o seu próprio conhecimento. Acrescente-se, ainda, que a dificuldade de formular questionamentos, a que nos referimos acima, advém também dos condicionamentos existentes nos alunos – e que existem nas pessoas em geral - de que os documentos escritos se impõem como verdades. No intuito de minimizar as dificuldades apontadas e colaborar para que os alunos viessem a desvelar as fontes e procurando exercitar o raciocínio deles para desenvolver uma interpretação, nós, professores, levantávamos indagações à semelhança das que os historiadores fazem durante o seu trabalho de pesquisa. Assim, formulávamos as perguntas usuais: o quê? quando? onde? como? por quê? para quê?, etc. Importante ressaltar que, durante as discussões, surgiam com freqüência questões relacionadas com as experiências vividas pelos alunos, o que lhes possibilitava se entenderem como seres históricos e perceberem os conhecimentos a partir de suas experiências próprias. Exemplo disso, quando se discutia a educação jesuítica, foi o depoimento de uma aluna ao relatar que estudou numa escola católica e que ficou marcada pelo rigor disciplinar e ameaças de castigo e de pecado, em caso de desobediência às normas vigentes. O fato relatado contribuiu para que ela percebesse a lentidão das mudanças na educação e suas permanências. No desenvolvimento das atividades, fomos introduzindo diferentes tipos de documentos e propondo reformulações nos procedimentos, a partir das avaliações realizadas, no decorrer do curso, com a participação dos alunos. A cada semestre dávamos um destaque maior a determinadas atividades relacionadas às fontes. Assim, num dos semestres realizamos, como atividade final da disciplina, um trabalho sobre o tema: Origem do Sistema de Educação Pública no Distrito Federal - década de 1960, relacionado à pesquisa que nós, professores, estávamos desenvolvendo. Os alunos envolveram-se na coleta de documentos e, por nossa orientação, foram a arquivos, como ao Centro de Documentação da Universidade de Brasília, Arquivo Público do Distrito Federal, Instituto Histórico-Geográfico do Distrito Federal, entre outros, realizaram pesquisa bibliográfica, bem como buscaram documentos e informações em diversas instituições públicas de ensino criadas nos primórdios da construção da Nova Capital. Na visita realizada à primeira Escola Parque de Brasília, um grupo de alunos filmou as suas dependências, apresentando posteriormente essa filmagem aos seus colegas em sala de aula. Nesse processo de coleta de documentos, houve, inclusive, iniciativa por parte de alguns estudantes de entrevistar professores pioneiros, em busca de maiores informações. A partir dos dados coletados, os grupos apresentaram relatório sucinto a respeito e socializaram as informações obtidas ao conjunto de alunos das respectivas turmas. Ao final do semestre letivo, organizamos, juntamente com os alunos, uma exposição sobre o tema, no saguão principal da Faculdade de Educação. Foram expostos documentos sobre a criação do sistema educacional, fotografias, recortes de jornais, cartas, depoimentos de alguns pioneiros e dados biográficos sobre Anísio Teixeira, responsável pela elaboração do Plano de Construções Escolares de Brasília. Essa documentação tratava da educação escolar em seus diferentes níveis, ressaltava as inovações propostas e as relacionava a experiências anteriores, como a da Escola Parque, em Salvador. No semestre seguinte, por ocasião da comemoração dos 70 anos do Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, considerando que o mesmo representa um marco na educação brasileira, deu-se ênfase a esse documento no trabalho que realizamos sobre as fontes. Sob a nossa orientação, os alunos organizaram um acervo, que foi exposto ao público. Essa atividade culminou com um Seminário, que contou com a presença de professores convidados que pesquisam sobre o assunto. Os alunos participaram do evento como parte da atividade programada, levantando questões bastante pertinentes. A visão dos alunos sobre as atividades com as fontes As atividades de avaliação a que procedemos no decorrer do curso mostram que, de forma geral, a disciplina contribuiu para que os alunos alcançassem uma maior compreensão da educação brasileira, especialmente dos problemas que se apresentaram nas diferentes épocas e de como os agentes históricos atuaram na tentativa de superá-los. Nesse sentido, é bastante significativa a fala de um estudante da licenciatura de matemática: A disciplina contribuiu bastante para a minha formação, pois aprendi a ter uma visão mais clara e mais crítica a respeito dos problemas e das estruturas educacionais. A única mágoa que tive é que aprendi a ter essa visão apenas no final da minha graduação. Na mesma direção, outro aluno reiterou a importância da disciplina para a sua formação, ao fazer a seguinte declaração: Eu tinha uma noção intuitiva sobre muitos dos assuntos estudados, porém a análise aprofundada de alguns tópicos foi essencial para melhorar a minha formação, até como cidadão. Tais assertivas são sinais de que a disciplina vem contribuindo para a formação acadêmica dos estudantes, influenciando o seu desenvolvimento pessoal e dotando-os de instrumentos capazes de favorecer sua futura atuação profissional. Mais do que isso, ao afirmarem a melhoria da sua formação, enquanto cidadãos, demonstram que o processo educacional repercutiu na dimensão política. Os depoimentos que atribuem importância às contribuições da disciplina na formação profissional referem-se particularmente ao desenvolvimento do senso crítico e ao repúdio à passividade, sustentando a importância de se trazer em sala de aula diferentes versões dos fatos históricos. Essa tomada de consciência estaria induzindo a uma nova prática docente. Como declara uma aluna, quando eu for educadora atuante, lembrarei dos aspectos abordados durante as aulas, procurarei redirecionar minha prática. A introdução das fontes como objeto de estudo durante o desenvolvimento da disciplina mereceu uma avaliação específica, realizada mediante um pequeno questionário que formulamos, com o objetivo de obter informações sobre a percepção dos estudantes no tocante à atividade. Em princípio, parece ter sido consensual a opinião de que esse trabalho despertou grande interesse e motivou os alunos, tornando as aulas mais dinâmicas, dada a diversidade das fontes. Particularmente, alguns estudantes ressaltaram a importância dos vídeos utilizados: A vida de Anísio Teixeira e Barra 68, este último um documentário sobre a repressão na UnB durante a ditadura militar. O interesse nas atividades empreendidas foi assim expresso nas palavras de uma aluna: é gostoso, prazeroso, ter em mãos documentos com a linguagem da época e de manifestações ocorridas há tanto tempo. A nossa preocupação de aliar os documentos com a literatura estudada, ensejou que perguntássemos aos alunos se essa relação favoreceu a aprendizagem dos conteúdos trabalhados na disciplina. Os depoimentos a esse respeito apontam para a validade do uso das fontes. O fato de os alunos perceberem que a história é uma construção, cuja matéria prima são as fontes, e que os fatos históricos podem ter várias interpretações, parece-nos ter sido uma das razões pela qual alcançaram maior compreensão sobre os textos analisados, dado o entendimento de que os mesmos não são portadores de uma verdade absoluta, definitiva e única. É nesse sentido que se configura o depoimento de uma aluna: (...) através das fontes de pesquisa os alunos têm a chance de entender melhor as idéias dos historiadores e até tirarem as suas próprias conclusões. Note-se, porém, que o nível de compreensão dos alunos a respeito do significado das fontes de pesquisa no campo da História da Educação apresentou variações, em virtude da heterogeneidade das turmas, derivada especialmente da natureza dos cursos de licenciaturas dos quais provêem. Para alguns alunos, o documento serve para comprovar os fatos históricos e, assim, dar credibilidade ao conhecimento produzido pelo historiador. Nesse caso, a premissa a que se referem é a veracidade do documento. Para outros, as fontes contribuem para tornar o conhecimento mais real, ou seja, tirar o tema apresentado do campo abstrato. Exemplificando esse entendimento, uma aluna diz: É o caso das Cartas dos Jesuítas, que aproxima a gente um pouco mais do passado. Há ainda depoimentos que mostram a importância das fontes primárias, por permitirem ao estudante adquirir conhecimento e percepções próprias, ao invés de somente repetir as opiniões de comentadores e historiadores. Tal percepção acentua-se em outras falas em que os alunos referem-se ao ofício do historiador. Uma delas assinala que: As fontes de pesquisa são indispensáveis ao trabalho do historiador. O historiador não inventa a História, ele constrói um conhecimento a partir daquilo que as fontes concedem. Sem fontes não há como “fazer” História. Outra fala reforça esse ponto de vista, ao afirmar que É de extrema necessidade que o historiador vá direto à fonte, pois se ficar dependendo das interpretações de outrem, formará um juízo, digamos, viciado – algo até fácil, já pronto, impregnado da ideologia de outrem. (...) É importante que ele construa sua interpretação da fonte, não desprezando, é claro, as interpretações existentes. Importante reflexão sobre o uso de fonte partiu de um aluno de História, que certamente possui maior embasamento teórico, ao pontuar que Ao se trabalhar com fontes são necessários conceitos básicos de Teoria e Metodologia da História. (...) Deve-se ter critério com as fontes, para evitar erros correntes no senso comum, como por exemplo, a transposição de conceitos, signos e ícones nitidamente contemporâneos, para épocas e acontecimentos cronologicamente anteriores, e que, conseqüentemente, possuem outro conjunto de representações. De todo esse trabalho realizado, dois aspectos relevantes foram levantados freqüentemente pelos alunos: o primeiro deles é o reconhecimento de que a metodologia de ensino adotada tem como cerne o desenvolvimento da capacidade de reflexão. Comentando sobre a importância desse enfoque, diz um aluno que com isso formamos a nossa própria concepção, (assim) a Universidade cumpre o seu papel: o de ensinar-nos a pensar. O segundo aspecto enfatizado é a importância da iniciação na atividade de pesquisa. Transparece, pelos depoimentos, que tal atividade não é usual no nosso curso de pedagogia. Como afirma uma estudante: foi uma novidade para mim e é muito importante, pois apesar de estarmos em uma universidade, as oportunidades de pesquisa são praticamente nulas. Esse fato é confirmado por um colega do curso de graduação em Biblioteconomia, ao dizer que foi a primeira vez que fiz um trabalho como este, para falar a verdade foi ele quem me fez entrar em um projeto de pesquisa no meu departamento sobre “Impacto Social da Informação”. Considerações finais O testemunho dos alunos coloca em evidência a importância de que se reveste a disciplina História da Educação Brasileira para a formação do educador. A postura teórica adotada tem-nos conduzido ao que Nunes (2002:44) preceitua como alargamento da concepção de espaços e fontes de aprendizagem, o que requer ir além da sala de aula, envolvendo atividades em bibliotecas, museus, teatros, arquivos de escolas, entrevistas, entre outras. O trabalho com fontes no ensino da História da Educação, de significado intrínseco para o campo disciplinar, apresenta esse caráter de ampliação de espaços e fontes de aprendizagem, distanciando-se, assim, de trabalhos centrados exclusivamente no livro didático. No desenvolvimento da disciplina, e particularmente nas atividades desenvolvidas com as fontes, chama-nos a atenção, sobretudo, o potencial que a mesma apresenta - na forma em que vem se estruturando -, para desenvolver o senso crítico e a autonomia intelectual do aluno. Segundo Nunes (2002:45), O grande desafio é fazer com que os docentes consigam (...) desenvolver um trabalho direcionado para o ideal de formação, que dote os jovens da capacidade de apropriar-se do conhecimento como instrumento criativo de inserção crítica na sociedade. Nessa perspectiva, a disciplina vem ao encontro dos objetivos essenciais atualmente preconizados para a formação do docente: um profissional reflexivo e autônomo, que seja capaz de refletir e tomar decisões acerca de sua ação educadora, construindo propostas de intervenção pedagógica, criando e recriando a sua prática, (NÓVOA, 1995). Dada a contribuição que a História da Educação Brasileira pode oferecer à construção de uma nova identidade do professor é fundamental repensar o ensino da disciplina, ampliando o desenvolvimento de pesquisas que possibilitem inovações nesse campo. Nesse sentido, a expectativa das autoras é de que os resultados deste estudo, embora preliminares, possam contribuir para ampliar a discussão a respeito do tema. Bibliografia CABRINI, Conceição et al. Ensino de história: revisão urgente. São Paulo: EDUC, 2000. LOPES, Eliane M. T.; GALVÃO, Ana Maria de O. História da Educação. Rio de Janeiro: DP&A, 2001. NÓVOA, António (Coord.). Os professores e a sua formação. Lisboa: Dom Quixote, 1995. NUNES, Clarice. História da Educação Brasileira: novas abordagens de velhos objetos. In: Teoria & Educação, Porto Alegre, (6), p. 151-182. ______ . História da Educação: interrogando a prática do ensino e da pesquisa. In: LOPES, Ana Amélia B. M. et al. (Org). História da Educação em Minas Gerais. Belo Horizonte: FCH/FUMEC, 2002, p. 38-57. RAGAZZINI, Dario. Para quem e o que testemunham as fontes da História da Educação?. Educar em Revista, Curitiba, (18), p. 13-28. RODRIGUES, JOSUÉ R. G. O ensino de história da educação no curso de Pedagogia. 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