Analgesia pós-operatória em descompressão medular cervical em

Propaganda
Analgesia pós-operatória em descompressão
medular cervical em cães – revisão
Viviane Shervesnquy Dubal
Jussara Zani Maia
Viviane Machado Pinto
Paulo Ricardo Centeno Rodrigues
Beatriz Guilhembernard Kosachenco
RESUMO
As descompressões cervicais são procedimentos cirúrgicos que provocam intensa algia
no pós-operatório devido à manipulação da musculatura epaxial, ligamentos, vértebras, medula
espinhal e raízes nervosas. A dor intensa é caracterizada por alterações comportamentais, como
latido e/ou gemido, automutilação, apatia, hiporexia/anorexia, e, quando não aliviada, ocasiona
efeitos prejudiciais ao organismo, podendo retardar a cicatrização tecidual. O protocolo de
controle da dor dos pacientes neurocirúrgicos deve iniciar com a analgesia preventiva, evitando
que os estímulos de dor cheguem ao sistema nervoso central. A analgesia deve ser mantida com
monitoramento constante no trans e no pós-operatório. Os fármacos mais utilizados são os
opióides, geralmente associados a drogas tranqüilizantes e/ou sedativas, ou a relaxantes musculares. A terapia multimodal que consta de associações de fármacos com diferentes modos de
ação facilita o planejamento do protocolo analgésico, pois reduz os efeitos adversos das drogas
e com o efeito sinérgico, potencializam a analgesia. Fisioterapia pós-operatória com eletroterapia
e laserterapia estão indicados como alternativas não farmacológicas para analgesia.
Palavras-chave: Analgesia. Cão. Descompressão medular. Dor. Opióide.
Post-operative analgesia in cervical spinal decompression in dogs
– review
ABSTRACT
The cervical decompressions are surgical procedures that provoke intense pain in the
post-operative period due to the manipulation of the epaxial musculature, ligaments, vertebrae,
spinal cord and nervous roots. The intense pain is characterized by disturbances on the mood
as bark or whine, self-mutilation, apathy, hiporexia or anorexia and when it is not diminished
causes harmful effects to the organism, being able of delaying the tecidual cicatrization. The
Viviane Shervesnquy Dubal é Médica Veterinária, Especialista, Residente Médica Veterinária R2, ULBRA/RS.
Jussara Zani Maia é Médica Veterinária, MSc., Professora de Anestesiologia Veterinária, ULBRA/RS.
Viviane Machado Pinto é Médica Veterinária, MSc., Professora de Anestesiologia Veterinária, ULBRA/RS.
Paulo Ricardo Centeno Rodrigues é Médico Veterinário, Especialista, Professor de Anestesiologia Veterinária, ULBRA/RS.
Beatriz Guilhembernard Kosachenco é Médica Veterinária, MSc., Professora de Cirurgia Veterinária, ULBRA/RS.
Endereço para correspondência: Av. Farroupilha 8001, Prédio 14, Sala 125. Bairro São José, Canoas/RS.
CEP: 92425-900. E-mail: [email protected]
p . 22007
8-37
v. 5 v.5, n.1,
n.1jul./dez.
2 8Veterinária em Foco Veterinária
Canoas em Foco,
jul./dez. 2007
protocol of the pain control on neurosurgical patients should begin with the preventive analgesia,
avoiding that the pain reaches the central nervous system. The analgesia should be maintained
with constant control in the trans and post-operative. The pharmacs often used are the opium
derivatives, usually associated with tranquilizer or sedative and also muscular relaxing drugs.
The multimodal therapy that consists on the drugs associations with different action mecanisms,
facilitates the planning of the analgesic protocol, because it reduces the adverse effects of the
drugs and as a result of the sinergic effect, they potentiate the analgesia. Post-operative
physiotherapy with electrotherapy and lasertherapy are indicated as non pharmacological
alternative for analgesia.
Key words: Analgesia. Dog. Spinal cord decompression. Pain. Opioid.
INTRODUÇÃO
As descompressões cervicais em cães estão indicadas em casos de discopatias
cervicais como hérnia de Hansen tipo I ou tipo II, presença de neoplasias em vértebras
cervicais, cordão espinhal e raízes nervosas, casos de espondilomielopatia cervical,
instabilidade atlanto-axial e fraturas e luxações da espinha cervical (SEIM III, 2002).
Segundo Seim III (2002) e Pellegrino et al. (2003), dentre as possibilidades cirúrgicas
para descompressão estão a laminectomia dorsal, hemilaminectomia, fenda ventral e
fenestração.
Conforme Podell (2003), os procedimentos cirúrgicos que envolvem musculatura
da região vertebral, ligamentos, vértebras, medula espinhal e raízes nervosas provocam
intensa algia no pós-operatório. Sendo assim, a analgesia pós-operatória destes
procedimentos inclui o uso de opióides como a morfina ou fentanil, que poderão ser
associados com drogas tranqüilizantes como a acepromazina ou o diazepam a fim de
obter-se efeito sinérgico (PADDLEFORD, 2001; CRUZ, 2002). Landoni (2005) refere a
utilização de antiinflamatórios não esteróides (AINEs) em combinação com analgésicos
opióides para analgesia pós-operatória em cirurgias de descompressão cervical. Outra
opção efetiva para reduzir a algia pós-operatória é a aplicação de adesivos de fentanil
(OTERO, 2005b). O objetivo deste trabalho é fazer uma revisão de literatura e atualização
no que concerne à dor e analgesia pós-operatória nas cirurgias de descompressão
medular cervical em cães.
DOR
A fisiologia da dor está centrada no sistema nervoso que se destina a captar
estímulos que se convertem em impulsos até o sistema nervoso central (SNC), sendo
que o efeito final é a produção de uma resposta comportamental do organismo
(PELLEGRINO, 2005). Dentro do SNC a informação transita pelas vias sensitivas que
chegam à medula espinhal e há também o córtex sensitivo com grande afluência de
neurônios do tálamo, sendo o responsável pela percepção consciente da dor e pelo
seu comportamento motivacional e afetivo (PELLEGRINO, 2005).
De acordo com Hansen (1993), as fibras nervosas delta A são denominadas
Veterinária em Foco, v.5, n.1, jul./dez. 2007
29
“rápidas” e são responsáveis pela dor aguda decorrente da lesão, permitindo ao animal
a localização do local da dor. As fibras nervosas C são denominadas fibras “lentas”,
sendo responsáveis pela dor secundária e menos intensa (PADDLEFORD, 2001).
Segundo o mesmo autor, também há fibras nervosas beta A que apresentam menor
limiar de estímulo que as anteriores e conduzem sensações táteis inócuas (formigamento,
cócegas).
Conforme Paddleford (2001) e Cruz (2002), o reconhecimento da dor nos
animais difere dos humanos já que sua manifestação não é verbal, apresentandose como alterações comportamentais a serem interpretadas. Os sinais fisiológicos
indicativos de dor incluem alterações cardiopulmonares como taquicardia,
taquipnéia, superficialização da respiração e palidez das mucosas ocasionada
pela vasoconstrição. Também é possível incluir midríase, salivação e
hiperglicemia. Os sinais comportamentais da dor são vocalização com latido e/ou
gemido, proteção do local dolorido, automutilação, inquietação, apatia e perda
de apetite (HANSEN, 1993).
A dor patológica está associada às cirurgias ou processos patológicos que
provocam lesões em órgãos ou tecidos, apresentando vários graus de intensidade
(PADDLEFORD, 2001). Cruz (2002) e Luttgen (2003) relatam que a presença de dor no
período pós-operatório pode contribuir para a elevação da concentração de cortisol
sérico e assim levar ao retardamento da cicatrização, sendo de fundamental importância
o conhecimento sobre a identificação da dor e seus mecanismos por parte do médico
veterinário (ALMEIDA et al., 2006).
Pisera (2005) cita que a dor pode ser de três tipos: fásica e aguda com duração
curta proporcional a sua causa, prolongada e subaguda com duração de horas a dias
podendo ser relacionada a procedimentos cirúrgicos doloridos, e dor crônica
relacionada a lesões teciduais cirúrgicas ou não.
A dor pode ser discreta quando facilmente tolerada, não levando a alterações
comportamentais. A dor moderada se origina quando o animal é submetido a um
procedimento cirúrgico, manifestando-se com alterações comportamentais. A dor
intensa leva o paciente a vocalização constante, automutilação e comportamento
totalmente anormal (PADDLEFORD, 2001). Para Almeida et al. (2006), o reconhecimento
do comportamento adotado pelo animal frente ao estímulo doloroso auxilia no
diagnóstico através da classificação da dor (Figura 1). Fantoni et al. (2005) referem que
procedimentos cirúrgicos que causem muita algia como cirurgias ortopédicas e de
coluna estão com pontuação 2 a 3. Bonafine e Pellegrino (2005) classificam a dor em
uma escala crescente de 1 a 5, sendo que a algia resultante de cirurgia de descompressão
medular recebe classificação 4 ou 5.
30
Veterinária em Foco, v.5, n.1, jul./dez. 2007
DOR PÓSOPERATÓRIA
(EM
PONTUAÇÃO)
0 SEM DOR
1 DOR LEVE
- ANALGESIA
COMPLETA
- SEM MAL-ESTAR
- SEM REAÇÃO A
MANIPULAÇÃO DO
LOCAL LESIONADO
- BOA ANALGESIA
- SEM MAL-ESTAR
- REAÇÃO À
MANIPULAÇÃO DO
LOCAL LESIONADO
2 DOR
MODERADA
- ANALGESIA
MODERADA
- COM MAL-ESTAR
- REAÇÃO À
MANIPULAÇÃO DO
LOCAL LESIONADO
3 DOR INTENSA
- SEM ANALGESIA
- SINAIS CLAROS DE
MAL-ESTAR
PERSISTENTE
FIGURA 1 – Pontuação utilizada para avaliação da dor pós-operatória segundo Fantoni et al. (2005).
Em casos de patologias compressivas da medula espinhal cervical as
possibilidades cirúrgicas incluem a laminectomia dorsal, hemilaminectomia, fenda
ventral e fenestração (SEIM III, 2002). Estes procedimentos apresentam pósoperatório muito doloroso pela manipulação exercida no canal medular, na região
próxima às raízes nervosas e por envolver a musculatura paravertebral, ligamentos
e tecido ósseo, exigindo uma terapia analgésica eficiente (PELLEGRINO et al.,
2003; PODELL, 2003). Os procedimentos neurocirúrgicos geralmente causam grande
sensação de dor para os pacientes da espécie humana (WHEELER e SHARP, 1999b).
ANALGESIA PÓS-OPERATÓRIA
A abordagem farmacológica do controle da dor no período pós-operatório deve
incluir diferentes fármacos a fim de se obter os efeitos máximos de proteção (MASSONE,
2003; RANKIN, 2004), pois a combinação de drogas proporciona a potencialização da
analgesia, como no uso de tranqüilizantes fenotiazínicos associados aos opióides
(OTERO, 2005b). Andrade (2002) e Hellebrekers (2002b) relatam que os diferentes
modos de ação dos fármacos no controle da dor favorecem a combinação dos mesmos,
a fim de obter sinergismo no uso (Tabela 1).
Veterinária em Foco, v.5, n.1, jul./dez. 2007
31
TABELA 1 – Modo de ação dos diferentes fármacos no manejo da dor.
Modo de ação dos diferentes fármacos no manejo da dor
Modo de ação
Fármacos
Inibição da percepção da dor
Anestésicos gerais, Opióides,
Benzodiazepínicos, Fenotiazínicos
Inibição da sensibilização central
Opióides, AINEs
Inibição da transdução
(sensibilização periférica dos nociceptores)
Corticosteróides, opióides, AINEs
Fonte: Andrade (2002).
Modo de ação dos diferentes fármacos no manejo da dor
Hellebrekers (2002a) e Fantoni et al. (2005) relatam que a analgesia preventiva é
uma medida de prevenção ou redução da dor pós-operatória realizada com a
administração de analgésicos antes que os estímulos nocivos cheguem ao SNC. Isto
ocorre através do controle da hipersensibilidade dos neurônios do corno dorsal da
medula espinhal causada pela sensibilização central. A administração de narcóticos
pré ou intra-operatórios reduz as necessidades de analgesia pós-operatória (WHEELER
e SHARP, 1999b). A prevenção da dor não está relacionada apenas com a administração
de drogas analgésicas em período conveniente, como na pré-anestesia, mas também
tem implicações evidentes no planejamento do protocolo para tratamento da dor após
a cirurgia (HELLEBREKERS, 2002b).
As cirurgias de descompressão cervical exigem muitos cuidados a serem tomados
no pós-operatório dos pacientes. Estes incluem o repouso absoluto, controle da micção,
troca de decúbito freqüentemente, manutenção do animal em local acolchoado e o
controle da dor pós-operatória (BAGLEY e WHEELER, 2001; LUTTGEN, 2003). Segundo
Fenner (1995), nas primeiras 24 horas após a cirurgia, o animal deve ter sua respiração
monitorada, pois a manipulação da medula espinhal cervical pode predispor à parada
respiratória e convulsões, principalmente, se o paciente tiver sido submetido à
mielografia antes da cirurgia. Conforme Seim III (2002), a algia pode induzir à aerofagia,
sendo importante a observação quanto à dilatação-vólvulo gástrica no pós-operatório
de cirurgias de descompressão cervical a fim de avaliar também o grau de dor do
paciente.
A analgesia pós-operatória neste tipo de procedimento cirúrgico inclui o uso de
opióides de ação longa, sendo indicados para as primeiras 12-24 horas do pósoperatório (WHEELER e SHARP, 1999a; FANTONI et al., 2002; OTERO, 2005b). Estes
fármacos promovem analgesia e sedação, podendo levar a depressão respiratória e
cardiovascular (BENSON, 2004). Desta maneira se torna tão importante o monitoramento
das arritmias no período pós-operatório como no trans-operatório, exigindo controle
constante (STAUFFER, 1998).
32
Veterinária em Foco, v.5, n.1, jul./dez. 2007
A morfina é um opióide que oferece eficiente poder analgésico sendo um
agonista opióide, no entanto sua potência é menor que outros fármacos do mesmo
grupo (Tabela 2) (TRANQUILI et al., 2005), e causa mais efeitos colaterais. A dose
dependente de depressão respiratória varia, sendo que ela deve ser usada com
grande cuidado em animais com diminuição do potencial da função ventilatória,
tais como pacientes com lesões das porções cervicais craniais da medula espinhal
(WHEELER e SHARP, 1999b).
TABELA 2 – Potência analgésica dos opióides.
Potência analgésica dos opióides
Opióide
Potência analgésica
Morfina
1
Butorfanol
4-7
Buprenorfina
30
Fonte: Tranquili et al. (2005).
Wheeler e Sharp (1999b) e Paddleford (2001) citam o uso de morfina na dose de
0,1-0,8 mg/kg, a cada 4 horas, por via intramuscular (IM), sendo que este fármaco exige
o controle da freqüência cardíaca já que pode ocasionar bradicardia. A utilização de
atropina na dose de 0,022-0,044 mg/kg, via endovenosa (IV) ou subcutânea (SC) está
indicada para o controle da freqüência cardíaca. Paddleford (2001) indica como dose
pós-operatória 0,05-0,25 mg/kg por via IV, com intervalo entre as doses de 1 a 4 horas.
Andrade (2002) preconiza a morfina na dose de 0,2-1mg/kg no intervalo de 2-6 horas
via SC ou IM, e por via oral (VO) na dose de 0,3-3mg/kg a cada 4-8h.
A morfina pode ser associada ao uso de antiinflamatórios não esteróides
como carprofeno, meloxican e cetoprofeno em situações de dor grave (OTERO,
2005b). A morfina epidural tem sido utilizada extensivamente em animais e tem
comprovado seu valor em pacientes neurocirúrgicos, podendo ser administrada
no período pré-operatório, visto que possui efeito retardado para início entre 20 e
60 minutos. A analgesia tem duração de dez a 24 horas sendo efetiva em segmentos
craniais de medula espinhal na dose de 0,1mg/kg diluída em solução salina aquecida
para o volume de 1ml/5 kg, injetada no espaço epidural lombo-sacro (WHEELER e
SHARP, 1999b). Valverde et al. e Dodman et al. apud Wheeler e Sharp (1999b) citam
não ter encontrado complicações e depressão respiratória com o uso da morfina
epidural em animais.
Andrade (2002) relata o uso de butorfanol, um agonista antagonista, para analgesia
na dose de 0,05– 0,2 mg/kg por via IV, IM ou SC a cada uma a quatro horas, sendo a
freqüência de administração uma desvantagem para uso. A opção pela administração
por via oral na dose 0,1 a 0,5 mg/kg reduz a freqüência, pois os intervalos de uso estão
entre quatro e seis horas. A dose de 0,2 a 0,4mg/kg por via IV ou IM a cada 4 horas ou
Veterinária em Foco, v.5, n.1, jul./dez. 2007
33
como necessário é indicada por Seim III (2002). Já Wheeler e Sharp (1999b) indicam 0,2
a 0,6mg/kg a cada 2 a 4 horas, por via IM ou SC.
A buprenorfina é um opióide agonista parcial com potente analgesia e depressão
respiratória menor que a possivelmente causada pela morfina, sendo que a dose varia de
3 a 10mg/kg por via IM a cada 4 a 8h (MASSONE, 2003). Seim III (2002) cita o uso deste
fármaco com dose de 5 a 15μg/kg a cada 6 horas, e Wheeler e Sharp (1999b) indicam 0,005
a 0,02 mg/kg. Pascoe (1993) cita como principal vantagem a ação por 8 a 12 horas.
Wheeler e Sharp (1999b) citam que a oximorfona é um opióide agonista puro que
ocasiona menores efeitos respiratórios e gastrintestinais do que a morfina, mas apresenta
como desvantagem ser uma droga de maior custo. Possui duração semelhante à da
morfina e é dez vezes mais potente (PASCOE, 1993). A indicação de administração de
oximorfona na dose de 0,02 a 0,1mg/kg via IV a cada 2 a 4 horas é relatada por Hansen
(1996). Wheeler e Sharp (1999b) indicam dose de 0,02 a 0,08mg/kg em intervalos de 4 a
6 horas, e Seim III (2002) cita a dose de 0,05 a 0,1mg/kg, via IV ou IM e ressalta que a
analgesia pós-operatória com baixa dose de opióides reduz o risco de depressão
cardiorrespiratória.
O tramadol é um opióide agonista parcial usado com sucesso no tratamento da
dor no pós-operatório e com poucos efeitos adversos (OTERO, 2005a). A dose indicada
é de 2 mg/kg a cada 6 horas nas primeiras 24 a 48 horas, administrada por via subcutânea,
intramuscular ou via oral. Posteriormente a cada 8 horas na dose de 1mg/kg (OTERO,
2005b).
A Tabela 3 resume as diversas dosagens de opióides indicadas pela literatura
consultada, oferecendo a dose mínima e máxima, vias de administração e intervalo
mínimo e máximo.
TABELA 3 – Opióides para analgesia pós-operatória de descompressão cervical em cães.
Fármaco
Buprenorfina
Dose
5-20 µg/kg
Via de aplicação
IV, IM
Freqüência
4 a 8 horas
0,05 a 0,5 mg/kg
IV, IM, SC
1 a 4 horas
0,1 a 0,5mg/kg
VÓ
4 a 6 horas
0,1 a 1,0 mg/kg
IM
2 a 6 horas
0,3 a 3mg/kg
VÓ
4 a 8 horas
Tramadol
2mg/kg
SC, IM, VO
6 em 6 horas
Oximorfona
0,02 a 0,1 mg/kg
IV, IM
2 a 6 horas
Butorfanol
Morfina
Os adesivos de fentanil são uma opção de analgesia, pois estes apresentam uma
liberação prolongada do produto quando aplicados na pele tricotomizada do paciente,
atingindo níveis plasmáticos adequados em cerca de 24 horas e durando até 72 horas.
Existem apresentações que liberam 25 μg/hora para cães de até 10 quilos, 50 μg/hora entre
10-25 quilos, 75 μg/hora para cães entre 20-30 quilos e 100 μg/hora para pacientes com mais
34
Veterinária em Foco, v.5, n.1, jul./dez. 2007
de 30 quilos (OTERO, 2005b). Benson (2004) refere a colocação do adesivo na noite anterior
à cirurgia e ressalta que o mesmo não pode garantir níveis plasmáticos terapêuticos.
De acordo com Andrade (2002), os benzodiazepínicos fornecem relaxamento
muscular e podem ser utilizados em associação com os opióides, na dose indicada de 0,5
– 1mg/kg via IV. O diazepam deve ser administrado de forma lenta por via endovenosa
devido à presença do propilenoglicol na diluição o qual acarreta hipotensão, bradicardia
e apnéia (RANKIN, 2004). Seim III (2002) relata que não deve ser ultrapassada a dose de
20mg/dia. Wheeler e Sharp (1999b) citam o metocarbamol para o relaxamento da
musculatura esquelética, na dose de 55 a 132mg/kg por via oral e em doses divididas,
após fenestração de disco intervertebral ou outros procedimentos neurocirúrgicos.
As drogas antiinflamatórias não esteróides (DAINEs) somente aliviam as dores de
baixa a moderada intensidade, porém podem ser úteis nos casos em que os narcóticos
não estão disponíveis. Agem através da inibição da enzima ciclooxigenase (COX), temse a COX-1 encarregada de mediar processos de proteção gástrica e renal e a COX-2
encarregada de interferir no processo inflamatório (LANDONI, 2005). Entre as DAINEs
não seletivas estão incluídos o cetoprofeno e o carprofeno, e entre os inibidores
preferenciais de COX-2 está o meloxicam (HANSEN, 1993; LANDONI, 2005). Wheeler e
Sharp (1999b) relatam que as DAINEs devem ser usadas por não mais que 24 horas, pois
os pacientes neurocirúrgicos apresentam a tendência de desenvolverem distúrbios
gastrintestinais. São contra-indicados para animais que receberam recentemente alta
dose de corticosteróide em virtude da possibilidade de sangramento e perfuração
gastrintestinal (WHEELER e SHARP, 1999b), assim como para animais que já apresentem
lesões gastrointestinais, hipotensão, hipovolemia e desidratação (ANDRADE, 2002).
A fisioterapia de reabilitação está indicada no pós-operatório de neurocirurgias
com objetivo de proporcionar analgesia. Dentre as alternativas encontra-se a
eletroterapia que utiliza a corrente elétrica para promover analgesia (STERIN e
GALLEGO, 2005). Com a utilização da eletroanalgesia transcutânea ou TENS
(Transcutaneal Eletrical Nerve Estimulation) obtém-se a redução da dor por meio da
inibição nociceptiva pré-sináptica do corno dorsal da medula espinhal, limitando sua
transmissão para o cérebro. O TENS pode ser usado no pós-operatório imediato e nos
dias subseqüentes em tempo integral. A analgesia e o relaxamento muscular impedem
a formação do ciclo dor-contratura-dor determinado pelo processo inflamatório.
O uso do laser terapêutico de Arseneto de Gálio (AsGa) ou Hélio-Neon (HeNe)
está indicado com o objetivo antiálgico, além de antiedematoso, bioestimulante do
trofismo tecidual, normalizador da microcirculação através da remoção de substâncias
inflamatórias e da melhora da oxigenação tecidual (STERIN e GALLEGO, 2005). Matera
e Pedro (2006) indicam seu uso de forma pontual em toda a extensão ferida cirúrgica,
durante o mesmo período da aplicação do TENS.
Paddleford (2001) sugere opções como a acupuntura e a massagem nas quais o
estímulo das fibras nervosas beta A promovem redução do estímulo nociceptor das
fibras delta A e C. Lorenz e Kornegay (2006) citam a importância da abordagem não
farmacológica da dor que inclui manter o paciente seco e limpo, mantê-lo aquecido em
local confortável, e em ambiente tranqüilo sem barulhos.
Veterinária em Foco, v.5, n.1, jul./dez. 2007
35
CONCLUSÃO
Os procedimentos neurocirúrgicos são extremamente traumáticos aos tecidos
moles, ossos e articulações ocasionando intensa algia pós-operatória. Para evitar efeitos
deletérios ao processo cicatricial e recuperação do paciente, o protocolo analgésico
deve ter início no período pré-operatório através da administração de drogas e/ou
associações medicamentosas com efeitos sinérgicos que evitem que os estímulos de dor
cheguem ao SNC. A algia deve ser monitorada durante o período pós-cirúrgico devendose recorrer à utilização de fármacos opiódes associados aos relaxantes musculares e/ou
sedativos para proporcionar comportamento normal e movimentação adequada do
paciente. Do mesmo modo, alternativas não farmacológicas que auxiliem na analgesia,
como o uso do TENS e do laser devem ser utilizadas a favor da recuperação do paciente.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, T. P. et al. Classificação dos processos dolorosos em medicina veterinária –
revisão de literatura. Veterinária em Foco, n.2, jan./jun., p.107-118, 2006.
ANDRADE, S. F. Analgésicos. In: ______. Manual de Terapêutica Veterinária. 2.ed.
São Paulo: Roca, 2002, p.347–401.
BAGLEY, R. S.; WHEELER, S. J. Doenças do Sistema Nervoso. In: DUNN, J. K. Tratado
de Medicina de Pequenos Animais. São Paulo: Roca, 2001, p.1053–1200.
BENSON, G. J. Opióides. In: GREENE, S. A. Segredos em Anestesia Veterinária e Manejo da Dor. Porto Alegre: Artmed, 2004, p.152–230.
BONAFINE, R.; PELLEGRINO, F. Manifestação Clínica da Dor em Pequenos Animais.
In: ______. Dor: Avaliação e Tratamento em Pequenos Animais. São Caetano do Sul:
Interbook, 2005, p.88–94.
CRUZ, M. L. Anestesia em Ortopedia. In: FANTONI, D. T.; CORTOPASSI, S. R. G.
Anestesia em Cães e Gatos. São Paulo: Roca, 2002, p.248–250.
FANTONI, D. T; MASTROCINQUE, S.; PELLEGRINO, F. Analgesia Preventiva. In:
OTERO, P. E. Dor: Avaliação e Tratamento em Pequenos Animais. São Caetano do Sul:
Interbook, 2005, p.76–80.
FENNER, W. R. Moléstias do Cérebro. In: ETTINGER, S. J.; FELDMAN, E. C. Tratado
de Medicina Interna Veterinária. 3.ed. São Paulo: Manole, 1995, p.817–1024.
HANSEN, B. Dor Pós-Operatória. In: BOJRAB, J. M. Mecanismo da Moléstia na Cirurgia dos Pequenos Animais. 2.ed., São Paulo: Manole, 1996, p.84–93.
HANSEN, B. H. Prescription and use of analgesic in dogs and cats in a veterinary teaching
hospital: 258 cases (1983-1989). J. Am. Vet. Med. Assoc. v.202, p.1485-1494, 1993.
HELLEBREKERS, L. J. Fisiopatologia da dor em animais e sua conseqüência para a
terapia analgésica. In: ______. Dor em Animais. São Paulo: Manole, 2002a, p.69-79.
HELLEBREKERS, L. J. Tratamento Analgésico Prático em Cães. In: ______ Dor em
Animais. São Paulo: Manole, 2002b, p.109-119.
LANDONI, M. F. Antiinflamatórios não Esteroidais. In: OTERO, P. E. Dor: Avaliação e
Tratamento em Pequenos Animais. São Caetano do Sul: Interbook, 2005, p.112–118.
36
Veterinária em Foco, v.5, n.1, jul./dez. 2007
LORENZ, M. D.; KORNEGAY, J. N. Tetraparesia, Hemiparesia e Ataxia. In: ______.
Neurologia Veterinária. São Paulo: Manole, 2006, p.60–73.
LUTTGEN, P. J. Distúrbios do Cordão Espinhal. In: BIRCHARD, S. J.; SHERDING, R. G. Manual Saunders: Clínica de Pequenos Animais. 2.ed. São Paulo: Roca, 2003, 1250–1270.
MASSONE, F. Medicação Pré-Anestésica. In: ______. Anestesiologia Veterinária.
4.ed. São Paulo: Guanabara Koogan, 2003, p.16–25.
MATERA, J. M.; PEDRO, C. R. Afecções na Coluna Vertebral. In: MIKAIL, S; PEDRO,
C. R. Fisioterapia Veterinária. São Paulo: Manole, 2006, p.157-166.
OTERO, P. E. Drogas Analgésicas. In: ______. Dor: Avaliação e Tratamento em Pequenos Animais. São Caetano do Sul: Interbook, 2005a, p.96–110.
OTERO, P. E. Manejo da Dor Aguda de Origem Traumática e Cirúrgica. In: ______. Dor:
Avaliação e Tratamento em Pequenos Animais. São Caetano do Sul: Interbook, 2005b, p.2–5.
PADDLEFORD, R. R. Analgesia e Controle da dor. In: ______. Manual de Anestesia de
Pequenos Animais. São Paulo: Roca, 2001, p.263–286.
PASCOE, P. J. Patient Aftercare. In: SLATTER, D. Textbook of Small Animal Surgery.
Philadelphia: Saunders, 1993, p.230-240.
PELLEGRINO, F. Organização Funcional das Vias da Dor. In: OTERO, P. E. Dor: Avaliação e Tratamento em Pequenos Animais. São Caetano do Sul: Interbook, 2005, p.6–28.
PELLEGRINO, F.; SURANTI, A.; GARIBALDI, L. Síndromes neurológicas. In: ______.
Síndromes Neurológicas em Cães e Gatos. São Paulo: Interbook, 2003, p.90–110.
PISERA, D. Fisiologia da Dor. In: OTERO, P. E. Dor: Avaliação e Tratamento em Pequenos Animais. São Caetano do Sul: Interbook, 2005, p.30–73.
PODELL, M. Sistema Nervoso. In: BIRCHARD, S. J.; SHERDING, R. G. Manual Saunders:
clínica de pequenos animais. 2.ed. São Paulo: Roca, 2003, p.1241–1310.
RANKIN, D. C. Tranqüilizantes. In: GREENE, S. A. Segredos em Anestesia Veterinária e
Manejo da Dor. Porto Alegre: Artmed, 2004, p.42–57.
SEIM III, H. B. Cirurgia da Espinha Cervical. In: FOSSUM, T. W. Cirurgia de Pequenos
Animais. São Paulo: Roca, 2002, p.1159–1211.
STAUFFER, J. L. et al. Cardiac dysrhythmias during anesthesia for cervical
decompression in the dog. Am. J. Vet. Res, v.49, n.7, 1143-6, 1998.
STERIN, G. M.; GALLEGO, F. C. Fundamentos da Fisioterapia na Terapêutica da Dor. In:
OTERO, P. E. Dor: Avaliação e Tratamento em Pequenos Animais. São Caetano do Sul:
Interbook, 2005, p 212–224.
TRANQUILI, W. J.; GRIMM, K. A.; LAMONT, L. A. Tratamento Clínico de Pequenos
Animais. 2.ed. São Paulo: Roca, 2005.
WHEELER, S. J.; SHARP, N. J. H. Cuidados Pós-Operatórios. In: ______. Diagnóstico
e Tratamento Cirúrgico das Afecções Espinhais do Cão e do Gato. São Paulo: Manole,
1999b, p.203–219.
WHEELER, S. J.; SHARP, N. J. H. Discopatia da Região Cervical. In: ______. Diagnóstico e Tratamento Cirúrgico das Afecções Espinhais do Cão e do Gato. São Paulo:
Manole, 1999a, p.68–84.
Recebido em: maio 2007
Aceito em: set. 2007
Veterinária em Foco, v.5, n.1, jul./dez. 2007
37
Download