TRATAMENTO DA FOBIA SOCIAL NA ABORDAGEM COGNITIVO-COMPORTAMENTAL Clara Maiello Viana1 Atualmente, muito se tem falado dos problemas em relação à ansiedade. Alguns autores da linha cognitivo-comportamental, como Gentil (1997), Costello (1998), Picon (2003), Zamignani e Banaco (2005), entre outros, vêm realizando pesquisas com o objetivo de buscar estratégias terapêuticas mais específicas para lidar com essa queixa. O alto grau de ansiedade, sofrida por sujeitos que vivem diante de grandes expectativas e mudanças, pode provocar vários transtornos psíquicos, dentre eles o transtorno de ansiedade. Este artigo abordará a Fobia Social, um tipo de transtorno de ansiedade, que apresenta um desafio terapêutico considerável e está frequentemente associado a outros transtornos psiquiátricos. Primeiramente, será conceituada a ansiedade. Segundo Gentil (1997), a ansiedade pode ser definida como um estado emocional desagradável, acompanhado de desconforto somático. Normalmente, possui relação com um evento futuro. O desconforto apresentado na ansiedade é normalmente descrito, por aquele que o sente, como “frio na barriga”, “coração apertado”, “nó na garganta”, “mãos suadas” e é, além disso, sentido como paralisante. O termo ansiedade, todavia, pode referir-se a eventos bastante diversos, tanto no que diz respeito a estados internos do sujeito, quanto a processos comportamentais que produzem esses estados internos. Muitos eventos descritos como agradáveis podem implicar em um sentimento de ansiedade, principalmente quando envolvem espera. Entretanto, é principalmente quando a ansiedade se refere à relação do indivíduo com eventos aversivos em suas múltiplas possibilidades de interação, que ela adquire o status de queixa clínica (ZAMIGNANI; BANACO, 2005, p.78). Para Picon (2003), os sintomas aparecem em diversas situações cotidianas e têm se tornado cada vez mais comum na vida das pessoas. Sensações e impressões errôneas da realidade, como o sofrimento por aflições antecipadas, pela probabilidade de algum acontecimento, causando sentimento de angústia e mal-estar, podendo alterar negativamente as atividades do cotidiano,e atrapalhar as atividades intelectuais do sujeito, podem indicar um transtorno de ansiedade. Segundo Zamignani e Banaco (2005), o padrão de comportamento característico dos transtornos de ansiedade é o de esquiva fóbica: na presença de um evento ameaçador ou incômodo, o indivíduo emite uma resposta que elimina, ameniza ou adia esse evento. O que diferencia cada um desses transtornos é o tipo de evento experimentado como ameaçador ou incômodo e o tipo de resposta na qual o sujeito se engaja de forma a produzir uma diminuição do contato com o estímulo aversivo. Os autores citam os diferentes transtornos de ansiedade: Fobia Simples, Fobia Social, Pânico, Agorafobia, Stress Pós-Traumático, Ansiedade Generalizada e Aguda e TOC (Transtorno Obsessivo-Compulsivo). Será abordada a Fobia Social, também conhecida como Transtorno de Ansiedade Social. Dentro do referencial cognitivo-comportamental, a fobia social pode ser enquadrada no modelo etiológico proposto por Barlow, em 1993, para os transtornos de ansiedade (Cia, 1994), que surge com alguns fatores desencadeantes associados a uma vulnerabilidade biológica e psicológica. Segundo Picon (2003), até a década de 80, os casos de ansiedade ou fobia social eram descritos na literatura da área de Psicologia como timidez patológica, ansiedade de encontro ou mesmo insegurança. Em 1980, com a publicação do DSM-III, o quadro passou a constar como categoria diagnóstica. Hoje, a ansiedade social é definida como medo marcante e persistente de uma ou mais situações sociais ou de desempenho, em que o indivíduo se sente exposto a desconhecidos ou a uma possível avaliação dos outros (American Psychiatric Association, 1994). Picon (2003) acrescenta que os modelos cognitivos mais atuais da fobia social se baseiam em uma série de crenças comuns de que os fóbicos sociais têm sobre si mesmos e sobre o mundo que os cerca, que os faz acreditar que estão em permanente perigo social ou de agir de forma imprópria e, como conseqüência, serem negativamente avaliados ou rejeitados pelos outros. Os modelos cognitivos atuais de fobia social possibilitaram o desenvolvimento de técnicas mais específicas, com maior chance de sucesso terapêutico, que estão atualmente em uso clínico e aguardam estudos de sua efetividade. Para Picon (2003), os objetivos da terapia cognitivo-comportamental, em pacientes portadores de fobia social são: diminuir a ansiedade que antecede as situações sociais temidas, diminuir os sintomas fisiológicos de ansiedade associados, diminuir Revista de Psicologia - Edição 1 l 87 as cognições de auto-avaliação negativa e avaliação negativa pelos outros, diminuir as hesitações sociais, tratar as comorbidades, diminuir as limitações do paciente e melhorar a qualidade de vida. O mesmo autor aponta que a terapia cognitivo-comportamental é de tempo usualmente limitado, orientada para o presente, e ensina o paciente a desenvolver competências cognitivas e comportamentais necessárias para um funcionamento intra e interpessoal mais adaptado; depende fundamentalmente de um processo colaborativo entre terapeuta e paciente para atingir os objetivos do paciente. Dessa forma, ela classifica em dois grupos os processos pelos quais o paciente deve passar durante o tratamento da Fobia social: técnicas cognitivas e técnicas comportamentais. As técnicas são apresentadas a seguir: TÉCNICAS COGNITIVAS: Familiarização com o modelo e conceituação do caso: seguindo-se a avaliação inicial, o terapeuta tem de familiarizar o paciente com o modelo cognitivo, que começa com a identificação dos pensamentos automáticos nas situações que despertam ansiedade social. Esses pensamentos devem ser investigados durante toda a terapia. Paralelamente, são identificadas as suposições condicionais, ou seja, regras com as quais o paciente enfrentou suas crenças centrais. Surge, então, a questão de quais estratégias compensatórias o paciente desenvolveu para enfrentar sua crença central. Modificação do autoprocessamento: o autoprocessamento pode ser trabalhado com intervenções que visam mudar o foco de atenção do paciente sobre si mesmo para o ambiente ou interlocutor a que se dirige, buscando pistas sociais reais de aprovação ou eventual desaprovação de seu desempenho. Após essas tarefas, o paciente é orientado a formular pensamentos ou auto-apreciações mais racionais a respeito de seu desempenho social. Reestruturação cognitiva: focaliza as distorções cognitivas do paciente para entender seu “sistema de crenças” para, por 88 l Revista de Psicologia - Edição 1 meio da terapia, modificá-las. TÉCNICAS COMPORTAMENTAIS: Exposição sistemática: a exposição nos quadros de Fobia Social tem por objetivo levar o paciente ao enfrentamento das situações sociais temidas, mantendo-se psicologicamente engajado, de forma que o processo natural de condicionamento, envolvido no medo da situação social, apresente redução da ansiedade desperta por meio da habituação e da extinção. Elas devem ocorrer de forma gradual, das situações menos ansiogênicas para as mais ansiogênicas, obtendo-se, assim, um grau de maestria crescente no paciente, em relação às suas capacidades de lidar com as situações alvo, aumentado sua auto-eficácia, sua segurança em lidar com as situações sociais e aumentando sua auto-estima. Manejo de ansiedade: as técnicas de manejo da ansiedade podem acrescentar benefícios e ser usadas em conjunto com a exposição. Elas incluem relaxamento, treinamento de respiração e o redirecionamento de atenção. Treinamento de habilidades sociais: esse treinamento tem como base o pressuposto de que os fóbicos sociais apresentam muitas vezes déficits e inibições sociais marcados e visa desenvolver habilidades que permitam o entrosamento social, diminuindo a ansiedade de desempenho e promovendo uma interação verbal mais efetiva. Essa abordagem também pode resultar em melhora do quadro por redirecionar a atenção autofocada do paciente. O transtorno de ansiedade social ou fobia social é um quadro com importante morbidade, e seus portadores devem ser tratados de forma enfática, uma vez estabelecido o diagnóstico. A terapia efetiva requer uma integração criativa das múltiplas abordagens terapêuticas eficazes existentes. O desenvolvimento de técnicas específicas para os casos de fobia social apresenta-se como uma ferramenta a mais no campo das psicoterapias e pode trazer resultados promissores, a serem confirmados por novos estudos de efetividade da terapia cognitivo-comportamental que as contemplem. REFERÊNCIAS AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION. Diagnostic and statistical manual of mental disorders. 4 ed. Washington: APA, 1994. p. 142. CÍA, AH. Ansiedad, estrés, pánico, fobias – transtornos por ansiedad: evaluación diagnóstica, neurobiologia, farmacoterapia, terapia cognitiva conductual. Buenos Aires: Sigmá, 1994. p.12. GENTIL, V. Ansiedade e Transtornos Ansiosos. In: Valentim Gentil, Francisco Lotufo-Neto e Márcio Antonini Bernik (org.): Pânico, Fobias e Obsessões. São Paulo: Edsup, 1997. p.168. PICON, Patrícia. Terapia Cognitivo-Comportamental do Transtorno de Ansiedade Social, In: CAMINHA, R.M; WAINER, R.; OLIVEIRA, M.; PICCOLOTO, N.M. Psicoterapias Cognitivo-Comportamentais: teoria e prática. São Paulo: Casa do Psicólogo, 2003. p. 129-144. ZAMIGNANI, D.R; BANACO, R.A. Um panorama analítico-comportamental sobre os Transtornos de Ansiedade. Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva (RBTCC), São Paulo, v. VII, nº 1, p. 77-92, 2004. Disponível em: <http://revistas.redepsi.com.br/RBTCC/article/viewFile/44/33> Acesso em 6 out. 2008. NOTA DE RODAPÉ 1 Aluna do curso de Psicologia do Centro universitário Newton Paiva do estágio supervisionado pela professora Maxleila Reis. Revista de Psicologia - Edição 1 l 89