UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE CURSO DE PSICOLOGIA – BIGUAÇU SÉRGIO SCHWEITZER SILVESTRI TRANSTORNO DA PERSONALIDADE BORDERLINE OU ESTRUTURA DE PERSONALIDADE BORDERLINE: UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA BIGUAÇU 2011 2 SÉRGIO SCHWEITZER SILVESTRI TRANSTORNO DA PERSONALIDADE BORDERLINE OU ESTRUTURA DE PERSONALIDADE BORDERLINE: UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA Trabalho de Conclusão do Curso apresentado como requisito para obtenção do grau de Bacharel em Psicologia na Universidade do Vale do Itajaí, no Curso de Psicologia. Orientação: Profª. Mª. Maria Suzete Salib. BIGUAÇU 2011 3 SÉRGIO SCHWEITZER SILVESTRI TRANSTORNO DA PERSONALIDADE BORDERLINE OU ESTRUTURA DE PERSONALIDADE BORDELINE: UMA REVISÃO BIBLIOGRÁFICA Este Trabalho de Conclusão do Curso foi considerado aprovado, atendendo os requisitos parciais para obter o grau de Bacharel em Psicologia na Universidade do Vale do Itajaí no Curso de Psicologia. Biguaçu, de Dezembro de 2011 Banca Examinadora Profª. MSc. Maria Suzete Salib Orientadora Profª Msc. Ana Paula Balbueno Karkotli Membro Drª. Luciana Martins Saraiva Membro 4 IDENTIFICAÇÃO ÁREA DE PESQUISA Psicologia da Personalidade e Psicologia Clínica TEMA Transtorno da Personalidade Borderline. TÍTULO DO PROJETO: Transtorno da Personalidade Borderline ou Estrutura de Personalidade Borderline: Uma Revisão Bibliográfica. ACADÊMICO Nome: Sérgio Schweitzer Silvestri Código de Matrícula: 06.1.3289 Centro de Ciências da Saúde UNIVALI – Biguaçu ORIENTADORA: Nome: Maria Suzete Salib Categoria Profissional: Psicóloga Titulação: Mestre Curso: Psicologia Centro: CS Biguaçu 5 SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 6 2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA .............................................................................. 9 2.1 SOBRE O DESENVOLVIMENTO DA PERSONALIDADE .................................. 9 2.2 ESTRUTURAS DE PERSONALIDADE ............................................................ 14 2.3 TRANSTORNO DE PERSONALIDADE ........................................................... 17 2.3.1 CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS .................................................................. 17 2.4 TRATAMENTO ................................................................................................. 22 3. METODOLOGIA DA PESQUISA .......................................................................... 25 3.1 TIPO DE PESQUISA ........................................................................................ 25 3.2 PROCEDIMENTO DE COLETA DE DADOS .................................................... 26 3.3 PROCEDIMENTO DE ANÁLISE DE DADOS ................................................... 26 3.4 ANÁLISE DOS DADOS .................................................................................... 31 3.5 DISCUSSÃO DOS DADOS .............................................................................. 32 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 35 5. CRONOGRAMA ................................................................................................... 37 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..................................................................... 38 6 1. INTRODUÇÃO Durante muitos anos, buscou-se explicar o comportamento humano, bem como definir a personalidade dos indivíduos sob diversos olhares. Estudiosos, religiosos e cientistas elaboram teorias, ou pelo menos esboçaram-nas numa tentativa algumas vezes frustrante de definir o que, ou quais as motivações que nos levavam a comportarmo-nos de determinadas maneiras. Dentre algumas teorias elaboradas encontra-se a Psicanálise, desenvolvida por Sigmund Freud, que embora não tenha por objetivo definir as motivações que subsidiam o comportamento humano, traz a luz reflexões sobre o modo de funcionamento dos indivíduos, por ela também denominados sujeitos. A teoria psicanalítica desenvolvida por Freud passou por muitas alterações desde a morte do seu representante primevo, o que contribuiu para o nascimento de inúmeras escolas psicanalíticas ao redor do mundo e principalmente para a cisão entre a psicanálise praticada pelos norte-americanos, também conhecida como Psicologia do Ego e a psicanálise praticada e difundida pela Escola Francesa de Psicanálise, fundada por Jacques Lacan em 1964. Para Cloninger (1999, p. 03), estudiosa da área da psicologia do ego, a personalidade numa perspectiva que considera a existência de processos que ocorrem em um nível inconsciente, pode ser definida como “as causas subjacentes do comportamento e da experiência individual que existem dentro da pessoa”, como também indicam Carver e Scheier (2000, p. 05), que por sua vez, utilizam do mesmo referencial da autora supracitada e consideram que a "Personalidade é uma organização interna e dinâmica dos sistemas psicofísicos que criam os padrões de comportar-se, de pensar e de sentir característicos de uma pessoa". Atualmente, um quadro de sintomas bastante contemporâneo tem chamado a atenção, por sua freqüência cada vez mais intensa na clínica, como infere Knight apud Grenn (1988, p. 66), “Tal como o histérico era o paciente típico do tempo de Freud, o fronteiriço é o paciente problemático de nosso tempo”. Este quadro sintomal é conhecido como a personalidade borderline ou como estruturas fronteiriças para os autores norte-americanos e como casos inclassificáveis ou psicoses ordinárias pelos autores da Escola Francesa de Psicanálise, que consideram que atualmente a sociedade vivencia a queda do Nome-do-Pai, ou seja, a queda da lei 7 da castração, em outras palavras, a possibilidade de alcançar satisfação cada vez mais rapidamente, sem que as bordas, os limites da impossibilidade estejam bem circunscritos. A observação supracitada feita por Knight vai de encontro ao pensamento de Kernberg (1995, p. 07), que por sua vez, propõe “a existência de três grandes organizações estruturais correspondentes à organização de personalidade neurótica, borderline e psicótica”. Sendo assim, este trabalho utilizirá como referencial bibliográfico, autores da escola norte-americana, uma vez que estes desenvolvem suas teorias respaldadas no que fora produzido por Freud, que por sua vez sustenta que os indivíduos ao vivenciarem o Complexo de Édipo, obterão como produto a definição de sua estrutura de personalidade, sendo esta: Neurose, Psicose e Perversão. O termo borderline foi utilizado pela primeira vez em 1945 por A. Stern, num livro intitulado Psychoanalytic therapy in the borderline nevroses referindo-se a um tipo de neurose, mas apenas em 1949 por intermédio de Eisenstein, que o termo se tornou uma classe composta pelos mais diversos diagnósticos que não podiam ser inseridos nas classes das neuroses e/ou das psicoses (CERVELATTI, 2005). Para Green (1988, p. 66,68), psiquiatra françês, fronteiriço/borderline corresponde ao termo comumente utilizado para se referir a perturbações psicopatológicas que jazem na fronteira entre a neurose e a psicose, em particular as esquizofrenias latentes que apresentam uma série aparentemente neurótica de sintomas. Em outras palavras, é um termo descritivo que alude a um grupo de condições que apresentam fenômenos tanto neuróticos como psicóticos sem se apropriarem de uma ou outra categoria diagnóstica. No Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, encontra-se a denominação Transtorno da Personalidade Borderline, que por sua vez corresponde a “um padrão global de instabilidade dos relacionamentos interpessoais, da autoimagem e dos afetos, e acentuada impulsividade que começa no início da idade adulta e está presente em uma variedade de contextos”. O referido manual (DSM-IVTR, 2002 p. 27) também apresenta uma definição para o termo transtorno, que corresponde a síndromes ou padrões comportamentais ou psicológicos clinicamente importantes, que ocorrem num indivíduo e que estão associados com o sofrimento, incapacitação ou com um risco significativamente aumentado de sofrimento, morte, dor, deficiência, ou importante perda da liberdade. Na obra Freudiana não encontra- 8 se uma definição de transtorno, mas sobre o adoecimento dos sujeitos, o autor infere que o mesmo seja um produto de um persistente conflito entre um impulso libidinal e a repressão sexual, ou seja, entre uma tendência sensual e uma tendência ascética (FREUD, 1917). Pode-se notar uma diferenciação entre alguns autores, no que concerne ao borderline, uma vez que muitos estudiosos o consideram um transtorno e outros o consideram uma estrutura/organização de personalidade, que remete à discussão acerca do entendimento sobre o Autismo que durante muito tempo foi considerado uma psicose infantil e que hoje é percebido como um Déficit Cognitivo até mesmo pela escola francesa, com sua tradição psicodinâmica (JÚNIOR, 2000). Sendo assim, tendo em vista que o problema de pesquisa seja o de identificar como a literatura especializada se posiciona com relação ao fenômeno borderline: um transtorno de personalidade ou uma estrutura de personalidade? A relevância científica deste trabalho consiste na possibilidade de identificar qual o termo que melhor descreve este fenômeno, uma estrutura de personalidade ou um transtorno de personalidade? Já a relevância social, consiste em possibilitar o entendimento sobre este fenômeno sob um referencial médico e também sob um referencial psicodinâmico. O presente trabalho tem por objetivo geral compreender como a literatura especializada se posiciona frente ao fenômeno borderline, bem como por objetivos específicos descrever o conceito de transtorno da personalidade e estrutura de personalidade, analisar o conceito descrito pela literatura especializada e descrever o tratamento atual. Desta forma, os resultados desta pesquisa promoverão o esclarecimento entre os conceitos Transtorno de Personalidade/Estrutura de Personalidade, contribuindo como fonte de consulta aos acadêmicos e profissionais interessados. 9 2. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA A seguir serão explicitados o entendimento e os conceitos acerca do modo de funcionamento dos sujeitos, bem como do desenvolvimento de suas personalidades, desenvolvidos por autores, cujo referencial se aproxime do que fora construído por Freud, e que se conhece pelo nome de Psicanálise. 2.1 SOBRE O DESENVOLVIMENTO DA PERSONALIDADE Para a teoria da Psicanálise a estrutura da personalidade é composta por três grandes instâncias, a saber: o id, o ego e o superego. O comportamento apresentado pelos sujeitos é na maioria das vezes o resultado da interação existente entre esses três sistemas, e muito dificilmente um sistema opera com a exclusão dos outros dois (HALL, 2000). Com relação ao Id, acredita-se que dele se originam o ego e o superego (HALL, 2000), bem como, “compreende as representações psíquicas dos impulsos” (BRENNER 1987, p. 51), o que significa dizer que o mesmo funciona regido pelo princípio do prazer, ou seja, “é hedonista e almeja satisfazer às suas necessidades, o que reduz a tensão e propicia prazer” (CLONINGER 1999, p. 47). Esta característica corresponde ao processo primário, que consiste num “funcionamento mental inconsciente (...) caracterizado por idéias ilógicas e simbólicas” (CLONINGER 1999, p. 74), justificando a ausência de julgamentos de valor, ignorando o bem, o mal e a moralidade (REIS, 1984). Ainda sobre o id e o princípio do prazer, tem-se: “O id não tolera aumentos de energia, que são experienciados como estados de tensão desconfortáveis. Consequentemente, quando o nível de tensão do organismo aumenta, como resultado ou de estimulação externa ou de excitações internamente produzidas, o id funciona de maneira a descarregar a tensão imediatamente e a fazer o organismo voltar a um nível de energia confortavelmente constante e baixo. Esse princípio da redução de tensão pelo qual o id opera é chamado de princípio de prazer” (HALL 2000, p. 53). Como mencionado anteriormente, acredita-se que o ego e o superego originam-se do id, “o Ego é aquela parte do Id que, modificada pela proximidade e 10 influência do mundo que circunda o sujeito, está apta tanto a receber estímulos como a funcionar como escudo protetor contra tudo aquilo que ameaça o aparelho mental” (REIS 1984, p. 49). De acordo com Freud (apud DAVIDOFF, 1983), o ego surge nas crianças em desenvolvimento objetivando tratar de suas transações diárias com o ambiente ao passo que as mesmas aprendem que existe uma realidade a parte de suas próprias necessidades e desejos, ou como indica Hall (2000, p. 54), “O ego passa a existir porque as necessidades do organismo requerem transações apropriadas com o mundo objetivo da realidade”. Em outras palavras, “o ego consiste naquelas funções ligadas às relações do indivíduo com seu ambiente” (BRENNER 1987, p. 51). A distinção básica entre ego e id, dá-se à medida que o id só conhece a realidade subjetiva da mente, ao passo que o ego distingue as coisas na mente das coisas no mundo externo (HALL, 2000). Diz-se que o ego destrona o princípio do prazer (REIS, 1984), ou seja, obedece ao princípio da realidade e opera por meio do processo secundário (HALL, 2000). Por princípio da realidade, entende-se que e o mesmo seja o modo de funcionamento do ego no qual existe um contato apropriado com o mundo externo (CLONINGER, 1999), ou seja, o ego “adia a gratificação dos desejos do id até que seja encontrada uma situação ou objeto apropriado” (DAVIDOFF 1983, p. 521), em outras palavras, o princípio da realidade é a capacidade do ego que “pode compreender com precisão a realidade e adaptar-se às exigências do mundo real. O ego pode adiar gratificações e planejar” (CLONINGER 1999, p. 50). A capacidade de adiar gratificações e planejar correspondem ao processo secundário, citado anteriormente e que pode ser definido como o pensamento realista (HALL, 2000), em outras palavras é “o funcionamento mental consciente no qual predomina o ego; caracterizado pelo pensamento lógico” (CLONINGER 1999, p. 74), ou ainda, é uma função do ego que “cria estratégias realísticas para satisfazer os impulsos do id” (DAVIDOFF 1983, p. 521), ou seja: “o ego formula um plano para a satisfação da necessidade e depois testa-o, normalmente com algum tipo de ação, para ver se ele vai funcionar ou não. (...) o ego é a porção organizada do id, que passa a existir para atingir os objetivos do id e não para frustrá-los. (...) Seu principal papel é o de mediador entre as exigências instintuais do organismo e as condições do ambiente circundante” (HALL 2000, p. 54). 11 Nas ocasiões em que o ego ceder ao id, o superego o punirá gerando um senso de culpa e inferioridade. Nas palavras de Freud apud Davidoff (1983, p. 522) “o pobre ego... tem de servir a três amos duros (id, superego e realidade) e tem de fazer o melhor que pode para conciliar as exigências dos três”. O superego é o último sistema da personalidade a se desenvolver e pode ser compreendido como o representante internalizado dos valores e ideais da sociedade, passados para a criança por intermédio dos pais. O superego abrange os preceitos morais de nossas mentes, bem como nossas aspirações ideais (BRENNER, 1987), em outras palavras, o superego é a força moral da personalidade. Ele representa o ideal mais do que o real e busca a perfeição mais do que o prazer (HALL, 2000). Ao discorrer sobre esta instância, Cloninger (1999, p. 50) aponta: “O superego nos fornece um ideal do ego, que é uma imagem do que gostaríamos de ser, nossos modelos anteriores. (...) pelo fato de se desenvolver em idade precoce, o superego representa uma forma de moralidade imatura e rígida. No jargão psicanalítico, o superego é “arcaico” e em grande parte inconsciente. Freud afirmava que nosso sentimento de culpa muitas vezes está desvinculado da realidade atual, representando a compreensão imatura de uma criança pequena. (...) Para Freud, a ética madura não pode ser alcançada por meio do superego, mas sim por meio do ego, a única estrutura da personalidade que se adapta à realidade atual.” Dentre as funções do superego, podem ser destacadas algumas, tidas talvez como as principais, são elas: “(1) inibir os impulsos do id, especialmente aqueles de natureza sexual ou agressiva, uma vez que estes são os impulsos cuja expressão é mais condenada pela sociedade; (2) persuadir o ego a substituir objetivos realistas por objetivos moralistas; e (3) buscar a perfeição. (...) diferentemente do ego, o superego não se satisfaz em adiar a gratificação instintiva; ele tenta bloqueá-la permanentemente” (HALL 2000, p. 55). Para concluir, Reis (1984, p. 52) afirma que “o Superego exerce não somente uma função crítica e normativa, mas, também, revela-se como base de todo ideal humano”, ou ainda, nas palavras de Freud (1930, p. 139) “a função consiste em manter a vigilância sobre as ações e as intenções do ego e julgá-las, exercendo sua censura”. 12 Como visto anteriormente, o princípio do prazer rege o funcionamento do aparelho psíquico desde o início da vida do indivíduo (FREUD, 1930), sabe-se também que o mesmo funciona sob a máxima da satisfação imediata dos instintos (pulsões) que por muitas vezes não podem ser satisfeitos, uma vez que o contato com a civilização, ou seja, com o princípio da realidade, exige que a satisfação imediata de tais instintos seja adiada, por muitas vezes cancelada ou substituída por outras vias de prazer. Quando o sujeito ingressa no social, ou seja, quando o mesmo é inserido na sociedade e começa a estabelecer relações sociais, depara-se com o princípio da realidade, o que implica numa repressão dos instintos. É a maneira como o indivíduo organiza-se internamente frente a esse embate entre a satisfação do desejo oriunda do princípio do prazer e as exigências da civilização/princípio da realidade, que define sua estrutura de personalidade. Quando a criança nasce e no decorrer do primeiro ano de vida, a satisfação é obtida através do contato da boca com o seio da mãe. Nesta fase, o bebê passivamente recebe a realidade, engolindo o que é bom ou (menos passivamente) cuspindo o que é ruim (CLONINGER, 1999). Para a psicanálise, neste momento a criança vive na fase oral, ou seja, a satisfação da pulsão é alcançada pela estimulação das mucosas da boca e o desmame é o principal conflito vivido nesta fase (DAVIDOFF, 1983). Por ocasião de as necessidades da criança serem satisfeitas sem qualquer esforço, a mesma sente-se onipotente; este sentimento de onipotência vai perdendo força, ao passo que a criança compreende que as suas necessidades são satisfeitas por intermédio dos objetos amados do mundo, ou seja, “à medida que o bebê aprende a associar a presença da mãe à satisfação da pulsão da fome, a mãe torna-se um objeto separado e ocorre a primeira diferenciação entre si mesmo e os outros” (CLONINGER 1999, p. 57). A fixação da libido nesta fase provoca o desenvolvimento de uma personalidade de caráter oral que tem como principais traços o otimismo, a passividade e a dependência (CLONINGER, 1999). Sobre a fase anal, Freud acreditava que neste período, por volta dos dois anos de idade, a satisfação é obtida primeiro por expelir as fezes e depois por retêlas. “O desejo de controlar os movimentos esfincterianos na criança que começa a andar entra em conflito com a exigência social de aquisição de hábitos de higiene” (CLONINGER 1999, p. 58). Para Davidoff (1983), o treinamento ao banheiro consiste no conflito central desta fase. A personalidade de caráter anal, que se 13 desenvolveu em virtude da fixação da libido nesta fase, consiste em três traços: ordem, parcimônia e teimosia (CLONINGER, 1999). Com relação à fase fálica, que ocorre a partir dos três anos e segue até aproximadamente os cinco anos de idade, Freud defendia que as crianças descobrem que podem obter prazer manipulando os órgãos genitais, ou seja, o desejo de prazer sexual da criança expressa-se através da masturbação ou autoerotismo (CLONINGER, 1999). As fantasias durante esta prática são direcionadas as figuras parentais do sexo oposto e montam o cenário para o aparecimento dos complexos de Édipo e Electra (HALL, 2000). O conflito corresponde à rivalidade que se instaura para com a figura parental do mesmo sexo. Neste momento o menino vive o que Freud denominou de Complexo de Édipo e a menina o Complexo de Electra (DAVIDOFF, 1983). O Complexo de Édipo caracteriza-se pelo conflito oriundo dos desejos incestuosos do menino para com a sua mãe, somados a hostilidade dirigida ao pai, considerado pelo menino como rival em virtude das afeições que o mesmo tem pela mãe. O menino imagina que o pai, sentido por ele como rival irá machucá-lo, os medos relativos ao que o pai pode fazer estão relacionados aos seus órgãos genitais, uma vez que os mesmos são a fonte de seus sentimentos de desejo (HALL, 2000). O menino teme que o pai ciumento remova seus órgãos ofensores; este medo sentido pelo menino foi denominado por Freud de angústia de castração e, tanto o menino quanto a menina o sentem. A angústia de castração induz à repressão do desejo sexual pela mãe, bem como a hostilidade dirigida ao pai e colabora para que o menino se identifique com o pai, o que permite que o mesmo obtenha certa satisfação dos impulsos dirigidos à mãe, ao passo que o sentimento erótico e perigoso por ela se converte em uma afeição terna e inofensiva (HALL, 2000). Em uma resolução sadia do complexo de Édipo, a angústia de castração é reprimida, ou seja, o menino abre mão de ser o substituto do pai e ao invés disso decide tornar-se semelhante a ele. É através da identificação que o menino efetua dois importantes desenvolvimentos; o primeiro diz respeito à internalização da consciência, denominada superego; e a segunda consiste no fato de o menino adquirir a identidade masculina apropriada. Para Nasio (1997), esse período que o menino teve que atravessar foi fecundo e estruturante, uma vez que o mesmo se tornou capaz de assumir sua falta, bem como produzir seu próprio limite. A 14 consciência, ou seja, o superego está repleto de angústia de castração e quanto maior for o medo da castração, mais forte será o superego (CLONINGER, 1999). Nas palavras de Freud: “O superego (...) é o herdeiro do complexo de Édipo” (FREUD 1923, p. 38). O Complexo de Castração corresponde a “uma experiência psíquica completa, inconscientemente vivida pela criança por volta dos três anos de idade, e decisiva para a assunção de sua futura identidade sexual” (NASIO 1997, p. 13). É a maneira como passamos por esse período, ou seja, como vivenciaremos essa experiência de contato com a realidade que determinará nosso funcionamento interno quando adultos, uma vez que, a experiência inconsciente da castração é renovada por muitas vezes ao longo da vida, (NASIO, 1997). As maneiras como os indivíduos se relacionam com a realidade, resultado do complexo de castração, são conhecidas pela psicanálise como Estruturas de Personalidade ou Estruturas Clínicas e correspondem à: Neurose, Psicose e Perversão. 2.2 ESTRUTURAS DE PERSONALIDADE A seguir serão explicitadas as três estruturas de personalidade sob um referencial psicanalítico, mas antes faz-se necessário explanar acerca da concepção de estrutura, que para a psicologia psicanalítica do ego, consiste na concepção de que o ego pode ser conceituado como: “(1) mudando aos poucos de “estruturas”, ou configurações, que determinam a canalização dos processos mentais, (2) os próprios processos mentais, ou “funções” e (3) “limiares” de ativação dessas funções e configurações” (KERNBERG 1995, p. 06). Sendo assim, estruturas de acordo com o conceito supracitado correspondem a configurações relativamente estáveis dos processos mentais. Para a abordagem de relações objetais a estrutura ou organização de personalidade está refletida nas características dominantes do paciente, principalmente com relação: “(1) ao grau de integração da identidade, (2) aos tipos de operações defensivas que ele habitualmente emprega, e (3) à sua capacidade de testar a realidade” (KERNBERG 1995, p. 07). Sendo assim, a seguir seguem as explanações acerca das estruturas de 15 personalidade. NEUROSE A estrutura clínica Neurose pode ser definida como a estrutura caracteriza pela presença do recalque, bem como do efeito patogênico que o mesmo opera no inconsciente, permitindo o aparecimento dos sintomas (LACAN, 1957). De acordo com Laplanche e Pontalis (2001, p. 296), a Neurose é uma “afecção psicogênica em que os sintomas são a expressão simbólica de um conflito que tem raízes na história infantil do sujeito e constitui compromissos entre o desejo e a defesa”, em outras palavras, o sujeito com estrutura de personalidade neurótica, é aquele que reconhece a castração vivida no Complexo de Édipo e recalca-a, internalizando e obedecendo regras, uma vez que, se transgredi-las sente culpa e sofrimento. PERVERSÃO A Perversão pode ser determinada pelos comportamentos psicossexuais atípicos para a obtenção do prazer sexual, ou seja, consiste no desvio em relação à prática sexual “normal”, que significa dizer que, quando o prazer sexual não for obtido por penetração genital com parceiro do sexo oposto, existe Perversão, Laplanche e Pontalis (2001). A relação da Perversão com a Castração vivida no Complexo de Édipo está no fato de o sujeito com estrutura de personalidade Perversa reconhecer a castração sob a reserva de transgredi-la continuamente, (DIAS, 2004), ou seja, o sujeito perverso reconhece a castração, porém a denega e não exita em transgredir regras e normas. PSICOSE A Psicose caracteriza-se por fenômenos alucinatórios cuja causa é oriunda da falha na inscrição da lei paterna (castração). Diz-se que o sujeito com estrutura de personalidade psicótica não reconhece a castração, o ego rompe com a realidade, fazendo com o que o sujeito viva de acordo com o princípio do prazer e do processo primário. 16 O mecanismo pelo qual o ego rompe com a realidade chama-se foraclusão, que de acordo com Nasio (1995, p. 149) é “o nome que a psicanálise dá à falta de inscrição, no inconsciente, da experiência normativa da castração, experiência crucial que, na medida em que é simbolizada, permite à criança assumir seu próprio sexo e, desse modo, tornar-se capaz de reconhecer seus limites”. Com relação aos conflitos intrapsíquicos do sujeito com transtorno de personalidade borderline, acredita-se que os mesmos “não são predominantemente recalcados e, portanto, inconscientemente dinâmicos; eles são expressos em estados do ego mutuamente dissociados, que refletem a defesa da dissociação primitiva, ou clivagem.” (KERNBERG, 1991 p. 23). Dado o entendimento de que os conflitos do sujeito boderline não são predominantemente recalcados, característica do funcionamento neurótico, mas que existe a clivagem, característica do funcionamento psicótico, torna-se possível compreender porque muitas definições sobre o termo borderline apontam para uma estrutura que jaz entre a neurose e a psicose. No tempo de Freud as estruturas fronteiriças/borderline eram denominadas pelo mesmo como Neuroses Atuais, sendo este termo substituído, pelos conceitos de Organização Limítrofe, pacientes borderline e/ou fronteiriços, como indica Junqueira (2006), (...) as observações de Freud sobre os quadros denominados de neuroses atuais, que se caracterizam pela formação de sintomas não mediados pelo simbólico, foram as primeiras observações psicanalíticas do que hoje segue a denominação de patologias atuais, casos-limite ou borderline e que inclui os distúrbios psicossomáticos, assim como algumas formas de distúrbios alimentares. (...) quadros limites (onde há falhas na constituição dos limites do psiquismo). Sabe-se que o conflito neurótico resulta de uma oposição do id ao superego, o que nas palavras de Bergeret (1998, p. 122), equivale a dizer que “Tal conflito só pode ser concebido como genital e edipiano”. Já na Psicose, o que existe é um conflito entre as pulsões e a realidade, que por sua vez caracteriza uma exclusão do ego. Com relação ao borderline, Bergeret (1998, p. 123) sustenta que o conflito “não se situa em nenhuma das duas dialéticas. 17 Trata-se, acima de tudo, de uma doença do narcisismo... a relação do objeto permaneceu centrada da dependência anaclítica do outro, ou seja, constitui-se uma relação de grande dependência permanentemente vivida e jogada a dois (...) Isto é bem próprio da organização limítrofe. É preciso apoiar-se no interlocutor, tanto em espera passiva e demanda de satisfações positivas quanto em manipulações muito mais agressivas, evidentes ou não desse parceiro indispensável”. Ainda com relação às diferenças entre as estruturas de personalidade, Kernberg (1995) afirma que a estrutura neurótica de personalidade apresenta uma organização defensiva centrada no recalcamento, bem como em outras operações defensivas avançadas ou de alto nível, o que não ocorre nos fenômenos borderline nem nas estruturas psicóticas, que por sua vez, apresentam uma predominância de operações defensivas primitivas centradas no mecanismo de cisão [Splitting]. O mecanismo de cisão consiste na divisão de objetos externos em “inteiramente bons” e “inteiramente maus”, cuja função é proteger o ego de conflitos por meio da dissociação ou do afastamento de experiências contraditórias do Self e de outros significativos (KERNBERG, 1995 p. 15). Além deste mecanismo primitivo, outros mecanismos tão primitivos quanto este estão envolvidos nestes casos, como por exemplo, os tipos primitivos de projeção (identificação projetiva), negação, onipotência e desvalorização que por sua vez “protegem o paciente borderline de conflito intrapsíquico, mas com o preço de enfraquecer o seu funcionamento do ego” (KERNBERG, 1995 p. 15). 2.3 TRANSTORNO DE PERSONALIDADE Este capítulo apresentará os critérios diagnósticos para Transtorno da Personalidade Borderline numa perspectiva médica, descritos pelo Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-IV-TR, 2002). 2.3.1 CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS 18 De acordo com o critério diagnóstico 1 do DSM-IV-TR (2002), os indivíduos com esse transtorno fazem “esforços frenéticos no sentido de evitar um abandono real ou imaginário”, são muito sensíveis às circunstâncias ambientais e experimentam intensos temores de abandono e raiva inadequada, mesmo quando o abandono real for por um tempo limitado ou quando existirem mudanças inevitáveis em seus planos. Ao passo que percebem a iminência da separação, da rejeição ou ainda da perda da estrutura externa, esses sujeitos experienciam profundas alterações na auto-imagem, no afeto, na cognição e no comportamento, bem como intolerância à solidão e necessidade de ter outras pessoas consigo. Tais comportamentos ocorrem porque o sujeito borderline acredita que esses abandonos implicam em ele ser mau. Outra característica deste quadro diz respeito aos relacionamentos instáveis e intensos que caracterizam-se por uma alternância entre extremos de idealização e desvalorização, considerados como 2º critério na avaliação desses indivíduos que podem idealizar potenciais cuidadores ou amantes já no primeiro ou segundo encontro, exigindo que passem mais tempo juntos, bem como compartilhem detalhes extremamente íntimos na fase inicial do relacionamento. Por achar que o outro não se importa o suficiente, não oferece o bastante, ou por não estar presente suficientemente, logo toda a idealização passa a desvalorização. Esses sujeitos estão inclinados a mudar súbita e dramaticamente suas opiniões sobre os outros, “que podem ser vistos como suportes benévolos ou como cruelmente punitivos” (DSM-IV-TR, 2002 p. 661). De acordo com o critério diagnóstico 3 “Pode haver um distúrbio de identidade caracterizado por uma auto-imagem ou sentimento de self acentuado e persistentemente instável”, o que resulta numa constante mudança de objetivos, valores e aspirações profissionais, bem como na mudança de opinião e planos com relação a carreira, valores, tipos de amigos e identidade sexual. Como indica Kernberg (1995, p. 13), que por sua vez salienta: (...) na organização borderline de personalidade falta tal integração, e tanto as representações do self quanto do objeto permanecem representações afetivocognitivas múltiplas e contraditórias do self e dos outros (...) esta falha em integrar aspectos “bons” e “maus” da realidade do self 19 e dos outros é supostamente devido à predominância de forte agressão inicial, ativada nesses pacientes. (...) na organização borderline de personalidade é a visão interna de si mesmo e dos outros que não está integrada. Um exemplo disso é que do papel de uma pessoa suplicante e carente de auxílio, o borderline passa rapidamente ao papel de um vingador implacável. Apesar de possuírem uma auto-imagem de malvados, é comum que esses indivíduos sintam que não existem em absoluto frente a situações nas quais sentem falta de um relacionamento significativo, carinho e apoio. Com relação a esta população, Kernberg (1995) afirma que os mesmos não possuem boa capacidade para avaliarem realisticamente os outros, e que suas relações são, a longo prazo caracterizadas por uma percepção dos outros cada vez mais distorcida, caótica e superficial. Estes indivíduos apresentam impulsividade em no mínimo duas áreas potencialmente prejudiciais para si próprios. De acordo com Tanesi (2007) a impulsividade do borderline parece estar relacionada à desesperança e à sensação de vazio, de sentido na vida. A crença de estar sem apoio e a falta de esperança no futuro levam ao desespero, aos atos impulsivos e a situações de risco, características que correspondem ao critério diagnóstico 4, e que diz respeito a atos como jogar, gastar de maneira irresponsável, dirigir imprudentemente, comer em excesso, bem como, abusar de substâncias químicas e engajar-se em sexo inseguro. Comportamentos, gestos ou ameaças suicidas ou comportamento automutilante como queimar-se ou cortar-se são comuns nestes sujeitos e atos como estes estão enquadrados no critério diagnóstico 5. Estes atos autodestrutivos geralmente antecipam ameaças de separação ou rejeição ou quando exige-se que assumam maiores responsabilidades, “a automutilação pode ocorrer durante experiências dissociativas e frequentemente traz alívio pela reafirmação da capacidade de sentir ou pela expiação do sentimento de ser mau” (DSM-IV-TR, 2002 p. 661). Disforia episódica intensa, irritabilidade ou ansiedade que geralmente dura algumas horas e raramente alguns dias, preenchem o critério diagnóstico 6, que 20 afirma que as pessoas que pertencem a este grupo podem apresentar instabilidade afetiva, em virtude de uma acentuada reatividade do humor. O humor disfórico básico destes indivíduos muitas vezes é perturbado por períodos de raiva, pânico ou desespero raramente aliviados por períodos de satisfação ou bem-estar. Estes episódios podem refletir a extrema reatividade do indivíduo a estresses interpessoais. Entediados e tomados por sentimentos crônicos de vazio (critério 7), estes indivíduos podem estar sempre buscando algo para fazer. Frequentemente expressam raiva intensa e inadequada ou têm dificuldades para controlar a raiva (critério 8), como por exemplo, demonstrações freqüentes de irritação, raiva constante e lutas corporais recorrentes. Ainda para satisfazer este critério, estes sujeitos “podem exibir extremo sarcasmo, persistente amargura ou explosões verbais”, a raiva frequentemente surge quando um cuidador ou amante é percebido como negligente, omisso, indiferente ou prestes a abandoná-lo, estas expressões da raiva são seguidas de culpa e vergonha, uma vez que contribuem para o sentimento de ser mau. Por fim, durante períodos de extremo estresse podem ocorrer sintomas dissociativos transitórios ou ideação paranóide (critério 9), como por exemplo a despersonalização. Estes sintomas em geral têm gravidade ou duração insuficiente para indicarem um diagnóstico adicional e ocorrem em resposta a um abandono real ou imaginário. O retorno real ou percebido do carinho da pessoa cuidadora pode resultar numa remissão dos sintomas. Os critérios diagnósticos supracitados, apesar de serem destinados a paciente adultos, podem ser aplicados a crianças. Não existe uma população infantil que satisfaça uma definição de consenso, com base em critérios de exclusão. Déficits neuropsicológicos, inclusive de memória e aprendizagem (O´LEARY apud CUNHA et. al, 2001), alterações genéticas (TORGERSEN apud CUNHA et. al 2001) e fatores ambientais (ZANARINI apud CUNHA et. al, 2001), ao que tudo indicam parecem desempenhar papéis importantes no desenvolvimento da doença, o que sugere um modelo multifatorial da etiologia deste transtorno. Kernberg (1995, p. 06) afirma que “a história genética tem muito pouco para contribuir para o problema clínico da diferenciação entre sintomatologia neurótica, borderline e psicótica” e numa visão mais psicanalítica, Junqueira (2006) infere que, 21 (...) os quadros borderline se formam onde há uma falha no processo de representação dos objetos da pulsão, pois na medida em que a libido não se liga a um objeto externo ela não encontra um meio de representação; e, também, com a idéia de que, nesses quadros, as fronteiras entre as instâncias são porosas, pois essas fronteiras se formam justamente a partir do vai-e-vem da libido e dos objetos. Com relação aos aspectos clínicos de crianças com transtorno de personalidade borderline, Anna Freud em 1956 em seu artigo “A Avaliação dos Casos Borderline” identificou profundos níveis de regressão, bem como comprometimentos evolutivos maciços, retração da libido do mundo objetal deslocada para o corpo e para o self, bem como incapacidade para receber conforto e defeitos específicos do ego, como por exemplo, tente de realidade deficiente, funções de sintetização enfraquecidas e inadequado desenvolvimento dos mecanismos de defesa próprios da idade (LEWIS, 1995). Dentre esses comportamentos, Engel, Roselfeld e Sprince e Frikling-Shreuder (1970 apud LEWIS 1995), indicam a existência de uma ansiedade relacionada a temores de aniquilamento ou desintegração e formas extremas de solidão. As crianças borderline sentem-se como bebês cujas mães estão permanentemente fora do quarto”. De acordo com Barlow (1999, p. 450) “a maioria dos indivíduos com uma vulnerabilidade temperamental inicial a uma desregulação da emoção não desenvolve TPB”, o que significa que para o desenvolvimento desta condição serão necessários ambientes particulares de desenvolvimento, como o conceito de ambientes invalidantes criado por Linehan e que pode ser definido como um ambiente que possui uma “tendência a negar e/ou responder desordenada e inapropriadamente à experiência privada e, em particular, a experiências privadas não acompanhadas por efeitos secundários públicos facilmente interpretáveis” (LINEHAN apud BARLOW, 1999 p. 450), o que significa dizer que nestes contextos as experiências emocionais e as interpretações dos eventos, são por muitas vezes consideradas como respostas inválidas ao eventos, ou punidas, desprezadas, abandonadas, banalizadas, ou ainda, aludidas a características socialmente inaceitáveis. 22 2.4 TRATAMENTO Este capítulo apresentará dados referentes ao tratamento de pessoas com transtorno da personalidade borderline, bem como aspectos relativos à adesão, ao sucesso terapêutico e às dificuldades enfrentadas durante o tratamento. Inicialmente faz-se necessário discorrer sobre a noção de adesão ao tratamento, que pode ser concebida como um comportamento complexo que inclui características do paciente, do clínico e das estratégias de tratamento utilizadas (DSM-IV-TR, 2002). De um modo geral, a não-adesão a um tratamento engloba muitos comportamentos, que vão desde uma relutância em procurar ajuda, interrupções prematuras no acompanhamento, consultas e sessões irregulares, até o uso de doses inadequadas da medicação, bem como o uso de medicações não recomendadas (Blackwell, 2000). Para Gunderson (1989) as razões conscientes mais comuns apontadas pelos pacientes para não aderirem ao tratamento e freqüentarem as sessões de psicoterapia, dizem respeito à frustração com o tratamento, bem como a falta de suporte social e dificuldades logísticas em comparecer às consultas. Em uma revisão sobre tratamentos psicológicos, Stone (2006) tomou conhecimento da existência de três linhas psicoterapêuticas maiores para o tratamento de pessoas com Transtorno da Personalidade Borderline, sendo elas a psicoterapia psicodinâmica, a terapia cognitivo-comportamental e a terapia suportiva, e observou que apesar de existirem diferenças específicas em suas características, ambas as possibilidades objetivam melhorar os sintomas e as dificuldades desses pacientes. O autor ainda alerta os terapeutas no sentido de que eles, no início do processo, deverão lidar com seis sérias dificuldades, sendo elas, o suicídio e a automutilação, ameaças de interrupção precoce do tratamento, bem como depressão, abuso de substâncias, dissociação e manifestações de ansiedade e pânico. Com relação ao sucesso das intervenções psicológicas em pacientes com diagnóstico de Transtorno da Personalidade Borderline, Binks (2000) pôde concluir, por meio de uma revisão sistemática, que os problemas apresentados por estas pessoas podem ser aliviados com tratamentos que envolvem a conversa ou tratamentos comportamentais e alerta que todos os tipos de tratamento ainda estão na fase experimental, bem como, que os estudos são poucos e limitados, impossibilitando inferir uma completa confiança em seus resultados. 23 Em um estudo desenvolvido por profissionais da Universidade Federal de São Paulo, foram submetidas à psicoterapia de orientação analítica, concomitante ao atendimento psiquiátrico, seis pacientes do sexo feminino. A freqüência das sessões de psicoterapia variou de duas a três sessões semanais, ao passo que o atendimento psiquiátrico variava de uma vez por semana, a uma vez por mês. O estudo teve como objetivo colher dados, que permitissem a identificação de construtos que, por sua vez, sugerissem o porquê das dificuldades de adesão ao tratamento em cada caso. Este estudo elaborado por Tanesi et al. (2007) permitiu identificar os seguintes construtos que interferiram na adesão ao tratamento: Impulsividade, manipulações, dissociação afetiva, tentativas de suicídio e auto-agressões, tendência à regressão e agressividade, bem como ataques ao vínculo, ataques à melhora, e agressividade voltada para a equipe e para a instituição. O estudo feito numa perspectiva qualitativa utilizou como estratégia social a intervenção familiar, que permitiu cogitar a hipótese de que familiares saudáveis podem contribuir significativamente para a adesão ao tratamento destes pacientes. Em outro estudo elaborado por Carvalho et al. (2004), que teve como objetivo revisar atuais evidências, relacionadas à efetividade das inúmeras abordagens farmacológicas empregadas nesta população, tornou possível concluir que embora seja difícil mensurar o real benefício dos psicotrópicos neste pacientes, o tratamento psicofarmacológico se torna útil, principalmente como agente adjunto às psicoterapias que seguem um referencial psicodinâmico ou cognitivo. Seguindo esta linha de raciocínio, que por sua vez sugere um tratamento combinado, interdisciplinar, torna-se possível trazer à luz os resultados obtidos no estudo elaborado por Dal’Pizol et. Al. (2003) efetuado no Ambulatório Melanie Klein do Hospital Psiquiátrico São Pedro, que por sua vez, lançou mão de um tratamento combinado entre psicoterapia individual de orientação analítica, grupoterapia de orientação analítica, psicofarmacoterapia e intervenções sociais. Este estudo permitiu verificar que houve uma melhora tanto nos aspectos qualitativos da vida dos pacientes (relacionamento interpessoal, interesses e atividades ocupacionais e de lazer, autonomia), quanto nos aspectos quantitativos (número de internações, tentativas de suicídio, procura por serviços de emergência). Por fim, após a apresentação de algumas alternativas para o tratamento destes sujeitos, torna-se possível inferir que a abordagem psicodinâmica, bem como 24 a cognitiva aliadas à psicofarmacoterapia, obtém resultados importantes no que diz respeito à melhora dos sintomas apresentados por estes pacientes. 25 3. METODOLOGIA DA PESQUISA 3.1 TIPO DE PESQUISA A metodologia utilizada neste trabalho foi a Pesquisa Bibliográfica, que consiste numa pesquisa elaborada a partir de material já produzido, sendo estes livros e artigos científicos (GIL, 1996). Essa metodologia consiste num apanhado bibliográfico sobre tudo o que foi escrito sobre o tema (DESLANDES, 1994; MARCONI e LAKATOS, 1999; MARTINS e LINTZ, 2000). Utilizar-se-ão referenciais teóricos, tais como, livros e artigos com o objetivo de mapear a produção científica geral sobre o Transtorno da Personalidade Borderline, sobre o conceito de estrutura e de transtorno e também sobre o tratamento atual. Esta pesquisa bibliográfica foi elaborada dentro de uma abordagem de pesquisa qualitativa. A particularidade da pesquisa qualitativa está na forma como ela apreende e legitima os conhecimentos, que não se reduzem a um rol de dados isolados conectados por uma teoria que os explique. Aqui existe um pesquisador, também denominado de sujeito-observador por Chizzotti (2005) que é parte integrante do processo de conhecimento, que interpreta os fenômenos e lhes atribui um significado. Para a validação dos dados de uma pesquisa qualitativa, existem dois métodos, a saber, o método da validação qualitativa interna ou “intrapessoal” e o método da validação externa ou “interpessoal”, sendo este último método o utilizado neste trabalho. Na validação interna, admitem-se os dados coletados como válidos mediante o uso do conjunto de conhecimentos/experiências que completem as bases intuitiva, técnica e intelectual do investigador, bem como seu background, planejamento adequado e seu senso crítico. Já na validação externa, o processo de validação é estabelecido na vivência do pesquisador com os membros de sua comunidade acadêmica, ou seja, na supervisão com o orientador da pesquisa, na discussão dos achados com seus pares e na troca de idéias acerca dos resultados preliminares com as audiências qualificadas em eventos e reuniões científicas (TURATO, 2003). 26 3.2 PROCEDIMENTO DE COLETA DE DADOS Para a coleta de dados para esta pesquisa, o pesquisador efetuou uma busca pelos termos “transtorno borderline”, “pacientes limítrofes”, “tratamento de pacientes fronteiriços”, “psicoses ordinárias”, “casos inclassificáveis”, “neuroses atuais” no idioma português, nas seguintes bibliotecas: SciELO, www.scielo.br, considerando que esta biblioteca inclui as principais revistas científicas brasileiras. Google Acadêmico, www.scholar.google.com.br Obras literárias da área que ofereçam contribuições teóricas para o presente trabalho. Biblioteca online da Escola Brasileira de Psicanálise, http://www.ebp.org.br/biblioteca/biblioteca.html Foram encontrados cerca de 30 artigos, em sua maior parte no ano de 2009, quando deu-se o início da pesquisa. Ao passo que os dados foram sendo reunidos, o pesquisador efetuou uma leitura minuciosa do material, com vistas a construir o referencial teórico desta pesquisa, que por sua vez subsidiou a análise dos dados coletados, numa perspectiva qualitativa. 3.3 PROCEDIMENTO DE ANÁLISE DE DADOS Os dados coletados nesta pesquisa foram compreendidos e analisados de acordo com os procedimentos inerentes à análise de conteúdo e que consistem em cinco etapas, como ilustra Moraes (1999): 1ª Preparação das informações: A preparação das informações consiste, num primeiro momento em identificar as diferentes amostras de informação a serem analisadas. Num segundo momento, inicia-se o processo de codificação destes materiais, que por sua vez consiste em estabelecer um código que possibilite identificar, de maneira rápida, cada elemento a ser analisado. 2ª Unitarização (transformação do conteúdo em unidades): O processo de unitarização consiste em reler cuidadosamente o material, a fim de definir a unidade de análise, também denominada de unidade de registro, ou ainda de unidade de significado e, que corresponde ao elemento unitário de conteúdo que será submetido à classificação posteriormente. A unidade de análise poderá ser tanto 27 palavras, quanto frases, temas ou os documentos em sua forma integral. 3ª Categorização (classificação das unidades de análise em categorias): A categorização consiste em agrupar os dados colhidos, considerando-se a parte comum existente entre eles. Para tanto, classificam-se os dados por semelhança ou analogia, segundo os critérios estabelecidos, que por sua vez podem ser semânticos, sintáticos, léxicos, ou ainda em critérios expressivos. Esta etapa de categorização deve ser entendida como um processo de redução de dados, ou seja, as categorias elencadas representam o resultado de um esforço de síntese, destacando neste processo seus aspectos mais importantes. Vale ressaltar que as categorias precisam ser válidas, pertinentes, adequadas, bem como homogêneas, objetivas e fidedignas. 4ª Descrição: A etapa de descrição, em uma pesquisa do tipo qualitativa consiste na criação de um texto síntese para cada uma das categorias elencadas anteriormente, a fim de expressar o conjunto de significados que se encontram presentes nas unidades de análise incluídas nestas categorias. É nesta etapa de descrição que serão expressos os significados captados e intuídos, sobre o material colhido. 5ª Interpretação: A interpretação consiste na procura pela compreensão e pode ser efetuada de duas formas. A primeira delas relaciona-se aos estudos feitos com uma fundamentação teórica explicitada a priori. Neste tipo de estudo a interpretação é efetuada por meio da exploração dos significados contidos nas categorias de análise, contrastando-os com a teoria que fundamenta o trabalho. No outro modo de interpretação, a teoria é construída com base nos dados e nas categorias de análise, ou seja, a teoria emerge das informações e categorias. De todo modo, a interpretação dos dados é imprescindível em toda e qualquer análise de conteúdo, mas especialmente nas de natureza qualitativa. Deste modo, a partir do material colhido, procedeu-se a análise de conteúdo, que correspondeu a agrupar os elementos comuns ao tema desta pesquisa e que correspondem às seguintes categorias expressas na tabela abaixo: 1 CATEGORIAS RECORTES DA BIBLIOGRAFIA Conceituação “O termo Borderline foi utilizado pela primeira vez em do termo 1945 por A. Stern, num livro intitulado Psychoanalytic 28 borderline therapy in the borderline nevroses referindo-se a um tipo de neurose, mas apenas em 1949 por intermédio de Eisenstein, que o termo se tornou uma classe composta pelos mais diversos diagnósticos que não podiam ser inseridos nas classes das neuroses e/ou das psicoses (CERVELATTI, 2005)” “Para Green (1988, p. 66,68), autor norte-americano, fronteiriço/borderline corresponde ao termo comumente utilizado para se referir a perturbações psicopatológicas que jazem na fronteira entre a neurose e a psicose” No Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, encontra-se a denominação Transtorno da Personalidade Borderline, que por sua vez corresponde a “um padrão global de instabilidade dos relacionamentos interpessoais, da auto-imagem e dos afetos, e acentuada impulsividade que começa no início da idade adulta e está presente em uma variedade de contextos” “os conflitos intrapsíquicos do sujeito com transtorno de personalidade borderline não são predominantemente recalcados e, portanto, inconscientemente dinâmicos; eles são expressos em estados do ego mutuamente dissociados, que refletem a defesa da dissociação primitiva, ou clivagem.” “as observações de Freud sobre os quadros denominados de neuroses atuais, que se caracterizam pela formação de sintomas não mediados pelo simbólico, foram as primeiras observações psicanalíticas do que hoje segue a denominação de patologias atuais, casoslimite ou borderline” “Trata-se, acima de tudo, de uma doença do narcisismo... a relação do objeto permaneceu centrada na dependência anaclítica do outro, ou seja, constitui-se uma relação de grande dependência permanentemente vivida 29 e jogada a dois” “o que não ocorre nos fenômenos borderline nem nas estruturas psicóticas, que por sua vez, apresentam uma predominância de operações defensivas primitivas centradas no mecanismo de cisão [Splitting].” 2 Conceito de “Para Cloninger (1999, p. 03), estudiosa da área da estrutura de psicologia do ego, a personalidade numa perspectiva que personalidade considera a existência de processos que ocorrem em um nível inconsciente, pode ser definida como as causas subjacentes do comportamento e da experiência individual que existem dentro da pessoa” “Carver e Scheier (2000, p. 05) consideram que a "Personalidade é uma organização interna e dinâmica dos sistemas psicofísicos que criam os padrões de comportar-se, de pensar e de sentir característicos de uma pessoa". “Kernberg (1995, p. 07), que por sua vez, propõe “a existência de três grandes organizações estruturais correspondentes à organização de personalidade neurótica, borderline e psicótica”. “para a psicologia psicanalítica do ego, consiste na concepção de que o ego pode ser conceituado como: “(1) mudando aos poucos de “estruturas”, ou configurações, que determinam a canalização dos processos mentais, (2) os próprios processos mentais, ou “funções” e (3) “limiares” de ativação dessas funções e configurações” (KERNBERG 1995, p. 06) “Para a abordagem de relações objetais a estrutura ou organização de personalidade está refletida nas características dominantes do paciente, principalmente com relação: “(1) ao grau de integração da identidade, (2) aos tipos de operações defensivas que ele habitualmente emprega, e (3) à sua capacidade de testar a realidade” 30 (KERNBERG 1995, p. 07). 3 Conceito de “(DSM-IV-TR, 2002 p. 27) também apresenta uma transtorno da definição para o termo transtorno, que corresponde a personalidade síndromes ou padrões comportamentais ou psicológicos clinicamente importantes, que ocorrem num indivíduo e que estão associados com o sofrimento, incapacitação ou com um risco significativamente aumentado de sofrimento, morte, dor, deficiência, ou importante perda da liberdade”. “um produto de um persistente conflito entre um impulso libidinal e a repressão sexual, ou seja, entre uma tendência sensual e uma tendência ascética (FREUD, 1917).” “conflito neurótico resulta de uma oposição do id ao superego, o que nas palavras de Bergeret (1998, p. 122), equivale a dizer que “Tal conflito só pode ser concebido como genital e edipiano”. “na Psicose, o que existe é um conflito entre as pulsões e a realidade, que por sua vez caracteriza uma exclusão do ego”. 4 Tratamento “adesão ao tratamento, que pode ser concebida como um atual comportamento complexo que inclui características do paciente, do clínico e das estratégias de tratamento utilizadas (DSM-IV-TR, 2002)” “Stone (2006) tomou conhecimento da existência de três linhas psicoterapêuticas maiores para o tratamento de pessoas com Transtorno da Personalidade Borderline, sendo elas a psicoterapia psicodinâmica, a terapia cognitivo-comportamental e a terapia suportiva”. “Binks (2000) pôde concluir, por meio de uma revisão sistemática, que os problemas apresentados por estas pessoas podem ser aliviados com tratamentos que envolvem a conversa ou tratamentos comportamentais”. 31 “Em um estudo desenvolvido por profissionais da Universidade Federal de São Paulo, foram submetidas à psicoterapia de orientação analítica, concomitante ao atendimento psiquiátrico, seis pacientes do sexo feminino”. “Em outro estudo elaborado por Carvalho et al. (2004), (...) tornou possível concluir que embora seja difícil mensurar o real benefício dos psicotrópicos neste pacientes, o tratamento psicofarmacológico se torna útil, principalmente como agente adjunto às psicoterapias que seguem um referencial psicodinâmico ou cognitivo”. “resultados obtidos no estudo elaborado por Dal’Pizol et. Al. (2003) efetuado no Ambulatório Melanie Klein do Hospital Psiquiátrico São Pedro, que por sua vez, lançou mão de um tratamento combinado entre psicoterapia individual de orientação analítica, grupoterapia de orientação analítica, psicofarmacoterapia e intervenções sociais”. TABELA 1: Termos e conceitos 3.4 ANÁLISE DOS DADOS Categoria 1 – Conceituação do termo borderline: Expõe a definição encontrada na literatura especializada relativa ao termo borderline, bem como a noção que se tem com relação a esta temática. Pôde-se perceber que sua primeira utilização referia-se a um tipo de Neurose, que como fora citado anteriormente caracteriza-se pela presença do recalque (LACAN, 1957), mas que posteriormente o termo começou a ser utilizado para se referir especialmente às perturbações psicológicas que encontravam-se entre a Neurose e a Psicose, que por sua vez caracteriza-se pela foraclusão (NASIO, 1995), sem se apropriarem de uma ou outra categoria diagnóstica, uma vez que estes sujeitos apresentam características de ambas as estruturas. Categoria 2 – Conceito de estrutura de personalidade: Apresenta o entendimento 32 dos referidos autores sobre o conceito de estrutura. De um modo geral, os autores compreendem o conceito como as características dominantes de um indivíduo, a maneira como os sujeitos se organizam interna e dinamicamente e que culmina nas causas subjacentes do comportamento humano. Em outras palavras, é o produto da interação entre as instâncias id, ego e superego (HALL, 2000). Categoria 3 – Conceito de transtorno de personalidade: Expressa a maneira como o conceito encontra-se disponibilizado na literatura atual e especializada. Foi possível obter uma visão médica, como a apresentada pelo DSM-IV-TR (2002) que o compreende como uma síndrome ou um padrão comportamental ou psicológico clinicamente importante, que está associado com o sofrimento, incapacitação ou com um risco significativamente aumentado de sofrimento, morte, dor, deficiência, ou importante perda da liberdade, bem como obter um entendimento psicodinâmico, como o apresentado por Freud e Bergeret que respectivamente, o consideram como um produto de um persistente conflito entre um impulso libidinal e a repressão sexual, ou seja, entre uma tendência sensual e uma tendência ascética (FREUD, 1917), ou como uma oposição do id ao superego (BERGERET, 1998). Categoria 4 – Tratamento atual: Apresenta as diferentes alternativas para o tratamento de pessoas diagnosticadas borderline, bem como a noção de adesão, que pode ser concebida como um comportamento complexo que inclui características do paciente, do clínico e das estratégias de tratamento utilizadas (DSM-IV-TR, 2002). Pôde-se observar que embora não existam muitos estudos acerca do tratamento desta demanda a psicoterapia psicodinâmica, bem como a cognitivo-comportamental e a terapia suportiva aliadas à psicofarmacoterapia, à grupoterapia de orientação analítica e às intervenções sociais, mostram-se como possibilidades interdisciplinares eficazes de abordar estes sujeitos. 3.5 DISCUSSÃO DOS DADOS Tendo em vista que o problema de pesquisa deste trabalho foi o de buscar na literatura atual e especializada identificar como a mesma se posiciona com relação ao borderline, bem como ao conceito de estrutura e de transtorno e ainda descrever o tratamento atual, observou-se que os entendimentos acerca deste tema se aproximam. Esta aproximação pode ser observada no que diz respeito às possíveis 33 causas contribuidoras para o desencadeamento desta desordem como o conceito de ambientes invalidantes, quanto em relação ao típico modo de funcionamento destes sujeitos, caracterizado por uma instabilidade apresentada em uma variedade de contextos. A diferenciação efetuada entre os autores ao considerar o fenômeno como uma estrutura de personalidade ou como um transtorno de personalidade é apenas uma questão de referencial, que por sua vez não implica em maiores comprometimentos no entendimento do conflito destes sujeitos. Faz-se necessário alertar o leitor com relação ao posicionamento de Kernberg (1995), que por sua vez, propõe três grandes organizações de personalidade, suprimindo a Perversão e substituindo-a por borderline. Este entendimento pode levar o leitor a confundir Perversão com borderline, porém sabe-se que apesar de ambos os casos caracterizarem-se por problemas com relação aos limites e à internalização da lei da castração, a Perversão consiste na transgressão das leis, nas palavras de Quinet (1997, p. 24) “há a admissão da castração no simbólico e concomitantemente uma recusa, um desmentido”, em contrapartida o borderline consiste na não simbolização da lei, o que o aproxima da estrutura Psicose. Ficou evidente também que os autores norte-americanos possuem maior afinidade pelo termo borderline, bem como concentram seus estudos e fundamentam seu diagnóstico, embasados nos mecanismos defensivos que estes sujeitos apresentam. Além disso, tornou-se possível identificar na literatura consultada que os tratamentos psicoterápicos efetuados sob um referencial psicodinâmico em conjunto com outros métodos de tratamento (psicofármaco, intervenções sociais e grupo terapia), se faz eficaz, tanto no que concerne à diminuição do sofrimento, quanto relacionada à supressão de sintomas apresentados por esta população. Considerando-se o que fora explicitado sobre o aparelho psíquico, que o mesmo seja formado pelas instâncias id, ego e superego, bem como a noção de processo primário e secundário, pode-se inferir que o funcionamento borderline caracteriza-se por uma falha na internalização do superego (realidade), uma vez que, como fora citado por Bergeret (1998), trata-se acima de tudo de uma doença do narcisismo, ou seja, o funcionamento do sujeito está regido principalmente pelo processo primário/princípio de prazer, característica da instância id, hedonista e desconhecedora do princípio de realidade/processo secundário. Isto pode ser percebido nos comportamentos autodestrutivos, na incapacidade do borderline em 34 tolerar frustrações, entre outras características apresentadas nos critérios diagnósticos do DSM-IV-TR, que de maneira geral apontam para um modo de funcionamento em que existe uma supervalorização da própria experiência, onde desconsidera-se a existência do outro e da realidade, ainda que de maneira mais branda e não tão intensa como na Psicose. Diferenças entre a idéia de que o fenômeno seja um transtorno ou uma estrutura de personalidade a parte, há algo importante e comum entre os autores referenciados neste trabalho e que corresponde à produção do conhecimento sobre estes casos que amiúde aparecem nos consultórios, hospitais, entre outros ambientes voltados à saúde e que possibilitam cada vez mais reflexões e entendimentos sobre estes sujeitos, o que também permite repensar alternativas mais eficazes ao tratamento destes pacientes. 35 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS Este Trabalho de Conclusão de Curso apresentou uma revisão de literatura sobre os conceitos: borderline, transtorno, estrutura de personalidade e uma descrição do tratamento atual. Na seqüência foram descritas categorias a partir das informações coletadas e dos objetivos desta pesquisa, que posteriormente foram analisadas e discutidas. Ao final deste trabalho, que possibilitou uma explanação subsidiada por um referencial psicodinâmico e médico em que propôs-se identificar como a literatura atual e especializada se posicionara com relação ao borderline, considerando o fenômeno como um transtorno ou como uma estrutura, obteve-se como produto um apanhado bibliográfico rico e substancial, em que fora possível constatar diferentes posicionamentos relacionados ao problema de pesquisa, que tendem a contribuir para o profissional Psicólogo, no sentido de permitir que o mesmo obtenha um entendimento interdisciplinar do fenômeno (médico e psicodinâmico). Considerando-se contribuição os diferentes posicionamentos, há que se considerar também que este foi o entrave que impossibilitou indicar qual a denominação mais apropriada, se é que ela existe, uma vez que dadas as teorias sobre o funcionamento dos processos psíquicos dos sujeitos, considerá-lo um transtorno ou uma estrutura só se torna possível após a escolha de uma dessas teorias, ou seja, a escolha por um referencial que possibilite o entendimento do fenômeno em questão. Com relação aos objetivos específicos desta pesquisa, que corresponderam respectivamente a descrever o conceito de transtorno da personalidade, de estrutura de personalidade, analisar o conceito descrito pela literatura e descrever o tratamento atual, o presente trabalho possibilitou visualizar o entendimento que a classe dos Psiquiatras possui acerca do sofrimento psíquico dos sujeitos, contrapondo com o entendimento que Freud elaborou acerca das causas do adoecimento e sofrimento psíquicos, permitindo ao leitor escolher pela definição que melhor lhe parece, sem se ter exercido qualquer influência. No que concerne ao tratamento atual, o pesquisador reuniu dados de pesquisas sobre práticas psicoterápicas utilizadas nestes pacientes, que por sua vez elencaram as dificuldades inerentes ao tratamento, concomitantemente ao sucesso obtido em terapias cujo referencial sustente a conversa como meio eficaz para a 36 diminuição do sofrimento e supressão de sintomas, o que por sua vez, atribui maior valor à prática clínica desenvolvida pelos profissionais da Psicologia, que amiúde corresponde a aliviar o sofrimento dos pacientes, por intermédio da conversa. Sendo assim, pode-se considerar que este trabalho alcançou os objetivos a que se propôs investigar, bem como que o mesmo serve como base de dados para pesquisa no âmbito acadêmico. 37 5. CRONOGRAMA MÊS/ANO ATIVIDADES Agosto Revisão Bibliográfica Elaboração Coleta de do TCC Dados Setembro Outubro Novembro Dezembro 2011 2011 2011 X X X 2011 X Análise de Dados Discussão de Dados Redação do TCC X X X X X X X Entrega do TCC X Defesa do TCC X Devolução Instituição para 2011 a X 38 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BARLOW, D. H. Manual Clínico dos Transtornos Psicológicos. Tradução: Maria Regina Borges Osório. Porto Alegre: ArtMed, 2ª ed., 1999. BERGERET, J. A Personalidade Normal e Patológica. Tradução: Maria Elísia Valliatti Flores. Porto Alegre: ArtMed, 3ª ed., 1998. BINKS, C. A.; FENTON, M.; MCCARTHY, L. LEE, T.; ADAMS, C. E.; DUGGAN, C. Psychological therapies for people with borderline personality disorder. 2000. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1413294X2007000100009&lang=pt>. Acesso em: 10 out. 2011. BLACKWELL, B. Additional conditions that may be a focus of clinical attention. 2000. 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