MATERNIDADE ASSISTIDA NOVA ESTRATÉGIA DO CUIDADO EM SAÚDE MENTAL E COLETIVA BELO HORIZONTE 2013 MATERNIDADE ASSISTIDA NOVA ESTRATÉGIA DO CUIDADO EM SAÚDE MENTAL E COLETIVA Relatório Técnico Científico apresentado para concorrer ao I Premio INOVAR.BH, conforme Edital SMARH nº 01/2013 na categoria servidor. BELO HORIZONTE 2013 RESUMO Em nossa prática clínica de saúde mental, na Atenção Primária em Saúde do SUS BH, é comum nos deparamos com situações de vulnerabilidade de mulheres com transtornos mentais graves, que se tornaram mães ou estão próximas da concepção. As soluções encontradas até o momento pela sociedade, diante de tal situação não foram além de propostas contraceptivas, de esterilização, adoção, separação definitiva da criança de seus pais para adoção ou inscrição em um percurso institucional, que se tratado de forma simplesmente burocrática e balizados pelo julgamento moral, trazem consequências danosas para o futuro desses pequenos sujeitos e seus familiares. Deparamo-nos também, no dia a dia do trabalho, com situações relativas à eminência concreta ou delirante da gravidez ou pelo desejo de maternidade dos sujeitos em atendimento. O atendimento a essas mulheres nas unidades básicas de saúde remete também a indagações das equipes de saúde da família, de pediatras e ginecologistas sobre a condução de casos de pacientes com sofrimento mental que desejam engravidar ou tem filhos sob sua guarda. Na perspectiva de fazer avançar a clínica com mulheres e mães na rede pública de saúde, esse trabalho pretende trazer elementos da teoria e da prática realizada em três unidades básicas de saúde que estamos denominando de estratégia de “Maternidade Assistida” demonstrando através dela, que é possível com ações intersetoriais, ou seja, articulando a atenção Materno Infantil, Assistência à Infância e o dispositivo de Matriciamento em Saúde Mental, reverter a condição de vulnerabilidade dessa população com algo mais promissor para as gerações futuras. PALAVRAS-CHAVE: Maternidade Assistida. Intersetorialidade. Matriciamento. SUMÁRIO 1. CARACTERIZAÇÃO DA SITUAÇÃO ANTERIOR ............................................. Pag. 1 2. DESCRIÇÃO DO TRABALHO ................................................................................ Pag. 4 2.1 OBJETIVOS PROPOSTOS E RESULTADOS ESPERADOS ............................ Pag. 6 2.2 PÚBLICO ALVO DO TRABALHO ........................................................................ Pag. 6 2.3 AÇÕES E ETAPAS DA IMPLEMENTAÇÃO ...................................................... Pag. 7 3. RECURSOS UTILIZADOS ...................................................................................... Pag. 10 4. CARACTERIZAÇÃO DA SITUAÇÃO ATUAL..................................................... Pag. 10 4.1 MECANISMOS OU MÉTODOS DE MONITORAMENTO E AVALIAÇÃO DE RESULTADOS E INDICADORES UTILIZADOS.................................................. Pag. 10 4.2 RESULTADOS QUANTITATIVOS E QUALITATIVOS CONCRETAMENTE MENSURADOS........................................................................................................... Pag. 11 5. LIÇÕES APRENDIDAS............................................................................................... Pag. 12 5.1 SOLUÇÕES ADOTADAS PARA A SUPERAÇÃO DOS PRINCIPAIS OBSTÁCULOS............................................................................................................ Pag. 12 6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS....................................................................... Pag. 14 1 – CARACTERIZAÇÃO DA SITUAÇÃO ANTERIOR Belo Horizonte é o município brasileiro que mais avançou no cumprimento da Lei n. 10.21 da Reforma Psiquiátrica Brasileira e têm construído, a partir do protagonismo dos trabalhadores de saúde mental e usuários, um acúmulo de discussões que reverberam em outros cantos do país, em torno do paradoxo que envolve a questão do tratamento da psicose fora das instituições psiquiátricas, da cidadania das pessoas acometidas por esse sofrimento psíquico grave e persistente e da possibilidade da construção de um outro lugar social para a loucura na sociedade. O resultado desse trabalho se faz presente na rede de serviços regionalizados e substitutivos aos manicômios construída ao longo dos últimos 20 anos e sustentada com o trabalho criativo de centenas de trabalhadores: os Centros de Referência para o atendimento de pessoas em crise,; as equipes de saúde mental dos Centros de Saúde compostas de psiquiatras, psicólogos e assistentes sociais, os Centros de Convivência que oferecem oficinas das mais variadas artes e ofícios promovendo a reinserção social dos usuários ali inscritos, os projetos de trabalho e geração de renda e os dispositivos de Residências Terapêuticas, criados para o acolhimento de pacientes que tiveram seus laços sociais fragilizados e até mesmo rompidos, após um longo período de internação; os CAPSI e as equipes complementares de atenção à infância e adolescência compostas de um psiquiatra infantil, um fonoaudiólogo e um terapeuta ocupacional, que respondem pela atenção á infância e a adolescência e também dispositivos de interlocução com os demais setores de atenção, educação e assistência social. São equipamentos públicos que fazem frente às estruturas clássicas de ordem médica e policial de controle social, que encarcerou durante mais de duzentos anos os denominados “loucos de todo gênero” nos hospícios (expressão observada no Código Civil Brasileiro, de 1916, herdado do Código Criminal do Império). Na nova organização da assistência preconizada pelo SUS, a partir da Constituição de 1988 que estabelecia como princípios básicos à universalização, regionalização, distritalização e territorialização da atenção à saúde, a rede ambulatorial básica, o antigo nível primário, passa a exercer uma função específica no conjunto geral da reforma sanitária: responder de forma eficaz e ágil pelos agravos à saúde da população de uma determinada área de abrangência e passa por reformas de área física, acréscimo de especialidades, alocação das equipes de saúde da família, organização da farmácia, aquisição de equipamentos e recomposição de recursos humanos entre eles psicólogos, psiquiatras e assistentes sociais para compor as denominadas equipes mínimas de saúde mental. Desta forma e com nova denominação – unidade básica de saúde - UBS, o nível primário torna-se elo importante do projeto maior da Reforma Psiquiátrica em curso em Belo Horizonte, em articulação com os demais níveis de cuidados em saúde mental, lugar onde é possível o desenvolvimento de práticas que asseguram aos usuários do SUS a integralidade do cuidado. Um elemento que tem se apresentado como relevante na construção e promoção desse cuidado na clínica em saúde mental é a atenção à família ou ao grupo com o qual essas pessoas fizeram ou fazem algum tipo de laço social. Sabemos que na emergência da sociedade moderna o saber psiquiátrico penetrou nos meandros de um novo modelo de família conjugal e influenciou fortemente sua organização interna a partir da abordagem do louco. A relação da família com o louco nesse contexto aparecia como um problema social e também como uma questão teórica que vai ser trabalhada por Esquirol e onde o principio do isolamento do louco é parte de um projeto terapêutico. Considerava-se que, se por um lado a família precisava ser protegida das intempéries de um de seus membros por outro ela mesma trazia em seu cerne os germes da alienação mental de que ele padecia. “Algumas vezes, a causa do delírio existe no seio da família. Desgostos domésticos, reveses da fortuna, a inveja, a presença de indivíduos que despertam ou irritam as paixões mal apagadas provocaram o extravio da razão e são obstáculos insuperáveis para seu restabelecimento” (Esquirol apud Birman, 1978:276). Sendo assim com uma herança perpetuada ao longo das épocas, que enfatiza as causas sociais da loucura independentemente da constituição do sujeito, lidar com o louco e seu grupo familiar nos equipamentos substitutivos aos hospitais psiquiátricos não é tarefa fácil. Considerando-se ainda que até muito recentemente, a relação de pessoas com sofrimento psíquico com suas famílias, foi mediatizada por trabalhadores e organizações de saúde, principalmente os hospícios, que com base no tratamento moral e disciplinar colocava a família, no papel passivo de espera dos resultados consignados pelo saber psiquiátrico clássico que originalmente, prometia a cura. Por outro lado, nossa prática tem demonstrado o quão difícil é para muitas famílias e para a comunidade lidar com a eclosão de uma crise, suportar o sofrimento mental de um de seus membros, no cotidiano de suas vidas. Estudos realizados por pesquisadores brasileiros nos últimos anos permitem evidenciar que “o sofrimento mental provoca diversos abalos no grupo familiar”. (Rosa, 2003: 37). Nessa prática também é comum o encontro com situações clínicas mais ou menos dramáticas, de mulheres com sofrimento psíquico com filhos pequenos ou próximos da concepção. As soluções encontradas até o momento pela sociedade, diante do insuportável dessa situação, não foram além das propostas anticonceptivas, de esterilização e separação definitiva da criança de seus pais para adoção ou inscrição em um percurso institucional claramente danoso para esses pequenos sujeitos. Em se tratando de adoção ou afastamento prolongado de crianças cujos pais são portadores de sofrimento mental, por exemplo, (Quintão, 2003:1) diz que, “... ao testemunhar alguns encontros tardios dos pacientes com seus filhos, fica-nos a pergunta – o que podemos fazer para não reproduzirmos simplesmente atitudes que visam apenas o alívio de uma tensão insuportável de fato, mas que freqüentemente rompem com qualquer possibilidade de afetividade, de vinculo, principalmente quando mais tarde uma estabilidade maior e atingida pelo paciente?”. Deparamo-nos também, no dia a dia do trabalho, com questões relativas à eminência, existência concreta ou delirante da gravidez, ou pelo desejo de maternidade dos sujeitos em atendimento. Um número significativo de mulheres trazem à clinica questões relativas ao desejo de terem filhos ou uma disposição de cuidarem de suas crianças depois de um longo período de separação. Muitas delas são surpreendidas com a notícia de encaminhamento de seus filhos para guarda de outrem ou instituição pública de abrigamento, muitas vezes sem o seu consentimento. Nesse trabalho também não é incomum os técnicos terem a impressão de que talvez tenham chegado tarde demais, tamanha a distância que se interpôs entre essas pessoas, suas famílias ou comunidade de origem. Por exemplo, uma paciente com longo percurso de institucionalização na antiga FEBEM, desde os cinco anos, mãe de três filhos, um deles dados para adoção à sua revelia, chega à unidade de saúde, queixando-se de ter perdido a guarda de um deles que mora em uma instituição de abrigamento onde ela tem acesso. Outras vêm para falar das dificuldades em torno do cuidado de seus filhos. Uma jovem mulher psicótica vem nos falar do insuportável que é para ela, escutar seu filho de cinco anos que esta com enurese noturna, lançar-lhe uma sequência de perguntas que ela considera sem nenhum sentido, e de sua angustia quando se vê com vontade de espancá-lo diante de sua falta de resposta. Outra pede para trazer seu filho de nove anos para uma consulta com a psicóloga pelo fato de estar apresentando sintomas de dispersão e desinteresse na escola. Conta no dia em que traz a criança e um relatório da escola, que o problema da criança nada tem a ver com ela e sim com o novo casamento do pai. Por outro lado, fala de uma série de desmaios que tem tido e que o menino é quem fica a seu lado nessas ocasiões, mostrando resistência para ir à escola, colocando-se claramente no lugar de cuidador de sua mãe. Um congresso realizado por La Ligue Bruxelloise Francophone por LaSantê Mental em 2002 na Bélgica, teve como um de seus temas privilegiados – Psicose e Família, perturbações recíprocas - que se aproxima das questões que são importantes considerarem em nossa clínica. Esse tema colocou em evidência os modos de comunicação complexa no seio das famílias nas quais um dos membros apresenta uma sintomatologia psicótica, os fenômenos de transmissão, inter e transgeracional que se entrecruzam e os tipos de interação específica que os pacientes psicóticos e seus familiares mantêm entre si. Trata-se nesse trabalho do acréscimo de um refinamento clínico que permite apontar a importância do tratamento de situações com essas características, dentro da possibilidade de cálculo, considerando a constelação familiar. O atendimento a essas mulheres nas unidades básicas de saúde remetem também a indagações de médicos generalistas das equipes de saúde da família, pediatrias e ginecologistas sobre a condução de casos de pacientes que desejam engravidar ou tem filhos sobre sua guarda. Alguns profissionais chegam a recomendar o afastamento definitivo de crianças do convívio com os pais acometidos de sofrimento psíquico. É preciso atentar para as implicações desse ato na subjetividade desses pais e de seus filhos. É preciso ainda interrogar, se essa conduta, que tem o risco da naturalização (no sentido do método que separa sujeito e objeto, o sujeito de seus laços sociais), não se aproximaria mais de uma espécie de eugenia nas intervenções de saúde coletiva, voltadas para pacientes psicóticos. Em um relato de uma apresentação de paciente feita por J. Lacan em 1976, em um hospital psiquiátrico em Paris, o psicanalista recomenda seu afastamento do cuidado de seu único filho ( Czeemak, M.1991). O que nos faz perguntar sobre o diagnóstico clínico que pode determinar se uma criança deve ou não ficar sob a guarda de seus pais definitivamente ou durante o período agudo de seu adoecimento, E ainda sobre os agravos que podem ocorrer na saúde, de uma criança que tem seus pais acometidos por um sofrimento mental grave e que suportes devem ser dados a ela e a seus progenitores nessas circunstâncias. Também nos leva a indagar que tipo de dispositivo poderíamos criar para lidar com essas situações e até mesmo de revertê-las em favor dos sujeitos em atendimento. 2- DESCRIÇÃO DO TRABALHO Diante do exposto acima propomos para o campo em saúde mental, novas formas de acompanhamento que poderão ser sustentadas com mulheres e mães psicóticas a partir da clínica “feita por muitos”, no contexto da atenção primária de saúde, ou seja, as UBS, como lugares de acolhimento, acompanhamento e sustentação do tratamento de mulheres e mães psicóticas, seus filhos e familiares, bem como criar as condições do exercício da função materna para muitas delas. Para tanto, estamos nomeando na clínica com mulheres e mães psicóticas que estamos realizando em três unidades básicas de saúde, a estratégia de “Maternidade Assistida”. A estratégia de “Maternidade Assistida” compreende a programação de um conjunto de ações que se organiza a partir do caso a caso. A primeira delas voltada para a atenção ao grupo geracional de parentesco das pacientes que se escutado poderá contribuir, tanto na compreensão do funcionamento da estrutura em jogo de um de seus membros, quanto no acolhimento de mãe e filho(s) e participação da organização do cuidado de ambos. É importante considerar no contexto dessa intervenção que nossa prática em saúde mental na unidade básica de saúde, com mães psicóticas ou não, tem sido testemunha privilegiada do ocaso da família tal como ela se colocou no passado e de como ela se coloca hoje. E colocada em: “(...) condição de se tornar um lugar de resistência à tribalização orgânica da sociedade globalizada. Sob a condição, todavia de que saiba se manter, como princípio fundador, o equilíbrio entre o um e o múltiplo de que todo sujeito precisa para construir sua identidade.” (Roudinesco, Elizabeth. 2003: 199) Testemunha também que na clínica atual, devemos nos ocupar com temas e questões que vão da família tradicional à suas novas conformações, abrangidas pelo termo parentalidade.1 O psicanalista Eric Laurent, ao se interrogar sobre como criar as crianças em tempos de dissolução de uma certa forma tradicional de família que se circunscrevia no contexto da definição do código napoleônico, situa os tempos atuais de igualdade de direitos entre homens e mulheres, de separação entre ato sexual e procriação e de crise do princípio da autoridade. Ele nos diz que agora há pluralização completa das formas de parentalidade e de vínculos que permitem articular pais e filhos fora da forma tradicional e ainda assim continua-se falando de família..” Ali onde não há mais a família do ponto de vista tradicional, ela subsiste, apesar de tudo.” (Laurent, E. 2007) e comporta de formas multifacetárias uma circulação de significantes, uma transmissão de bens e direitos entre gerações. O que nos leva a considerar que na clínica com mães com transtornos mentais graves, uma família, uma a uma, deve ser em nossa contemporaneidade, reinventada. Um segundo viés da estratégia da “Maternidade Assistida” compreende o laço a ser feito entre os técnicos da atenção em rede e as mulheres em atendimento na perspectiva de construir com elas a possibilidade do exercício da maternidade para algumas mulheres e outras soluções para aquelas cujo desejo de maternidade não se sustenta ao longo do tratamento. Estratégias que privilegiam para a sua efetivação o recurso da Intersetorialidade no contexto do SUS. Acreditamos que a importância do trabalho reside não somente no fato de propor uma nova prática em assistência voltada para mães psicóticas e seus filhos, como também uma proposta de fortalecimento das ações intersetorias nas diversas políticas públicas voltadas para as famílias e crianças/adolescentes que muitas vezes trabalham de maneira setorizada e isolada das demais. Ademais, as soluções até então apontadas, não demonstraram resolutividade do ponto de vista da saúde integral de seus cidadãos, da estabilidade psíquica dessas mulheres, do mutilamento das famílias e da medida extrema de abrigamento de crianças. 1 Nos campos psiquiátrico e psicológico, o termo é utilizado para designar o processo que permite a uma mulher ou a um homem, reconhecerem-se no seu papel e lugar parental, de maneira a poder reconhecer seu filho em sua alteridade. No campo sociológico o termo descreve principalmente as novas formas de conjugabilidade e de vidas familiares tais como a família monoparental, a família homoparental e a família pluriparental, no caso de famílias recompostas. Tradução de parentalitê –verbete WIKIPÉDIA –consulta em 04/09/2013. 2.1- OBJETIVOS PROPOSTOS E RESULTADOS ESPERADOS Investigar a partir de estudo e construção de casos, o que se passa na relação entre a mãe psicótica e seu(s) filho(s); Contribuir para a melhoria, formalização e implementação de políticas públicas, que visem o atendimento diferenciado às mulheres e mães psicóticas e o acompanhamento e orientação aos demais membros de suas famílias e responsáveis; Fortalecer a intersetorialidade entre políticas públicas voltadas para famílias, crianças e adolescentes, com um recorte para os casos de psicose, de forma a promover maior interlocução entre saúde, assistência social, educação e judiciário; Contribuir para a construção e aprimoramento de instrumentais teóricos que subsidiem a prática de saúde mental e de saúde coletiva com mulheres e mães psicóticas no SUS; Contribuir para a construção de um novo paradigma acerca da assistência pública à mães psicóticas, bem como a prática de abrigamento de crianças filhas destas mães; Apresentar proposições e propostas sobre “Maternidade Assistida” no âmbito do SUS. Implementação de um Centro de Estudos contínuo em uma das três Unidades Básicas de Saúde, onde se realiza esse trabalho, como lugar de discussão, formalização e teorização de praticas de atenção voltadas para e com pessoas com alto grau de vulnerabilidade psíquica e social. Nossa expectativa enfim, é de que ao voltarmos nossa escuta e nosso olhar para as questões que aqui se colocam, possamos contribuir na formalização e implementação de práticas em políticas públicas multiprofissional, e intersetorial que visem o atendimento diferenciado pessoas acometidas de sofrimento psíquico grave e a seus filhos, bem como o acompanhamento e orientação aos demais membros de suas famílias ou responsáveis pelo seu cuidado. 2.2 - PÚBLICO-ALVO DO TRABALHO Conforme apontado anteriormente, o projeto tem como público-alvo mulheres e mães psicóticas atendidas na rede atenção à saúde do município de Belo Horizonte. Contudo, avalia-se que indiretamente outros atores integram a proposta de intervenção, como as crianças envolvidas, familiares, a comunidade, ou seja, aqueles que integram o arranjo familiar que compõe cada núcleo. Ainda compõe o público-alvo afetado pelo projeto, outras categorias profissionais da atenção à saúde como médicos, enfermeiros, assistentes sociais, agentes comunitários de saúde, assim como atores de outras políticas públicas da Assistência Social, Educação, Judiciário e Conselho Tutelar. 2.3- AÇÕES E ETAPAS DA IMPLEMENTAÇÃO Este trabalho tem sido realizado em três unidades básicas de saúde – no município de Belo Horizonte, com mulheres com idade entre 20 e 56 anos, que apresentam questões em torno da maternidade na psicose. Por se tratar também de uma pesquisa, utiliza como instrumento metodológico, a construção do caso, que se pauta pela escuta dos sujeitos, um a um, como possibilidade de colocar em interlocução o saber adquirido e os ensinamentos dos casos, tornando-os capazes de a partir de seu ineditismo e singularidade: reformular, distinguir ou ultrapassar o que já foi explicitado pela generalização teórica, tanto da psicanálise quanto da saúde pública e coletiva. Os casos são conduzidos no contexto de uma “clínica feita por muitos”, sustentada por diferentes agentes na rede de cuidados fortemente marcadas por um discurso de mestria, que geralmente produz uma cifra: os diabéticos, os hipertensos, os loucos, as mães, além de outros termos e nomenclaturas utilizados pelo Sistema de Garantia de Direitos de Crianças e Adolescentes, como violadores de direitos ou negligentes. Faz parte da construção dos casos, uma escuta atenta aos discursos, ações, omissões, preconceitos, no cotidiano dos sujeitos envolvidos com os casos (profissionais das áreas da medicina, serviço social, enfermagem, gerentes, agentes comunitários de saúde e profissionais de outras instituições e políticas públicas). Nas instituições de saúde pública, os sujeitos pelos quais se interessa a psicanálise correm o risco de se tornarem objeto de intervenção de uma vasta clínica interdisciplinar, a expensas do sujeito singular. Nesse contexto as mulheres, são a princípio nomeadas no interesse da criança apenas como mães, que devem se adequar aos protocolos das políticas do SUS, no interesse da diminuição dos índices de mortalidade materno infantil, (o que é um avanço enorme) mas não como sujeitos de discurso. Portanto, no interesse também das mulheres, consideramos neste trabalho a “construção do caso” que inclui a fala dos sujeitos, dos técnicos, seus efeitos de método, e a existência de uma rede simbólica construída em torno deles passível de transformação. A Rede de que falamos, absorve os dispositivos de “Matriciamento”, as equipes de saúde da família, as supervisões, as reuniões de micro área e com os demais equipamentos tanto da atenção em saúde mental quanto de rede intersetorial (como os Centros de Referência da Assistência Social, Centros de Referência Especializados em Assistência Social, Conselhos Tutelares e Juizado da Infância e Juventude). O dispositivo do Matriciamento citado acima também se configurou como um arranjo institucional importante na implementação do trabalho. O Matriciamento pode ser entendido como um arranjo organizacional que visa oferecer retaguarda assistencial e suporte técnico pedagógico e tem em seu norte a conversação em áreas específicas às equipes responsáveis pelo desenvolvimento de ações básicas de saúde para a população. De acordo com o Ministério da Saúde (Brasil, 2003) espera-se uma “responsabilização compartilhada pelos casos em saúde, que pode se efetivar através de discussões conjuntas de caso, intervenções conjuntas junto às famílias e comunidades ou em atendimentos conjuntos.” O Matriciamento, portanto, tem em seu norte a conversação e o compartilhamento de saberes, além da implicação do sujeito objeto da discussão, na construção de um projeto terapêutico singular. Ainda de acordo com o Ministério da Saúde (Brasil, 2003) assim, ao longo do tempo e gradativamente a responsabilização compartilhada, também estimula a interdisciplinaridade e a ampliação da clínica na equipe sendo que “a ampliação da clínica significa o resgate e a valorização de outras dimensões, que não somente a biológica e a dos sintomas, na análise singular de cada caso.” Também elegemos como instrumento metodológico, nesse trabalho, o dispositivo psicanalítico de “conversação” em família. Os dois instrumentos - a construção do caso clínico e a conversação em família - primam por erem, eles mesmos, instrumentos de trabalho intervenção, cujo movimento vivo nos permite extrair novos saberes das experiências em andamento na rede SUS, como também e no mesmo gesto, interferir no destino dos sujeitos em atendimento. Abaixo ilustramos como se deu a condução de quatro casos de forma a ilustrar a partir dos arranjos institucionais, parcerias e instrumentais metodológicos, os resultados alcançados: Caso CRS : trata-se de uma usuária semi alfabetizada, hoje com aproximadamente 30 anos de idade, após 10 anos de acompanhamento. Iniciou atendimento quando saía das ruas para a República Maria Maria, era diagnosticada como dependente de etílicos e déficit intelectivo leve. Posteriormente percebemos que seu discurso encerrava atividade delirante persecutória relacionada a racismo e uma atividade alucinatória auditivo verbal mais exuberante nas alcoolizações. Começamos assim o tratamento medicamentoso e psicoterápico, com sucessivas discussões de caso com equipes da Política Municipal de Assistência Social. Ela já havia perdido a guarda de 4 filhos ao completar pouco mais de 20 anos de idade e aguardava ligadura de trompas quando engravidou de sua última filha. Durante exame pré- natal foi constatada soropositiva para o HIV. A filha nasceu de parto cesáreo, não foi amamentada ao seio, recebeu tratamento profilático, negativando o soro para vírus. Conseguimos finalmente a ligadura de trompas. A paciente chegou a levar a filha consigo ao sair desse abrigo para mulheres, quando amparada pelo Programa Bolsa Moradia. Algum tempo depois deixou a criança com uma ex- patroa que veio a solicitar a guarda em juízo cerca de um ano depois.. Chamou-nos a atenção o fato de a paciente ter comparecido à audiência, tendo concedido a guarda e garantindo seu direito de visita, mas não exerceu esse direito posteriormente. O trabalho na clínica portanto, se volta então para a construção de outras saídas para essa mulher, que não seja necessariamente pela via da maternidade. Preocupa-nos ainda a evolução do quadro da infecção pelo HIV e a situação de rua novamente. Caso JTR: aproximadamente 25 anos de idade e cerca de 7 anos de acompanhamento. A usuária chegou à unidade de saúde encaminhada pelo CERSAM após tratamento de crise no final da gestação de sua única filha. Chegou a abrigar-se com a filha numa banca de revistas que herdara do pai. As crises posteriores fizeram-na entregar a filha antes de buscar serviços de urgência, exigindo o abrigamento da pequena. Na época, a partir da articulação em rede, o Serviço de Orientação e Apoio Sócio-familiar (da Secretaria de Assistência Social ) levou o caso à reunião de Supervisão e de Microárea, houve mediação com outros parentes e o inicio da Educação Infantil, com a estabilização sob transferência e aceitação medicamentosa – as questões com o corpo, o uso de anorexígenos, o medo de engravidar novamente, aliado ao desfecho diagnóstico como um caso de psicose, nos levaram a avalizar uma ligadura tubária que em outras circunstâncias seria considerada precoce, mas que contribuiu para sua estabilização. Mãe e filha, continuam em atendimento psiquiátrico e psicoterápico ora conjunto, ora individual na unidade. Caso SFDC: com aproximadamente 30 anos e cerca de 5 anos em acompanhamento. Encaminhada pela Pastoral da Mulher, com diagnóstico prévio de Transtorno Bipolar. O uso de anorexígenos complicava seu quadro, teve duas gestações com abortamento espontâneo. O quadro da usuária estabilizou-se sob transferência com a equipe; engravidou enquanto usava lítio, já com parceiro estável, porém ele dependente químico. O pré-natal se configurou de alto risco com boa evolução, substituímos lítio por haloperidol. O aleitamento materno foi mantido com baixas doses de medicação e acompanhamento de puericultura feito pelo nosso pediatra. Hoje a bebê tem 9 meses, apresenta-se saudável e bem cuidada e atualmente avalizamos ida para berçário na Educação Infantil. Caso A.C: foi encaminhada à unidade de saúde, após abrigamento dos quatro filhos há dois anos. Casada, terceiro grau incompleto, bilíngue, reside num bairro de classe média da capital. Seu companheiro, com quem convive há mais de 10 anos, trabalha como garçom. A renda desta família é composta pelo salário do companheiro, bolsa família e trabalhos manuais, feito por ela. A retirada das crianças do convívio desta família foi sustentada pelos técnicos do Juizado da Infância e Da Juventude em razão das “condições precárias de higiene” as quais as crianças eram submetidas. Avaliaram a partir de visitas domiciliares e de algumas denuncias de vizinhos, que esta família não estaria apta à educação destas crianças. A demanda da mãe de retomada da guarda dos filhos mobilizou a equipe de saúde mental no sentido de considerar a necessidade de uma articulação em rede, uma vez que esta família era acompanhada pela Assistência Social, Conselho Tutelar, Educação e Saúde e nenhum destes serviços havia se reunido para uma discussão em torno do caso. A introdução da estratégia da Maternidade Assistida nesse trabalho aponta para a possibilidade de reversão da condição de apartamento desse grupo familiar, a partir da sustentação da oferta da palavra na clínica e da realização de intervenções programadas no contexto familiar pelos demais técnicos envolvidos, considerando que apesar das “condições precárias de higiene”, os vínculos afetivos estão bastante preservados. Não há relato ou evidencia de violência física, as crianças apresentam bom desempenho escolar, são carinhosas entre si, com os pais e com as pessoas ao redor. Um elemento importante que podemos extrair deste caso de experiência clínica com mulheres e mães psicóticas é que, no campo das políticas públicas em geral, muitas vezes, decide-se apressadamente por privar a mãe da guarda de seu(s) filho(s), ou com base em relatórios técnicos feitos isoladamente ou com base no simples diagnóstico de psicose, enquanto nada em seus atos justificam tal decisão. Outras vezes, a decisão de não intervir se baseia na ausência de “sinais de loucura”, deixando-se de lado a loucura dos atos, para salvaguardar a ligação da criança com a mãe, considerada essencial para o desenvolvimento da criança. Nesse sentido tomamos como princípio ético relevante as recomendações de Zenoni (2002), de nos referenciarmos mais firmemente nas contribuições da psicanálise freudiana como orientação no campo da clínica com mulheres e mães psicóticas, tanto do ponto de vista do acompanhamento que poderia ser proposto a essas mães, quanto do ponto de vista legal e das decisões que um julgamento judicial implica. A simples retirada do poder familiar, ou seja, o afastamento definitivo de uma mãe de seu filho com base no Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, pode ser louvável e, em alguns casos, até mesmo necessário. Mas não é, de forma alguma, justificativa suficiente para tal procedimento, principalmente quando é aplicado de forma técnico- burocrática, deixando de lado tanto os discursos em jogo e a própria subjetividade dos técnicos, quanto a responsabilidade subjetiva do ato ainda que louco de uma mãe, que pode ter consequências danosas para ambos e para o grupo familiar. 3- RECURSOS UTILIZADOS Para a realização do trabalho utilizamos os recursos já disponibilizados pelo poder público. Tentamos realizar uma maior otimização desses recursos, vinculados ao conhecimento teórico da equipe e das experiências adquiridas ao longo da assistência em saúde pública. Para tanto, no que tange aos Recursos humanos podemos citar os profissionais de saúde mental (psiquiatra e psicólogos), profissionais das equipes de saúde da família, assistentes sociais, pediatras, ginecologistas e profissionais das políticas de Assistência Social, Educação e do judiciário. Os recursos tecnológicos utilizados se resumem no sistema de comunicação como telefone, computadores, impressoras e fax, além do Sistema de Atendimento Informatizado utilizado no SUS BH, o Gestão, que possibilita a condensação de informações acerca do quadro de saúde do paciente, das intervenções realizadas e propostas para o projeto terapêutico de cada sujeito. 4 - CARACTERIZAÇÃO DA SITUAÇÃO ATUAL 4.1 - MECANISMOS OU MÉTODOS DE MONITORAMENTO E AVALIAÇÃO DE RESULTASDOSE INDICADORES UTILIZADOS O monitoramento e a avaliação dos resultados se dá no caso a caso através de indicadores como a estabilização clínica do quadro do paciente, a diminuição de crises e internações psiquiátricas e a maior autonomia dos sujeitos para a vida cotidiana. Além disso a longitudinalidade do cuidado em saúde pública nos permite acompanhar a evolução do quadro do sujeito, identificando potencialidades e fragilidades de cada cidadão, considerando seu território. Outro dado importante que facilita o monitoramento são as ações intersetoriais propostas a partir da estratégia da “Maternidade Assistida” que convida os atores das diversas políticas públicas a se debruçarem sob a questão da maternidade na psicose. A prática tem mostrado que a ausência desse debate tem produzido, em alguns casos, o acionamento de políticas e equipamentos de alta complexidade e com alto custo como o abrigamento para crianças, a institucionalização de mulheres em abrigos ou repúblicas, o retorno para a vida nas ruas e incompleta cidadania desses sujeitos. Dessa forma, indicadores e monitoramento podem e devem ocorrer também de forma intersetorial, como propomos em nosso trabalho, pois muitas das políticas públicas voltadas para a questão da infância e juventude e da família acabam trabalhando de maneira setorizada, muitas vezes com duplicidade de ações e com sobrecarga operacional. 4.2- RESULTADOS QUANTITATIVOS E QUALITATIVOS CONCRETAMENTE MENSURADOS O que podemos sumariamente considerar como resultados do trabalho: Mudança nos paradigmas entre profissionais da rede SUS que levam a ruptura de laços entre mães-bebês: “A psicose em mulheres exclui o exercício da maternidade”. Observou-se que a equipe passou a considerar a mulher efetivamente em sua função materna, e muitas vezes capaz no exercício do cuidado e maternagem de seus filhos, bem como de responder por isso frente à sociedade; Também possibilita construir com outras mulheres, saídas que não sejam necessariamente o exercício dessa função, e com outras a possibilidade de compartilhá-la com outros sujeitos de forma intermitente ou continuada. Sensibilização de profissionais de saúde pública e coletiva, particularmente os das equipes de saúde da família e saúde mental, (bem como os profissionais da Assistência Social e do Judiciário) dos efeitos devastadores da separação mãe-filho e/ou da perda de pátrio poder para as mães psicóticas que encontram na maternidade, se possibilitadas pela assistência, um “estancamento do sofrimento psíquico”; Sensibilização dos membros da família e reposicionamento com relação à capacidade da mulher psicótica de exercer o cuidado e maternagem de seus filhos, possibilitando um reordenamento familiar; Sensibilização dos profissionais da Educação, da Assistência Social e do Poder Judiciário que promoveu mudanças de postura no âmbito intersetorial facilitando a possibilidade de reencontro, convivência social e rediscussão da questão do pátrio poder em alguns casos; Fomento da possibilidade de criação de novas estratégias para impedir que, em nome do sofrimento psíquico grave, seja concretizada a separação mãe psicótica-criança, a desagregação familiar e seus efeitos subjetivos sobre as mães e as crianças; Incentivo à busca de outras e novas respostas à maternidade na psicose, utilizando da estratégia da “Maternidade Assistida” na rede SUS para propiciar a construção de novos paradigmas e possibilitar o aprimoramento nas intervenções de saúde pública e coletiva contribuindo para a promoção da saúde na sociedade, além do aprimoramento das intervenções intersetoriais. 5- LIÇÕES APRENDIDAS 5.1- SOLUÇÕES ADOTADAS PARA A SUPERAÇÃO DOS PRINCIPAIS OBSTÁCULOS ENCONTRADOS No trabalho clínico com usuários de quatro unidades básicas de saúde, encontramos um número significativo de mulheres que constituíram prole e tiveram os laços familiares cindidos a partir de seu adoecimento ou a partir de sua ida para as ruas. Para algumas delas foi possível tanto a reversão dessa condição, quanto a retomada de laços com seus filhos. Para outras por uma série de contingências, essa possibilidade mostrou-se impossível. Foi, portanto, a partir dessa experiência com mulheres que se distanciaram ou perderam a guarda de seus filhos e encontraram a possibilidade de se posicionarem ou não na relação com o mundo, que nasceu nosso interesse pela sustentação de um espaço para pesquisa e para sustentação de uma clínica em saúde mental e coletiva. Embora essa experiência demonstre que, se para algumas mulheres a gravidez e o nascimento do bebê, pode culminar no desencadeamento de um surto psicótico, para outras, a gravidez e o filho, podem significar uma “suplência” ou uma “estabilização”, um “estancamento” da própria condição delirante da psicose, podendo ser lida em vários casos, como uma “saída inventiva” que viabiliza a função materna. Um elemento que foi considerado neste trabalho é a família e/ou grupos co-sanguíneos ou não, com os quais os usuários das unidades de saúde fazem seus laços. Se a família tradicional não é a única modalidade de estrutura na sociedade moderna, ela ainda subsiste como instituição em seus novos arranjos. No trabalho clínico e intersetorial, com mulheres para quem o exercício da função materna se encontra comprometido ou “compreendido como impossível” pelos agentes de cuidado e pelos operadores do direito –(ou pelo Sistema de Garantia de Direitos da Criança e Adolescente) constata-se que arranjos familiares podem ser produzidos e que laços estruturais e estruturantes podem ser construídos entre elas e seus filhos. Preconceitos levaram historicamente à exclusão e seqüestro de cidadanias e subjetividades do considerado socialmente “louco”. As mulheres são duplamente atingidas: pesam sobre elas os “ideais maternais” cujas premissas estão arraigadas no tecido social. Uma vez impossibilitadas de responderem a esses ideais, a única saída ditada pela sociedade e pelos agentes de cuidado – em princípio responsáveis pelo seu bem-estar físico, psicossocial – é a brutal ruptura de seus laços com seus filhos. Esse trabalho tem demonstrado ainda que muitas dessas mulheres têm na gravidez e no nascimento de seu filho, o fator desencadeador do surto psicótico: delírios, alucinações, riscos de passagens ao ato, colocando em risco a sua integridade física e psíquica e a de seu bebê. Mas demonstra também que, existem casos em que o exercício da maternidade pode significar uma “suplência” ou uma “estabilização” do quadro psicótico, e que ao contrário a perda do filho muitas vezes desagrega e devasta a mulher. Na primeira situação (fator desencadeador do surto psicótico) ou na segunda (“suplência” ou “estabilização” do quadro psicótico), o afastamento, a perda da guarda e/ou do pátrio poder do filho, tem sido a única e estereotipada resposta, que desconsidera a singularidade do sujeito, no caso a caso, e as vicissitudes da maternidade em mulheres psicóticas. Esse trabalho demonstra ainda que o afastamento da criança da mãe se deve mais à desassistência que a condição da loucura. Há necessidade de novas respostas e proposições, que impulsione a quebra da circularidade difícil de romper: a cruel perda do exercício da maternidade em nome do sofrimento psíquico, que, se acolhido, tratado e acompanhado, pode impedir a desagregação familiar, o desencadeamento de outros e novos surtos, o seqüestro de cidadanias e subjetividades, bem como a errância de muitas mulheres que encontram nas ruas e não na rede de cuidados, suporte para sua sobrevivência. Entende-se que a estratégia da “Maternidade Assistida” no contexto do SUS, possa ser uma dessas respostas. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALLOUCH, Jean.(2005) Paranóia. Marguerite ou A Aimée de Lacan. Rio de Janeiro. Companhia de Freud: BIRMAN,J.(1978). A psiquiatria como discurso da moralidade.Rio de Janeiro. Graal. BRASIL. Ministério da Saúde. Saúde mental. Brasília: Ministério da Saúde, 2013. (Cadernos de Atenção Básica, 32) BRASL (2003). Ministério da Saúde/Coordenação de Saúde Mental e Coordenação de Gestão da Atenção Básica. Saúde Mental e Atenção Básica: o vínculo e o diálogo necessários. Mimeo BRITO, M.M.M. (2013) Maternidade e Suas Vicissitudes Na Psicose. Tese de Doutorado. FAFICH. UFMG. CZEEMAK, Marcel.(2001) Paixões do Objeto. Estudos Psicanalíticos das Psicoses. Documento. O Caso de Mademoiselle B. Entrevistada por. Jacques Lacan em 1976. Paris CHIAVERINE, Dulce Helena (org) Et.al. (2011). MANUAL DE MATRICIAMENTO EM SAÚDE MENTAL. Ministério da Saúde. 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