Agricultura familiar e biocombustíveis

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AGRICULTURA FAMILIAR E BIOCOMBUSTÍVEIS: ELEMENTOS PARA UMA
PRODUÇÃO SUSTENTÁVEL
[email protected]
APRESENTACAO ORAL-Agricultura Familiar e Ruralidade
MARCIO LUIZ PERIN; GILBERTO MARTINS; DARLENE RAMOS DIAS.
UFABC - UNIVERSIDADE FEDERAL DO ABC, SANTO ANDRÉ - SP – BRASIL
Agricultura familiar e biocombustíveis: elementos para uma produção
sustentável
Family farming and biofuels: elements for a sustainable production
Grupo de Pesquisa: Agricultura Familiar e Ruralidade
RESUMO
A expansão da produção de biocombustíveis tem acirrado os debates envolvendo a
agricultura brasileira. As matérias-primas que compõem a base da matriz nacional de
biocombustíveis são produzidas em sistemas de monoculturas. O modelo de gestão
agrícola adotado no país, que favorece a agricultura patronal, tem provocado intensas
mudanças nas estruturas sociais do campo. A agricultura familiar que teve um papel
importante na economia nacional, empregando grande parte da população agrária, está
perdendo destaque no planejamento agrícola. No entanto, a não contemplação da
agricultura familiar vinculada à produção de biocombustíveis poderá trazer sérias
conseqüências sócio-ambientais ao país. Este artigo discute a importância de uma
reorientação da política agrária, envolvendo uma participação concomitante da agricultura
familiar nos sistemas de produção, entre eles, o cultivo de insumos para a produção de
biocombustíveis. Uma discussão sobre uma nova proposta para este modelo conclui o
texto.
Palavras-Chave: política agrícola; agricultura familiar; diversificação produtiva;
biocombustíveis; sustentabilidade.
ABSTRACT
The expansion of biofuels production has increased the debates surrounding the
Brazilian agriculture. The raw materials that make up the base of the national biofuels
matrix are produced in systems of monoculture. The agricultural management model
adopted in the country, which favors agriculture employers, has provoked intense changes
in social structures of the rural sector. The family farm which had an important role in the
national economy, employing much of the agrarian population, is losing highlights in
agricultural planning. However, the non-contemplation of family farms linked to the
production of biofuels could have serious social and environmental consequences to the
country. This article discusses the importance of a reorientation of agricultural policy,
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involving a concomitant participation in family farm production systems, including the
cultivation of raw materials for biofuel production. A discussion on a new proposal for this
model concludes the paper
Key words: agricultural policy; family farming; productive diversification, biofuels,
sustainability.
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1 Introdução
A intensificação dos debates envolvendo questões energéticas e ambientais,
relacionadas com o aquecimento global, e as constantes flutuações na cotação do petróleo
têm levado a busca por novas formas de energia, limpas, renováveis, seguras e
competitivas. Nesta perspectiva a biomassa desponta como uma das fontes com maior
potencial em substituir os combustíveis fósseis. A biomassa pode ser considerada um
reservatório de energia solar. A conversão da luz do sol em energia química é um dos
processos mais importantes para o suporte da vida no planeta. O processo de conversão da
energia solar em energia química, que envolve o consumo de CO2 e a produção de O2, é
responsável pela reprodução das plantas.
Diversas definições podem ser adotadas para definir biomassa. No contexto
energético, o termo abrange a matéria orgânica utilizada para produção de energia. As
principais fontes de biomassa são as florestas, culturas agrícolas e os resíduos resultantes
das atividades agroflorestais e da pecuária. De acordo com sua origem e tipo de
beneficiamento, a biomassa é classificada em biomassa moderna e biomassa tradicional. A
biomassa tradicional está associada à produção de energia por recursos oriundos de manejo
predatório e com técnicas de baixa eficiência, com altos índices de emissão de poluentes.
Já a biomassa moderna é obtida em um manejo adequado, com emprego de tecnologias
que garantem maior eficiência nos processos de produção e conversão, garantindo um
combustível com qualidade mais elevada. Pode-se citar: etanol, biogás, bio-óleo, óleos
vegetais, madeira de reflorestamento, dentre outros (CHU AND GOLDEMBERG, 2007).
O governo brasileiro tem promovido intensos esforços para promover a expansão
da produção de bioenergia1, em especial o etanol e o biodiesel. O Programa Nacional do
Álcool (Proálcool, Decreto n° 76.593/75), a Lei da Inovação (Lei 10.973/04), a Lei do
Biodiesel (Lei 11.097/05), o Plano Nacional de Agroenergia (PNA 2006–2011), dentre
outros marcos regulatórios recentes, têm estimulado o aumento da participação dos
biocombustíveis na matriz energética nacional (DURÃES, 2008).
No entanto, a expansão da produção nacional de biocombustíveis tem provocado a
identificação dos debates envolvendo a agricultura brasileira. Os favoráveis a esta
expansão justificam ser a bioenergia uma oportunidade para “alavancar o setor agrícola”,
gerando riquezas e contribuindo para a sustentabilidade do planeta (CHU AND
GOLDEMBERG, 2007; GOES ET. AL, 2008). Já os contrários a esta expansão alegam
que os biocombustíveis competem com a produção de alimentos, colocando em risco a
segurança alimentar da população mais pobre, além de agravar, ainda mais, os problemas
do campo (PLATAFORMA BNDES, 2008).
Além disso, a crítica internacional tem atribuído aos biocombustíveis à elevação na
cotação dos alimentos no mercado internacional, o que estaria comprometendo a segurança
alimentar da população mais pobre (MARTHA JR, 2008). Contrariando a crítica
1
Neste trabalho, o termo “bioenergia” tal qual “biocombustíveis”, apresentam definições sinônimas –
produção de combustíveis a partir da biomassa. No entanto, destaca-se que o termo “biocombustível” é mais
usual na designação de combustíveis oriundos da biomassa, enquanto a definição “bioenergia contempla,
também, outras formas de energia, com a eletricidade.
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internacional, os defensores da política de brasileira de bioenergia afirmam que o país tem
condições de garantir a expansão da produção de biocombustíveis, sem comprometer a
produção de alimentos (GOES ET. AL, 2008; MARTHA JR, 2008). A problemática
envolvendo a segurança alimentar é mais abrangente do que a simples discussão sobre a
influência ou não dos biocombustíveis na cotação dos alimentos. O “problema da fome” no
mundo não é oriundo da falta de alimentos, mas sim, do baixo poder aquisitivo da
população mais carente. Este tem raízes mais profundas, sendo conseqüência do modelo de
desenvolvimento econômico adotado pelas nações. “Fome por não poder, não por não ter”.
É indispensável, porém, planejar a expansão dos biocombustíveis. O limiar entre “o ser
herói e o ser vilão” é tênue. Entender os limites dessa expansão é indispensável, devendo
estar presente na pauta de discussões. A bioenergia só pode ser considerada sustentável se
for produzida de forma sustentável.
“Embora a substituição dos derivados de petróleo por biocombustíveis contribua em
princípio para a redução das emissões dos gases de efeito estufa, é necessário atentar às
condições de sua produção. Essas podem ter impactos tão negativos sobre o meio
ambiente que o saldo da operação seja negativo. O impacto ambiental da produção de
biocombustíveis vai depender dos cultivos escolhidos, da maneira como são cultivados
e processados” (SACHS, 2007- pag. 29).
Sachs (2007) aponta que o principal desafio da bioenergia está em contornar os
impactos sociais associados à produção das matérias-primas. Na conjuntura agrícola atual,
as matérias-primas empregadas na produção de biocombustíveis são produzidas em
monocultura. A cana-de-açúcar, em particular, é marcada por condições de trabalho
precárias, desestruturação social das comunidades agrícolas locais e alta insalubridade no
trabalho (PLATAFORMA BNDES, 2008). Modelos agrícolas alternativos com produção
diversificada de insumos e concomitância da produção patronal e familiar podem
contribuir para a produção sustentável dos biocombustíveis. Ademais, sistemas agrícolas
diversificados são menos suscetíveis as oscilações de mercado. No entanto, é necessária
uma reorientação na política agrícola brasileira a fim de fornecer condições para a inserção
deste modelo de produção.
É nesse contexto que se situa o debate fundamental sobre o modelo produtivo
dentro do qual se dará a expansão na produção dos bioenergia no Brasil. Este trabalho tem
por objetivo analisar e discutir as principais problemáticas que envolvem a agricultura
familiar e a expansão da produção da biocombustíveis no Brasil, bem com as perspectivas
para o desenvolvimento sustentável da agricultura brasileira. A suposta benevolência
ambiental não justificaria uma expansão desenfreada da bioenergia. É necessário um
entendimento das reais implicações sociais, ambientais e econômicas que a expansão da
produção de bioenergia pode trazer ao país, a fim de planejar esta expansão.
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2 Produção Familiar no Sistema Agrícola Brasileira
2.1 Agricultura Familiar versus Agricultura Patronal
A agricultura familiar é tida como economicamente ineficiente por muitos
pesquisadores. Por muito tempo a comunidade acadêmica brasileira considerou como
parâmetro para a classificação das formas de produção agropecuária apenas o tamanho dos
estabelecimentos agrícolas. A oposição entre a pequena e a grande propriedade, não apenas
dominou o debate sobre a estrutura social da agricultura brasileira, como também
influenciou diretamente as estratégias agrárias adotadas no país. Desta oposição chegou-se
a tese de que a produção agrícola em pequenos estabelecimentos teria irrisória importância
econômica. A visão produtivista do governo brasileiro direcionou esforços para o
fortalecimento da agricultura patronal, tida como produtiva e altamente eficiente
economicamente. Qualquer esforço em torno do fortalecimento da agricultura familiar era
tida como “um desperdício de recursos públicos” (VEIGA, 1995).
Veiga (1995) retrata que muitas nações pagaram um preço elevado por acreditar
que a produção patronal seria mais eficiente que a pequena produção em unidades
familiares. As grandes fazendas, normalmente, são mais providas em aparatos
tecnológicos, dinâmicas e com administração eficaz, apresentando altos índices de
produtividade. Entretanto, os custos de produção destas fazendas costumam exceder os
verificados nas unidades familiares. Em verdade, nem as micro extensões nem as grandes
áreas de plantio tendem a apresentar, em média, as maiores eficiências.
“... quando se examina com cuidado a questão do tamanho na agricultura e na pecuária,
percebe se que este não é o aspecto mais relevante. A adoção de inovações tecnológicas
eleva constantemente a dimensão dos meios de produção (terra e capital) e reduz na
maior parte dos casos as necessidades de mão-de-obra. Assim, a importância econômica
de unidades produtivas de pequeno porte na agricultura está muito mais ligada à
possibilidade de adoção de inovações tecnológicas, à localização e à qualidade do solo,
do que à área inicial do estabelecimento” (VEIGA, 1995).
Veiga (2000) aponta que, mesmo contando com uma política agrícola favorável, a
agricultura patronal é mais competitiva que a familiar em alguns poucos itens, como na
produção de carne bovina, cana-de-açúcar, arroz e soja. Nos demais, não se observa
diferenças significativas entre as duas estruturas produtivas – em alguns itens a produção
familiar chega a ser mais competitiva que a patronal. A agricultura familiar ocupa cerca de
4,1 milhões de estabelecimentos, representando mais de 84% dos imóveis rurais do país. O
segmento familiar é responsável por aproximadamente 40% do valor bruto da produção
agropecuária, 80% das ocupações produtivas agropecuárias e parcela significativa da
produção dos principais alimentos consumidos no Brasil (RATHMANN, PADULA E
SANTOS, 2007). O Gráfico 1 apresenta a contribuição percentual da agricultura familiar e
patronal na oferta nacional de alguns alimentos no ano de 2007.
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Gráfico 1: contribuição percentual da produção familiar e patronal na oferta interna
de determinados alimentos no ano de 2007.
Fonte: RATHMANN, PADULA E SANTOS, 2007 – gráfico elaborado pelo autor.
Os aspectos sociais associados à distribuição fundiária apontam disparidades entre a
produção familiar e a produção latifundiária, quanto a sua capacidade em garantir
qualidade de vida à sociedade. Sociedades que investiram em uma estratégia de produção
agrícola diversificada, com grande participação da agricultura familiar, apresentam
melhores índices de qualidade de vida entre a sua população. Veiga, 2000, aponta que nos
Estados Unidos, berço da agricultura moderna, a adoção da agricultura fundiária como
base para a produção agrícola não foi plenamente satisfatória. Nas comunidades agrícolas
americanas onde prevaleceu a produção fundiária patronal há poucas escolas, igrejas,
clubes, associações, jornais, empresas e bancos. Nestas localidades, as condições de
moradia são precárias, quase não existem equipamentos de lazer e a delinqüência infantojuvenil é alta, ao contrário do que ocorre em regiões onde predominou a produção familiar.
A tabela 1 apresenta a comparação entre típicas comunidades americanas com predomínio
das formas patronal e familiar na organização da agricultura.
Do ponto de vista ambiental, o enfoque da produção apenas em sistemas patronais
pode aumentar as pressões sobre o meio ambiente. Estes sistemas enfatizam a aplicação de
técnicas agrícolas padronizáveis de forma a eliminar a sua dependência às decisões de área,
clima e fertilidade do solo (FAO/INCRA, 1994). Nesta conjuntura prevalece a produção de
monoculturas intensivas, tanto em capital, quanto em energia e recursos naturais. São
empregadas grandes quantidades de compostos agroquímicos para a correção da fertilidade
do solo e controle de pragas, além da massificação das técnicas “predatórias” de uso do
solo e recursos hídricos, com pouco ou nenhum controle sobre suas influências no meio
ambiente brasileira. A utilização de insumos industrializados e a mecanização da produção
aumentaram a capacidade produtiva das terras. No entanto, a intensificação da produção
em áreas não aptas, ou acima de sua capacidade de suporte, tem provocado erosão,
contaminação dos solos e água com agroquímicos, mudanças nos ciclos hídricos e
diminuição da flora e fauna nos ambientes circundantes. O manejo agrícola intensivo, não
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adequado às condições climáticas, simultaneamente com a ocorrência natural de chuvas
intensas, ou períodos de estiagem, têm reduzido a capacidade de auto-sustentação da
agricultura brasileira, sendo dependente de recursos energéticos externos (AGOSTINHO,
2005).
Tabela 1: comparação entre comunidades agrícolas americanas com predomínio
das formas patronal e familiar de organização econômica.
Características/funções
População
Escolas
Típica localidade patronal
Típica localidade familiar
6.300
1 (primária)
7.800
4 (prim.) + 1 (sec.)
Igrejas
5
14
Clubes
2
12
Associações
Nenhuma
Jornais
Empresas nãoagrícolas
Bancos
Habitações
Delinqüência juvenil
2
1
2
35
62
Nenhum
2
Poucas e pobres
Modestas e adequadas
Séria
Ausente
Fonte: Anne Buttimer, 1995 citado por VEIGA, 1995.
Observando a história do país, bem como a experiência agrícola de outras nações,
conclui-se que o Brasil necessita de um plano de gestão agrícola e territorial adequado à
realidade agrária nacional. A readequação territorial, com a distribuição equilibrada das
terras destinadas a ocupação rural e urbana, reservas florestais e de proteção permanente e
exploração de recursos minerais e florestais, pode garantir maior sustentabilidade à
agricultura brasileira. Neste contexto, é fundamental o fortalecimento da produção
familiar, sob pena de comprometer o desenvolvimento agrário do país.
2.2 Especialização versus Diversificação Produtiva
A maior parte da população menos assistida do planeta reside em áreas rurais.
Estimativas apontam que 75% da população que sobrevive com menos de um dólar por dia
reside no campo, o que representa um contingente de 1,2 bilhões de pessoas (SARRIS,
2001). No Brasil, o desafio está em garantir o desenvolvimento socioeconômico da
agricultura na região norte-nordeste. Estratégias agrárias, que visem o fortalecimento das
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estruturas familiares e o desenvolvimento agrícola em atividades intensivas em mão-deobra, podem constituir-se como ferramentas importantes na redução da pobreza no mundo,
além de diminuir as pressões sobre as grandes cidades.
O debate entre as estratégias para o desenvolvimento agrário concentra-se em duas
vertentes principais: a primeira prevê sistemas produtivos mais especializados, como forma
de aumentar a produtividade, com redução dos custos de produção, visando garantir a
competitividade do agronegócio brasileiro. Contrapondo a esta política há a visão de que
sistemas produtivos diversificados, mais intensivos em mão-de-obra e menos em capital e
energia, serão mais efetivos no desenvolvimento do país.
A adoção de estratégias políticas voltadas para sistemas produtivos mais
diversificados ou mais especializados, para a maior eficiência no uso dos recursos, depende
da exploração inteligente da relação entre as economias de escala, economias de escopo, e
os custos de transação. As economias de escala permitem a redução do custo unitário de
determinada mercadoria pelo aumento da dimensão operacional, em sua produção e/ou
distribuição. Economias de escopo são obtidas quando um mesmo esquema operacional
passa a produzir ou distribuir mais mercadorias. Já as economias de custos de transação
são aquelas que analisam, em seus balanços, os custos associados com a transferência de
mercadorias e serviços entre diferentes unidades operacionais. A combinação destes três
fatores determina as vantagens de determinado segmento com mais especialização ou mais
diversificação em suas atividades (VEIGA ET AL, 2001). No entanto, destaca-se que a
diversificação da agricultura reduz a suceptividade às flutuações do mercado. A economia
familiar normalmente é diversificada, e por conseqüência, é menos vulnerável às crises
financeiras no mercado internacional.
O modelo de gestão da agrícola adotado no país, baseado na produção e exportação
de commodities, em monocultura, tem provocado intensas mudanças nas estruturas sociais
do campo. A agricultura familiar que, por muito tempo, teve um papel importante na
economia nacional, empregando grande parte da população agrária, está em crise. De
Gouvello, 1995, aponta a existência de uma crise energética agrária, onde os pequenos e
médios produtores estão perdendo a sua capacidade produtiva e de auto-sustentação. A
agricultura moderna, globalizada e voltada ao mercado externo, precisa reduzir custos
constantemente, como forma de garantir a competitividade do agronegócio brasileiro. A
corrida tecnológica exigida para esta redução impõe a especialização das fazendas, com
intensa mecanização e o emprego de técnicas de produção avançadas. “Produzir mais com
menos”. Por conseqüência tem-se uma significativa redução da necessidade de mão-deobra. “fatalmente 15% da população brasileira deverá sair do campo nas próximas
décadas”. Esse contingente de mão-de-obra, com baixa qualificação, fica por conta dos
outros setores da economia e de outros grupos sociais. Como alocar estes trabalhadores?
Quais as conseqüências de um fluxo migratório em massa destes trabalhadores rurais para
os grandes centros? O resultado poderá ser um agravamento dos problemas sociais do país,
levando a situações extremamente críticas (VEIGA ET AL, 2001).
Contraponto com a política agrária vigente, a estratégia que prevê sistemas
produtivos mais diversificados opta por diversidade multissetorial, com a maximização das
oportunidades de desenvolvimento humano. Nesta óptica, as mesorregiões rurais do
território brasileiro seriam divididas em microrregiões tendo suas economias baseadas na
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produção diversificada – a pluriatividade2. “A pluriatividade favorece a industrialização
difusa e a descentralização de serviços sociais e empresariais” (FULLER, 1990, p.367).
Para Veiga et al (2001), adotando esta estratégia, o país poderia atingir um patamar de
desenvolvimento econômico equiparado aos países de primeiro mundo, com qualidade de
vida e menor pressão sobre o meio ambiente. Veiga (1998) aponta que o Brasil necessita
adotar políticas fundiárias e agrícolas voltadas ao fortalecimento e a expansão da
agricultura familiar como base para o desenvolvimento local e regional sustentável de seu
povo.
No âmbito das políticas agrícolas, o Pronaf3 prevê linhas de crédito voltadas ao
desenvolvimento rural integrado dos estabelecimentos familiares em transição4, visando
fortalecer estas unidades produtivas. No entanto, apesar da agricultura familiar, constar nos
programas oficiais, grande parte das tecnologias agrícolas não está acessível a este
segmento. Além da política de crédito agrícola (principal veia de fomento do Pronaf),
devem estar previstos programas de extensão rural eficientes, para o adequado treinamento
dos agricultores familiares. A disponibilização de recursos financeiros, por si só, não
garante a auto-sustentação das propriedades familiares. É indispensável que os produtores
recebam o adequado treinamento a fim de que possam se inserir na nova conjuntura
produtiva que vem se desenhando no país.
3 Biocombustíveis e a Agricultura Brasileira
3.1 Aspectos Gerais
O Brasil é um dos países que apresenta maior potencial para liderar a produção de
bioenergia no mundo. A vasta extensão territorial, aliada às condições geoclimáticas
favoráveis, confere ao país significativas vantagens frente aos demais países. Além disso, o
potencial da agricultura brasileira não é totalmente explorado, apresentando áreas
agriculturáveis subaproveitadas. Ademais, o histórico brasileiro na produção de etanol
coloca o país na vanguarda da produção de bioenergia alimentos (GOES ET. AL, 2008;
MARTHA JR, 2008).
A expansão da produção dos biocombustíveis faz parte da agenda política do país.
Políticas de isenção fiscal, subsídios a produtores, além da obrigatoriedade no uso tem
alavancado o mercado brasileiro de biocombustíveis. O etanol e biodiesel são os principais
“vetores” da indústria brasileira de bioenergia. No âmbito do etanol, o país é referencia
mundial, sendo o segundo maior produtor mundial (perdendo apenas para os Estados
2
A pluriatividade refere-se a uma unidade produtiva multidimensional, onde se pratica a agricultura e outras
atividades, tanto dentro, como fora da propriedade, pelas quais são recebidos diferentes tipos de remuneração
e receitas (rendimentos, rendas em espécie e transferências) (FULLER, 1990, p.367).
3
O Pronaf - Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar - foi criado em 1996, tendo como
base o estudo FAO/INCRA-1994.
4
Os estabelecimentos familiares são classificados em: Periféricos: Locais de residência e subsistência de uma
mão-de-obra desempregada ou subempregada. Consolidados: Propriedades desenvolvidas, com acesso as
tecnologias mais eficientes de produção e com bom desempenho econômico. Em transição: Estado
Intermediário entre as duas categorias anteriores (FAO/INCRA, 1994).
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Unidos), além de possuir o menor custo de produção (FAO, 2008). O mercado de biodiesel
ainda é incipiente no país, quando comparado ao etanol. No entanto, os incentivos
econômicos e a obrigatoriedade da mistura junto ao diesel fóssil têm alavancado a
produção brasileira ao longo dos anos com. O gráfico 2 apresenta evolução da produção
brasileira de etanol e biodiesel no período de 2005 a 2009.
Gráfico 2: Evolução da produção brasileira de etanol e biodiesel no período de
2005 a 2009.
Fonte: UNICA, 2009; ANP, 2010 – gráfico elaborado pelo autor.
A produção nacional de etanol está centrada na região sudeste, sendo o estado de
São Paulo o maior produtor nacional (59%). A matéria-prima empregada é a cana-deaçúcar. O gráfico 3 apresenta a distribuição da produção de etanol brasileira, de acordo
com as unidades federativas.
Ao contrário do que ocorre na produção de etanol, o biodiesel é produzido por mais
de uma fonte de matéria-prima. Além disso, a liderança na produção de biodiesel tem
apresentado alternância desde o inicio da produção nacional. Em 2005, a produção
concentrava-se na região norte-nordeste. Neste período os estados do Pará e Piauí eram
responsáveis por cerca de 90% da produção nacional. No entanto, com a expansão da
produção nacional, o eixo de produção de biodiesel deslocou-se para o centro-sul (regiões
centro-oeste, sudeste e sul). A partir de 2007, os estados do Rio Grande do Sul e Mato
Grosso passaram a liderar a produção nacional, respondendo por 51% da produção
nacional. O gráfico 4 apresenta a dinâmica da evolução participativa dos estados
brasileiros na produção de biodiesel.
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Gráfico 3: Participação dos principais estados na produção brasileira de etanol.
Fonte: UNICA, 2009 - gráfico elaborado pelo autor.
Gráfico 4: Evolução da participação dos estados na produção brasileira de
biodiesel no período de 2005 a 2009.
Fonte: ANP, 2010 – gráfico elaborado pelo autor.
A mudança no eixo de produção deve-se às mudanças na matriz de suprimento de
matéria-prima. Em 2005, a matéria-prima era quase que totalmente suprida pela mamona.
No entanto, o predomínio da sojicultura na produção nacional de oleaginosas deslocou a
produção de biodiesel para as regiões produtoras de soja. Além disso, os sistemas
produtivos do centro-sul são mais bem estruturados, quando comparados à agricultura
desenvolvida na região norte-nordeste. O emprego de técnicas agrícolas mais eficientes, a
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contração da produção e a proximidade aos centros de consumo, conferem a soja aspectos
econômicos e técnicos favoráveis. Atualmente, a oleaginosa responde por 77% da matériaprima consumida na produção de biodiesel (ANP, 2010). O gráfico 5 apresenta a matriz de
fornecimento de matéria-prima para a produção de biodiesel, tendo como base o mês de
janeiro de 2010.
Gráfico 5: Matriz de suprimento da produção de biodiesel no Brasil janeiro de
2010.
Fonte: ANP, 2010 – gráfico elaborado pelo autor.
A estratégia política aportada pelo PNPB (Programa Nacional de Produção de
Biodiesel) prevê que as matérias-primas utilizadas pela indústria de biodiesel sejam
adquiridas da agricultura familiar. Através de incentivos econômicos e fiscais o governo
previa que o eixo de produção de biodiesel estaria centrado na região norte-nordeste. No
entanto, avaliando os gráficos 4 e 5 verifica-se que esta expectativa não está se
concretizando. O Rio Grande do Sul, que apresenta grande parte de suas unidades
produtivas enquadradas como agricultura familiar5, aparenta ter sido o grande favorecido
pelo programa. Além disso, as demais matérias-primas representativas na produção de
biodiesel são a gordura animal (principalmente de origem bovina) e óleo de algodão. Estes
insumos são produzidos, normalmente, em grandes unidades produzidas, desvinculadas à
produção familiar. Desta forma, é necessária uma reestruturação do PNPB, a fim de inserir
os agricultores do norte-nordeste no mercado de biodiesel.
3.1 Biocombustíveis: Perspectivas para Produção Sustentável
Os principais insumos utilizados para a produção de bioenergia no país são a canade-açúcar e o óleo de soja. Esses insumos são produzidos em sistemas de produtivos
baseados em monoculturas, com alta intensidade de capital e de agroquímicos (em especial
5
No Rio Grande do Sul 85% das unidades agrícolas são enquadradas com familiares (IBGE, 2010).
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no caso da soja). O cultivo de monoculturas em grandes extensões de terra é apontado por
movimentos sociais e por ambientalistas como um dos principais entraves ao
desenvolvimento agrário6 do país. Uma eventual abertura dos mercados internacionais,
aliado ao aumento da demanda nacional, aumentaria a demanda dos produtores de
bioenergia por novas áreas agrícolas. Os resultados dessa expansão são incertos, gerando
intensos debates. O aumento na produção de biocombustíveis pode expandir a fronteira
agrícola às regiões não aptas do ponto de vista ambiental, como o pantanal mato-grossense
e mata amazônica. Até que ponto pode-se considerar o etanol e biodiesel como sendo
“energias verdes”? Entender as limitações do campo é indispensável para não
comprometer a sustentabilidade da agricultura brasileira.
Ademais, o balanço de carbono, um dos principais argumentos dos defensores dos
biocombustíveis, pode variar consideravelmente em função do local e das técnicas de
manejo empregadas (LEE, CLARK AND DEVEREAUX, 2008). Em muitos casos, há
aumentos nas emissões líquidas de gases de efeito estufa7. A produção intensiva de
monoculturas, sem observar as práticas de conservação da microbiologia do solo, pode
comprometer a redução das emissões proporcionadas pela substituição dos derivados
fósseis, utilizados como combustíveis.
Os sistemas agrícolas são complexos, envolvendo uma série de processos
econômicos, culturais e de relação com o meio ambiente; processos que ocorrem
simultaneamente e em diferentes intensidades, de acordo com a região. Soluções
energéticas com pretensão de serem sustentáveis e que envolvam o uso da infra-estrutura
agrícola devem atender a diferentes restrições ou perspectivas: compatibilidade com as leis
biofísicas, a identidade cultural, a organização sócio-política, as restrições ambientais, o
contexto institucional, as variáveis macro e micro-econômicas e conhecimento sobre os
processos ecológicos envolvidos (GIAMPIETRO; PASTORE E ULGIATI, 2003).
As expectativas de que os biocombustíveis contribuirão para o desenvolvimento
agrícola do país, melhorando a qualidade de vida no campo, podem não se concretizar. No
caso do etanol, a produção está centrada na monocultura canavieira, em grandes unidades
produtivas. É pouco provável que possam ocorrer mudanças na atual conjuntura produtiva,
possibilitando a inserção da agricultura familiar neste mercado. Já o biodiesel,
vislumbrava-se que sua inserção poderia ocorrer em sistemas agrícolas familiares,
promovendo a melhoria das condições sociais destes agricultores. No entanto, avaliando a
evolução da produção nacional verifica-se que esta inserção não está ocorrendo como
previsto pelo PNPB, sendo que os agricultores familiares do norte-nordeste não estão tendo
acesso a este mercado, ou tendo acesso limitado. Além disso, as principais matérias-primas
empregadas pela indústria do biodiesel são produzidas em monocultura.
Desta forma, avalia-se que é necessária uma reestruturação do programa brasileiro
de biodiesel, sob pena de excluir permanentemente os agricultores familiares do mercado
6
Por desenvolvimento agrário entende-se que o desenvolvimento econômico (nível de produção,
competitividade da agricultura, dentre outros itens de ordem econômica) deve ser acompanhado do
desenvolvimento social dos agricultores.
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O balanço de carbono para as bioenergias considera a relação entre o carbono evitado pela não-queima de
fontes de energia fósseis, descontadas as emissões decorrentes do processo produtivo (queimadas, o uso de
compostos nitrogenados – fertilizantes e defensivos agrícolas – mudanças no uso do solo, transportes do
combustível, etc.)
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de bioenergia brasileiro. Silva (2009) aponta que a mamona, principal insumo energético
produzido na região norte-nordeste, não é competitiva frente às demais oleaginosas – as
oscilações na cotação do óleo de mamona e a produção difusa encarecem o custo de
produção do biodiesel. Outras matérias-primas, como o óleo de babaçu, apresentam a
mesma restrição mercadológica. Silva (2009) aponta ainda, que os produtores desta região
têm encontrado dificuldades no acesso às linhas de credito, assistência técnica, e acesso ao
mercado de biodiesel (a produção, normalmente é comercializada junto a atravessadores).
Assim, sugerem-se linhas de créditos específicas que atendam as especificidades desta
região, além da extensão dos programas de assistência técnica para os produtores.
Ademais, novas matérias-primas, com menor custo de produção deveriam ser inseridas no
portfólio produtivo do programa, a fim de melhorar a competitividade insumos energéticos
produzidos nesta região.
Além das culturas energéticas tradicionais, outro grande potencial para a produção
de energia, é o aproveitamento de resíduos resultantes da produção agropecuária. Durante
as atividades de colheita, transporte, armazenagem e beneficiamento são produzidos uma
vasta quantidade de rejeitos. Esses rejeitos, normalmente, são lançados no meio ambiente,
com pouco ou nenhum aproveitamento. Além de representar um impacto ambiental, a não
utilização desses materiais incursiona um desperdício de energia, uma vez que eles
representam potencial energético considerável. A produção de biocombustíveis de material
residual figura como importante alternativa para os produtores familiares, produzindo
energia a custos reduzidos e com relação ambiental mais favorável do que os sistemas
convencionais de produção de energia. Entretanto, devem-se desenvolver estratégias para a
exploração desses recursos, principalmente no âmbito técnico e econômico.
A diversificação da matriz bioenergética, com maior participação da produção de
biogás, combustíveis de 2ª e 3ª geração8, dentre outras fontes, pode garantir mais
flexibilidade e segurança a produção brasileira de bioenergia. A geração descentralizada de
energia em pequenas propriedades rurais pode contribuir para a um aumento na
sustentabilidade energética e econômica do local, contribuindo para a melhoria da
qualidade de vida e reduzindo a evasão agrícola. A produção diversificada de bioenergia
em pequena escala, concomitantemente com a produção de alimentos pode contribuir para
a mitigação da crise agrícola nesses sistemas produtivos. De acordo com Nogueira e Lora
(2003), a geração descentralizada de energia favorece a utilização dos recursos energéticos
locais. O que tem por beneficio, o incremento no valor econômico destes recursos, além de
promover o desenvolvimento tecnológico da região. A utilização adequada de tecnologias
para a geração descentralizada pode aumentar a quantidade e a qualidade da energia
disponível no local, a um custo acessível, com maior eficiência e com menor pressão sobre
o meio ambiente.
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Os Biocombustíveis 1ª geração utilizam como matéria-prima produtos agrícolas e agroindustriais como
insumo em seu processo produtivo. Ex.: o etanol de cana-de-açúcar e o biodiesel de óleos vegetais.
Biocombustíveis de 2ª geração são produzidos por fontes de biomassa que não utilizadas na alimentação
humana ou animal. Ex: o etanol produzido da celulose e/ou lignocelulose. Já os biocombustíveis de 3ª
geração são produzidos a partir de insumos energéticos produzidos exclusividade para abastecer este
mercado. São produzidos em áreas não aptas à agricultura convencional. Ex.: a produção de biodiesel a partir
da cultura de micro-algas.
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A bioenergia representa um potencial altamente relevante para o desenvolvimento
econômico e redução dos riscos associados com o aquecimento global. Adotando técnicas
de produção eficientes do ponto de vista social, ambiental, técnico e econômico o Brasil
poderia ampliar a produção de bioenergia, sem comprometer a qualidade de vida sua
nação. Ressalta-se, neste contexto, a importância de preservar participação da produção
familiar, sob pena de agravar os problemas sociais do campo. A concomitância da
produção patronal e familiar pode contribuir para que o desenvolvimento sustentável do
país.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este artigo teve por objetivo analisar e discutir os principais aspectos que envolvem
a produção dos biocombustíveis e a sua relação com a agricultura familiar. Foram
apresentados dados que confirmam a importância da produção familiar para a economia
brasileira, bem como, uma breve discussão sobre as estratégias produtivas que envolvem a
estrutura agrícola do país.
A expansão da produção de biocombustíveis tem despertado o interesse por
questões relacionadas à agricultura brasileira. O debate envolvendo o modelo ao qual se
dará a produção dos biocombustíveis está centrado em duas vertentes ideológicas
principais: uma produtivista – que prevê sistemas intensivos, altamente especializados; e
outra que prega a diversidade produtiva em sistemas descentralizados.
Na conjuntura agrícola atual, as perspectivas para a inserção dos agricultores
familiares no mercado de bioenergia são pouco promissoras. O etanol, cuja produção já
está consolidada no país e em franca expansão, é caracterizado pelas grandes propriedades
e pela monocultura da cana-de-açúcar. É pouco provável que este cenário possa se alterar.
Já o biodiesel que surgiu em um contexto social, visando à inclusão dos agricultores
familiares na cadeia de fornecimento de matéria-prima, ainda é incipiente. No entanto,
avaliando os primeiros resultados da produção nacional, aponta-se que o PNPB tem sido
pouco efetivo em sua missão de incluir os agricultores familiares da região norte-nordeste
no mercado de bioenergia. O predomínio da sojicultura na produção de oleaginosas do
país, aliado a falta de uma política agrária consistente e eficaz, tem marginalizado a
participação destes agricultores. Sugere-se uma reestruturação do PNPB, a fim de
promover condições que possibilitem a inclusão dos agricultores desta região no mercado
de biodiesel.
O potencial dos biocombustíveis para o desenvolvimento agrário do país é
relevante. No entanto, é necessária a adoção de políticas agrícolas eficientes para a
inclusão dos agricultores familiares na cadeia produtiva, sob pena de agravar ainda mais os
problemas sociais do campo. O Pronaf, principal agente de incentivo da agricultura
familiar, deve ser fortalecido. Além da política crédito agrícola aos pequenos agrícolas,
devem estar previsto programas de extensão rural, para o adequado treinamento dos
agricultores. Apenas disponibilizar recursos financeiros não garante a auto-sustentação das
propriedades familiares.
A produção diversificada de bioenergia em pequena escala, concomitantemente
com a produção de alimentos pode contribuir para a mitigação da crise agrícola nesses
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sistemas produtivos. A geração descentralizada de energia favorece a utilização dos
recursos energéticos locais. O que tem por beneficio incremento no valor econômico destes
recursos, além de promover o desenvolvimento tecnológico da região. A utilização
adequada de tecnologias para a geração descentralizada pode aumentar a quantidade e a
qualidade da energia disponível no local, a um custo acessível, com menores perdas de
eficiência e com menor pressão sobre o meio ambiente.
Por fim, aponta-se que a bioenergia não pode estar baseada apenas na produção de
monoculturas em grandes unidades produtivas. Nesta concepção os biocombustíveis não
geram desenvolvimento, apenas agravam os problemas socioambientais e econômicos do
país. A produção de biocombustíveis só poderá ser considerada sustentável se prever o
emprego das técnicas de produção eficientes, com respeito às limitações socioambientais
do campo, além de prever a participação da geração descentralizada em unidades
familiares.
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